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yTKcu4YBgYBz1XKvLSKs | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA</font><a><u><sup><font>[1]</font></sup></u></a><font>:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> “AA, Lda.”, com sede em ......, Serpins, Lousã, propôs a presente acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra “BB, Unipessoal, Lda.”, com sede em ......, São Miguel, Vila Nova de Poiares, CC e esposa, DD, EE e marido, FF, com residência em ......, São Miguel, Vila Nova de Poiares, pedindo que, na sua procedência, os réus sejam condenados, solidariamente, a pagar-lhe a quantia de €64.136,82, bem assim como os juros moratórios, à taxa legal, a partir da data da citação e até efectivo e integral pagamento.</font>
</p><p><font>Para atingir a finalidade visada com a presente acção, a autora alega, em síntese, que, no exercício da actividade de comercialização de azeites e óleos a que se dedica, forneceu à ré, sociedade unipessoal, sendo o seu único gerente o réu BB, a pedido desta, para posterior revenda, diversas mercadorias, a partir de 19 de Janeiro de 2007, como consta das respectivas facturas, com vencimento a trinta dias, que a mesma ia amortizando, ascendendo ao montante total de €8.868,67, com referência ao ano de 2007.</font>
</p><p><font>Por conta deste valor, a ré unipessoal entregou à autora a quantia de €91.886,15, ficando em débito a importância de €32.753,04, e, continuando os fornecimentos, do mesmo modo, ascenderam ao montante total de €36.996,81, até Agosto de 2008, data em que se fixou o quantitativo global em dívida, em €69.749,85.</font>
</p><p><font>Por conta deste outro montante, a ré unipessoal entregou à autora a quantia de €22.522,79, ficando, assim, em débito a importância de €47.227,06, a que acrescem juros de mora, os quais, contabilizados desde o vencimento das facturas, até 19 de Janeiro de 2009, importam em €16.909,76.</font>
</p><p><font>Considerando que a ré unipessoal e os réus BB e esposa sempre mostraram dificuldades em cumprir, pontualmente, com os pagamentos, em 17 de Maio de 2007, na sequência de procedimento cautelar interposto pela autora, realizou-se um acordo de pagamento, assumindo a ré EE, parcialmente, a dívida da ré unipessoal, através do qual foi fixada a dívida da ré sociedade para com a autora, em €38.564,74, tendo o réu BB entregue, para seu pagamento, cheques pré-datados, no valor de €14.750,00, e €1.487,34, em dinheiro, sendo o restante pagamento efectuado, em onze prestações, mensais e sucessivas, no valor individual de €2.000,00, titulado por cheques, emitidos pela ré EE, e a diferença de €327,40, entregue em dinheiro.</font>
</p><p><font>Ao emitir tais cheques, referentes a uma conta bancária sua e de seu marido, a ré EE assumiu e garantiu o débito perante a autora, sendo, também, responsável pelo seu pagamento, sem o que esta não aceitaria o pagamento acordado em prestações. </font>
</p><p><font>Como o acordo estivesse a ser cumprido, a autora continuou a fornecer a ré unipessoal, tendo a ré EE entregue outros cheques, no montante, também, de €2.000,00, cada, todos depositados na conta de pré-datados da autora, por conta do valor aberto em conta corrente.</font>
</p><p><font>Porém, estes cheques passaram a ser devolvidos, a partir de 1 de Julho de 2008, com a menção de revogação por justa causa, devido a vício na formação da vontade, tendo, também, sido devolvido um 0000000000 do réu BB, no montante de €4.034,00, com a indicação de falta ou insuficiência de provisão.</font>
</p><p><font>A autora interpelou, por diversas vezes, todos os requeridos para procederem ao pagamento, o que não foi conseguido, pelo que, para assegurar o pagamento da dívida, obteve arresto, que foi decretado no apenso.</font>
</p><p><font>Na sua contestação, o réu FF impugna a factualidade alegada pela autora, concluindo pela inexistência de qualquer garantia ou obrigação de pagamento seu e da ré EE aquela, a quem nada devem, pelo que a acção deve, quanto a si, ser julgada improcedente, condenando-se a autora como litigante de má fé, em multa e indemnização, a seu favor, a liquidar, ulteriormente.</font>
</p><p><font>Por seu turno, os demais réus, na sua contestação, impugnam diversa da factualidade alegada, em sede de petição inicial, concluindo no sentido de que as relações comerciais estabelecidas com a autora foram levadas a cabo, tão-só, pela ré sociedade, pelo que todos os demais réus estão, indevidamente, na lide, o que resulta de litigância clara de má fé daquela.</font>
</p><p><font>Na verdade, o réu BB, sócio e único gerente da ré sociedade, apenas nessa veste se relacionou com a autora, nunca tendo, por isso, assumido perante a mesma qualquer responsabilidade individual, pois que a dívida era da sua empresa, sendo certo que os réus BB e esposa nunca assumiram, pessoalmente, a obrigação de pagar, o que quer que fosse, à autora, e que o pagamento parcial efectuado pelo réu BB apenas faz diminuir a dívida da ré sociedade, a qual se não confunde com a pessoa dos réus CC e esposa, não responsabilizando aquele pela totalidade da dívida, sendo certo, igualmente, que os réus EE e marido nada contrataram com a autora, nada lhe adquiriram ou lhe prestaram qualquer garantia, pelo que nada lhe devem.</font>
</p><p><font>Por outro lado, a ré EE não entregou quaisquer cheques à autora, e os cheques a que esta se refere, embora emitidos da conta pessoal desta ré, foram entregues ao réu BB, como forma de o auxiliar nos encargos da sua empresa, que passava por dificuldades económicas, desconhecendo a ré EE que concreto destino tiveram, enquanto que aquele réu, em contrapartida, venderia a esta ré todas as metades indivisas que detém em todos os seus prédios das freguesias de Poiares, Santo André e S. Miguel de Poiares, como adequado acerto de contas aquando da outorga das respectivas escrituras públicas, tratando-se, precisamente, de todos os prédios arrestados no apenso.</font>
</p><p><font>Em meados de 2008, a ré EE ordenou o cancelamento de alguns desses cheques, uma vez que o réu BB andava a protelar no tempo a realização das aludidas escrituras públicas.</font>
</p><p><font>Alegam, por fim, que a ré sociedade procedeu ao pagamento dos fornecimentos realizados pela autora, pelo que nada lhe deve, com a consequente improcedência total da acção, condenando-se, porém, esta como litigante de má fé, em multa e indemnização.</font>
</p><p><font>Na réplica, a autora conclui como na sua petição inicial e, assim, pela total improcedência da matéria de excepção deduzida pelos réus, na contestação.</font>
</p><p><font> A sentença considerou, em suma, que a ré sociedade deixou por pagar o saldo devedor dos fornecimentos que a autora lhe fez, no apurado montante de €37.715,85, a que acrescem €164,20 de despesas bancárias, atinentes à devolução de cheques entregues para pagamento, quantia total essa, a título de capital, de €37.880,05, pela qual é responsável e em cujo pagamento a mesma foi condenada, sendo ainda o réu BB, solidariamente, condenado com a ré sociedade, quanto à quantia parcelar de €4.034,00, e bem assim a ré EE condenada, também, solidariamente, com a ré sociedade, quanto à quantia parcelar de €26.164,20, na linha de entendimento de que estas quantias parcelares de €4.034,00 e de €26.164,20, representavam os valores de cheques emitidos por estes, acrescido de despesas bancárias quanto à segunda situação, no âmbito dum “acordo de pagamento” à aqui autora, donde a “co-responsabilização” dos mesmos com a ré sociedade perante a autora nesses particulares, sendo ainda proferida condenação, em juros moratórios, sobre tais quantias, mais concretamente, “</font><i><font>cada um dos 2.º R. marido e 3.ª R. mulher devem juros moratórios, solidariamente com a 1.ª R., com referências aos valores inscritos nos cheques, por cada um daqueles preenchidos, que foram devolvidos sem pagamento, desde a data de devolução de cada um desses cheques, como consta discriminado supra na factualidade provada, e até integral pagamento; - quanto ao mais, até perfazer a totalidade do capital ainda em dívida, apenas a 1.ª R. deve juros moratórios, devendo-os desde a citação e até integral pagamento</font></i><font>”, sendo certo que, “</font><i><font>Já quanto ao mais peticionado, não provada nessa parte a acção, vão todos os RR. absolvidos</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>Desta sentença, os réus</font><b><font> </font></b><font>BB e EE interpuseram recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado, totalmente, procedente a apelação deduzida pelo co-réu BB, em consequência do que, revogando a condenação respeitante ao mesmo, foi este, totalmente, absolvido do pedido contra ele deduzido pela autora [I], e julgado, parcialmente, procedente a apelação deduzida pela co-ré EE,</font><b><font> </font></b><font>em consequência do que, revogando-se a condenação respeitante à mesma, se substitui a sentença proferida nessa parte pela condenação da ré EE, solidariamente, com a ré sociedade, na quantia parcelar de 4.000,00 euros (quatro mil euros), acrescida do que se vier a liquidar como correspondendo às despesas de devolução dos dois cheques em causa, a que acrescem os peticionados juros moratórios, à taxa supletiva legal aplicável às dívidas de natureza comercial, mais concretamente, a ré EE deve juros moratórios, solidariamente, com a ré sociedade, com referência aos valores inscritos nos dois ditos cheques, por si preenchidos, que foram devolvidos sem pagamento, desde a data de devolução de cada um desses cheques, como consta discriminado supra na factualidade provada, e até integral pagamento [II], quanto ao mais, até perfazer a totalidade do capital ainda em dívida, apenas a ré sociedade deve juros moratórios, devendo-os desde a citação e até integral pagamento [III].</font>
</p><p><font>Do acórdão da Relação de Coimbra, a autora interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, substituindo-se por outro que confirme, mantendo, integralmente, a decisão da 1ª instância, formulando as seguintes conclusões, que, integralmente, se transcrevem:</font>
</p><p><font>1ª - O douto Tribunal de 1</font><sup><font>a</font></sup><font> instância esteve bem na interpretação da prova produzida, não podendo ser dada outra decisão que a da condenação dos réus, nos termos do douto acórdão supra descrito.</font>
</p><p><font>2ª - A autora apenas manteve os fornecimentos à 1</font><sup><font>a</font></sup><font> ré em virtude do 2</font><sup><font>º</font></sup><font> e 3</font><sup><font>a</font></sup><font> ré terem assumido a dívida e,</font>
</p><p><font>3ª - Por os cheques que se destinavam ao pagamento da mercadoria fornecida pertencerem à 3</font><sup><font>a </font></sup><font>ré,</font>
</p><p><font>4ª - Pois a autora tinha por experiência que tais cheques eram pagos atempadamente. Os funcionários do banco, as testemunhas GG e HH, confirmaram que tais cheques devolvidos não foram efectivamente pagos.</font>
</p><p><font>5ª - Não conseguiu a ré recorrente lograr provar que tinha pago os referidos cheques,</font>
</p><p><font>6ª - Tendo provada a autora que os mesmos não estavam pagos. Pelo que deverá manter-se a resposta dada aos quesitos 106°, 123° e 124° (quesito 129) da base instrutória.</font>
</p><p><font>7ª - Dentre os cheques emitidos pela 3.</font><sup><font>a</font></sup><font> ré mulher foram devolvidos treze,</font>
</p><p><font>8ª - No montante total, pois, de 26.000,00 euros, montante este pelo qual aquela é responsável perante a autora,</font>
</p><p><font>9ª - Já que se vinculou ao cumprimento nessa parte do devido, tendo emitido cheques, de que a autora é o legítimo portador, revogados sem motivo válido,</font>
</p><p><font>10ª - Estando, por isso, obrigada a 3.</font><sup><font>a</font></sup><font> ré ao pagamento dos valores por esses cheques titulados, tal como está obrigada ao pagamento das despesas decorrentes da devolução desses cheques, sem esquecer os juros moratórios respectivos.</font>
</p><p><font>11ª - Deve também manter-se, na íntegra, a condenação do 2</font><sup><font>o</font></sup><font> co-réu,CC, </font>
</p><p><font>12ª - Foi violado o artigo 767°, n° 1, do C. Civil.</font>
</p><p><font>Nas contra-alegações, que apenas a ré EE apresentou, esta conclui no sentido de que deve ser rejeitado o recurso de revista a que se responde, por inadmissibilidade legal e, caso assim se não entenda, deve ser negado provimento ao mesmo.</font>
</p><p><font> Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.</font>
</p><p><font>As questões a decidir, na presente revista, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3, 690º e 726º, todos do CPC, são as seguintes:</font>
</p><p><font>I – A questão da alteração da decisão sobre a matéria de facto.</font>
</p><p><font>II – A questão da vinculação ao cumprimento, por parte dos réus EE e BB, em relação aos cheques por si emitidos.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>I. DA ALTERAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO</font>
</p><p><font> Entende, desde logo, a autora, que, tendo provado que os cheques não estavam pagos, deverão manter-se as respostas dadas, em sede de 1ª instância, aos quesitos 106°, 123° e 124° (quesito 129º) da base instrutória.</font>
</p><p><font>Efectivamente, uma das circunstâncias excepcionais em que o Supremo Tribunal de Justiça pode alterar a decisão proferida pela Relação quanto à matéria de facto, consiste na situação em que se verifique a ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, uma vez que, por via de regra, aquele aplica, definitivamente, o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, ainda que exista erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 729º, nºs 1, 2 e 3, e 722º, nº 3, do CPC.</font>
</p><p><font>E isto porque, em princípio, só à Relação compete modificar a decisão sobre a matéria de facto, a partir de prova testemunhal extratada nos autos e dos demais elementos de prova que serviram de base à respectiva decisão, desde que dos mesmos constem todos os elementos probatórios, necessários e suficientes, para o efeito, dentro do quadro normativo e através do exercício dos poderes conferidos pelo artigo 712º, do CPC.</font>
</p><p><font>Ora, a predita intervenção residual do Supremo Tribunal de Justiça não consente, no caso em apreço, que o mesmo possa vir a alterar o que o Tribunal da Relação decidiu, a este propósito, com base no princípio da livre convicção racional.</font>
</p><p><font>Assim sendo, este Supremo Tribunal de Justiça entende que se devem considerar demonstrados os seguintes factos, conforme, oportunamente, foi fixado pelo Tribunal da Relação, mas reproduz, nos termos das disposições combinadas dos artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do CPC:</font>
</p><p><font>1. Em 30 de Abril de 2007, a requerente interpôs uma providência cautelar para tentar salvaguardar os seus créditos – Processo n.º 432/07.3TBLSA, Procedimento Cautelar - A).</font>
</p><p><font>2. A autora é uma sociedade por quotas que tem por objecto o comércio de azeites e óleos – 1.º.</font>
</p><p><font>3. A 1.ª ré é uma sociedade unipessoal que se dedica à distribuição de produtos alimentares – 2.º.</font>
</p><p><font>4. Sendo o 2.º réu o seu único sócio gerente – 3.º.</font>
</p><p><font>5. Em 19/01/2007, a autora forneceu à 1.ª ré a mercadoria, aludida na factura n.º 7, no valor de €2.798,88, a que corresponde a guia de remessa n.º 4 – 4.º.</font>
</p><p><font>6. Factura essa que se venceu, em 19 de Fevereiro de 2007 – 5.º.</font>
</p><p><font>7. Em 31/01/2007, a autora forneceu à 1.ª ré a mercadoria, aludida na factura n.º 14, no valor de € 3.448,48. – 6.º.</font>
</p><p><font>8. Factura essa que se venceu, em 28 de Fevereiro de 2007 – 7.º.</font>
</p><p><font>9. Em 13/02/2007, a autora forneceu à 1.ª ré a mercadoria, aludida na factura n.º 21, no valor de € 1.384,32 – 8.º.</font>
</p><p><font>10. Factura essa que se venceu, em 13 de Março de 2007 – 9.º.</font>
</p><p><font>11. Em 17/02/2007, a autora forneceu à 1.ª ré a mercadoria, aludida na factura n.º 23, no valor de € 1.999,20 – 10.º.</font>
</p><p><font>12. Factura essa que se venceu em 17 de Março de 2007 – 11.º.</font>
</p><p><font>13. Em 16/03/2007, a autora forneceu à 1.ª ré a mercadoria, aludida na factura n.º 33, no valor de € 3.099,04 – 12.º.</font>
</p><p><font>14. Factura essa que se venceu, em 16 de Abril de 2007 – 13.º</font>
</p><p><font>15. Em 23/03/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 34, no valor de € 2.549,90 – 14.º.</font>
</p><p><font>16. Factura essa que se venceu, em 23 de Abril de 2007 – 15.º.</font>
</p><p><font>17. Em 23/03/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 40, no valor de €3.022,10 – 16.º.</font>
</p><p><font>18. Factura essa que se venceu, em 23 de Abril de 2007 – 17.º.</font>
</p><p><font>19. Em 21 de Maio de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 79, no valor de €99,96, datada de 21 de Maio de 2007 a que corresponde a guia de remessa nº 1519 –18.º.</font>
</p><p><font>20. Factura esta que se venceu, em 21 de Junho de 2007 – 19.º.</font>
</p><p><font>21. Em 25 de Maio de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 81, no valor de €3.200,74, datada de 25 de Maio de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1522 – 20.º.</font>
</p><p><font>22. Factura esta que se venceu, em 25 de Junho de 2007 – 21.º.</font>
</p><p><font>23. Em 2 de Junho de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 87, no valor de €2.189,04, datada de 2 de Junho de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1099 – 22.º.</font>
</p><p><font>24. Factura esta que se venceu, em 2 de Julho de 2007 – 23.º.</font>
</p><p><font>25. Em 6 de Junho de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 88, no valor de €2.673,44, datada de 6 de Junho de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1100 – 24.º.</font>
</p><p><font>26. Factura esta que se venceu, em 6 de Julho de 2007 – 25.º</font>
</p><p><font>27. Em 26 de Junho de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 93, no valor de €8.197,28, datada de 26 de Junho de 2007 – 26.º.</font>
</p><p><font>28. Factura esta que se venceu, em 26 de Julho de 2007 – 27.º.</font>
</p><p><font>29. Em 06/07/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 106, no valor de € 2.520,00 – 28.º.</font>
</p><p><font>30. Factura esta que se venceu, em 6 de Agosto de 2007 – 29.º.</font>
</p><p><font>31. Em 11/07/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 109, no valor de € 2.520,00, datada de 11/07/2007 – 30.º.</font>
</p><p><font>32. Factura esta que se venceu, em 11 de Agosto de 2007 – 31.º.</font>
</p><p><font>33. Em 18/07/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 112, no valor de €2.887,36 – 32.º.</font>
</p><p><font>34. Factura esta que se venceu, em 18 de Agosto de 2007 – 33.º.</font>
</p><p><font>35. Em 20 de Julho de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 114, no valor de €2.100,00, datada de 20 de Julho de 2007 – 34.º.</font>
</p><p><font>36. Factura esta que se venceu, em 20 de Agosto de 2007 – 35.º.</font>
</p><p><font>37. Em 1 de Agosto de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 117, no valor de €4.200,00, datada de 1 de Agosto de 2007 – 36.º.</font>
</p><p><font>38. Factura esta que se venceu, em 1 de Setembro de 2007 – 37.º.</font>
</p><p><font>39. Em 08/08/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 119, no valor de €2.205,00 – 38.º.</font>
</p><p><font>40. Factura esta que se venceu, em 8 de Setembro de 2007 – 38º-A.</font>
</p><p><font>41. Em 14/08/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 120, no valor de €4.598,72 – 39.º.</font>
</p><p><font>42. Factura esta que se venceu, em 14 de Setembro de 2007 – 40.º.</font>
</p><p><font>43. Em 4 de Setembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 122, no valor de €2.596,32, datada de 4 de Setembro de 2 007, a que corresponde a guia de remessa nº 1552 – 41.º.</font>
</p><p><font>44. Factura esta que se venceu, em 4 de Outubro de 2007 – 42.º.</font>
</p><p><font>45. Em 13 de Setembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 129, no valor de €5.001,92, datada de 13 de Setembro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1465 – 43.º.</font>
</p><p><font>46. Factura esta que se venceu, em 13 de Outubro de 2007 – 44.º.</font>
</p><p><font>47. Em 21 de Setembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 133, no valor de €4.800,32, datada de 21 de Setembro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 75 – 45.º.</font>
</p><p><font>48. Factura esta que se venceu, em 21 de Outubro de 2007 – 46.º.</font>
</p><p><font>49. Em 4 de Outubro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 136, no valor de €2.600,64, datada de 4 de Outubro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1531 – 47.º.</font>
</p><p><font>50. Factura esta que se venceu, em 4 de Novembro de 2007 – 48.º.</font>
</p><p><font>51. Em 9 de Outubro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 138, no valor de €5.201,28, datada de 9 de Outubro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1602 – 49.º.</font>
</p><p><font>52. Factura esta que se venceu, em 9 de Novembro de 2007 – 50.º.</font>
</p><p><font>53. Em 19 de Outubro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 141, no valor de €5.199,04, datada de 19 de Outubro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1532 – 51.º.</font>
</p><p><font>54. Factura esta que se venceu, em 19 de Novembro de 2007 – 52.º.</font>
</p><p><font>55. Em 24 de Outubro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 143, no valor de €2.602,88, datada de 24 de Outubro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1558 – 53.º.</font>
</p><p><font>56. Factura esta que se venceu, em 24 de Novembro de 2007 – 54.º.</font>
</p><p><font>57. Em 7 de Novembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 153, no valor de €1.949,92, datada de 7 de Novembro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1535 – 55.º.</font>
</p><p><font>58. Factura esta que se venceu, em 7 de Dezembro de 2007 – 56.º.</font>
</p><p><font>59. Em 16 de Novembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 164, no valor de €2.500,96, datada de 16 de Novembro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1608 – 57.º.</font>
</p><p><font>60. Factura esta que se venceu, em 16 de Dezembro de 2007 – 58.º.</font>
</p><p><font>61. Em 22 de Novembro de 2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 167, no valor de €2.500,96, datada de 22 de Novembro de 2007, a que corresponde a guia de remessa nº 1467 – 59.º.</font>
</p><p><font>62. Factura esta que se venceu, em 22 de Dezembro de 2007 – 60.º.</font>
</p><p><font>63. Em 06/12/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 172, no valor de €2.700,32 – 61º.</font>
</p><p><font>64. Factura esta que se venceu, em 6 de Janeiro de 2008 – 62.º.</font>
</p><p><font>65. Em 12/12/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 175, no valor de €2.820,33 – 63.º.</font>
</p><p><font>66. Factura esta que se venceu, em 12 de Janeiro de 2008 – 64º.</font>
</p><p><font>67. Em 15/12/2007, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria, aludida na factura n.º 178, no valor de €2.700,32 – 65º.</font>
</p><p><font>68. Factura esta que se venceu, em 15 de Janeiro de 2008 – 66º.</font>
</p><p><font>69. A 1.ª R. tinha ainda um saldo devedor do ano de 2006 de €25.770,52 – 67º.</font>
</p><p><font>70. A 1.ª R. entregou à autora a quantia de €91.886,15 (noventa e um mil oitocentos e oitenta e seis euros e quinze cêntimos) – 68º.</font>
</p><p><font>71. Em 8 e 16 de Janeiro de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 8, no valor de €3.510,42, datada de 16 de Janeiro de 2008, a que correspondem as guias de remessa nºs 1233 e 1619 - 69º.</font>
</p><p><font>72. Factura esta que se venceu, em 16 de Fevereiro de 2008 – 70º.</font>
</p><p><font>73. Em 1 de Fevereiro de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 12, no valor de €2.600,64, datada de 1 de Fevereiro de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1620 – 71º.</font>
</p><p><font>74. Factura esta que se venceu, em 1 de Março de 2008 – 72º.</font>
</p><p><font>75. Em 24 de Abril de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 41, no valor de €2.419,65, datada de 24 de Abril de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 14 – 73º.</font>
</p><p><font>76. Factura esta que se venceu, em 24 de Maio de 2008 – 74º.</font>
</p><p><font>77. Em 5 de Maio de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 44, no valor de €4.113,27, datada de 5 de Maio de 2008 – 75.º.</font>
</p><p><font>78. Desta factura consta como data de vencimento 04/06/2008 – 76.º.</font>
</p><p><font>79. Em 6 de Maio de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 46, no valor de €1.930,75, datada de 6 de Maio de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1478 – 77º.</font>
</p><p><font>80. Factura esta que se venceu, em 5 de Junho de 2008 – 78º.</font>
</p><p><font>81. Em 17 de Junho de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 54, no valor de €3.510,42, datada de 17 de Junho de 2008, a que corresponde a guia de remessa n.º 1483 – 79º.</font>
</p><p><font>82. Desta factura consta como data de vencimento 17/07/2008 – 80º.</font>
</p><p><font>83. Em 14 de Julho de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 62, no valor de €1.649,76, datada de 14 de Julho de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1486 – 81º.</font>
</p><p><font>84. Factura esta que se venceu, em 13 de Agosto de 2008 – 82º.</font>
</p><p><font>85. Em 16 de Julho de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 64, no valor de €1.924,72, datada de 16 de Julho de 2008, a que corresponde a guia de remessa n.º 1487 – 83.º.</font>
</p><p><font>86. Desta factura consta como data de vencimento 15/08/2008 – 84.º.</font>
</p><p><font>87. Em 4 de Agosto de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 76, no valor de €2.599,52, datada de 4 de Agosto de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1716 – 85º.</font>
</p><p><font>88. Factura esta que se venceu, em 3 de Setembro de 2008 – 86º.</font>
</p><p><font>89. Em 8 de Agosto de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 77, no valor de €2.599,52, datada de 8 de Agosto de 2008, a que corresponde a guia de remessa n.º 1717 – 87º.</font>
</p><p><font>90. Factura que se venceu em 07/09/2008 – 88º.</font>
</p><p><font>91. Em 14 de Agosto de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 79, no valor de €2.599,52, datada de 14 de Agosto de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1582 – 89º.</font>
</p><p><font>92. Factura esta que se venceu, em 13 de Setembro de 2008 – 90º.</font>
</p><p><font>93. Em 19 de Agosto de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 80, no valor de €3.639,33, datada de 19 de Agosto de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1538 – 91º.</font>
</p><p><font>94. Factura esta que se venceu, em 18 de Setembro de 2008 – 92º.</font>
</p><p><font>95. Em 25 de Agosto de 2008, a autora forneceu à 1.ª R. a mercadoria constante da factura nº 81, no valor de €3.899,28, datada de 25 de Agosto de 2008, a que corresponde a guia de remessa nº 1583 – 93º.</font>
</p><p><font>96. Factura esta que se venceu, em 24 de Setembro de 2008 – 94º.</font>
</p><p><font>97. A 1.ª R. entregou à autora a quantia de 22.522,79 (vinte e dois mil quinhentos e vinte e dois euros e setenta e nove cêntimos) – 95º.</font>
</p><p><font>98. Na sequência do processo, identificado na alínea A) dos factos assentes, a 17 de Maio de 2007, os 1.º e 2.º requeridos fizeram um acordo de pagamento com a requerente – 96º.</font>
</p><p><font>99. Tendo a 3.ª R. mulher intervindo, também, nesse acordo – 97º.</font>
</p><p><font>100. Tal acordo consubstanciou-se na fixação da dívida da 1.ª requerida para com a requerente, em €38.564,74 (trinta e oito mil, quinhentos e sessenta e quatro euros e setenta e quatro cêntimos) – 98º e 99º.</font>
</p><p><font>101. Tendo o 2.º requerido entregue cheques pré-datados no valor de €14.750,00 e €1.487,34, em dinheiro – 100º.</font>
</p><p><font>102. O restante, em pagamento de 11 prestações, mensais e sucessivas, no valor de €2.000,00 cada, titulado pelos cheques nºs 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, 0000000000, do Banco Caixa de Crédito Agrícola, CCAM Beira Centro – 101º.</font>
</p><p><font>103. Agência de Vila Nova de Poiares, emitidos pela 3.ª requerida – 102º.</font>
</p><p><font>104. Sendo a diferença de €327,40, entregue em dinheiro – 103º.</font>
</p><p><font>105. A autora apenas concordou no pagamento em prestações perante a intervenção da 3.ª R. mulher – 104º.</font>
</p><p><font>106. Como tal acordo estava a ser cumprido, a autora continuou a fornecer a 1.ª requerida – 105º.</font>
</p><p><font>107. Para liquidação dos fornecimentos da autora à 1ª requerida, foram entregues, em datas e por pessoa não concretamente apurada, àquela primeira, pelo menos, os seguintes cheques da 3ª requerida:</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 4 de Março de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº0000000000, datado de 11 de Março de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 18 de Março de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 25 de Março de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 13 de Abril de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 27 de Abril de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 00000000000, datado de 18 de Maio de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 00000000000, datado de 4 de Maio de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 30 de Junho de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 19 de Julho de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 31 de Julho de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 9 de Agosto de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 5 de Setembro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 25 de Setembro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 5 de Setembro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 10 de Outubro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 25 de Outubro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 25 de Novembro de 2008,</font>
</p><p><font>Cheque nº 0000000000, datado de 25 de Dezembro de 2 008, todos sacados sobre a caixa de Crédito Agrícola Mútuo, Agência de Vila Nova de Poiares, no montante de €2.000,00, cada, e todos depositados, na conta de “Pré datados”, pertença da autora – nova resposta ao quesito 106º. </font>
</p><p><font>108. No entanto, em 1 de Julho de 2008, é devolvido o cheque nº 0000000000, sacado sobre ao Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, Agência de Vila Nova de Poiares, com data de 30 de Junho de 2008, no montante de €2.000,00, com a indicação de FALTA VÍCIO, OU SEJA REVOGADO por justa causa POR VÍCIO NA FORMAÇÃO DA VONTADE – 107º.</font>
</p><p><font>109. Em 4 de Julho de 2008, é devolvido o cheque nº 0000000000, sacado sobre a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, Agência de Vila Nova de Poiares, com data de 2 de Julho de 2008, no montante de €2.000,00, com a indicação de FALTA VÍCIO, OU SEJA REVOGADO por justa causa POR VÍCIO NA FORMAÇÃO DA VONTADE – 108º.</font>
</p><p><font>110. Em 23 de Julho de 2008, é devolvido o cheque nº 0000000000, com data de 19 de Julho de 2008, | [0 0 0 ... 0 0 0] |
yjJzu4YBgYBz1XKveQon | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> Proc. nº 505/17.4T8LMG.C1.S1</font></b>
<p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> I - Relatório</font></b><br>
<b><font> 1. AA </font></b><font>e marido, </font><b><font>BB,</font></b><font> instauraram contra </font><b><font>CC</font></b><font> e marido, </font><b><font>DD;</font></b><font> </font><b><font>EE </font></b><font>e marido, </font><b><font>FF;</font></b><font> </font><b><font>GG;</font></b><font> e </font><b><font>HH,</font></b><font> ação declarativa, de condenação, com processo comum, em que pediram:</font><br>
<font>a) Se declare nula e de nenhum efeito, por constituir pacto sucessório, a escritura pública designada “Cessão gratuita de quinhão hereditário” outorgada em 28 de março de 2015, em que II foi doadora e as RR. CC e EE donatárias;</font><br>
<font>Se assim se não entender,</font><br>
<font>b) Se declare a anulação da mesma escritura, em razão da incapacidade da declarante, por anomalia psíquica;</font>
</p><p><font>c) De decrete a anulação dos testamentos e atos de última vontade outorgados pela II em 4 de outubro de 2013 e em 15 de novembro de 2013, ambos no Cartório da Dra. JJ, em razão da incapacidade da declarante, que padecia já à data de anomalia psíquica, estando incapaz de perceber o sentido e alcance das declarações que proferia;</font>
</p><p><font>Quando assim se não entenda,</font><br>
<font>d) Que se decrete a anulação da escritura pública designada “Cessão gratuita de quinhão hereditário” outorgada em 28 de março de 2015, em que a II foi doadora e as aqui RR. CC e EE donatárias, bem como dos testamentos e atos de última vontade outorgados pela II em 4 de outubro de 2012 no Cartório Notarial de …, em 21 de junho de 2013 e em 15 de novembro de 2013, estes no Cartório Notarial da Dra. JJ, em virtude de terem sido obtidas as declarações da declarante por coação e/ou dolo, diretamente exercidas pelas beneficiárias de ambos os documentos, para o efeito do seu enriquecimento patrimonial;</font>
</p><p><font>Caso assim se não entenda,</font><br>
<font>e) Declarar-se a incapacidade sucessória das RR. CC e EE para receber da II qualquer deixa testamentária em virtude de indignidade, por haverem determinado a declaração de vontade de II, a qual não obteriam de outra forma, e contra a vontade da declarante.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> 2. </font></b><font>A sentença do tribunal de 1.ª instância declarou a ação totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se os Réus dos pedidos contra si formulados pelos autores.</font>
</p><p><b><font> </font></b><br>
<b><font> 3. </font></b><font>Inconformados recorreram os autores, tendo o</font><b><font> </font></b><font>Tribunal da Relação decidido julgar o recurso procedente, revogar a sentença e declarar a anulação da escritura pública designada “Cessão gratuita de quinhão hereditário” outorgada em 28 de março de 2015, em que II foi doadora e as RR. CC e EE donatárias.</font><br>
<font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>4.</font></b><font> Inconformados, os 1.ºs e 2.ºs Réus apresentaram recurso de revista, recursos que foram admitidos, tendo este Supremo Tribunal de Justiça concedido as revistas e revogado o acórdão recorrido, considerando válida a cessão gratuita enquanto negócio jurídico de doação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> 5. AA</font></b><font>e marido, </font><b><font>BB</font></b><font>, notificados do acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça, que revogou o acórdão recorrido, vêm arguir a respetiva nulidade nos termos do disposto nos artigos 685.º, 666.º e 615.º do Código de Processo Civil (CPC), e com os seguintes fundamentos:</font>
</p><p><font> «Os ora requerentes notificados do teor da decisão proferida não se podem conformar com o decidido que se lhes afigura conter vícios que inquinam a sua validade. </font>
</p><p><font>Desde logo porquanto se sustenta no acórdão a bondade da decisão recorrida, admitindo-se que: </font>
</p><p><b><font>«o preceito do artigo 149.º do CC era aplicável à inabilitação </font></b><b><i><font>ex vi</font></i></b><b><font> do disposto no 156.º do mesmo código»</font></b>
</p><p><b><font>«que o acto de cessão gratuita foi praticado quando já havia sido instaurada a acção de interdição … sendo certo que a inabilitação veio a ser decretada» </font></b>
</p><p><b><font>«que na situação em apreço a actuação da relação não infringe qualquer comando» </font></b>
</p><p><b><font>«que vistos estes contornos e mesmo que o acto fosse oneroso os factos provados apontam para a existência de prejuízo» </font></b>
</p><p><b><font>«assim se concluindo, na perspectiva do </font></b><b><i><font>homo prudens</font></i></b><b><font> e numa exegése sagaz mas razoável e sensata, que o acto… seria prejudicial» </font></b>
</p><p><font>E finalmente </font>
</p><p><b><font>«teríamos de concluir que se mostravam preenchidos os pressupostos da anulação da cessão gratuita, sendo que o respectivo pedido foi formulado tempestivamente, nos termos dos artigos 149.º n.º 2 e 287.º do CC» </font></b>
</p><p><font>A entender-se assim, como efectivamente se entendeu neste venerando Tribunal, a consequência teria de ser inevitável e necessariamente o acolhimento e confirmação do acórdão da Relação. </font>
</p><p><font>Porém não o foi. </font>
</p><p><font>O que constitui contradição insanável que deve ser conhecida e consequentemente reparada a decisão proferida.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> É certo que a sentença que decretou a inabilitação fixou um momento em que considera que se iniciou a incapacidade. </font>
</p><p><font>Mas essa fixação é meramente indicativa e não absoluta, como tem vindo a ser jurisprudência dos tribunais superiores. </font>
</p><p><font>Pois que é bem sabido que o processo de degradação das capacidades mentais não é, na grossa maioria dos casos, súbito antes evolutivo, de modo lento e gradual. </font>
</p><p><font>E que, no caso, necessariamente se desenvolveu no decurso dos longos cinco anos da pendência daquela acção. </font>
</p><p><font>Acresce que, transportar a possibilidade da anulação dos actos para o momento fixado na sentença introduz um factor de insegurança jurídica para o incapaz e para os que terceiros que com ele contratem. </font>
</p><p><font>Aliás, a razão de ser da necessidade da publicitação da acção e fazer-se decorrer o início do período em que os actos podem ser anulados dessa publicação é, precisamente a proteção dos interesses quer do inabilitando quer de terceiros. </font>
</p><p><font>Princípio que também se impõe no novo regime de acompanhamento de maiores: </font>
</p><p><i><font>- artigo 154.º do CC - sem que se vislumbre no acórdão agora impugnado qualquer fundamento que demonstre, ou sequer invoque, o ganho ou mais valia que resulta de se transferir para o momento fixado na sentença - momento que em concreto ninguém conhece - o início do limite temporal da anulabilidade do acto.</font></i>
</p><p><font>Diz-se no acórdão que esta novel interpretação tem por objectivo defender primordialmente os interesses e dignidade do incapaz. </font>
</p><p><font>Mas, colocada a questão assim, falta-lhe considerar a outra face do problema, a qual o acórdão agora impugnado omite e desconsidera. </font>
</p><p><font>É certo que a liberdade e autonomia individual são princípios inderrogáveis do cidadão, e também do incapaz, a respeitar em todos os casos e em todas as vertentes de modo absoluto. </font>
</p><p><font>Porém, para o cidadão incapaz ou limitado na sua vontade e capacidade deverá sempre ser, também, considerada esta sua limitação, o que o acórdão não fez. </font>
</p><p><font>Apontar a relevância da autonomia individual como princípio absoluto no caso de pessoa com capacidade intelectual limitada é considerar igual o que, de facto e na realidade, é desigual. </font>
</p><p><font>É no confronto entre a regra geral - a plena capacidade dos maiores - e a situação concreta do incapaz, que deve fundar-se, ponderadamente, a determinação do critério ideal para a interpretação da lei. </font>
</p><p><font>A não ser assim - a optar-se pela interpretação agora ensaiada - admitir-se-á a validade de actos praticados pelo inabilitando, sem capacidade de entender e querer, e que são aptos a lesá-lo gravemente. </font>
</p><p><font>Lesão essa que o atinge do ponto de vista pessoal, mas também na sua vertente patrimonial.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Ou seja, o critério agora inovador da interpretação do artigo 149.º em virtude de deixar de considerar também a redução ou limitação de capacidades e eleger como valor primordial a autonomia tem, ou pode ter, como consequência a omissão da defesa dos incapazes. </font>
</p><p><font>Em contradição absoluta com o intuito da lei e com o próprio propósito que o acórdão diz defender, já que é absolutamente contraditório que a interpretação agora sufragada defenda os interesses do inabilitando. </font>
</p><p><font>A novel interpretação agora sustentada, como se vê, acarreta como consequência que a inabilitanda tenha aberto mão de metade do seu património a favor de pessoas - da sua intimidade - a favor de quem também já tinha disposto, por testamento, da sua quota disponível. </font>
</p><p><font>Sendo certo que o acórdão considerou, e até citou, a págs. 32, o seguinte: </font>
</p><p><b><i><font>«… não se provaram factos que, de algum modo, compensassem justificassem tal transferência de direito a futuro património de tal magnitude. O acompanhamento, cuidados e apoio moral e afectivo das donatárias à doadora não justificavam tal relevante doação, até porque elas eram remuneradas pelos serviços prestados. </font></i></b>
</p><p><b><i><font>Note-se ainda que se provou ter a Elisa praticado actos que aponta para a necessidade de ela obter liquidez… </font></i></b>
</p><p><b><i><font>Nesta conformidade mal se compreende que perante tal necessidade ainda fosse alienar gratuitamente, e sem para tal se apurar cabal ou até suficiente justificação, parte muito significativa do seu património».</font></i></b><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Manifestamente, cremos não ser esta a melhor maneira de defender os direitos e interesses dos incapazes. </font>
</p><p><font>Mais ainda: </font>
</p><p><font>Sustentam os Senhores Conselheiros - e bem - e até citam o n.º 2 do art.º 9.º do Código Civil, que diz: </font>
</p><p><font>«Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ...» </font>
</p><p><font>Dispunha o artigo 149.º do CC em vigor à data dos que: </font>
</p><p><font>«</font><b><font>1. São igualmente anuláveis os negócios jurídicos celebrados pelo incapaz depois de anunciada a proposição da acção...» </font></b>
</p><p><font>Solução que foi mantida pelo legislador na alteração introduzida pela - Lei n.º 49/2018, de 14/08. </font>
</p><p><font>Veja-se o teor da alínea </font><i><font>b) </font></i><font>do n.º 1 do artigo 154.º </font>
</p><p><font>Donde a novel interpretação traduzir-se em considerar e fixar uma leitura da lei que não tem um mínimo de correspondência na letra da lei. </font>
</p><p><font>E mais, subverte princípios básicos da lei e da jurisprudência maioritária nesta matéria. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em consequência </font>
</p><p><font>1 - Considerando que se mostravam preenchidos os pressupostos da anulação da cessão gratuita, e que o respectivo pedido foi formulado tempestivamente, a consequência teria de ser inevitável e necessariamente o acolhimento e confirmação do acórdão da Relação. </font>
</p><p><font>2 - Sofre assim o acórdão do vício de contradição insanável entre os seus fundamentos e a decisão proferida </font>
</p><p><font>3 - Sustenta-se no acórdão uma nova interpretação para o artigo 149.º do CC; o que se faz de modo inválido e enfermando de nulidade; </font>
</p><p><font>Pois que, </font>
</p><p><font>4 - Defende-se que o âmbito de actos permitidos ao incapaz fixado na sentença que determinou a incapacidade, deve ser o critério delimitador da anulabilidade dos seus actos. </font>
</p><p><font>5 - Ora, nos termos da sentença proferida nos autos de acção de inabilitação decidiu-se ocorrer a incapacidade da ali requerida, sem que se tenham sido delimitados os actos ou categoria de actos que a inábil poderia praticar. </font>
</p><p><font>6 - Neste ponto o acórdão proferido carece, em absoluto, de fundamento porque no caso a decidir não foram fixados quaisquer actos. </font>
</p><p><font>7 - O segundo requisito integrante daquela nova interpretação da lei prende-se com o quadro temporal em que foi praticado o acto. </font>
</p><p><font>8 - O quadro temporal em que foi praticado a acto é meramente indicativa e não absoluta, como tem vindo a ser jurisprudência dos tribunais superiores, pois que é bem sabido que o processo de degradação das capacidades mentais não é, na grossa maioria dos casos, súbito antes evolutivo, de modo lento e gradual.</font>
</p><p><font>9 - Acresce que transportar a possibilidade da anulação dos actos para o momento fixado na sentença introduz um factor de insegurança jurídica para o incapaz e para os que terceiros que com ele contratem. </font>
</p><p><font>10 - A razão de ser da necessidade da publicitação da acção e fazer-se decorrer o início do período em que os actos podem ser anulados dessa publicação é, precisamente a proteção dos interesses quer do inabilitando quer de terceiros. </font>
</p><p><font>11 - Assim sendo carece, absolutamente, de fundamentação nesta parte, já que não se especificam os fundamentos que levam a esta decisão </font>
</p><p><font>Por outro lado </font>
</p><p><font>12 - Apontar a relevância da autonomia individual como princípio absoluto no caso de pessoa com capacidade intelectual limitada é considerar igual o que, de facto e na realidade, é desigual. </font>
</p><p><font>13 - Terá de ser sempre sopesada a limitação na capacidade de querer e entender do incapaz na apreciação da questão em análise </font>
</p><p><font>14 - E é no confronto entre a regra geral da plena capacidade dos maiores - e a situação concreta do incapaz, que deve fundar-se, ponderadamente, a determinação do critério ideal para a interpretação da lei. </font>
</p><p><font>15 - A solução aqui encontrada conduz a admitir a validade de actos praticados pelo inabilitando, sem capacidade de entender e querer, e que são aptos a lesá-lo gravemente. </font>
</p><p><font>16 - Em divergência absoluta com o intuito da lei e com o próprio propósito que o acórdão diz defender, já que é absolutamente contraditório que a interpretação agora sufragada defenda os interesses do inabilitando.</font>
</p><p><font>17 - A novel interpretação traduz-se em considerar e fixar uma leitura da lei que não tem um mínimo de correspondência na letra da lei, e mais, subverte princípios básicos da lei e da jurisprudência maioritária nesta matéria. </font>
</p><p><font>18 - É assim nulo o acórdão nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC quando não especifica os fundamentos de facto e de direitos que justificam a decisão </font>
</p><p><font>19.º - E, quando o faz, os fundamentos invocados estão em oposição com a decisão proferida. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> TERMOS EM QUE DEVEM SER CONHECIDAS E SANADAS AS AGORA ARGUIDAS NULIDADES».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> 2.</font></b><font> A ré, HH, veio apresentar a sua resposta</font><b><font> </font></b><font>à arguição de nulidade apresentada pelos Autores, tendo formulado as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«I. Entende a Ré que o douto Acórdão terá que ser revogado, sendo do interesse de todas as partes que tal suceda, porquanto quaisquer futuros passos processuais só podem ser dados, se estiverem assentes em fundações sólidas e sem possibilidade de serem abaladas;</font>
</p><p><font>II. O douto Acórdão está ferido de nulidade prevista na alínea b) do artigo 615º do Código de Processo Civil;</font>
</p><p><font>III. Os Senhores Conselheiros optam por uma interpretação diferente do Tribunal da Relação relativamente ao artigo 149º do Código Civil, sem fundamentarem tal opção;</font>
</p><p><font>IV. Impedindo as partes de impugnarem tal opção.</font>
</p><p><font>V. Os Senhores Conselheiros não demonstram a razão pela qual não merece acolhimento a interpretação do Tribunal da Relação, não obstante referirem expressamente que “creio que a mera interpretação das normas dos artigos 149º e 156º nos conduzem a uma solução que não a adotada pela Relação, pese embora a sua aparente bondade.”</font>
</p><p><font>VI. O douto Acórdão está ainda ferido de nulidade prevista na alínea c) do artigo 615º do Código de Processo Civil;</font>
</p><p><font>VII. Os Senhores Juízes Conselheiros citam o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, expressando concordância com o teor do mesmo, seguindo a sua linha de raciocínio, referindo que “se mostram preenchidos os pressupostos da anulação da cessão gratuita, sendo que o pedido foi formulado tempestivamente (…)” e acolhendo a “aparente bondade” da decisão da Relação;</font>
</p><p><font>VIII. Contudo, a final, seguem um caminho diferente, motivado por uma interpretação totalmente nova não sendo inteligível o motivo de tal interpretação;</font>
</p><p><font>IX. Os Senhores Juízes Conselheiros parecem hesitar entre dois sentidos diferentes, tendo, a final, optado por um que está em contradição com toda a linha de raciocínio montada;</font>
</p><p><font>X. A opção dos Senhores Juízes Conselheiros viola expressamente o artigo 12º do Código Civil, violando ainda o princípio da igualdade estatuído no art.º 13.º da Constituição, já que, ao basearem a sua decisão numa lei que não estava em vigor à data dos factos, estão a atribuir à mesma um efeito retroactivo, colocando em causa a dignidade social e a igualdade de todos perante a lei;</font>
</p><p><font>XI. Os Senhores Juízes Conselheiros parecem, efetivamente, querer adotar o douto entendimento do Tribunal da Relação, já que concordam com toda a linha de pensamento. Contudo e, na parte final, optam por uma interpretação diferente e em clara violação da lei e da Constituição;</font>
</p><p><font>XII. Os Senhores Juízes Conselheiros não podem querer dar um entendimento a um artigo baseado numa lei que não estava em vigor à data dos factos;</font>
</p><p><font>XIII. Nem podem fazer uma interpretação restritiva de uma norma, baseada nessa mesma lei;</font>
</p><p><font>XIV. Não obstante, mesmo que o pudessem fazer, a verdade é que a alínea b) do nº 1 do artigo 154º do Código Civil na sua versão atual, salvaguarda as situações como a do caso em apreço;</font>
</p><p><font>XV. Pelo que mesmo seguindo esta linha de raciocínio, a conclusão dos Senhores Juízes Conselheiros teria que ser a de acolher e confirmar a decisão do Tribunal da Relação;</font>
</p><p><font>XVI. Com o nº 1 do artigo 149º do Código Civil, o legislador quis proteger os negócios realizados depois de anunciada a propositura da ação, até porque criou o artigo específico para estas situações;</font>
</p><p><font>XVII. Tendo igualmente estipulado como requisitos para a anulabilidade dos atos que: a interdição seja decretada e que o negócio cause prejuízo ao interdito;</font>
</p><p><font>XVIII. Os Senhores Juízes Conselheiros invocam expressamente os factos provados, dos quais se retira que a cessão em causa ocorreu em momento posterior ao do anúncio da propositura da ação, que a inabilitação veio a ser decretada e que o negócio causou prejuízo à Sra. II (inabilitada);</font>
</p><p><font>XIX. Era então forçoso concluir no mesmo sentido do Tribunal da Relação, acolhendo e confirmando tal decisão.</font>
</p><p><font>XX. Os Senhores Juízes Conselheiros dão a volta ao tema e decidem em sentido diverso, verificando-se uma clara ambiguidade.</font>
</p><p><b><font>Termos em que devem as NULIDADES Arguidas pelos Autores serem julgadas procedentes e o Acórdão proferido ser REVOGADO e substituído por outro que ACOLHA e CONFIRME a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra.</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Assim, se fará, como sempre, inteira</font>
</p><p><font>J U S T I Ç A»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> 3. EE </font></b><font>e marido, </font><b><font>FF</font></b><font>, reclamados, vêm apresentar resposta ao requerimento apresentado pelos autores, pugnando para que este mereça indeferimento </font><i><font>in totum</font></i><font>, mantendo-se intocado o Acórdão proferido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Cumpre apreciar e decidir. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> II - Fundamentação</font></b>
</p><p><font> As questões a decidir na presente reclamação, de acordo com as alegações dos reclamantes, são as seguintes: 1) Nulidade do acórdão reclamado por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e por contradição entre os fundamentos e a decisão, respetivamente previstas nas alíneas </font><i><font>b)</font></i><font> e </font><i><font>c)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 615.º do CPC; 2) Violação dos princípios da proibição da retroatividade (artigo 12 .º do CC) e da igualdade (artigo 13.º da Constituição) pela interpretação do artigo 149.º do Código Civil adotada pelo acórdão reclamado.</font>
</p><p><font> Para além destas questões, desenvolvem as reclamantes uma múltipla argumentação de direito substantivo relacionada com a interpretação do artigo 149.º do Código Civil e com os requisitos estipulados na citada norma para a anulabilidade do negócio praticado pelo inabilitando durante a pendência da ação, nos casos em que a inabilitação vem a ser decretada. Contudo, esses alegados erros de interpretação não constituem vícios de nulidade, mas refletem apenas o inconformismo das reclamantes com a decisão em si, da qual discordam, pelo que não cabe aqui discuti-los. Como se afirma no acórdão deste Supremo Tribunal, de 28 de janeiro de 2020 (Revista n.º 392/18.5T8STR-C.E1-A.S1 - 6.ª Secção) </font><i><font>«A circunstância das partes não estarem de acordo com a decisão produzida, não é fundamento para sustentar a reclamação por nulidades e/ou reforma do acórdão, constituindo um incidente extravagante».</font></i><br>
<font> A observação da realidade judiciária mostra que é vulgar a arguição da nulidade da decisão, em confusão com o erro de julgamento. E a verdade é que, por vezes, se torna difícil distinguir o </font><i><font>error in judicando </font></i><font>- o erro na apreciação da matéria de facto ou na determinação e interpretação da norma jurídica a eles aplicável - e o error </font><i><font>in procedendo</font></i><font>, como é aquele que está na origem da nulidade decisão (cf. Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, </font><i><font>Dos Recursos, Quid Iuris, </font></i><font>Lisboa, 2009, p. 117). No mesmo sentido, afirma o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30/9/2010, Proc. n.º 341/08.9TCGMR.G l.S2, que o “o erro de julgamento (</font><i><font>error in judicando</font></i><font>) resulta de uma distorção da realidade factual (</font><i><font>error facti</font></i><font>) ou na aplicação do direito (</font><i><font>error juris</font></i><font>), para que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa” e distingue-se da nulidade do acórdão.</font>
</p><p><font> Na verdade, as reclamantes parecem confundir a sua discordância em relação à decisão, à qual imputam erros de julgamento, com as causas de nulidade do acórdão. As nulidades da decisão, previstas no artigo 615.º do CPC, são vícios intrínsecos da própria decisão, deficiências da estrutura da sentença que não podem confundir-se com o erro de julgamento que se traduz antes numa desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjetivo) aplicável. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>I - Nulidade do acórdão</font></b><br>
<b><font> 1.1. </font></b><i><font>Nulidade por falta de fundamentação, de facto e de direito</font></i>
</p><p><b><font> </font></b><font>A nulidade em razão da falta de fundamentação, de facto e de direito, está relacionada com o comando que impõe ao juiz o dever de fundamentar as suas decisões, discriminando os factos que considera provados, e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes. </font>
</p><p><font> O dever de fundamentar as decisões (artigo 154.º do CPC) impõe-se por razões de </font><i><font>ordem substancial</font></i><font> – cabe ao juiz demonstrar que soube extrair da norma geral e abstrata a disciplina ajustada ao caso concreto – e de </font><i><font>ordem prática</font></i><font>, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão a fim de, podendo, a impugnar.</font>
</p><p><font> Só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade – integra a previsão da al. </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de junho de 2016, processo n.º 781/11.6TBMTJ.L1.S1).</font>
</p><p><font> Ora, a decisão reclamada não padece deste vício. A sua fundamentação é, como exige a lei e a Constituição, completa, clara e rigorosa, enunciando os factos, bem como expondo a interpretação das normas aplicáveis, de acordo com os critérios hermenêuticos da teoria do direito, sem a violação de qualquer princípio ou cânone argumentativo, e esclarecendo de forma clara o caminho adotado na fixação do sentido da norma e os motivos da construção jurídica a que procedeu.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Pelo que, não se verifica a nulidade do acórdão recorrido prevista na alínea </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> 1.2. </font></b><i><font>Nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, ou por ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível</font></i><br>
<b><font> </font></b><font> </font>
</p><p><font> </font><b><i><font>a)</font></i></b><font> Esta causa de nulidade remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença. Não está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, o que sucede quando a decisão proferida seguiu um caminho diverso daquele que era indicado pelos seus fundamentos. </font>
</p><p><font> A contradição a que a lei impõe o efeito da nulidade é a oposição entre os fundamentos e a decisão – artigo 615.º, nº 1, al. </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC. Só ocorrerá nulidade do acórdão, por contradição entre os seus fundamentos e a decisão, quando os fundamentos invocados conduziriam não ao resultado expresso no dispositivo da decisão, mas a um resultado oposto, ou seja, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma conclusão oposta à que, logicamente, deveria ter extraído. </font>
</p><p><font> Para que tal ocorra, não basta uma qualquer divergência inferida entre os factos provados e a solução jurídica, pois tal divergência consubstanciaria, a existir, um mero erro de julgamento (</font><i><font>error in judicando</font></i><font>), sem a gravidade de uma nulidade do acórdão. Na verdade, o que as reclamantes invocam é um erro de interpretação de uma norma jurídica, o artigo 149.º do CC, o que nunca seria suscetível de gerar qualquer vício de nulidade do acórdão. Como escreve Amâncio Ferreira «a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento» (Amâncio Ferreira, </font><i><font>Manual de Recursos em Processo Civil</font></i><font>, 9ª edição, p. 56). </font>
</p><p><font> A contradição entre os fundamentos e a decisão prevista na alínea </font><i><font>c)</font></i><font> do nº 1 do artigo 615.º do CPC, ainda nas palavras do citado autor, verifica-se quando «a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo Juiz </font><u><font>conduziriam necessariamente</font></u><font> a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente» (</font><i><font>ibidem, </font></i><font>sendo nosso o sublinhado). </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Conforme afirma a jurisprudência: </font>
</p><p><font>«Há contradição entre os fundamentos e a decisão, quando estes dois aspectos cruciais da sentença, na sua sustentação, enfermam de um vício lógico insanável, através do qual se evidencie que a concreta fundamentação utilizada pelo julgador, s | [0 0 0 ... 0 0 0] |
RjJou4YBgYBz1XKvhQMk | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><br>
<b><font> </font></b><div><br>
<i><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></i></div><br>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>1. AA</font></b><font> e </font><b><font>Reaching Time Unipessoal, Lda.</font></b><font> intentam ação declarativa de anulação de deliberações de assembleia de condóminos contra </font><b><font>BB </font></b><font>e </font><b><font>CC</font></b><font>, formulando os seguintes pedidos: a anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 12.2.2019 do prédio sito na Rua ……….., constante da Ata n° …., que aprovou a proposta de substituição do elevador do prédio de acordo com a proposta da empresa </font><i><font>Easylift </font></i><font>a anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 12.2.2019, do prédio sito na Rua …….., que aprovou o orçamento e proposta de trabalhos da empresa João Luís Cunha Durão com a pintura geral de paredes e tetos do vão de escada com as demãos necessárias na cor a definir.</font>
</p><p><font> Os Réus contestaram, arguindo a exceção dilatória da falta de legitimidade passiva dos Réus e por impugnação, concluindo pela improcedência da ação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Em 18.10.2019, foi proferido saneador-sentença que julgou existir a exceção dilatória da ilegitimidade passiva dos Réus, mas que, ao abrigo do artigo 278°, n°3, do Código de Processo Civil (CPC), conheceu de mérito, com o seguinte dispositivo:</font>
</p><p><font>«Termos em que, face ao exposto, julgo a presente acção interposta por AA e Reaching Time Unipessoal, Lda. contra BB e CC, improcedente, e, em consequência, não se decreta nem a nulidade, nem a anulação, das deliberações tomadas na assembleia de condóminos do dia 12.2.2019, referentes à aprovação da substituição do elevador do prédio id. nos autos de acordo com a proposta da empresa Easylfit e do orçamento e proposta de trabalhos da empresa JOÃO LUÍS CUNHA DURÃO para pintura geral de paredes e tectos do vão de escada com as demãos necessárias na cor a definir.»</font>
</p><p>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Não se conformando com a decisão, dela apelaram os requerentes, tendo o Tribunal da Relação ……… proferido acórdão, com um voto de vencido, que julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença do tribunal de 1.ª instância. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Novamente inconformados, os autores interpõem recurso de revista, em que formulam as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><font>«I. O presente recurso de revista vem interposto do acórdão que tendo julgado improcedente a apelação, confirmou a sentença recorrida que não anulou as deliberações impugnadas pelas Autoras.</font><br>
</p><p><font>II. O voto de vencido vertido no acórdão recorrido espelha, integralmente, o entendimento das Recorrentes – quer quanto à questão da legitimidade processual, quer quanto à questão de fundo, referente à legalidade da deliberação impugnada.</font><br>
</p><p><font>III. Não há dúvidas de que o tema da legitimidade passiva nas acções de anulação de deliberação da assembleia de condóminos tem ocupado a jurisprudência e a doutrina, mas não se crê que a solução a acolher seja a perfilhada pelo Tribunal a quo.</font><br>
</p><p><font>IV. A letra da lei, tanto no art. 1433.º, n.º 6, do CC, como no art. 383.º, n.º 2, do CPC de 2013 é muito clara, não deixando margem para qualquer dúvida interpretativa.</font><br>
</p><p><font>V. O nº 6 do artigo 1433º do código Civil é decisivo no afastar da legitimidade do próprio condomínio, e no afirmar da legitimidade dos condóminos, apenas suscitando, eventualmente, dúvidas quanto a saber quais os condóminos contra quem a acção deve ser proposta: “A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.”</font><br>
</p><p><font>VI. Quando um condómino intenta uma ação para impugnação de uma deliberação da assembleia de condóminos está fundamentalmente em litígio com o(s) outro(s) condómino(s), como a prática bem demonstra e como é o caso dos autos.</font><br>
</p><p><font>VII. Na falta de uma norma que contenha uma indicação em contrário, por exemplo como a que consta do art. 60.º do CSC (nos termos da qual "Tanto a acção de declaração de nulidade como a de anulação são propostas contra a sociedade") ou de alteração legislativa clarificadora, não existe motivo para reconhecer legitimidade processual passiva ao condomínio.</font><br>
</p><p><font>VIII. Sendo jurisprudência do nosso Supremo Tribunal de Justiça que as acções para anulação de deliberações tomadas em sede de assembleias de condóminos devem ser intentadas contra os condóminos que as votaram favoravelmente.</font><br>
</p><p><font>IX. No caso dos autos as Recorrentes intentaram a acção prevista em tal normativo contra os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação que visavam impugnar e requereram, em sede de petição inicial, “a Administração do Condomínio nos termos do nº 6 do artigo 1433º do CC, na pessoa do Administrador do Condomínio, o Sr. Arquitecto EE, com domicílio profissional na Rua ……. na senda do que tem sindo a ver decidido pela jurisprudência, ou, se assim não se entender, o Senhor Administrador do Condomínio e, ainda, os condóminos ora Réus na presente acção.” </font><br>
</p><p><font>X. Pelo que deveria a excepção dilatória invocada pelos Réus, ora Recorridos, ter sido conhecida e julgada improcedente.</font><br>
</p><p><font>XI. Por outro lado, e quanto à questão de saber se houve violação do artº 1425º do CC e se as obras aprovadas através de deliberação por maioria simples correspondem a inovações que deveriam ser aprovadas por maioria de 2/3, entende-se que mal andou o Tribunal a quo ao concluir pela inexistência de inovação.</font><br>
</p><p><font>XII. Nos termos do nº 1 do artigo 1425º do Código Civil, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.</font><br>
</p><p><font>XIII. “Inovar” é nada mais, nada menos, do que “criar”, “fazer algo de novo”, “trazer algo de novo” àquilo que está. Obras inovadoras serão, portanto, aquelas que trazem algo de novo ao que está, algo de “criativo”, introduzindo uma “novidade”, ou seja, algo diferente daquilo que está. São aquelas que alteram a edificação no seu estado original.”</font><br>
</p><p><font>XIV. Nos autos está em causa a substituição integral de um elevador, clássico, com porta de correr, por uma plataforma vertical com cilindro hidráulico, com a consequente relocalização do motor do elevador de um piso superior para o rés-do-chão. </font><br>
</p><p><font>XV. A referida obra representa uma inovação, no sentido do conceito tal como tem vindo a ser construído pela jurisprudência, pelo que tinha de ser aprovada através de maioria correspondente a 2/3 do valor total do prédio.</font><br>
</p><p><font>XVI. Veja-se que a obra ilegalmente deliberada por maioria simples constitui uma inovação quer porque traduz a introdução no prédio de um elevador, com características completamente distintas do elevador existente, mudança que do ponto de vista estético é radical, quer porque a obra comportou uma mudança de local do motor igualmente, uma inovação que altera a edificação relativamente à situação actual: a incorporação no edifício, em local distinto, do motor de elevador, importa a introdução numa parte comum, o r/c do prédio dos autos, de uma volumetria que antes não existia, modificando espaços comuns.</font><br>
</p><p><font>XVII. A introdução de um elevador, com características estéticas completamente distintas do elevador existente, contende com arranjo estético do edifício, consubstanciando inovação para os efeitos do disposto no artigo 1425º, exigindo, assim, a sua deliberação uma aprovação por maioria de dois terços do valor total do prédio, o que não sucedeu.</font><br>
</p><p><font>XVIII. A aprovação de tal obra por maioria simples fere a deliberação em causa de nulidade nos termos do nº 1 e 4, segunda parte, do artigo 1433º do Código Civil – “se os condóminos tomarem deliberações de conteúdo contrário a normas imperativas, a sanção aplicável não pode deixar de ser a nulidade”.</font><br>
</p><p><font>XIX. O entendimento do Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> vertido no acórdão recorrido resulta de uma incorrecta interpretação dos artigos 1433º nºs 1 e 6 e 1425º do Código Civil.</font><br>
</p><p><font> XX. Uma interpretação correcta do disposto naqueles preceitos impunha que o Tribunal conhecesse da excepção dilatória e a julgasse improcedente e que considerasse procedente o pedido das Autoras em relação à anulação da deliberação referente à substituição do elevador, revogando a sentença recorrida.</font><br>
</p><p><font>XXI. Tendo o acórdão sob recurso feito uma incorrecta interpretação do disposto nos artigos 1433º nºs 1 e 6 e 1425º do Código Civil, deve o mesmo ser revogado e substituído por outro que julgue procedentes o pedido formulado pelas Autoras, ora Recorrentes, no sentido de declarar nula a deliberação que determinou a substituição do elevador e relocalização do motor e que conhece da excepção dilatória invocada pelos Réus e a julgue improcedente.</font><br>
</p><p><font> Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e o acórdão em crise revogado, substituindo-se por outro que i) conheça da excepção dilatória invocada pelos Réus, ora Recorridos, e a julgue totalmente improcedente ii) declare nula a deliberação de substituição do elevador do prédio objecto dos autos e relocalização do motor do mesmo, aprovada por maioria simples, em manifesta violação do disposto no nº 1 do artigo 1425º do Código Civil».</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><b><font>5.</font></b><font> Os réus apresentaram contra-alegações, que aqui se consideram integralmente transcritas, nas quais pugnaram pela manutenção do decidido.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>6. </font></b><font>Sabido que o objeto do recurso, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, se delimita pelas conclusões, as questões a decidir são as seguintes:</font><br>
</p><p><font>I – </font><i><font>Legitimidade passiva da ação de anulação de deliberação proferida em assembleia de condóminos</font></i><font>: isto é, saber se detêm esta legitimidade os condóminos, que aprovaram a deliberação, ou se essa legitimidade cabe ao próprio condomínio, ainda que em ambos os casos representados pelo administrador.</font>
</p><p><font>II – Saber se a substituição integral do atual elevador e relocalização do motor existente no 4° piso para o Rés do Chão constitui obra de inovação, carecendo a deliberação de maioria de 2/3 do valor total do prédio, nos termos do artigo 1425.°, n.° 1, do Código Civil. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> Cumpre apreciar e decidir. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>A – Os factos</font></b><br>
</p><p><font>As instâncias consideraram como provada a seguinte factualidade:</font>
</p><p><font>1 - Autoras e Réus são os únicos condóminos do prédio sujeito ao regime da propriedade horizontal sito na Rua ……, em ……, composto por 5 fracções (A , B, C, D e E).</font>
</p><p><font>2 - A Autora AA é proprietária das Fracções C e D do identificado prédio.</font>
</p><p><font>3 - A Autora Reaching Time é proprietária da fracção B do mesmo prédio.</font>
</p><p><font>4 - Os Réus BB e CC são proprietários das Fracções A e E do prédio em causa.</font>
</p><p><font>5 - Às fracções A e E , propriedade dos Réus, corresponde a permilagem de 600 (100+500), e o remanescente (400) às Autoras, proprietárias das Fracções B, C, e D.</font>
</p><p><font>6 - No dia 12 de Fevereiro de 2019, realizou-se uma Assembleia Geral Extraordinária de Condomínio do identificado prédio, com a seguinte ordem de trabalhos:</font>
</p><p><b><font> 1. </font></b><font>Votação de todos os trabalhos e orçamentos apresentados na Assembleia Geral n°25:</font>
</p><p><font> Ponto um: Renovação do elevador</font>
</p><p><font> Ponto dois: Renovação e recuperação do hall de entrada e escada edifício </font>
</p><p><font> Ponto três: Nova porta de entrada para albergar 4 entradas de correio</font>
</p><p><font>2. Apresentação de orçamento para restauro dos terraços do piso 5.</font>
</p><p><font>3. Limpeza da fachada principal do edifício.</font>
</p><p><font>4. Discussão sobre alterações efectuadas à fachada do prédio desde 2015</font>
</p><p><font>5. Apresentação de Relatório técnico sobre o estado do edifício.</font>
</p><p><font>6. Apresentação das contas de 2019</font>
</p><p><font>7. Determinação de provisões/orçamento de condomínio para o ano de 2019</font>
</p><p><font>8. Recondução da Administração do condomínio, conforme Convocatória junta como doc.7 com a p.i.</font>
</p><p><b><font>7 -</font></b><font> Como consta da Acta da referida Assembleia, as Autoras fizeram-se representar por DD (marido da Autora AA) e os Réus fizeram-se representar pelo seu mandatário, Dr. FF. - cfr. Acta n° 26 junta como doc.8 com a p.i..</font>
</p><p><b><font>8 -</font></b><font> No n° 1 da ordem de trabalhos, concretamente nos pontos um (renovação do elevador) e dois (renovação e recuperação do hall de entrada e escada edifício) do referido número 1, consta:</font>
</p><p><font>"Tomou a palavra o Dr. DD, apresentando uma consulta feita à empresa Thyssen Group, empresa essa que apresentou proposta, que segundo o Dr. DD, responde e corrige os pontos levantados no relatório efectuado em 2015, bem como é uma solução mais económica.</font>
</p><p><font>Tomando a palavra o Dr. FF, referiu que existindo uma proposta que resolve o problema fundamental de retirar a casa das máquinas do interior do apartamento do casal BB e CC, deverá esta ser esta objeto de aprovação no esteio do que foi também o parecer da empresa easylift, que fica em anexo.</font>
</p><p><font>Referiu ainda o Dr. DD, que tal ponto não é referido no relatório de inspeção efetuado pela BUREU VERITAS RINAVE em 2015. Sendo que a nova proposta da Thyssen responde a todos os pontos e problemas levantados no relatório supra citado."</font>
</p><p><b><font>9 -</font></b><font> Na sequência destas intervenções, e como resulta da acta, foi posto à votação o orçamento e proposta de trabalhos da empresa Easylift (apresentado pelos Réus), e foi a mesma "aprovada pelo condómino das "A" e "E" que representam uma permilagem de 600/1000, e não aprovada pelo condómino das fracções "B", "C" e "D" que representa uma permilagem de 400/1000."</font>
</p><p><b><font>10 -</font></b><font> Foi deliberada a renovação do elevador do prédio de acordo com a proposta da empresa Easylift, de 23.07.2018 com a ref. N° IN18 0132.2 PR, proposta apresentada pelos Réus e que já havia sido anexa à Acta n° 25 correspondente a Assembleia de Condóminos realizada a 22 de Novembro de 2018, cuja cópia foi junta como doc.8 com a p.i.</font>
</p><p><b><font>11 -</font></b><font> A Deliberação referida em 10- , como decorre da leitura da acta, foi aprovada por maioria simples, uma vez que contou apenas com os votos favoráveis dos Réus (a quem corresponde a permilagem de 600)</font>
</p><p><b><font>12 -</font></b><font> Na Acta n° 25, em que constituiu igualmente ponto da ordem de trabalhos "a renovação do elevador", e a que foi anexa a proposta aprovada na Assembleia objecto dos autos (e que dá origem à acta n° 26) lê-se:</font>
</p><p><font>"Tomou a palavra BB, que apresentou uma proposta de renovação do elevador pela empresa denominada Easylift Engenharia e Projectos limitada, com o valor de € 22.232,00, que implica a substituição integral do actual elevador, com a relocalização do motor existente no 4° piso para o rés-do-chão da fracção A.</font>
</p><p><font>Ficou acordado que devido ao caracter técnico da proposta, a mesma exige uma análise detalhada por parte de todos os condóminos, tendo ficado acordado que este ponto seria novamente discutido em assembleia-geral a ter lugar em Fevereiro."</font>
</p><p><b><font>13 -</font></b><font> Na mesma acta e quanto à pintura das paredes do prédio, lê-se o seguinte:</font>
</p><p><font>Em relação à pintura e barramento das paredes das escadas comuns do prédio, o Dr. DD referiu que nada tem a opor desde que mantenha todas as características, nomeadamente a cor e textura actual.</font>
</p><p><font>Tomou a palavra o Dr. FF, referindo que quanto a ele a proposta apresentada em nada altera a estética das paredes existentes.</font>
</p><p><font>Posto à votação o orçamento e proposta de trabalhos apresentado pela empresa Luis Cunha Durão, apresentado na Acta n° 25 de vinte e dois de novembro de 2108, foi a mesma aprovada pelo condómino das fracções "A" e "E" e representam uma permilagem de 600/1000, e não aprovada pelo condómino das fracções "B", "C" e "D" que representa uma permilagem 400/1000, por considerar que altera a estética e aspeto das paredes interiores."</font>
</p><p><b><font>14 -</font></b><font> Em anexo à referida acta n° 25, consta o orçamento da empresa "JOÃO LUIS CUNHA DURÃO - EMPREITEIRO DE CONSTRUÇÃO CIVIL", o qual se refere a pintura geral de paredes e tectos do vão de escada com as demãos necessárias na cor a definir."</font>
</p><p><font>Porque foi referido que a intenção era a de aplicar uma tinta com uma textura e cor diferente da existente, fez o representante das condóminas das fracções "B", "C" e "D", ora AA., questão que constasse em acta que "entende que a pintura da parede com alteração de cor e tipo de tinta constituem uma inovação, e como tal a sua aprovação exige uma maioria qualificada nos termos do n° 1 do art° 1425 do código civil o que não se verificou por quanto apenas existiu uma maioria simples".</font>
</p><p><b><font>15 -</font></b><font> Dá-se aqui por reproduzido o relatório de inspeção datado de 2.11.2015, relativo ao elevador do prédio id. nos autos, junto como doc.3 com a contestação, e bem assim o relatório técnico com proposta de aplicação de novo ascensor datado de 15.3.2016, junto como doc.5 com a contestação.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><b><font>B – O Direito</font></b><br>
</p><p><font>I. </font><i><font>Legitimidade passiva para a ação de anulação de deliberação de uma assembleia de condomínio</font></i><br>
</p><p><font> </font><b><font>1.</font></b><font> Defende o acórdão recorrido que </font><i><font>«A ação de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos deve ser intentada contra o condomínio, que será representado pelo seu administrador ou por quem a assembleia designar para esse efeito, e não contra os condóminos que aprovaram a deliberação».</font></i><br>
</p><p><font>Alegam os recorrentes, autores da presente ação, que tal entendimento é contrário à letra da lei e ao seu espírito, bem como à jurisprudência maioritária deste Supremo Tribunal de Justiça. Os recorrentes fundamentam a sua tese no artigo 1433.º, n.º 6, do Código Civil, segundo o qual «</font><i><font>A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as ações compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito», </font></i><font>defendendo</font><i><font> </font></i><font>a legitimidade passiva dos condóminos que votaram positivamente a deliberação impugnada, muito embora representados judiciariamente pelo administrador, na pessoa do qual são citados. Citam jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, de 2006, 2007 e 2008, segundo a qual a ação de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos tem de ser interposta contra os condóminos que as votaram, que naquela devem figurar como réus, embora representados em juízo pelo administrador, que é quem deve ser citado. A ideia base que subjaz a esta orientação é a de que a questão da legitimidade não respeita diretamente ao condomínio, mas envolve antes os próprios condóminos, enquanto membros do órgão deliberativo que é a assembleia de condóminos. Nesta perspetiva, a questão da impugnação das deliberações seria um litígio entre condóminos (os que votaram contra e os que votaram a favor), sendo neles que radica a legitimidade para impugnar e para defender a deliberação. No mesmo sentido, invocam também a letra do artigo 383.º, n.º 2, do CPC/2013, concluindo que não há margem para qualquer dúvida interpretativa que justifique uma interpretação corretiva e que na falta de uma norma que contenha uma indicação em contrário, como a que consta do artigo 60.º do CSC (nos termos da qual "Tanto a ação de declaração de nulidade como a de anulação são propostas contra a sociedade"), não existe motivo para reconhecer ao condomínio qualquer legitimidade passiva.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Esta questão tem dividido a jurisprudência, quer nas Relações, quer no Supremo Tribunal de Justiça. Em defesa da tese da ilegitimidade passiva dos condóminos, foi proferido um recente acórdão desta Secção, de 04-05-2021 (proc. n.º 3107/19.7T8BRG.G1.S1), em cujo sumário se estipulou que </font><i><font>«A acção de anulação de deliberação da assembleia de condóminos deve ser instaurada contra o condomínio, por só ele ter legitimidade passiva, embora representado pelo respectivo administrador</font></i><font>». </font><br>
</p><p><font>Os fundamentos da decisão, após uma vasta exposição jurisprudencial e doutrinal, foram os seguintes:</font><br>
</p><p><font> «O art.º 12.º, al. e), do actual CPC, reproduzindo o art.º 6.º do CPC de 1961, na versão proveniente da revisão de 1995/96 [15], atribui personalidade judiciária ao “condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”.</font><br>
</p><p><font>Esta disposição legal remete para o art.º 1437.º do Código Civil, que prevê especificamente a “legitimidade do administrador” para agir em juízo activa e passivamente, nalguns casos, e também para o art.º 1436.º do mesmo Código que discrimina as diversas funções que competem ao administrador, nas quais se inclui a execução das deliberações da assembleia [alínea h)].</font><br>
</p><p><font>Por sua vez, o art.º 1433.º, n.º 6, do Código Civil prevê que “a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as ações compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para o efeito”.</font><br>
</p><p><font>A deliberação de condóminos é a forma por que se exprime a vontade da assembleia de condóminos (art.ºs 1431.º e 1432.º, ambos do Código Civil), órgão deliberativo a quem compete a administração das partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal (art.º 1430.º, n.º 1, do Código Civil), sendo o administrador o órgão executivo da administração (art.ºs 1435.º a 1438.º, todos do Código Civil).</font><br>
</p><p><font>Como bem se refere no acórdão da Relação do Porto, de 13/2/2017, proferido no processo n.º 232/16.0T8MTS.P1 [16], parcialmente transcrito no acórdão deste Supremo, de 24/11/2020, já citado:</font><br>
</p><p><font>“Se a deliberação exprime a vontade da assembleia de condóminos, estruturalmente percebe-se que seja essa entidade, porque vinculada pela deliberação, a demandada em ação em que se questione a existência, a validade ou a eficácia de uma sua qualquer deliberação.</font><br>
</p><p><font>Por outro lado, mal se percebe que os condóminos, pessoas singulares ou coletivas, dotados de personalidade jurídica, careçam de ser representados judiciariamente pelo administrador do condomínio. De facto, a representação judiciária apenas se justifica relativamente a pessoas singulares desprovidas total ou parcialmente de capacidade judiciária ou relativamente a entidades coletivas, nos termos que a lei ou respetivos estatutos dispuserem, ou ainda relativamente aos casos em que as pessoas coletivas ou singulares se venham a achar numa situação de privação dos poderes de administração e disposição dos seus bens por efeito da declaração de insolvência”.</font><br>
</p><p><font>Por isso, entende-se que, quando no n.º 6 do art.º 1433º do Código Civil se faz referência aos condóminos, o legislador incorreu nalguma incorreção de expressão, dizendo menos do que queria, pois parece ter tido em mira uma entidade colectiva - a assembleia de condóminos -, o condomínio vinculado pelas deliberações impugnadas e cuja execução compete ao administrador, como já se viu.</font><br>
</p><p><font>Se ao administrador compete executar as deliberações da assembleia de condóminos, nos termos do art.º 1436.º, al. h), do Código Civil), por igualdade de razão, cumpre-lhe sustentar a existência, a validade e a eficácia dessas mesmas deliberações, em representação do condomínio.</font><br>
</p><p><font>Concluímos, assim, com o devido respeito por outros entendimentos, que a legitimidade passiva na ação de impugnação de deliberação da assembleia de condóminos, compete ao condomínio, representado pelo administrador.</font><br>
</p><p><font>Esta solução, como refere Miguel Mesquita [17], é a que permite um exercício mais ágil do direito de ação, pois que os “pressupostos processuais não devem servir para complicar, desnecessariamente, o conhecimento do pedido e a resolução dos litígios, finalidades precípuas do processo civil.” </font><br>
</p><p><font>Com ela afastam-se problemas que resultariam da obrigatoriedade de demandar, em litisconsórcio necessário, os condóminos que votaram a favor da deliberação inválida, seja pelo elevado número de condóminos de certos edifícios, seja pela impossibilidade prática, na esmagadora maioria das vezes, de proceder à sua identificação, como sucede no caso dos autos, na versão apresentada pela recorrente.</font><br>
</p><p><font>A citação do administrador não evitaria esse problema, porquanto se trata de apurar a legitimidade passiva para a acção, ou seja, quem devia ser demandado e não quem os representa, sendo que, na tese que sustentamos, também o administrador representa o condomínio. Trata-se de saber quem deve figurar como parte, do lado passivo, e não o seu representante, questões distintas, como é evidente.</font><br>
</p><p><font>Atento o pedido formulado – de anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 4/4/2019 – de acordo com a tese que sustentamos, cremos não haver dúvidas de que a legitimidade passiva é do condomínio, ainda que representado pelo seu administrador».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Neste acórdão citam-se outras decisões deste Supremo Tribunal, no mesmo sentido, de 2005, 2006 e de 2007, bem como outros mais recentes, cujo sumário agora se transcreve:</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>- </font><b><font>Acórdão de 25/9/2012, revista n.º 3592/09.5TBPTM.E1.S1- 6.ª Secção</font></b><font>, com o seguinte sumário:</font><br>
</p><p><font>“I - O condomínio é um ente colectivo, constituído pelo conjunto dos condóminos, que manifesta a sua vontade através das deliberações da assembleia dos condóminos e do respectivo administrador – arts. 1430.º, n.º 1, 1432.º, 1435.º e 1436.º do CC.</font><br>
</p><p><font>II - As deliberações impugnadas da assembleia dos condóminos não são pessoais de cada condómino, mas do condomínio, como ente colectivo, que as aprovou em assembleia convocada para o efeito, nos termos legais e regulamentares.</font><br>
</p><p><font>III - Numa acção de impugnação de deliberações da assembleia dos condóminos o condomínio pode estar em juízo, representado pelo respectivo administrador.”</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>- </font><b><font>Acórdão de 24/11/2020 (Revista n.º 23992/18.9T8LSB.L1.S1 – 6.ª Secção),</font></b><font> com o seguinte sumário:</font><br>
</p><p><font>“I – O condomínio é um ente colectivo, constituído pelo conjunto dos condóminos, que manifesta a sua vontade através das deliberações da assembleia dos condóminos.</font><br>
</p><p><font>II – A deliberação tomada pela assembleia de condóminos exprime a vontade do condomínio, do grupo, e não dos condóminos individualmente considerados, designadamente dos que a aprovaram.</font><br>
</p><p><font>III – A própria essência de uma deliberação constitui um conteúdo autonomizado da vontade dos sujeitos individuais que nela intervieram e para ela contribuíram, configurando-se não como uma soma das vontades singulares, mas como uma realidade autónoma e distinta.</font><br>
</p><p><font>IV – Na acção de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos, a legitimidade passiva pertence ao condomínio, representado pelo respectivo administrador”.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> Estamos perante uma questão de direito que não conhece uma resposta única, sendo possível esgrimir argumentos com racionalidade e pertinência a favor de qualquer uma das teses em confronto. Todavia, neste Supremo Tribunal, designadamente, nesta secção, está a desenhar-se uma tendência para aderir à tese de que a legitimidade passiva cabe ao condomínio. Na verdade, sendo um dos valores primordiais do processo civil a celeridade, tem que se ponderar que a citação individual de cada um dos condóminos, que aprovou a deliberação, nos prédios constituídos em propriedade horizontal com muitos moradores, acentua a morosidade da justiça e dificulta a tramitação do processo. A circunstância de o prédio do presente caso não ter estas caraterísticas, devido ao reduzido número de condóminos, não invalida que deva prevalecer a tese mais prática para a celeridade dos processos. As orientações jurisprudenciais devem revestir-se de generalidade e abstração, não sendo adequado à segurança jurídica que haja divisões consoante a dimensão da propriedade horizontal.</font><br>
</p><p><font> Assim, subscreve-se a tese do acórdão de 4 de maio de 2021 proferido pela 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, e decide-se que a legitimidade para a presente ação cabe ao condomínio representado pelo Administrador.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>II – </font><i><font>Substituição do elevador como inovação a exigir maioria de 2/3 nos termos do artigo 1425.º, n.º 1, do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><font> </font><b><font>3.</font></b><font> Entendem os recorrentes, a este propósito, que a introdução no prédio de um elevador, com características completamente distintas do elevador existente, representa uma mudança radical do ponto de vista estético e modifica espaços comuns, na medida em que comporta uma mudança de local do motor do elevador do 4.º andar para o rés do chão.</font><br>
</p><p><font> Vejamos:</font><br>
</p><p><font> De acordo com o relatório técnico referido no facto provado 15, </font><i><font>«O ascensor existente foi instalado ao abrigo do regulamento de 1936, encontra-se desatualizado em termos de segurança e tecnologia, apresente evidências de desgaste elevado, consistente com a sua idade, e não está em condições de funcionar, conforme consta no relatório da inspeção. / O ascensor possui acessos diretos aos apartamentos dos pisos superiores, situação que não foi registada no relatório de inspeção, mas que é necessário resolver nos termos da circular 3/2010/DSE-EL.»</font></i>
</p><p><font> Nos termos do artigo 1422°, n° 2, al. </font><i><font>a),</font></i><font> do Código Civil, é vedado aos condóminos prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício. E, nos termos do n°3, as obras que modifiquem a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver a prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio. Por sua vez, o artigo 1425°, n° 1, do Código Civil, dispõe que </font><i><font>«Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que</font></i><font> </font><i><font>constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.» E no n°7 dispõe-se que «Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos tanto das coisas próprias como das coisas comuns.»</font></i>
</p>< | [0 0 0 ... 0 0 0] |
SjFau4YBgYBz1XKvFfkL | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<font>Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, S.A.</font></b><font>, Ré/Recorrida nestes autos de ação popular, intentados por </font><b><font>AA</font></b><font> e </font><b><font>BB</font></b><font>, tendo sido notificada do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 02-02-2022, proferido no âmbito do recurso </font><i><font>per saltum</font></i><font> interposto por estes últimos da decisão proferida pelo tribunal de primeira instância, veio, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 616.º, aplicável </font><i><font>ex vi</font></i><font> artigo 666.º e artigo 685.º do Código de Processo Civil (CPC), requerer a reforma do Acórdão, formulando as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><font>«1. É manifesto que, nos presentes autos, a situação de facto que constitui a causa de pedir não diz respeito à ativação de qualquer serviço adicional,</font><br>
</p><p><font>2. mas antes e tão só, à activação de pacotes de dados móveis, nos casos em que o cliente esgota o</font><i><font> plafond</font></i><font> incluído na mensalidade base do tarifário contratado.</font><br>
</p><p><font>3. Constituindo a activação dos referidos pacotes de dados, uma característica central e própria do tarifário especificamente contratado</font><br>
</p><p><font>4. e decorrendo essa mesma característica, de forma clara, expressa e perceptível para qualquer consumidor médio, da informação pré-contratual fornecida pela Vodafone e que se provou ter sido do conhecimento e compreensão do Autor,</font><br>
</p><p><font>5. nenhum fundamento existe para sustentar a invalidade e/ou a nulidade das disposições contratuais do serviço de comunicações electrónicas contratado,</font><br>
</p><p><font>6. sob pena de manifesta violação dos mais basilares princípios da liberdade contratual e da liberdade económica,</font><br>
</p><p><font>7. princípios esses com dignidade constitucional.</font><br>
</p><p><font>8. Acresce que a declaração de nulidade da cláusula 2.ª, al. d), do ponto C. das Condições Gerais do Contrato de adesão ao serviço fixo e/ou serviço Móvel, em que o acórdão reformando fundamenta a decisão proferida, não contém qualquer previsão relativa à questão que constitui objecto do presente processo, nem tem por virtualidade impedir a manutenção da validade da relação contratual. </font><br>
</p><p><font>9. O princípio constitucional da liberdade económica, concretizada, na liberdade de configuração da oferta de serviços de comunicações electrónicas, é posta directamente em causa pela interpretação conferida, no acórdão reformando, ao alcance dos artigos 15.º e 16.º do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, interpretados e aplicados, no caso concreto, no sentido de considerar que o grau de informação e a prova do cumprimento do dever de informação do consumidor, é irrelevante na apreciação da legalidade do clausulado contratual e, bem assim, das informações pré-contratuais do concreto tarifário que foi objecto da acção, o que permitiria a qualquer cidadão desrespeitar as obrigações contratual, válida e esclarecidamente assumidas.</font><br>
</p><p><font>10. Da mesma forma, aceitar e defender que, independentemente do grau de informação prestada ao consumidor e ainda que se prove a total compreensão por parte deste das condições pré-contratuais que estão na base do negócio jurídico, livre e voluntariamente, celebrado, seria colocar em crise todo o instituto do direito das obrigações, com especial acuidade para o princípio geral da </font><i><font>pacta sunt servanda</font></i><font>, isto é, o princípio jurídico segundo o qual as partes devem respeitar os acordos celebrados, cumprindo as obrigações dos mesmos decorrentes, atribuindo-lhes a natureza de imperatividade na regulação das relações jurídicas daí resultantes,</font><br>
</p><p><font>11. sendo que, não pode deixar de sublinhar-se a dignidade constitucional da autonomia privada, que, compreensivelmente, irradia a concreta manifestação desta como liberdade contratual, igualmente colocada em crise pela interpretação perfilhada no acórdão reformando.</font><br>
</p><p><font>12. O acórdão reformando, consagra uma decisão Injusta e iníqua. Escorando-se num manifesto lapso, pretende, sem qualquer fundamento, beneficiar alguns consumidores em detrimento de outros, pois alguns clientes, independentemente do consumo de dados que tenham realizado, acabam por receber o serviço gratuitamente nada tendo a pagar (através do reembolso decorrente da condenação </font><i><font>sub judice</font></i><font>), enriquecendo à custa da Vodafone, sem qualquer limite ao volume de dados consumido e em completa desigualdade com outros consumidores que, por terem contratado um pacote de dados superior, pagam mais, mesmo consumindo menos dados.</font><br>
</p><p><font>13. A solução propugnada pelo acórdão reformando é, assim, claramente violadora da igualdade entre os diversos clientes/consumidores, sem que exista qualquer razão válida para tal e em total desrespeito dos mais elementares princípios gerais de Direito, alguns com consagração constitucional, nomeadamente o princípio da igualdade, da proporcionalidade e, como já antes se mencionou, da liberdade contratual.</font><br>
</p><p><font>14. Assim, é manifesto que o acórdão reformando incorre num erro grosseiro e patente quando decide conceder provimento ao recurso dos Autores.</font><br>
</p><p><font>15. A reforma da decisão </font><i><font>sub judice</font></i><font> é a única forma de evitar uma violação do direito fundamental da tutela jurisdicional efetiva e de repor a justiça material.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Nestes termos, e nos melhores do Direito aplicáveis, </font><br>
</p><p><font>deve o acórdão proferido ser reformado e, consequentemente, </font><br>
</p><p><font>ser julgado improcedente o recurso interposto pelos Autores,</font><br>
</p><p><font>pois que só se assim se permitirá que se faça a imposta e devida</font><br>
</p><p><font>JUSTIÇA!»</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2. CITIZENS' VOICE - CONSUMER ADVOCACY ASSOCIATION et al., </font></b><font>autores intervenientes e autores populares, recorrentes e ora reclamados, notificados da reclamação para reforma do acórdão apresentada pela </font><b><font>VODAFONE PORTUGAL – COMUNICAÇÕES PESSOAIS, S.A., </font></b><font>vêm, nos termos do artigo 3.º do CPC, invocar a extemporaneidade da reclamação apresentada pela Vodafone.</font><br>
</p><p><font>Em alternativa, para o caso de se considerar que a reclamação não é extemporânea, peticionam os reclamados que seja a reclamação considerada manifestamente improcedente, para o efeito do artigo 670.º, n.º 5, do CPC, e que a Vodafone seja condenada no pagamento de uma taxa sancionatória excecional, em conformidade com o artigo 531.º do CPC.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3. </font></b><font>Em 21-02-2022, </font><b><font>Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, S.A., </font></b><font>veio, na sequência da apresentação em juízo do pedido de reforma do acórdão proferido nos presentes autos, deduzir incidente de impedimento contra a ora Relatora, ao abrigo do disposto</font><b><font> </font></b><font>na alínea </font><i><font>c)</font></i><font> do artigo 115.º do CPC, o qual foi indeferido por acórdão datado de 13 de setembro de 2022.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4. </font></b><font>Em 23-02-2022, os autores populares apresentam requerimento em que pedem o pagamento de custas de parte, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 25.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), requerendo a junção aos autos da sua Nota discriminativa e Justificativa de Custas de Parte (Nota de Custas Parte). </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Em 03-03-2022, veio a Ré Vodafone apresentar novo requerimento, pugnando para que não lhe seja aplicável qualquer taxa sancionatória excecional, e defendendo que a sua reclamação não é extemporânea, pois a reclamante tem direito a beneficiar da solução legal que prevê que a notificação se considera feita ao terceiro dia e que mesmo que se considerasse feita no dia 4 de fevereiro sempre teria o direito de a apresentar nos termos do artigo 139.º, n.º 5, do CPC, após notificação pela secretaria.</font><br>
</p><p><font>Na mesma data, a Vodafone apresenta reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais, defendendo que o requerimento apresentado pelos Autores é manifestamente extemporâneo.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Os autores populares respondem à reclamação e peticionam que esta seja totalmente improcedente, e que se conclua pela condenação da ré, aqui reclamante, em sede de custas de parte nos precisos termos constantes da nota discriminativa apresentada pelos autores, cujo pagamento deverá ser efetuado logo que confirmado o trânsito em julgado da sentença proferida por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, seja essa na data de 17.02.2022 ou noutra posterior.</font><br>
</p><p><font>Requerem ainda que a Relatora ordene a notificação da aqui reclamante para vir a efetuar o pagamento da taxa devida acrescida de multa, nos termos do artigo 570, n.º 3, </font><i><font>ex vi</font></i><font> do artigo 145, n.º 3, do CPC.</font><br>
</p><p><font>Requerem também a condenação da aqui reclamante em custas pelo incidente e no demais legal.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>A esta resposta responde, por sua vez, a Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, S.A., alegando que a resposta ora apresentada pelos Autores é processualmente inadmissível, pois a lei não contempla um direito de contraditório face à reclamação prevista na norma do artigo 26.º-A n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, e requer que seja ordenado o desentranhamento do requerimento apresentado pelos Autores. </font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> São três as questões agora a decidir: </font><br>
</p><p><font> I – Reclamação da Vodafone contra o acórdão proferido a 2 de fevereiro de 2022;</font><br>
</p><p><font>II – Aplicação da taxa sancionatória à reclamante Vodafone;</font><br>
</p><p><font>III – Custas de parte peticionadas pelos reclamados e reclamação da Vodafone. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II - Fundamentação</font></b><font> </font><br>
</p><p><b><font>I - Reclamação apresentada pela Vodafone</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><i><font>Questão prévia da extemporaneidade da reclamação</font></i><br>
</p><p><font>Vieram os reclamados pugnar para que a presente reclamação não fosse conhecida invocando a sua extemporaneidade, sustentando que a presunção de notificação consagrada no artigo 248.º, </font><i><font>in fine,</font></i><font> do CPC, é uma presunção </font><i><font>juris tantum</font></i><font>, que, no caso concreto, tem de se considerar ilidida, pois que a reclamante Vodafone tem assumido perante vários dos seus clientes que foi notificada do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça na data de 04-02-2022 (cf. Documento 1 que se junta e aqui se dá por reproduzido), assim se demonstrando que a reclamante foi efetivamente notificada em 04-02-2022, como a própria o reconheceu aos seus clientes reclamantes, tendo, em consequência, o acórdão do Supremo transitado em 14-02-2002, sendo extemporânea a reclamação apresentada em 17-02-2022.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Vejamos.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Ora, apesar dos documentos apresentados pelos reclamados demonstrarem que alguns funcionários da Vodafone, que responderam a reclamações dos clientes, tiveram conhecimento efetivo do acórdão proferido em 2 de fevereiro, no dia 4 do mesmo mês, dia do envio da notificação às partes, não há razão para a Vodafone pessoa coletiva não beneficiar da regra geral de que a notificação se considera feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, nos termos do artigo 248.º, n.º 1, </font><i><font>in fine,</font></i><font> do CPC. Tem sido este o entendimento da jurisprudência, considerando que se trata de uma garantia processual que prevalece sobre o conhecimento efetivo da decisão. Neste sentido, vide, o acórdão deste Supremo Tribunal, de Justiça, de 19-01-2021 (proc. n.º 86/05.1TBRSD.P1.S1), onde se sumariou o seguinte:</font><br>
</p><p><font>«I - Para efeitos de determinação das datas da notificação electrónica, o legislador consagrou duas presunções: (i) a notificação por transmissão electrónica de dados presume-se feita na data da expedição e (ii) a expedição presume-se feita no terceiro dia posterior ao da elaboração da notificação ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o final do prazo termine em dia não útil.</font><br>
</p><p><font>II - O prazo para apresentação de alegações de recurso inicia-se na data em que se presuma feita a notificação por transmissão electrónica do despacho que o receba, ou seja, no terceiro dia posterior ao da elaboração da notificação ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o final do prazo termine em dia não útil.</font><br>
</p><p><font>III - Tendo tal notificação ocorrido em data anterior àquela em que se presume efectuada, nenhum efeito se pode extrair de tal ocorrência, não podendo a contraparte invocar, para efeito de encurtamento do prazo, o recebimento ocorrido em data anterior, como decorre do disposto no n.º 6 do art. 254.º do CPC, segundo o qual as presunções da notificação postal ou electrónica só podem ser ilididas pelo próprio mandatário notificado, provando que não foram efectuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis.</font><br>
</p><p><font>IV - Ou seja, a presunção de notificação pode ser ilidida, mas sempre para alargamento do prazo e nunca para redução do mesmo, pelo que a ilisão da presunção da notificação não poderá ser efectuada pelo critério da leitura da peça processual, não se encontrando, aliás, elencado tal desiderato no texto legal».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Em consequência, consultado o </font><i><font>citius</font></i><font>, certifica-se que a notificação eletrónica foi expedida no dia 4 de fevereiro e determina-se que o início da contagem do prazo dá-se no dia 8 de fevereiro, estando a Vodafone dentro do prazo quando apresenta a reclamação no dia 17 do mesmo mês. </font><br>
</p><p><font>Pelo que, indefere-se o pedido de extemporaneidade da reclamação apresentado pelos reclamados.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Passa-se a conhecer, pois, da reclamação. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2. </font></b><font>Na reclamação, a reclamante Vodafone veio pugnar pela reforma do acórdão reclamado, sustentando, em síntese, que: 1)</font><b><font> </font></b><font>a causa de pedir no presente processo não diz respeito à ativação de qualquer serviço adicional, mas apenas à ativação de pacotes de dados móveis; 2) a falta de fundamento para a invalidade e/ou a nulidade das disposições contratuais do serviço de comunicações eletrónicas contratado; 3) a inconstitucionalidade da decisão reclamada.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>3. </font></b><font>O direito aplicável é o seguinte:</font><br>
</p><p><font>O artigo 613º do Código de Processo Civil (doravante, CPC), sob a epígrafe (Extinção do poder jurisdicional e suas limitações), aplicável por força do disposto nos artigos 685º e 666º, preceitua o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>1. Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. É lícito, porém, ao juiz retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes.</font></i><br>
</p><p><font>A violação das normas processuais que disciplinam (artigos 607º a 609º do CPC) a elaboração da sentença ou do acórdão (artigos 663.º, n.º 2 e 679.º, ambos do CPC), enquanto ato processual, consubstancia vício formal ou </font><i><font>error in procedendo</font></i><font> e pode importar, designadamente, alguma das nulidades típicas previstas nas diversas alíneas do nº 1 do artigo 615º do CPC (aplicáveis aos acórdãos </font><i><font>ex vi</font></i><font> nº 1 do artigo 666º e artigo 679º do CPC). </font><br>
</p><p><font>Prescreve o artigo 616.º, n.º 2, do CPC (aplicável ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, por força do disposto nos artigos 685º e 666º do CPC) que:</font><br>
</p><p><i><font>Não cabendo recurso da decisão, é lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4. </font></b><font>Como tem sido entendimento da jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, o erro manifesto de julgamento das questões de direito pressupõe obviamente, para além do seu carácter evidente, patente e virtualmente incontroverso, que o juiz se não haja expressamente pronunciado sobre a questão a dirimir, analisando antes e fundamentando a (errónea) solução jurídica que acabou por adotar (v.g., aplicando ao caso uma norma indiscutivelmente revogada, por não se ter então apercebido dessa revogação) - </font><i><font>vide, </font></i><font>por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-06-2010, Incidente n.º 718/2001.S1).</font><br>
</p><p><font>Lapso manifesto será o erro grosseiro, um evidente engano, um desacerto total no regime jurídico aplicável ou na omissão ostensiva de observação dos elementos dos autos; enquanto manifesto, o referido lapso tem que ser evidente, patente e incontrovertível (Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 4-05-2010, proc. n.º 364/04.4TBPCV.C1.S1 e de 26-06-2014, proc. n.º 5928/04.6TBCSC.L1.S1). </font><br>
</p><p><font>Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-01-2022 (processo n.º1292/20.4TBFAR-A.E1.S1) e no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2-12-2021 (processo n.º9/21.0YFLSB), a reforma da decisão destina-se a corrigir um erro de julgamento resultante de um erro grosseiro, um evidente engano, um desacerto total no regime jurídico aplicável à situação ou na omissão ostensiva de observação dos elementos dos autos, não podendo ser usado para as partes manifestarem discordância do julgado ou tentarem demonstrar </font><i><font>“error in judicando”. </font></i><font>O erro de julgamento, sem lapso manifesto, não pode ser suprido em sede de reforma da decisão.</font><br>
</p><p><font>No mesmo sentido, se pronunciou o Acórdão deste Supremo Tribunal de 09-02-2021 (proc. N.º 359/10.1TVLSB.L1.S1), </font><i><font>«É consensual que, tendo a reforma da sentença como desiderato suprir os lapsos ou erros manifestos assinalados nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 616.º do CPC, não se destina a corrigir eventuais erros de julgamento ou a servir de veículo para o reclamante exprimir a sua discordância com a decisão ou defender a sua posição técnico-jurídica em relação às questões de direito resolvidas pelo Acórdão objeto do pedido de reforma».</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><b><font>5. </font></b><font>Analisado o teor da reclamação, cujas conclusões foram acima transcritas, verifica-se que a reclamante não invoca nulidades do Acórdão impugnado (artigo 615.º do CPC), nem qualquer erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos, que tenha ocorrido por manifesto lapso do juiz, nos termos da al. </font><i><font>a)</font></i><font> do n.º 2, do artigo 616.º do CPC, nem tão-pouco invoca documentos ou meios de prova plena que só por si implicassem necessariamente decisão diversa da proferida, conforme exigido na al.</font><i><font> b)</font></i><font> do n.º 2 do mesmo preceito. </font><br>
</p><p><font>O pedido de reforma do acórdão foi aqui utilizado para exprimir discordância em relação ao Acórdão reclamado, extravasando as hipóteses em que a lei prevê, excecionalmente, a intervenção do tribunal após ter sido proferida a decisão que dirimiu o conflito entre os recorrentes e a recorrida e se ter esgotado, portanto, o seu poder jurisdicional.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>6. </font></b><font>Quanto às pretensas questões de constitucionalidade suscitadas, o Supremo Tribunal de Justiça vem tendo o entendimento que </font><i><font>“no incidente decorrente da aplicação dos arts. 615.º e 616.º do CPC, ex vi dos arts. 666.º e 685.º do CPC, não cabe a discussão de inconstitucionalidades, assente na discordância em relação às interpretações do Tribunal e visando, em consequência, obter uma decisão favorável ao recorrente”. </font></i><font>(Acórdão de 28/09/2021, processo n.º249/18.0YHLSB.L1.S1).</font><br>
</p><p><font>Já no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 09-07-2015 (processo n.º3820/07.1TVLSB.L2.S1), se havia decidido que </font><i><font>“não quadra no expediente processual previsto nos arts.616.º e 685.º, ambos do NCPC, a alegação da inconstitucionalidade material da interpretação dada no acórdão reclamado a determinada norma jurídica, visando obter uma nova decisão favorável ao requerente”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Esta tem sido a orientação do Tribunal Constitucional relativamente aos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade, pelo menos desde o Acórdão de 3 de junho de 1998 (publicado no DR, II série, de 20 de julho de 1998) havia afirma que </font><i><font>“A eventual aplicação de uma norma inconstitucional não configura (ressalvada alguma hipótese anómala e excepcional, como seja a da inexistência jurídica da norma) uma situação de manifesto lapso do juiz na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos”.</font></i><br>
</p><p><font>Acresce que as supostas questões de constitucionalidade agora suscitadas não respeitam os requisitos que o Tribunal Constitucional exige para admitir um recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, pois não foram suscitadas previamente e de modo processualmente adequado durante o processo, não constituindo a reclamação para a Conferência o momento para colocar questões de constitucionalidade que não foram discutidas durante o processo. Pelo que, também por este motivo, não está agora o Supremo Tribunal de Justiça vinculado a conhecê-las (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> Em conclusão, não se verifica qualquer fundamento para a reforma da decisão, porquanto não se verifica qualquer lapso, e muito menos, lapso manifesto, tendo este Supremo Tribunal aplicado as normas jurídicas que entendeu pertinentes, e tendo-as analisado e interpretado de acordo com adequados cânones hermenêuticos. </font><br>
</p><p><font>Da análise do requerimento da Reclamante resulta, pois, que esta não fundamentou a sua pretensão na violação de qualquer das circunstâncias que permitam que se declare a nulidade do Acórdão ou a reforma do mesmo, mas somente na discordância do julgado e para colocar em discussão supostas questões de constitucionalidade de interpretações normativas que não havia efetuado no momento oportuno.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>8. </font></b><font>Pelo exposto, indefere-se a reclamação.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Da taxa sancionatório excecional</font></b><br>
</p><p><b><font>9. </font></b><font>Requereram os reclamados que fosse aplicada à reclamante uma taxa sancionatória especial.</font><br>
</p><p><font>Tem sido entendimento deste Supremo que, desde que o instrumento de impugnação utilizado esteja previsto na lei e seja habitual na prática judiciária, não há lugar à aplicação desta taxa, reservada para o recurso a instrumentos anómalos e patológicos, fora do desenrolar normal do processo, conforme se decidiu nos Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 18-01-2022 (proc. N.º 2600/17.0T8LSB-B.L1.S1) e de 07-06-2022 (proc. N.º 922/15.4T8PTM.E1.S1), mas não já na mera reclamação para a Conferência ainda que indeferida (Acórdão de 09-02-2021, proc. N.º 359/10.1TVLSB.L1.S1).</font><br>
</p><p><font>Pelo que não se aplica qualquer taxa sancionatória excecional.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>III – Das custas de parte</font></b><br>
</p><p><b><font>10.</font></b><font> Estipula o artigo 25.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, sob a epígrafe “Nota justificativa”, </font><i><font>«Até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas».</font></i><br>
</p><p><font> Não obstante o direito a custas nascer logo que a decisão final do processo é proferida, tem-se entendido que «</font><i><font>O «dies a quo» da contagem do prazo de apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte é o correspondente ao do trânsito em julgado da decisão final» (</font></i><font>cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, 10-09-2015, proc. n.º 1100/11.7TBABT-A.E1).</font><br>
</p><p><font> Assim sendo, uma vez que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de fevereiro de 2022, ainda não tinha transitado em julgado quando os autores apresentaram a nota de custas de parte, tem razão a Vodafone e este pedido tem de ser considerado extemporâneo.</font><br>
</p><p><font> Procedem, pois, nesta questão, os argumentos da Vodafone, e desentranha-se o requerimento de custas de parte, bem como a resposta da Citizen’s Voice e autores populares à reclamação quanto a custas da Vodafone por não estar não prevista na lei essa possibilidade.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>11. </font></b><font>Anexa-se sumário elaborado nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC:</font><br>
</p><p><font>I – O prazo para apresentação da reclamação inicia-se na data em que se presuma feita a notificação por transmissão eletrónica do acórdão reclamado, ou seja, no terceiro dia posterior ao da elaboração da notificação ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o final do prazo termine em dia não útil. As presunções da notificação só podem ser ilididas pelo próprio mandatário notificado, provando que não foram efetuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis, mas não pela contraparte.</font><br>
</p><p><font>II – Tendo a reforma da sentença como desiderato suprir os lapsos ou erros manifestos assinalados nas alíneas </font><i><font>a) </font></i><font>e </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 2 do artigo 616.º do CPC, não se destina a corrigir eventuais erros de julgamento ou a servir de veículo para o reclamante exprimir a sua discordância com a decisão ou defender a sua posição técnico-jurídica em relação às questões de direito resolvidas pelo Acórdão objeto do pedido de reforma. </font><br>
</p><p><font>III - Tem sido entendimento deste Supremo que, desde que o instrumento de impugnação utilizado esteja previsto na lei e seja habitual na prática judiciária, não há lugar à aplicação da taxa sancionatória excecional, reservada para o recurso a instrumentos anómalos e patológicos, fora do desenrolar normal do processo. </font><br>
</p><p><font>IV – O</font><i><font> «dies a quo» </font></i><font>da contagem do prazo de apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte é o correspondente ao do trânsito em julgado da decisão final.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>III – Decisão</font></b><br>
</p><p><font>Pelo exposto, decide-se na 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, em Conferência, o seguinte:</font>
</p><p><font>a) A reclamação apresentada pela Vodafone é tempestiva;</font>
</p><p><font>b) A reclamação apresentada pela Vodafone é indeferida, mantendo-se o acórdão proferido no dia 2 de fevereiro de 2022, nos seus exatos termos;</font>
</p><p><font>c) A reclamação da Vodafone quanto a custas é deferida e ordena-se o desentranhamento dos requerimentos da Citizen’s Voice.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Custas da questão prévia da tempestividade da reclamação pela Citizens' voice-consumer advocacy association e autores populares;</font>
</p><p><font>Custas da reclamação contra o Acórdão de 2 de fevereiro de 2022 pela Vodafone;</font><br>
</p><p><font>Custas do incidente de custas pela Citizens' voice - consumer advocacy association e autores populares.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 25 de outubro de 2022</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora) </font><br>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto) </font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2.º Adjunto)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
SjJvu4YBgYBz1XKv2Aj1 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font>Processo n.º 1193/07.1TBBNV.E1.S1</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Na ação declarativa que </font><b><font>AA </font></b><font>e mulher, </font><b><font>BB</font></b><font>- entretanto falecida, tendo sido declarados habilitados como seus sucessores CC e DD-, movem contra </font><b><font>Urbisilva - Construções, Lda., Urbidoze - Construções, Lda., Tdoze - Urbanização e Construção, Lda., Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, Urbibuild - Construções, Lda. e Câmara Municipal de Alenquer</font></b><font>.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> No despacho saneador, proferido na audiência prévia realizada a 20-10-2015, foi julgada verificada a exceção de ilegitimidade processual das rés </font><b><font>Urbidoze – Construções, Lda., Urbibuild, Construções, Lda., Câmara Municipal de Alenquer e Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL,</font></b><font> e absolvidas estas rés da instância, decisão que transitou em julgado.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Realizada audiência final, por sentença de 08-05-2018, foi a ação julgada parcialmente procedente, tendo-se decidido o seguinte:</font><br>
<i><font>“Em face do exposto, e vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios invocados decido julgar a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência:</font></i><br>
<i><font> 6.1. – Declaro nulo, por simulação, o negócio de compra e venda objeto da escritura pública outorgada no dia 16 de setembro de 2005 relativo ao prédio urbano, destinado à habitação, garagem e logradouro, sito na Estrada ...e Av. ..., lote …, freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.2. – Ordeno o cancelamento da inscrição G – 1, Apresentação 28/010905, provisória, convertida em definitiva pela inscrição G – 1, Apresentação 54/281005, relativamente ao prédio urbano, destinado à habitação, garagem e logradouro, sito na Estrada ...e Av. ..., lote …, freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.3. – Declaro a execução específica do contrato promessa celebrado no dia 30 de maio de 2003 e, em consequência, declaro transferida para os autores AA, CC e DD(estes dois últimos na qualidade de herdeiros da falecida BB) a propriedade ao prédio urbano, destinado à habitação, garagem e logradouro, sito na Estrada ...e Av. ..., lote …, freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., com a área de 2 348 m2, livre de ónus ou encargos.</font></i><br>
<i><font>6.4. – Ordeno o cancelamento da inscrição C – 1 (hipoteca voluntária), Apresentação 29/010905, registada a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.5. – Ordeno o cancelamento da inscrição C – 2 (hipoteca voluntária), Apresentação 20/110506, registada a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.6. – Ordeno o cancelamento da Apresentação … de 2010/01/25 (penhora), registada a favor de “..., Cª, S.A. relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.7. – Ordeno o cancelamento da Apresentação … de 2010/12/15 (penhora), registada a favor da Fazenda Nacional relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.8. – Ordeno o cancelamento da Apresentação … de 2013/02/22 (penhora), registada a favor da Fazenda Nacional relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.9. – Ordeno o cancelamento da Apresentação … de 2017/09/13 (penhora), registada a favor da Fazenda Nacional relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i><br>
<i><font>6.10. – Absolvo a ré “URBISILVA, CONSTRUÇÕES, LDA.” do demais contra si peticionado pelos autores AA, CC e DD.</font></i><br>
<i><font>Custas a cargo dos autores e da ré na proporção de 1/3 pelos primeiros e 2/3 pela segunda. Registe e notifique.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.1.</font></b><font> Esta sentença foi notificada aos mandatários do autor e da ré Urbisilva -Construções, Lda. por transmissão eletrónica de dados efetuada através do Citius a 09-05-2018, foi notificada aos habilitados por via postal registada enviada a 09-05-2018 e foi notificada ao Ministério Público na mesma data.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.2.</font></b><font> Foi elaborada certidão datada de 04-07-2018, da qual consta que a sentença transitou em julgado a 25-06-2018.</font>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>4.</font></b><i><font> </font></i><font>A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL veio aos autos, a 21-05-2019, juntar nova procuração e solicitar a notificação da sentença proferida, pelos motivos que expõe, o que foi deferido por despacho de 28-05-2019, tendo a sentença sido notificada ao ilustre mandatário ora constituído por transmissão eletrónica de dados efetuada através do </font><i><font>Citius</font></i><font> a 30-05-2019.</font>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Inconformada com a sentença, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL interpôs o presente recurso de apelação, através de requerimento apresentado a 20-06-2019, tendo o mesmo sido admitido com subida nos próprios autos, imediatamente e com efeito suspensivo, com fundamento no disposto nos artigos 627.º, n.ºs 1 e 2, 629.º, n.º 1, 631.º, n.º 2, 644.º, n.º 2, al. f), 645.º, n.º 1, al. a), e 647.º, n.º 3, al. e), do Código de Processo Civil).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Por despacho da relatora, no Tribunal da Relação, foi determinada a audição das partes, nos termos do artigo 655.º, n.º 1, do CPC, por se ter entendido inadmissível o recurso interposto.</font>
</p><p><font>A recorrente e o autor recorrido emitiram pronúncia.</font>
</p><p><font>Foi proferida decisão singular, na qual se rejeitou, por extemporâneo, o recurso interposto.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> Novamente inconformada, a apelante requereu que recaísse acórdão sobre a decisão singular proferida, sustentando que deverá ser admitido o recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido rejeitar o recurso, não conhecendo do seu objeto.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> Insatisfeita com a decisão, a </font><b><font>Caixa Agrícola</font></b><font> </font><b><font>Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL,</font></b><font> interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal, nos termos do artigo 671.º, n.º 1, do CPC, formulando as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>«51. Nos presente autos e em sede de despacho saneadora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado foi julgada parte ilegítima e, consequentemente absolvida da instância.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><br>
<font>52. Ainda assim, a final, foi proferida sentença que lhe inflige um manifesto e objectivo prejuízo, tendo o Tribunal de 1ª instância mantido essa decisão arredada do conhecimento da lesada, impedindo desse modo o início do prazo para interposição de recurso, que é como quem diz impedindo o trânsito em julgado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><br>
<font>53. À margem da discussão sobre se a notificação da sentença à Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado constituía, ou não, uma obrigação do Tribunal de 1ª instância, facto é que, em dado momento e de modo fortuito ou acidental, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado veio a ter dela conhecimento.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>54. Apenas nesse momento, e não no da notificação às partes, se iniciou a contagem do prazo para o exercício, pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, do seu direito de recorrer, que é de 30 dias nos termos do art.º 638.</font><br>
<font> </font><br>
<font>55. O entendimento constante do Acórdão recorrido, segundo o qual o prazo para interposição do recurso iniciou-se na data da notificação às partes e, consequentemente, na data em que a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo o fez, a sentença recorrida já havia transitado em julgado, não tem qualquer apoio na lei (particularmente no nº 4 do art.º 638 do CPC).</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>56. O recurso de apelação foi, pois, interposto em prazo, tendo a recorrente, Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo, lançado mão do meio correcto que a Lei coloca à sua disposição para reagir contra a sentença.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>57. Consequentemente e porque assim foi, não houve lugar à formação de caso julgado.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>58. Ao contrário do defendido no douto Acórdão de que se recorre, a situação aqui tratada não tem qualquer paralelismo com a reacção a uma decisão judicial transitada em julgado e afectada por irregularidade prévia, relativamente à qual caberá recurso extraordinário.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>59. Tal como anteriormente ficou demonstrado, ao invés do defendido pelo Tribunal </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>quo</font></i><font>, o caso dos presentes autos não se subsume em nenhuma das hipóteses previstas no art.º 696 do CPC, que constituem requisitos taxativos para a admissão do recurso de revisão.</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>60. Mais e com o devido respeito, a jurisprudência invocada para sustentar a rejeição da apelação não se ajusta ao caso em discussão, porquanto os acórdãos do STJ ali indicados correspondem a decisões proferidas a propósito de recursos intentados por quem era parte naqueles litígios e teve oportuno conhecimento das respectivas decisões de que pretendia recorrer.</font><br>
<font> </font><br>
<font>61. São, pois bem distintas as posições em que se encontravam aqueles recorrentes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><br>
<font>62. Assim e nos termos expostos, requer-se a V Exas a revogação do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora que, reiterando os fundamentos da decisão singular da Sra. Juiz Desembargadora relatora, impede a interposição do recurso de apelação, posição que constitui uma manifesta denegação da tutela do Direito, e que será agora revogada por V Exas.».</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font>
</p><p><b><font>9.</font></b><font> O autor/recorrido, </font><b><font>AA</font></b><font>, tendo sido notificado das alegações da Caixa de Crédito Agrícola de Entre Tejo e Sado, apresentou contra-alegações nas quais pugnou pela inadmissibilidade do recurso de revista, e, subsidiariamente, defendeu que o recurso, se admitido, devia ser considerado improcedente. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>9.1. </font></b><font>Nas suas contra-alegações, o recorrido apresenta sobre a questão de fundo as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font>«9 - Nos pontos 4 a 7 das suas doutas alegações, pela apelante é feita uma interpretação incorrecta e infundamentada do acórdão de que se pretende recorrer quando ali se “afirma que não está em causa a legitimidade da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e sado CRL para interpor recurso da decisão proferida”. O que se pretende dizer __ e foi dito__ é que a CCAM até podia ter apelado da douta decisão do tribunal a quo. Todavia tinha de o fazer no prazo de 30 dias que decorria para a apelação pelas partes processuais. Ou seja antes de a decisão ter transitado em julgado. Após o que só tem à mão o recurso de revisão.</font>
</p><p><font>10 - Não tem razão a apelante nos pontos 8 a 18 das suas doutas alegações quando diz que “Para a boa interpretação do art. 637º nº 4 do CPC importa recuar até à redacção do art. 686º do CPC de1939.E a este propósito cita o Prof. Alberto dos Reis __CPC Anotado, V, pag. 319 a 320. A um primeiro olhar dir-se-ia que a citação efectuada tem algo a ver com aquilo que a apelante pretende nos autos. O que já não acontece a uma segunda vista. E tal não acontece já que aquele ilustre Prof., de seguida à citação supra, exemplificando, continua: “O juiz condena em multa uma testemunha ou um perito que não está presente; o despacho não é notificado ao condenado; este tem o direito de recorrer dentro dos oito dias a contar da data em que teve conhecimento da condenação.”</font>
</p><p><font>11 - Constata-se assim que a situação de uma testemunha ou de um perito nada tem a ver com aquilo que a apelante pretende ser nos autos.</font>
</p><p><font>12 - Acresce, por outro lado, que o Prof. Alberto dos Reis naquela sua obra, a pag. 319, sistematiza as transcrições feitas com a epígrafe: Decisões orais. O que nada tem a ver com a questão ora sub judice.</font>
</p><p><font>13 - Continua depois a apelante citando ainda o Prof. Alberto dos Reis, referindo-se à posição do Dr. Joaquim de Sá Carneiro que opinava que o prazo corria desde a data em que o autor tivera conhecimento do despacho. O contexto desta citação, nada tem a ver com a questão dos autos poisquese trata deuma acção proposta contra pessoa ausente em parte incerta. Tendo-se colocado a questão de o autor poder recorrer de um despacho exarado nos autos do qual não fora notificado nem tinha de o ser. O que nada tem a ver com a questão de fundo dos presentes autos que é a da alegada nulidade da decisão proferida em primeira instância que foi argumentada em sede de apelação, sendo que a decisão em apreço já transitara em julgado.</font>
</p><p><font>14 - Nos presentes autos verificamos que a acção foi inicialmente sido proposta também contra a apelante que veio a ser declarada parte ilegítima no douto despacho saneador</font>
</p><p><font>15 - Deste modo, sempre soube a apelante aquilo que se discutia nos autos.E tendo tido conhecimento do objecto da acção uma vez proferida a decisãoem 1ªinstância, poderia, no prazo processualmente estipulado de 30 dias, ter recorrido da mesma. E não o fez.</font>
</p><p><font>Daí ter transitado a decisão proferida.</font>
</p><p><font>16 - À data da prolação da decisão, a CCAM não é parte nos autos. Pelo que não tinha de lhe ser notificada a decisão final. Pelo que para apelar da mesma, nos termos do nº 4 do art.º 638º do CPC, poderia fazê-lo, mas com a condicionante essencial quanto ao respectivo prazo de 30 dias a contar da notificação às partes processuais.</font>
</p><p><font>17 - Não tem o mínimo de fundamento o alegado nos pontos nº 19 a 24º das doutas</font>
</p><p><font> alegações de recurso. Face ao que as decisões nunca transitariam em julgado. E, assim, sempre um terceiro poderia apelar da mesma. O que implicaria a desnecessidade da existência do recurso de revisão pois que sempre se poderia interpor recurso de apelação. E daí não ter sido feita pelo douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora uma errada interpretação do art. 628º do CPC.</font>
</p><p><font>18 - Nos seus pontos 26 a 35 , na tese da recorrente, o trânsito em julgado apenas ocorrerá quando as partes e todos os eventuais terceiros tiver conhecimento da decisão.</font>
</p><p><font>Até lá a decisão não transita. Pelo que se poderá apelar enquanto a mesma não chegar</font>
</p><p><font>ao seu conhecimento. O que não tem o mínimo de fundamento no nosso sistema processual civil.</font>
</p><p><font>19 - As citações feitas nos pontos 27 e 28 da apelante encontram-se descontextualizadas da situação dos autos. E se, por exercício de raciocínio, a apelante tivesse razão nas citações que faz, então tudo o que o Professor Alberto dos Reis escreveu relativamente ao recurso de revisão no volume VI do seu C. P. C. Anotado estaria em contradição com as citadas transcrições __ o que seria um absurdo, convenhamos-</font>
</p><p><font>20 - Assim não tem fundamento no seu ponto 32 ao afirmar que “o trânsito em julgado tem como pressuposto o conhecimento da decisão contra a qual se poderá reagir e que, não o fazendo, haverá de transitar”. Isto só é verdadeiro para as partes processuais e respectivos intervenientes. E a apelante não é parte nos autos.</font>
</p><p><font>21 - Na tese da apelante a segurança das decisões deixaria de existir.</font>
</p><p><font>22 - Em Limites Subjectivos do Caso Julgado, António Júlio Cunha, 2010, Quid Juris, pág. 86, refere: “O ser humano carece de segurança para planificar e conduzir de forma autónoma e responsável a sua vida, daí que, unanimemente, se consideram hoje os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança como elementos constitutivos do estado de direito. O primeiro princípio, conexionado com os elementos de natureza objectiva, impõe a garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito, o segundo, em estrita ligação com àquele, impõe a susceptibilidade de os indivíduos poderem calcular e prever os efeitos jurídicos decorrentes dos actos dos poderes públicos, mas igualmente dos seus próprios actos.”</font>
</p><p><font>23 -Prosseguindo depois na mesma página: “(…) à segurança jurídica e à protecção daquela confiança não basta a proibição de normas retroactivas, se restritivas de interesses juridicamente tutelados, ou a estabilidade dos actos administrativos constitutivos de direitos, é ainda necessária a garantia da certeza jurídica, incompatível com a exigência ilimitada de continuidade das situações. É a esta exigência que o caso julgado responde através do seu efeito preclusivo. O reconhecimento deste efeito vem ao encontro daqueles valores fundamentais e, assim, da razão última do processo.”</font>
</p><p><font>24 - A este propósito diz o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol V, Coimbra Editora, 1984, Reimpressão, em anotação ao art. 677º, pag. 217: ”A necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas quer que, uma vez formado o caso julgado, ele fique intangível. A decisão pode conter erro de facto ou erro de direito; não obstante isto, desde que passa em julgada, a ordem jurídica imprime-lhe força e autoridade indiscutível, como se estivesse puro e isento de qualquer mácula. Eis a realidade normal”.</font>
</p><p><font>25 - Assim a pretensão da apelação da CCAM viola clara e frontalmente o princípio da segurança em toda a sua extensão.</font>
</p><p><font>26 - Na tese da apelante qualquer decisão seria sempre objecto de apelação pelo que nunca transitaria, pois que, em termos hipotéticos, nunca se saberia quando é que um eventual terceiro, alegando um eventual prejuízo, a viria a pôr em causa.</font>
</p><p><font>27 - As eventuais nulidades que a apelante pretende arguir encontram-se sanadas face ao trânsito em julgado ocorrido, conforme amplamente decidido no Supremo tribunal de Justiça nos acórdãos supra citados.</font>
</p><p><font>28 - Pretende a apelante CCAM contar o prazo para a interposição da sua apelação com início na notificação judicial que lhe foi feita da douta sentença. Acontece que esta notificação traduz-se numa nulidade pelo que o prazo do recurso nunca se poderá iniciar com esta notificação. Sendo certo que, mesmo a não ser considerada esta nulidade, sempre a apelação da CCAM teria de ser interposta antes do trânsito em julgado. O que não aconteceu e daí a ocorrência deste.</font>
</p><p><font>29 - No seu ponto 48 é referido que da decisão do tribunal de 1ª instância resultou prejuízo para a apelante. Todavia nada se alega para essa essa demonstração. A realidade é que a apelante possui, relativamente ao caso em apreço, várias outras garantias hipotecárias e não só.</font>
</p><p><font>30 -Daí que só no fim de executadas todas estas outras garantias se saberá se as mesmas são, ou não, suficientes para o pagamento do seu crédito. E daí a existência, ou não, de prejuízo. Sendo que a apelante apesar desta ausência de prejuízo já ter sido alegada em anteriores peças processuais, em nenhum dos seus requerimentos posteriores veio a impugná-la ou a alegar a sua inveracidade.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>9.2.</font></b><font> A Relatora, junto do Supremo Tribunal de Justiça, notificou o recorrente, ao abrigo do artigo 655.º, n.º 2, do CPC, para que se pronunciasse sobre a questão prévia da inadmissibilidade do recurso, suscitada pelo recorrido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>10.</font></b><font> Ouvido o recorrente sobre a questão prévia da admissibilidade do recurso de revista, decidiu este Supremo Tribunal admitir o mesmo. </font>
</p><p><font>O presente recurso tem por objeto o Acórdão do Tribunal da Relação Évora que, invocando fundamentos adjetivos, coloca termo ao processo. Nos termos da lei processual civil, admitem revista os acórdãos da Relação que conheçam, no todo ou em parte, do mérito da causa, ou que ponham termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos (artigo 671.º, n.º 1, do CPC). Abrantes Geraldes (</font><i><font>Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração,</font></i><font> 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, p. 834) tem, contudo, defendido o alargamento do conceito de </font><i><font>“acórdão que ponha termo ao processo”</font></i><font> aos casos em que o acórdão da Relação conheceu de alguma exceção perentória, no sentido da procedência ou da improcedência, bem como aos acórdãos que se traduzam na </font><i><font>extinção da instância</font></i><font> relativamente ao réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção formulados. Prossegue Abrantes Geraldes afirmando que, para a delimitação da revista, é de considerar o efeito processual que emana do acórdão recorrido, e que apesar de o texto do artigo 671.º se reportar textualmente apenas à </font><i><font>absolvição da instância</font></i><font>, tem suficiente latitude para abarcar outras formas de </font><i><font>extinção da instância</font></i><font>, como a que decorre designadamente da rejeição do recurso por intempestividade </font><i><font>(Ibidem</font></i><font>, p. 834). No mesmo sentido, a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem admitido recursos de revista, de acórdãos da Relação que rejeitam o recurso de apelação por intempestividade, integrando estas decisões no n.º 1 do artigo 671.º do CPC, porque põem termo ao processo. Veja-se o acórdão de 30-03-2017 (6617/07.5TBCSC.L1.S2) onde se concluiu que </font><i><font>«I. Ao abrigo do art. 671º, nº 1, do CPC, é admissível revista do acórdão da Relação que, incidindo sobre decisão de 1ª instância, determina a extinção total ou parcial da instância por via da absolvição de instância ou de qualquer outra forma de extinção da instância. II. O acórdão da Relação que, incidindo sobre decisão da 1ª instância, declara a extemporaneidade da contestação/reconvenção determina, por si, a extinção da instância reconvencional, admitindo, por isso, recurso de revista».</font></i>
</p><p><font>Assim, considera-se no caso vertente justificada admissibilidade do recurso de revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>11.</font></b><font> Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que se define o objeto de recurso, a única questão a decidir é a de saber se já decorreu ou não o prazo do recurso de apelação da sentença de 1.ª instância, que só foi notificada à apelante, a seu pedido, após o trânsito em julgado. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>II - Fundamentação </font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Está em causa verificar se o recurso da sentença proferida a 08 de maio de 2018 foi tempestivamente interposto pela apelante Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL.</font>
</p><p><font>A presente ação declarativa foi intentada por AA e mulher, BB contra empresas de construção civil, a Câmara Municipal de Alenquer e a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL.</font>
</p><p><font>No despacho saneador, proferido na audiência prévia realizada a 20-10-2015, foi julgada verificada a exceção de </font><b><font>ilegitimidade processual</font></b><font> de algumas das rés, entre elas, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, que foi absolvida da instância. Esta decisão transitou em julgado.</font>
</p><p><font>Realizada audiência final, por sentença de 08 de maio de 2018, foi a ação julgada parcialmente procedente (</font><i><font>vide </font></i><font>ponto n.º 3 do Relatório onde se transcreve o dispositivo da sentença).</font><br>
<font>Do acórdão da Relação constam os seguintes factos (também descritos agora no Relatório): </font><br>
<font>1 - A sentença foi notificada aos mandatários do autor e da ré Urbisilva - Construções, Lda. por transmissão eletrónica de dados efetuada através do </font><i><font>Citius</font></i><font> a 09-05-2018, e notificada aos habilitados por via postal registada enviada a 09-05-2018 e ao Ministério Público na mesma data.</font><br>
<font>2 - Foi elaborada certidão datada de 04-07-2018, da qual consta que a sentença transitou em julgado a 25-06-2018.</font><br>
<font>3 - A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL veio aos autos, a 21-05-2019, juntar nova procuração e solicitar a notificação da sentença proferida, pelos motivos que expõe, o que foi deferido por despacho de 28-05-2019, tendo a sentença sido notificada ao mandatário ora constituído por transmissão eletrónica de dados efetuada através do </font><i><font>Citius </font></i><font>a 30-05-2019.</font><br>
<font>4 - A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL interpôs o presente recurso de apelação, através de requerimento apresentado a 20-06-2019.</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>2.</font></b><font> O Tribunal da Relação decidiu que o recurso de apelação era intempestivo com a seguinte fundamentação:</font><br>
<font>«Não está em causa a legitimidade da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL para interpor recurso da decisão proferida, apesar de ter deixado de ser parte na causa na sequência da respetiva absolvição da instância. Face ao teor da decisão proferida, na qual é ordenado o cancelamento da inscrição de hipotecas registadas a favor da ora apelante, dúvidas não há de que foi direta e efetivamente prejudicada pela decisão, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 631.º, n.º 2, do CPC, pode interpor recurso da decisão.</font><br>
<font>O prazo de interposição de recurso da sentença proferida é de 30 dias e conta-se da notificação da decisão, conforme dispõe o artigo 638.º, n.º 1, do CPC. Acrescenta o n.º 4 do citado preceito que, fora dos casos previstos nos números anteriores, quando não tenha de fazer-se a notificação, o prazo corre desde o dia em que o interessado teve conhecimento da decisão.</font><br>
<font>Porém, nestas situações em que não tenha de fazer-se a notificação, o anterior trânsito em julgado da decisão constituirá sempre um limite a partir do qual não poderá reiniciar-se a contagem do prazo de interposição de recurso.</font><br>
<font>Transitada em julgado, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e foram dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º do CPC, sem prejuízo da possibilidade de vir a ser objeto de recurso de revisão, conforme estatuído no artigo 619, n.º 1, do citado Código.</font><br>
<font>Daqui decorre a inviabilidade da arguição de nulidades ou da interposição de recurso após o trânsito em julgado da decisão, dado que a eventual existência de irregularidades anteriores não contende com o caso julgado, assim não podendo ser atendidas ou produzir quaisquer efeitos no âmbito do processo, só através da interposição do recurso de revisão podendo ser suscitadas, desde que verificados os pressupostos de admissibilidade deste recurso extraordinário.</font><br>
<font>Neste sentido, na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, cf., entre muitos outros, o acórdão de 11-10-2005 (relator: Azevedo Ramos), proferido no agravo n.º 2615/05 -6.ª Secção (cujo sumário se encontra publicado em www.stj.pt), no qual se entendeu o seguinte: I - Com o trânsito em julgado da decisão final, qualquer nulidade ou vício formal anteriores perdem a possibilidade de ser considerados e atendidos no próprio processo e de aí produzirem quaisquer efeitos; II - Mesmo a nulidade de citação ou a sua falta não constitui fundamento para a anulação de uma sentença já transitada em julgado, a requerimento de qualquer das partes, pois só através do recurso extraordinário de revisão pode tal sentença ser posta em crise, nos termos do art.º 771, n.º 1, al. f), do CPC; o acórdão de 02-10-2014 (relator: Abrantes Geraldes), proferido na revista n.º 1017/2001.L1.S1 - 2.ª Secção (cujo sumário se encontra publicado em www.stj.pt), no qual se entendeu que a invocação de nulidades processuais respeitantes a atos anteriores à data em que foi proferido o acórdão não invalida o caso julgado que, eventualmente, se tenha já formado, sendo que tais irregularidades apenas poderiam ser ultrapassadas através do recurso extraordinário de revisão – reservado para os casos excecionais previstos no art. 671.º, n.º 1, do anterior CPC.</font><br>
<font>Considerando que a ora apelante deixou de ser parte na causa, por ter sido absolvida da instância em sede de despacho saneador, não tinha de efetuar-se a respetiva notificação da sentença posteriormente proferida. Porém, regularmente notificada às partes, não foi interposto recurso da sentença no prazo fixado para o efeito, contado da notificação, pelo que a mesma transitou em julgado.</font><br>
<font>Nesta conformidade, é de concluir que, tendo o recurso sido interposto após o trânsito em julgado da decisão recorrida, se mostra extemporâneo, o que impõe a respetiva rejeição».</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> A citada sentença controvertida declarou a nulidade de um negócio translativo de um prédio urbano (compra e venda) por simulação e a execução específica de um contrato de promessa sobre o mesmo imóvel, ordenando o cancelamento da inscrição no registo de duas hipotecas voluntárias que incidiam sobre o prédio e que tinham sido constituídas a favor da Ré Caixa de Crédito Agrícola. A sentença produziu, portanto, através dos efeitos retroativos da nulidade (artigos 240.º e 289.º do Código Civil) e dos efeitos constitutivos da execução específica de contrato promessa (artigo 830.º do Código Civil), duas transferências do direito de propriedade de um sujeito para outro, que tiveram repercussões na posição jurídica da Caixa Crédito Agrícola, conforme consta dos pontos 6.4 e 6.5 da sentença:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>“6.4. – Ordeno o cancelamento da inscrição C – 1 (hipoteca voluntária), Apresentação 29/010905, registada a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...;</font></i>
</p><p><i><font>6.5. – Ordeno o cancelamento da inscrição C – 2 (hipoteca voluntária), Apresentação 20/110506, registada a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Entre Tejo e Sado, CRL, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ...”.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Invoca a recorrente que o prazo para atacar esta sentença, interpondo recurso de apelação, não se deve conta | [0 0 0 ... 0 0 0] |
8TFdu4YBgYBz1XKvzPvi | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>1. COFIDIS</font></b><font>,</font><b><font> </font></b><font>pessoa coletiva n.º ..., com sede em ... intentou contra</font><b><font> AA, </font></b><font>NIF ..., e</font><b><font> BB</font></b><font>, NIF ..., residentes em ..., ação comum destinada a obter a condenação destes no pagamento da quantia de € 33.917,63 (trinta e três mil novecentos e dezassete euros e sessenta e três cêntimos), acrescida dos juros legais vincendos até efetivo e integral pagamento, bem como nas respetivas custas.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Para tanto, alega o incumprimento de um contrato de crédito em conta corrente, com três entregas, que os Réus deixaram de cumprir e que foi resolvido em abril de 2010, estando em dívida a quantia de € 24.224,98 (vinte e quatro mil duzentos e vinte e quatro euros e noventa e oito cêntimos), acrescida de juros.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Os Réus deduziram CONTESTAÇÃO, aceitando os pagamentos e a resolução, concluindo pela improcedência do pedido, alegando que celebraram um contrato de financiamento e não de conta corrente, no valor de €15.000, em 63 prestações mensais, não lhe tendo sido explicadas as condições, pelo que têm que ser excluídas. Por exceção, arguem ainda a prescrição de 5 anos para as prestações em dívida e os juros, havendo ainda de excluir os juros vencidos dos juros agora peticionados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Notificada a Autora para se pronunciar sobre as exceções, veio concluir como na petição, alegando que o contrato é um empréstimo, tendo sido assinado pelos Réus e remetido à Autora, estando as cláusulas expressas no contrato assinado, tendo os Réus possibilidade de as conhecer e pedir esclarecimentos, tendo procedido ao pagamento por vários meses.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Relativamente às invocadas prescrições terão de improceder por se tratar de um pagamento fracionado, cujas prestações foram declaradas vencidas por resolução datada de 01/04/2010, e que ficou suspenso em virtude do processo de insolvência, desde 27/04/2010 até 26/03/2014.</font>
</p><p><font>Acrescentou que o cálculo de juros efetuado foi sobre o valor de capital à data do incumprimento, e não sobre o valor em dívida à data da resolução, não havendo anatocismo.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi proferido saneador e designada data para a audiência de julgamento.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Realizado o julgamento foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>“Face ao exposto, julgando a ação parcialmente procedente, e em consequência, condeno os Réus AA e BB, a pagar à Autora COFIDIS, S.A., a quantia correspondente ao montante de € 22.364,27 (vinte e dois mil trezentos e sessenta e quatro euros e vinte e sete cêntimos) ao qual, em sede de liquidação serão expurgados os juros remuneratórios, que se encontram prescritos. A esta quantia liquidada, acrescerão os juros de mora legais devidos nos 5 anos anteriores à citação ficta -desde 4 de abril de 2015, até efetivo e integral pagamento.”</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Inconformados com o decidido os réus interpuseram recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação ... decidido o seguinte:</font>
</p><p><i><font>«Pelo exposto, acordam os juízes da Relação em julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogam a decisão recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>Custas a cargo da apelada».</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><b><font>6. </font></b><font>Inconformada, a autora, COFIDIS, veio interpor recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça, com subida em separado e efeito meramente devolutivo (artigos 675.º, n.º 2, e 676.º, n.º 1, ambos do CPC) e apresentar, nos termos do n.º 2 do artigo 637.º, do CPC, a sua alegação, que terminou com as seguintes conclusões:</font><b><font> </font></b>
</p><p><font>«I. Vem a Recorrente interpor recurso do acórdão do Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto no Art. 637.º, n.º 2, do CPC.</font>
</p><p><font>II. Revogou o Tribunal da Relação a decisão proferida na Primeira Instância por entender que quando a ação foi proposta a 30 de março de 2020 o crédito já se encontrava prescrito, nos termos do disposto na alínea e) do artigo 310.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>III. Entende a Recorrente que, contrariamente ao entendido pelo Tribunal da Relação, e salvo o devido respeito, não se verifica a prescrição prevista no suprarreferido artigo, atento o facto de tal dispositivo legal não poder ser aplicado ao caso em concreto.</font>
</p><p><font>IV. Conforme a clausula resolutiva aposta no contrato (cláusula 10.º) verifica-se que o contrato foi resolvido com base no incumprimento definitivo, estipulando-se a perda do benefício do prazo, pelo que a Recorrente aquando da entrada da competente ação reclamou o montante da dívida global.</font>
</p><p><font>V. Conforme Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19/01/2021, relator Isabel Salgado, processo n.º 8636/16.1T8LRS-A-7, disponível para consulta em </font><font>www.dgsi.pt:</font><font> </font><i><font>“1. No contrato de mútuo bancário liquidável em prestações sucessivas, assumindo estas a natureza de obrigações periódicas, distintas e autónomas, ficam sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos, estabelecido no artigo 310º, al) e) do Código Civil. 2. Porém, em caso de incumprimento do mutuário que deixa de pagar as prestações, tendo o mutuante considerado vencidas todas as prestações e devido o pagamento do valor total remanescente, fica sem efeito o plano de pagamento acordado, e nessa medida o montante em dívida retoma a sua natureza original de capital (e juros), sujeito ao prazo de prescrição ordinário de 20 anos, previsto no artigo 309º, do Código Civil (…)”.</font></i>
</p><p><font>VI. Conforme referido na sentença do Tribunal de Primeira Instância “Após esta revogação do contrato por incumprimento e vencimento antecipado das prestações acordadas, com a interpelação para o seu pagamento, a dívida total passa a assumir a natureza de obrigação única, sujeita, por conseguinte, ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos estabelecido no artigo 309.º do Código Civil”.</font>
</p><p><font>VII. Conforme posição assumida pelo Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12/06/2018, relator Jorge Arcanjo, processo n.º 17012/17.8YIPRT.C1: </font><i><font>“Portanto, o crédito reclamado já não se configura como “quotas de amortização”, mas antes uma dívida (global) proveniente da “relação de liquidação”, correspondente ao valor do capital em dívida, à data do incumprimento.”</font></i>
</p><p><font>VIII. Dito isto, importa dizer que existem vários entendimentos doutrinários e jurisprudenciais quanto ao alcance e interpretação da natureza do instituto da prescrição, pelo que entende a Recorrente que andou bem o Tribunal de Primeira Instância.</font>
</p><p><font>IX. Assim sendo, a decisão em crise fez uma incorreta interpretação dos factos e desadequada aplicação do Direito, devendo, por isso, ser determinada a anulação da decisão que revogou a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO QUE V. EXAS. SUPRIRÃO DEVE SER DETERMINADA A ANULAÇÃO DA DECISÃO QUE CONSIDEROU PRESCRITO O CRÉDITO, ANULANDO ASSIM A DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL DA PRIMEIRA INSTÂNCIA.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Assim se fazendo JUSTIÇA».</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>7. </font></b><font>Notificados das alegações de recurso da COFIDIS, os autores, agora recorridos, vieram defender que o recurso de revista devia ser rejeitado e apresentar as suas contra-alegações, para a hipótese de o recurso de revista ser admitido, formulando as seguintes conclusões:</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>«1ª. Não assiste qualquer razão à Recorrente na sua alegação de que o prazo prescricional aplicável no presente caso deveria ser o prazo ordinário de 20 anos com o motivo de a obrigação se ter tornado única por força do incumprimento definitivo e da resolução contratual.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na verdade,</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>2ª. O Recorrido marido obrigou-se ao pagamento de uma prestação mensal que, ao longo do cumprimento do contrato, amortizaria o capital em dívida e, segundo a qual, eram pagos mensalmente uma parte do capital e uma parte dos juros, num total de 63 prestações.</font>
</p><p><font>3ª. Estas prestações mensais correspondem a quotas de amortização de capital, pagáveis com os juros, o que, nos termos da al. e) do artigo 310º do Código Civil, prescrevem no prazo de cinco anos.</font>
</p><p><font>4ª. Sendo certo que não é o simples facto de, por via do incumprimento, se verificar o vencimento da totalidade do crédito, que se altera o seu enquadramento jurídico no que diz respeito à prescrição que o legislador quis, expressamente, que fosse de cinco anos.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Ora,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>5ª. São indícios reveladores da existência de quotas de amortização do capital pagáveis com juros, nos termos do art. 310º, al. e) a circunstância de nos encontrarmos perante quotas integradas por duas fracções, nomeadamente uma de capital e outra de juros que são pagas conjuntamente e o facto de serem acordadas prestações periódicas, isto é, várias obrigações distintas, embora todas emergentes do mesmo vínculo fundamental, de que nascem sucessivamente, e que se vencerão uma após outra.</font>
</p><p><font>6ª. E, na verdade, o Supremo Tribunal de Justiça tem perfilhado o entendimento de que, perante situações de mútuo, como as dos presentes autos, com acordo de reembolso periódico de capital e juros remuneratórios, o prazo de prescrição aplicável, ainda que se verifique a resolução do contrato e o vencimento antecipado é sempre o de cinco anos, aplicável por via da al. e) do artigo 310º do Código Civil - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28.04.2021, no proc. nº 1736/19.8T8AGD-A.P1.S1, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.2021 (proc. nº 20767/16.3T8PRT-A.S2), e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06.07.2021 (proc. nº 6261/19.4T8ALM-A.L1.S1), todos disponíveis em </font><font>www.dgsi.pt</font><font>.</font>
</p><p><font>7ª. A alegada perda do benefício do prazo que a Recorrente invoca nas suas alegações, traduzida no vencimento imediato de todas as frações por via da falta de pagamento de uma delas, não altera a natureza da dívida.</font>
</p><p><font>8ª. E, desse modo, não interfere com o tipo de prescrição aplicável em função da natureza da obrigação que se mantém como sendo de cinco anos de forma a evitar a perpetuação, com a consequente incerteza e insegurança da situação dos devedores.</font>
</p><p><font>9ª. Não restam dúvidas de que a intenção do legislador, ao especificar este prazo prescricional mais curto, é a de defender o devedor da acumulação de dívida pela mera inércia do credor, evitando-se constrangimentos futuros.</font>
</p><p><font>10ª. Pelo que, bem andou o Tribunal da Relação ... ao aplicar o prazo de prescrição de 5 anos, assim determinando que a dívida reclamada já se encontra prescrita desde 29/01/2019.</font>
</p><p><font>11ª. Assim, quando a Recorrente propôs a presente ação, em março de 2020, o crédito já não era exigível por se encontrar prescrito.</font>
</p><p><font>12ª. Pelo que, deverá o recurso interposto ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se incólume o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação ..., com todos os devidos e legais efeitos.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Termos em que deve o recurso de revista ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se assim, com todos os devidos efeitos, a decisão do Acórdão recorrido».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, as questões a decidir são as seguintes: </font>
</p><p><font>I - A questão prévia da admissibilidade da revista suscitada pelos recorridos;</font>
</p><p><font>II – Saber se o prazo de prescrição aplicável é o de 5 anos fixado no artigo 310.º, al. </font><i><font>e),</font></i><font> do Código Civil, ou se é o prazo geral de prescrição de 20 anos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação </font></b>
</p><p>
</p><p><b><font>A – Os factos provados</font></b>
</p><p>
</p><p><font>O Tribunal da Relação, após conhecer da impugnação da matéria de facto, fixou a seguinte matéria de facto provada:</font>
</p><p><font>“1.º O Réu, pretendendo um empréstimo, contactou telefonicamente a Autora, que, de acordo com o acordado, lhe remeteu formulário de contrato de crédito “VALOR TOP”, subordinado às condições gerais e particulares que dele constam, e que aqui se dão como reproduzidas, solicitando a reserva de 15.000 €, durante 63 meses, com o montante de 330 €.</font>
</p><p><font>2.º O contrato é composto por duas páginas, e contém, além da identificação dos intervenientes, todas as cláusulas que o integram, sendo a assinatura dos réus aposta abaixo dos seguintes dizeres: “O(s) abaixo assinado(s) Mutuário(s) declara(m) aceitar as Condições Gerais deste contrato de crédito, dos quais igualmente declara(m) ter tido integral conhecimento antes de assinar e das quais confirma(m) ter recebido um exemplar (…)”.</font>
</p><p><font>3.º Os Réus subscreveram a respetiva proposta em 02/08/2007, tendo preenchido o referido formulário em duplicado, sendo um exemplar enviado à Cofidis, e um exemplar conservado pelo cliente.</font>
</p><p><font>4.º Nos termos do acordado, o mutuário poderá pedir à Cofidis que disponibilize, por transferência bancária, o montante entre 10.000,00€ e 20.000,00 €, indicando-se um quadro de prazos e prestações de reembolso, sendo o custo do crédito variável, composto pelo crédito utilizado, juros diários vencidos, impostos e demais encargos, correspondendo a uma Taxa Anual Nominal de 12,00% e uma Taxa Anual Efetiva Global (TAEG) de 13,76%.</font>
</p><p><font>5.º Após a receção da documentação, foi aprovado pela Autora o valor máximo de € 20.000,00 (vinte mil euros), quantia que foi transferida a pedido dos Réus e para a sua conta bancária, em 04/08/2007, e que ficaram de devolver em 63 prestações mensais de 440 € (quatrocentos e quarenta euros) cada, por débito em conta, desde 1 de setembro de 2007.</font>
</p><p><font>6.º A solicitação dos Réus, foram depositadas, ao abrigo do mesmo contrato e na mesma conta bancária dos Réus, as seguintes quantias: transferência no valor de 1.159,00€ concretizada em 09.01.2008, a transferência no valor de 1.387,00€ concretizada em 08.07.2008 e, por fim, a transferência no valor de 1.081,00€ concretizada em 11.12.2008.</font>
</p><p><font>7.º Todos os meses era remetido aos Réus um extrato de conta, com as utilizações e prestações pagas e em falta, não tendo sido pedidos esclarecimentos em nenhuma ocasião.</font>
</p><p><font>8.º Os Réus pagaram à Autora a prestação que se venceu em 01/09/2007 e as que posteriormente se venceram, até 01/07/2009, deixando de pagar as restantes, não obstante a interpelação.</font>
</p><p><font>9.º No referido contrato ficou acordado que a falta de pagamento de uma prestação implicaria uma penalidade mensal de 4% sobre cada uma das prestações, podendo a Autora, mantendo-se o incumprimento, resolver o contrato e exigir o pagamento imediato de todas as prestações vincendas, sendo as penalidades da mora substituídas por uma penalidade única de 8% sobre todo o saldo em dívida.</font>
</p><p><font>10.º Em 1 de abril de 2010, foram os Réus interpelados para, no prazo suplementar de 8 dias, proceder ao pagamento das prestações em atraso de 22.545,21 € (vinte e cinco mil quinhentos e quarenta e cinco euros e vinte e um cêntimos), acrescida de uma cláusula penal de 8% sobre o saldo em dívida, no montante total de € 24.224,98 (vinte e quatro mil duzentos e vinte e quatro euros e noventa e oito cêntimos), não o tendo feito, foi o contrato resolvido.</font>
</p><p><font>11.º Os Réus foram declarados insolventes por sentença proferida em 27/04/2010, pelo Tribunal da Comarca ... - Instância Local – Secção Cível – J... de ..., a qual transitou em julgado em 07/06/2010.</font>
</p><p><font>12.º Em 08/07/2010 foi proferido despacho inicial de exoneração do passivo restante, tendo, no entanto, sido posteriormente proferido despacho de revogação da exoneração do passivo restante em 26/03/2014, transitado em 29/04/2014.</font>
</p><p><font>13.º No âmbito do processo de insolvência, foi declarado pelos Réus uma lista de credores onde consta o crédito da Autora, no montante de € 20.464,37, não havendo lugar à prolação de sentença de verificação e graduação de créditos. </font>
</p><p><font>14.º A presente ação deu entrada em 30 de março de 2020 e os Réus citados a 4 de junho de 2020.”</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>B – O Direito</font></b>
</p><p>
</p><p><font>I – </font><i><font>Questão prévia da admissibilidade do recurso</font></i>
</p><p>
</p><p><font>Entendem os recorridos que o recurso de revista deve ser rejeitado, na medida em que não foram observados os requisitos previstos no artigo 637.º do CPC, ou seja, a Recorrente requer que o recurso tenha subida em separado, nos termos do artigo 675º, nº2, do CPC, quando o recurso deve subir nos próprios autos, segundo o teor do n.º 1 do citado preceito, e não indica em que termos legais interpõe o presente recurso ou com que fundamentos como demanda o artigo 674.º do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Vejamos:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No requerimento de interposição de recurso, o recorrente deve indicar a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso (artigo 637.º, n.º 1, do CPC).</font>
</p><p><font>Ora, a recorrente, Cofidis, ao solicitar a subida do recurso em separado cometeu um erro, pois que o recurso interposto de uma decisão que conheceu do mérito e que pôs termo ao processo, nos termos do artigo 671.º, n.º 1, do CPC, sobe nos próprios autos, como claramente estipulado na lei processual (artigo 675.º, n.º 1, do CPC).</font>
</p><p><font>Todavia, este erro não vincula nem o tribunal recorrido, nem o tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>, e encontra-se corrigido pelo despacho do Tribunal da Relação que admitiu o recurso de revista, com subida imediata nos próprios autos e efeitos devolutivos, pelo que não se verifica a causa de rejeição do recurso invocada pelos recorridos.</font>
</p><p><font>O mesmo vale para a alegada falta de fundamentos do recurso, pois que, na sua alegação de recurso, a recorrente identifica a questão que a leva a recorrer, a qual diz respeito à questão de saber se o prazo de prescrição é de 5 ou de 20 anos.</font>
</p><p><font>Sem mais delongas, admite-se o recurso de revista.</font><i><font> </font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>II – </font><i><font>Aplicabilidade do prazo de prescrição de 5 anos ao crédito peticionado</font></i><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Discute-se, nestes autos, a questão de saber se o prazo de prescrição aplicável ao caso em apreço é o ordinário de 20 anos (artigo 309.º do Código Civil Civil) ou se é o prazo mais curto de 5 anos previsto no artigo 310.º, al. </font><i><font>e)</font></i><font>, do mesmo diploma.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.1</font></b><font>. Sobre esta questão de direito, o tribunal de 1.ª instância julgou improcedente a exceção perentória de prescrição invocada pelos réus, e decidiu ser aplicável o prazo geral de prescrição de 20 anos, entendendo que a obrigação emergente do contrato outorgado entre as partes, após a sua resolução e comunicação para pagamento, tornou-se única, ficando, por isso, sujeita à prescrição ordinária de 20 anos e não à de 5 anos.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>1.2.</font></b><font> Diferentemente o acórdão do Tribunal da Relação considerou que a obrigação já estava prescrita, por aplicação do prazo mais curto fixado no artigo 310.º, al. </font><i><font>e),</font></i><font> do Código Civil, com o seguinte fundamento: </font><br>
</p><p><font>«A jurisprudência do STJ é quase unânime em considerar que aos contratos de mútuo, que envolvam um plano de pagamento, em que o montante fixado é amortizado em quotas de capital e juros, durante um determinado período de tempo, se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no artigo 310 al e) do C. Civil. E isto porque se pretende defender o devedor da acumulação de dívida pela inércia do credor, evitando-se constrangimentos futuros, traduzidos na impossibilidade de liquidá-la, gerando uma situação de insolvência. Com um prazo curto de 5 anos, impõe-se ao credor mais diligência no exercício do seu direito de cobrança da dívida por incumprimento, sob pena de extinção por prescrição.</font><br>
</p><p><font>E este objetivo aplica-se também às situações em que o vencimento é antecipado, uma vez que esta situação não atinge a estrutura inicial da obrigação composta por amortização de quota de capital e juros. Continuam a ser exigíveis as prestações em dívida, deduzidas dos juros por força do acórdão uniformizador de jurisprudência 7/2009 publicado no DRSI, 36 de 5/05/2009 (conferir – Ac. STJ 27/03/2014; Ac. STJ. 29/9/2016; Ac. STJ. 6/6/2019; Ac. STJ. 3/11/2020; Ac. STJ. 26/01/2021; Ac. STJ. 6/07/2021; Ac. STJ. 10/09/2021 </font><font>www.dgsi.pt</font><font> ).</font><br>
</p><p><font>No caso em apreço os réus/apelantes deixaram de cumprir o contrato a 1/07/2009, que veio a ser resolvido a 1/4/2010, porque os devedores não pagaram as prestações em dívida até esse momento. O prazo prescricional de 5 anos começou a correr, sendo suspenso com a declaração de insolvência e admissão da exoneração do passivo restante que veio a ser revogado e transitado em julgado a 29/04/2014.</font><br>
</p><p><font>Decorreram cerca de 3 meses entre a resolução do contrato e o despacho de admissão do pedido de exoneração do passivo restante, que ocorreu a 08/07/2010.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Continua-se a contar o prazo prescricional a partir do trânsito em julgado do despacho que revogou a exoneração do passivo restante, que se verificou a 29/04/2014. Subtraindo os 3 meses já decorridos à data de 29/04/2014, temos que o prazo prescricional de 5 anos ocorreu a 29/01/2019. Quando a ação foi proposta a 30 de março de 2020 já o crédito estava prescrito, pelo que não exigível».</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.3.</font></b><font> Entende a recorrente que o prazo de prescrição é de 20 anos, porque tendo o contrato sido resolvido com base no incumprimento definitivo, o Banco invocou, conforme a cláusula contratual n.º 10, a perda do benefício do prazo, e reclamou o montante da dívida global, ficando sem efeito o plano de pagamento acordado, e nessa medida o montante em dívida já não se configura como “quotas de amortização”, mas retoma a sua natureza original de capital (e juros), sujeito ao prazo de prescrição ordinário de 20 anos, previsto no artigo 309º do Código Civil.</font><i><font> </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>Quid Iuris?</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>1.4.</font></b><font> No caso vertente, estamos perante um contrato de crédito ao consumo, sob a forma de mútuo bancário, na modalidade de crédito em conta corrente, celebrado entre a autora, COFIDIS, e os réus, através da técnica das cláusulas contratuais gerais, que os réus subscreveram, apondo a sua assinatura no contrato (factos provados n.º 1 e n.º 2). </font>
</p><p><font>O contrato dos autos encontra-se legalmente definido no artigo 2.º, n.º 1 alínea </font><i><font>a)</font></i><font>, do Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de setembro, o diploma vigente à data da celebração do contrato (agora regulado pelo Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, com as alterações subsequentes, as últimas das quais definidas no DL n.º 74-A/2017, de 23/06), como </font><i><font>“o contrato pelo qual um credor concede ou promete conceder a um consumidor um crédito sob a forma de diferimento de pagamento, mútuo, utilização de cartão de crédito, ou qualquer outro acordo de financiamento semelhante”.</font></i>
</p><p><font>O contrato tem de ser reduzido a escrito, assinado pelos contraentes e entregue um exemplar ao consumidor, e tem de conter os restantes elementos referidos no artigo 6.º do referido Decreto-Lei n.º 359/91, nomeadamente a TAEG e condições de pagamento, sob pena de nulidade ou inexigibilidade (artigo 7.º).</font>
</p><p><font>Nos contratos de crédito em conta corrente, nos termos do artigo 13.º, tem ainda que existir informação, por escrito, do eventual limite do crédito ou a forma de o determinar, sendo remetida informação das alterações através de extrato de conta. A inobservância presume-se imputável ao credor (artigo 7.º, n.º 4). </font>
</p><p><font>Segundo o facto provado n.º 5, foi aprovado pela Autora o valor máximo de € 20.000,00 (vinte mil euros), quantia que foi transferida a pedido dos Réus e para a sua conta bancária, em 04/08/2007, e que ficaram de devolver em 63 prestações mensais de € 440 (quatrocentos e quarenta euros) cada, por débito em conta, desde 1 de setembro de 2007.</font>
</p><p><font> Neste contrato, a obrigação de pagamento foi fixada em sucessivas prestações periódicas que englobam, simultaneamente, os juros remuneratórios e a amortização do capital mutuado. Trata-se, pois, de </font><i><font>“quotas de amortização do capital pagáveis com os juros”,</font></i><font> como sucede com muita frequência nos contratos de financiamento.</font>
</p><p><font>Segundo o facto provado n.º 8, os réus deixaram de pagar as prestações, não obstante a interpelação para o fazerem. </font>
</p><p><font>Nos termos do facto provado n.º 9, ficou acordado no contrato que a falta de pagamento de uma prestação implicaria uma penalidade mensal de 4% sobre cada uma das prestações, podendo a Autora, mantendo-se o incumprimento, resolver o contrato e exigir o pagamento imediato de todas as prestações vincendas, sendo as penalidades da mora substituídas por uma penalidade única de 8% sobre todo o saldo em dívida. Segundo o facto provado n.º 10, em 1 de abril de 2010, foram os Réus interpelados para, no prazo suplementar de 8 dias, procederem ao pagamento das prestações em atraso, no valor de 22.545,21 euros e, não o tendo feito, foi o contrato resolvido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.5.</font></b><font> Para fundar a sua pretensão no recurso de revista, a recorrente invoca a cláusula n.º 10, que classifica como cláusula resolutiva, aposta no contrato, a qual tem o seguinte teor (nos termos que foram dados como provados nos factos n.º 9 e n.º 10):</font>
</p><p><br>
</p><p><img>
</p><p>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Prossegue a recorrente, alegando que, tendo sido o contrato de empréstimo resolvido com base no incumprimento definitivo, e tendo sido estipulada a perda do benefício do prazo, acompanhada da reclamação do montante global da dívida, deixa de ser aplicável o prazo curto de prescrição fixado na al. </font><i><font>e)</font></i><font> do artigo 310.º do Código Civil </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Vejamos:</font>
</p><p><font>Nos termos do artigo 310.º (Prescrição de cinco anos) do Código Civil, </font><i><font>«Prescrevem no prazo de cinco anos: e) As quotas de amortização do capital pagáveis com os juros».</font></i><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Segundo o artigo 781.º (Dívida liquidável em prestações) do Código Civil, </font><i><font>«Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A obrigação de pagamento das quotas de capital traduz-se numa obrigação unitária, de montante predeterminado, cujo pagamento foi parcelado ou fracionado em prestações, sendo a amortização fracionada do capital em dívida realizada conjuntamente com o pagamento dos juros vencidos, originando uma prestação unitária e global.</font>
</p><p><font>Nos termos do artigo 781.º do Código Civil, nas dívidas a prestações ou fracionadas, tendo o devedor faltado ao cumprimento de uma prestação, o credor poderá exigir imediatamente as restantes prestações, antes do tempo acordado para a sua exigibilidade. Este regime aplica-se não só ao pagamento do preço em prestações, mas também à restituição do capital mutuado em frações. Trata-se de uma hipótese de perda de benefício do prazo, que, em regra, não é automática, mas exige que o credor interpele o devedor para cumprir imediatamente todas as prestações vincendas. Tem-se entendido na doutrina (cfr. Ana Afonso, “Anotação ao artigo 781.º”, in </font><i><font>Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Das Obrigações em Geral, </font></i><font>Universidade católica Editora, Lisboa, 2018, p. 1071), que, «Não sendo uma norma imperativa, é possível convencionar o vencimento automático das prestações vincendas, independentemente de ter havido interpelação, conforme decidiu o Ac STJ 21.11.2006».</font>
</p><p><font> A lei determina a aplicação a estas prestações do prazo quinquenal de prescrição (artigo 310.º, al. </font><i><font>e),</font></i><font> do Código Civil).</font>
</p><p><font>A </font><i><font>ratio</font></i><font> da lei reside na proteção dos devedores, que, nos casos de incumprimento, poderiam ser confrontados com a exigência de pagamentos de montantes avultados durante um período demasiado longo, caso fosse aplicável o prazo geral de prescrição de 20 anos.</font>
</p><p><font>O artigo 310º do Código Civil consagra uma prescrição de curto prazo (dentro das prescrições extintivas), e encontra a sua razão de ser, como esclarecia Vaz Serra (in </font><i><font>Revista Decana</font></i><font>, 89.º/328), na proteção do devedor contra a acumulação da sua dívida, que se transformaria de dívida de anuidades, pagas com os seus rendimentos, em dívida de capital suscetível de o arruinar, caso o pagamento lhe pudesse ser exigido de um golpe ao cabo de um número demasiado de anos. </font>
</p><p><font>Esta solução não se altera pela circunstância de, por meio do vencimento antecipado, após interpelação para cumprir, sem que o devedor o tenha feito (artigo 781.º do Código Civil), a multiplicidade de obrigações fracionadas se transformarem numa obrigação unitária, decorrente da operação de liquidação efetuada.</font>
</p><p><font>O vencimento imediato das prestações previsto no artigo 781.º do Código Civil (Dívida liquidável em prestações) é uma norma supletiva e exige que o credor interpele o devedor nesse sentido, declarando-lhe que considera vencidas todas as prestações em dívida, o que se verificou no caso vertente. </font>
</p><p><font>O recurso a esta norma não altera o prazo de prescrição, e, em particular, não faz com que o prazo de prescrição deixe de ser de cinco anos e passe a ser de 20 anos. As finalidades de proteção do devedor e de promover um especial dever de diligência do credor na reclamação judicial célere do pagamento continuam presentes neste contexto.</font><br>
</p><p><font>Para efeitos de prescrição, o vencimento ou a exigibilidade imediata das prestações, por aplicação do disposto no artigo 781.º do Código Civil, não altera a </font><i><font>natureza</font></i><font> das obrigações inicialmente assumidas, </font><i><font>antecipando</font></i><font> apenas o </font><i><font>momento da exigibilidade</font></i><font> das quotas. Mesmo que, por aplicação do AUJ n.º 7/2009, o vencimento imediato das prestações não implique a obrigação de pagamento de juros remuneratórios nelas incorporados, mantém-se válido o risco de </font><i><font>“acumulação de contas rapidamente ruinosa para o devedor”</font></i><font> que a doutrina pretendeu evitar, servindo este regime jurídico, simultaneamente, para incentivar a célere cobrança, pelo credor, dos mo | [0 0 0 ... 0 0 0] |
8TFgu4YBgYBz1XKv7_3m | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça </font></div><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<p><b><font>I - Relatório</font></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> O embargante </font><b><font>AA</font></b><font> deduziu oposição à execução instaurada pela sociedade </font><b><font>“M.C.–Comércio de Frutas, Lda”,</font></b><font> por meio de embargos de executado, alegando, em resumo e no essencial: </font><br>
</p><p><font>(i) a execução deveria correr no processo executivo nº 13700/17.... do Juízo de Execução ..., Juiz ..., instaurado pela exequente M.C.– Comércio de Frutas, Lda, contra BB e CC, dado serem estes os devedores, uma vez que o embargante nada lhe deve, sendo aquele processo executivo o local próprio para fazer valer o direito que lhe foi conferido pela sentença, ocorrendo, assim, clara e inequívoca litispendência; </font><br>
</p><p><font>(ii) com a presente execução a exequente procura obter um proveito ilegítimo, em seu exclusivo benefício e em detrimento de todos os demais credores do devedor BB, uma vez que o eventual direito de crédito deste terá de ser apreendido para a respetiva massa insolvente, dado o mesmo ter sido declarado insolvente no processo nº 2496/19...., do Juízo de Comércio ... - Juiz ..., onde a exequente já consta como credora e aí reclamou créditos.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Proferiu-se sentença que julgou a oposição improcedente: </font><br>
</p><p><i><font>«Assim, em face de todo o exposto, decide-se julgar improcedente, por não provada, a oposição à execução por embargos de executado intentada pelo executado AA, e, em consequência, determinar o prosseguimento da execução intentada pela exequente M. C. Comércio de Frutas, Lda».</font></i><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Inconformado com a sentença, o Embargante interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação ... decidido o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>«Pelo exposto, acordam as Juízas que constituem este Tribunal da Relação ... em julgar procedente o recurso, e em consequência, determinam a restituição do crédito depositado à ordem da presente execução à massa insolvente do processo acima identificado, e oportunamente, quando for concretizada, deve ser extinta a execução».</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> </font><b><font>MC Comércio de Frutas, Lda., Embargada,</font></b><font> inconformada, veio interpor Recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça, do Acórdão do Tribunal da Relação ..., de 25-06-2021, formulando as seguintes conclusões: </font><br>
</p><p><font>«I. Destina-se o presente recurso a impugnar a decisão proferida pelo Venerando Tribunal da Relação ..., que judiciou pela procedência do recurso interposto pelo aqui Recorrido e, consequentemente, pela restituição do crédito à massa insolvente e a extinção dos autos de execução principal, pois que não se conforma a Recorrente com a douta decisão, porquanto se afigura diametralmente oposta às normas jurídicas vigentes na matéria </font><i><font>sub judice,</font></i><font> estando convicta de que Vossas Excelências, no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogá-la e de substitui-la por uma que julgue a prossecução da lide executiva.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Contemplemos,</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><u><font>Primórdios</font></u></b><b><font>:</font></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>II. Na pretérita data de 30-08-2019, a Recorrente propôs ação executiva para pagamento de quantia certa, figurando o aqui Recorrido como executado, tendo por título a decisão judicial condenatória proferida no processo que sob o n.º 14216/18.... correu os seus termos junto do T.J.C. ...- Juízo Central Cível ...-Juiz ..., relativa a ação de impugnação pauliana, a qual lhe atribuiu legitimidade para praticar os necessários atos de conservação da garantia patrimonial, até ao limite do seu crédito, no valor de € 66 492,13.</font><br>
</p><p><font>III. Por apenso aos autos de execução instaurados pela aqui Recorrente, deduziu o Recorrido AA oposição à execução por meio de embargos de executado, alegando que a aqui Recorrente pretendia obter um proveito ilegítimo em detrimento dos demais credores, atendendo ao estado de insolvência em que se encontrava o devedor/cedente BB, uma vez que o direito de crédito em crise deveria ser apreendido para a respetiva massa insolvente.</font><br>
</p><p><font>IV. Deduzida a correspondente contestação pela aqui Recorrente, na qual se refutou integralmente os argumentos aduzidos pelo ali Embargante, considerou o Tribunal de Primeira Instância que os autos já dispunham de todos os elementos necessários para a prolação de decisão, e mediante concordância das partes, foi proferida sentença, que judiciou que </font><i><font>“(…) decide-se julgar improcedente, por não provada, a oposição à execução por embargos de executado intentada pelo executado AA, e, em consequência, determinar o prosseguimento da execução intentada pela exequente M. C. Comércio de Frutas, Lda.”. </font></i><br>
</p><p><font>V. O aqui Recorrido lançou mão de Recurso de Apelação para o Venerando Tribunal da Relação ..., asseverando a argumentação anteriormente aduzida, a qual mereceu a resposta da aqui Recorrente, tendo colhido a decisão de procedência do recurso, na pretérita data de 25-06-2021, porquanto determinou o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> que </font><i><font>“acordam as Juízas que constituem este Tribunal da Relação ... em julgar procedente o recurso, e em consequência, determinam a restituição do crédito depositado à ordem da presente execução à massa insolvente do processo acima identificado, e oportunamente, quando for concretizada, deve ser extinta a execução.”,</font></i><font> decisão com a qual não assentimos, porquanto não se afigura processual e materialmente justa, constituindo assim decisão ilegal.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><u><font>Perscrutemos,</font></u></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Das normas jurídicas violadas:</font></b><font> a contravenção do disposto nas normas jurídicas ínsitas nos artigos 9.º n.º 2 e 616.º n.º 1 e n.º 4 do Código Civil (doravante CC), artigos 120.º, 123.º, 127.º n.º 2 e n.º 3 do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (doravante CIRE):</font><br>
</p><p><font>VI. De acordo com o disposto no n.º 1 e n.º 4 do artigo 616.º do Código Civil, o Credor Impugnante tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os atos de conservação da garantia patrimonial do seu crédito, sendo que os efeitos advenientes da procedência da impugnação pauliana aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido, e não aos restantes credores.</font><br>
</p><p><font>VII. Citando o entendimento perfilhado por Pires de Lima e Antunes Varela in “Código Civil Anotado, Vol. I”3, </font><i><font>“1. O carácter pessoal da impugnação pauliana aparece afirmado especialmente nos n.ºs 1 e 4 deste artigo: o primeiro, ao atribuir ao credor o direito à restituição dos bens na medida do seu interesse; o segundo, não atribuindo aos outros credores quaisquer direitos sobre esses bens. Afasta-se, assim, a doutrina do artigo 1044.º do Código de 1867, que mandava reverter os valores alienados ao cúmulo dos bens do devedor em benefício dos seus credores. Por outro lado, sacrificando o acto apenas na medida do interesse do credor impugnante, mostra-se claramente que ele não está afectado por qualquer vício intrínseco capaz de gerar a sua nulidade, pois se mantém de pé, como acto válido, em tudo quanto excede a medida daquele interesse (…) O n.º 4 confirma o carácter pessoal da impugnação: esta não beneficia senão o credor que a exerceu (…)”.</font></i><br>
</p><p><font>VIII. A ação de impugnação pauliana configura um direito pessoal de restituição, não anulando o ato translativo para terceiro, mas tornando-o apenas ineficaz quanto ao credor impugnante.</font><br>
</p><p><font>IX. O negócio de cessão de créditos não se encontra inquinado por qualquer vício intrínseco, subsiste como ato perfeitamente válido, pelo que o direito de crédito cedido sempre permaneceria na esfera jurídica do terceiro cessionário, o aqui Recorrido, não retornando à esfera jurídica do devedor cedente, apenas se tornando ineficaz quanto à Credora Impugnante, não tendo cabimento, salvo devido respeito por mais douto entendimento, a restituição do crédito à massa insolvente. </font><br>
</p><p><font>X. Não se verificou, </font><i><font>in casu</font></i><font>, qualquer resolução do negócio operada pelo Ex.ª Sr. Administrador de Insolvência em benefício da massa insolvente, nem poderia tal resolução incidir sobre o aludido negócio pois que, de acordo com o estipulado no artigo 120.º n.º 1 do CIRE, só poderiam ser resolvidos negócios praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência; ora, o processo de insolvência teve o seu início em 06 de Julho de 2019, tendo decorrido mais de dois anos sobre a data do negócio, que se celebrou em 07 de Abril de 2017.</font><br>
</p><p><font>XI. Mas ainda que assim não se entendesse, e tal como apregoado no requerimento apresentado pela aqui Recorrente na pretérita data de 06 de Abril de 2021 (Ref.ª Eletrónica Citius ...), na sequência do despacho proferido pelo Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> na data de 15 de Março de 2021 (Ref.ª Eletrónica Citius ...) e da junção de documentos operada, o Administrador de Insolvência admitiu não se encontrarem verificadas as condições para resolução do negócio em benefício da massa insolvente, mantendo a sua decisão de encerramento do processo por insuficiência de massa.</font><br>
</p><p><font>XII. Ademais, os prazos estipulados para a resolução constantes do normativo legal ínsito no artigo 123.º n.º 1 do CIRE, atendendo ao conhecimento do ato e à data da declaração de insolvência (30 de Julho de 2019), já se encontram largamente ultrapassados, pelo que também não seria possível operar a resolução pelo Ex.º Sr. Administrador de Insolvência.</font><br>
</p><p><font>XIII. Inexistindo qualquer resolução do negócio jurídico em apreço, o mesmo não deixa de produzir os seus efeitos quanto aos restantes credores e, não integrando já a esfera jurídica do devedor, mas sim a esfera jurídica de terceiro adquirente, </font><i><font>in casu</font></i><font>, o aqui Recorrido, não pode ser considerado como integrando a massa insolvente.</font><br>
</p><p><font>XIV. Em face da inexistência de resolução, não se vislumbra qualquer fundamento legal que permita afastar o caráter pessoal da impugnação pauliana, aproveitando aos credores não impugnantes, ou que sustente a restituição do crédito à massa insolvente.</font><br>
</p><p><font>XV.A ação de impugnação pauliana em apreço não foi nem poderia ser apensada aos autos de insolvência do devedor alienante, tal qual comanda o artigo 127.º do CIRE, pois que, tratando-se de bens que pertencem já a terceiro, não poderão ser restituídos ou apreendidos para a massa insolvente.</font><br>
</p><p><font>XVI. Sobre esta questão, pronunciou-se já o Colendo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 17 de Dezembro de 2019, proferido no âmbito do Processo n.º 1542/13.3TBMGR-K.C1.S1, aí tendo sido decidido que </font><i><font>«Dado que a procedência da impugnação pauliana não tem como consequência a extinção do efeito translativo da venda, o credor impugnante executa os bens, alvo da impugnação, no património do terceiro adquirente. Assim, não regressando os bens vendidos ao património do alienante, posteriormente declarado insolvente, a impugnação pauliana da respetiva venda não aproveita aos demais credores do insolvente. Por isso, o art.127º do CIRE determina que aquela ação de impugnação pauliana não é apensa aos autos da insolvência do devedor alienante. Tratando-se, assim, de bens de terceiro, não pode o administrador da insolvência (que não procedeu à resolução em benefício da massa) apreender esses bens para a massa insolvente.» e, bem assim, o douto Supremo Tribunal no Acórdão de 20-02-2020, pelo relator João Bernardo, nos termos do qual “III. O credor que persegue procedentemente um bem do devedor em impugnação pauliana não tem que se submeter à concorrência dos credores deste.”.</font></i><br>
</p><p><font>XVII. Atentemos ainda na sapiência propalada pelo Tribunal da Relação ..., no Acórdão de 26-01-2017, pela relatora Lina Castro Baptista, coincidentemente a Mma. Juiz Desembargadora que presidiu à decisão </font><i><font>a quo,</font></i><font> nos termos do qual “</font><i><font>II - Em caso de inexistência ou improcedência da resolução do Administrador da Insolvência, o processo de insolvência em nada contende com ação de impugnação pauliana pendente ou a interpor em Juízo. III- Nem poderia ser de outra forma: atualmente a ação pauliana traduz-se num direito pessoal de restituição, em nada afetando o ato translativo de situações jurídicas para terceiro. Por inerência, não ocorrendo resolução do ato jurídico em causa pelo Administrador da Insolvência, o objeto do ato translativo para terceiro não pode ser considerado como integrando a massa insolvente, por pertencer a terceiro.”.</font></i><br>
</p><p><font>XVIII. Citando ainda a sapiência propalada por Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, à qual aderimos na íntegra, </font><i><font>“(…) Apesar do regime descrito nas notas anteriores, pode dar-se o caso de o processo de impugnação pauliana vir a seguir o seu curso até ao final, sendo a impugnação julgada procedente. É esta a hipótese que constitui a previsão do n.º 3, que rege os efeitos da impugnação. Na aferição do interesse do credor, o preceito em anotação atende</font></i><font> </font><i><font>ao disposto no artigo 616.º do C. Civ., nomeadamente no seu n.º 4, quando estabelece que a impugnação só aproveita ao impugnante. A nova lei afasta-se assim da anterior, a qual, no seguimento da nossa tradição, determinava que a procedência da impugnação aproveitaria à comunidade dos credores. (…)”.</font></i><font> </font><br>
</p><p><br>
</p><p><font>Ora,</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>XIX. o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> conferiu primazia ao princípio geral do </font><i><font>par conditio creditorum</font></i><font>, em detrimento do instituto da impugnação pauliana e da sua pessoalidade, sem sustento legal, pois que não se verificou qualquer resolução do negócio, afigurando-se largamente superado o entendimento anteriormente vigente que contemplava o aproveitamento da procedência da impugnação pela comunidade dos credores.</font><br>
</p><p><font>XX. Destarte, aplicou o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> as regras do regime insolvencial, quando deveria ter aplicado e atendido aos normativos legais subjacentes ao instituto da impugnação pauliana. - perfilhando da mesma linha de pensamento, pronunciou-se já anteriormente o Venerando Supremo Tribunal, no Acórdão de 26-01-2017, pelo Relator Abrantes Geraldes, no processo que sob o n.º 417/14.3TBVFR.P1.S1 correu os seus termos, segundo o qual </font><i><font>“(…) o quadro da insolvência – que na presente acção não pode ser ponderado – existem limitações quanto à liberdade de actuação do devedor, privilegiando-se o tratamento paritário dos credores a partir do princípio par conditio creditorum. Em tal contexto, admite-se que o administrador de insolvência possa accionar a resolução ou a impugnação de actos de que tenha resultado o benefício injustificado de alguns credores em função de outros. Mas na presente acção estamos fora desse contexto normativo, sendo o litígio unicamente regido pelas regras gerais sobre a impugnação pauliana e sobre as garantias gerais das obrigações. Por outro lado, ao titular do direito de propriedade é lícita a alienação dos seus bens sem limitações, a não ser que haja motivos para declarar a sua ineficácia mediante o accionamento da impugnação pauliana. Assim confinados, nada impede que o devedor utilize seu património satisfação de alguns créditos em detrimento de outros, não havendo norma alguma que assegure a credores sem garantia real que sejam colocados a par dos demais credores comuns.”.</font></i><br>
</p><p><font>XXI. Carece de sustentação o entendimento segundo o qual, excecionalmente, por imperativos de justiça material, os bens devem regressar ao património do devedor pois que, e salvo devido respeito por mais douto entendimento, se a intenção do legislador fosse conferir tal primazia, tê-lo-ia expressamente previsto nas disposições do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o que não sucede </font><i><font>in casu,</font></i><font> configurando tal entendimento um desvirtuar da letra da lei, nos termos do consagrado no artigo 9.º n.º 2 do Código Civil.</font><br>
</p><p><font>XXII. Outrossim, não se nos afigura consentâneo com os mais elementares princípios de justiça material e de certeza jurídica, apelar a um princípio geral de processo de insolvência, para refutar toda a lógica jurídica do processo de impugnação pauliana já anteriormente julgado, e que conferiu à aqui Recorrente a legitimidade necessária para lançar mão da competente ação executiva.</font><br>
</p><p><font>XXIII. A decisão </font><i><font>a quo</font></i><font> violou flagrantemente o disposto nas normas jurídicas ínsitas nos artigos 9.º n.º 2 e 616.º n.º 1 e n.º 4 do CC, 120.º, 123.º, 127.º n.º 2 e n.º 3 do CIRE, devendo ter sido interpretadas e aplicadas tais normas no sentido da pessoalidade dos efeitos da ação de impugnação pauliana, afetando apenas a credora impugnante, inexistindo qualquer obrigação de restituição do crédito à massa insolvente, e devendo prosseguir a instância executiva.</font><br>
</p><p><font>XXIV. Alfim, deverão V.ª Ex.ª judiciar pela revogação da decisão </font><i><font>a quo,</font></i><font> substituindo-a por uma outra que judicie pela interpretação e aplicação das normas sobreditas no sentido da não restituição do crédito à massa insolvente em virtude dos efeitos da impugnação pauliana, e pela consequente prossecução da lide executiva.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Nestes termos e nos melhores de direito que Vossas Excelências mui doutamente cuidarão de suprir, deve a presente Revista ser julgada totalmente procedente, revogando-se a decisão </font></b><b><i><font>a quo,</font></i></b><b><font> substituindo-a por uma outra que judicie pela não restituição do crédito à massa insolvente em virtude dos efeitos da impugnação pauliana, e pela consequente prossecução da lide executiva.</font></b><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Alterando a douta decisão recorrida, farão Vossas Excelências, inteira e sã JUSTIÇA».</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> O recorrido apresentou contra-alegações, nas quais pugnou pela manutenção do decidido, formulando as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><font>«1ª. Os fundamentos invocados na revista interposta são a expressão de uma incoerente tentativa da recorrente de obter decisão diversa da douta, justificada e esclarecidamente proferida e de procurar, de forma ínvia e inaceitável, manter dissimulada a estratégia processual por si traçada com vista a obter um resultado que é altamente injusto.</font><br>
</p><p><font>2ª. Da factualidade constante dos autos resulta evidente que a ora recorrente adoptou uma estratégia claramente tendente a ocultar, nos autos de insolvência do seu devedor, onde reclamou o seu crédito no prazo fixado na douta sentença, a pendência da acção de impugnação pauliana, para assim evitar a possibilidade da sujeição à imediata resolução em benefício da massa do negócio sob impugnação. </font><br>
</p><p><font>3ª. E do mesmo modo, também na acção pauliana ocultou o conhecimento que tinha da declaração de insolvência do seu devedor, pois que o conhecimento dessa sentença produziria, pelo menos, o inevitável efeito processual da substituição do réu insolvente pelo administrador de insolvência, a quem caberia o dever de declarar a resolução do negócio sob impugnação a favor da massa insolvente, assim obstando à ponderação da imediata resolução do negócio impugnado em benefício da massa insolvente. </font><br>
</p><p><font>4ª. Essa sua postura não se ficou por aí, tendo a recorrente prosseguido os seus propósitos, através da propositura imediata da execução a que se reportam estes autos, sob a forma sumária permitida pela sentença enquanto título executivo, mesmo que sem trânsito em julgado, apenas contra o ora recorrido e sem nela que interviesse como executado o seu efectivo devedor, o que para si não era conveniente dada a declaração da insolvência deste. </font><br>
</p><p><font>5ª. Antes desta execução já pendia o processo executivo nº 13700/17.... no Juízo de Execução ... - Juiz ..., para cobrança coerciva do mesmo crédito que foi objecto da impugnação pauliana, cujo prosseguimento era para si inconveniente com a dedução do incidente de chamamento do ora recorrido, já que o aí executado era o insolvente. </font><br>
</p><p><font>6ª. A estratégia da recorrente de instaurar a execução a que se reportam estes autos, com prévia penhora com remoção de bens do ora recorrido, levou ao depósito da quantia exequenda e mais encargos à ordem da Sra. Agente de Execução, assim obstando à efectiva restituição do crédito objecto da impugnação ao património do devedor, por depósito à ordem da Sra. Agente de Execução daquele processo nº 13700/17...., cujos termos ficariam suspensos e os bens aí penhorados seriam apreendidos para a massa insolvente do executado devedor. </font><br>
</p><p><font>7ª. Foi, pois, para obviar a esse desfecho legal que a ora recorrente intentou esta segunda execução para cobrança do mesmo crédito já em execução naquela outra, movendo-a apenas contra o terceiro adquirente e não contra aquele que é o seu devedor, por essa via procurando furtar ao património colectivo da massa insolvente do seu devedor o crédito cuja ineficácia translativa obteve por via da impugnação pauliana. </font><br>
</p><p><font>8ª. Uma tal duplicação de vias executivas está expressamente vedada pelo artigo 90º do CIRE do qual decorre que “para poderem beneficiar do processo de insolvência e aí obterem na medida do possível, a satisfação dos seus interesses, os credores têm de nele exercer os direitos que lhes assistem, procedendo, nomeadamente, à reclamação dos créditos de que sejam titulares, ainda que eles já se encontrem reconhecidos em outro processo (…)”- Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª Edição, 2015, p. 438 - norma esta que impõe a concentração num único processo das pretensões de todos os credores, em decorrência do princípio </font><i><font>par conditio creditorum</font></i><font>. </font><br>
</p><p><font>9ª. A respeito dessa questão tem sido vasta a jurisprudência firmada no sentido de que, em caso de insolvência dos alienantes no acto impugnado e réus na acção de impugnação pauliana, a execução deixou de ser uma execução singular contra os executados, onde apenas poderiam intervir o exequente e os credores reclamantes cujos créditos fossem providos de garantia real, para passar a ser uma execução universal – artº. 1º do CIRE – justificando-se que os bens alienados objecto da acção de impugnação pauliana julgada procedente regressem excepcionalmente ao património do devedor para responderem perante os credores da insolvência. </font><br>
</p><p><font>10ª. E se assim é entendido no caso de insolvência do alienante dos bens objecto da acção de impugnação pauliana, também no caso de declaração de insolvência do adquirente desses bens tem sido defendido de modo uniforme que a insolvência do terceiro adquirente dos bens objeto de impugnação pauliana tem como consequência a não continuidade dessa acção nem da subsequente ação executiva, com a integração desses bens na massa insolvente (</font><i><font>ex vi</font></i><font> arts. 85º e 88º CIRE). </font><br>
</p><p><font>11ª. Assim, a declaração de insolvência de qualquer um dos sujeitos do acto objecto de impugnação pauliana, seja ele o devedor seja o terceiro adquirente, impede o prosseguimento de qualquer acção executiva e implica a integração dos bens aí em causa na massa insolvente, por respeito ao basilar princípio da execução universal e da igualdade dos credores, não se justificando, pois, soluções jurídicas diversas para situações semelhantes.</font><br>
</p><p><font>12ª. Assim foi decidido com acerto nos doutos Acórdãos da Relação de Guimarães, de 11-07-2019, proc. 341/13.7TBVNO-I.E1.S1 e de 14-11-2019, proc. 8257/18.4T8VNF.G1, ambos disponíveis in www.dgsi.pt, nos quais se defende que o credor impugnante pauliano concorre em igualdade com os demais credores da insolvência do insolvente adquirente do bem-alvo na impugnação pauliana, salvaguardando-se o princípio par </font><i><font>conditio creditorum</font></i><font> e sendo tratado o seu crédito como se tivesse sido reclamado e verificado no processo de insolvência. </font><br>
</p><p><font>13ª. Da douta sentença da acção de impugnação pauliana resulta que o terceiro atingido pela ineficácia do negócio jurídico face ao credor não fica a ser um novo devedor, mas apenas obrigado à restituição ao património de BB do crédito por este a si cedido. </font><br>
</p><p><font>14ª. Seja porque o crédito daquela MC Comércio de Frutas, Lda. estava já em execução judicial naquele processo nº 13700/17...., seja porque o aqui recorrido não é devedor da recorrente, mas tão-só obrigado à restituição do crédito ao património do cedente, não podia nem devia ser admitido o aqui recorrido como parte principal e executado na execução a que estes autos respeitam, tudo levando à solução muito acertadamente defendida no douto Acórdão ora sob revista: a restituição à massa insolvente do crédito depositado à ordem da presente execução. </font><br>
</p><p><font>15ª. A questão abordada no douto Acórdão recorrido, de saber se o crédito cedido ao executado pelo devedor, objecto de uma acção de impugnação pauliana julgada procedente em data posterior à declaração de insolvência do devedor, deve ser restituído à massa insolvente, tem vindo a ser discutida na doutrina e na jurisprudência, mas sempre no pressuposto de que, cabendo ao credor o direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, esse retorno ao património do devedor não seja concretizado, caso em que pode o credor executá-los no património do adquirente. </font><br>
</p><p><font>16ª. Todavia, nada obstando na lei que o terceiro restitua materialmente os bens objecto da impugnação ao património do efectivo devedor, nesse caso cumprir-se-ia a satisfação igualitária dos credores deste último, declarado insolvente, em respeito pelo princípio par </font><i><font>conditio creditorum</font></i><font>. </font><br>
</p><p><font>17ª. Sendo a resolução em benefício da massa insolvente, prevista nos arts. 120.º e segs. do CIRE., uma das formas de ser cumprido o princípio da igual satisfação do universo dos credores, a realidade é que, no processo de insolvência do devedor BB, o Sr. Administrador de Insolvência, conhecedor da pendência desta execução e da sentença de impugnação pauliana, sem qualquer justificação, não resolveu o negócio impugnado em benefício da massa insolvente. </font><br>
</p><p><font>18ª. Perante a injustificada inacção na tomada de decisão de resolução em benefício da massa, por um lado e, por outro, face à instauração de uma execução sumária apenas contra o aqui recorrido quando deveria prosseguir a anteriormente pendente, o resultado alcançado é um injusto privilégio do credor impugnante em contraponto com o prejuízo dos credores universais do processo de insolvência do devedor. </font><br>
</p><p><font>19ª. Por a cessão do crédito do devedor insolvente ao aqui recorrido não ter sido objecto de resolução em benefício da massa insolvente, não é aqui aplicável o regime do n.º 3 do artº 127.º do CIRE, uma vez que este pressupõe a restituição efectiva à massa insolvente do crédito transmitido pelo devedor a terceiro, sob pena do seu conteúdo normativo não ter qualquer utilidade prática e, principalmente, por implicar a inobservância do princípio de satisfação igualitária dos credores, como se verifica nestes autos. </font><br>
</p><p><b><font> </font></b><font>20ª. O douto Acórdão recorrido acolheu de forma correcta e justa a tese defendida no douto Acórdão deste Supremo Tribunal, de 11.07.2013, proc. 283/09.0TBVFR-C.P1.S1, que, apoiado na doutrina de Antunes Varela, concluiu que, se os executados são declarados insolventes na pendência de acção de impugnação pauliana movida pelo exequente, por razões de justiça material e respeito pela execução universal que a insolvência despoleta, os bens alienados, objecto da acção de impugnação pauliana julgada procedente, devem, excepcionalmente, regressar ao património do devedor, para, integrando a massa insolvente, responder perante os credores da insolvência. </font><br>
</p><p><font>21ª. Assim, a restituição efectiva do crédito em causa nos presentes autos ao processo de insolvência impõe-se como a solução que protege, de forma eficaz, os interesses dos credores, em face da relevância dos interesses que se visam proteger no processo de insolvência. </font><br>
</p><p>
</p><p><b><font> </font></b><font>22ª.</font><b><font> </font></b><font>A propositura da acção executiva a que respeitam os embargos deduzidos, sem que nela intervenha como executado o efectivo devedor do crédito pecuniário da exequente, foi a forma engenhosamente encontrada por esta última de iludir a proibição da regra constante do artº 88º do CIRE, que determina a proibição de serem intentadas execuções contra o devedor insolvente e a suspensão de todas as execuções pendentes contra ele. </font>
</p><p><br>
</p><p><b><font> </font></b><font>23ª. Ao decidir como decidiu, o douto Acórdão aqui recorrido veio a corrigir a indevida interpretação dos artºs 53º nº 1, 85º nº 1 e 729º al. a) do CPC e dos artºs 616º nº 1 e 818º, estes do Cód. Civil, de que a sentença de primeira instância padecia, interpretando, para além disso, devidamente o disposto nos artºs 1º nº 1, 120º, 123º e 127º nºs 2 e 3 do CIRE. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Excias., deverá o recurso de revista interposto ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se o douto acórdão recorrido nos seus precisos termos, assim se fazendo </font><br>
</p><p><font>Justiça!»</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, a questão a decidir é a de saber se, no caso de o devedor-transmitente ter sido declarado insolvente na pendência de uma ação de impugnação pauliana, o terceiro adquirente está obrigado a restituir à massa insolvente os bens transmitidos pelo devedor, devendo o credor reclamar o seu crédito no processo de insolvência, em concorrência com os demais credores, ou se se aplica o princípio civilístico segundo o qual os efeitos da impugnação pauliana só aproveitam ao credor impugnante, que os deve fazer valer na esfera jurídica do adquirente.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font>A - Os factos</font></b><br>
</p><p><font>Os factos provados, após o exercício do poder modificativo do Tribunal da Relação, são os seguintes:</font><br>
</p><p><font>1- A exequente M. C. – Comércio de Frutas, Lda, intentou contra o executado AA a ação executiva de que estes autos são apensoss, dando à execução a sentença proferida na ação de impugnação pauliana nº 14216/18…, que correu os seus termos pelo Juízo Central Cível ...- Juiz ..., cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido; </font><br>
</p><p><font>2 - Na parte dispositiva da referida sentença foi feito constar o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>“I - Julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência:</font></i>
</p><p><i><font>a. Declaro ineficaz quanto à autora “MC – Comércio de Frutas, Ldª”, o acordo de cessão de créditos cuja cópia consta de fls 82 a 85, no qua | [0 0 0 ... 0 0 0] |
GTFiu4YBgYBz1XKvs_9p | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></div><br>
<br>
<b><i><font> </font></i></b><br>
<p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>AA</font></b><font> propôs ação declarativa com forma comum contra </font><b><font>BB </font></b><font>(1.º Réu)</font><b><font> </font></b><font>e</font><b><font> CC </font></b><font>(2.º Réu), em que peticionou a condenação dos réus a pagar-lhe, solidariamente, as seguintes quantias: </font><br>
</p><p><font>a) €200.000,00 (duzentos mil euros), acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até efetivo pagamento, pela perda do direito à vida do seu filho; </font><br>
</p><p><font>b) €30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelo autor, em consequência da morte do seu filho DD, acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento; </font><br>
</p><p><font>c) €36.000,00 (trinta e seis mil euros) a título de danos patrimoniais sofridos, acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento; </font><br>
</p><p><font>d) €2.455,50 (dois mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) a título de despesas suportadas com o funeral, acrescidas de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento. </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Por acórdão transitado em julgado, os réus foram condenados, em co-autoria, pela prática do crime de homicídio qualificado de que foi vítima DD, filho do autor; o autor sofreu uma grande dor e desgosto com a morte de DD, passando a padecer de uma depressão; o falecido DD vivia com os seus pais, contribuindo mensalmente com €300, 00, para as despesas da casa; com o falecimento de DD o Autor deixou de dispor de meios para prover a todas as despesas, uma vez que está desempregado; o autor gastou € 2.455,50 em flores e preparativos do funeral do seu filho DD; o mencionado DD faleceu no estado de solteiro e sem deixar descendentes, sucedendo-lhe como únicos herdeiros os seus pais, AA e EE.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> O 1 ° réu apresentou contestação, impugnando a factualidade alegada pelo autor, pugnando pela improcedência da ação, com a consequente absolvição do pedido; invocou, nomeadamente, que os factos alegados pelo autor </font><i><font>“não estão provados e não está dispensada a prova dos factos invocados”</font></i><font> (art. 12º da contestação).</font>
</p><p><font>O 2° réu aderiu e fez sua a contestação apresentada pelo co-réu BB – cfr. fls. 239.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Foi proferido o despacho de fls. 253-254, em 03-05-2016, na sequência do qual as partes se pronunciaram conforme consta de fls.255, 256 e 257.</font>
</p><p><font>Em 21-11-2016 dispensou-se a realização de audiência prévia e proferiu-se despacho saneador, julgando-se verificados todos os prossupostos processuais, com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova (despacho de fls. 260-261).</font>
</p><p><font>Posteriormente e em face da reclamação apresentada pelo autor foi proferido o despacho de fls. 280-281, em 28-03-2017, na sequência do qual foi realizada a audiência prévia, em 19-04-2017, conforme ata de fls. 282 a 289 dos autos </font><a><u><font>[1]</font></u></a><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Realizou-se a audiência final, em 24-10-2017.</font>
</p><p><font>No início da audiência o réu CC fez juntar procuração forense outorgada a favor da mandatária FF, pela qual lhe atribui poderes forenses para o representar (fls. 376) na sequência do que foi proferido despacho julgando cessada a intervenção da patrona nomeada, GG, mais se determinando que fica </font><i><font>“a mesma dispensada de estar presente na presente audiência” </font></i><font>(fls. 378 dos autos)</font><a><u><font>[2]</font></u></a><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Tendo-lhe sido concedida, no seu uso disse o seguinte:</font>
</p><p><i><font>«Corroboro o quanto foi dito no requerimento que antecede pelo meu Ilustre colega Dr. HH e reforço o quanto referido, acrescentando que desde que a Defensora Oficiosa foi nomeada ate à presente data, houve sempre impedimento da mesma para representar o Réu CC, impedimento esse que está consignado no artigo 94º, nº 6, do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto a defensora, Dra. GG, exerce actividade no mesmo escritório do Dr. II, Ilustre Advogado e que foi advogado da família da vitima no âmbito do processo-crime, bem como no pedido de indemnização cível enxertado nos autos de processo crime, nº 78/12...., que correu termos no Tribunal Judicial de ... - ... Juízo.</font></i>
</p><p><i><font>Sublinhe-se que o nº 6 da citada norma estatutária tem no seu propósito prevenir situações que, em abstracto, potenciem e no caso concreto não há dúvida que efectivaram a afectação independência a isenção bem como violação do segredo profissional da advogada e tal resultou notório na audiência preliminar em que a Advogada/Defensora interveio contra os interesses do Réu nos termos do que encontra gravado.</font></i>
</p><p><i><font>Tal artigo 96º, nº 6, também tem como propósito evitar situações de indefesa material, pelo que, com a actuação perpetrada foram lesados os artigos 4º do Código de Processo Civil, o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia do Direito do Homem, artigo 47º paragrafo 1º e 2º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, pelo que, atento o quanto exposto em nome do estado de direito e em respeito pelo principio da dignidade da pessoa humana, não resta outra alternativa ao Tribunal, que não a declaração de nulidade de todos os actos praticados pela defensora, bem como conceder ao Réu a prorrogativa de exercer toda a sua defesa que, a partir da nomeação da sua defensora não foi efectuada, nomeadamente, complementar o requerimento de prova.</font></i>
</p><p><i><font>Frise-se que a defensora jamais por momento algum, conforme nos foi referido pelo Réu e que é facilmente aferido nos registos do Estabelecimento Prisional, para questioná-lo acerca de indicação probatórias, tendo a defensora indicado duas testemunhas, cujo depoimento é ante visivelmente desfavorável ao Réu.</font></i>
</p><p><i><font>Pede-se deferimento”».</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Pela FF foi dito que </font><i><font>“substabelece no Dr. HH, com reserva, os poderes que lhe foram conferidos pelo réu CC, ao abrigo da procuração junta aos autos”.</font></i>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Após o que pelo mandatário Dr. HH, foi peticionado como segue:</font><br>
</p><p><i><font>“O Reu, CC retira a eficácia aos actos praticados pela sua Defensora Oficiosa que esteve presente em situação de indiciada incompatibilidade, não o consultou quanto à prova a produzir ou à matéria em debate fazendo da sua presença uma situação de ausência material de defesa efectiva até agora e que assim se põe termo”.</font></i>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Mais foi consignado em ata como segue:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>“De seguida, pela Ilustre Mandatária Dra. FF, foi pedida a palavra, tendo-lhe sido concedida, no seu uso disse o seguinte:</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>Corroboro o quanto foi dito no requerimento que antecede pelo meu Ilustre colega Dr. HH e reforço o quanto referido, acrescentando que desde que a Defensora Oficiosa foi nomeada ate à presente data, houve sempre impedimento da mesma para representar o Réu CC, impedimento esse que está consignado no artigo 94º, nº6, do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto a defensora, Dra. GG, exerce actividade no mesmo escritório do Dr. II, Ilustre Advogado e que foi advogado da família da vitima no âmbito do processo-crime, bem como no pedido de indemnização cível enxertado nos autos de processo crime, nº 78/12...., que correu termos no Tribunal Judicial de ... - ... Juízo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sublinhe-se que o nº 6 da citada norma estatutária tem no seu propósito prevenir situações que, em abstracto, potenciem e no caso concreto não há dúvida que efectivaram a afectação independência a isenção bem como violação do segredo profissional da advogada e tal resultou notório na audiência preliminar em que a Advogada/Defensora interveio contra os interesses do Réu nos termos do que encontra gravado.</font></i>
</p><p><i><font>Tal artigo 96º, nº6, também tem como propósito evitar situações de indefesa material, pelo que, com a actuação perpetrada foram lesados os artigos 4º do Código de Processo Civil, o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia do Direito do Homem, artigo 47º paragrafo 1º e 2º da Carta dos Direitos</font></i>
</p><p><i><font>Fundamentais da União Europeia, pelo que, atento o quanto exposto em nome do estado de direito e em respeito pelo princípio da dignidade da pessoa humana, não resta outra alternativa ao Tribunal, que não a declaração de nulidade de todos os actos praticados pela defensora, bem como conceder ao Réu a prorrogativa de exercer toda a sua defesa que, a partir da nomeação da sua defensora não foi efectuada, nomeadamente, complementar o requerimento de prova.</font></i>
</p><p><i><font>Frise-se que a defensora jamais por momento algum, conforme nos foi referido pelo Réu e que é facilmente aferido nos registos do Estabelecimento Prisional, para questioná-lo acerca de indicação probatórias, tendo a defensora indicado duas testemunhas, cujo depoimento é ante visivelmente desfavorável ao Réu.</font></i>
</p><p><i><font>Pede-se deferimento”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi de seguida proferido o seguinte despacho:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>“O Réu, CC, esteve até ao momento regularmente representado pela advogado nos presentes autos, o qual representou-o nas diligências já efectuadas, tendo apresentado requerimento probatório oportunamente, não tendo sido invocado qualquer irregularidade nessa representação aquando da prática de tais actos ou do conhecimento dos mesmos, não tendo sido apresentada qualquer prova do ora alegado por forma a demonstrar os fundamentos do incidente, razão pela qual se indefere a requerida ineficácia dos actos praticados pela referida defensora, sem prejuízo de eventual responsabilidade que se venha a apurar em termos disciplinares em sede própria.</font></i>
</p><p><i><font>Mais se diz que o referido Réu não está impedido de requerer a substituição das testemunhas que foram arroladas pela sua patrona, verificados os pressupostos legais, caso os seus novos representantes nestes autos assim o entendam conveniente para a sua defesa.</font></i>
</p><p><i><font>Em face do exposto indefere-se o requerido.</font></i>
</p><p><i><font>Notifique”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Após o que a FF, formulou o seguinte requerimento:</font>
</p><p><i><font>“A prova do domicílio profissional da advogada/defensora oficiosa encontra-se documentada nos presentes autos. A coincidência da morada profissional da mesma com a do Defensor Oficioso da vítima na acção do processo-crime é facilmente e aferível pelo tribunal agora, neste momento, se assim o entender, através de mera consulta ao site da Ordem dos Advogados.</font></i>
</p><p><i><font>Relativamente à falta de arguição até então deste impedimento pelo Réu CC, é preciso ter presente que o mesmo se encontra em situação de reclusão e que só teve conhecimento destes factos muito recentemente, através de informação que lhe fora transmitida por outro recluso, que conhece ambos os advogados, bem como o seu domicílio profissional.</font></i>
</p><p><i><font>Após receber esta informação a Mandatária teve o cuidado de confirmar tal informação, pelo que não pode ser motivo justificativo para o Tribunal o quanto referido para o conhecimento do impedimento e incompatibilidade alegada pelos Mandatários.</font></i>
</p><p><i><font>Quanto à faculdade de alterar o requerimento probatório conferida pelo Tribunal, deverá a mesma abranger a prova na sua integralidade, incluindo-se aí a possibilidade de requer perícia e audição de perita médico-legal”.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Sobre esse requerimento incidiu o seguinte despacho:</font>
</p><p><i><font>“O incidente suscitado no início desta audiência não foi acompanhado de qualquer indicação probatória, conforme exige o disposto no artigo 293º, nº 1, do Código de Processo Civil, razão pela qual se decidiu nos termos acima indicados, sendo que discordando o Réu de tal situação deverá recorrer da mesma, caso assim o entenda. Quanto à alteração do requerimento probatório, esclarece que o Tribunal considerou que tal faculdade não é admissível nesta fase processual, sem prejuízo da faculdade da inquirição oficiosa de testemunhas que se revelem importantes para a decisão da causa, ou de substituição de testemunha ao abrigo do artigo 508º, nº 3, do Código de Processo Civil.</font></i>
</p><p><i><font>Notifique”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Retomada a audiência da parte da tarde, a FF formulou o seguinte requerimento: </font>
</p><p><i><font>“Vimos pelo presente requer, ao abrigo do artigo 423º, nº 3, do Código de Processo Civil, a junção de documentos, cuja junção até à data não foi possível, porquanto a mandatária desconhecia os factos que apenas no dia de ontem lhe foram reportados pelo Réu CC, já no final do dia e, que substanciam impedimento e incompatibilidade da anterior defensora, constar no processo como tal, bem como ainda se alega que a apresentação dos mesmos apenas se tornou efectivamente necessária, em virtude do mandato conferido, sendo que tais documentos correspondem a registo da Advogada GG no site da Ordem dos Advogados, onde consta o seu domicilio profissional, o qual corresponde ao documento que se junta como doc. nº 1, e registo do Dr. II So também no referido site, onde também consta o seu domicílio profissional o que coincide com o da Defensora Oficiosa, que se junta sob doc. nº 2.</font></i>
</p><p><i><font>É de evidenciar que só através da junção dos referidos documentos, conseguimos fazer prova de que ambos os advogados têm o mesmo domicílio profissional, sendo a mesma absolutamente necessária para demonstrar, não só o impedimento, bem como para atestar a insuficiência ou ausência de defesa do Réu, CC”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Sobre esse requerimento incidiu o seguinte despacho:</font>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>“Os documentos ora apresentados nada têm a ver com o objecto em discussão dos presentes autos, mas sim com eventuais problemas existente entre o Réu e a sua Patrona, situação que, como já se referiu na sessão da manhã, não é apreciada nos presentes autos, mas caso se entenda existir qualquer situação disciplinar será matéria da competência disciplinar da Ordem Advogados.</font></i>
</p><p><i><font>Mas se acrescenta, que o referido Réu, CC, tendo sido representado por patronos ao longo dos presentes autos, tendo inclusive aderido à contestação e como tal ao requerimento probatório apresentado pelo co-réu JJ, conforme resulta do requerimento apresentado em 26/03/2016, fls. 239 pelo Dr. LL, razão pela qual nada temos a acrescentar ao já decidido, não se admitindo os documentos agora apresentados, em face da sua irrelevância para a decisão da matéria de facto em discussão”.</font></i><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Finda a audiência de julgamento foi proferida sentença, em 08-10-2019, que concluiu como segue:</font>
</p><p><b><i><font>“Pelo exposto julgo parcialmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência:</font></i></b>
</p><p><b><i><font>- condena-se os réus a pagar solidariamente ao autor a quantia de €26.000,00 (vinte e seis mil euros), respeitante a quota parte de que este é titular, pela indemnização do dano morte e perda do direito à vida do seu filho, DD;</font></i></b>
</p><p><b><i><font> </font></i></b>
</p><p><b><i><font>- condena-se os réus a pagar solidariamente ao autor a quantia de €10.000,00 (dez mil euros), a título de indemnização dos danos morais por este sofridos, em consequência da morte do seu filho, DD;</font></i></b>
</p><p><b><i><font>- condena-se os réus no pagamento de juros, sobre as quantias acima mencionadas, à taxa legal, desde a presente data até integral pagamento;</font></i></b>
</p><p><b><i><font>- absolve-se os réus do demais peticionado.</font></i></b>
</p><p><b><i><font> </font></i></b>
</p><p><b><i><font>Custas do processo a cargo do autor e dos réus, na proporção do respectivo decaimento</font></i></b>
</p><p><b><i><font> </font></i></b>
</p><p><b><i><font>Registe e notifique”.</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font> </font></i></b><br>
</p><p><b><i><font> </font></i></b>
</p><p><b><font>7. </font></b><font>Não se conformando o 1.º réu, </font><b><font>BB</font></b><font>, apelou, suscitando, segundo o tribunal recorrido, as seguintes questões:</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«- Do “princípio de adesão”: art. 71.º do Cód. de Processo Penal (CPP);</font>
</p><p><font>- Da exceção de caso julgado;</font>
</p><p><font>- Da nulidade de sentença por omissão de pronúncia;</font>
</p><p><font>- Da litigância de má-fé do autor;</font>
</p><p><font>- Da revisão de sentença (art. 449.º, nº 1, alínea c) do CPP);</font>
</p><p><font>- Da “nulidade do despacho saneador proferido”;</font>
</p><p><font>- Da oponibilidade da decisão penal condenatória: o alcance do art. 623.º do CPC;</font>
</p><p><font>- Da atuação da patrona oficiosa do Réu CC: do incidente suscitado em audiência final;</font>
</p><p><font>- Da fixação dos “temas da prova”;</font>
</p><p><font>- Da ausência de apreciação probatória pelo tribunal recorrido».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu julgar improcedente a apelação interposta pelo réu BB, confirmando a sentença recorrida</font><i><font>.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>9. </font></b><font>O réu,</font><b><font> BB, </font></b><font>inconformado,</font><b><font> </font></b><font>interpôs recurso de revista geral, ao abrigo do artigo 629.º n.º 1, </font><i><font>in fine,</font></i><font> e n.º 2, al. </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC e, subsidiariamente, recurso de revista excecional, ao abrigo do artigo 672.º, n.º 1, als. </font><i><font>a),</font></i><font> </font><i><font>b)</font></i><font> e </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC, em que formulou prolixas e pouco claras conclusões, que aqui se consideram integralmente transcritas em virtude da sua extensão, e nas quais suscita várias nulidades da sentença e do acórdão recorrido, violação de regras de direito probatório material (artigo 674.º, n.º 3, do CPC) e do princípio da adesão obrigatória (artigos 71.º e 72.º do CPP), bem como violação do caso julgado, identificando assim o objeto do recurso de revista:</font>
</p><p><b><font>«</font></b><font>Questões</font><b><font> a Dirimir</font></b>
</p><p><font>1. Pode o Despacho Saneador não conhecer de questões de Direito que são de conhecimento oficioso (por contenderem com Direitos e Garantias Constitucionais, e de Direito Europeu, bem como com Direitos Processuais) apesar de terem sido suscitadas e expressamente arguidas em peças processuais e em sede de audiência, como foram no caso dos autos?</font>
</p><p><font>2. Pode o Julgador decidir, conforme decidiu no caso </font><i><font>sub judice</font></i><font>, contra a sua própria convicção e </font><i><font>contra legem</font></i><font>, fundando a sua decisão meramente em adesão a jurisprudência que não tem força obrigatória geral?</font>
</p><p><font>3. Pode o despacho saneador proferido restringir Direitos Fundamentais, com violação dos requisitos formais e materiais pevistos no art.º 18 da CRP, também aplicável aos Direitos Fundamentais adquiridos por via do Direito Internacional </font><i><font>ex vi</font></i><font> do art.º 16 e 17 da CRP?</font>
</p><p><font>4. A interpretação do art.º 623.º do CPC, no sentido de ser considerada “presunção inilidivel” quanto aos factos provados em acção penal, quando os mesmos sejam reputados aos RR, deve ou não ser considerada inconstitucional?</font>
</p><p><font>5. É, ou não é, proibida a aplicação analógica (à contrário) do art.º 623.º do CPC, tendo presente o art.º 11.º do CC e tendo em conta que aquela norma (623.º) é norma excepcional ao regime do contraditório e princípio da igualdade das partes instituído na prática processual civil?</font>
</p><p><font>6. É ou não é proibida a interpretação restritiva e </font><i><font>a contrario</font></i><font> de norma excepcional do art.º 623.º do CPC?</font>
</p><p><font>7. É possível considerar-se legal despacho saneador que tem intento ilegal, ou seja, que visa expressamente impedir o exercício de Direitos, Liberdades e Garantias consagrados pela CRP e Direito da União Europeia?</font>
</p><p><font>8. É permitido aplicar presunção inilidível que não esteja expressamente prevista na lei, em violação do disposto no art.º 350 n.º 2 do CC? E no caso da resposta ser negativa (como julgamos ser) com que base pode o julgador aplicar o 623.º para daí extrair presunção inilidível aos RR?</font>
</p><p><font>9. Podem ser importados factos que sustentaram decisão penal transitada e aplicar-lhes força de caso julgado, com o propósito de impedir a sua discussão em posterior acção civil autónoma?</font>
</p><p><font>10. Pode o julgador impedir a produção de prova pelos RR, com a justificação de que os factos dos autos já se encontram provados noutra acção, e impedir a produção de nova prova que assegure de forma superior a verdade material dos factos que importam a esta nova acção?</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Sendo também sobre estas questões que nos debatemos na fundamentação de recurso infra explanada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>- Por outro lado, também se recorre do acórdão na parte relativa a despachos proferidos em audiência de julgamento de 24.10.2017, nomeadamente:</font>
</p><p><font>- do despacho que indeferiu a requerida ineficácia dos atos praticados pela defensora oficiosa do Réu CC, por impedimento da advogada/defensora oficiosa para representá-lo nos presentes autos, porquanto a Dra. GG (defensora deste Réu) exerce actividade no mesmo escritório que o advogado Dr. II, que representou a família da vítima, no pedido de indemnização cível enxertado nos autos de processo crime n.º 78/12.....</font>
</p><p><font>- do despacho proferido em audiência de julgamento que após pedido de esclarecimento de qual seria o objecto do litígio - por haver discrepância entre a despacho saneador, e despacho de 19.04.2017 que definiram que o dano vida estaria fora do objecto do litígio, e o despacho do tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> que indeferiu o recurso do despacho saneador -determinou que do objecto de litígio também fazia parte o dano vida.</font>
</p><p><font>E por fim,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>- da Sentença que condenou os RR. – sem análise das questões que se suscitou préviamente, e sem que fizesse análise probatória que se impunha, recorrendo à importação de factos de sentença proferida nos autos crime, com sonegação da prova produzida em audiência, e de outra prova requerida, a que obstou com o despacho saneador - de que também se recorre – ao definir que o dano vida estaria fora do objecto de litígio».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Invocou, ainda, como fundamentos da revista, o seguinte:</font>
</p><p><font>«Ordem de razões, que consubstanciam fundamento de revista :</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1- No caso em apreço há erro de julgamento, que resultou em concreto numa distorção do direito aplicável, de tal forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou à normativa existente, havendo violação da lei substantiva, que consiste tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável;</font>
</p><p><font>2- A violação ou errada aplicação da lei de processo;</font>
</p><p><font>3- Por haver nulidades na sentença devidamente alegadas e que não foram consideradas ou que se entendeu inexistir no acórdão e que efectivamente existem.</font>
</p><p><font>4- Os fundamentos do próprio acórdão estão em oposição com a própria decisão, ou se assim não se entender pelo menos haverá ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível».</font>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>10. </font></b><font>Termina as suas conclusões de recurso, peticionando o seguinte:</font><br>
</p><p><font>«Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. proficientemente suprirão, requer-se que seja concedido provimento ao recurso, e que:</font><br>
</p><p><font>a) Sejam conhecidas as questões suscitadas a título prévio que determinam erro na aplicação do Direito e Nulidade de Sentença e do Acórdão.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Não obstante as questões colocadas a título prévio sejam suficientes para determinar a absolvição da instância e do pedido, a qual se requer, requer-se outrossim que o tribunal se pronuncie sobre todas as outras questões colocadas, porquanto está em causa a violação de Direitos Fundamentais, que obriga ao conhecimento oficioso das mesmas, sendo que do conhecimento e apreciação de tais questões poderá resultar a reparação de Direitos, que foram vedados aos arguidos, que com a reapreciação prova e matéria de facto, poderá suscitar recurso de revisão, o qual a lei prevê, e não cabe ao tribunal vedar.</font><br>
</p><p><font>Pelo que sem prescindir da absolvição da instância e do pedido, nos termos pedidos em a), Requer-se concomitantemente: </font><br>
</p><p><font>b) Que seja Declarada a Ineficácia dos atos praticados pela Defensora Oficiosa do R. CC, que agiu em situação de conflito de interesses, tornando a representação deste R. irregular numa causa em que era obrigatório o pratrocínio de advogado.</font><br>
</p><p><font>c) Que declare a ilegalidade e invalidade do despacho que em audiência de julgamento declarou o dano vida como integrante do objecto do litígio, em contradição com depachos proferidos anteriormente nos autos.</font><br>
</p><p><font>d) Que declare a invalidade do Despacho saneador, por erro na aplicação do Direito, por o mesmo restringir a aplicação de Direitos Fundamentais da União Europeia, ao aplicar a interpretação conferida ao art.º 623.º do CPC que viola as normas suscitadas (designadamente arts.º 20.º, 47.º, parágrafo segundo da CDFUE e art.º 6.º da CEDH);</font><br>
</p><p><font>e) Declare verificadas as nulidades arguidas nos termos das als. b), c) e d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, e consequentemente a nulidade do despacho Saneador.</font><br>
</p><p><font>E também,</font><br>
</p><p><font>f) Declare a inconstitucionalidade e erro da interpretação conferida ao art.º 623.º do CPC, pelo tribunal à quo, por violar normas imperativas de Direito Constitucional (nos termos supra aduzidos- art.º 1.º,ART.º 2.º art.º 20.º, da CRP);</font><br>
</p><p><font>g) Declarar a inconstitucionalidade e erro da interpretação conferida ao art.º 623.º, por tal interpretação restringir Direitos Fundamentais em violação dos requisitos formais e materiais exigidos pelo art.º 18.º da CRP, também aplicável aos Direitos Fundamentais adquiridos do Direito Internacional ex vi do art.º 16.º e art.º 8 da CRP.</font><br>
</p><p><font>h) Declarar a ilegalidade da interpretação conferida ao art.º 623.º do CPC (</font><i><font>error iuris</font></i><font>), no sentido de que a presunção sobre os factos provados em penal em relação aos Réus, deva ser considerada presunção inilidivél, por tal contender com as regras de interpretação por aplicação analógica e de interpretação extensiva (que é estrita e não admite interpretação </font><i><font>a contrario</font></i><font>) cfr. art.º 11.º do Código Civil.</font><br>
</p><p><font>i) Declarar a ilegalidade da interpretação conferida ao art.º 623.º do CPC (por </font><i><font>error iuris</font></i><font>), quando interpretada no sentido de que a presunção sobre os factos provados em penal em relação aos Réus, deva ser considerada presunção inilidível, por tal interpretação declinar o regime estatuído no art.º 350.º n.º 2 do CC, que consagra que as presunções inilidíveis são casos excepcionais, que têm de estar expressamente previstas na lei.</font><br>
</p><p><font>j) Declarar ilegal (por </font><i><font>error iuris</font></i><font>) e inconstitucional o despacho e sentença que tem por real fundamento impedir o acesso ao duplo grau de jurisdição, por tal contender com art.º 32.º n.º 1 e art.º 10 da CRP, art.º 3.º, 5.º e 6.º da CEDH, art.º 6.º, art.º 20.º, art.º 47 parágrafo primeiro, e art.º 48.º parágrafo segundo, da CDFUE, por tal motivação ser ilegal e imoral face ao ordenamento jurídico vigente, pondo ainda em causa a independência e dever de administrar a justiça que sobre os tribunais impende (cfr art.ºs 202.º e 203.º da CRP).</font><br>
</p><p><font>k) Julgar a impossibilidade de importar factos julgados e que sustentaram decisão em acção penal, para atribuir-lhes força de caso julgado uma vez que a força do caso julgado é relativa à decisão proferida e não quanto aos factos que justificaram a mesma, quando autonomizados em acção diversa.</font><br>
</p><p><font>l) Julgar a impossibilidade do juiz a quo impedir a produção de prova sempre que a mesma assegure de forma superior a verdade material dos factos, e principalmente sempre que a prova dos factos se demonstre prova que padece de erro grosseiro (Relatório de autópsia)</font><br>
</p><p><font>E por fim, sem contender com o quanto requerido, </font><br>
</p><p><font>m) Requer-se que o Tribunal ad quem, reaprecie a prova produzida nos presentes autos civis, e conheça do erro grosseiro do relatório de autópsia e que serviu de prova aos factos fixados e importados do processo-crime, erro da apreciação da matéria de facto dada por provada em Sentença, com recurso a mera importação de autos crime, matéria essa que resulta infirmada com a prova produzida nos presentes autos e por contradição de factos entre si».</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>10. </font></b><font>O recorrido não apresentou contra-alegações.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>11. </font></b><font>Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e que admitem recurso de revista normal (artigo 671.º, n.º 1, do CPC), salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar as questões que fiquem prejudicadas pela decisão dada a outras, nem todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito – artigo 5.º, nº 3, do Código de Processo Civil (CPC). </font>
</p><p><font>Uma vez que estamos perante uma situação de dupla conformidade, este Supremo só conhecerá no âmbito da revista normal, a violação do caso julgado (artigo 629.º, n.º 2, al. a), 2.ª parte, do CPC) e as nulidades do acórdão recorrido que se relacionam com esta questão, competindo a apreciação da admissibilidade do recurso das restantes questões à formação prevista no artigo 672.º, n.º 2, do CPC. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II - Fundamentação </font></b><br>
</p><p><b><font>A – Os factos</font></b>
</p><p><u><font>Releva o seguinte circunstancialismo, que o tribunal de primeira instância deu por assente:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>2.1.1.- No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal coletivo n° 78/12...., do extinto ... Juízo do Tribunal Judicial da Comarca ......, por decisão transitada em julgado, BB foi condenado como co-autor material de um crime de homicídio qualificado de que foi vítima DD e de um crime de furto, previstos e puníveis pelos artigos 131°, 132°, | [0 0 0 ... 0 0 0] |
6zFZu4YBgYBz1XKvk_ih | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>AA</font></b><font> e </font><b><font>BB</font></b><font> intentaram a presente ação contra </font><b><font>CC</font></b><font>, formulando os seguintes pedidos:</font><br>
</p><p><font>A) Ser julgada abusiva, ilegítima, não titulada e de má-fé, a posse que a Ré exerce sobre a fração “E”, correspondente ao 2.º andar direito do prédio sito na Rua ..., na ...;</font><br>
</p><p><font>B) A condenação da Ré a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre aquela fração;</font><br>
</p><p><font>C) A condenação da Ré, no pagamento aos Autores da quantia de €20.000,00, a título de indemnização pela ocupação e utilização da referida fração;</font><br>
</p><p><font>D) A condenação da Ré no pagamento aos Autores de uma indemnização não inferior a €20,00 por cada dia que durar a mais, a contar da citação da presente ação à ocupação da referida fração.</font><br>
</p><p><font>E) A condenação da Ré no pagamento de uma indemnização de €5.000,00, a título de sanção pecuniária compulsória. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Para fundar a sua pretensão alegou, em síntese, que: </font><br>
</p><p><font>- Os Autores são legítimos proprietários da fração autónoma descrita no art. 1.º e 3.º, da petição inicial, que adquiriram por compra;</font><br>
</p><p><font>- O referido prédio, encontra-se ocupado pela Ré, sem e contra o consentimento dos Autores, a qual se arroga a qualidade de filha de DD, com quem os Autores, em meados do ano de 1985 celebraram um contrato promessa de compra e venda da fração autónoma em causa, não tendo sido celebrado o contrato definitivo, por circunstâncias e contrariedades várias, quer do Sr. DD, quer dos Autores.</font><br>
</p><p><font>- Após várias interpelações infrutíferas feitas ao DD com vista à outorga da escritura de compra e venda, tomaram os autores conhecimento, em 2007, de que era a Ré quem, conjuntamente com a sua filha, genro e neta, residia naquele andar.</font><br>
</p><p><font>- Contactada que foi a Ré por parte dos Autores, mostrou a mesma interesse na aquisição da fração reivindicada, desde que conseguisse empréstimo bancário.</font><br>
</p><p><font>- Apesar das várias propostas de solução apresentadas por parte dos Autores, a Ré nunca apresentou qualquer resposta.</font><br>
</p><p><font>- A Ré ocupa, assim, de forma ilegítima e abusiva a fração pertença dos autores. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Regularmente citada, contestou a Ré a presente ação. Defende-se por exceção e por impugnação.</font><br>
</p><p><font>- Invoca a ineptidão da petição inicial, bem como ilegitimidade passiva da R., desacompanhada dos restantes herdeiros de DD.</font><br>
</p><p><font>- Impugna serem os Autores proprietários da fração em causa; </font><br>
</p><p><font>- Alega ter título legítimo para ocupar a fração autónoma em causa, porquanto, logo após a outorga do contrato promessa em causa, os Autores entregaram as chaves da fração reivindicada a DD que passou de imediato a habitá-la na companhia da Ré, com pleno conhecimento e aceitação dos autores.</font><br>
</p><p><font>- Por conta do preço acordado pagou o DD a quantia de Esc:1.000.000,00,00.</font><br>
</p><p><font>- Pese embora tenha sido concedido a DD empréstimo com vista ao pagamento do remanescente do preço acordado, a escritura de compra e venda não foi outorgada por facto exclusivamente imputável aos Autores.</font><br>
</p><p><font>Pugna a final pela improcedência da ação.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Deduziu ainda a Ré pedido reconvencional, pedindo: </font><br>
</p><p><font>A) Se reconheça e declare a aquisição da propriedade, por usucapião, a favor da Ré, sobre a fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao 2.º andar direito, do prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., na freguesia ..., concelho ..., descrito sob o n.º ...7 da freguesia ..., na ... Conservatória do Registo Predial ..., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...03, da referida freguesia, ou, subsidiariamente:</font><br>
</p><p><font>B) Seja proferida decisão judicial que substitua a declaração negocial dos autores, enquanto promitentes faltosos, destinada à celebração da escritura pública de compra e venda prometida, nos precisos termos e condições estipulados no contrato promessa junto aos autos.</font><br>
</p><p><font>Alega para o efeito, que DD seu pai celebrou com os Autores um contrato-promessa de compra e venda da fracção autónoma supra descrita, tendo entregue àqueles, a título de sinal, a quantia global de Esc: 1.000.000,00.</font><br>
</p><p><font>Munido dos documentos necessários com vista à celebração da escritura pública, DD procurou, sem sucesso, os Autores.</font><br>
</p><p><font>DD e a Ré passaram a residir na referida fracção desde 19 de setembro de 1985, data da celebração do contrato promessa em causa, onde fixaram a sua habitação permanente; sempre residiram e a Ré ainda reside, sem qualquer oposição dos autores ou de quem quer que fosse, o que fizeram de boa-fé, na convicção de não violarem o direito de outrem, sendo reconhecidos por todos como proprietários da fração. </font><br>
</p><p><font>DD faleceu a .../.../1994, continuando a Ré a residir na fração em causa.</font><br>
</p><p><font>Apenas por carta datada de 3/7/2007, se dirigiram os Autores à Ré.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Mais alega que o contrato promessa em causa apenas não foi cumprido por culpa exclusiva dos Autores.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Mais requereu a Ré, em tal peça processual, a intervenção principal, como seus associados, dos seus irmãos EE e FF, sucessores do promitente comprador DD, que foi deferido, não tendo os mesmos apresentado qualquer articulado, apesar de regularmente citados.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Os Autores apresentaram réplica, respondendo à nulidade e excepção deduzida, mantendo a posição por si assumida em sede de petição inicial.</font><br>
</p><p><font>Mais invocaram em sede de réplica a nulidade do contrato promessa em causa, por o mesmo não se mostrar assinado pelo promitente comprador, alegando que apenas com a junção do contrato pela R. aos autos ficaram a saber que o mesmo não foi assinado por DD.</font><br>
</p><p><font>Impugnam ainda a versão apresentada pela Ré que fundamenta o pedido reconvencional</font><br>
</p><p><font>Pugnam a final pela improcedência do pedido reconvencional. </font><br>
</p><p><font>Foi dispensada a realização de audiência prévia. </font><br>
</p><p><font>Foi admitido o pedido reconvencional.</font><br>
</p><p><font>Foi julgada improcedente a invocada exceção de ineptidão da petição inicial e foi julgado prejudicado o conhecimento da invocada exceção de ilegitimidade, face à intervenção de terceiros. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a competência do tribunal; a inexistência de nulidades que afetem todo o processado; a legitimidade, personalidade e a capacidade judiciária das partes.</font><br>
</p><p><font>Verificou-se a inexistência de quaisquer outras nulidades, exceções ou questões prévias, que obstem ao conhecimento da causa.</font><br>
</p><p><font>O Tribunal fixou o objeto do litígio e enunciou dos temas da prova.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Procedeu-se a julgamento e, a final, foi proferida Sentença onde se decidiu o seguinte: </font>
</p><p><font>«</font><i><font>1) Por todo o exposto, e com base nas citadas disposições legais, julgo a presente acção parcialmente procedente por parcialmente provada e, em consequência:</font></i>
</p><p><i><font>A - Condeno a Ré CC a reconhecer o direito de propriedade dos Autores AA e BB. sobre a fracção autónoma designada pela letra</font></i>
</p><p><i><font>E”, correspondente ao 2.º andar direito, do prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., na freguesia ..., concelho ..., descrito sob o n.º ...7 da freguesia ..., na ... Conservatória do Registo Predial ..., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...03, da referida freguesia;</font></i>
</p><p><i><font>B - Absolvo a Ré dos demais pedidos contra si deduzidos.</font></i>
</p><p><i><font>2) Por todo o exposto, e com base nas citadas disposições legais, julgo a Reconvenção improcedente por não provada e, em consequência absolvo os Autores dos pedidos contra si deduzidos</font></i><font>».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Inconformados com esta decisão, vieram os autores interpor recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa decidido </font><i><font>“Julgar improcedente o recurso interposto pelos AA. mantendo-se em consequência a Sentença proferida nos autos”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7. </font></b><font>Novamente inconformados, vieram os autores,</font><b><font> AA</font></b><font> e </font><b><font>BB</font></b><font>, nos termos do disposto noS artigos 637.º, 638.º, n.º 1, 639.º, n.ºs 1 e 2, al. </font><i><font>c), </font></i><font>671.º, n.ºs 1 e 3, 672.º, n.º 1, al</font><i><font>. c),</font></i><font> e 674.º, n.º 1, al. </font><i><font>a),</font></i><font> todos do Código de Processo Civil (CPC), interpor recurso de Revista Excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«</font><b><font>A.</font></b><font> O regime do contrato promessa está submetido ao princípio da equiparação, aplicando-se em geral ao contrato promessa os requisitos e efeitos do contrato prometido. </font>
</p><p><b><font>B.</font></b><font> Nos termos do disposto no n.º 2 do art. 410.º do Cód. Civil, o contrato promessa de compra e venda de imóveis só é validamente celebrado se constar de documento assinado por ambas as partes. </font>
</p><p><b><font>C.</font></b><font> O contrato promessa de compra e venda em causa nos autos encontra-se assinado exclusivamente pelo promitente vendedor. </font>
</p><p><b><font>D.</font></b><font> Um contrato promessa de compra e venda, por natureza bilateral e sinalagmático, assinado por um só promitente é nulo por inobservância da forma legal. </font>
</p><p><b><font>E.</font></b><font> A doutrina e jurisprudência divergem como à forma de aproveitamento daquele contrato nulo. </font>
</p><p><b><font>F.</font></b><font> No Acórdão recorrido apontou-se o caminho da redução do contrato (cf. art. 292.º do CC) </font>
</p><p><b><font>G.</font></b><font> Já no Acórdão fundamento, na esteira do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 29-11-89, a solução eleita passou pela consagração da tese da conversão do contrato (cf. art. 293.º do CC). </font>
</p><p><b><font>H.</font></b><font> A aplicação de um ou de outro instituto tem gravosas implicações quanto ao ónus de alegação e de prova dos respetivos pressupostos de aplicação. </font>
</p><p><b><font>I.</font></b><font> No que se refere à aplicação do regime da conversão, a parte não subscritora do contrato-promessa, interessada na validade da promessa em termos de unilateralidade, terá de alegar e provar os requisitos gerais da conversão – art. 293.º do CC. </font>
</p><p><b><font>J.</font></b><font> O que não aconteceu nos presentes autos. </font>
</p><p><b><font>K.</font></b><font> O Tribunal não pode conhecer oficiosamente da conversão do contrato. </font>
</p><p><b><font>L.</font></b><font> A Ré nunca suscitou a questão da conversão do contrato promessa nulo, estando o tribunal </font><i><font>a quo </font></i><font>impedido de suscitar e apreciar a possibilidade de recorrer à conversão ou redução do contrato promessa declarado nulo. </font>
</p><p><b><font>M.</font></b><font> O instituto da conversão é o que melhor realiza a justiça no caso concreto. </font>
</p><p><b><font>N.</font></b><font> A Ré não alegou, e muito menos provou, qualquer facto que permita supor que as partes teriam pretendido a validade da promessa unilateral se tivessem antecipado a nulidade da promessa bilateral entre si celebrada. </font>
</p><p><b><font>O.</font></b><font> Não se verificam, no caso concreto, os requisitos exigidos no art. 293.º do CC, não podendo o contrato promessa em crise valer como promessa unilateral de venda, por força da aplicação do instituto da conversão. </font>
</p><p><b><font>P. </font></b><font>Face à nulidade do contrato promessa de compra e venda e à impossibilidade de o mecanismo da conversão (e da redução!) operar no caso concreto, a Ré carece de título que legitime a recusa da restituição da fração reivindicada. </font>
</p><p><b><font>Q.</font></b><font> Qualquer que seja o instituto aplicável, o recurso aos ditamos da boa-fé funciona como válvula de escape da realização de justiça. </font>
</p><p><b><font>R.</font></b><font> A conduta dos Recorrentes, ao invocarem a nulidade do contrato, ainda que depois de pretenderem ver concretizado o negócio com a Recorrida, não viola o princípio da boa-fé, antes visou a resolução expedita do litígio. </font>
</p><p><b><font>S.</font></b><font> Os Recorrentes só com a notificação da Contestação adquiriram conhecimento que o contrato promessa nunca haveria sido assinado pelo promitente comprador. </font>
</p><p><b><font>T.</font></b><font> O comportamento da Recorrida, ao longo de todo o litígio (extra e judicialmente), configura uma situação de violação dos ditamos da boa-fé, atenta todas as manobras dilatórias utilizadas, que visaram adiar </font><i><font>ad aeternum</font></i><font> (em benefício exclusivo da Recorrida) uma decisão transitada em julgado. </font>
</p><p><b><font>U.</font></b><font> O contrato promessa bilateral em causa nos autos é nulo por falta de observância da forma legal. </font>
</p><p><b><font>V.</font></b><font> Esse contrato não poderá valer como promessa unilateral de venda, face ao não preenchimento dos requisitos do instituto da conversão. </font>
</p><p><b><font>W.</font></b><font> O Acórdão recorrido, ao contrário do entendimento explanado no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 25-11-2003, proc. n.º 03ª3583, relatado por AZEVEDO RAMOS (CF. Acórdão fundamento (doc. 1) o Assento do STJ de 29-11-89, que se debruçou num caso com contornos semelhantes, aplica o instituto da conversão em detrimento do regime da redução. </font>
</p><p><b><font>X.</font></b><font> O Acórdão recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 292.º, 293.º e 410.º, n.º 2, todos do Código Civil. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Nestes termos, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser o Acórdão recorrido revogado e substituído</font></b><font> </font><b><font>por douto Acórdão que:</font></b><font> </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8</font></b><font>. A ré apresentou contra-alegações, nas quais pugna pela manutenção do decidido. </font><br>
</p><p><b><font>9.</font></b><font> A Formação prevista no n.º 3 do artigo 672.º do CPC admitiu o presente recurso de revista excecional, com base no artigo 672.º, n.º 2, al. </font><i><font>c)</font></i><font>, do CPC, em virtude da invocada contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 25-11-2003 (proc. n.º 03A3583). </font><br>
</p><p><font>A questão de direito tratada em ambos os acórdãos, e que tem sido objeto de controvérsia doutrinal e jurisprudencial é a da validade do contrato promessa bilateral, reduzido a escrito, mas assinado apenas por um dos promitentes, na situação presente, apenas assinado pelo promitente-vendedor. A questão reside em saber se à situação dos autos se aplica a redução do negócio jurídico (artigo 292.º do Código Civil), e uma presunção de validade parcial do negócio, tal como decidido pelo acórdão recorrido, ou o instituto de conversão do contrato-promessa nos termos do artigo 293.º do Código Civil, tal como entendeu o acórdão fundamento, cujo ónus de alegação e prova caberia ao interessado na validade.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>10.</font></b><font> Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, a questão a decidir é a da validade do contrato promessa bilateral reduzido a escrito, mas apenas assinado pelo promitente-vendedor.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b>
</p><p><b><font>A - Os factos</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Factos Provados:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1 - Mostra-se inscrita, através da AP. n.º ...59 de 2019-02-01, a propriedade a favor dos Autores, sobre a fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao 2.º andar direito, do prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., na freguesia ..., concelho ..., descrito sob o n.º ...7 da freguesia ..., na ... Conservatória do Registo Predial ..., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...03, da referida freguesia.</font>
</p><p><font>2 - A qual foi por si adquirida, por compra, em 16-04-1982.</font>
</p><p><font>3 - Tendo sido constituída propriedade horizontal sobre o prédio urbano referido em 1), em 26-08-1983.</font>
</p><p><font>4 - Em 05-01-2007 a Caixa Económica declarou autorizar o cancelamento das inscrições hipotecárias n.º C-1, Ap. ...5 de 1982/04/16 e C-2, Ap. ...3 de 1982/06/30, registadas a seu favor na Conservatória do Registo Predial ... 2.ª, mas tão somente quanto às frações autónomas designadas pela letra “B”, “E” e “N”, do prédio urbano descrito na mesma Conservatória sob o número ...47, da Freguesia ....</font>
</p><p><font>5 - Os Autores pagaram a 2.ª prestação do IMI referente ao ano de 2007, relativa à fração autónoma descrita em 1).</font>
</p><p><font>6 - Os Autores prometeram vender a DD, que por sua vez lhes prometeu comprar, a fração autónoma descrita em 1).</font>
</p><p><font>7 - Para o efeito, foi outorgado, em 19 de setembro de 1984, o documento particular, denominado “Contrato de Promessa de Compra e Venda”, do qual consta apenas a assinatura do promitente-vendedor, nos termos do qual o Autor AA, prometeu vender a DD, que prometeu comprar, livre de ónus ou encargos, pelo preço Esc: 3.600.00$00 (três milhões e seiscentos mil escudos), a fração descrita em 1), nos precisos termos constantes de fls. 105 a 105v, cujo teor se dá integralmente por reproduzido. </font>
</p><p><font>8 - Os Autores tomaram conhecimento através da administração do condomínio, “C..., Lda.” que era a Ré quem, juntamente com uma sua filha, genro e neta, residia naquela fração.</font>
</p><p><font>9 - A pedido e em representação dos Autores, foi dirigida e remetida à Ré, que a recebeu, missiva datada de 03-07-2007, cuja cópia se mostra junta a fls. 24, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido, nos termos da qual, foi indagada a disponibilidade da Ré com vista a reunir no escritório do Advogado subscritor de tal missiva, com vista a poder fazer o levantamento da situação, também, jurídica, da posse da fração, que, conforme informação da Administração do prédio, V. Exa habita.</font>
</p><p><font>10 - Em julho de 2007 teve lugar uma reunião entre, pelo menos, o Autor marido e a Ré, na qual esta mostrou interesse em adquirir a fração em causa, desde que conseguisse obter empréstimo bancário para o efeito,</font>
</p><p><font>11 - Mais informando que iria falar com os seus irmãos e solicitou algum tempo para dar uma resposta.</font>
</p><p><font>11A- Com data de 30/10/2007, a pedido e em representação dos Autores, foi dirigida e remetida à Ré, que a recebeu e à qual não apresentou resposta, de onde consta:</font>
</p><p><i><font>“Ultrapassados que estão todos os prazos normais, solicitados, aliás, por v. Exa, com vista a ser encontrada uma solução, acordada, venho, na sequência do nosso último contacto, pessoal, no passado dia 24 e numa derradeira tentativa de resolução extrajudicial deste assunto, apresentar nova proposta para aquisição por v.Exa. da fracção de que sou proprietário (…). Assim, tendo em atenção o interesse, sempre manifestado, de V. Exa. Na aquisição daquela fracção e a regularização imediata do assunto, reduzo para €95.000,00 o valor de €110.000,00 inicialmente pedido para a venda da fracção.</font></i>
</p><p><i><font>Assim, é a seguinte a proposta que agora apresento a V. Exa.:</font></i>
</p><p><i><font>- Preço de venda da fracção: €95.000,00 (noventa e cinco mil euros); - Assinatura imediata do contrato promessa de compra e venda; </font></i>
</p><p><i><font>- Entrega do sinal, no valor de €9.500,00, até 30/11/2007;</font></i>
</p><p><i><font>- Outorga da escritura de compra e venda até 31/1/2008.</font></i>
</p><p><i><font>Fico, pois, a aguardar que até ao próximo dia 8 de Novembro impreterivelmente, seja dada uma resposta a esta minha proposta (…).”</font></i><font>(ponto da matéria de facto aditado pelo Tribunal da Relação, nos termos do artigo 662º, n.º 1, do CPC).</font>
</p><p><font>12 - A pedido e em representação dos Autores, foi dirigida e remetida à Ré, que a recebeu e à qual não apresentou resposta, missiva datada de 13 [por manifesto lapso, na sentença consta 31, o que aqui se rectifica]-11-2007, cuja cópia de mostra junta a fls. 30, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido, nos termos da qual, foi concedido, à Ré, até ao próximo dia 20, me seja dada uma resposta e, caso V. Exa. opte pela aquisição da fração, deverá enviar-me fotocópia dos BI’s e dos Cartões de Contribuinte, do ou dos promitentes compradores.</font>
</p><p><font>Por último, posso informar que o Sr. AA está apto e disponível para outorgar a escritura a todo o momento, quer da fração, aqui em assunto, quer do rés-do-chão esquerdo ou do sexto andar.</font>
</p><p><font>Mais consta desta carta:</font>
</p><p><i><font>“Face à sua total indiferença às minhas várias interpelações escritas, bem como às que o meu cliente, directamente, lhe tem feito, com vista a poder ser regularizada, extrajudicialmente, uma situação que se arrasta há quase 25 anos (…) e da qual, apenas V. Exa. Tem beneficiado, sem quaisquer custos ou encargos, venho, pela última vez, reiterar a proposta que lhe foi apresentada na carta (…) datada de 30.10.2007, com as seguintes alterações:</font></i>
</p><p><i><font>- Preço de venda da fracção: €90.000,00;</font></i>
</p><p><i><font>- Assinatura imediata do Contrato de promessa de compra e venda; - Entrega do sinal (5%), no valor de €4.500,00 até 31.12.2007;</font></i>
</p><p><i><font>- Outorga da escritura de compra e venda até 31.03.2008.</font></i>
</p><p><i><font>Não obstante, V. Exa., ter, sempre, afirmado o seu interesse na aquisição da fracção, o meu cliente apresenta, em, alternativa, a seguinte proposta: </font></i>
</p><p><i><font>- pagamento a V. Exa. da quantia correspondente a 10 vezes o valor entregue pelo Sr. DD, a título de sinal, como contrapartida da entrega da fracção, livre de pessoas e bens, até 31.03.2008”</font></i><font> (redacção da matéria de facto aditado nos termos do art.º 662º, n.º 1 do Código de Processo Civil, conforme fundamentação infra).</font>
</p><p><font>13 - Por missiva datada de 30 de novembro de 2007, cuja cópia se mostra junta a fls. 33 e cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido, que o Autor marido remeteu à Ré, que a recebeu e à qual não apresentou resposta, além de lhe ter apresentado propostas com vista à resolução amigável do diferendo, conclui do seguinte modo:</font>
</p><p><i><font>“Se nenhuma destas propostas a senhora aceitar, fica desde já resolvido o contrato promessa de compra e venda do 2.º andar direito assinado com o Sr. DD, colocando à disposição dos seus herdeiros o dobro do sinal que eu recebi e tudo o que de lei lhes der direito. (…).”</font></i>
</p><p><font>Mais constava desta carta:</font>
</p><p><i><font>“Acabei de ser informado (…) da carta que (…) enviou no dia 28 de Novembro. Não quero deixar, no entanto, de lhe dizer que o contrato promessa foi feito com o seu pai, aceito que o Sr. DD seria o seu pai, creio que no ano de 1983. A seu pedido, deixei-o ir para o andar contra o pagamento de uma renda mensal de Esc. 20 000$00 até fazer-se a escritura, mas que nunca me foi paga. Penso que em 1985, o Sr. DD pediu um empréstimo ao Banco para fazer a escritura, mas que nunca foi feita, porque estava no andar sem pagar nada.</font></i>
</p><p><i><font>Há uma situação que se arrasta desde 1983 e que tem de ser resolvida agora de uma vez por todas. (…) quero propor o seguinte: a venda do andar por €90.0000,00, assinatura do contrato promessa de compra e venda até ao fim do ano, com a entrega do sinal de apenas €500,00, a escritura a fazer-se até 31 de Maio de 2008.</font></i>
</p><p><i><font>Quero dizer que vendo o andar por aquele preço, quer à D. CC quer a qualquer seu familiar. No caso de não querer comprar o andar, dou-lhe €25.000,00, mas tem de desocupar o andar até ao fim de Março de 2008.”</font></i><font> (redação da matéria de facto aditada pelo Tribunal da Relação, nos termos do artigo 662º, n.º 1, do CPC).</font>
</p><p><font>14 - Com a assinatura do acordo referido em 7), DD entregou ao Autor marido a quantia de Esc: 200.000,00 (correspondente a novecentos e noventa e sete euros e sessenta cêntimos), a título de sinal e princípio de pagamento.</font>
</p><p><font>15 - Por força daquele acordo, DD obrigou-se a reforçar o referido sinal, até ao dia 5 de outubro de 1984, pelo montante de Esc: 800.000,00 (correspondente a três mil e novecentos e noventa euros e trinta e oito cêntimos), obrigação que cumpriu, tendo entregue ao autor marido, cheque visado n.º ...78, emitido em 04 de outubro de 1984.</font>
</p><p><font>16 - Tendo em vista a celebração da escritura pública de compra e venda prometida, em fevereiro de 1985 DD solicitou e obteve, junto do então Banco 1..., um empréstimo bancário no montante de capital de Esc: 2.400.000$00 (correspondente a onze mil e novecentos e setenta e um euros e quinze cêntimos), para pagamento do remanescente do preço da fração autónoma prometida comprar.</font>
</p><p><font>17 - DD promoveu e custeou o registo de aquisição provisória a seu favor da fração autónoma designada pela letra “E”, bem como o registo provisório da hipoteca voluntária a favor do Banco 1..., para garantia do pagamento do referido capital de Esc: 2.400.000$00 (correspondente a onze mil e novecentos e setenta e um euros e quinze cêntimos), tendo em vista a celebração da escritura de compra e venda prometida, cujos atos se mostram registados através das inscrições ... e ..., relativas às Apresentações n.º...4 e ...5 de 22-02-1985.</font>
</p><p><font>18 - Pelo menos em meados do ano de 1985, os Autores entregaram, as chaves da fração autónoma designada pela letra “E” a DD, que passou a habitar a mesma, com autorização e aceitação dos Autores. </font>
</p><p><font>19 - Ficou estabelecido no acordo referido em 7) que a escritura pública destinada a concretizar a promessa de compra e venda aí referida seria celebrada no prazo de 6 meses a contar da data da celebração do referido contrato promessa, não ficando estipulado a quem incumbiria proceder à marcação de escritura (redação aditada nos termos do artigo 662º, n.º 1 do CPC).</font>
</p><p><font>20- A Ré fixou a sua habitação permanente na fração referida em 1), onde continua a residir.</font>
</p><p><font>21 - DD e a Ré são reconhecidos pelos vizinhos e amigos como donos da fração referida em 1).</font>
</p><p><font>22 - DD, desde a data referida em 18), e a Ré desde de data não apurada, residiram de forma permanente na fração referida em 1) sem oposição dos Autores ou de quem quer que fosse, na convicção de não violarem o direito de outrem.</font>
</p><p><font>23 - DD faleceu a .../.../1994, no estado civil de viúvo. </font>
</p><p><font>24 - A Ré e os intervenientes FF e EE são filhos de DD, natural do .... </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Factos não provados</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1 - Os Autores residem, desde meados do ano 1985, em ....</font>
</p><p><font>2 - Os autores têm sido interpelados por pessoas interessadas na aquisição da fração referida em 1).</font>
</p><p><font>3 - Circunstâncias e contrariedades várias, quer do DD, quer dos Autores, não permitiram que fosse outorgada a escritura de compra e venda no prazo acordado em 6).</font>
</p><p><font>4 - Os Autores interpelaram DD por diversas vezes, pessoalmente, com vista à outorga da escritura de compra e venda. </font>
</p><p><font>5 - Nas circunstâncias referidas em 9) a Ré recusou fazer prova da sua qualidade de filha de DD.</font>
</p><p><font>6 - Munido da certidão registral com as inscrições referidas em 17), bem como dos demais documentos respeitantes à sua identificação, DD procurou os Autores para celebrarem a escritura de compra e venda, pessoas que, no entanto, aquele nunca mais encontrou.</font>
</p><p><font>7 - DD procurou obter informações sobre o paradeiro dos autores junto de outras pessoas que habitavam o prédio e que igualmente haviam prometido comprar as frações em que residiam.</font>
</p><p><font>8 - Contudo, nenhum dos demais residentes em questão sabia do paradeiro dos Autores, encontrando-se os mesmos em situação análoga à de DD.</font>
</p><p><font>9 - A Ré passou a residir na fração dos autos nas circunstâncias de tempo e modo referidas em 18).</font>
</p><p><font>10 - Desde meados de 1985 que era desconhecido o paradeiro dos Autores por parte de DD que tentou obtê-lo, o que impossibilitou a celebração da escritura pública do contrato de compra e venda.</font>
</p><p><font>11 - Os Autores mantiveram-se ausentes em parte incerta desde meados de 1985 até à data referida em 9), não tendo estabelecido, ou tentado estabelecer qualquer contacto com a Ré ou DD.</font>
</p><p><font>12 - A escritura pública de compra e venda no prazo estabelecido no acordo referido em 7), não foi celebrada no prazo aí estabelecido, nem posteriormente, exclusivamente pelo facto dos Autores, no início do ano de 1995, haverem desaparecido para parte incerta e terem apenas aparecido no mês de julho de 2007.</font>
</p><p><font>13 - Os Autores não ficaram com cópia ou fotocópia do acordo referido em 7), contendo a assinatura de DD, ficando apenas a saber, com a junção aos autos.</font>
</p><p><font>14 - A Ré sempre residiu na fração referida em 1) com conhecimento e consentimento dos Autores.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>B – O Direito</font></b>
</p><p><b><font>1</font></b><font>. Os recorrentes entendem que um contrato promessa de compra e venda, por natureza bilateral e sinalagmático, assinado apenas por uma das partes, </font><i><font>in casu</font></i><font>, o promitente vendedor, é nulo por falta de forma. Sustentam que a nulidade só pode ser suprida pela figura da conversão (artigo 293.º do Código Civil) e não pelo instituto da redução (artigo 292.º do Código Civil), como decidiu o acórdão recorrido. Prosseguem o seu raciocínio, sustentando que, uma vez que a Ré não alegou nem provou qualquer facto que permita supor que as partes teriam pretendido a validade da promessa unilateral caso tivessem antecipado a nulidade da promessa bilateral entre si celebrada, não poderá o contrato promessa em crise valer como promessa unilateral de venda, por força da aplicação do instituto da conversão, por falta de verificação dos requisitos exigidos no artigo 293.º do Código Civil. Em consequência, sendo o contrato totalmente nulo, a Ré careceria de título que legitimasse a recusa da restituição da fração reivindicada. </font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> O contrato-promessa está definido no Código Civil como sendo </font><i><font>“a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato</font></i><font>” (410º, n.º 1, do Código Civil), designando-se este último por contrato prometido. Trata-se de um verdadeiro contrato e não de um mero acordo preparatório ou preliminar que obriga à futura celebração de um outro contrato determ | [0 0 0 ... 0 1 1] |
JDFXu4YBgYBz1XKvJfdv | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font> </font>
<p><font>Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>DR. JOAQUIM CHAVES - LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS, S.A., </font></b><font>Autora nos presentes autos, tendo sido notificada do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, veio requerer a redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 7º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais, com os seguintes fundamentos, que agora se transcrevem:</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«Resulta do D. Acórdão proferido por Vexas. que é perfilhada a orientação jurisprudencial que atribui a esse Supremo Tribunal de Justiça a apreciação dos pedidos de dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça em todas as instâncias.</font>
</p><p><font>O presente pedido de redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida é tempestivo, de acordo com a orientação jurisprudencial perfilhada no D. Acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2022, proferido em sede de recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, publicado na 1.ª série do Diário da República do dia 3 de Janeiro de 2022, nos termos da qual, </font><i><font>“A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo.”</font></i>
</p><p><font>Conforme reconhecido no D. Acórdão proferido, as questões de direito analisadas por esse Venerando Tribunal e pelo Tribunal da Relação de Lisboa relativas aos pressupostos da responsabilidade civil contratual não revestiram especial complexidade.</font>
</p><p><font>A conduta das partes norteou-se por boa fé na litigância. </font>
</p><p><font>A condenação parcial dos Réus nos pedidos implica o decaimento da Autora, ora recorrida, pelo que foi condenada no pagamento das custas na proporção desse decaimento.</font>
</p><p><font>Assim, por uma questão de igualdade relativamente ao determinado no D. Acórdão proferido por esse Venerando Tribunal para os Réus, requer-se a Vexas. se dignem determinar:</font>
</p><p><font>- a redução da taxa de justiça a cargo da Autora em 50% no Tribunal da Relação e no Supremo Tribunal de Justiça;</font>
</p><p><font>- a redução de 25% do remanescente da taxa de justiça a cargo da Autora no Tribunal de primeira instância.</font>
</p><p><font>O D. Acórdão desse Venerando Supremo Tribunal foi proferido em 6 de Dezembro de 2022, tendo sido notificado às partes no dia seguinte, pelo que ainda não transitou em julgado, sendo o presente pedido de redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida tempestivo. </font>
</p><p><b><font>Termos em que, de harmonia com o decidido sobre esta questão relativamente aos Réus, requer-se a Vossas Excelências se dignem determinar a redução da taxa de justiça a cargo da Autora em 50% no Tribunal da Relação e no Supremo Tribunal de Justiça e a redução de 25% do remanescente da taxa de justiça a cargo da Autora no Tribunal de primeira instância, com as legais consequências».</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> O Acórdão que decidiu sobre o mérito da presente causa, datado de 6 de dezembro de 2022, decidiu em relação aos réus, a seu pedido na alegação do recurso de revista, a redução do remanescente da taxa de justiça em 50% no Tribunal da Relação e no Supremo Tribunal de Justiça e a redução em 25% no tribunal de 1.ª instância, conforme consta do seu dispositivo:</font>
</p><p><i><font>« </font></i><b><i><font>III – Decisão</font></i></b>
</p><p><i><font>Pelo exposto, decide-se na 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: </font></i>
</p><p><i><font>a) conceder parcialmente a revista, revogando a decisão do Tribunal da Relação quanto a custas, condenando-se ambas as partes pelas custas na apelação na proporção do respetivo decaimento;</font></i>
</p><p><i><font>b) manter, no mais, o acórdão recorrido;</font></i>
</p><p><i><font>c) decretar uma redução de 50% do remanescente da taxa de justiça, a cargo dos réus, no Supremo Tribunal de Justiça e na Relação.</font></i>
</p><p><i><font>e) decretar uma redução de 25% do remanescente da taxa de justiça, a cargo dos réus, no tribunal de 1.ª instância.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> No presente processo, o MP, a propósito do pedido dos réus, entendeu o seguinte: </font>
</p><p><font>«</font><i><font>I- Deve ser indeferida a requerida dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente relativamente à 1.ª e 2.ª instâncias; II- Deve dispensar-se o pagamento da taxa de justiça remanescente respeitante à presente instância recursória em 75% daquele valor».</font></i>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Em relação aos réus, este Supremo Tribunal de Justiça já decidiu, no Acórdão de 6 de dezembro de 2022, o pedido de dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça, com o seguinte fundamento: </font><br>
</p><p><i><font>«Dispõe o artigo 7.º, n.º 6, do Regulamento das Custas Processuais: Nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Adotamos a orientação jurisprudencial que entende que compete ao Supremo Tribunal de Justiça conhecer da dispensa da taxa de justiça em todas as instâncias, diferentemente do proposto pelo MP (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. n.º 2104/12.8TBALM.L1.S1; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29-03-2022, proc. n.º 2309/16.2T8PTM.E1-A.S1), cabendo ao último grau de jurisdição apreciação da dispensa/redução da taxa de justiça devida não só nesse órgão (no caso de revista, o Supremo Tribunal de Justiça) mas também na dos graus precedentes, abarcando toda a tramitação.</font></i><br>
</p><p><i><font>No Supremo Tribunal de Justiça, as questões de direito analisadas no Supremo incidiram na qualificação jurídica dos factos e nos pressupostos da responsabilidade civil contratual, questões já muito estudadas pela doutrina e frequentes na jurisprudência e que, por isso, não se revestem de especial complexidade ou controvérsia. A conduta das partes norteou-se por boa fé na litigância. Todavia, entendemos que não há motivo para uma dispensa da totalidade da taxa de justiça, nem sequer para uma redução da taxa de justiça em 80% conforme requerem os recorrentes, uma vez que foram elaborados dois acórdãos: o primeiro a decidir a qualificação jurídica dos factos e a reenviar o processo para a Relação aplicar o direito aos factos; o segundo a conhecer da aplicação do direito feita pelo Tribunal da Relação e das demais questões elencadas neste acórdão e que integram a presente revista. </font></i><br>
</p><p><i><font>Esta análise, em relação ao Supremo Tribunal de Justiça, vale também para a fase da apelação. </font></i><br>
</p><p><i><font>Assim sendo, decide-se por uma redução da taxa de justiça em 50% no Tribunal da Relação e no Supremo Tribunal de Justiça.</font></i><br>
</p><p><i><font>Já em relação à 1.ª instância entendemos que a fixação da matéria de facto foi complexa e trabalhosa pela multiplicidade de documentos a apreciar, pelo que decide-se decretar, em relação ao 1.º grau, uma redução de 25% do remanescente da taxa de justiça».</font></i>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> O momento processual em que a requerente apresentou o pedido – 12 de dezembro de 2022 – foi anterior ao trânsito em julgado do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de dezembro de 2022. Está, por isso, em tempo, nos termos do acórdão uniformizador de jurisprudência, n.º 1/2022, que decidiu que </font><i><font>“[a] preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem lugar, de acordo com o nº 7 do art. 6º do RCP, com o trânsito em julgado da decisão final do processo”.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Adotando a tese segundo a qual o Supremo tem competência para conhecer da dispensa do remanescente da taxa de justiça (cfr. Acórdãos de 20-12-2021, proc. n.º 2104/12.8TBALM.L1.S1, de 29-03-2022, proc. n.º 2309/16.2T8PTM.E1-A.S1 e de 13-09-2022, proc. n.º 799/09.9TBOER.L1.S1), não só no recurso de revista, mas também no tribunal de 1.ª instância e no Tribunal da Relação, decide-se analisar todo o processado anterior e ponderar globalmente todos os parâmetros relevantes em cada uma das fases processuais. </font><br>
</p><p><font>Por razões de igualdade de tratamento, entendemos que os argumentos utilizados para decidir idêntica questão em relação aos réus – quer a lisura do comportamento processual, quer a reduzida complexidade técnico-jurídica da matéria – se aplicam também à autora, pelo que se decide reduzir o remanescente da taxa de justiça nos mesmo termos do que foi decidido para os réus no Acórdão de 6 de dezembro de 2022.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Anexa-se sumário elaborado nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC:</font><br>
</p><p><font>I - O Supremo tem competência para conhecer da dispensa do remanescente da taxa de justiça (cfr. Acórdãos de 20-12-2021, proc. n.º 2104/12.8TBALM.L1.S1, de 29-03-2022, proc. n.º 2309/16.2T8PTM.E1-A.S1 e de 13-09-2022, proc. n.º 799/09.9TBOER.L1.S1), não só no recurso de revista, mas também no tribunal de 1.ª instância e no Tribunal da Relação, analisando todo o processado anterior e ponderando globalmente todos os parâmetros relevantes em cada uma das fases processuais. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>III – Decisão</font></b>
</p><p><font>Pelo exposto, decide-se na 1.ª Secção deste Supremo Tribunal de Justiça:</font>
</p><p><font>a) Decretar uma redução de 50% do remanescente da taxa de justiça, a cargo da autora, no Supremo Tribunal de Justiça e no Tribunal da Relação.</font>
</p><p><font>b) Decretar uma redução de 25% do remanescente da taxa de justiça, a cargo da autora, no tribunal de 1.ª instância.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Supremo Tribunal de Justiça, 31 de janeiro de 2023</font>
</p><p>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora)</font>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto)</font>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2.ª Adjunta)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
JDFYu4YBgYBz1XKvgPhN | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1. AA e BB </font></b><font>intentaram a presente ação declarativa, com processo ordinário, contra</font><b><font> V.... e Sociedade Agrícola Serra do Loureiro, S.A., </font></b><font>peticionando que sejam estas solidariamente condenadas a pagar-lhes o montante total de € 101.000,00, acrescido de juros de mora desde a citação e até integral pagamento, sendo € 55.000,00 para a A. e € 46.000,00 para o A., a título de danos não patrimoniais por cada um sofridos, bem como dos provocados no falecido CC.</font><br>
</p><p><font>Fundamentaram a sua pretensão nos prejuízos não patrimoniais para ambos havidos, e nos danos não patrimoniais sofridos pelo seu falecido marido e pai, em virtude de queda por este sofrida quando participava numa caçada ao javali na zona de caça explorada pela segunda R., da qual resultaram ferimentos que lhe vieram a provocar a morte. Mais alegam que o referido acidente se deveu à circunstância de não terem sido garantidas, de forma adequada, pela segunda R., as condições de segurança para a prática daquela atividade, tendo o mesmo ficado a dever-se à falta de cuidado dos seus responsáveis na montagem da torre de onde o falecido veio a cair, e que a responsabilidade civil por danos ocasionados na prática da caça, no local em causa, se encontrava transferida para a primeira R., por contrato de seguro celebrado com aquela.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>2. </font></b><font>Devidamente citadas, ambas as RR. contestaram.</font><br>
</p><p><font>Quanto à R. seguradora alegou a celebração, com a segunda R., do contrato de seguro mencionado na petição inicial, titulado pela apólice n° ...19, mas referiu que, à data do acidente, a exploração cinegética da Herdade ... pertencia a dois particulares, DD e EE, pertencendo a estes toda a responsabilidade, bem como toda a organização relativa à prática da caça. Mais alegou que a torre de onde o falecido caiu foi construída pelo referido DD, contrariando a proibição constante do contrato de compra e venda da zona de caça, e que o mesmo informou expressamente o sinistrado de que não lhe era permitida a subida à referida torre/palanque. Por outro lado, alega que inexiste nexo de causalidade entre os ferimentos sofridos pelo sinistrado em consequência da queda e a pneumonia que veio a contrair e que foi causa da sua morte. Conclui no sentido de que a acção deve improceder, pelo se impõe, consequentemente, a sua absolvição do pedido.</font><br>
</p><p><font>Por sua vez, a R. Sociedade Agrícola alegou, na sua contestação, que na data do acidente não explorava a zona de caça de que era concessionária, por ter vendido a DD e a EE o direito de exercer a exploração cinegética no local em apreço, tendo tal acordo produzido efeitos entre 01.03.2005 e 01.03.2006. Para além do mais, em tal contrato de compra e venda ficou expressamente estipulada a proibição de serem construídos palanques ou andaimes na zona de caça, sendo ainda certo que desconhece, sem obrigação de saber, as circunstâncias do alegado acidente sofrido pelo familiar dos AA., não sendo responsável pela sua verificação. Aduz ainda que não resulta do certificado de óbito junto pelos AA. que a morte de CC haja ocorrido na sequência da queda descrita na petição inicial.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>3. </font></b><font>Os AA. apresentaram réplica, na qual, entre o mais, reiteram que a responsabilidade pela indemnização dos danos reclamados na petição inicial cabe à R. Seguradora, por força do referido contrato de seguro que celebrou com a R. Sociedade Agrícola. Por outro lado, em tal articulado, os AA. mencionaram, além da apólice n° ...84, a apólice n° ...19, requerendo a notificação da R. Seguradora para juntar ambas aos autos, mas isso porque esta última, na sua contestação, tinha mencionado (por mero lapso), que o contrato de seguro celebrado com a R. Sociedade Agrícola Serra do Loureiro, S.A. era titulado pela última apólice. Não obstante, com a junção aos autos dessas duas apólices, os AA. pretendiam comprovar a celebração do contrato de seguro entre a R. Seguradora e a R. Sociedade Agrícola Serra do Loureiro, S.A. em que fundamentavam a pretensão formulada contra aquela.</font><br>
</p><p><font>Além disso, os AA., face às dúvidas existentes quanto ao real titular do direito de exploração cinegética da Herdade em causa - levantadas nas contestações de ambas as RR. - vieram requerer, ao abrigo do disposto nos arts. 325° a 329° do CPC (CPC, na versão anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n°41/2013, de 26 de Junho), a intervenção principal provocada de DD e EE, como responsáveis e sujeitos passivos da obrigação de indemnizar os AA. pelos factos já elencados na petição inicial.</font><br>
</p><p><font>Não tendo sido manifestada, pelas RR., qualquer oposição à requerida intervenção provocada, e constatada a respetiva admissibilidade legal, foi a mesma deferida, por despacho de 18/2/2009, e determinada a citação dos chamados.</font><br>
</p><p><font>Devidamente citados, ambos os chamados apresentaram contestação.</font><br>
</p><p><b><font>O EE </font></b><font>consignou, em síntese, que celebrou com a segunda R. o contrato de compra e venda da exploração da zona de</font><b><font> </font></b><font>caça e que, na altura do acidente, se encontrava de férias, tendo sido o chamado DD quem organizou a caçada ao javali, sendo que a torre de onde o sinistrado caiu tinha sido construída por aquele, para seu uso exclusivo, e o sinistrado devidamente advertido pelo mesmo de que não lhe era permitido o acesso a tal local. Acrescenta ainda que inexiste nexo de causalidade entre a morte do sinistrado, devida a pneumonia, e a queda da estrutura nas condições descritas na petição inicial.</font><br>
</p><p><font>Quanto ao </font><b><font>DD</font></b><font>, alegou, em resumo, que o contrato que, em conjunto com </font><b><font>EE</font></b><font>, celebrou com a segunda R., nos termos do qual compraram a esta o direito de exploração cinegética da Herdade ... é materialmente inválido, por violação do regime regulamentar aplicável, pelo que é a referida R. a única responsável pelo acidente descrito na petição inicial, tal como a R. seguradora, nos termos do acordo de seguro entre ambas celebrado. A não ser assim entendido, sempre a responsabilidade pelos danos alegadamente decorrentes do acidente pertence à R. seguradora, dado que entre esta e os chamados igualmente foi celebrado um contrato de seguro (apólice n° ...08) que cobria os riscos decorrentes da prática cinegética no local em apreço. Por fim, alega que inexiste nexo de causalidade entre a morte que sobreveio ao sinistrado, em consequência de pneumonia, e as lesões que sofreu com a queda da estrutura existente no local da caçada.</font><br>
</p><p><font>Foi oportunamente realizada audiência preliminar, no âmbito da qual se proferiu despacho saneador, declarando-se a competência do tribunal, em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia, a inexistência de nulidades ou questões prévias, e se reconheceu a personalidade e capacidade judiciárias das partes, bem como a sua legitimidade, tendo aí sido fixado o valor da causa. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Procedeu-se ainda à fixação da matéria de facto assente e à seleção, na base instrutória, da matéria controvertida, as quais não foram objeto de reclamação pelas partes.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> De seguida veio a ser realizada a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença que julgou a presente ação parcialmente procedente, por provada e, em consequência:</font><br>
</p><p><font>«1. Absolveu a R. Sociedade Agrícola dos pedidos contra si deduzidos pelos AA.;</font><br>
</p><p><font>2. Condenou solidariamente a R. seguradora e os intervenientes DD e EE a pagar aos AA. as seguintes quantias, a que acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a presente data e até integral pagamento:</font><br>
</p><p><font>a) € 45.000,00 pelos danos não patrimoniais causados a CC (€ 5.000,00 + € 40.000,00);</font><br>
</p><p><font>b) € 9.000,00 a cada um dos AA., pelos danos não patrimoniais por cada um sofridos (€ 9.000,00 x 2 = € 18.000,00)».</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>6. </font></b><font>Inconformados com tal decisão dela apelaram os AA., a R. seguradora e os intervenientes DD e EE, tendo sido proferido Acórdão no tribunal da Relação de Évora, datado de 11/5/2017, no qual foi anulada a sentença recorrida, a fim de serem dadas novas respostas aos quesitos 16° a 18° e 18°A (requisitando-se previamente documentos para ser complementada a prova pericial) e determinando-se a realização de novo julgamento em conformidade com o acima explanado (sendo que, na nova audiência a realizar, sempre as partes, querendo, podiam requerer e apresentar novas provas que viessem a complementar ou infirmar a referida prova pericial).</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><font>Tendo os autos baixado ao tribunal de 1.ª instância, foi solicitado relatório pericial complementar (juntando-se o relatório de autópsia de CC necessário para esse efeito) e, uma vez junto aos autos tal relatório complementar, a Juíz "a quo" proferiu despacho em que determinou - sem mais - que não se impunha a realização de quaisquer outras diligências de prova, bem como ordenou que as partes proferissem as suas alegações por escrito, sendo que, de seguida, proferiu, de imediato, a respetiva sentença (concluindo-se que não veio a ser realizado, afinal, o novo julgamento no tribunal "a quo", em conformidade com aquilo que havia sido previamente determinado no aresto supra referido proferido nesta Relação...).</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> Ora, na mencionada sentença que proferiu, a Juíza "a quo" veio a julgar a presente ação parcialmente procedente, por provada e, em consequência:</font>
</p><p><font>1. Absolveu a R. Sociedade Agrícola dos pedidos contra si deduzidos pelos AA.;</font><br>
</p><p><font>2. Condenou solidariamente a R. seguradora e os intervenientes DD e EE a pagar aos AA. as seguintes quantias, a que acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a presente data e até integral pagamento:</font><br>
</p><p><font>a) € 45.000,00 pelos danos não patrimoniais causados a CC (€ 5.000,00 + € 40.000,00);</font><br>
</p><p><font>b) € 9.000,00 a cada um dos AA., pelos danos não patrimoniais por cada um sofridos (€ 9.000,00 x 2 = € 18.000,00).</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> Novamente inconformados com tal decisão dela apelaram os AA., a R. seguradora e os intervenientes DD e EE, tendo sido proferido acórdão no Tribunal da Relação de Évora, datado de 31/1/2019, no qual foi anulada a sentença recorrida (uma vez que apenas veio a ser elaborado o relatório pericial complementar junto a fls.731, por a Julgadora "a quo" ter determinado - por despacho datado de 30/5/2018 - que não se impunha a realização de quaisquer outras diligências de prova), ordenando-se a notificação das partes para, querendo, face ao teor do mencionado relatório pericial complementar de fls.731, apresentarem as provas tidas por pertinentes e necessárias à descoberta da verdade e, de seguida, ser designada uma data para a realização de nova audiência de julgamento, na qual – se outras provas não forem requeridas – deverá ser inquirida, oficiosamente, a médica que elaborou os dois mencionados relatórios periciais (quer o de fls.335/336, quer o de fls.731) - Dra. FF - a fim de esclarecer todo o circunstancialismo fáctico a que se alude a fls. 28 de tal aresto e, no final, ser dada a palavra aos ilustres mandatários das partes para produzirem as respetivas alegações orais (de acordo, aliás, com o disposto no art.604° n°5 do C.P.C.).</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>9. </font></b><font>Baixando os autos à 1.ª instância foi então cumprido o que havia sido determinado no aresto </font><i><font>supra</font></i><font> referido (datado de 31/1/2019), realizando-se novo julgamento em conformidade, findo o qual veio a ser proferida uma nova sentença pela Juíza "a quo", onde a presente ação foi julgada parcialmente procedente, por provada e, em consequência:</font><br>
</p><p><font>1. Absolveu a R. Sociedade Agrícola dos pedidos contra si deduzidos pelos AA.;</font>
</p><p><font>2. Condenou solidariamente a R. seguradora e os intervenientes DD e EE a pagar aos AA. as seguintes quantias, a que acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a presente data e até integral pagamento:</font><br>
</p><p><font>a) € 45.000,00 pelos danos não patrimoniais causados a CC (€ 5.000,00 + € 40.000,00);</font><br>
</p><p><font>b) € 9.000,00 a cada um dos AA., pelos danos não patrimoniais por cada um sofridos (€ 9.000,00 x 2 = € 18.000,00).</font><br>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>10. </font></b><font>Mais uma vez inconformados com tal decisão, dela apelaram os AA., a R. seguradora e os intervenientes DD e EE, tendo o Tribunal da Relação de Évora decidido o seguinte:</font>
</p><p><b><font>«</font></b><font>Pelo exposto, e em jeito de conclusão - após a apreciação e análise de todos os (quatro) recursos interpostos para esta Relação -resulta claro que a sentença recorrida não se poderá manter, "in totum", revogando-se a mesma em conformidade e, por via disso, decide-se:</font>
</p><p><font>1 - Condenar o interveniente/chamado, DD, a pagar<br>
aos AA., AA e BB, as seguintes quantias, a<br>
que acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a presente data e até<br>
integral pagamento:</font>
</p><p><font>a) € 60.000,00 pelos danos não patrimoniais causados a CC (€ 10.000,00 + € 50.000,00);</font>
</p><p><font>b) € 20.000,00 à A. e € 12.500,00 ao A., pelos danos não patrimoniais sofridos por cada um deles (€ 20.000,00 + e 12.500,00 = € 32.500,00).</font><br>
</p><p><font>2 - Absolver a R. Sociedade Agrícola Serra do Loureiro, S.A., a R.<br>
V.... e o interveniente/chamado EE<br>
dos pedidos contra si deduzidos pelos AA., AA e<br>
BB».</font><br>
</p><p><font>O acórdão terminou com o seguinte dispositivo: </font><br>
</p><p><i><font>«Pelo exposto acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelos AA. AA e BB, procedente o recurso de apelação interposto pela R. V..., improcedente o recurso de apelação interposto pelo chamado DD e procedente o recurso de apelação interposto pelo chamado EE e, em consequência, revoga-se a sentença proferida pela Julgadora "a quo" nos exactos e precisos termos acima explanados.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas em partes iguais pelos AA. e pela R. seguradora, face às posições sustentadas e que não obtiveram vencimento (sufragadas pelos AA. nas alegações e contra alegações de recurso e pela R. seguradora nas contra alegações de recurso), e ainda pelo chamado DD, atenta a improcedência do seu recurso (sem prejuízo do apoio judiciário de que este último é beneficiário)».</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><b><font>11</font></b><font>. É contra este acórdão que os autores e o interveniente/chamado, DD, interpõem recurso de revista. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>12.</font></b><font> A Seguradora Ré, V..., interpõe recurso de revista subordinado, restringido ao segmento decisório da condenação em custas. </font><br>
</p><p><b><font>I – Conclusões do Recurso dos autores - AA e de BB:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«19.1. O presente recurso de revista vem interposto dos segmentos do Acórdão sob censura, proferido em 17.06.2021 pela Relação de Évora, em que é parcialmente revogada a decisão de 1ª instância de condenação do interveniente/chamado EE e da Ré V..., S. A., esta na qualidade de segurador do contrato de seguro titulado pela apólice ...08, a pagar aos Autores, ora recorrentes, em regime de solidariedade com o também interveniente/chamado DD, as indemnizações arbitradas para reparar os danos decorrentes da morte do sinistrado CC, absolvendo, em conformidade, o EE e a V..., S. A. dos pedidos contra si deduzidos.</font>
</p><p>
</p><p><font>19.2. Embora no Acórdão sob recurso se tenha concluído, confirmando nesse ponto o decidido em 1ª instância, que a responsabilidade pela ocorrência do sinistro era imputável aos intervenientes/chamados EE e DD, o EE veio a ser absolvido pelo Tribunal “a quo” por este ter atendido a invocação da exceção de prescrição, feita pela 1ª vez, em 2015, pelo EE, nas alegações de um primeiro recurso de mérito para a Relação de Évora;</font>
</p><p>
</p><p><font>19.3. Aquando da invocação da hipotética prescrição, pelo EE, na fase de recurso junto do Tribunal da Relação, havia já precludido o direito de o mesmo deduzir tal exceção perentória, uma vez que não havia feito tal invocação na contestação, como tinha o ónus de fazer, sendo certo ainda que a questão nunca foi suscitada junto do Tribunal inferior, como se confirma consultando todo o processado;</font><br>
</p><p><font>19.4. Por força do princípio da concentração da defesa (artigo 573 do CPC, que corresponde ao artigo 489 do CPC revogado) a prescrição carece, para ser eficaz, de ser invocada por aquele a quem aproveita (artigo 303 do Código Civil), na fase processual apropriada e no instrumento e tempo próprios (artigo 573 do CPC, antes artigo 489 do CPC): ou seja, na contestação – o que não aconteceu - sob pena de preclusão.</font>
</p><p>
</p><p><font>19.5 A arguição da prescrição na contestação impõe-se não só por efeito do princípio da concentração da defesa previsto no artigo 573 do CPC (correspondente ao artigo 489 do CPC revogado) e do princípio da preclusão que o mesmo também consagra ou que dele deriva, mas, ainda, por efeito dos princípios da boa-fé e da lealdade processual e como condição indispensável ao exercício idóneo e pleno do direito ao contraditório pela contraparte, quer no tocante aos aspetos de facto como de direito atinentes à eventual procedência da mesma – direito esse que, no caso, não foi proporcionado de modo pleno aos Autores sobre tal matéria, devido à invocação tardia, extemporânea e fora da fase processual própria, da exceção de prescrição;</font>
</p><p>
</p><p><font>19.6. Esta posição vem sendo reiteradamente seguida pela jurisprudência dos tribunais superiores (ver, entre outros, os Acórdãos do STJ de 06-12-2016, de 29.01.2014, de 01.10.15 e de 11.03.2021, de que são relatores, respetivamente, o Venerando Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, o Venerando Juiz Conselheiro Fernando Bento, a Veneranda Juiz Conselheira Maria dos Prazeres Beleza, todos consultáveis in DGSI.net e a doutrina, supra citada, entre outros, os Profs. José Lebre Freitas e Isabel Alexandre, in Código Processo Civil Anotado, pág. 565 a 568 da 4ª edição, o Código Processo Civil Anotado, a pág. 645 e 646, pelos Sr. Juiz Conselheiro António Abrantes Geraldes e outros, bem como o Sr. Juiz Conselheiro Jubilado Francisco Manuel Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Volume II, 2ª Edição, a págs. 155 a 159);</font>
</p><p>
</p><p><font>19.7. Paradigmaticamente, no Acórdão do STJ, de 11.03.2021, de que é relator a Veneranda Juíz Conselheiro Rosa Tching, citado, diz-se, nos pontos II e III do respetivo sumário, o seguinte:</font>
</p><p><font>«II – “O princípio da concentração da defesa na contestação consagrado no artigo 573, nº1, do CPC (correspondente ao artigo 489 do CPC revogado) faz recair sobre o réu o ónus de, na contestação, alegar factos que sirvam de base a qualquer exceção dilatória ou perentória……, sob pena de preclusão da possibilidade de o fazer posteriormente”;</font><br>
</p><p><font>III – Precludido o direito da ré deduzir as exceções de caducidade da ação e da prescrição do direito de indemnização civil, por não tê-lo feito na contestação e por não se verificar nenhuma das situações excecionais previstas no nº2 do artigo 573 do CPC (antes artigo 489 do CPC) fica o Tribunal impedido de conhecer das invocadas exceções, sob pena de violação do princípio de concentração da defesa”».</font><br>
</p><p>
</p><p><b><font> </font></b><font>19.8. Por outro lado, “os recursos são meios a usar para reapreciação de uma decisão, mas não para obter decisões de questões novas, isto é, de questões que não tenham sido suscitadas perante o tribunal recorrido”, ou, dizendo de outro modo, “os recursos são meios de obter a reponderação das questões anteriormente colocadas e a eventual reforma de decisões dos tribunais inferiores, e não de alcançar decisões novas”;</font>
</p><p>
</p><p><font>19.9. No caso, a questão da eventual prescrição dos direitos dos Autores nunca foi suscitada junto do tribunal de 1ª instância, nem, consequentemente, por este ponderada ou apreciada – tendo, por isso, sido apreciada e decidida “ex-novo”, pelo Tribunal “a quo”, em infração à lei (artigo 627 nº1, antes 676, do CPC);</font>
</p><p>
</p><p><font>19.10. À cautela, sem prescindir, é de sublinhar, ainda, que, no caso, o prazo de prescrição invocável é o de </font><b><font>5</font></b><font> </font><b><font>anos</font></b><font>, previsto no nº3, do artigo 498, do CC e não o de 3 anos, previsto no nº1 do mesmo artigo, dado se encontrarem suficientemente provados factos que permitem que se conclua que ambos os intervenientes/chamados violaram, com negligência, os deveres de cuidado, de prudência e de segurança, a que estavam adstritos e que estamos, por isso, perante um circunstancialismo reveladorda existência de um ilícito criminal, em co-autoria, sendo, para a formulação de um tal juízo, indiferente o que tenha realmente acontecido no plano processual penal;</font><br>
</p><p><font>19.11. À situação mostra-se, por outro lado, aplicável o disposto no artigo 321, nº1, do CC, interpretado nos termos em que o foi no Acórdão do STJ de 4/7/2002, supra citado, pelo menos por analogia, por se tratar de um caso em que os Autores estiveram, pelas razões supra referidas, por efeito de factos próprios dos intervenientes/chamados e da Sociedade concessionária da exploração turística da zona de caça, sem qualquer inércia culposa da sua parte, impossibilitados de saber, ou sequer de suspeitar, até à fase da contestação, que o EEpoderia ser responsabilizável pela reparação dos danos verificados;</font><br>
</p><p><font>19.12. Deveria, assim, o Tribunal “a quo” ter rejeitado a invocada exceção ou ter-se abstido de dela tomar conhecimento, não a acolhendo, e, em conformidade, ter mantido a condenação do EE, em regime de solidariedade pelo menos com o também interveniente/chamado DD, no pagamento das indemnizações arbitradas aos Autores no Acórdão recorrido, impondo-se, agora, a concessão de revista, julgando improcedente a exceção e “repristinando” a decisão proferida em 1ª instância, embora com os novos montantes indemnizatórios fixados pelo Tribunal recorrido.</font><br>
</p><p><br>
</p><p><font>20.1. No tocante ao segmento do Acórdão recorrido que conduziu à absolvição da Ré V..., enquanto titular do contrato de seguro titulado pela apólice ...08, é de sublinhar, antes de mais, que, em todos os relatórios de todas as decisões anteriores à de 17.06.2021 da Relação de Évora, é dito que, na réplica, os Autores “</font><b><font>reiteramquearesponsabilidadepelaindemnização</font></b><font> </font><b><font>dos</font></b><font> </font><b><font>danos</font></b><font> </font><b><font>reclamados</font></b><font> </font><b><font>napetição</font></b><font> </font><b><font>inicial</font></b><font> </font><b><font>cabe</font></b><font> </font><b><font>à</font></b><font> </font><b><font>R.</font></b><font> </font><b><font>Seguradora,</font></b><font> </font><b><font>seja</font></b><font> </font><b><font>por</font></b><font> </font><b><font>força</font></b><font> </font><b><font>do</font></b><font> </font><b><font>contrato</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>seguro</font></b><font> </font><b><font>que</font></b><font> </font><b><font>celebrou</font></b><font> </font><b><font>com</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>R.</font></b><font> </font><b><font>Sociedade</font></b><font> </font><b><font>Agrícola,</font></b><font> </font><b><font>seja</font></b><font> </font><b><font>por</font></b><font> </font><b><font>força</font></b><font> </font><b><font>do</font></b><font> </font><b><font>contrato</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>seguro</font></b><font> </font><b><font>que</font></b><font> </font><b><font>igualmente</font></b><font> </font><b><font>celebrou</font></b><font> </font><b><font>com</font></b><font> </font><b><font>DD</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>EE,</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>quem</font></b><font> </font><b><font>foi</font></b><font> </font><b><font>vendido,</font></b><font> </font><b><font>por</font></b><font> </font><b><font>aquela,</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>exploração</font></b><font> </font><b><font>da</font></b><font> </font><b><font>zona</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>caça</font></b><font> </font><b><font>no</font></b><font> </font><b><font>local</font></b><font> </font><b><font>onde</font></b><font> </font><b><font>ocorreu</font></b><font> </font><b><font>o</font></b><font> </font><b><font>sinistro”;</font></b><br>
</p><p>
</p><p><font>20.2. E, na verdade, desde o despacho saneador de 28.04.2010, encontra-se provado nos autos que - ao tempo do sinistro (16.09.2005) - estava em vigor, entre a Ré V... e a Sociedade Agrícola Serra do Loureiro o contrato de seguro titulado pela apólice ...84 (</font><b><font>ponto</font></b><font> </font><b><font>9</font></b><font> </font><b><font>dos</font></b><font> </font><b><font>factos</font></b><font> </font><b><font>provados</font></b><font>);</font>
</p><p><font>- na mesma data vigorava, também, entre a Ré V... e os intervenientes/chamados EE e DD, o contrato de seguro titulado pela apólice ...08 (</font><b><font>ponto</font></b><font> </font><b><font>10</font></b><font> </font><b><font>dos</font></b><font> </font><b><font>factos</font></b><font> </font><b><font>provados)</font></b><font>;</font>
</p><p><font>- ambos os contratos de seguro eram do ramo de responsabilidade civil e se destinavam a cobrir responsabilidades relacionadas com a organização de caçadas, o exercício da caça e a exploração cinegética na mesma zona de caça, na Herdadeda ....</font><br>
</p><p><b><font>20.3.</font></b><font> </font><b><font>Estes</font></b><font> </font><b><font>factos</font></b><font> </font><b><font>sucessivamente</font></b><font> </font><b><font>reafirmados,</font></b><font> </font><b><font>quer</font></b><font> </font><b><font>nos</font></b><font> </font><b><font>textos</font></b><font> </font><b><font>das</font></b><font> </font><b><font>sentenças</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>1ª instância</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>11.11.2015e</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>23.11.2020,</font></b><font> </font><b><font>quer</font></b><font> </font><b><font>nos</font></b><font> </font><b><font>Acórdãos</font></b><font> </font><b><font>da</font></b><font> </font><b><font>Relação</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>11.05.2017,</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>31.01.2019</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>17.06.2021,</font></b><font> </font><b><font>nunca</font></b><font> </font><b><font>foram</font></b><font> </font><b><font>objeto</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>qualquer</font></b><font> </font><b><font>infirmação;</font></b><br>
</p><p><font>20.4. É certo que o pedido inicial se baseava na vigência da apólice ...84, contratada pela Sociedade Agrícola, na suposição, fundada nos factos conhecidos e cognoscíveis, de que sobre esta recaía a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do sinistro;</font><br>
</p><p><font>20.5. Porém, a partir do momento em que, pelas rés originárias, foi suscitada a dúvida sobre quem recaía tal responsabilidade, se sobre elas, se sobre as pessoas que vieram a ser chamadas, e em que, </font><b><font>nos</font></b><font> </font><b><font>artigos</font></b><font> </font><b><font>34,</font></b><font> </font><b><font>35</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>36</font></b><font> </font><b><font>da</font></b><font> </font><b><font>sua</font></b><font> </font><b><font>réplica,</font></b><font> os AA vieram afirmar que cabia, também, à 1ª Ré, a seguradora V..., SA, </font><b><font>por</font></b><font> </font><b><font>via</font></b><font> </font><b><font>dos</font></b><font> </font><b><font>seguros</font></b><font> </font><b><font>contratados,</font></b><font> </font><b><font>que</font></b><font> </font><b><font>estivessem</font></b><font> </font><b><font>em</font></b><font> </font><b><font>vigor,</font></b><font> e cobrissem, </font><b><font>bem</font></b><font> </font><b><font>entendido</font></b><font> </font><b><font>,</font></b><font> a responsabilidade decorrente da atividade de exploração da referida zona de caça concessionada, </font><b><font>o</font></b><font> </font><b><font>pedido</font></b><font> </font><b><font>passou</font></b><font> </font><b><font>também</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>estar</font></b><font> </font><b><font>baseado,</font></b><font> </font><b><font>alternativamente,</font></b><font> </font><b><font>em</font></b><font> </font><b><font>qualquer</font></b><font> </font><b><font>outro</font></b><font> </font><b><font>seguro</font></b><font> </font><b><font>contratado</font></b><font> </font><b><font>junto</font></b><font> </font><b><font>da</font></b><font> </font><b><font>V...,</font></b><font> </font><b><font>quer</font></b><font> </font><b><font>cobrisse</font></b><font> </font><b><font>responsabilidades</font></b><font> </font><b><font>civis</font></b><font> </font><b><font>assacáveis</font></b><font> </font><b><font>à</font></b><font> </font><b><font>Ré,</font></b><font> </font><b><font>Sociedade</font></b><font> </font><b><font>Agrícola,</font></b><font> </font><b><font>quer</font></b><font> </font><b><font>aos</font></b><font> </font><b><font>intervenientes/chamados,</font></b><font> </font><b><font>consoante</font></b><font> </font><b><font>o</font></b><font> </font><b><font>que</font></b><font> </font><b><font>se</font></b><font> </font><b><font>viesse</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>provar</font></b><font> </font><b><font>nos</font></b><font> </font><b><font>autos.</font></b><br>
</p><p><font>20.6. O alegado na réplica pelos Autores, conjugado com a alegada existência e prova de vigência da apólice ...08, de que são tomadores os intervenientes/chamados, consubstanciou, assim,uma modificação/ampliação da causa depedirinicial eumanova configuração da lide que foi reconduzia a apurar sobre quem era responsável pela produção do sinistro e reparação de danos dele decorrentes, se a 2ª Ré originária, se os intervenientes/chamados, e qual dos seguros, dos que vigoravam junto da V..., seria instrumento de ressarcimento dos danos julgados devidos aos Autores;</font><br>
</p><p><font>20.7. Foi esse o inequívoco sentido dado ao processado por todos os ilustres magistrados intervenientes no processo até 31.01.2019, incluindo os Venerandos Desembargadores da Relação de Évora, nos dois Acórdãos acima referidos de 2017 e de 2019, como se vê do relatório de ambos e dos relatórios das decisões proferidas em 1ª instância;</font><br>
</p><p><font>20.8. Aliás, o novo teor do relatório do Acórdão de 2021 sobre a configuração da lide e a posição dos Autores, mesmo que se coadune com o normal exercício do poder jurisdicional, o que se duvida, gera surpresa, pois não só não vem fundamentada a modificação substantiva da narrativa processual como não se vê como essa modificação se adequa ao regime previsto nos artigos 613 e segs. do CPC.</font><br>
</p><p><font>20.9. A decisão de condenação do segurador, ao abrigo do contrato titulado pela apólice ...08, não ence | [0 0 0 ... 0 0 0] |
IDFiu4YBgYBz1XKvvf-a | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b><div><br>
<b><font> </font></b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></div><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b>
</p><p>
</p><p><b><font>1. AA</font></b><font> e mulher, </font><b><font>BB</font></b><font>, recorrentes nestes autos, notificados da decisão de não admitir o recurso de revista interposto, vieram apresentar reclamação, requerendo que sobre a matéria do despacho recaia acórdão, o que fazem nos termos e com os fundamentos, que se passam a transcrever na parte que para aqui releva:</font>
</p><p><font>«Apreciado o requerimento de recurso, decidiu o Relator não admitir o mesmo, com o fundamento de que o Acórdão da Relação confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância.</font><br>
</p><p><font>O que dizer?</font><br>
</p><p><font>O acórdão da relação não confirma a decisão proferida na 1.ª instância, posto que uma e outra decisão são dissemelhantes, desconformes, seja do ponto de vista qualitativo, seja no ponto de vista quantitativo.</font><br>
</p><p><font>Não são conformes do ponto de vista qualitativo, na medida em que a decisão proferida pelo tribunal de 1.ª instância tem por fundamento a responsabilidade civil (extracontratual) exclusiva dos reclamantes, com o fundamento na prática, por estes, de um facto voluntário, ilícito e culposo, que, de acordo com aquela decisão, havia sido causa adequada dos danos sofridos pelo autor (i.e., a decisão estriba-se no preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual pela prática, pelos reclamantes, de um facto ilícito), já a decisão proferida pela Relação de Guimarães tem por fundamento quer o facto ilícito culposo do autor/lesado, consubstanciado no facto de ter estorvado o escoamento natural das águas por meio da construção de um dique (circunstância que terá, pelo menos, concorrido para a derrocada do muro), quer o exercício, porventura ilegítimo?, de um direito por parte dos reclamantes (i.e., a deposição de terras e inertes junto ao muro construído pelo autor), que igualmente terá concorrido para a derrocada do muro. Logo, a decisão proferida pela 2.ª instância estriba-se, no que respeita aos reclamantes, já não num facto ilícito destes, mas no exercício, ilícito, de um direito, alterando radicalmente o fundamento da responsabilidade que lhe é assacada.</font><br>
</p><p><font>Por outro lado, as decisões não são conformes do ponto de vista quantitativo, posto que a decisão de 2.ª instância representa uma responsabilidade diminuída em face da decisão de 1.ª instância, pelo que jamais poderia configurar, pelo menos em face dos ora reclamantes, uma dupla conforme.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>TERMOS EM QUE deve a presente reclamação ser procedente, e, em consequência, recaindo acórdão sobre a matéria do despacho objeto de reclamação, ser admitido o recurso interposto pelos aqui reclamantes».</font></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> O teor da decisão reclamada foi o seguinte: </font><br>
</p><p><font>«</font><b><font>1.</font></b><font> Tendo as partes sido notificadas ao abrigo do artigo 655.º, n.º 1, do CPC, para se pronunciarem acerca da questão prévia da admissibilidade do recurso de revista, designadamente acerca da dupla conformidade, por despacho de 1 de outubro de 2021, nada vieram dizer.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre decidir.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Com efeito, analisadas as decisões do tribunal de 1.ª instância e o acórdão do Tribunal da Relação, verifica-se que estamos perante uma situação de dupla conformidade, porque o acórdão do Tribunal da Relação apesar de ter alterado a sentença de 1.ª instância, fê-lo num sentido mais favorável aos recorrentes. E, uma vez que os recorrentes não lançaram mão do recurso de revista excecional (artigo 672.º do CPC), que constituiria a única exceção legal à não admissibilidade do recurso de revista por ter havido dupla conforme, não se pode admitir o recurso de revista geral.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> No caso vertente, as instâncias decidiram do mesmo modo, sem voto de vencido, e com fundamentação semelhante as mesmas questões de direito, perante idêntica factualidade, o que permite presumir, na perspetiva do legislador que excluiu o recurso de revista geral por dupla conformidade (artigo 671.º, n.º 3, do CPC), que a resolução do caso está dotada de uma especial garantia de acerto e de segurança, que torna desnecessário outro grau de recurso.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Vejamos:</font><br>
</p><p><font>A sentença do tribunal de 1.ª instância decidiu o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>«a) julgar totalmente procedente a ação e, em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a procederem, no prazo de três meses a contar do trânsito em julgado da presente decisão, à remoção do amontoado de terras, pedras, pedregulhos e outros materiais até à cota de nível da bordadura ou limite superior do rego e à desobstrução e limpeza deste, na reconstituição da sua profundidade e abertura;</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a executarem, no prazo de três meses a contar do trânsito em julgado da presente decisão, a reconstrução do muro de vedação demolido e a reposição dos prumos e da rede plastificada ao seu estado anterior; e</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a pagarem ao Autor a quantia que vier a ser liquidada, respeitante aos danos indicados no ponto 26º dos factos provados causados pela derrocada do muro em cerca de 67 m2 do logradouro do prédio identificado em 1º dos factos provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>b) julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>- reconhecer que os Réus são donos e legítimos possuidores do prédio identificado no ponto 4º dos factos provados;</font></i><br>
</p><p><i><font>- absolver o Autor do restante pedido reconvencional.»</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>O acórdão do Tribunal da Relação, considerando o recurso de apelação dos parcialmente procedente, decidiu o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>«Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso, nessa medida revogando a sentença recorrida, decidindo:</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a procederem, no prazo de três meses a contar do trânsito em julgado da presente decisão, ao afastamento do amontoado de terras, pedras, pedregulhos e outros materiais, que se encontrem colocados junto do muro erigido pelo Autor.</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a pagarem ao Autor metade da quantia que vier a ser liquidada, respeitante ao custo da reconstrução do muro na parte desmoronada correspondente a uma extensão aproximada de 16,80 metros;</font></i><br>
</p><p><i><font>- condenar os Réus a pagarem ao Autor metade da quantia que vier a ser liquidada, respeitante aos danos causados pela derrocada do muro em cerca de 67 m2 do logradouro do prédio identificado em 1º dos factos provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>- absolver os Réus dos demais pedidos formulados.</font></i><br>
</p><p><i><font>No mais, manter a sentença recorrida.»</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Em face da jurisprudência deste Supremo Tribunal, verifica-se, pois, uma situação de dupla conformidade.</font><br>
</p><p><font>Vejam-se os seguintes acórdãos, a título de exemplo:</font><br>
</p><p><font>- Acórdão de 21-02-2019, in Revista n.º 1589/13.0TVLSB-A.L1.S1:</font><br>
</p><p><i><font>“I - Consagra-se no art. 671.º, n.º 3, do CPC a regra da “dupla conforme”, a qual estatui a inadmissibilidade do recurso de acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância. (…) IV - Apresentando-se a decisão da Relação, no que toca à quantificação dos danos patrimoniais sofridos pelo autor como mais favorável do que a da 1.ª instância, dado que aquela os fixou em € 80 000,00 e a Relação em € 90 000,00, verifica-se, igualmente, nesta parte, uma situação de dupla conforme, impeditiva da admissibilidade do recurso de revista interposto pelo autor, porquanto se a improcedência total da apelação obstaria à interposição do recurso, então também a sua improcedência parcial não pode deixar de produzir, por idêntica razão, o mesmo efeito impeditivo”;</font></i><br>
</p><p><font>- Acórdão de 27-09-2018, in Revista n.º 634/15.9T8AVV.G1-A.S1:</font><br>
</p><p><i><font>“I -</font></i><font> </font><i><font>Prevalece actualmente na jurisprudência do STJ a tese segundo a qual é de equiparar à dupla conforme os casos em que o acórdão da Relação, não sendo inteiramente coincidente com a decisão da 1.ª instância, divirja dela em sentido mais favorável ao recorrente, tanto no aspeto quantitativo como no aspeto qualitativo. II - Não tendo os recorrentes no seu requerimento de interposição de recurso referido-se minimamente à revista excepcional nem ali indicado como fundamento específico a contradição jurisprudencial, é de rejeitar a pretendida convolação de um recurso de revista interposto em termos gerais num recurso de revista excepcional, ao abrigo do art. 672.º, n.º 1, al. c), do CPC</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Em consequência, decido não admitir o recurso de revista».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Discordam os réus desta decisão, que agora impugnam, invocando que as decisões de 1.ª instância e do Tribunal da Relação são distintas, quer qualitativamente, quer no aspeto quantitativo, pelo que pugnam pela admissibilidade do presente recurso de revista.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> O Tribunal da Relação, perante o recurso de apelação dos réus contra a sentença que julgou totalmente procedente a ação, debruçou-se sobre as seguintes questões:</font><br>
</p><p><i><font>« - se deve ser modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto; </font></i>
</p><p><i><font>- consequentemente, se deve ser alterado o mérito da ação conforme pugnado pelos Recorrentes». </font></i>
</p><p><font>Quanto à matéria de facto, os apelantes consideraram que foram incorretamente julgados os factos 9, 17, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 da matéria de facto julgada provada e factos 2, 3 e 4 da matéria de facto julgada não provada.</font><br>
</p><p><font>O Tribunal da Relação considerou a impugnação da matéria de facto parcialmente procedente, alterando o elenco dos factos provados e não provados, da seguinte forma:</font>
</p><p><i><font>«Donde, impõe-se dar como não provados os factos constantes do ponto 9 e 17 da matéria de facto provada e alterar a redação do facto 22, nos termos seguintes:</font></i>
</p><p><i><font>22. As águas pluviais provenientes de toda a encosta formada no prédio dos Réus escorriam naturalmente para o prédio do Autor.</font></i>
</p><p><i><font>Quanto aos demais factos impugnados, os mesmos relacionam-se com duas questões essenciais: a ação voluntária dos réus na alteração da morfologia do seu terreno e com a remoção de terras e pedras para junto do muro, e a pressão exercida por esses materiais sobre o muro como causa da sua derrocada.</font></i>
</p><p><i><font>Quanto à primeira questão não há dúvida que os réus alteraram a morfologia do seu terreno e deslocaram para junto do muro terras, entulho e pedras, revelando-se irrefutável a prova produzida quanto à realidade deste facto. A realidade representada pelas fotografias juntas aos autos complementada pelos depoimentos das testemunhas, não deixam dúvidas quanto a tais ações perpetradas pelos réus, embora não com a extensão de mais de três metros e que em algumas das partes elevaram o nível acima da altura do muro de vedação, pois que de nenhuma prova tal se extrai.</font></i>
</p><p><i><font>Já a mesma segurança não confere a prova quanto à intensidade da pressão exercida por esses materiais suscetível de conduzir à sua derrocada.</font></i>
</p><p><i><font>Neste ponto, o meio de prova mais credível é a perícia realizada. No relatório pericial admitem os srs peritos que para a ruina do muro concorreram um conjunto de causas concomitantes, por um lado o aumento do impulso hidrostático das terras que lhe terão sido encostadas na parte em elevação/vedação, ou por via natural (por escorrências de terras arrastadas pelas águas das chuvas da encosta da bacia sobranceira) ou por aterro manual/mecânico executado no seu tardoz, e, por outro, a ausência de barbacãs/bueiros para escoamento das águas que para ele convergem provindas da bacia hidrográfica da vertente nascente da encosta que atravessa o prédio dos réus.</font></i>
</p><p><i><font>O perito do autor considera que na ausência do impulso das terras colocadas no seu tardoz, o muro não teria ruido apenas por ação das águas, as quais face à inclinação no sentido sul-norte iriam escoar naturalmente para o ribeiro.</font></i>
</p><p><i><font>Não cremos que assim seja, na medida em que, como bem se fez constar do relatório, o muro construído em granito com junta argamassada eleva-se acima do solo e nele não foram deixadas aberturas que permitissem o escoamento das águas provenientes dos prédios superiores, bem como o entulho que estas águas arrastam. Por outro lado, atenta a sua implantação ortogonal e na fralda da linha de maior declive das águas da bacia hidrográfica da vertente que com ele confronta a nascente, impõe a conclusão, de que o muro não foi executado de modo a resistir à força das águas que a ele forçosamente afluem.</font></i>
</p><p><i><font>Atenta a prova produzida, cremos que uma das causas que contribuiu decisivamente para o derrube do muro, mesmo considerando os materiais que junto do mesmo foram colocados, foi a inexistência de aberturas para a passagem das águas pluviais.</font></i>
</p><p><i><font>Antes da construção do muro a linha divisória entre os prédios encontrava-se livre de obstáculos, existindo apenas um conjunto pedras soltas que permitiam a passagem das águas pluviais que aí afluíssem, passagem que o muro construído pelas suas características seguramente bloqueou.</font></i>
</p><p><i><font>Inexistindo um sistema que derivasse as águas que ali afluíam, não havendo no muro aberturas para que as águas passassem, a derrocada do muro era previsível.</font></i>
</p><p><i><font>A presença de terras, entulho e pedras colocados pelos réus junto ao muro a par da falta de barbacãs neste concorreu, como causa adequada, para a derrocada do muro.</font></i>
</p><p><i><font>Assim, e nesta conformidade, impõe-se retirar dos factos provados o facto 21 e alterar a redação dos demais nos seguintes termos:</font></i>
</p><p><i><font>20. Após, junto ao muro, descarregaram entulho, argolas e anilhas de cimento, pedras e pedregulhos e estenderam o “rapão” e as terras daqueles corredores abertos ao longo do tardoz do muro restaurado pelo Autor.</font></i>
</p><p><i><font>23. Tais águas dada a inexistência de barbacãs ou bueiros no muro construído pelo Autor passaram a concentrar-se e a infiltrar-se nessa entulheira criada pelos Réus encostada e corrida ao longo do tardoz do muro de vedação, exercendo, acompanhado dessa entulheira, nele grande pressão.</font></i>
</p><p><i><font>24. Devido ao facto referido em 23º, em finais de Setembro de 2013 esse muro desabou parcialmente, numa extensão aproximada de 16,80 metros, na parte em que o prédio identificado em 1º confronta a Nascente com o prédio referido em 4º, confrontação essa que, na sua totalidade, se faz numa extensão de cerca de 75 metros.</font></i>
</p><p><i><font>Quanto aos factos não provados, em face da alteração da factualidade provada, são excluídos os factos 2 e 4.</font></i>
</p><p><i><font>O facto 3, quanto à altura do muro acima do solo, resulta do relatório pericial que o muro se eleva a cerca de 50 cm acima da cota do terreno dos réus, sendo por isso um muro misto de suporte e vedação.</font></i>
</p><p><i><font>Daí que este facto terá de ser considerado como provado, com a seguinte redação:</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>- O muro ficou cerca de 50 cms. acima do solo, em toda a sua extensão, do lado do prédio dos Réus.</font></i>
</p><p><i><font>Procede, assim, parcialmente a impugnação da matéria de facto»</font></i>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>Os argumentos apresentados na resposta dos recorrentes quanto à possibilidade de admissão do recurso de revista, desdobram-se em três aspetos:</font><br>
</p><p><font>- saber se as alterações da matéria de facto são suficientes para impor a quebra da dupla conformidade;</font><br>
</p><p><font>- saber se o Tribunal da Relação alterou as normas ou institutos jurídicos aplicados pelo tribunal de 1.ª instância;</font><br>
</p><p><font>- saber se as alterações quantitativas e qualitativas do dispositivo do acórdão da Relação, todas elas em favor dos recorrentes, impedem a formação de dupla conformidade.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Como enquadramento da questão da dupla conformidade, é necessário lembrar que nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do CPC, </font><i><font>«(…)não é admissível revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância (…)». </font></i><br>
</p><p><font>Este Supremo Tribunal de Justiça tem entendido que o conceito de dupla conforme, não exige uma plena identidade de todos os aspetos da fundamentação de facto e de direito, ampliando a dupla conformidade às situações em que o próprio dispositivo é distinto, desde que as modificações operadas, quantitativas ou qualitativas, tenham sido favoráveis ao recorrente. O objetivo desta orientação jurisprudencial é o de evitar que diferenças pouco relevantes ou num sentido favorável ao recorrente possam servir de pretexto para, na prática, se restaurar de pleno o terceiro grau de jurisdição que o legislador limitou.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Neste sentido, veja-se o acórdão deste Supremo Tribunal, de 20-11-2014 (Processo n.º 3479/10.9TBGDM-B.P1.S1): </font><i><font>«Para efeitos de aplicação do art. 671º, nº 3, do NCPC, que restringiu o conceito de dupla conforme, apenas relevam as divergências das instâncias relativamente a questões essenciais, sendo insuficientes as que se apresentem com natureza meramente complementar ou secundária, sem carácter decisivo para o julgamento do caso».</font></i><br>
</p><p><font>Para que o recurso seja admissível, é necessário que a fundamentação da sentença e do acórdão seja diversa e que tal diversidade tenha natureza </font><i><font>essencial.</font></i><font> Desconsideram-se, assim, para este efeito, discrepâncias marginais, secundárias ou periféricas, que não representem efetivamente um percurso jurídico diverso. Por exemplo, não se considera essencial a diversidade dos argumentos utilizados, quando esta diversidade se traduziu, apenas, na não aceitação, pela Relação, de uma das vias trilhadas, pela sentença, para atingir o mesmo resultado, ou no aditamento de um fundamento jurídico novo em relação aos que já tinham sido aduzidos pelo tribunal de 1.ª instância, e aos quais se aderiu. </font><br>
</p><p><font>Tem-se entendido que a mera modificação da matéria de facto não é, em si mesma, um fator de quebra da dupla conformidade, quando não potencia ao Tribunal da Relação uma fundamentação jurídica essencialmente diversa. Neste sentido, o Acórdão 09-03-2017 (Revista n.º 95/10.9TJVNF.G1.S1), onde se decidiu que </font><i><font>«Uma modificação essencial da matéria de facto provada ou não provada apenas será relevante para aferir da diversidade ou da conformidade das decisões quando implique uma modificação, também essencial, da motivação jurídica. Não tendo a alteração da matéria de facto provada em julgamento, superiormente concretizada pela Relação, consentido motivação diferenciada direcionada a ajuizar a justa decisão da causa, é de concluir que a apelação se contém no enquadramento de idêntica fundamentação proposta na decisão proferida na 1.ª instância, não sendo, consequentemente, admissível o recurso de revista».</font></i><br>
</p><p><font>Apesar de vários pontos da matéria de facto terem sido alterados pelo Tribunal da Relação, há que considerar que tal não é suficiente para admitir o recurso de revista, por dois motivos: o tribunal recorrido, na fundamentação de direito, aplicou as mesmas normas e institutos jurídicos aplicados pelo tribunal de 1.ª instância; a modificação da matéria de facto provocou alterações na decisão de mérito em sentido favorável aos agora recorrentes.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Vejamos:</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>O Tribunal da Relação inseriu a presente ação no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, dependendo da verificação de todos os seus pressupostos (artigo 483º do Código Civil), em conjugação com os limites ao exercício do direito de propriedade, nos termos da segunda parte do artigo 1305º do Código Civil e dos artigos relativos às restrições do direito de propriedade nas relações de vizinhança, designadamente, os artigos 1351.º e 1356.º do Código Civil, relativos, respetivamente, à construção de muros e escoamento de águas.</font><br>
</p><p><font>O tribunal da 1.ª instância entendeu também que a conduta dos Réus caia na previsão do citado artigo 1351º do Cód. Civil, pois entulharam e aterraram o seu terreno para cima e contra o muro, aumentando a cota do mesmo e levaram a que às águas pluviais aí se concentrassem pressionando o muro, com o que causaram o desmoronamento parcial do mesmo e causaram danos na esfera patrimonial do Autor, acrescentando que que estamos perante uma atuação ilícita e uma violação culposa do direito de propriedade do Autor, pelo que os Réus se constituíram na obrigação de indemnizar aquele pelos danos sofridos (arts. 483º nº 1, 562º, 563º e 566º nºs 1 a 3, todos do Cód. Civil).</font><br>
</p><p><font>Pelo que não houve qualquer mudança nos institutos jurídicos aplicáveis que foram, em ambas as instâncias, as restrições ao direito de propriedade nas relações de vizinhança e as normas da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.</font><br>
</p><p><font>O que fez o Tribunal da Relação foi aplicar a norma do artigo 570.º (culpa do lesado), assim reduzindo a responsabilidade dos réus, quer no aspeto qualitativo, quer no aspeto quantitativo. Todavia, a aplicação desta norma, situada ainda dentro do instituto da responsabilidade civil, não é suficiente para se entender que houve uma modificação essencial na fundamentação jurídica.</font><br>
</p><p><font>Por último, na decisão final, o acórdão da Relação dispensou os réus de proceder à desobstrução e limpeza do terreno dos autores, bem como à reconstituição da sua profundidade e abertura; desobrigou os réus da reconstrução do muro, condenando-os apenas a pagarem ao Autor metade da quantia que vier a ser liquidada respeitante ao custo da reconstrução do muro na parte desmoronada; e</font><i><font> </font></i><font>reduziu para metade a quantia, que vier a ser liquidada, a pagar ao Autor, respeitante aos danos causados pela derrocada do muro.</font><br>
</p><p><font>A jurisprudência deste Supremo Tribunal já há muito que aderiu à orientação segundo a qual diferenças quantitativas e qualitativas da parte decisória do acórdão da Relação, desde que favoráveis ao recorrente, não são suficientes para quebrar o conceito de dupla conformidade, para o efeito de ajuizar da admissibilidade da revista ao abrigo do artigo 671.º, n.º 3, do CPC. Desde logo, por um argumento estritamente lógico e incontornável: se a Relação tivesse mantido integralmente a parte decisória da sentença, haveria dupla conformidade e o recurso de revista não seria admissível; não faria, pois, qualquer sentido, do ponto de vista da racionalização do trabalho deste Supremo, que tivesse de aceitar um recurso de revista num caso em que a decisão recorrida foi favorável ao recorrente.</font><br>
</p><p><font>Neste sentido, por todos, veja-se o Acórdão 07-04-2016 (Revista n.º 397/09.7TBPVL.G1.S1), em que se decidiu que </font><i><font>«I - Na hipótese em que o acórdão recorrido se traduz, por cotejo com a sentença da 1.ª instância, numa situação qualitativa ou quantitativamente mais favorável ao recorrente (o que implica uma redução da sucumbência), é de considerar, por coerência na interpretação do conceito de dupla conforme, que aquele aresto é também irrecorrível. É que, se as decisões fossem integralmente sobreponíveis, não caberia igualmente recurso.»</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Sendo assim, da conjugação dos argumentos expostos resulta que não se admite o presente recurso de revista, por estarmos perante uma situação de dupla conformidade em sentido amplo.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Anexa-se sumário elaborado nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC:</font><br>
</p><p><b><font>I -</font></b><font> Na hipótese em que o acórdão recorrido se traduz, por cotejo com a sentença da 1.ª instância, numa situação qualitativa ou quantitativamente mais favorável ao recorrente (o que implica uma redução da sucumbência), é de considerar, por coerência na interpretação do conceito de dupla conforme, que o acórdão da Relação não admite recurso de revista. É que, se as decisões fossem integralmente sobreponíveis, não admitiria igualmente recurso.</font><br>
</p><p><b><font>II –</font></b><font> Apesar de a Relação ter procedido a alterações nos factos provados e não provados, se essa alteração não se repercutiu na fundamentação jurídica, que continuou enquadrada pelos institutos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos (artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil) e pelas normas respeitantes às restrições ao exercício do direito de propriedade nas relações de vizinhança, continuamos a estar perante uma dupla conforme, no sentido amplo admitido pela jurisprudência, como uma forma de racionalizar o trabalho deste Supremo Tribunal e de evitar o recurso indiscriminado para este tribunal, que se deve concentrar em questões de particular relevância jurídica e social.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Custas pelos recorrentes.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 14 de dezembro de 2021 </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora) </font><br>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto) </font><br>
</p></font><p><font><font>Fernando Samões (2.º Adjunto)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
JTFXu4YBgYBz1XKvJvex | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1. Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, S.A.</font></b><font>, Recorrente nos autos de recurso para uniformização de jurisprudência acima melhor identificados, em que são Recorridos </font><b><font>AA </font></b><font>e </font><b><font>BB</font></b><font>, notificada da decisão singular proferida, em 16 de dezembro de 2022, que não admitiu o recurso e com ela não se conformando, vem, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 692.º do Código de Processo Civil, apresentar reclamação para a Conferência, </font><b><font> </font></b><font>com os fundamentos desenvolvidos em trinta páginas, sem conclusões, que aqui se consideram transcritas.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2. </font></b><font>Os recorridos</font><b><font> </font></b><font>apresentaram resposta, em que pugnam pela não admissibilidade do recurso e subsidiariamente para a hipótese de o acórdão de uniformização da jurisprudência ser admitido, o reenvio para interpretação prejudicial pelo TJUE.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> A decisão singular pronunciou-se sobre a alegada contradição entre o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 2 de fevereiro de 2022, que condenou a Vodafone e outro Acórdão também proferido por este Supremo Tribunal de Justiça, em 16 de outubro de 2014, no processo n.º 2476/10.... (já transitado em julgado e do qual a recorrente juntou cópia), entendendo que não estão presentes os requisitos exigidos pela lei (artigo 688.º, n.º 1, do CPC) para a admissibilidade do recurso de uniformização de jurisprudência, com os seguintes fundamentos, que se passam a transcrever: </font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>«4.1.</font></b><font> O presente recurso incide sobre a interpretação do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais (DL 446/85, de 25-10) e sobre a validade de cláusulas contratuais gerais apostas em contratos de adesão. </font>
</p><p><font>Em ambos os casos, estão em causa pedidos de apreciação da validade de cláusulas contratuais inseridas em contratos de adesão, sujeitos ao regime jurídico das cláusulas contratuais gerais: no caso do acórdão fundamento o Supremo pronunciou-se pela validade da cláusula; no caso do acórdão recorrido o Supremo pronunciou-se pela nulidade da cláusula. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso do acórdão fundamento (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16.10.2014, processo n.º 2476/10....) estamos perante um contrato de mútuo bancário para financiamento de aquisição de automóvel, enquanto no caso do acórdão recorrido estamos perante um contrato de telecomunicações. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>As cláusulas em litígio têm o seguinte teor: </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No </font><u><font>acórdão recorrido</font></u><font>, a cláusula considerada nula afirmava o seguinte: </font>
</p><p><i><font>“a) Após a ativação do serviço o cliente poderá usufruir de todas as funcionalidades do mesmo, as quais se encontram descritas em ... bem como no tarifário subscrito pelo Cliente, o qual faz parte integrante do respetivo contrato”.</font></i><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No </font><u><font>acórdão fundamento</font></u><font> a cláusula do contrato de mútuo bancário era do seguinte teor, consoante consta do sumário do acórdão: </font>
</p><p><i><font>«Não padece de nulidade a cláusula contratual geral, inserida em contrato de adesão destinado ao financiamento de crédito automóvel, em que se prevê que o mutuário se confessa devedor do capital mutuado e respectivos juros, bem como dos encargos contratualmente previstos como estando a seu cargo, remetendo-se a determinação dos respectivos montantes para o Preçário do Banco – documento facilmente acessível ao interessado e que deverá, no momento da subscrição do contrato, ser objecto de adequado esclarecimento e informação ao aderente».</font></i><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em ambos os casos, as cláusulas remetem para documentos externos aos contratos, gerando para o aderente o ónus de pesquisar para se informar sobre elementos negociais que não estão determinados ou descritos no contrato de adesão. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.2.</font></b><font> Será que a circunstância de no acórdão fundamento o Supremo ter considerado a cláusula válida e no acórdão recorrido ter declarado a nulidade da cláusula consiste numa contradição relevante para o efeito de exigir uma uniformização de jurisprudência? </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Pensamos que não. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>As cláusulas contratuais em debate estão inseridas em contratos distintos, não só nos serviços que fornecem, mas também nos destinatários a que se dirigem, sendo que os destinatários dos serviços de telecomunicação são em muito maior número (os serviços de internet e telemóveis estão praticamente generalizados a toda a população) e incluem cidadãos com pouca informação e conhecimentos, bem como famílias onde há crianças e jovens que utilizam os serviços, necessitando pois estes últimos de uma maior proteção do que os compradores de automóveis. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por outro lado, as cláusulas estão inseridas em contratos com outras cláusulas, necessariamente diferentes no seu conjunto. O sentido e alcance de uma cláusula não se determina isoladamente das restantes cláusulas do contrato, antes tem de ser interpretado no seu contexto, nos termos do artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil: </font><font>«</font><i><font>A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoávelmente contar com ele».</font></i><font> </font>
</p><p><font>O artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil consagra a teoria da impressão do destinatário, isto é, a declaração negocial deve ser interpretada como um declaratário razoável, colocado na posição concreta do declaratário, a interpretaria. </font>
</p><p><font>Para apurar o sentido juridicamente relevante, importa, pois, considerar outros elementos ou circunstâncias, designadamente o contexto das declarações e a sua finalidade. </font>
</p><p><font>A declaração negocial é também </font><i><font>“um acto social de comunicação, que tem de ter relação com aquele a quem se destina ou o conhece”</font></i><font> (cf. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 442). </font>
</p><p><font>Como tem entendido a doutrina, a interpretação da declaração negocial deve ser, assim, assumida como uma </font><i><font>“operação concreta, integrada em diversas coordenadas”, tendo em conta “o conjunto do negócio, a ambiência em que ele foi celebrado e vai ser executado” </font></i><font>(Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, I, Parte Geral, Tomo I, Almedina, Coimbra, 2005, p. 755). </font>
</p><p><font>Para proceder à interpretação das declarações negociais são atendíveis os termos do negócio; os interesses que nele estão em jogo; a finalidade prosseguida pelo declarante; as negociações prévias; as precedentes relações negociais entre as partes; os usos da prática; os modos de conduta por que, posteriormente, se executou negócio concluído (Mota Pinto, </font><i><font>Teoria Geral do Direito Civil,</font></i><font> </font><i><font>ob. cit.,</font></i><font> pp. 446-447). </font>
</p><p><font>Em síntese, os critérios que presidem à interpretação da declaração negocial são os seguintes: </font>
</p><p><i><font>«(1) o contexto negocial em que a declaração aparece; (ii) eventuais antecedentes próximos ou elementos preparatórios; (iii) o ambiente ou contexto externo, de facto e jurídico, em que a declaração é emitida; (iv) a finalidade da declaração (ou negócio); (v) o tipo de negócio em causa, bem como os valores e interesses em jogo; (vi) a anterior e subsequente prática negocial entre declarante e declar</font></i><i><font>atário, se existir; (vii) o modo como a declaração ou o negócio em que se integra vem sendo executado»</font></i><font> (cf. Evaristo Mendes/Fernando Sá, “Anotação ao artigo 236.º”, in Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2014, p. 538). </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Ora, para o efeito de ajuizar da admissibilidade de um recurso para uniformização de jurisprudência sobre a validade de uma cláusula negocial inserida num contrato de adesão, não pode o intérprete separar a cláusula dos restantes elementos do contrato, da sua natureza jurídica e contexto, pelo que seria de todo inútil admitir o presente recurso para resolver uma questão que não é suscetível de generalização – antes, pelo contrário, é necessariamente casuística e dependente das idiossincrasias de cada caso concreto. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Para além disto, a interpretação do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, a fim de aferir da validade ou invalidade da cláusula em debate, inserida num contrato de telecomunicações, foi feita à luz de diretivas comunitárias que só são aplicáveis a este setor. É o caso Diretiva 2018/1972, de 11 de dezembro de 2018, que estabelece o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (ainda não transposta para o direito nacional, sem detrimento de, em tudo o que nela estiver determinado de forma clara e precisa, ser diretamente aplicável, conforme tem sido orientação da jurisprudência). </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A este propósito afirmou-se o seguinte no acórdão recorrido: </font>
</p><p><font>«O sentido da cláusula 2.ª al. d) é incompleto e vago, não contém de forma clara e inequívoca todos os elementos necessários para uma cabal compreensão do que está em causa. </font>
</p><p><font>A remissão para outros documentos para mais informações não garante que o aderente tenha efetivamente conhecimento de elementos essenciais do contrato como é dever da empresa predisponente. Daí que não estejamos perante uma aceitação consciente suscetível de demonstrar consenso entre as partes e de integrar um acordo vinculativo. </font><b><font>O dever das empresas predisponentes é o de fornecerem, por escrito, um resumo do contrato, em linguagem clara, simples e facilmente percetível para os cidadãos comuns, onde se chama a atenção para as cláusulas que contêm riscos de prejudicar o cliente e de frustrar as suas expetativas em relação ao contrato que celebrou. Nos termos do artigo 102.º, n.º 3, da Diretiva 2018/1972, os fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público fornecem aos consumidores um resumo do contrato, conciso e facilmente legível.</font></b><font> Esse resumo identifica os principais elementos dos requisitos de informação, que devem incluir no mínimo: “ a) O nome, endereço e os dados de contacto do fornecedor e, se diferentes, os dados de contacto para eventuais reclamações; b) As principais características de cada serviço prestado; c) Os respetivos preços de ativação do serviço de comunicações eletrónicas e de quaisquer encargos recorrentes ou associados ao consumo, se o serviço for prestado contra uma prestação pecuniária direta; d) A duração do contrato e as condições de renovação e cessação; e) A medida em que os produtos e serviços são concebidos para os utilizadores finais com deficiência; f) No que respeita aos serviços de acesso à Internet, um resumo das informações necessárias nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alíneas d) e e) do Regulamento (UE) 2015/2120”.» </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em virtude da aplicação desta diretiva sobre as comunicações eletrónicas, não se pode dizer que o acórdão recorrido e o acórdão fundamento tenham sido proferidos no domínio da mesma legislação, também por este motivo fracassando a demonstração pelos recorrentes dos requisitos de admissibilidade dos recursos para uniformização de jurisprudência nos termos dos artigos 688.º e seguintes do CPC. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> Pelo que, não se admite o recurso para uniformização de jurisprudência interposto pela Vodafone.»</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Na reclamação para a Conferência, a recorrente utiliza, em síntese, os seguintes argumentos para fundamentar a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência: </font><i><font>i)</font></i><font> que a decisão singular reconhece implicitamente a identidade das questões de direito em confronto e a verificação dos pressupostos legais da admissibilidade do recurso; </font><i><font>ii)</font></i><font> que o acórdão recorrido e o acórdão fundamento foram proferidos no domínio da mesma legislação, o Decreto-lei 446/85, de 30 de outubro, que consagrou o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais; </font><i><font>iii)</font></i><font> que as decisões foram contraditórias na medida em que o acórdão fundamento admitiu a validade de uma cláusula contratual geral idêntica àquela que foi declarada nula pelo acórdão recorrido; </font><i><font>iv)</font></i><font> que a decisão sumária impugnada incorre em contradição ao afirmar que o acórdão recorrido e o acórdão fundamento não foram proferidos no domínio da mesma legislação; </font><i><font>v)</font></i><font> que a circunstância de os contratos onde as cláusulas em análise se encontram inseridas terem uma natureza jurídica distinta não é de molde a afastar a verificação dos pressupostos legais para a interposição do presente recurso; </font><i><font>vi)</font></i><font> que basta a identidade substancial do núcleo essencial das situações de facto do acórdão fundamento e do acórdão recorrido, não importando diferenças acessórias ou casuísticas; </font><i><font>vii)</font></i><font> que o mercado do crédito bancário para as famílias é semelhante aos serviços de telecomunicações, sendo ambos generalizáveis a quase toda a população.</font><br>
</p><p><font>Por último, pugnam para que este Supremo Tribunal, para além de admitir o recurso, decida, reunido em Pleno, que </font><i><font>«não padece de nulidade a cláusula contratual geral, inserida em contrato de adesão, em que se prevê a obrigação de pagamento de quantias adicionais correspondentes a consumos posteriores a ser atingido o plafond previsto na mensalidade inicial, remetendo-se especificação do serviço e a determinação dos respectivos montantes para, in casu, as Condições Pré-Contratuais e características específicas do concreto tarifário/pacote de serviços contratado, os quais fazem parte integrante do respetivo contrato – informação facilmente acessível ao interessado».</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>Os recorridos, em contraposição, defendem que não estão verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, tal como exposto pela decisão singular, e que a nulidade da cláusula contratual geral impugnada não foi a </font><i><font>ratio decidendi</font></i><font> do acórdão recorrido, pois os pagamentos adicionais de internet sempre teriam de ser devolvidos ao abrigo do artigo 9.º - A da Lei n.º 24/96, de 31 de julho.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Vejamos: </font><br>
</p><p><font>Tem sido vasto o labor jurisprudencial acerca da temática dos pressupostos de admissibilidade dos recursos para uniformização de jurisprudência. Se, por um lado, a função uniformizadora é, por excelência, a competência mais importante do Supremo Tribunal de Justiça, por outro lado, estando em causa a reabertura do processo judicial, depois de a decisão ter transitado em julgado, o legislador foi particularmente cauteloso, exigindo um conjunto de requisitos apertados para a sua admissibilidade, que a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem interpretado de uma forma rigorosa. Neste juízo de ponderação existe sempre uma tensão entre a segurança jurídica do trânsito em julgado e a necessidade de promover a igualdade das orientações dos tribunais para casos semelhantes. O Supremo Tribunal de Justiça assume nesta nobre tarefa uma função quase semelhante ao legislador, embora os Acórdãos Uniformizadores de Jurisprudência não sejam fonte de direito e tenham apenas uma força de persuasão qualificada.</font>
</p><p><font>O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 12/2015, publicado no DR n.º 200 SÉRIE I, de 13-10-2015, explica, de forma lapidar, quais os pressupostos legais deste recurso extraordinário, e que se centram, em síntese, na existência de contradição entre as decisões proferidas por dois acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça relativamente à mesma questão fundamental de direito, sob a égide da mesma norma. Aí se salienta, também, que o requisito contradição é referido à decisão em si e não aos fundamentos, e que o conceito de identidade da questão fundamental de direito deve ser entendido como </font><i><font>«(…) a controvérsia baseada numa norma que estava em apreciação para dirimir o litígio e cuja interpretação foi decisiva para que, num caso e noutro, o Supremo Tribunal de Justiça tivesse proferido decisões que colidem, que não se harmonizam, porque existe contradição quanto ao efeito jurídico que delas se extraiu e que foi crucial para o resultado, fruto do labor interpretativo». </font></i>
</p><p><font>A contradição de julgados pressupõe, pois, que o acórdão-fundamento e o acórdão recorrido tenham aplicado, de forma divergente, o mesmo critério de decisão geral e abstrato, excluindo-se, portanto, os casos em que o critério foi a equidade ou a discricionariedade (cfr. Castro Mendes/Teixeira de Sousa, </font><i><font>Manual de Processo Civil</font></i><font>, Vol. II, AAFDL, Lisboa, 2022, p. 205). Prosseguem os autores, explicando que </font><i><font>«Estes critérios destinam-se a possibilitar uma decisão que atende às particularidades do caso concreto, pelo que, pela sua natureza, são insuscetíveis de originar uma contradição de julgados. Mesmo que tenham sido proferidas decisões divergentes em dois casos concretos, isso não significa que, em função das especificidades destes casos, a divergência não seja perfeitamente justificada»</font></i><font> (</font><i><font>ibidem,</font></i><font> p. 205).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Abrantes Geraldes (</font><i><font>Recursos em Processo Civil</font></i><font>, 6.ª edição Atualizada, Almedina, Coimbra, pp. 529 e seguintes), em comentário ao artigo 688.º do CPC, sintetiza assim os requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência:</font>
</p><p><i><font>«a) Objeto do recurso: </font></i><font>acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.</font>
</p><p><i><font>b) Razão do recurso:</font></i><font> Contradição entre o núcleo essencial do acórdão recorrido e o do outro acórdão do Supremo (acórdão fundamento);</font>
</p><p><i><font>c) Natureza da contradição: </font></i><font>deve verificar-se uma oposição frontal e não apenas implícita ou pressuposta em relação ao acórdão fundamento;</font>
</p><p><i><font>d) Matéria: </font></i><font>a divergência jurisprudencial deve verificar-se relativamente a questão ou questões de direito, sendo irrelevantes eventuais divergências relativamente a questões de facto;</font>
</p><p><i><font> e) Identidade: </font></i><font>relação de identidade entre a questão de direito que foi objeto de ambos os acórdãos;</font>
</p><p><i><font>f) Essencialidade: </font></i><font>a questão de direito sob controvérsia deve revelar-se essencial para o resultado numa e noutra das decisões, sendo irrelevantes respostas ou argumentos que não tenham valor decisivo </font><i><font>(obter dicta).</font></i>
</p><p><i><font>g) Anterioridade</font></i><font>: o acórdão fundamento deve ter sido proferido antes de transitar em julgado o acórdão recorrido.</font>
</p><p><i><font> h) Quadro normativo: </font></i><font>deve verificar-se identidade substantiva do </font><i><font>quadro normativo</font></i><font> em que se insere a questão ou questões de direito em causa.</font>
</p><p><i><font>h) Resultado da contradição: </font></i><font>é necessário que na decisão recorrida se tenha optado por uma decisão diversa da que foi assumida no acórdão de uniformização, diversidade que não representa uma necessária contradição absoluta quanto à decisão com efeito uniformizadores, bastando que esta não tenha sido inteiramente acolhida. </font>
</p><p><i><font>i)</font></i><font> </font><i><font>Definitividade dos acórdãos: </font></i><font>qualquer dos acórdãos deve ter transitado em julgado, presumindo-se este relativamente ao acórdão fundamento.</font>
</p><p><i><font>j)</font></i><font> Como acórdão fundamento poderá ser invocado, não apenas o proferido com intervenção de três juízes no âmbito da revista normal ou excecional, como ainda algum acórdão de uniformização de jurisprudência que tenha sido desrespeitado pelo próprio Supremo.</font>
</p><p><i><font>k) Requisitos formais:</font></i><font> nas conclusões das alegações de recurso o recorrente deve aludir ao fundamento em que se baseia e devem ser instruídas com cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento (art. 637.º)</font>
</p><p><i><font>l) Requisito negativo:</font></i><font> Impede a admissão de recurso extraordinário o facto de o acórdão recorrido ter adotado jurisprudência anteriormente uniformizada pelo Supremo ou o facto de o acórdão recorrido ser ele mesmo um acórdão uniformizador».</font>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>No Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 2-10-2014, proferido no Proc. 268/03.0TBVPA.P2.S1-A, resume-se, no respetivo sumário, a questão dos requisitos de admissibilidade, do seguinte modo:</font>
</p><p><i><font>«1. Para que exista um conflito jurisprudencial, susceptível de ser dirimido através do recurso extraordinário previsto no art. 688º do Código de Processo Civil, é indispensável que as soluções jurídicas, acolhidas no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, assentem numa mesma base normativa, correspondendo a soluções divergentes de uma mesma questão fundamental de direito.</font></i>
</p><p><i><font>2. O preenchimento deste requisito supõe que as soluções alegadamente em conflito:</font></i>
</p><p><i><font>a) - Correspondem a interpretações divergentes de um mesmo regime normativo, situando-se ou movendo-se no âmbito do mesmo instituto ou figura jurídica fundamental: implica isto, não apenas que não hajam ocorrido, no espaço temporal situado entre os dois arestos, modificações legislativas relevantes, mas também que as soluções encontradas num e noutro acórdão se situem no âmbito da interpretação e aplicação de um mesmo instituto ou figura jurídica – não integrando contradição ou oposição de acórdãos o ter-se alcançado soluções práticas diferentes para os litígios através da respectiva subsunção ou enquadramento em regimes normativos materialmente diferenciados;</font></i>
</p><p><i><font>b) Têm na sua base situações materiais litigiosas que, de um ponto de vista jurídico-normativo – tendo em consideração a natureza e teleologia dos específicos interesses das partes em conflito – sejam análogas ou equiparáveis, pressupondo o conflito jurisprudencial uma verdadeira identidade substancial do núcleo essencial da matéria litigiosa subjacente a cada uma das decisões em confronto;</font></i>
</p><p><i><font>c) A questão fundamental de direito em que assenta a alegada divergência assuma um carácter essencial ou fundamental para a solução do caso, ou seja, que integre a verdadeira ratio decidendi dos acórdãos em confronto – não relevando os casos em que se traduza em mero obter dictum ou num simples argumento lateral ou coadjuvante de uma solução já alcançada por outra via jurídica».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Feito este excerto descritivo, a fim de determinar os critérios de decisão do presente debate, regressemos ao caso concreto.</font><br>
</p><p><font>No caso vertente, estando em causa o regime das cláusulas contratuais gerais, cujas normas recorrem a conceitos indeterminados, por exemplo, como no presente caso, a boa fé (artigo 15.º do DL 446/85), o processo de aplicação do direito faz-se numa base necessariamente casuística e contextualizada, através do recurso a um preenchimento valorativo insuscetível de generalizações, pois o que está em causa é a justiça contratual que tem uma natureza flexível e evolutiva. Por isso são corretos os critérios afirmados na decisão singular e que se reportam à diferente natureza e tipologia dos contratos em causa (um de concessão de crédito e outro de prestação de serviços de telecomunicações), à diferença entre os seus destinatários e utentes dos serviços, à diferença da função económico-social das prestações fornecidas. Também o sentido global das cláusulas contratuais gerais de cada contrato é distinto, não sendo correto, no plano da equidade inerente à justiça contratual, analisar-se o significado ou a validade/invalidade das cláusulas através de um juízo atomístico de cada uma das cláusulas isoladamente consideradas como pretende a recorrente.</font><br>
</p><p><font>O artigo 16.º do DL 446/85, aplicado pelo acórdão recorrido, recorre também a conceitos indeterminados e a cláusulas gerais, que remetem para a especificidade de casa situação: </font><br>
</p><p>
<table>
<tbody><tr><td><font>«Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:</font><br>
<p><font>a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;<br>
b) O objetivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efetivação à luz do tipo de contrato utilizado».</font></p></td></tr>
</tbody></table>
<font>Como afirma Baptista Machado (</font><i><font>Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador</font></i><font>, Almedina, Coimbra, 1983), os conceitos indeterminados e as cláusulas gerais visam realizar uma osmose entre o direito e as conceções sociais, bem como obter uma justiça individualizada e ajustada às especificidades do caso concreto.</font><br>
</p><p><font>A doutrina (Pais de Vasconcelos, </font><i><font>Contratos Atípicos</font></i><font>, Coimbra, 1995, p. 423.), referindo-se à proteção dos consumidores na contratação em massa, entende esta proteção não apenas como uma garantia da liberdade contratual, mas também uma forma de correção do desequilíbrio das prestações e de defesa da justiça interna do contrato.</font><br>
</p><p><font>Assim como não é possível uniformizar o sentido juridicamente relevante com que devem valer cláusulas contratuais gerais inseridas em contratos diferentes, ainda que o seu teor textual seja padronizado e idêntico, também não é possível generalizar os juízos de validade ou invalidade que incidem sobre elas, à luz da boa fé e de outros conceitos indeterminados.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Para além destas diferenças – conceituais, funcionais e fácticas – entre ambos os casos, não se pode considerar, como também se afirma na decisão singular, que a legislação aplicável ao contrato do acórdão recorrido e ao contrato do acórdão fundamento seja a mesma, pois que no acórdão recorrido foi aplicada, juntamente com o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, a Diretiva 2018/1972, de 11 de dezembro de 2018, que estabelece o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas. </font><br>
</p><p><font>O que vem agora a recorrente Vodafone afirmar como sendo um obstáculo à aplicação da diretiva – a circunstância de não sido transposta para o direito nacional – não tem fundamento, pois como tem sido prática dos tribunais tudo o que na diretiva estiver determinado de forma clara e precisa pode ser diretamente aplicável, conforme se esclareceu no acórdão recorrido e tem sido orientação da jurisprudência</font><i><font>, v. g.</font></i><font>, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-01-2010 (proc. n.º 2212/06.4TBMAI.P1.S1, segundo o qual </font><i><font>«As Directivas Comunitárias têm aplicação directa no ordem jurídica interna – mesmo entre particulares, ou seja, têm efeito horizontal -, mesmo que não transpostas ou transpostas em termos que as violem, desde que haja decorrido o prazo para a sua transposição e sejam suficientemente claras e precisas, se mostrem incondicionais e não estejam dependentes da adopção de ulteriores medidas complementares por parte dos Estados Membros</font></i><font>».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5. </font></b><font>Por último, adere-se ao argumento dos recorridos, segundo o qual a nulidade da cláusula em litígio não constitui </font><i><font>ratio decidendi</font></i><font> do acórdão recorrido, no sentido em que não foi o fundamento decisivo e efetivo para a decisão de condenação da Vodafone, pois sempre seria devido o reembolso dos pagamentos adicionais por força do artigo 9.º-A da Lei n.º 24/96, de 31 de julho (aditado pela Lei nº 47/2014 de 28-07-2014).</font><br>
</p><p><font>Em consequência, ainda que o Supremo Tribunal viesse a uniformizar jurisprudência no sentido requerido pela Vodafone, teria esta de devolver aos consumidores, de qualquer modo, os referidos pagamentos adicionais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Anexa-se sumário elaborado de acordo com o artigo 663.º, n.º 7, do CPC: </font>
</p><p><font>I - Estando em causa o regime das cláusulas contratuais gerais, cujas normas recorrem a conceitos indeterminados, por exemplo, como no presente caso, a boa fé (artigo 15.º do DL 446/85), o processo de aplicação do direito faz-se numa base necessariamente casuística e contextualizada, através do recurso a um preenchimento valorativo insuscetível de generalizações, pois o que está em causa é a justiça contratual que tem uma natureza flexível e evolutiva.</font><br>
</p><p><font>II - Assim como não é possível uniformizar o sentido juridicamente relevante com que devem valer cláusulas contratuais gerais inseridas em contratos diferentes, ainda que o seu teor textual seja padronizado e idêntico, também não é possível generalizar os juízos de validade ou invalidade que incidem sobre elas, à luz da boa fé e de outros conceitos indeterminados.</font><br>
</p><p><font>III – Os critérios destinados ao preenchimento valorativo de conceitos indeterminados são necessariamente casuísticos e destinam-se a possibilitar uma decisão que atende às particularidades do caso concreto, pelo que, pela sua natureza, são insuscetíveis de originar uma contradição de julgados. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>III – Decisão </font></b>
</p><p><font>Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e não admitir o recurso para uniformização de jurisprudência, confirmando-se a decisão reclamada.</font>
</p><p><font>Custas pela recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Supremo Tribunal de Justiça, 31 de janeiro de 2022</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora)</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto)</font>
</p><p><font> </font>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2.ª Adjunta)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
JTFYu4YBgYBz1XKvgvhK | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>DR. JOAQUIM CHAVES LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS S.A.</font></b><font> intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra </font><b><font>GRUPLAB GESTÃO DE INSVESTIMENTOS E ACTIVIDADES LABORATORIAIS S.A. DR. AA e DRA. BB</font></b><font>, todos melhor identificados nos autos, pedindo se declare o incumprimento contratual das obrigações assumidas perante a Autora e se condenem os Réus solidariamente no pagamento à Autora da quantia de € 2 605 012,02, acrescida de juros de mora vencidos sobre o capital, desde a citação até efetivo e integral pagamento.</font><br>
</p><p><font>Para tanto invoca, sumariamente, a Autora:</font><br>
</p><p><font>- ser uma sociedade prestadora de serviços de meios complementares de diagnóstico, sendo que, no âmbito dessa atividade, em 19-06-2008 a sociedade grupo Joaquim Chaves SGPS celebrou com os Réus um contrato promessa de compra e venda de ações e direito, nos termos do qual estes últimos prometeram vender à primeira pelo preço de € 11 975 000,00 as ações representativas da totalidade do capital social das sociedades L..., S.A. e V... S.A.;</font><br>
</p><p><font>- o referido contrato-promessa foi celebrado tendo por base determinados pressupostos, tendo o preço das vendas prometidas tido por referência as contas apresentadas no ano de 2007 que os Réus declararam ser verdadeiras e corretas, bem como que em 2008 não se verificariam alterações significativas;</font><br>
</p><p><font>- nesse mesmo contrato os Réus obrigaram-se a indemnizar a Autora por todos os prejuízos e despesas decorrentes de quaisquer reclamações de terceiros contra a sociedade L... e V...;</font><br>
</p><p><font>- em substituição da Grupo Joaquim Chaves SGPS, a Autora celebrou com os Réus, em 7 de Agosto de 2008, os contratos definitivos e prometidos de compra e venda de ações e direitos sobre a totalidade do capital social das sociedades L..., S.A. e V... S.A., contrato esse que nos termos da cláusula 4.ª ficou sujeito a todas as cláusulas e condições insertas no contrato-promessa e que se renovaram nessa data;</font><br>
</p><p><font>- nessa mesma data a Autora celebrou com os Réus um contrato de cessão de quotas da C... Lda., nos termos do qual os Réus cederam à Autora, livres de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, três quotas representativas da totalidade do capital social daquela sociedade e de que os réus eram titulares.</font><br>
</p><p><font>- O preço de tal contrato teve como condição a verificação de pressupostos previstos na cláusula 5.ª daquele contrato, e por referência as contas do ano de 2007 que os Réus declararam ser verdadeiras e corretas, sem alterações significativas de registo em 2008.</font><br>
</p><p><font>- os 2.º e 3.º Réus eram, para além de sócios, Diretores técnicos dos laboratórios das sociedades Gruplab e V... e assim continuaram depois da celebração dos contratos definitivos de compra e venda daquelas sociedades, sendo que a Ré BB cessou essas funções em 1 de março de 2009 e AA cessou-as a 20 de junho de 2013;</font><br>
</p><p><font>- não obstante as obrigações assumidas, a Autora, após a celebração do contrato definitivo, veio a apurar a existência de situações distintas das que constituíram os pressupostos do negócio, com reflexos significativos na desvalorização das empresas compradas, entre as quais (i) a facturação da Gruplab à L... de € 1 077 345,31 pela realização de análises clínicas entre janeiro e ulho de 2008, sem qualquer justificação e que visaram anular créditos naquele montante que a L... detinha sobre a Gruplab; (ii) a Gruplab emitiu à V... faturas no valor de € 280 000, pela alegada realização de análises, sem qualquer justificação e sem ter dado conhecimento à Autora e que visaram anular um crédito da V... sobre aquela empresa no mesmo montante;</font><br>
</p><p><font>- para além disto os Réus retiraram da L...o </font><i><font>software</font></i><font> de contabilidade bem como o computador de um colaborador onde se encontrava instalado tal </font><i><font>software</font></i><font>, propriedade de L..., bem como não foi encontrado diverso equipamento informático adquirido pela sociedade e que constava da lista do imobilizado com o valor de € 41 417,32, assim como o equipamento informático da V... e da C... Lda.</font><br>
</p><p><font>- De igual forma o 2.º Réu assinou um cheque sobre uma conta da V... no Banco Millenium BCP, à ordem da Gruplab, no valor de € 146 081,89 o qual apenas foi descontado em 5 de agosto de 2008, visando retirar da sociedade o referido montante;</font><br>
</p><p><font>- no imobilizado da V... encontra-se registado um trespasse, sendo certo que não existe nenhum ativo da empresa naquele montante;</font><br>
</p><p><font>- de igual forma o saldo de caixa não correspondia à realidade, bem como não foi encontrado o equipamento correspondente a um Liaison e que integrava o ativo da empresa L..., S.A.;</font><br>
</p><p><font>- por último os réus venderam diverso imobilizado das três sociedades, em 31-03-2008, tendo omitido as mesmas à Autora, assim como a Autora se deparou com a existência de dívidas quer a instituições de crédito quer a fornecedores.</font><br>
</p><p><font>Termina, assim, a Autora concluindo que os contratos devem ser pontualmente cumpridos e que o devedor que falta ao cumprimento torna-se responsável por esse prejuízo, o qual é reclamado na presente ação, no montante globalmente contabilizado de € 2 605 012,02.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Devidamente citados, vieram os Réus contestar a fls. 365 e ss., excecionando a incompetência territorial, prescrição e a extinção do direito da Autora pela fusão/dissolução das sociedades e alegando, em suma, que:</font><br>
</p><p><font>(i) abuso do direito</font><br>
</p><p><font>- a presente ação insere-se num plano maquiavélico elaborado pelo Autor com o desígnio de afastar os Réus do exercício da atividade de análises clínicas em especial no concelho ..., atuando assim a Autora com abuso de direito, ultrapassando os limites do normal e legítimo;</font><br>
</p><p><font>- o negócio em causa só se realizou após a realização de uma auditoria às empresas a adquirir a qual durou cerca de 3 meses, com entrega da documentação;</font><br>
</p><p><font>- e nos anos que se seguiram à outorga do contrato, os Réus conviveram de modo harmonioso com a Autora;</font><br>
</p><p><font>- com o despedimento do Réu AA e o encerramento do laboratório L..., os 2.º e 3.º Réus decidiram voltar a desempenhar a profissão de analistas clínicos abrindo o laboratório C..., situação que desencadeou o comportamento da Autora materializado em várias ações intentadas contra os Réus;</font><br>
</p><p><font>- com as consecutivas ações, o Autor pretende manter os Réus sobre um estado de permanente coação e desgaste emocional e económico-financeiro, bem como denegrir a imagem dos mesmos e abalar a sua reputação;</font><br>
</p><p><font>- durante toda a fase das negociações os Réus colocaram à disposição do Autor e dos seus representantes e técnicos as suas instalações e documentação, sendo que a relação de confiança era tanta que os Réus não fizeram intervir neste processo os seus advogados, tendo todo o processo sido liderado pelo Autor e seus representantes;</font><br>
</p><p><font>- Nas semanas seguintes à assinatura do contrato-promessa, os Réus, com a colaboração e supervisão do Autor, regularizaram situações contabilísticas e fiscais pendentes, bem como solicitaram à empresa de contabilidade a emissão de balancetes que refletissem a situação contabilística da empresa;</font><br>
</p><p><font>- os balanços analíticos reportados a 31-12-2007 apresentados ao Autor demonstravam a situação contabilística das sociedades;</font><br>
</p><p><font>- os balancetes de 31-07-2008, apresentados pelo Autor, não correspondem aos que foram entregues pelos Réus, pois que estes estavam devidamente assinados e acompanharam o contrato definitivo;</font><br>
</p><p><font>- as faturas emitidas pela Gruplab à L..., S.A. no valor de € 1 077 345,31 eram do conhecimento do autor aquando da negociação e outorga do contrato definitivo de compra de ações e direitos, e foram por esta aceites no balanço final do ano de 2008;</font><br>
</p><p><font>- é falsa a existência de um crédito da L... sobre a Gruplab, razão pela qual não podia o Autor contar com algo que não existia;</font><br>
</p><p><font>- as faturas emitidas pela Gruplab à V... no valor de € 280 000,00 eram igualmente do conhecimento da Autora aquando da negociação do contrato e foram aceites e refletidas no balanço final do ano de 2008.</font><br>
</p><p><font>- é falsa a existência de um crédito da V... sobre a Gruplab, razão pela qual não podia a Autora contar com algo que não existia;</font><br>
</p><p><font>- o </font><i><font>software</font></i><font> primavera estava licenciado em nome da L..., S.A. e aquando das negociações foi transmitido à Autora pelo 2.º Réu que pretendia que a respetiva licença fosse alterada para a GrupLab, caso não houvesse oposição, sendo que a Autora não manifestou qualquer interesse no referido </font><i><font>software</font></i><font> posto que não o utilizava no seu grupo empresarial;</font><br>
</p><p><font>- o Autor teve conhecimento da alteração da titularidade da licença do </font><i><font>software</font></i><font> em virtude de emails da empresa P..., sendo que a partir de julho de 2008 os contratos de assistência técnica passaram a ser faturados à Gruplab;</font><br>
</p><p><font>- no que respeita ao equipamento informático a Autora não realizou qualquer auditoria ao património da L..., razão pela qual não é crível que decorridos mais de seis anos venha a Autora referir desaparecimento desse material utilizado diariamente por diversos funcionários;</font><br>
</p><p><font>- de qualquer das formas, a Autora, no ano de 2009, procedeu à substituição do equipamento informático que compunha o património da L..., substituindo-o por HP, com vista à uniformização dos sistemas informáticos das empresas pertencentes ao grupo;</font><br>
</p><p><font>- da mesma forma a Autora não realizou qualquer auditoria ao património da V... ou da C...;</font><br>
</p><p><font>- no que respeita ao cheque no valor de € 146 081,89 o mesmo foi depositado em 08-05-2008, sendo que o mesmo se reporta a transações efetuadas e concluídas em data anterior às negociações para aquisição das sociedades;</font><br>
</p><p><font>- no que respeita ao trespasse foi explicado ao Autor, aquando da análise da documentação a que essa rubrica de referia, e tanto assim é que tal valor foi mantido na Prestação de Contas de 2008;</font><br>
</p><p><font>- o saldo de caixa só se comprova pela respetiva folha de caixa, pois que estando a empresa em atividade, os movimentos de caixa são dinâmicos, alterando-se diariamente;</font><br>
</p><p><font>- o equipamento Liaison fazia parte do equipamento da L... que continuou a pagá-lo até setembro de 2010;</font><br>
</p><p><font>- em 2009 os serviços de manutenção do g... retiraram este equipamento, conjuntamente com outros que entretanto ficaram desativados, tendo os mesmos sido transportados para a sede da Autora, tendo sido posteriormente vendidos por esta à empresa W... Lda;</font><br>
</p><p><font>- as vendas de imobilizado em nada afectaram o negócio celebrado ou desvalorizaram as sociedades e o seu património, sendo o seu valor real diverso daquele que consta dos documentos de venda, sendo que, não obstante, o Autor foi informado e esclarecido sobre o imobilizado existente nas três sociedades.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Deduziram ainda os Réus reconvenção, pedindo a condenação da Autora no pagamento ao 1.º Réu da quantia de € 800 000,00.</font><br>
</p><p><font>Alegaram, para tanto, em síntese, que:</font><br>
</p><p><font>- No contrato promessa celebrado entre os três Réus e a J... SGPS, ficou acordado que os 2.º e 3.º Réus manteriam o contrato de trabalho, comprometendo-se a J... SGPS a celebrar um contrato de prestação de serviços com a Gruplab com o valor anual de € 200 000, contrato esse que fazia parte integrante do negócio de compra e venda;</font><br>
</p><p><font>- não obstante, desde agosto de 2009 que a Autora deixou de liquidar tal quantia, sendo que uma vez que tal cláusula se mantém válida e eficaz, a Autora é devedora à 1.ª Ré de € 800 000,00</font><br>
</p><p><font>Requer assim a condenação da Autora em conformidade.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Veio a Autora replicar respondendo ao (i) pretenso abuso de direito, (ii) à litigância de má - fé, (iii) à matéria de exceção, bem como (iv) contestar a reconvenção alegando que o contrato não se renovou, razão pela qual, a partir de agosto de 2009, a Ré Gruplab nunca reclamou da J... SGPS ou da Autora o pagamento do preço dos serviços abrangidos naquele contrato, pois bem sabe que não prestou quaisquer serviços e que o contrato cessou em 31 de julho de 2009.</font><br>
</p><p><font>Mais impugnou os documentos juntos com a contestação sob os nºs 11,12,13, 15, 16, 17 e 18.</font><br>
</p><p><font>A fls. 625, foi proferido despacho no qual se declarou o tribunal territorialmente incompetente, ordenando a remessa para o Tribunal Judicial ....</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Foi dispensada a realização de audiência prévia – cf. fls. 713 – e foi proferido despacho que (i) admitiu liminarmente o pedido reconvencional deduzido pela 1.ª Ré, (ii) fixou valor à ação, (iii) saneou o processo, relegando para final o conhecimento das exceções invocadas, fixou o objeto do litígio, elencou os temas da prova, e decidiu da admissibilidade dos requerimentos probatórios.</font><br>
</p><p><font>Foi realizada prova pericial.</font><br>
</p><p><font>Procedeu-se à realização do julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a presente ação improcedente, por extinção por prescrição do direito da Autora, absolvendo os Réus do pedido.</font><br>
</p><p><font>Mais decidiu julgar improcedente a reconvenção deduzida pelos Réus contra a Autora, absolvendo-a do pedido.</font><br>
</p><p><font>Inconformada com a decisão a Autora interpôs recurso da sentença.</font><br>
</p><p><font>Também a Ré GRUPLAB interpôs recurso, mas o mesmo não foi admitido por extemporâneo.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Por acórdão proferido em 9 de janeiro de 2020, este Tribunal da Relação julgou o recurso improcedente e, consequentemente, confirmou a sentença recorrida.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> Porém, inconformada com a decisão, a Autora interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça que foi admitido por decisão da Formação de 03-11-2020, constituída ao abrigo do artigo 672.º, n.º 3, do CPC.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> Em 23-02-2021 foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça no qual foi entendido que os factos provados devem ser enquadrados nas normas relativas à responsabilidade contratual (artigos 798.º e ss do Código Civil).</font><br>
</p><p><font>Assim, o Supremo Tribunal de Justiça, julgou improcedente a exceção de prescrição e determinou a baixa dos autos ao tribunal recorrido para ser aplicado o direito aos factos provados, com o seguinte dispositivo:</font><br>
</p><p><i><font>«Nestes termos, decide-se na 1.ª Secção deste Supremo Tribunal de Justiça, conceder a revista, revogando o acórdão recorrido e determinando-se o reenvio do processo ao Tribunal da Relação, a fim de proceder à aplicação do direito aos factos».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>9.</font></b><font> Em cumprimento do citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, o Tribunal da Relação, à luz das normas da responsabilidade contratual, decidiu o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>«Em conformidade com o exposto, acordamos neste Tribunal da Relação de Lisboa e em conformidade com o determinado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que antecede, revogada a decisão da 1.ª instância, condenar os Réus solidariamente a pagar à Autora a título de responsabilidade contratual a quantia de € 1.524.155,36, acrescida da quantia que se vier a liquidar, nos termos do disposto no art.º 609.º n.º 2 do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>Custas pelos Apelados».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>10. </font></b><font>Inconformados com este acórdão, vêm os réus interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: </font><br>
</p><p><font>«A) O recurso tem por objeto o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.03.2022, que julgou novamente a causa, no seguimento do decidido pelo Supremo em acórdão de 23.02.2021.</font><br>
</p><p><font>B) No aludido acórdão de 23 de fevereiro de 2021, o Supremo Tribunal de Justiça revogou a decisão do Tribunal da Relação (que absolvia os Réus dos pedidos, por verificação da prescrição do alegado direito a indemnização, à luz da responsabilidade pré-contratual) e remeteu o processo novamente àquele Tribunal (da Relação), para que este decidisse a causa tomando por enquadramento jurídico os parâmetros da responsabilidade contratual (que não os da responsabilidade pré-contratual).</font><br>
</p><p><font>C) De tal aresto decorreu, assim, para o Tribunal da Relação, o dever de proceder à análise dos factos relevantes à luz do regime da responsabilidade contratual, de modo a, sob este ângulo de aferição jurídica, apreciar da procedência ou improcedência dos pedidos formulados pela Autora.</font><br>
</p><p><font>D) O Tribunal da Relação proferiu decisão em termos que não se afiguram compatíveis com a lei processual, bem como com a lei substantiva.</font><br>
</p><p><font>E) Na verdade, o Tribunal da Relação não cumpriu o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça pelo que, também por desrespeito da decisão do Supremo, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação é recorrível.</font><br>
</p><p><font>F) Desconformidade que se reflete, por outro lado, em violação de lei material.</font><br>
</p><p><font>G) A decisão é recorrível nos termos gerais, tendo a causa valor superior à alçada do Tribunal da Relação, cumprindo também o requisito da sucumbência e não tendo havido dupla conforme (cfr. dos artigos 629.º, n.º 1, 631.º, 637.º, 638.º, n.º 1, 671.º, n.º 1, 674.º, n.º 1, al. a), 675.º, n.º 1 e 676.º, n.º 1, todos).</font><br>
</p><p><font>H) O presente recurso tem por fundamento a violação de lei substantiva, na vertente de erro de interpretação e de aplicação da lei – artigo 674.º, n.º 1, al. a) do CPC –, bem como a violação de lei processual, por violação do artigo 662.º, n.º 2, do CPC, na medida em que o Tribunal da Relação não ordenou a produção de prova adicional em função do decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
</p><p><font>I) Com efeito, o Tribunal da Relação de Lisboa, apesar de não ter voltado a tomar por referência o regime da responsabilidade pré-contratual, não deu adequada execução ao decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, na medida em que, de forma errada, procedeu à aplicação da responsabilidade contratual à factualidade relevante.</font><br>
</p><p><font>J) Importa ainda esclarecer o concreto âmbito da decisão do Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
</p><p><font>K) Após o tribunal de 1.ª instância e o Tribunal da Relação terem considerado que seria de aplicar aos factos alegados ao regime jurídico da responsabilidade pré-contratual – e que, por esse motivo, a responsabilidade das ora Recorrentes teria prescrito – o Supremo Tribunal de Justiça decidiu nos termos seguintes:</font><br>
</p><p><i><font>“(…) reconhece-se à autora o direito de obter indemnização ou redução do preço do bem, em valor equivalente ao valor dos bens patrimoniais indevidamente subtraídos do património social, verificados os demais pressupostos da responsabilidade contratual a analisar pelas instâncias.”. (</font></i><font>pág. 43 do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, realce nosso).</font><br>
</p><p><font>L) Ora, o Supremo Tribunal de Justiça não determinou a condenação dos Réus, ora Recorrentes.</font><br>
</p><p><font>M) Cabia ao Tribunal da Relação de Lisboa, perante o enquadramento jurídico definido pelo Supremo Tribunal de Justiça,</font><br>
</p><p><font>i) Em primeiro lugar, efetuar uma apreciação dos factos provados, em ordem a concluir se esse acervo e o seu conteúdo se revela adequado, completo e coerente (ou, ao invés, desadequado, incompleto ou contraditório) para poder decidir ao abrigo do novo enquadramento jurídico - as regras da responsabilidade contratual – determinando, se necessário (e essa necessidade verifica-se, no caso em apreço, como </font><i><font>infra</font></i><font> melhor se explicitará), a modificação da matéria de facto;</font><br>
</p><p><font>ii) Em segundo lugar, (uma vez obtido um conjunto de factos provados capaz de permitir julgar ao abrigo das regras da responsabilidade contratual), selecionar quais as normas jurídicas aplicáveis (dentro da responsabilidade contratual), e subsumir a matéria de facto às normas jurídicas, de modo a apurar se os factos provados e eventualmente aqueles aditados efetivamente preenchem as hipóteses normativas, ou seja, se constituem factos ilícitos e culposos, praticados pelos Recorrentes, capazes de gerar uma obrigação de indemnizar ou não e (em caso afirmativo) em que medida. Também este dever não foi observado pelo Tribunal Recorrido.</font><br>
</p><p><font>N) Não o tendo feito, como se impunha que oficiosamente o fizesse, não agiu, o Tribunal da Relação, processualmente, como lhe competia, o que comprometeu definitivamente o acerto da decisão.</font><br>
</p><p><font>O) Numa breve súmula, no dia 19/6/2008 a Recorrida celebrou com os Recorrentes um contrato-promessa de compra e venda da totalidade das participações sociais das sociedades L... e V....</font><br>
</p><p><font>P) Em 7/8/2008 os Recorrentes celebraram com a Recorrida, individualmente, contratos de venda da totalidade das participações sociais da L... e da V....</font><br>
</p><p><font>Q) O preço manteve-se tal como acordado no contrato-promessa e a Recorrida dispôs de informação adicional que determinou o preço, nomeadamente os balancetes de 31/7/2008.</font><br>
</p><p><font>R) No mesmo dia 7/8/2008 a Recorrida celebrou com os Recorrentes um contrato de compra e venda de quotas da sociedade C....</font><br>
</p><p><font>S) Depois da aquisição das participações sociais da L..., V... e C..., a Recorrida constatou existir diminuição do ativo e aumento do passivo dessas sociedades, ao contrário do que havia sido acordado.</font><br>
</p><p><font>T) O Supremo Tribunal de Justiça determinou que essa diminuição do ativo e aumento do passivo são indemnizáveis pelos Recorrentes, no âmbito da responsabilidade contratual, conquanto digam respeito a atos (de diminuição do ativo ou de aumento de passivo) praticados após a celebração dos contratos (promessa ou definitivos).</font><br>
</p><p><font>U) Mais determinou o Supremo Tribunal de Justiça que o Tribunal da Relação de Lisboa deveria, à luz deste enquadramento, aplicar os factos ao direito, verificando, nomeadamente, se estão preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade contratual.</font><br>
</p><p><font>V) Assim, importa verificar se os danos que o Tribunal a quo considerou como indemnizáveis, por constituírem uma violação do contrato-promessa, ocorrida depois da sua celebração, são indemnizáveis.</font><br>
</p><p><font>W) No que respeita aos danos indemnizáveis, o Tribunal da Relação de Lisboa identificou seis tipos de danos a indemnizar pelos Recorrentes:</font><br>
</p><p><font>a. € 1.077.345,31 respeitante a faturas emitidas pela Ré Gruplab à L..., em 31 de julho de 2008 (v. facto provado 20.);</font><br>
</p><p><font>b. € 280.000 respeitante a faturas emitidas pela Ré Gruplab à V..., em 31 de julho de 2008 (v. facto provado 21.);</font><br>
</p><p><font>c. € 146.081,89 referente a serviços de análises clínicas prestados pela Ré Gruplab à V..., prestados em 2007, mas faturados em 2009 (v. facto provado 25.);</font><br>
</p><p><font>d. € 12.696,47 referente ao saldo de caixa da V... (v. facto provado 30.);</font><br>
</p><p><font>e. € 8.031,69 referente a dívidas existentes mas não refletidas na contabilidade da C... (v. facto provado 44.);</font><br>
</p><p><font>f. Quantia ilíquida, referente a imobilizado vendido e não comunicado à Recorrida (v. factos provados 36. a 39.).</font><br>
</p><p><font>X) Responsabilidade pré-contratual. Alguns dos factos em que o Tribunal da Relação de Lisboa sustenta a decisão de condenar os Recorrentes a indemnizar a Recorrida constituem violações pré-contratuais, pelo que não podem servir de alicerce à decisão proferida, o que determina a insusceptibilidade de permanência da decisão recorrida na ordem jurídica enquanto assente nesta base</font><br>
</p><p><font>Y) Veja-se o facto provado 25.:</font><br>
</p><p><i><font>“O Réu AA assinou um cheque com a data </font></i><b><i><font>de 30-11-2007,</font></i></b><i><font> sacado sobre uma conta bancária da sociedade V... S.A. no Banco Millenium BCP, à ordem de Gruplab S.A. no valor de € 146 081,89 (…), o qual apenas [foi] apresentado a pagamento em </font></i><b><i><font>08-05-2008.”.</font></i></b><br>
</p><p><font>Z) Ora, quer a assinatura do cheque, quer o levantamento do mesmo (e, nessa medida, a diminuição do património da V...), ocorreram antes da data de celebração do contrato-promessa de compra e venda, assinado em 19 de junho de 2008 (facto provado 4). Assim, não há ilicitude, não havendo lugar à redução do preço no referido montante.</font><br>
</p><p><font>AA) O mesmo se diga a respeito da quantia de € 8.031,69 referente a dívidas existentes mas não refletidas na contabilidade da C..., e que resulta do facto provado 44.:</font><br>
</p><p><font>“44</font><i><font>. Nas suas contas a sociedade C... Lda. tinha registado, a 31-07-2008, uma dívida de €1875,61 a fornecedores e uma divida [sic] de €6 156,08 a fornecedores de imobilizado.”.</font></i><br>
</p><p><font>BB) Conforme resulta dos factos provados, não foi celebrado qualquer contrato-promessa a respeito da transmissão das quotas da C..., mas apenas o contrato definitivo de cessão de quotas, em 7/8/2008 (facto provado 10.).</font><br>
</p><p><font>CC) Assim, a dívida já existia na data de celebração do contrato de cessão de quotas pelo que estaríamos, em tese, perante responsabilidade pré-contratual, já prescrita nos termos do artigo 227.º, n.º 2, do Código Civil, pelo que deveria o montante indemnizatório ser reduzido em € 154.113,58, nos termos descritos, impondo-se a substituição do acórdão recorrido por outro que proceda a uma correta aplicação do direito aos factos, nos termos do artigo 674.º, n.º 1, al. a), do CPC e sob pena de violação do determinado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
</p><p><font>DD) Abuso de direito. Em todo o caso, e sem prescindir, o pedido de indemnização da Recorrida é abusivo, inserindo-se na categoria da suppressio, no âmbito do abuso do direito.</font><br>
</p><p><font>EE) Assim, por aplicação do artigo 334.º do Código Civil, a pretensão da Recorrida de exercício de direitos contratuais de que julga ser titular é ilegítima, não devendo ser atendida.</font><br>
</p><p><font>FF) São enumerados como requisitos para a verificação desta figura os seguintes, não sendo necessário, contudo, a verificação de todos eles: um não exercício prolongado do direito; uma situação de confiança daí derivada para a contraparte, coadjuvada por elementos circundantes que a sustentem; uma justificação para essa confiança; um investimento de confiança; a imputação ao não exercente da confiança criada. Não releva também a verificação da culpa ou de qualquer outro estado subjetivo por parte da Recorrida, conforme tem sido entendido pela jurisprudência.</font><br>
</p><p><font>GG) Ora, no presente caso a Recorrida criou a confiança de que não iria exercer qualquer direito a indemnização que eventualmente tivesse sobre os Recorrentes:</font><br>
</p><p><font>HH) não só os contratos definitivos foram assinados em agosto de 2008 (desde essa data que a Recorrida dispõe de toda informação),</font><br>
</p><p><font>II) como as contas das sociedades foram aproveitas, tendo a Recorrida colhido os benefícios fiscais dos pagamentos que as sociedades adquiridas efetuaram às Recorrentes, e foi aprovado o processo de fusão ou liquidação das sociedades (factos provados 45. a 50. e 52. a 54.).</font><br>
</p><p><font>JJ) No entanto, foi apenas em outubro de 2014 que a Recorrida deu entrada a presente ação, isto é, quase 7 anos após ter adquirido as participações das referidas sociedades e assim conhecer toda a situação patrimonial.</font><br>
</p><p><font>KK) Note-se ainda que, no presente caso, estaríamos perante uma exceção de caducidade, não invocada pelos Recorrentes na medida em que enquadraram os factos alegados pela Recorrida na responsabilidade pré-contratual, tal como o tribunal de 1.ª instância e o Tribunal da Relação.</font><br>
</p><p><font>LL) Em todo o caso, havendo responsabilidade contratual, aplica-se o regime da compra e venda de bens defeituosos, previsto nos artigos 913.º e ss. do Código de Processo Civil – cfr., a título de exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26/11/2014, Proc. 282/04.9TBAVR.C2.S1, Relator: TAVARES DE PAIVA.</font><br>
</p><p><font>MM) Ora, nesse caso, e ainda que se considere que estamos perante um bem imóvel, a denúncia do defeito deveria ser feita no prazo de um ano após o conhecimento do defeito e até cinco anos após a entrega das ações da L... e da V... e das quotas da C... (artigo 916.º, n.os 2 e 3 do Código Civil) e a correspondente ação ser proposta no prazo de seis meses após a denúncia (artigo 917.º).</font><br>
</p><p><font>NN) A denúncia foi feita muito depois de uma no após a Recorrida estarem condições de conhecer o defeito – quando as ações e quotas foram transmitidas –, tendo a ação correspondente dado entrada em 02-10-2014, isto é, mais de seis anos após a venda das participações sociais, que ocorreu em 07-08-2008.</font><br>
</p><p><font>OO) A exceção de caducidade não é de conhecimento oficioso, pelo que não poderia ser conhecida pelo Tribunal a quo. Em todo o caso, é relevante para confirmar que estamos perante uma situação de </font><i><font>suppressio.</font></i><br>
</p><p><font>PP) Assim, no presente caso, o direito da Recorrida já teria caducado. Independentemente desse facto, as circunstâncias do exercício do direito pela Recorrida, confirmam que esse exercício foi abusivo, pelo que terá de se concluir, em virtude das circunstâncias em causa, que o exercício do direito pela Recorrida, através da presente ação, é abusivo, não tendo, consequentemente, direito aos montantes que reclama, revogando-se assim o acórdão recorrido por outro que absolva as Recorrentes, nos termos dos artigos 576.º, n.º 3 e e 674.º, n.º 1, al. a), ambos do CPC.</font><br>
</p><p><font>QQ) Da renúncia aos efeitos da ilicitude. Se se entender que o exercício do direito a uma indemnização, pela Recorrida, não é abusivo, o que apenas se equaciona por dever de patrocínio, importa ainda apurar se a Recorrida renunciou aos efeitos da alegada ilicitude dos contratos de compra e venda.</font><br>
</p><p><font>RR) Da factualidade já dada por provada, existem indícios nesse sentido, na medida em que aprovou as contas da sociedade e nada fez.</font><br>
</p><p><font>SS) Resulta ainda dos factos provados o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>“19. As contas das três sociedades fornecidas à Autora pelos Réus na fase pré-contratual e que determinaram o preço de aquisição oferecido pela Autora foram os balancetes de 31-07-2008.” (facto provado 19., realce nosso).</font></i><br>
</p><p><i><font>“51. Os Réus [ora Recorrentes] durante a fase de negociações, quer no período entre a celebração do contrato promessa e o contrato definitivo em 07-08-2008, foram prestando informações verbais e documentais à Autora.” (facto provado 51.).</font></i><br>
</p><p><font>TT) A Recorrida, perante a nova informação e com base nela, determinou o preço de aquisição das sociedades, aceitando o que havia sido estipulado aquando do contrato-promessa. Assim, haverá que apurar se existiu uma | [0 0 0 ... 0 0 0] |
HDJsu4YBgYBz1XKvoQbP | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<font>Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça</font></div><br>
<font> </font>
<p><b><font>Relatório</font></b>
</p><p><b><font>1. AA, </font></b><font>réu/recorrido nestes autos, tendo sido notificado do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, datado de 2 de dezembro de 2020, que o condenou, a si e à interveniente principal: i) no pagamento à autora na indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 150.000,00, com juros de mora a partir desta decisão e até efectivo e integral pagamento; ii) na indemnização por danos patrimoniais, nos termos do artigo 564º nº 1 do Código Civil, a liquidar em execução de sentença, acrescidos de juros de mora a partir da citação e até efetivo e integral pagamento; e iii) na indemnização por danos patrimoniais futuros (artigo 564º nº2 e 569º nº 1, ambos do Código Civil, a liquidar em execução de sentença) vem, nos termos dos artigos 195º, 613º a 617º, 666º, 685º, todos do CPC:</font>
</p><p><font>«I - Arguir a nulidade processual, nos termos do artigo 195º nº 1 do CPC, por omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve e a irregularidade cometida influir no exame e na decisão da causa.</font>
</p><p><font>II - Arguir a nulidade do acórdão de Revista por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no nº 1, alínea d) do artigo 615º do CPC.</font>
</p><p><font>III - Requerer a reforma do acórdão de revista com fundamento em manifesto erro na determinação da norma aplicável e qualificação jurídica dos factos, nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 616º do CPC».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Os fundamentos da reclamação estão expostos em 32 páginas, sem conclusões, que se consideram aqui integralmente reproduzidas devido à sua extensão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> A autora,</font><b><font> BB,</font></b><font> notificada do requerimento do Réu, veio apresentar a sua resposta, na qual defende que devem ser indeferidas as nulidades arguidas, que a reforma pretendida não é legalmente admissível, por não estarem verificados os requisitos do artigo 616.º, n.º 2, do CPC, e que não se verifica qualquer erro de julgamento. Termina, requerendo a aplicação do artigo 670.º do CPC, tendo em conta a extensão do requerimento apresentado pelo réu e a sua falta de fundamento.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II - Fundamentação</font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font> </font>
</p><p><b><font>1. e 2. Arguição de nulidades</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Invoca o reclamante que, no apenso (processo n.º 359/10……) ao presente processo, a Relatora decidiu, por despacho singular, a admissibilidade do recurso de revista da Autora, na sequência de uma reclamação desta, ao abrigo do artigo 643.º do CPC, contra o despacho de não admissibilidade do recurso proferido pelo Tribunal da Relação. Entende que foi omitida uma formalidade essencial, na medida em que o réu reclamou do despacho singular para a Conferência, nos termos previstos no artigo 643.º, n.º 4, que remete para o artigo 652.º, n.º 3, ambos do CPC, mas não obteve resposta a essa reclamação. Alega, em consequência, que, verificada uma nulidade processual, o Acórdão reclamado deve ser anulado, nos termos do artigo 195.º, n.º 2, CPC, ou, em alternativa, anulado por estarmos perante uma omissão de pronúncia, ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, al. </font><i><font>d)</font></i><font>, do CPC.</font>
</p><p><font>A omissão de pronúncia a que se refere a citada al. </font><i><font>d)</font></i><font> do nº 1 do artigo 615.º traduz-se na circunstância de o juiz não se ter pronunciado sobre questões que devesse apreciar ante o estatuído na 1ª parte do nº 2 do artigo 608.º, do CPC, vício este, que, no entanto, não se confunde com a omissão da prática de ato processual que devesse ter sido praticado. Como é sabido, enquanto que as nulidades da sentença (a que se reporta o artigo 615.º do CPC) derivam de atos ou omissões praticados pelo juiz no acórdão (ou na sentença) e são arguidas e conhecidas pelo tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>, as nulidades processuais derivam de atos ou omissões que foram praticados antes da prolação do acórdão e, constituindo anomalia do processado, devem ser conhecidas no tribunal onde ocorreram. </font>
</p><p><font>Consultado o processo que correu por apenso, com base na reclamação da autora ao abrigo do artigo 643.º, n.º 1, do CPC, constata-se a omissão da prática de um ato: a intervenção da Conferência, suscitada pelo ora reclamante, sobre a questão da admissibilidade do recurso. Tendo sido omitida a prática de um ato que devia ter ocorrido em momento anterior à prolação do acórdão, em princípio, estariamos perante uma nulidade processual nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do CPC, que, em abstrato, seria suscetível de influir no exame da causa. </font>
</p><p><font>Todavia, considera-se que esta nulidade processual ficou suprida pelo acórdão de revista, proferido em 2 de dezembro de 2020, que julgou a questão colocada pelo réu na reclamação para a Conferência, quando, a fls. 26 e 27, justificou a ausência de dupla conformidade, nos seguintes termos, que agora se reproduzem: </font>
</p><p><font>«As instâncias declararam a ação improcedente com um fundamento distinto. </font>
</p><p><font>O Tribunal Judicial da Comarca ... considerou não verificados os requisitos da responsabilidade civil médica, por entender que a autora não provou a violação do dever de informação, nem o nexo de causalidade entre os procedimentos médicos utilizados pelo réu e os danos sofridos, enquanto factos constitutivos do seu direito à indemnização.</font>
</p><p><font>O acórdão recorrido, no decurso das alterações de facto a que procedeu, entendeu que a autora não foi informada das caraterísticas do produto utilizado no tratamento, o C....., designadamente do caráter definitivo do tratamento e do facto de o produto infiltrado nas rugas se comportar como uma prótese. Contudo, considerou que o ónus da prova do consentimento informado se repartia entre o réu (médico) e a entre a autora (lesada), cabendo a esta a demonstração da previsibilidade dos riscos, do seu caráter significativo e grave. Assim, no sumário do acórdão recorrido, concluiu-se que «Enquanto facto impeditivo do direito da apelante compete ao réu/recorrido (médico), fazer a prova do consentimento informado, mas essa prova não abrange a demonstração de que os riscos que não foram informados eram imprevisíveis, irrazoáveis ou não significativos, cabendo antes ao lesado demonstrar que o risco de cuja verificação resultaram os danos era um dos riscos conhecidos, previsíveis, razoáveis e significativos que lhe deviam ter sido transmitidos». </font>
</p><p><font>Ainda assim, para que não restem dúvidas de que os argumentos do réu foram considerados, decide-se, agora, responder expressamente à reclamação para a Conferência então apresentada, ao abrigo do artigo 643.º, n.º 4, do CPC, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido. </font>
</p><p><font>O conteúdo do despacho singular impugnado foi o seguinte: </font>
</p><p><b><font>«3.</font></b><font> O artigo 671.º, n.º 3, do CPC, dispõe o seguinte: </font><i><font>«Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte».</font></i><font> Sendo assim, uma das situações em que deixa de se verificar o requisito negativo da dupla conformidade e em que o recurso de revista deve ser admitido, verifica-se quando o Tribunal da Relação assenta a sua decisão numa fundamentação essencialmente diferente.</font>
</p><p><font>Ponderados os argumentos de ambas as partes e analisadas a sentença e o acórdão do Tribunal da Relação, resulta que tendo o acórdão recorrido modificado a matéria de facto provada e não provada em relação ao dever de informação do médico, cujo cumprimento o tribunal de 1.ª instância considerou provado e o Tribunal da Relação considerou não provado, tal permite, em abstrato, a discussão de percursos jurídicos novos, e a reanálise e reponderação dos mesmos institutos jurídicos a outra luz, tanto mais que o instituto da responsabilidade civil médica está em permanente evolução e discussão doutrinal.</font>
</p><p><font>Para o que aqui releva, o tribunal recorrido considerou não provados os seguintes factos:</font><br>
<font>s) Na consulta pré-operatória com o 1º réu em 26-07-1994, este prestou à autora os esclarecimentos globais e individuais de todo o processo cirúrgico a realizar e foram ponderados e discutidos os riscos e os benefícios associados, os quais foram compreendidos e aceites pela autora;</font><br>
<font>t) Durante todo o processo, pré e pós-operatório, tanto a paciente, ora autora, como o cirurgião, ora ré, discutiram detalhadamente os pormenores das intervenções em causa.</font>
</p><p><font>Se é certo que ambas as instâncias decidiram com base na responsabilidade civil médica e na análise dos seus pressupostos, o acórdão recorrido, em virtude da alteração da matéria de facto a que procedeu, colocou de outra forma o requisito da ilicitude, com repercussão na repartição do ónus da prova entre autora e réu. </font>
</p><p><font>O tribunal de 1.ª instância afastou liminarmente o requisito da ilicitude por não ter sido provada a violação do dever de informação pelo médico, independentemente da repartição das regras quanto ao ónus da prova; já o acórdão recorrido considerou que a autora não foi informada das caraterísticas do produto utilizado no tratamento,</font><i><font> o C.....,</font></i><font> designadamente o caráter definitivo do tratamento e que o produto infiltrado nas rugas se comportava como uma prótese. Entendeu o acórdão recorrido que não se tinha</font><i><font> </font></i><font>provado o cumprimento do dever de informação quanto aos riscos resultantes da aplicação desse produto, fazendo incidir o debate na questão de saber como se reparte o ónus da prova entre a autora (lesada) e o réu (médico) quanto à previsibilidade desses riscos, ao seu caráter significativo e grave, e ao seu conhecimento médico à data das intervenções. Por outro lado, aceitou, diferentemente do tribunal de 1.ª instância, a existência de um nexo de causalidade entre a aplicação do </font><i><font>C.....</font></i><font> e os danos sofridos pela autora. </font>
</p><p><font>Pelo que, tem de se considerar que a fundamentação aduzida pelo acórdão recorrido é essencialmente diferente da desenvolvida na sentença de 1.ª instância – o argumento decisivo para a improcedência da ação incidiu sobre uma questão distinta daquela que baseou a sentença de 1.ª instância e foi proferida também uma opinião distinta da desenvolvida pelo tribunal de 1.ª instância acerca do nexo de causalidade – o que justifica a abertura à recorrente do recurso de revista, com fundamento no artigo 671.º, n.º 3, do CPC, segunda parte». </font>
</p><p><font>Em síntese, no caso vertente, a alteração factual a que procedeu o Tribunal da Relação incidiu, não sobre uma questão lateral ou secundária na economia do processo, mas sobre uma questão decisiva para a indagação do cumprimento ou incumprimento do dever de informação do médico, questão de direito essencial para a análise dos pressupostos da responsabilidade civil, cujo tratamento tem evoluído significativamente no direito nacional e europeu no sentido de uma proteção crescente do lesado, sobretudo quanto à importância do consentimento informado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Vejamos: </font>
</p><p><font>O Tribunal da Relação deu como não provados os factos que a sentença de 1.ª instância considerou provados (factos n.º 55 e 59) e que diziam respeito aos esclarecimentos que o médico teria prestado à paciente, a questão central do processo, na medida em que o fundamento invocado pela recorrente, para fundamentar o seu direito à indemnização, foi a violação do dever de informação pelo médico.</font>
</p><p><font>O acórdão do Tribunal da Relação fundamentou assim a modificação dos factos:</font>
</p><p><i><font>“Serve isto para dizer que não tendo a prova produzida incidido sobre os esclarecimentos que terão sido prestados à autora previamente à realização das cirurgias que efectuou, não se alcança de que modo se pode dar como provado que todo esse processo cirúrgico foi precedido de esclarecimentos globais e individuais, porque ninguém se pronunciou, em concreto, sobre qualquer uma dessas intervenções, pelo menos no que diz respeito às informações que sobre elas terão sido prestadas.</font></i>
</p><p><i><font>Todavia, se ao se referir ao processo cirúrgico que se iniciou subsequentemente à consulta de 26 de Julho de 1994 o tribunal recorrido inclui a infiltração do produto C....., de igual modo não se vislumbra que a prova que convocou para sustentar a afirmação de que foram prestados todos os esclarecimentos globais e individuais desse procedimento seja suficiente para o demonstrar”.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Afirmou o acórdão recorrido que, não havendo documento escrito a demonstrar o consentimento informado, a única prova válida para o efeito era o depoimento de parte da autora e do réu.</font>
</p><p><font>Referindo-se às declarações de parte da autora e do réu, o acórdão da Relação concluiu o seguinte:</font>
</p><p><i><font>“Naturalmente que tais declarações contrariam, de facto, os factos provados nos pontos 55. e 59., pois que a autora nega que lhe tenha sido dada qualquer explicação, informação ou esclarecimentos sobre o produto e sobre a maneira como este funcionava, tendo-lhe sido referido apenas que se tratava de um produto para encher as rugas e a boca, nunca lhe tendo sido referido que se tratava de um procedimento definitivo. </font></i>
</p><p><i><font>(…)</font></i>
</p><p><i><font>Sucede, porém, que neste caso não se pode acompanhar o tribunal recorrido quando, valendo-se sobremaneira das declarações de parte do réu AA, dá como provados os factos vertidos nos pontos 55. e 59.</font></i>
</p><p><i><font>Na verdade, a assertividade que a senhora juíza a quo identificou em tais declarações não são extensíveis à concreta questão que está em apreciação nos pontos de facto impugnados, ou seja, o alcance da informação que foi prestada à autora sobre a infiltração do produto para enchimento de rugas profundas.</font></i>
</p><p><i><font> (…)</font></i>
</p><p><i><font>No que concerne à transmissão à paciente das características do produto C..... aplicado em Setembro de 1994 e do modo como funcionava e seus eventuais efeitos adversos, não se pode, em rigor, aceitar que o réu tenha logrado convencer que prestou todos os esclarecimentos acerca do procedimento, nomeadamente, que tenha sido conversado e discutido entre ele e a autora os riscos e benefícios decorrentes desse procedimento».</font></i>
</p><p><font> </font><i><font> </font></i>
</p><p><font>Apesar de o Tribunal da Relação ter confirmado a absolvição do réu, a modificação dos factos provados e não provados a que procedeu repercutiu-se, de forma inovatória, na fundamentação aduzida, tendo a Relação justificado de forma essencialmente diversa a decisão, suscitando questões novas e resolvendo de forma distinta as questões do ónus da prova do dever de informação e do nexo de causalidade. Enquanto a sentença de 1.ª instância aplicou ao caso as regras gerais da responsabilidade civil, onerando a paciente com a prova dos factos constitutivos do seu direito, o Tribunal da Relação, para além da alteração da matéria de facto em pontos essenciais, suscetíveis de se repercutirem na resolução da questão de direito, analisou os requisitos da responsabilidade civil a uma luz completamente distinta do tribunal de 1.ª instância, tendo em conta as especificidades da responsabilidade médica e recorrendo a uma motivação jurídica essencialmente distinta. Assim, tem de se considerar que, nos termos exigidos pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, estamos perante uma fundamentação essencialmente distinta, a que alude o artigo 671.º, n.º 3, do CPC, na medida em que as instâncias divergiram essencialmente no </font><i><font>iter</font></i><font> jurídico conducente à mesma decisão, relevando sobremaneira a análise da questão fulcral adotada pelas instâncias (09-07-2015 - Revista n.º 5838/11. .0TBMAI.P1.S1 - 7.ª Secção).</font>
</p><p><font>No mesmo sentido, referindo-se à essencialidade da modificação dos factos operada pela Relação, apesar de a parte dispositiva das decisões das instâncias ser idêntica, </font><i><font>vide</font></i><font> o acórdão deste Supremo datado de 26-11-2015 - Revista n.º 6027/09.0TVLSB.L1.S1, que no seu sumário afirmou o seguinte:</font>
</p><p><font>«I - </font><i><font>A circunstância de ter havido dupla conforme no que respeita ao estrito segmento decisório, confirmando a Relação a sentença apelada, não inibe o acesso ao STJ quando tais decisões idênticas assentaram numa fundamentação essencialmente diferente, enquadrável no n.º 3 do art. 671.º NCPC (2013) – o que ocorre quando a decisão constante da sentença assentou em se não ter considerado provada determinada factualidade essencial, ao passo que – no acórdão proferido pela Relação – se alterou o julgamento da matéria de facto, considerando provado aquele facto essencial, baseando-se a improcedência da acção numa argumentação esgrimida no plano jurídico, por não preencherem os factos definitivamente provados a fattispecie normativa invocada pelo autor. (…)»</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Pelo que, não se verificou no caso vertente dupla conformidade quanto aos fundamentos das decisões das instâncias, justificando-se a intervenção deste Supremo em sede de recurso de revista normal.</font>
</p><p><font>Assim, confirma-se em Conferência o despacho da Relatora que admitiu o recurso de revista, ficando suprida a nulidade processual invocada, sem necessidade de anular todo o processado subsequente, de acordo com o princípio de que os efeitos da nulidade processual devem ser circunscritos ao indispensável, conforme salienta a doutrina (cfr. Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, </font><i><font>Código de Processo Civil Anotado, </font></i><font>Volume 1.º, 4.ª edição, 2018, p. 404), remetendo a lei esse juízo de anular ou não os atos subsequentes ao ato omitido para uma análise casuística do juiz (Abrantes Geraldes, </font><i><font>Código de Processo Civil Anotado</font></i><font>, Vol. I, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2020, p.249). </font>
</p><p><font>Por último, reafirma-se que não se verifica no Acórdão agora impugnado, proferido em 2 de dezembro de 2020, qualquer nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que este decidiu todas as questões suscitadas pela recorrente nas conclusões do recurso e respondeu expressamente à questão suscitada pelo reclamante em relação à admissibilidade do recurso de revista. Como é sabido, a mera ausência de resposta a todos os argumentos invocados pelo reclamante não constitui qualquer nulidade por omissão de pronúncia, ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, al. </font><i><font>d),</font></i><font> do CPC. Tem sido entendimento da doutrina e da jurisprudência, que importa distinguir entre as questões postas na ação e os argumentos apresentados para sustentar a pretensão ou posição processual. Neste conspecto, a nulidade por "omissão de pronúncia" só existe se o juiz deixar de se pronunciar sobre as questões postas pelas partes e não se deixar de apreciar algum dos argumentos utilizados (cfr., por todos, Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 06-10-2002, proc. n.º 02S1599; Acórdão de 08-01-2015, proc. n.º 129/11.0TCGMR.G1.S1). No mesmo sentido, Albertos dos Reis (</font><i><font>Código de Processo Civil Anotado</font></i><font>, Vol. V, p. 143, afirmava </font><i><font>que “Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão (…)”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em consequência, improcede a arguição de nulidades do acórdão.</font><b><font> </font></b><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> </font><b><font>Reforma do acórdão</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.1. </font></b><font>O reclamante pede ainda a reforma do Acórdão com base n</font><font>o artigo 616.º, n. 2, al. </font><i><font>a)</font></i><font>, do CPC, pugnando para que o Acórdão reclamado seja substituído por outro que o absolva do pedido, por entender que houve um erro manifesto na determinação da norma aplicável e na qualificação jurídica dos factos. </font>
</p><p><font>Mas não tem razão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Nas suas alegações, o reclamante</font><b><font> </font></b><font>incorre numa confusão entre requisitos de reforma do acórdão e o alegado erro de julgamento. O artigo 616.º do Código de Processo Civil permite que seja requerida a reforma da sentença quando </font><i><font>“tenha ocorrido lapso manifesto na determinação da norma aplicável, na qualificação dos factos ou na omissão de considerar documento ou outro elemento meio de prova plena que só por si implicasse necessariamente decisão diversa”</font></i><font> (cfr. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, </font><i><font>Código de Processo Civil Anotado,</font></i><font> Vol. II, p. 742). </font>
</p><p><font>No mesmo sentido se tem orientado a jurisprudência, como é o caso, entre muitos outros, dos Acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 02-06-2020</font><b><font> </font></b><font>(proc. n.º 2444/07.8TVLSB.L1.S1), e de 26-01-2021 (proc. n.º 8963/16.8T8ALM-B-L1.S1), que afirmaram que </font><i><font>«A reforma do acórdão é uma faculdade excecional só admissível em hipóteses de lapso manifesto, ou seja, de falha ostensiva na valoração de um meio de prova plena ou do direito aplicável, como, por exemplo, quando se aplica legislação revogada. Não é, portanto, mais um grau de recurso, ao dispor da parte descontente para expressar a sua discordância com a solução jurídica que não lhe foi favorável». </font></i><font>Também no Acórdão de 28 de janeiro de 2020 (Revista n.º 392/18.5T8STR-C.E1-A.S1), se estabeleceu que</font><i><font> «A circunstância das partes não estarem de acordo com a decisão produzida, não é fundamento para sustentar a reclamação por nulidades e/ou reforma do acórdão, constituindo um incidente extravagante». </font></i><font>Esta orientação jurisprudencial é já antiga, remontando ao antigo artigo 669.º do CPC, norma de conteúdo semelhante ao artigo 616.º do CPC, conforme se estipulou no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 09-06-2005 (proc. n.º 05B1422), «</font><i><font>A reforma da sentença (ou do acórdão) a que alude o nº 2 do artigo 669º do Código de Processo Civil não abrange qualquer erro de julgamento, mas apenas aquele que foi resultante de lapso do julgador na fixação dos factos ou na interpretação e aplicação da lei».</font></i>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>3.2.</font></b><font> Ora, o requerimento apresentado pelo Réu não se fundamenta em nenhuma das referidas possibilidades de reforma do acórdão, nos termos do referido artigo 616º do Código de Processo Civil, antes correspondendo a uma nova alegação de recurso, sendo que não existe no ordenamento jurídico um quarto grau de jurisdição, nem tal seria comportável ou constitucionalmente exigível. Na sua reclamação, o reclamante volta a discutir os argumentos técnico-jurídicos subjacentes à questão de mérito decidida pelo acórdão reclamado – a extensão do dever de informação do médico e o ónus da prova do seu cumprimento, o nexo de causalidade entre o tratamento e o dano, a presunção de comportamento conforme à informação e a presunção de culpa ínsita no artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil, bem como o montante da indemnização arbitrada – questões que não cabem no objeto de um pedido de reforma do acórdão, por não ter sido demonstrado qualquer erro na determinação da norma aplicável, lapso manifesto ou desconsideração de um documento dotado de força probatória plena, que implicasse solução diversa. </font>
</p><p><font>O reclamante assume a sua opinião em relação aos pressupostos da responsabilidade civil médica, questão em relação à qual tem aumentado a litigiosidade entre médicos e pacientes outrora praticamente inexistente. Mas nada afirma que possa sustentar a existência de um lapso manifesto na determinação da norma aplicável ou na qualificação dos factos. Na verdade, o vício que o Réu imputa ao Acórdão reclamado é o de “erro de julgamento”, como decorre do teor do pedido de reforma e como refere expressamente a fls. 10 e fls. 31 da “alegação”, conforme se passa a ilustrar: Fls.10: “Existe, por isso, um manifesto e cabal </font><u><font>erro de julgamento</font></u><font> na apreciação e decisão do presente acórdão de Revista” (sublinhado nosso); Fls. 31: “Por conseguinte, na apreciação do mérito, não se pode deixar de concluir que, </font><i><font>in casu</font></i><font>, se está perante um </font><u><font>erro de julgamento</font></u><font>, decomposto em erro de qualificação e apreciação dos factos provados e na aplicação do direito, sendo que, em</font><i><font> </font></i><font>qualquer das referidas modalidades, reconduz-se sempre a violação da lei substantiva” (sublinhado nosso). </font>
</p><p><font>Ora, é consensual, que, tendo</font><b><font> </font></b><font>a reforma da sentença como desiderato suprir os lapsos ou erros manifestos assinalados nas alíneas </font><i><font>a)</font></i><font> e </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 2 do artigo 616.º do CPC, não se destina a corrigir eventuais erros de julgamento ou a servir de veículo para o reclamante exprimir a sua discordância com a decisão ou defender a sua posição técnico-jurídica em relação às questões de direito resolvidas pelo Acórdão objeto do pedido de reforma.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.3</font></b><font> Ainda assim, porque o reclamante tenta reconduzir as questões suscitadas a um erro manifesto na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos, sempre se dirá o seguinte: </font>
</p><p><i><font>a) Dever de informação</font></i>
</p><p><font>O Acórdão reclamado baseou-se apenas na violação do dever de informação pelo médico em relação às caraterísticas do produto, o caráter definitivo da aplicação e os seus riscos, não lhe tendo imputado, contrariamente ao que parece afirmar o reclamante, qualquer erro médico. Pelo contrário, o acórdão deste Supremo reconheceu, em conformidade com as instâncias, que não se provou qualquer erro técnico na infiltração do produto, que foi aplicado corretamente. Todavia, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, basta a violação do dever de informação para fundamentar uma ação de responsabilidade civil, mesmo na ausência de qualquer erro médico nas intervenções realizadas. Conforme se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-10-2019, Revista n.º 3192/14.8TBBRG.G1.S1 - 1.ª Secção) </font><i><font>“A responsabilidade civil emergente da realização de ato médico, ainda que se prove a inexistência de erro ou má prática médica, pode radicar-se na violação do dever de informação do paciente relativamente aos riscos e aos danos eventualmente decorrentes da realização do ato médico” </font></i><font> </font>
</p><p><font> O acórdão do Tribunal da Relação, ao alterar a matéria de facto, veio permitir uma distinta avaliação da questão do cumprimento e extensão do dever de informação, com consequências para a solução do caso. O Supremo, no exercício da sua função soberana de julgar, aderiu à orientação doutrinal mais exigente com os deveres do médico e que sobre ele faz recair as consequências da falta ou da insuficiência de prova, ao abrigo do artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil, pelo que não se verifica qualquer erro manifesto de aplicação do direito, mas apenas a aplicação da doutrina mais moderna relativa à responsabilidade médica e adotada também noutros Acórdãos deste Supremo Tribunal (cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 02-06-2015, proc. nº 1263/06.3TVPRT.P1.S1; de 16- 06-2015, proc. n.º 308/09.0TBCBR:c1.S1; de 22-03-2018, proc. n.º 7053/12.7TBVNG.P1.S1). De acordo com esta orientação, cada vez mais comum na jurisprudência nacional e europeia, é ao médico que cabe o ónus da prova do cumprimento do dever de informação, o qual deve ser mais extenso na cirurgia voluntária não curativa, em que se enquadram as cirurgias e tratamentos estéticos destes autos (cfr. André Dias Pereira, </font><i><font>Direitos dos pacientes e responsabilidade médica,</font></i><font> Dissertação de doutoramento, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, dezembro de 2012, p. 183). </font>
</p><p><font>Como se afirmou no acórdão do Supremo contra o qual se apresentou a presente reclamação:</font>
</p><p><font>Esta tese [que faz recair sobre o médico o ónus da prova] é a que promove a ideia de igualdade de armas no processo e de igualdade na aplicação do direito, protegendo o lesado da incumbência, considerada diabólica pela literatura processualista, de provar um facto negativo (Cf. André Dias Pereira, “Responsabilidade médica e consentimento informado. Ónus da prova e nexo de causalidade”, disponível para consulta in <a>https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/10577/1/Responsabilidade%20m%C3%A9dica.pdf</a>)). Já para o médico, dado ter um consultório ou trabalhar numa instituição de saúde, é mais fácil organizar os serviços de forma a reunir os documentos necessários para demonstrar que obteve o consentimento informado, por exemplo, dispensar a informação por escrito ao paciente e dispor de um registo das informações clínica e de um bom preenchimento do dossier clínico (cf. André Dias Pereira, “Responsabilidade médica…”, ob. cit.).</font>
</p><p><font>O alcance e extensão do dever de informação, bem como o seu cumprimento ou incumprimento, constituem as questões de direito centrais do presente processo e a apreciação delas está incluída nos poderes cognitivos do Supremo, não tendo o Supremo cometido qualquer erro manifesto na decisão de fazer recair sobre o médico as consequências da falta de prova do cumprimento do dever de informação, pois é ao médico que compete fazer a prova desse cumprimento, como decorre do artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil, por se tratar de um facto impeditivo do direito da autora.</font><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>b) Relatório pericial</font></i>
</p><p><font>Invoca, ainda, o reclamante que o relatório pericial junto aos autos comprova que o médico cumpriu o dever de informação e que o produto </font><i><font>C.... </font></i><font>tinha sido aprovado pela entidade competente, e que por isso se verifica no acórdão reclamado um erro ou lapso manifesto. </font>
</p><p><font>Mais uma vez não tem razão. </font>
</p><p><font>A asserção de que o produto tinha sido aprovado pela entidade competente não foi levada, pelas instâncias, à matéria de facto, pelo que não podia este Supremo tê-la em conta na sua decisão, que tem de se basear exclusivamente na aplicação do direito aos factos dados como provados e não provados. As conclusões dos relatórios periciais relevam apenas na medida em que deles se tenham retirado factos provados para a matéria de facto assente, não assumindo qualquer relevo a respeito da questão do consentimento, que foi tratada pelo acórdão recorrido de forma essencialmente diferente da que conheceu na sentença do tribunal de 1.ª instância, ou seja, à luz de factos distintos e de uma interpretação distinta das normas jurídicas. De resto, a afirmação de que o produto tinha sido aprovado, nunca teria por consequência necessária a demonstração do cumprimento do dever de informação pelo médico e a obtenção do consentimento informado. Também não provam o cumprimento do dever de informação os factos provados n.º 18 e 19, que o reclamante agora invoca para fundamentar a sua reclamação, segundo os quais à data da aplicação do produto não tinham ainda sido comprovadas as complicações decorrentes do mesmo, e que o C.... | [0 0 0 ... 0 0 0] |
qDJsu4YBgYBz1XKvAgUP | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça </font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> No dia 04-10-2012, ALE-HEAVYLIFT IBÉRICA, SA., com sede na P.L …, …., …, Madrid, Espanha, pessoa coletiva n.° A-78…6, intentou contra FERROVIAL AGROMAN, SA., com sede em Espanha e sucursal em Portugal, no Edifício …, Rua …, n°. … - …, …, com o número único de pessoa coletiva e de matrícula na Conservatória do Registo Comercial de … 98…7, a presente ação declarativa de condenação com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo que a Ré fosse condenada:</font><br>
</p><p><font>a) A liquidar à Autora a quantia total de €458.517,00, em virtude de ser a Ré responsável pela derrocada em apreço nos presentes autos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 483° do Código Civil, sendo:</font><br>
</p><p><font>i. €74.500,00, correspondente ao valor de trabalhos adicionais realizados pela ALE por motivo da derrocada, acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento; e</font><br>
</p><p><font>ii. €179.129,00, correspondente ao valor de um conjunto de máquinas, ferramentas e materiais auxiliares que se encontravam na zona da derrocada e foram declarados como perda total na sequência da mesma, valor acrescido de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento; e</font><br>
</p><p><font>iii. €204.888,00 (€34.900,00 + €169.988,00), correspondente aos sobrecustos resultantes para a ALE da interrupção da obra e consequente alargamento do prazo de execução da mesma, quantia acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento;</font><br>
</p><p><font>b) A liquidar à ALE a quantia total de €75.579,81, que corresponde à quantia de €74.070,00 (€69.750,00 + 4.320,00), acrescida de juros de mora vencidos no montante de €1.509,81 e vincendos até integral pagamento, correspondente aos trabalhos contratualizados e efetivamente executados pela ALE, nos termos do contrato de subempreitada celebrado;</font><br>
</p><p><font>c) A pagar as custas e procuradoria condigna.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Para tanto alegou, em síntese:</font><br>
</p><p><font>A Autora dedica-se a trabalhos, estudos e atividades relacionadas com a engenharia sobre movimento, transporte, instalação e pesagem de cargas pesadas ou volumosas, assim como todas aquelas atividades que estando relacionadas direta ou indiretamente com o anterior sirvam para a realização das atividades mencionadas.</font><br>
</p><p><font>A Ré dedica-se, entre outras atividades, à execução de grandes obras civis e de infraestruturas.</font><br>
</p><p><font>No exercício da sua atividade, a Ré era agrupada maioritária do VIALSCUT - CONSTRUÇÃO DA SCUT DOS AÇORES, A.C.E., agrupamento complementar de empresas a quem foram adjudicados, mediante a celebração de um contrato de empreitada, todos os trabalhos relativos à conceção, projeto, construção e fornecimento previstos no Contrato de Concessão da Concessão Rodoviária em regime de SCUT na Ilha de …, Açores.</font><br>
</p><p><font>Por sua vez, o VIALSCUT - CONSTRUÇÃO DA SCUT DOS AÇORES, A.C.E. adjudicou à Ré parte dos trabalhos que constituem o objeto do referido contrato de empreitada.</font><br>
</p><p><font>Parte desses trabalhos foi, por sua vez, adjudicada pela Ré à Autora, através de contrato de subempreitada de 8 de Outubro de 2010, tendo-se a Autora obrigado, ao abrigo desse contrato, a projetar e executar os trabalhos de abertura dos Viaduto 06 (V6) Ribeira … 1.6, Variante Água d'Alto, do Eixo Sul da obra da Scut … .</font><br>
</p><p><font>Do ponto de vista técnico, a subempreitada contratada visava a abertura de dois pares de pilares, denominados n.° 1 e n.° 2, ambos conformados por um pilar esquerdo e por um pilar direito (cfr. Anexos III e IV do Contrato, junto como Documento n.° 1).</font><br>
</p><p><font>A manobra de abertura dos pilares - a cargo da Autora - consistia em levar cada um dos pilares esquerdo e direito, construídos pela Ré em posição vertical, a uma inclinação de 12° em relação à posição vertical original, até alcançar a geometria pretendida em "V".</font><br>
</p><p><font>As partes acordaram que a subempreitada seria realizada em regime de Valor Global, pelo valor estimado de € 155.000,00, de acordo com a discriminação constante da Lista de Preços, que constitui o Anexo I do Contrato.</font><br>
</p><p><font>De acordo com a Cláusula Quinta do Contrato, os trabalhos teriam início no dia 28 de janeiro de 2011 e o prazo total seria de 9 semanas e 4 dias.</font><br>
</p><p><font>Os trabalhos tiveram início no dia 2 de fevereiro de 2011.</font><br>
</p><p><font>Na madrugada do dia 12 de março de 2011, pelas 1H30 horas, ocorreu um deslizamento do talude contíguo ao par de pilares n.° 2, provocando um deslocamento de terras de tal magnitude que deu origem ao colapso da grua torre instalada junto aos pilares.</font><br>
</p><p><font>E, por extensão, deu origem ao colapso destes pilares e à sua queda e impacto sobre o próprio talude.</font><br>
</p><p><font>Por fax enviado à Autora a 17 de março de 2011, que se junta como Documento n.° 2, a Ré qualificou a ocorrência nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>"Como é do conhecimento de V. Ex. as ocorreu na madrugada do passado dia 12 de Março de 2011, pelas 1:30 horas (...) um desastre natural e imprevisível, conduzindo ao deslizamento de terras na sequência do qual caíram dois pilares 2E e 2D do V6. O desastre ocorrido foi externo e alheio à vontade de ambas as partes do contrato e, por isso, deve cada uma delas assumir os riscos inerentes ao mesmo (...). Finalmente, reiteramos que o evento acima identificado decorreu de um facto natural, imprevisível e inevitável, ocorrendo os seus efeitos independentemente da vontade das partes e que é nesse âmbito que deve ser analisado e tratado".</font></i><br>
</p><p><font>O que a Autora refutou, por fax de 21-03-2011, considerando adicionais ao contrato todos os custos e trabalhos tornados necessários pela derrocada.</font><br>
</p><p><font>Com o objetivo de (i) serem analisadas e avaliadas as várias circunstâncias que concorreram para a ocorrência, assim como de (ii) serem quantificadas e valoradas as perdas sofridas pela Autora, nomeadamente no que toca à maquinaria, ferramentas e material auxiliar instalados na obra, a Autora solicitou à empresa C… & Company (Espana), S.A. a realização de uma perícia ao local do acidente, que deu origem ao relatório pericial que se junta como Documento n.° 4.</font><br>
</p><p><font>De acordo com o referido relatório pericial, pág. 20, o sinistro ocorrido não pode ser qualificado, nem caracterizado, como desastre natural imprevisível ou extraordinário.</font><br>
</p><p><font>Antes foi resultado direto das atividades de construção do viaduto, a cargo da Ré.</font><br>
</p><p><font>Por motivo da derrocada, revelaram-se necessários trabalhos adicionais, que a Autora realizou, cujo valor total ascendeu a € 74.500,00.</font><br>
</p><p><font>A derrocada deu causa à perda total, por danificação, de um conjunto de máquinas, ferramentas e materiais auxiliares que se encontravam na zona do deslizamento de terras, cujo valor total ascendeu a € 179.129,00 (cfr. orçamento que se junta como Documento n.° 6.</font><br>
</p><p><font>Verificaram-se também sobrecustos ocasionados pela interrupção da obra, desde o momento do deslizamento as terras até à retoma dos trabalhos a 12 de setembro de 2011, com o consequente alargamento do período efetivo de execução da mesma, que ascenderam a € 34.900.00 + € 169.988,00.</font><br>
</p><p><font>Autora e Ré chegaram a encetar negociações com vista ao pagamento de uma indemnização no valor de € 136.000,00, para cobrir os trabalhos adicionais, os sobrecustos e os prejuízos incorridos pela Autora com o ocorrido no dia 12 de março de 2011, a ter lugar com a faturação da conclusão dos trabalhos contratados à Autora.</font><br>
</p><p><font>Tais negociações não foram bem-sucedidas, pelo que os trabalhos adicionais realizados, os prejuízos e os sobrecustos suportados pela Autora com o ocorrido no dia 12 de Março de 2011, no valor total de € 458.517,00 (6 458.517,00 = € 74.500,00 + € 179.129,00 + € 34.900,00 + € 169.988,00), ficaram por ressarcir.</font><br>
</p><p><font>Encontram-se ainda por pagar à Autora os seguintes valores:</font><br>
</p><p><font>(i) € 69.750,00, referente à conclusão dos trabalhos contratualizados, conforme consta do Auto de Medição n.° 3, que se junta como Documento n.° 14, e do auto de medição final da obra, junto como Documento n.°8;</font><br>
</p><p><font>(ii) € 4.320,00, referentes à realização de trabalhos adicionais que se prenderam com o fornecimento e colocação de cabos adicionais de pré-esforço, conforme consta do Auto de Medição n.° 3, junto como Documento n.°14 e do auto de medição final da obra, junto como Documento n.° 8;</font><br>
</p><p><font>Na qualidade de empreiteiro geral da obra, cabia à Ré assegurar que o referido talude estava em condições de suportar a construção do viaduto em causa, maxime o peso dos pilares, bem como a operação de abertura dos mesmos.</font><br>
</p><p><font>Estando preenchidos os pressupostos da responsabilidade, civil estatuída no art. 483.°, n.° 1 do C. Civil.</font><br>
</p><p><font>A Ré contestou, tendo alegado, também em síntese:</font><br>
</p><p><font>A celebração do contrato entre as partes teve como pressuposto o facto de a Autora exercer uma atividade de natureza muito especializada, com elevado grau de complexidade, e que consiste na movimentação de peças pesadas ou volumosas.</font>
</p><p><font>Para o efeito, a Autora procedeu à verificação das condições e especificações técnicas pressupostos do contrato, tendo declarado (Cláusula Terceira das Condições Particulares do Contrato):</font>
</p><p><i><font>1. (..).ter verificado o local, bem como os planos, plantas, condições e especificações técnicas, antes de apresentar a sua proposta, e que aceitou as condições de realização dos presentes trabalhos, bem como a natureza destes, e todas as dificuldades que, de qualquer modo, possam influenciar o cumprimento do objecto do contrato.</font></i>
</p><p><i><font>2. (...) reconhece ter tido tempo suficiente para conhecer exactamente as implicações, consequências e dificuldades derivadas do cumprimento do presente contrato.</font></i>
</p><p><i><font>3. (...) declara ainda que teve em consideração todos os elementos relativos à execução das diferentes partes da Empreitada, pelo que se obriga no âmbito da execução do presente Contrato a colaborar e praticar todo os actos que se revelem necessários para a coordenação de todos os trabalhos da Empreitada ".</font></i>
</p><p><font>No que respeita ao prazo de execução da Subempreitada (cfr. Cláusula Quinta das Condições Particulares do Contrato) ficou estabelecido que:</font>
</p><p><font>"7. </font><i><font>O trabalho terá início no dia 28 de Janeiro de 2011 e realizar-se-á de acordo com os seguintes prazos parciais:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Montagem dos Equipamentos: 2 semanas;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Abertura do Primeiro Pilar: 2 dias;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Mudança para o segundo Pilar: 2 semanas;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Abertura do Segundo Pilar: 2 dias;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Desmontagem: 2 semanas;</font></i>
</p><p><i><font>- Trabalhos a realizar pela Primeira Outorgante (montagem de Vigas): 3 semanas. Sendo o prazo total de 9 semanas e 4 dias (...).</font></i>
</p><p><font>Assim, a Autora deveria ter concluído a primeira fase nas seguintes datas: (i) montagem de Equipamento em 10 de fevereiro de 2011; e (ii) abertura do Pilar 1 em 12 de fevereiro 2011;</font>
</p><p><font>Mas, por razões que lhe são exclusivamente imputáveis, na data em que ocorreu o sinistro, em 12 de março de 2012, a Autora ainda não tinha realizado a abertura do Pilar 1, e apenas tinha terminado, no dia imediatamente anterior, a montagem do equipamento necessário para essa abertura.</font>
</p><p><font>Se a Autora tivesse concluído a l.</font><sup><font>a</font></sup><font> fase, em 12 de fevereiro, não estaria em obra, nas condições em que estava e com os correspondentes equipamentos, na madrugada de 12 de março de 2011.</font><br>
</p><p><font>E não teria sofrido quaisquer danos.</font><br>
</p><p><font>Na sequência do referido sinistro, e em momento imediatamente anterior aos trabalhos da Autora no Pilar 2 - após diversas pressões da Autora, condicionando a continuidade dos trabalhos ao fecho de um acordo entre as partes - Autora e Ré chegaram a acordo, nos termos do qual a Ré pagaria à A. a quantia de € 136.000,00 a título de compensação global pelos trabalhos adicionais a implementar durante o período de recuperação (conforme e-mail datado de 29.09.2011 e que se junta como Doc.6. e se dá aqui reproduzido para todos os devidos efeitos legais)</font><br>
</p><p><font>Esse acordo assentou no entendimento de que o sinistro tinha ocorrido por causas alheias a ambas as partes, e visou a repartição dos riscos da situação.</font><br>
</p><p><font>E foi respeitado pela Ré na liquidação final do contrato.</font><br>
</p><p><font>Liquidação que a Autora não aceitou, mas apenas porque recusou assumir um conjunto de custos suportados pela Ré, que lhe eram totalmente imputáveis.</font><br>
</p><p><font>Tendo acabado por revogar esse acordo em 02-07-2012.</font><br>
</p><p><font>Revogação que a Ré aceitou.</font><br>
</p><p><font>De acordo com o estipulado contratualmente, ANEXO I das Condições Particulares (Doc. 1 junto com a p.i.), a Ré ficou obrigada a ceder à Autora apenas dois operários de apoio, equipamento de soldadura, corte e apoio pontual de soldador.</font><br>
</p><p><font>No entanto, para a abertura dos Pilares 1 e 2, a Ré forneceu à Autora a seguinte mão-de-obra auxiliar: i) 20 Capatazes; ii) 20 Soldadores; iii) 1 Eletricista; iv) 43 Carpinteiros; v) 58 Ajudantes; vi) Encarregado; vii) Engenheiro, (cfr. Doc. n.° 13 que se dá aqui por integralmente reproduzido).</font><br>
</p><p><font>Os referidos elementos estiveram exclusivamente afetos aos trabalhos a cargo da Autora, quer na 1.ª quer na 2.ª Fase, durante 52 dias, isto é de 02 de Fevereiro a 10 de Março de 2011 e de 13 de Setembro a 27 de Setembro de 2011.</font><br>
</p><p><font>Com isso a Ré suportou um custo adicional de mão-de-obra de € 32.718,32.</font><br>
</p><p><font>Segundo o Anexo II das Condições Particulares, estava incluído nos preços unitários e, por conseguinte, era da Responsabilidade da Autora, todo o equipamento auxiliar necessário para o desenvolvimento dos trabalhos contratados, exceto a cedência de um gerador de 20Kvas, gruas ou camiões para transporte entre frentes de obra, montagem e desmontagem de equipamento (Doe. 1 junto com a p.i.).</font><br>
</p><p><font>Mas, para que a Autora pudesse executar os trabalhos que lhe foram subcontratados, a Ré foi obrigada a colocar em obra, entre o período de 02.02.2011 a 01.10.2012, os seguintes equipamentos:</font><br>
</p><p><u><font>Abertura do Pilar 1</font></u><br>
</p><p><font>a) 1 Grua Torre;</font><br>
</p><p><font>b) 1 Grua 200 toneladas;</font><br>
</p><p><font>c) 1 Grua 130/200 toneladas;</font><br>
</p><p><font>d) 1 Grua 50 toneladas;</font><br>
</p><p><font>e) 2 Camiões Grua;</font><br>
</p><p><font>f) 1 trator;</font><br>
</p><p><font>g) 1 Gerador de 150kvas; </font><br>
</p><p><font>h) 1 Gerador de 150kvas.</font><br>
</p><p><u><font>Abertura do Pilar 2 </font></u><br>
</p><p><font>a) 1 Grua Torre;</font><br>
</p><p><font>b) 1 Grua 200 toneladas;</font><br>
</p><p><font>c) 1 Grua 130/200 toneladas;</font><br>
</p><p><font>d) 1 Grua 50 toneladas;</font><br>
</p><p><font>e) 2 Camiões Grua;</font><br>
</p><p><font>f) 1 tractor;</font>
</p><p><font>g) 1 Gerador de 250 kvas; </font>
</p><p><font>h) 1 Gerador de 100 kvas.</font>
</p><p><font>Em relação à grua de 200 toneladas, com o custo de € 180,00/hora, foi debitado o montante de € 17.159,53,00, correspondente à afetação de 100% de 8hx20 dias .</font>
</p><p><font>E em relação à grua de 130 toneladas, com o custo de € 123,00/hora, foi debitado o montante de 19.785,60, implicou o custo global- cfr. doc. n.° 15.</font><br>
</p><p><font>Ao referido montante acresce a quantia de € 44.893,32 referente ao custo que a R. teve de suportar com um equipamento que alugou, denominado Lançador de Vigas de 100 t e 2 (dois) Pórticos automotores de 70 tm denominados "elefantes" e um técnico especialista para o trabalho intercalar da R. (cfr. Cópia das Facturas que se juntam com Doe. 17.</font>
</p><p><font>Devido ao atraso da A. em concluir a l.</font><sup><font>a</font></sup><font> Fase, a R. suportou o custo do aluguer necessário aos trabalhos diretamente executados por si, e do técnico que coordenaria os trabalhos.</font>
</p><p><font>A Autora teve um atraso na conclusão da 1." fase de 26 dias, devendo ser-lhe imputado o custo do material c técnico especialista:</font><br>
</p><p><font>(i) Lançador / preço unitário 30.000,00 euros/mês - (Quant. 28 dias ou seja:28.000,00 euros.</font><br>
</p><p><font>(ii) Elefante 1/ preço unitário 5.000,00 euros/mês - (Quant. 28 dias) ou seja:4.666,66 euros;</font><br>
</p><p><font>(iii) Elefante 2 / preço unitário 5.000,00 euros/mês (Quant. 28 dias) ou seja: 4.666,66 euros;</font><br>
</p><p><font>(iv) Técnico especialista / 420,00 dia- (Quant. 18 dias) ou seja: 7.560,00 euros.</font><br>
</p><p><font>(Cfr. Cópia das Facturas que se juntam como Doc. 17.</font>
</p><p><font>Do acima exposto, resulta que o incumprimento da Autora resultou para a Ré um acréscimo de custos diretos e indiretos no total de € 120.537,72 (cento e vinte mil quinhentos e trinta e sete euros e setenta e dois cêntimos).</font><br>
</p><p><font>Consequentemente, e reconhecendo a Ré a existência de um crédito da Autora no montante de € 74.070,00 (setenta e quatro mil e setenta euros) resultante do Auto Final datado de julho de 2012, e operando a compensação nos termos contratuais, aquele crédito da Autora deve ser declarado extinto.</font><br>
</p><p><font>Continuando a Autora a ser devedora da Ré da quantia de € 46.467,72.</font>
</p><p><font>Nos termos da cláusula 7.3.2 das condições gerais do contrato, não seriam efetuados pagamentos, sem emissão de faturas cm perfeita conformidade com o auto de medição correspondente.</font>
</p><p><font>E, nos termos da cláusula 18.1 das mesmas condições gerais, uma vez finalizados os trabalhos, deveria o SUBEMPREITEIRO submeter ao EMPREITEIRO, no prazo máximo de trinta dias, todas as faturas referentes aos trabalhos realizados. Uma vez decorrido este prazo não seriam aceites quaisquer faturas exceto se os motivos da sua não apresentação naquele prazo não fossem imputáveis ao SUBEMPREITEIRO.</font><br>
</p><p><font>Ora a Autora não emitiu, nos prazos contratuais, qualquer fatura no que respeita aos pedidos formulados por trabalhos a mais, sobrecustos e trabalhos contratuais.</font><br>
</p><p><font>O talude onde ocorreu o deslizamento de terras era natural.</font><br>
</p><p><font>Esse deslizamento de terras ocorreu de forma imprevisível e não imputável a conduta humana, como foi concluído em diversos estudos.</font><br>
</p><p><font>E também pela Seguradora da Ré.</font><br>
</p><p><font>Esse deslizamento teve lugar numa zona fora da área de intervenção da obra a cargo da Ré.</font><br>
</p><p><font>Zona essa não expropriada e sem acesso permitido a terceiros, incluindo à própria Ré.</font>
</p><p><font>A ré só teve conhecimento de que a Autora tinha solicitado à empresa C… & Company (Espana), S.A.. a realização de uma perícia ao local do acidente, com a sua citação para os termos da presente ação.</font><br>
</p><p><font>Impugnando todas as conclusões aí formuladas.</font><br>
</p><p><font>No que concerne aos designados "trabalhos adicionais" descritos nos arts. 23.°, 24.°, 25.° e 26.° da p.i., a Ré apenas reconhece a existência de trabalhos que foram necessários realizar por todos os intervenientes, quer pela Autora, quer pela própria Ré, em consequência do sinistro ocorrido em 12 de Março de 2011.</font><br>
</p><p><font>E, nos termos e circunstâncias descritas, a Ré veio a aceitar pagar à Autora uma verba global de € 136.000, ainda que em nenhum momento tenha reconhecido ou aceite, em termos concretos, qualquer acréscimo de custos, dano ou prejuízo para a Autora.</font><br>
</p><p><font>Assim, não se vislumbra a razão da invocação de danos, nem a respetiva justificação.</font>
</p><p><font>A Ré tem conhecimento de que a Autora, tal como a própria Ré, incorreu em prejuízos, nomeadamente perda de algum material.</font>
</p><p><font>No entanto, a Ré desconhece se houve perda total ou parcial do material que integra a Lista de bens constante da página 22 do Relatório Pericial junto como Doc. 4 da p.i., nem sequer que material a Autora tinha em obra na data de 12 de Março de 2011, ou o valor da sua reposição.</font><br>
</p><p><font>Uma vez concluída, a 10 de Abril de 2011, a abertura do Pilar 1, foram retirados da Obra todos os equipamentos da Autora e todo o seu pessoal, e apenas voltaram à Obra em Setembro de 2012.</font><br>
</p><p><font>Pelo que, nesse período intermédio, os custos dos equipamentos nunca poderiam ser imputados à Ré.</font>
</p><p><font>Todos os débitos que a Ré imputou à Autora no auto de medição final da obra estão justificados, e alguns deles até foram reconhecidos pela Autora.</font><br>
</p><p><font>Concluiu que a ação deve ser julgada inteiramente improcedente.</font><br>
</p><p><font>E, em reconvenção, pediu que a Autora fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 46.467,72.</font>
</p><p><font>Mais requereu a condenação da Autora, por litigância de má-fé, em multa e indemnização à Ré, de valor não inferior a € 5.000,00. </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A Autora Replicou, tendo alegado, em síntese:</font>
</p><p><font>A Autora não teria conseguido iniciar os trabalhos no dia 28-01-2011, por falta de acessos e de preparação da obra por parte da Ré.</font>
</p><p><font>As plataformas de acesso aos capitéis, onde a Autora tinha que montar parte do seu equipamento, só foram montadas pela Ré no dia 05 de Fevereiro de 2011.</font>
</p><p><font>E a obra executada pela Ré apresentava desvios em relação aos planos geométricos que haviam sido apresentados à Autora.</font><br>
</p><p><font>O que tomou necessária a execução de cunhas para compensar esses desvios.</font><br>
</p><p><font>Sem meios para fazer a medição dessas cunhas, a Autora pediu essas medidas à Ré no dia a 21-01-2011.</font><br>
</p><p><font>Mas a Ré só prestou essa informação no dia 08-02-2011.</font><br>
</p><p><font>E, em tempo recorde, essas cunhas ficaram prontas no dia 18-02-2011.</font><br>
</p><p><font>Sem instalação dessas cunhas não poderia dar se início à montagem dos equipamentos no tirante 2, o que representava 75% do tempo total de montagem dos equipamentos.</font><br>
</p><p><font>A Autora alertou a Ré, várias vezes, para as consequências do atraso no fornecimento de tais cunhas. </font>
</p><p><font>Para além do que estava contratualmente previsto, a Ferrovial solicitou à Autora que efetuasse uma manobra de teste de abertura dos pilares 1.</font><br>
</p><p><font>Essa manobra foi feita no dia 10 de março de 2011.</font><br>
</p><p><font>A Autora sempre estaria em obra, no dia 12 de março de 2011, dia do colapso dos pilares 2.</font>
</p><p><font>O deslizamento de terras ocorreu devido a negligência da Ré na adoção de medidas de contenção do talude. Medidas que a Ré acabou por tomar na sequência do acidente, em estreita colaboração com a Autora.</font>
</p><p><font>Que não desmobilizou todo o seu equipamento e pessoal da obra, tendo aliás todo o equipamento ficado guardado no estaleiro da Ré a aguardar o regresso à obra.</font>
</p><p><font>Esse regresso à obra não teve qualquer ligação com o acordo sobre o pagamento, pela Ré à Autora, da quantia de €136.000,00.</font>
</p><p><font>Na liquidação do contrato, a Ré associou o pagamento desta indemnização à aceitação, por parte da Autora, de um conjunto de descontos ao trabalho por ela executado.</font><br>
</p><p><font>Esses descontos não tinham fundamento.</font><br>
</p><p><font>Assim a Ré incumpriu o referido acordo.</font>
</p><p><font>A Ré nunca forneceu à Autora, a pedido desta, mais mão-de-obra ou equipamento do que aqueles que estava obrigada a fornecer contratualmente (vd. Anexo II do Contrato).</font><br>
</p><p><font>Também não ocorreu qualquer carência de meios materiais por parte da Autora.</font>
</p><p><font>Quanto ao valor reclamado a título do aluguer de gruas, a Autora desconhece como é que a Ré chega aos valores que peticiona (o período temporal e a percentagem que imputa à Autora).</font><br>
</p><p><font>O aluguer de um lançador de vigas não tem qualquer relação com a atividade da Autora.</font>
</p><p><font>Assim, e relativamente aos custos reclamados no artigo 90.° da Contestação, a Autora apenas aceita a quantia de €5.980,95, impugnando os demais.</font>
</p><p><font>Em lermos contratuais, se a Ré pretendesse efetuar a compensação dos seus créditos deveria tê-lo feito nos autos de medição mensais.</font><br>
</p><p><font>Ora a Ré nunca reclamou qualquer quantia à Autora, muito menos lhe imputou responsabilidades por supostos atrasos, pelo que, e também por esse motivo, deve improceder a requerida compensação, por ser extemporânea a reclamação dos referidos custos.</font><br>
</p><p><font>Não estando em causa, na presente ação, o pagamento de trabalhos contratualizados, mas de uma compensação por danos e custos extra que a Autora incorreu na sequência do acidente ocorrido, não faz sentido a invocação da falta de faturação.</font><br>
</p><p><font>A Autora não litigou de má-fé.</font><br>
</p><p><font>Concluiu pedindo a improcedência da reconvenção.</font>
</p><p><font>E requereu a condenação da Ré, por litigância de má-fé, em indemnização de montante não inferior a € 5.000,00.</font><br>
</p><p><font>A Ré treplicou, tendo alegado, na parte em que este articulado foi admitido:</font><br>
</p><p><font>A Autora obrigou-se a trazer os seus equipamentos e pessoal para a Ilha de ... no dia 4 de janeiro de 2011, para poder iniciar os trabalhos.</font><br>
</p><p><font>No dia 21-01-2011, com os capitéis betonados, a Autora ainda não tinha indicado as definições para fixação dos elementos do variador de betão.</font><br>
</p><p><font>No dia 08 de fevereiro a Autora, ainda não tinha indicado o tipo de geradores necessários aos seus trabalhos.</font><br>
</p><p><font>Nem tinha definido os elementos de fixação entre o capitel e os equipamentos da Autora.</font><br>
</p><p><font>A Autora forneceu tardiamente, em 21-01-2011, as dimensões das plataformas de acesso aos capitéis. </font>
</p><p><font>A inviabilização da realização da manobra de abertura dos pilares deveu-se, tão só, à inexistência de cunhas necessárias, da exclusiva responsabilidade da Autora.</font>
</p><p><font>A informação sobre as medidas das cunhas foi prestada a 08.02.2011, após a montagem das plataformas, e não antes por impossibilidade técnica.</font><br>
</p><p><font>Mas podia ter sido prestada durante a betonagem dos capitéis.</font><br>
</p><p><font>Não há qualquer erro na geometria do plano de capitel ou outros elementos fornecidos pela Ré.</font>
</p><p><font>A Autora tinha prevista a execução das cunhas desde o início, no entanto, não solicitou qualquer medição específica à Ré.</font>
</p><p><font>As definições para as plataformas adicionais para acesso/fornecimento e instalação para as cabeças superiores dos equipamentos da Autora eram da responsabilidade desta.</font><br>
</p><p><font>Que apenas em 09.02.2011 informou a Ré das definições relativas às plataformas adicionais.</font>
</p><p><font>O ensaio que foi realizado poderia ter ocorrido em data anterior, e faria sempre parte dos procedimentos a cargo da Autora.</font><br>
</p><p><font>Recusa estar a litigar de má-fé.</font><br>
</p><p><font>No seguimento foi declarado territorialmente competente, para conhecer da ação, o Tribunal da comarca de Vila Franca do Campo, para onde foi remetido o processo.</font><br>
</p><p><font>Foi realizada audiência prévia, onde foi tentada a conciliação das partes; foi admitida a reconvenção e, parcialmente, a réplica e a tréplica; foi fixado o valor da causa; foi identificado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova; e foram admitidos os meios de prova.</font><br>
</p><p><font>Procedeu-se a julgamento, entre 02-10-2017 e 21-06-2018, com alegações finais por escrito.</font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Seguiu-se a sentença, com a seguinte decisão:</font>
</p><p><i><font>«Nos termos do exposto, julgo a ação e a reconvenção parcialmente procedentes e em conformidade:</font></i><br>
</p><p><i><font>a. Reconheço à ALE - HEAVYLIFT IBÉRICA, SA. um crédito sobre a FERROVIAL AGROMAN, SA. no montante de €74.070,00 (setenta e quatro mil e setenta euros);</font></i><br>
</p><p><i><font>b. Reconheço à FERROVIAL AGROMAN, SA. um crédito sobre a ALE – HEAVYLIFT IBÉRICA, SA. no montante de €5.128,46 (cinco mil cento e vinte e oito euros e quarenta e seis cêntimos);</font></i>
</p><p><i><font>c. Procedendo à compensação dos créditos apontados em a. e b. condeno a FERROVIAL AGROMAN, SA. a pagará ALE - HEAVYLIFT IBÉRICA, SA. o saldo que dessa compensação resulta no valor de €68.941,54 (sessenta e oito mil novecentos e quarenta e um euros e cinquenta e quatro cêntimos) a que acrescem os juros legais a contar da data desta sentença por ser a data da liquidação e até efetivo e integral pagamento;</font></i><br>
</p><p><i><font>d. Absolvo no mais o que era pedido a ambas pela respetiva contraparte.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelas partes na proporção de 80% para a ALE e de 20% para FERROVIAL.</font></i><font>»</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Inconformada, a Autora apelou do assim decidido, e a Ré apresentou recurso subordinado. </font><br>
</p><p><font>O Tribunal da Relação, após proceder a alterações da matéria de facto, decidiu o seguinte, conforme consta do dispositivo do mesmo:</font><br>
</p><p><i><font>«Termos em que acordam em julgar parcialmente procedentes os dois recursos, e em alterar a decisão recorrida, nos seguintes termos:</font></i>
</p><p><b><i><font>I - Julga-se parcialmente procedente a ação reconhecendo-se a Autora os seguintes<br>
créditos sobre a Ré:</font></i></b>
</p><p><i><font>i. No montante de €74.500,00, correspondente ao valor de trabalhos adicionais realizados pela ALE por motivo da derrocada;</font></i>
</p><p><i><font>ii. No montante de €204.888,00 (€34.900,00 + €169.988,00), correspondente aos sobrecustos resultantes para a ALE da interrupção da obra e consequente alargamento do prazo de execução da mesma;</font></i>
</p><p><i><font>iii. No montante de €74.070,00, correspondente ao preço de trabalhos contratualizados e efetivamente executados pela ALE, nos termos do contrato de subempreitada celebrado entre as Partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>iiii. No montante, a liquidar em eventual incidente de liquidação, com o limite de €179.129,00, correspondente ao valor dos danos que o deslizamento de terras provocou em máquinas, ferramentas e materiais auxiliares da Autora, que se encontravam na zona da derrocada;</font></i><br>
</p><p><i><font>Anotando-se que os créditos já liquidados somam € 353.458,00.</font></i><br>
</p><p><b><i><font>II - Julga-se parcialmente procedente a reconvenção, reconhecendo-se à Ré os seguintes créditos sobre a Autora:</font></i></b><i><font> </font></i><br>
</p><p><i><font>i. No montante de € 5.135,97, respeitante aos custos enunciados no ponto de facto n.° 28.</font></i><br>
</p><p><i><font>ii. No montante já liquidado de € 19.489,21, respeitante a custos do aluguer do Lançador de Vigas, e do respetivo operador;</font></i><br>
</p><p><i><font>iii. No montante, a liquidar em eventual incidente de liquidação, com o limite de € 32.718,32, correspondente ao custo suportado pela Ré com a cedência à Autora de 93 ajudantes para além dos previstos no contrato;</font></i>
</p><p><i><font>iiii. No montante, a liquidar em eventual incidente de liquidação, com o limite de € 36.945,13, correspondente ao custo do aluguer das duas gruas, de 200 e 130 toneladas, no período de doze dias;</font></i><br>
</p><p><i><font>Anotando-se que os créditos já liquidados | [0 0 0 ... 0 0 0] |
sjFdu4YBgYBz1XKvb_vE | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font>
<p><font> </font></p></div><br>
<font> </font>
<p><b><font>I - Relatório</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> A </font><b><font>Padaria Portuguesa CQ - Actividades Hoteleiras, LDA</font></b><font>, intentou ação declarativa sob a forma comum contra </font><b><font>Silobaião, Unipessoal, Lda</font></b><font>, pedindo que seja julgada válida e eficaz a resolução do contrato de empreitada celebrado com a Ré e que esta seja condenada a pagar-lhe o valor de € 64.814,50 acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos, desde a citação até efetivo e integral pagamento.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Para tanto alegou, muito sinteticamente ter contratado com a Ré a conceção, construção e fornecimento de um silo exterior destinado ao armazenamento de farinha. O silo foi concluído e entregue em agosto de 2017, tendo a A. pago o respetivo preço.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em 28 de novembro de 2017 durante o transporte de farinha no silo a estrutura do mesmo cedeu e rebentou, tendo a A., após análise ao silo realizada pela fornecedora da farinha, concluído que o equipamento padecia de anomalia de fabrico na sua estrutura inferior e no sistema de segurança, tendo comunicado à Ré quer a ocorrência do sinistro, quer a existência do defeito no dia 1 de dezembro de 2017.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A Ré não assumiu nunca a responsabilidade pelo evento danoso e recusou reparar os prejuízos sofridos pela A. com a rutura do silo, tendo apenas, a pedido desta, instalado um silo recondicionado que possuía nas instalações.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A A. resolveu o contrato celebrado com a Ré e pede a condenação desta a indemnizá-la no valor dos prejuízos sofridos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Em sede de contestação a Ré alegou que a pedido da A. forneceu-lhe e esta adquiriu um silo exterior para armazenamento de farinha entregue em agosto de 2017 e em funcionamento desde essa data. Mais alegou que no dia anterior ao evento descrito na petição a Ré fez deslocar um técnico às instalações da A. para que procedesse a uma pequena reparação tendo este verificado que o silo se encontrava em plenas condições de funcionamento, quer do ponto de vista elétrico, quer mecânico.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegou ainda a Ré que a deformação apresentada no silo só pode ter sido causada por pressão pneumática de fonte exterior ao silo, não padecendo este de qualquer vício, defeito ou deficiência estrutural de conceção ou desempenho. Conclui ter cumprido pontual e integralmente a obrigação contratual devendo a ação ser julgada improcedente.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A Ré excecionou a caducidade do direito da A. e deduziu pedido reconvencional pretendendo ser paga pelas despesas em que incorreu com a montagem do silo de substituição, transporte e armazenamento nas suas instalações do silo danificado.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Replicando, a A. impugnou a versão dos factos apresentada pela Ré para sustentar o pedido reconvencional e afastou a verificação da exceção de caducidade.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Realizou-se Audiência Prévia, tendo-se fixado como objeto do litígio:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>- Da validade e eficácia da resolução do contrato celebrado entre A. e Ré;</font>
</p><p><font>- Do direito da A. a ser indemnizada pelos prejuízos sofridos em consequência da conduta da Ré;</font>
</p><p><font>- Da caducidade do direito da A.; </font>
</p><p><font>- Do pedido reconvencional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Procedeu-se à realização de Audiência de Julgamento tendo sido proferida a seguinte decisão: </font>
</p><p><i><font>“- julgar a ação parcialmente procedente por provada, julgando inválida e ineficaz a resolução do contrato celebrado entre autora e ré, e condenando a ré a pagar à autora a quantia que vier a apurar-se em sede de liquidação, nos termos preditos supra, a titulo de indemnização pelos prejuízos sofridos pela autora, acrescida de juros de mora, a contar da citação até efectivo pagamento. </font></i>
</p><p><i><font>- julgar a reconvenção improcedente e, em consequência, absolver a autora do pedido contra si dirigido”. </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Inconformada com o assim decidido, a Ré interpôs recurso de Apelação, em que impugnou a matéria de facto e sustentou a improcedência da ação e a procedência da reconvenção.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> A Autora contra-alegou, sustentando a manutenção da decisão proferida ou, caso assim se não entenda, e a título subsidiário, pediu a ampliação do objeto do recurso, nos termos do disposto no artigo 636.º, n.º 2, do CPC, pugnando para que se considere como provados os factos que ali indica devendo, em consequência, ser alterada a decisão no sentido de tornar-se líquida.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> O Tribunal da Relação, com uma declaração de voto, decidiu o seguinte: </font>
</p><p><i><font>«Face ao exposto, julga-se procedente a Apelação e, nessa conformidade, revoga-se a decisão proferida pelo senhor Juiz do Tribunal de 1.ª Instância, declarando-se a caducidade do direito da A. e condenando-se a mesma a pagar à Ré a quantia de € 12.000,00 + IVA.</font></i>
</p><p><i><font>Custas por A. e Ré, nos termos dos respetivos decaimentos».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>9.</font></b><font> A Autora, Padaria portuguesa, inconformada interpôs recurso de revista, terminando a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«1.O contrato dos autos é um contrato de empreitada, com todos os seus elementos típicos, o que resulta quer da matéria de facto dada como provada (vide alíneas C), D), E), F), G) e FF)), quer dos documentos juntos aos autos (vide documentos n.ºs 2 e 3 juntos à Petição Inicial), quer da interpretação da vontade das partes.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>2. Desde logo, de acordo com o artigo 6.º da Petição Inicial, cujos factos foram aceites pela Ré no artigo 10.º da Contestação, “o valor total proposto pela Ré englobava, além da conceção, construção e fornecimento, o transporte, a montagem mecânica e elétrica do silo (bem como os respetivos materiais necessários para tal efeito) e a formação dos funcionários da Autora relativamente à utilização do mesmo.”.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>3. Quer isto dizer que, para além da obrigação de entrega do silo à Recorrente, resulta ainda que a Recorrida foi contratada para construir o silo e estava obrigada a proceder à montagem do silo nas instalações da Recorrente, nomeadamente dos seus diversos componentes acessórios, ao seu transporte, bem como a realizar o treinamento do pessoal da Recorrente para que estes pudessem corretamente manuseá-lo, sendo todas estas obrigações principais do contrato celebrado entre as partes, conforme resulta dos factos provados da Sentença.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>4. Não se está nos presentes autos perante uma situação em que o negócio/contrato se teria por concluído com a simples entrega do silo à Recorrente, como de um contrato de compra e venda se tratasse.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>5. Resulta ainda da matéria de facto dada como provada que o silo encomendado pela Recorrente deveria observar determinadas características nomeadamente no que respeitava à sua dimensão e software, tendo em conta o espaço físico de que dispunha a Recorrente, na sua fábrica de Marvila e a sua necessidade de armazenamento.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>6. Daqui resultando que não era um qualquer silo constante de um catálogo da Recorrida que poderia ser implementado nas instalações da Recorrente, mas sim um silo que especificamente construído para aquele espaço que obrigatoriamente obedecesse a determinadas características e que especificamente fosse realizado pela Recorrida para se adaptar às instalações da Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>7. A este respeito, atente-se na própria designação da proposta contratual feita pela Recorrida à Recorrente – “Projeto SB/044-F/15” (destaque e sublinhado nossos) -, notoriamente uma designação típica de um contrato de empreitada e não de uma compra e venda (vide documento n.º 3 junto à Petição Inicial).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>8. E compulsado o documento n.º 2 junto à Petição Inicial, que corresponde à ficha técnica da Recorrida, apercebemo-nos logo que a própria Recorrida propõe construir os seus silos à medida das necessidades da fábrica dos seus Clientes – o que, por si só, indicia de que prevalece na sua prestação a denominada “obrigação de facere”</font>
</p><p><font>(como melhor veremos abaixo) e, evidentemente, o bem produzido terá modificações.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>9. O elemento de domínio no negócio celebrado com a Recorrida é indubitavelmente a conceção e construção de um silo, que se adaptasse à realidade da fábrica da Recorrente, atendendo ao seu específico know how, ou seja, a realização de uma obra, que se sobrepõe à mera compra e venda de um bem ou à prestação de um serviço.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>10. Esta questão não é colocada em causa pelo facto de não se terem dado como provados os dois primeiros factos dados como não provados, pois, como é evidente, o Tribunal a quo não poderia única e exclusivamente ter tido em conta estes segmentos da matéria de facto dada como não provada, ignorando toda a matéria de facto que ficou provada a respeito desta questão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>11. Têm sido identificados pela nossa jurisprudência os seguintes traços que distinguem o contrato de compra e venda do contrato de empreitada:</font>
</p><p><font>• no contrato de compra e venda permanece a obrigação de dare, no contrato de empreitada permanece a obrigação de facere;</font>
</p><p><font>• no contrato de empreitada, contrariamente ao que ocorre no contrato de compra e venda, a disponibilização dos materiais por parte do empreiteiro constitui um simples meio para a produção da obra;</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>• no contrato de empreitada verifica-se a introdução de modificações no que diz respeito à forma, medidas e qualidades do objeto, representando, portanto, a obra, um quid novi relativamente à produção originária do empreiteiro.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>12. No contrato celebrado entre as partes, permanecia, sem qualquer margem para dúvidas, uma obrigação de facere, em detrimento de uma obrigação de dare, porque a Ré encontrava-se contratualmente obrigada a conceber, transportar e a implementar nas instalações da Recorrente um silo que obedecesse a determinadas características no que dizia respeito à sua dimensão e software, tendo em conta as específicas necessidades da Autora - espaço físico de que dispunha a Recorrente e a sua necessidade de armazenamento.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>13. Destas prestações resulta claramente que, nos termos do contrato celebrado pelas partes, a prestação dos materiais por parte da Recorrida constituía um simples meio para a produção da obra, sendo o trabalho desenvolvido pela Recorrida desde a conceção à montagem o escopo essencial do negócio.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>14. Do mesmo modo, também o objeto que iria ser realizado pela Recorrida, isto é, o silo, representava um quid novi relativamente a uma produção originária, na medida em que a realização do silo de que a Recorrente necessitava implicava a introdução neste de dimensões e software próprios, tendo em conta o espaço físico de que dispunha a Recorrente e a sua necessidade de armazenamento.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>15. Assim sendo, o silo foi concebido e montado, atendendo a necessidades e características específicas, sendo que, evidentemente, o mesmo não se encontrava já na esfera jurídica da Recorrida, aquando da celebração do contrato com a Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>16. Acresce que não obstante a Recorrente ter aceitado a proposta de realização do silo apresentada pela Recorrida no dia 06.01.2016, só passado mais de um ano, isto é, no mês de agosto de 2017, é que a Recorrida entregou e implementou o mesmo nas instalações da Recorrente, o que também claramente é demonstrativo do facto do silo não se encontrar concebido aquando da celebração do contrato entre as partes (vide factos provados D) e M) da sentença).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>17. Diga-se também que só efetivamente se poderia retirar qualquer tipo de utilidade do silo encomendado pela Autora depois de este se encontrar devidamente montado e implementado nas suas instalações e depois de a Autora ter sido treinada para o seu manuseamento e utilização plena.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>18. Dúvidas não restam que o contrato celebrado entre as partes efetivamente trata-se de um contrato de empreitada e não de um contrato de compra e venda ou outro.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>19. Tal como se encontra explanado no facto dado como provado correspondente à alínea LL), a Autora comunicou o defeito à Ré primeiramente por telefone e depois por e-mail no dia 05.12.2017.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>20. A data da propositura da presente ação é de 30.11.2018, como resulta da alínea HHH) dos factos dados como provados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>21. Assim sendo, aquando da propositura da presente ação, encontrava-se ainda a Autora dentro do prazo de um ano estabelecido no artigo 1224.º do CC, motivo pelo qual o direito da mesma em interpor a presente ação judicial não se encontra caducado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>22. Relativamente ao pedido reconvencional, o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> não podia ter sequer procedido à sua apreciação, uma vez que, contrariamente ao decidido, o pedido reconvencional deduzido pela Ré, encontra-se dependente do pedido formulado pela Autora, conforme resulta da Contestação e do seu petitório final, em que a Ré termina com um pedido principal de improcedência da ação da Autora, ou caso assim não se entenda, ou seja, caso a ação seja procedente pede a procedência do seu pedido reconvencional:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>23. Dispõe o n.º 6, do artigo 266.º, do CPC que “a improcedência da ação e a absolvição do réu da instância não obstam à apreciação do pedido reconvencional regularmente deduzido, salvo quando este seja dependente do formulado pelo autor.”</font>
</p><p><font>(sublinhado e negrito nossos).</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>24. Nos presentes autos encontramo-nos precisamente perante uma situação em que o pedido reconvencional formulado pela Recorrida se encontra totalmente dependente do pedido formulado pela Autora, ora Recorrente, pois o que a Recorrida pretendia era que, caso o Tribunal viesse dar razão à Recorrente, e considerasse a ação constante dos presentes autos procedente, que então também o seu pedido reconvencional fosse apreciado e julgado precedente para poder compensar o valor dos € 12.000 + IVA com o valor em que viesse a ser condenada.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>25. Assim sendo, encontra-se preenchida a previsão da última parte do n.º 6, do artigo 266.º, do CPC, motivo pelo qual, com todo o respeito, não poderia o Tribunal a quo ter revogado a decisão de condenação da Silobaião e dessa forma ter considerado improcedente o pedido da Autora e, em simultâneo, ter procedido à apreciação do pedido reconvencional formulado pela Recorrida.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>26. Acresce que, tal como decidiu o Tribunal de Primeira Instância, a Recorrida não logrou afastar a sua culpa, nos prejuízos causados à Recorrente e, portanto, esse valor teria de ser descontado no valor a pagar à Recorrente pelos prejuízos que esta teve.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>27. Mais: a Recorrida prestou uma garantia de bom funcionamento do silo pelo prazo de 2 anos após a sua entrega à Recorrente – o que foi dado como provado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>28. Como é sabido, ao abrigo de uma garantia voluntária o prestador/vendedor deve substituir, reparar, proceder à redução do preço ou devolver o montante do preço pago.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>29. Com efeito, sendo o defeito no silo exclusivamente imputável à Recorrida – que não afastou a sua culpa, reitera-se - e tendo ocorrido dentro do prazo de garantia de bom funcionamento, não pode esta vir a reclamar qualquer valor da Recorrente.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>30. Pelo que deve improceder, em qualquer caso, o requerido quanto ao pedido reconvencional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>31. Aqui chegados, deve ser dado provimento ao presente recurso de Revista, revogando- se o Douto Acórdão recorrido e mantendo-se a Sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Termos em que mui respeitosamente se requer a Vossas Excelências, Colendos Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça que se dignem conceder provimento ao presente recurso,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Com o que farão a costumada e sã Justiça!»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>10.</font></b><font> A recorrida apresentou contra-alegações, que aqui se consideram transcritas, que concluiu, peticionando que seja negada a revista e confirmado o acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>11.</font></b><font> Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso as questões a decidir são as seguintes:</font><br>
</p><p><font>I – Qualificação jurídica do contrato dos autos;</font><br>
</p><p><font>II – Obrigação de indemnização a pagar pela ré pelo defeito da coisa</font><br>
</p><p><font>II – Pedido reconvencional</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b>
</p><p>
</p><p><b><font>A - FACTOS PROVADOS</font></b>
</p><p><font>2.1 - Factos adquiridos por acordo nos termos do artigo 574.º, n.º 2, do CPC Revisto e provados por documentos (fixados em sede de Audiência Prévia):</font>
</p><p><font>A) A A. é uma sociedade comercial que se dedica à exploração de estabelecimentos de restauração e bebidas, designadamente pastelarias, bem como ao fabrico próprio de pastelaria e panificação.</font>
</p><p><font>B) A Ré é uma sociedade comercial que se dedica ao comércio por grosso de silos e automatismos para a indústria alimentar.</font>
</p><p><font>C) Em 05.01.2016, a Ré apresentou à A. uma proposta contratual para fornecimento de silo exterior para armazenar farinha, designado por “Projecto SB/044-F/15”, pelo valor total de 54.000,00 EUR + IVA, como melhor consta do documento junto a fls. 19 verso a 21, cujo teor se dá por reproduzido.</font>
</p><p><font>D) A qual foi aceite pela A., em 06.01.2016.</font>
</p><p><font>E) A Ré, nos termos da proposta supra referida, forneceu à A. um silo exterior para armazenamento de farinha do tipo NORMSILO em aluminium Almg3, próprio para produtos alimentares, em concreto farinha.</font>
</p><p><font>F) Incluía-se no fornecimento do silo exterior para armazenamento de farinha, a montagem eléctrica e mecânica dos diversos componentes acessórios ao silo propriamente dito, nomeadamente o sistema de fluidificação, o sistema electrónico de pesagem (composto por balança de pesagem em inox), a válvula rotativa, o sistema de transporte (composto por tubos, curvas e abraçadeiras), o computador de pesagem (composto por uma unidade SS-39- 8P) e central eléctrica (composto por uma unidade, incluindo controlo de silo cheio - sensor de nível máximo e sistema sonoro de alerta - válvula).</font>
</p><p><font>G) Incluía-se igualmente no fornecimento o transporte do silo para as instalações da A. e o treino do seu pessoal para o correcto manuseamento e funcionamento do silo.</font>
</p><p><font>H) Estavam excluídos do fornecimento do silo exterior para armazenamento de farinha, competindo, por isso, à A. a colocação de cabo trifásico com 5 linhas de 4mm2 de secção onde o quadro /central eléctrica ficasse instalado, bem como a instalação de rede de ar comprimido e água com postos de saída e ainda todos os trabalhos de construção civil necessários à instalação do mesmo.</font>
</p><p><font>I) A ré prestou garantia do bom funcionamento do silo pelo prazo de 2 anos após a sua entrega.</font>
</p><p><font>J) Em 06.01.2016, a Autora procedeu ao pagamento de 33.210,00 EUR, correspondente a metade do valor acordado.</font>
</p><p><font>L) Em 08.04.2016, a Autora pagou o valor remanescente de 33.210,00 EUR. </font>
</p><p><font>M) O silo foi concluído e entregue pela Ré à Autora em Agosto de 2017, tendo entrado em funcionamento nessa data.</font>
</p><p><font>N) O silo foi colocado nas instalações fabris da autora em Marvila.</font>
</p><p><font>O) No dia 27 de Novembro de 2017, a Ré fez deslocar às instalações da Autora um técnico que procedeu a uma intervenção na base do silo, tendo verificado que o silo se encontrava em plenas condições de funcionamento, quer do ponto de vista eléctrico quer mecânico.</font>
</p><p><font>P) A Ré rejeitou qualquer responsabilidade quanto ao rebentamento do silo, alegando que o mesmo não se devia a qualquer problema de concepção, fabrico ou montagem.</font>
</p><p><font>Q) No dia 13.12.2017, realizou-se uma reunião com todos os intervenientes, Autora, Ré, Cerealis e empresa transportadora, tendo a SILOBAIÃO recusado assumir a responsabilidade no sinistro.</font>
</p><p><font>R) Nessa reunião, a transportadora informou ainda que ia accionar o seu seguro para fazer uma peritagem ao silo.</font>
</p><p><font>S) A pedido da SILOBAIÃO, a Autora entregou-lhe o silo para análise e peritagem, tendo o mesmo ficado ao cuidado da SILOBAIÃO nas respectivas instalações, situadas na Rua Ribeira Grande, 88, 4410-244 Canelas.</font>
</p><p><font>T) Onde se encontra até à presente data. </font>
</p><p><font>U) No dia 28.12.2017, as partes intervenientes reuniram-se novamente as instalações da Autora.</font>
</p><p><font>V) A SILOBAIÃO manteve a sua posição, declinando a sua responsabilidade nos defeitos do silo.</font>
</p><p><font>X) Sem prejuízo, ficou combinado entre todos que o perito da empresa transportadora iria fazer uma peritagem ao silo, deslocando-se às instalações da SILOBAIÃO.</font>
</p><p><font>Z) Com a data de 28/06/2018 a autora enviou à ré missiva junta a fls. 26/26 verso solicitando a reparação do silo e/ou o fornecimento de todas as informações para se apurar as responsabilidades na causação do sinistro, bem como a facultar os dados da sua seguradora, tudo como melhor consta do documento junto a fls. 26/26 verso e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido.</font>
</p><p><font>AA) A Ré respondeu por carta de 13.07.2018 alegando que o silo se encontrava em perfeito estado de funcionamento e apto ao fim a que se destinava quando foi entregue, não assumindo qualquer responsabilidade no sinistro.</font>
</p><p><font>BB) No dia 16.07.2018, a Autora remeteu nova missiva à Ré para que esta cooperasse no sentido de ser realizada uma peritagem ao sinistro pelo ISQ, facultando as especificidades técnicas do silo, desenhos, projectos, cálculos de pressão, sistemas de segurança e outros que pudessem ser facultados à empresa de peritagem, com vista a confirmar ou excluir a responsabilidade na concepção e construção do silo e reiterando ainda o teor da carta de 28 de Junho de 2018. </font>
</p><p><font>CC) A Autora reuniu-se novamente com a Ré em 15.10.2018, nas instalações da Autora e na presença dos mandatários.</font>
</p><p><font>DD) A pedido da Autora, a SILOBAIÃO instalou na fábrica um silo recondicionado que possuía nas suas instalações, cujo valor era de € 12.000,00 + IVA.</font>
</p><p><font>EE) A autora não pagou à ré o preço do silo recondicionado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.2 - Factos resultantes da prova produzida em audiência de julgamento:</font></b>
</p><p><font>FF) O silo encomendado à ré deveria observar determinadas características no que respeitava à sua dimensão e software.</font>
</p><p><font>GG) Em 28 de Novembro de 2017, após uma descarga de farinha no silo, a estrutura do mesmo cedeu e este abaulou.</font>
</p><p><font>HH) A carga era composta de 11.980kg de farinha de trigo, tipo 55-E1, a granel;</font>
</p><p><font>II) A farinha é fornecida à Autora pela empresa Cerealis, S.A., a qual abastece o silo no seu armazém sito na ... ..., e o entrega na fábrica da Autora em Marvila.</font>
</p><p><font>JJ) A Autora tomou conhecimento do sinistro nesse mesmo dia. </font>
</p><p><font>LL) A ocorrência do sinistro foi comunicada à ré telefonicamente primeiro, e depois por email de 5 de Dezembro de 2017, junto a fls. 81 verso e cujo teor se dá por reproduzido</font>
</p><p><font>MM) No dia 11.12.2017, a Cerealis, acompanhada no dono da empresa transportadora que fez a descarga no dia do sinistro, do respectivo motorista e de um técnico de uma empresa de silos deslocaram-se às instalações da Autora a fim de fazerem uma avaliação mais concreta ao silo.</font>
</p><p><font>NN) Constataram que o silo estava abaulado ao nível do 1° painel.</font>
</p><p><font>OO) O técnico abriu o óculo do silo e constatou que havia alguns tirantes partidos do lado esquerdo ao nível do 1° painel.</font>
</p><p><font>PP) O motorista da transportadora da Cerealis esclareceu que, no dia do sinistro, aquando do abastecimento da farinha, ninguém detectou, nem o equipamento emitiu, qualquer sinal de que havia excesso de carga ou de pressão.</font>
</p><p><font>QQ) Não foi emitido qualquer aviso sonoro pelo silo ou dado o alerta para qualquer problema de pressão.</font>
</p><p><font>RR) Na reunião havida em 13/12/2017 a ré afirmou que o sinistro se devera a excesso de pressão no silo e/ou excesso de carga no seu interior.</font>
</p><p><font>SS) Foi explicado à ré nessa reunião que o sinistro não podia ficar a dever-se a excesso de pressão, porquanto a cisterna tem uma válvula reguladora de pressão na cisterna, com o limite de 0,8 Bar, pelo qual sempre que o sistema de descarga entra em pressão, abre a válvula para a rua.</font>
</p><p><font>TT) E que quanto ao aventado excesso de farinha, tal era impossível de ocorrer dada a quantidade de farinha descarregada no silo de 11.900 Kg, que está confirmada na respectiva guia de entrega e factura, bem como a capacidade máxima do silo que é de 14.400 Kg.</font>
</p><p><font>UU) Em virtude do sinistro ficou danificado o silo propriamente dito, isto é, a estrutura do tipo NORMSILO em aluminium Almg3.</font>
</p><p><font>VV) O silo recondicionado não pôde ser montado em contacto com o ar exterior, pelo que obrigou à Autora a construção de uma estrutura para o envolver, cujo custo foi de montante não concretamente apurado.</font>
</p><p><font>XX) No caso presente a carga/abastecimento do silo em questão foi efectuada por pressão (pneumática) através de camião cisterna.</font>
</p><p><font>ZZ) Desta forma, a farinha não sendo fluida, ao ser carregada no silo vai exercer pressões laterais maiores ou menores, conforme as densidades ou pesos respectivos.</font>
</p><p><font>AAA) Razão pela qual o silo fornecido pela Ré dispunha de sistema de controlo de silo cheio - sensor de carga máxima -, bem como de um dispositivo que permite avisar através dum sinal sonoro, o operador do camião cisterna de que o volume (cubicagem) interior do silo está prestes a atingir o limite pré-estabelecido. </font>
</p><p><font>BBB) Tais dispositivos estão, ainda hoje, instalados e a funcionar no silo recondicionado que a Ré disponibilizou à Autora,</font>
</p><p><font>CCC) Assim como todos os outros componentes e acessórios (sistema de fluidificação, sistema de pesagem, balança de pesagem, válvula rotativa, computador de pesagem, central eléctrica) que foram desmontados do silo danificado e (re)montados no silo recondicionado.</font>
</p><p><font>DDD) A ré facultou o acesso às suas instalações ao perito nomeado pela seguradora da empresa que procedeu ao carregamento do silo a fim de poder vistoriar o silo danificado.</font>
</p><p><font>EEE) E forneceu todos os elementos que o perito solicitou designadamente, o esquema do silo e os valores da reparação e valor do silo em novo.</font>
</p><p><font>FFF) O valor de 54.000 € +IVA constante da proposta de fornecimento apresentada pela Ré à A. correspondia à globalidade do fornecimento efectuado pela ré, tendo a estrutura do tipo NORMSILO em aluminium Almg3 um valor não concretamente apurado</font>
</p><p><font>GGG) A ré procedeu à desmontagem do silo danificado em 13/12/2017 iniciando em 21/12/2017 a montagem do silo recondicionado.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Com interesse para a resolução da causa encontra-se ainda provado o seguinte facto que foi aditado, pelo Tribunal da Relação, à matéria de facto dada como Provada, com a alínea: </font>
</p><p><i><font>HHH) A presente ação deu entrada em Tribunal no dia 30 de Novembro de 2018.</font></i><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.3 - Factos não provados:</font></b><br>
</p><p><font>- No âmbito da sua actividade comercial, a Autora contratou com a Ré a concepção e construção de um silo exterior destinado ao armazenamento de farinha.</font>
</p><p><font>- Este silo foi especialmente construído para a Autora para ser instalado no parque exterior da sua fábrica em Marvila.</font>
</p><p><font>- Também nesse mesmo dia, a Cerealis fez uma análise ao silo e constatou o seguinte:</font>
</p><p><font>i. O silo encontrava-se abaulado nas laterais e com maior incidência na parte inferior;</font>
</p><p><font>ii. O silo não tinha qualquer dano na parte superior onde era feito o abastecimento;</font>
</p><p><font>iii. A intervenção referida em O) ocorrera em virtude de uma fuga;</font>
</p><p><font>- O equipamento padecia de uma anomalia de fabrico na sua estrutura inferior e no sistema de segurança, uma vez que não possuía qualquer sistema preventivo automático para o caso de o silo estar cheio ou sob pressão.</font>
</p><p><font>- O técnico concluiu, após abrir o óculo do silo danificado, que os danos ocorreram em virtude de um problema estrutural no equipamento, uma vez que: </font>
</p><p><font>i. Não existia travamento interior adequado - ligação entre vigas; </font>
</p><p><font>ii. Não tinha reforço exterior a ligar os pontos de apoios das vigas;</font>
</p><p><font>iii. Não tinha os suficientes e necessários metros quadrados de pano filtrante ao escoamento de ar;</font>
</p><p><font>iv. Não cumpria as regras atinentes à área de escape de pressão, atentas as suas dimensões;</font>
</p><p><font>v. A estrutura cedeu após abastecimento da farinha por ruptura dos apoios das vigas à lateral do silo, onde se localiza o parafuso mais frágil.</font>
</p><p><font>- A SILOBAIÃO impediu a peritagem ao não facultar as informações técnicas do silo ao perito, que as solicitou por diversas vezes e que eram essenciais para fazer a peritagem;</font>
</p><p><font>- No dia 23.03.2018, o perito encerrou o processo por falta de informação para realizar a peritagem, tendo a seguradora, em consequência, declinado a sua responsabilidade.</font>
</p><p><font>- Em resposta à missiva referida em BB) a ré, em 27.07.2018, manteve a sua posição e não forneceu as informações solicitadas, inviabilizando assim qualquer possibilidade de fazer uma peritagem ao silo.</font>
</p><p><font>- Em virtude do sinistro, o silo ficou totalmente inutilizado e já não é recuperável, até porque a SILOBAIÃO, na qualidade de construtora do silo, seria a única com know-how para o reparar.</font>
</p><p><font>- O prejuízo sofrido com a perda do silo ascende ao valor de aquisição, uma vez que ainda se encontrava no prazo de garantia de 2 anos, ou seja, €54.000,00 + IVA. </font>
</p><p><font>- A farinha que ia dentro do silo ficou inutilizada, o que representou um prejuízo de € 3.294,50, correspondente ao valor que a Autora pagou à CEREALIS.</font>
</p><p>< | [0 0 0 ... 0 0 0] |
WDJyu4YBgYBz1XKvugr3 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<br>
<br>
<b><font> Proc. n.º 3278/16.4T8GMR.G1.S1</font></b><br>
<br>
<br>
<b><font> </font></b><font>Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
<br>
<br>
<font> </font><b><font>I – Relatório</font></b><br>
<br>
<br>
<font> </font><b><font>1.</font></b><font> A recorrente AA, notificada do acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 2 de junho de 2020, que confirmou o acórdão recorrido e considerou improcedente a ação de investigação de paternidade, vem arguir nulidades do mesmo e suscitar a inconstitucionalidade da interpretação dada ao artigo 1871º, n.º 1, al. </font><i><font>e)</font></i><font> e n.º 2, do Código Civil (CC), por violação do disposto nos artigos 26º, n.º 1 e 36º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o que fez nos termos e com os seguintes fundamentos, que agora se transcrevem:</font><br>
<font> «1- Decide o acórdão recorrido que as nulidades imputadas à sentença que o acórdão da relação julgou inexistirem não podem ser objeto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. </font><br>
<font> Com efeito, expressamente se refere no acórdão produzido que </font><i><font>“enquanto causas de nulidade de uma decisão, apenas é competente para as conhecer o tribunal ad quem, ou seja, o tribunal da Relação a quem cabe competência para declarar a nulidade da sentença de primeira instância e para a revogar, não o Supremo Tribunal de Justiça que exerce a sua competência apenas sobre o acórdão recorrido proferido pelo tribunal da Relação”.</font></i><br>
<i><font> </font></i><font>Para além disso, defende ainda o acórdão que quanto às nulidades processuais invocadas pela recorrente em relação à prática ou omissão de atos processuais no decurso da tramitação do processo, no tribunal da primeira instância, </font><i><font>“não é admissível qualquer pronúncia deste Supremo Tribunal, por extemporaneidade”.</font></i><font> As duas afirmações constantes da decisão não são legalmente justificadas, e não se conhece justificação legal que possa caber-lhes, uma vez que dentro das regras de competência jurisdicente do Supremo não se encontra nenhuma que exclua a possibilidade de ser reapreciada a decisão sobre nulidades produzida na segunda instância, nem qualquer princípio de preclusão em relação à decisão de nulidades cometidas pelo tribunal de primeira instância e que não tenham transitado em julgado. </font><br>
<font> A decisão nesta parte afigura-se, assim, a enfermar da nulidade a que se refere o artigo 615º n.º 1 al. b) do Código de Processo Civil, uma vez que não especifica os fundamentos de direito em que se deveria estribar. </font><br>
<font> Nestes termos deve conhecer-se da apontada nulidade, com a consequência de, a julgar-se inexistente justificação legal para aquelas decisões, ser produzida nova decisão que aprecie as nulidades em causa.</font><br>
<br>
<font> 2- O acórdão, por outro lado, a partir da decisão sobre a matéria de facto produzida na segunda instância, entendeu acertado dizer que </font><i><font>“um resultado de exclusão da paternidade não tenha valor absoluto”,</font></i><font> mas isso não significa que se justifique a verificação da paternidade, por essa hipótese ser “</font><i><font>quase nula”,</font></i><font> conclusão que extraiu das declarações dos peritos em audiência de julgamento, uma vez que estes </font><i><font>“reconheceram que o resultado de um exame de exclusão de paternidade não é em abstrato absoluto, mas esclareceram que no caso concreto, a hipótese de o reu ser de facto o progenitor biológico da criança era, na expressão de um dos peritos “quase nula””. </font></i><br>
<font> Analisando a questão sustenta o acórdão deste STJ, concordantemente com a posição do acórdão recorrido que </font><i><font>“não se pode considerar provada a paternidade, independentemente da prova da exclusividade das relações sexuais entre a autora (mãe) e o réu (pretenso pai), uma vez que os exames hematológicos esclarecem que está excluída a paternidade do réu”,</font></i><font> e daí que </font><i><font>“tem de se entender que não era exigível ao tribunal da Relação exercer sobre a questão da exclusividade do relacionamento sexual os seus poderes de modificação ou de ampliação da matéria de facto, pois estaria a praticar um ato inútil”.</font></i><font> </font><br>
<font> No entanto, ao justificar a decisão, nessa parte, o acórdão deste Supremo Tribunal considera que, de facto, não está excluída de todo a paternidade, uma vez que não é possível excluí-la em absoluto, mas não pode censurar o tribunal recorrido por excluir a paternidade, uma vez que esta é de excluir, embora com uma margem de erro quase nula, </font><i><font>“para considerar que, mesmo sendo feita a prova da exclusividade das relações sexuais entre a mãe e o pretenso pai, sempre se estaria perante uma situação em que a paternidade do réu não poderia ficar estabelecida”, </font></i><font>pois </font><i><font>“a atribuição de um maior valor probatório a um parecer técnico jurídico quando comparado com a prova testemunhal, ao abrigo dos juízos de ponderação que as instâncias podem usar na livre apreciação da prova não é sindicável por este Supremo Tribunal”.</font></i><br>
<font> Essa decisão é manifestamente contraditória em si mesma, porque não pode considerar-se por um lado correta a decisão que exclui a paternidade e ao mesmo tempo considerar-se que a paternidade pode ser excluída, apesar de, embora numa hipótese remota, ela pudesse ser atribuída.</font><br>
<font> A recorrente não é a Virgem Maria.</font><br>
<font> Teve um filho, e esse filho foi gerado pela recorrente conjuntamente com um homem.</font><br>
<font> </font><u><font>Não se conhece nem ninguém lhe apontou qualquer outro relacionamento sexual, para além do que teve com o réu.</font></u><br>
<font> Daí que, remota ou não, a possibilidade de o réu ser o pai do filho da recorrente, não pode deixar de ser-lhe atribuída a paternidade, </font><u><font>porque foi o único homem que se relacionou sexualmente no período legal da conceção</font></u><font>.</font><br>
<font> O artigo 26º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa prescreve que </font><i><font>“a todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, do desenvolvimento da personalidade, da capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação”.</font></i><br>
<font> Por sua vez, o artigo 36 n.º 4 da Constituição da República Portuguesa estabelece o princípio de que “os filhos nascidos fora do casamento não podem por esse motivo ser objeto de qualquer discriminação”.</font><br>
<font> Congruentemente o Código Civil, no artigo 1871º n.º 1 al. e) estabelece o principio de que a paternidade se presume quando se prove que o pretenso pai teve relações sexuais com a mãe durante o período legal da conceção, presunção que, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, só pode considerar-se ilidida se existirem dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado.</font><br>
<font> As dúvidas a que se refere o citado acórdão só podem ser as que resultem da possibilidade de existir qualquer “concorrência” de hipóteses de paternidade, não podem resultar de qualquer exame hematológico, conclua ele o que concluir.</font><br>
<font> Não é, por isso, possível excluir a paternidade de quem teve relações sexuais com a mãe no período legal da conceção, a não ser que, através de um juízo fundado na </font><i><font>“exceptio plurium”,</font></i><font> se demonstre que no mesmo período legal da conceção a mãe teve relações com outros homens.</font><br>
<font> A interpretação dada à referida norma do Código Civil, considerando ilidida a presunção não obstante se não provar, nem ter sido alegado, que a mãe do menor manteve relações de sexo com outro homem no período legal da conceção, viola, pois, a indicada norma constitucional que garante a todos os cidadãos à identidade pessoal.</font><br>
<font> Termos em que, conhecendo-se da apontada contradição, deve a decisão nessa parte ser também julgada nula, conforme o disposto no artigo 615º n.º 1 al. c) do Código de Processo Civil, nulidade que deve ser julgada por forma a ser produzida decisão que julgue legalmente impossível excluir a paternidade em termos absolutos, e, em consequência, julgar-se inconstitucional a interpretação dada ao artigo 1871º n.º 1 al. e) e 2, no sentido de que a presunção de paternidade se deve considerar ilidida quando, não obstante se não provar que a mãe manteve relações de sexo no período legal da conceção com mais nenhum homem, seja escassa a possibilidade de ser esse o pai da criança, em virtude do resultado de exames hematológicos que lhe atribuam uma hipótese de paternidade remota».</font><br>
<br>
<font> </font><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
<br>
<br>
<font> </font><b><font>II - Fundamentação </font></b><br>
<b><font> </font></b><br>
<font> A reclamante vem arguir nulidades do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido nestes autos, que considerou improcedente a ação de investigação de paternidade, confirmando o acórdão recorrido. Alega que o citado acórdão padece de nulidade por falta de fundamentação de direito (artigo 615.º, n.º 1, al. </font><i><font>b), </font></i><font>do Código de Processo Civil – CPC), na parte em que afirma que o Supremo não pode conhecer nulidades da sentença de 1.ª instância, nem de nulidades processuais alegadamente cometidas pelo tribunal de 1.ª instância. Entende ainda que o acórdão reclamado é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão (artigo 615.º, n.º, al. </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC), na parte em que considera, com base nas declarações dos peritos, que, por um lado, o exame hematológico não exclui em absoluto a paternidade e, por outro lado, não se pode considerar verificada a paternidade do réu, pois, no caso concreto, é “quase nula” a hipótese de o réu ser o pai. </font><br>
<font> Por último, coloca uma pretensa questão de constitucionalidade, segundo a qual, deve julgar-se inconstitucional, por violação dos artigos 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 4, ambos da CRP, a interpretação do artigo 1871.º, n.º 1, al. </font><i><font>e),</font></i><font> e n.º 2 do Código Civil, no sentido de que </font><i><font>a presunção de paternidade se deve considerar ilidida quando, não obstante se não provar que a mãe manteve relações de sexo no período legal de conceção com mais nenhum homem, seja escassa a possibilidade de ser esse o pai da criança, em virtude do resultado de exames hematológicos que lhe atribuam uma paternidade remota». </font></i><br>
<b><font> </font></b><br>
<b><font> </font></b><font>Vejamos: </font><br>
<br>
<font> </font><b><font>1.</font></b><font> Relativamente à primeira questão, deve notar-se que, quando o Código de Processo Civil afirma, no artigo 615.º, n.º 1, al. </font><i><font>b)</font></i><font>, que é nula a decisão que não especifica os fundamentos de direito, tal conceito de fundamentos de direito não inclui necessariamente a lei, mas também princípios fundamentais de direito, a jurisprudência e raciocínios jurídicos de lógica elementar. </font><br>
<font> O fundamento, segundo o qual uma decisão do Supremo Tribunal só se debruça sobre o reexame da decisão do Tribunal da Relação e não sobre a sentença do tribunal de 1.ª instância, é um princípio fundamental que resulta do objeto do recurso de revista, e que não carece, para a sua demonstração, que seja invocado um preceito legal para o efeito, dado o seu caráter óbvio e imediatamente decorrente da fixação do objeto do recurso. Como se afirma no acórdão 23-03-2000, Revista n.º 263/99, </font><i><font>«O Supremo não conhece das nulidades cometidas na sentença da 1ª instância, mas das nulidades do acórdão da Relação».</font></i><font> O mesmo se diga em relação ao princípio da preclusão das nulidades processuais, sendo orientação jurisprudencial dominante, como é por demais sabido, que, em regra, não podem ser conhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, pois os prazos de arguição são muito curtos e terminam em fases anteriores do processo (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-06-2011, proc. n.º 527/05.8TBVNO.C1.S1). Os vícios previstos no artigo 615.º do CPC, que determinam a nulidade da sentença, não se confundem com as nulidades dos atos processuais previstas nos artigos 195.º e seguintes do mesmo Código. Nulidades de processo são todos os desvios ao ritualismo processual prescrito na lei, com relevância para o exame e discussão da causa. As nulidades processuais consistem num desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo processual seguido, e só se produzem quando a lei o declare ou quando tal falha possa influenciar o decurso da causa. O regime destas nulidades encontra-se regulado nos artigos 195.º a 198.º e 200.º, fundamento legal que foi invocado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, agora reclamado, diferentemente do que afirma o reclamante. </font><br>
<font> O acórdão reclamado não deixou, portanto, de remeter para o respetivo regime legal, não tendo desenvolvido mais a questão, pelo facto de se tratar, por um lado, de uma questão que não lhe competia conhecer, e por outro, porque o acórdão recorrido a tratou com pormenor e rigor técnico, nada mais havendo a dizer senão remeter para a fundamentação desenvolvida pelo acórdão recorrido, à qual nada havia a censurar.</font><br>
<br>
<font> </font><b><font>2.</font></b><font> Relativamente à alegada contradição, supostamente suscetível de inquinar de nulidade o acórdão reclamado nos termos da alínea </font><i><font>c)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, entre o valor de um exame hematológico que exclui a paternidade, o qual, em abstrato, se reconhece não ser absoluto, e a afirmação dos peritos de que era quase nula a probabilidade de o réu ser o pai, está extensa e profundamente explicado no acórdão reclamado, com recurso a doutrina e a jurisprudência, que não se trata de contradição alguma, relevando apenas para o caso, como não podia deixar de ser, o grau de probabilidade que, </font><b><font>em concreto,</font></b><font> tinha o exame dos autos.</font><br>
<font> Dispõe o artigo 615.º, n.º 1, al. </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC que: "É nula a sentença [e também o acórdão] quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão". As premissas do silogismo judiciário têm de ser congruentes com a conclusão que delas tem de decorrer logicamente. </font><br>
<font> Segundo a jurisprudência:</font><br>
<br>
<font> «Há contradição entre os fundamentos e a decisão, quando estes dois aspectos cruciais da sentença, na sua sustentação, enfermam de um vício lógico insanável, através do qual se evidencie que a concreta fundamentação utilizada pelo julgador, seja ancorada na matéria de facto ou na matéria de direito, jamais poderia ter conduzido ao resultado alcançado que, assim, não pode ser considerado inteligível e coerente desfecho por estar inquinado de um vício no raciocínio lógico-dedutivo; ou seja, o caminho trilhado na via da fundamentação nunca poderia, de uma maneira lógica e razoável, desaguar naquele concreto resultado plasmado na sentença» (acórdão de 20-11-2012, processo n.º 176/06.3TBMTJ.L1.S2).</font><br>
<br>
<font> Verifica-se, pois, a nulidade em causa quando as premissas do silogismo judiciário a que se reconduz a sentença ou o acórdão não se coadunam com a conclusão que delas é extraída.</font><br>
<font> Mas não é o caso do acórdão reclamado, que não padece deste vício, nem de qualquer contradição lógica nos sues fundamentos.</font><br>
<br>
<font> Revejam-se, agora, alguns excertos da fundamentação do acórdão reclamado:</font><br>
<br>
<font> </font><font>«Invoca ainda o recorrente que o acórdão recorrido, à semelhança da sentença, padece de ambiguidade ou obscuridade e ininteligibilidade, na medida em que, por um lado, aceita que o réu é excluído da paternidade, tal como consta do exame pericial junto aos autos, e, por outro lado, admite que os peritos esclareceram que a exclusão da paternidade não é absoluta devido a um fenómeno a que chamaram de “ocorrência de mutações”.</font><br>
<font>Contudo, compulsada a matéria de facto acerca dos exames periciais e do depoimento dos peritos em audiência de julgamento: </font><br>
<font> «13 - Resulta do Relatório Pericial de Investigação de Parentesco Biológico de fls. 182 e v.º, que </font><i><font>“De acordo com os resultados obtidos, BB é excluído da paternidade de CC, filho de AA.” </font></i><br>
<font> 14 - Resulta do Relatório Pericial de Investigação de Parentesco Biológico de fls. 253 a 254v.º, que </font><i><font>“De acordo com os resultados obtidos, BB é excluído da paternidade de CC, filho de AA. </font></i><br>
<i><font>A identificação de haplótipos distintos do cromossoma Y em BB e CC, exclui a possibilidade de pertencerem à mesma linhagem paterna, ou seja BB é excluído da paternidade que lhe é atribuída no haplótipo do cromossoma Y.”. </font></i><br>
<font> 15- Dada a ocorrência de um fenómeno raro que pode acontecer na transmissão do património genético de pai para o filho, os exames hematológicos podem dar um resultado de exclusão de paternidade biológica do primeiro em relação ao segundo, não obstante aquele ser efetivamente pai biológico deste.</font><br>
<font> 16- Apesar do referido em 15), a quantidade de perfis genéticos que foram analisados aquando da realização das periciais identificadas em 11A), 13) e 14) e o número de perfis genéticos em que ocorre incompatibilidade genética entre Autor e Réu</font><b><font>, a possibilidade deste ser pai biológico do Autor é praticamente nula». </font></b><font>(realce nosso)</font><br>
<font> </font><font>Desta matéria de facto, bem como da apreciação da fundamentação do acórdão recorrido, baseada nos depoimentos dos peritos, resulta que, não obstante a possibilidade, em abstrato, de ocorrência de mutação genética suscetível de provocar que um resultado de exclusão da paternidade não tenha valor absoluto e que o indivíduo excluído seja afinal o progenitor biológico, essa hipótese é </font><b><font>“quase nula”</font></b><font> no caso vertente em que foi utilizado um número elevado de marcadores genéticos. </font><br>
<font> (…)</font><br>
<font>O acórdão recorrido conclui, portanto, que: </font><i><font>«(…)se é certo que assiste razão ao apelante quando sustenta que a prova produzida, impõe que se conclua que o resultado de exclusão de paternidade dados pelos exames hematológicos pode ter na sua base um fenómeno raro de mutação genética ocorrida na transmissão do património genético de pai para filho, já não lhe assiste razão quando pretende que essa circunstância está na base da exclusão da paternidade do apelado em relação ao apelante, antes pelo contrário, </font></i><i><u><font>a prova produzida, impõe que se conclua que</font></u></i><i><font> </font></i><i><u><font>dado o número de perfis genéticos analisados nos exames hematológicos realizados e o número de perfis genéticos em que ocorre incompatibilidade genética entre o apelante e o apelado, a possibilidade deste ser pai biológico daquele é praticamente nula</font></u></i><font>».(sublinhado nosso)</font><br>
<br>
<font>Mesmo tendo em conta que o tribunal recorrido aceitou, com base nos pareceres proferidos pelos peritos em audiência de julgamento, que os exames científicos de exclusão da paternidade não têm valor absoluto, e que existe uma possibilidade, ainda que quase nula, de o pretenso progenitor excluído ser afinal o pai, em virtude da ocorrência de mutações genéticas, tal não impõe ao tribunal recorrido que estabeleça a paternidade em relação ao réu com base numa probabilidade que se dirá ser, a esta luz, muito remota. E este Supremo Tribunal, ainda que aceitasse a tese do recorrente, não tem poderes para alterar o valor probatório atribuído pelo tribunal recorrido a estas declarações, pois estamos no domínio de prova sujeita a livre apreciação, não podendo o Supremo Tribunal substituir-se ao tribunal recorrido, nem para valorar de outra forma este meio de prova, nem para ordenar a repetição de novos exames, que substituíssem aqueles que já foram realizados, uma vez que foi feita nos autos uma segunda perícia, em relação à qual não se provou qualquer irregularidade, vício ou quebra de imparcialidade.</font><br>
<font>Tratando-se de prova pericial, é costume distinguir entre o juízo do tribunal sobre os factos que serviram de base à perícia e o juízo do tribunal sobre a validade científica das conclusões apresentadas. Neste último ponto, será, contudo, difícil, como afirma Guilherme de Oliveira (</font><i><font>Estabelecimento da filiação, </font></i><font>Petrony, 2019, p. 50), que o tribunal se afaste das conclusões científicas dos peritos, desde logo porque os juízes não têm uma competência técnica equivalente. </font><br>
<font>(…)</font><br>
<font>Contudo, entende-se ser normal, como também afirma Guilherme de Oliveira </font><i><font>(Estabelecimento da Filiação, ob.cit., </font></i><font>p. 50), que,</font><i><font> «Nos casos típicos, em que nada se pode assinalar de anormal, é difícil que o tribunal se afaste das conclusões dos peritos, tal é a credibilidade dos laboratórios nacionais e o potencial técnico dos procedimentos, quer para a exclusão de um vínculo quer para a sua afirmação». </font></i><br>
<font>É certo que os peritos em audiência de julgamento reconheceram que o resultado de um exame de exclusão da paternidade não é, em abstrato, absoluto, mas esclareceram que, no caso concreto, a hipótese de o réu ser de facto o progenitor biológico da criança, era, na expressão de um dos peritos</font><i><font>, “quase nula”.</font></i><font> Neste quadro, o tribunal recorrido, valorando, no exercício do princípio da livre apreciação da prova, o “risco de erro” do exame, entendeu, que ele era de tal modo baixo, que decidiu não reconhecer a paternidade do investigado em relação ao investigante. </font><br>
<font>Entendeu, assim, o tribunal recorrido, de acordo com a premissa jurisprudencial de que a paternidade só deve declarar-se quando é altamente provável, que, em face do resultado do exame, a relação paterno-filial invocada pelo autor não reunia condições para merecer um juízo de probabilidade elevado. É esta a prática judicial nesta matéria, em que, não sendo possível apurar uma verdade, negativa ou positiva, 100% garantida, prevalecem juízos de probabilidade. Nas palavras de Guilherme de Oliveira (</font><i><font>ob. cit.,</font></i><font> p. 227), </font><i><font>«É preciso não exceder a margem de erro admissível; só deve declarar-se a paternidade do réu quando ela é altamente provável (…)».</font></i><br>
<font>Também a jurisprudência tem afirmado que o exame hematológico constitui neste tipo de processos autêntica «prova rainha», com virtualidade de excluir a possibilidade de o réu ser o pai do menor, ou, pelo contrário, praticamente garantir que o seria (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-06-2004. Proc. n.º 04A1974). Em relação aos exames científicos de paternidade, como se afirma no Acórdão citado, </font><i><font>«As provas não têm que criar no espírito do julgador uma certeza para além de todas as dúvidas, mas tão só a probabilidade bastante da existência do facto, tendo em consideração as regras de experiência comum». </font></i><font> </font><br>
<font>Tendo o Tribunal da Relação decidido com base em juízos de probabilidade, decorrentes das afirmações dos peritos ouvidos em audiência de julgamento, que afirmaram que a margem de erro do exame era quase nula, não existe qualquer obscuridade, ininteligibilidade ou ambiguidade no acórdão recorrido. As decisões judiciais de paternidade baseiam-se sempre em juízos de probabilidade e é compreensível para o cidadão comum que não esteja ao alcance do tribunal estabelecer a paternidade num caso em que o exame exclui a paternidade do réu. A margem de erro do exame, segundo os peritos, é quase nula, e seria sempre, de qualquer forma, uma margem infinitamente menor do que a possibilidade de erro do julgador em face da prova testemunhal.</font><br>
<font>Sendo assim, apesar de provada a coabitação entre a mãe do autor e o réu, durante o período legal de conceção, e de funcionar uma presunção de paternidade, ao abrigo do artigo 1871.º, n.º 1, alínea </font><i><font>c),</font></i><font> 2.ª parte e alínea </font><i><font>e)</font></i><font>, decidiu o tribunal recorrido – de forma inteligível, clara e sem ambiguidades – que o resultado do exame pericial ilide essa presunção, devido à existência de dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado, nos termos do artigo 1871.º, n.º 2, do Código Civil». </font><br>
<font> </font><br>
<font> Do exposto, resulta que não se verifica, nos termos exigidos pela alínea </font><i><font>c)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, qualquer contradição lógica entre os fundamentos e a decisão de não reconhecimento a paternidade, nem qualquer obscuridade ou ambiguidade na fundamentação, pelo que não padece o acórdão reclamado desta nulidade invocada pelo reclamante.</font><br>
<br>
<font> </font><b><font>3. </font></b><font>Relativamente à pretensa questão de constitucionalidade formulada pelo reclamante, importa dizer que a mesma não foi suscitada no momento processualmente adequado, na medida em que tendo sido esta interpretação aplicada também no acórdão recorrido, o reclamante devia tê-la colocado logo nas alegações de revista, o que não fez, não sendo a arguição de nulidades o momento adequado para tal. </font><br>
<font> Por outro lado, o teor da alegada questão de constitucionalidade não está concebido em termos que vinculem o juiz a decidi-la, por falta de normatividade, pois remete para as idiossincrasias do caso concreto e para especificidades da ponderação da prova, não se revestindo da natureza geral e abstrata exigida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, nem sendo possível destacar dela um sentido normativo suscetível de ser aplicado a um número indeterminado de casos. </font><br>
<font> Vejamos:</font><br>
<font> A pretensa questão de constitucionalidade reporta-se à interpretação do artigo 1871.º, n.º 1, al. </font><i><font>e),</font></i><font> e n.º 2, do Código Civil, no sentido de que </font><i><font>a presunção de paternidade se deve considerar ilidida quando, não obstante se não provar que a mãe manteve relações de sexo no período legal de conceção com mais nenhum homem, seja escassa a possibilidade de ser esse o pai da criança, em virtude do resultado de exames hematológicos que lhe atribuam uma paternidade remota». </font></i><br>
<font> </font><br>
<font> Esta alegada interpretação normativa, não reúne as caraterísticas de generalidade e abstração, pois a sua aplicação depende de juízos casuísticos de ponderação da prova, que não são sindicáveis em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade, na medida em que o nosso sistema não admite o recurso de amparo, nem a impugnação direta de decisões judiciais por violação de direitos fundamentais, nem o recurso de constitucionalidade é um contencioso de decisões.</font><br>
<font> Ainda que assim não se entendesse, o sentido normativo agora impugnado nunca violaria direitos fundamentais e princípios constitucionais, como o direito à identidade pessoal (artigo 26.º, n.º 1, da CRP) e a proibição da discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (artigo 36.º, n.º 4, da CRP), por ser manifestamente inexigível, de um ponto de vista constitucional, ao julgador, quando interpreta e aplica a lei, que, sendo o resultado do exame hematológico a exclusão da paternidade, ainda assim estabeleça a paternidade por prova testemunhal acerca da ausência de coabitação concorrente durante o período legal de conceção. Desde logo porque é menos falível, em termos de probabilidade, uma prova científica do que a prova testemunhal acerca de um facto negativo, a qual tem vindo a ser abandonada pela jurisprudência pela circunstância de os exames disponíveis terem a virtualidade de fazer a prova positiva da paternidade com uma probabilidade próxima dos 100%. Os exames científicos que incidem sobre o facto biológico da procriação assumem um especial relevo e importância nas ações relativas à filiação, pois constituem o único mecanismo adequado a permitir a prova direta da paternidade. São, assim, desde a reforma de 1977, nos termos da lei, a prova rainha nas ações de investigação (artigo 1801.º do CC), quer para estabelecer a paternidade, quer para a excluir. Antes de ser possível utilizar exames científicos na investigação da paternidade, o estabelecimento deste vínculo de filiação resultava de uma conclusão judicial deduzida de determinados factos: a prova de relações sexuais entre a mãe e o pretenso pai durante o período legal de conceção e a demonstração que a mãe não tinha mantido relações de sexo com outro homem durante esse período, facto negativo que representava para o autor uma prova diabólica.</font><br>
<font> Contudo, conforme se exarou no acórdão reclamado: </font><br>
<font>«A prova da exclusividade das relações sexuais tinha um valor mais forte do que qualquer presunção, pois permitia demonstrar a causalidade da coabitação, sem suporte de exames de sangue. Contudo, esta exclusividade não era, em si mesmo, o verdadeiro facto constitutivo de que emergia a relação jurídica de filiação paterna, mas mero facto instrumental ou indiciário da procriação biológica. Estes factos indiciários da procriação biológica, como afirma Lopes do Rego («O ónus da prova nas acções de investigação da paternidade: prova directa e indirecta do vínculo de filiação», in </font><i><font>Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, </font></i><font>Volume I, Coimbra Editora, 2004, p. 783) eram em muitos casos «(…) demonstrados no processo através do uso, pelas partes, de factos instrumentais ou indiciários de segundo grau, tendentes nomeadamente à indireta demonstração da </font><i><font>“exclusividade das relações”:</font></i><font> o </font><i><font>“bom comportamento”</font></i><font> da mãe, o facto de esta ser considerada, no seu meio social, </font><i><font>“mulher séria, honesta e bem comportada” </font></i><font>– situando-se, aliás, tais “factos” no limite dos conceitos </font><i><font>“valorativos”</font></i><font> ou puras </font><i><font>“conclusões”.</font></i><font>» Contudo, estas considerações valorativas ou indagações dentro destes processos sempre foram preconceituosas e discriminatórias para as mulheres, implicando devassas da vida privada e alegações falsas de coabitações concorrentes, dependendo a declaração ou não da paternidade do réu apenas da convicção pessoal dos juízes em relação à prova testemunhal. Não está excluído, como entende Guilherme de Oliveira (</font><i><font>Estabelecimento da Filiação, ob. cit</font></i><font>., p. 214), que os tribunais continuem a seguir este método quando, por qualquer razão, não disponham de exames científicos. Mas, nestes autos foram feitos dois exames periciais (para além de um outro feito no processo de averiguação oficiosa, que também excluiu a paternidade), tendo as instâncias confiado no resultado dos exames e concluído que a coabitação entre a mãe do autor e o pretenso pai não foi causal em relação à procriação. Mesmo que se trate de um erro de julgamento, não tem este Supremo poderes para o corrigir, ordenando novo julgamento ou repetição da prova. Por outro lado, a verificação ou não do requisito da exclusividade das relações sexuais sempre seria matéria de exclusiva competência das instâncias, que não poderia ser reapreciada por este Supremo, nem alterada, em sede de outro recurso que o autor viesse a interpor contra outra decisão do Tribunal da Relação, que, conhecendo da impugnação da matéria de facto, considerasse a ação improcedente».</font><br>
<font> </font><br>
<font> Por outro lado, sendo o conceito de dúvidas sérias acerca da paternidade do investigado um conceito indeterminado, de dimensão casuística, não se divisa qualquer inconstitucionalidade na fixação do seu sentido, de molde a aceitar que o resultado negativo de exames ilide a presunção fixada na alínea </font><i><font>e)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 1871.º do Código Civil.</font><br>
<font> Como se afirma no acórdão reclamado:</font><br>
<font> </font><font>«As “dúvidas sérias” resultam de circunstâncias que </font><i><font>enfraquecem</font></i><font> uma grande probabilidade de o réu ser o pai. Neste sentido, o estabelecimento judicial da paternidade através da presunção é compatível com uma dúvida acerca da paternidade, mas não é compatível com uma “dúvida séria”, que | [0 0 0 ... 0 0 0] |
sDFau4YBgYBz1XKvmPm_ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<font>Acordam na Conferência do Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
<p><b><font> </font></b></p></div><br>
<br>
<b><font>I – Relatório</font></b><br>
<p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1. AA, </font></b><font>na qualidade de Reclamante, vem apresentar reclamação para a Conferência, nos termos do disposto nos artigos 643, nº 4 e 652º, nº 3, do Código de Processo Civil (CPC), do despacho singular da Relatora que não admitiu o recurso de revista excecional, por falta de objeto idóneo.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Na decisão singular reclamada, rejeitou-se liminarmente o recurso porque </font><i><font>“(…) a recorrente limitou-se nas alegações e nas conclusões do recurso a esgrimir argumentos sobre o fundo da questão para sustentar a procedência do recurso, nada tendo dito, para além da singela enunciação no requerimento de recurso das alíneas a) e b) do artigo 672.º do CPC, acerca dos pressupostos previstos nas citadas alíneas e das razões pelas quais se justifica a intervenção deste Supremo Tribunal. Assim sendo, por falta de objeto idóneo, não se reenvia o processo à Formação prevista no n.º 3 do artigo 672.º do CPC, por se tratar de um ato inútil».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>3. </font></b><font>A reclamante, na sua reclamação, apresentou os seguintes fundamentos, conforme conclusões que aqui se transcrevem:</font><br>
</p><p><font>«a) O presente recurso vem interposto da, aliás mui douto acórdão proferido pela, ... Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, que determinou considerar improcedente o recurso apresentado pela executada AA, determinando que oposição é extemporânea, concluindo pelo desentranhamento da mesma.</font><br>
</p><p><font>b) Salvo o devido respeito, que, aliás, é muito, andaram mal os Srs Juízes Desembragadores do Tribunal </font><i><font>a quo,</font></i><font> ao decidir da forma como o fez, como se procurará demonstrar.</font><br>
</p><p><font>c) De entre os factos relevantes nos autos, assumem particular relevância para melhor compreensão das presentes alegações e da boa e definitiva decisão da causa, aqueles que a seguir se descriminam:</font><br>
</p><p><font>d) Em primeiro lugar, a executada AA, nunca teve conhecimento da citação feita em 29/04/2009;</font><br>
</p><p><font>e) Não entende a Recorrente que, como fundamento da não apreciação do recurso, esteja o fundamento dos factos elencados na mesma, sejam idênticos a uma outra;</font><br>
</p><p><font>f) A Recorrente, foi citada pessoalmente, no passado dia 09/07/12, nos termos do disposto do antigo 239º do C.P.C., do processo em discussão.</font><br>
</p><p><font>e) Nessa altura, a Recorrente foi informada nos ternos do disposto do antigo artigo 813º do C.P.C., que tinham 20 ( vinte) dias, querendo, para deduzir oposição à execução.</font><br>
</p><p><font>f) A Recorrente, no passado dia 12/09/14, deduziram tempestivamente oposição à execução.</font><br>
</p><p><font>g) No entanto, o Tribunal a quo, optou por promover o desentranhamento da oposição por considerar a mesma extemporânea, em virtude de ter sido ultrapassado o prazo de 10 (dias) para o fazer.</font><br>
</p><p><font>h) Como se infere pelos factos relevantes acabados de explicitar, os Apelantes tinham e têm a plena convicção dos factos que corroboram a defesa dos seus legítimos interesses.</font><br>
</p><p><font>i) Realmente, a citação pessoal deu-se no passado dia 09/07/12.</font><br>
</p><p><font>j) Em face ao supra referido, a Recorrente, deduziram tempestivamente ( no prazo de 20 dias), oposição à execução.</font><br>
</p><p><font>l) Tal facto, não deixa de surpreender os Recorrente, em virtude do prazo legal de defesa, não ter sido ultrapassado.</font><br>
</p><p><font>m) Da mesma forma, que procedeu-se à autoliquidação da taxa de justiça inicial.</font><br>
</p><p><font>n) Em virtude do mesmo, ao invés da oposição ter sido considerada extemporânea, e consequentemente devendo ser desentranhada e devolvida à Recorrente.</font><br>
</p><p><font>o) A mesma deveria ter sido admitida por tempestiva</font><br>
</p><p><font>p) Na citação por via postal, a aposição de data no aviso de recepção é útil para a aferição pelo Tribunal e pelas partes, do cumprimento dos prazos para contestar, sendo certo que, actualmente, com a possibilidade de, através do número do registo/código de barras, se obter a data de entrega da carta (pesquisa de objectos na página online dos Correios), tal informação, omitida no aviso de recepção, poder ser prontamente suprida por este meio ou, de forma mais morosa, por informação solicitada por escrito aos serviços postais.</font><br>
</p><p><font>q) Considerando a citação se considerava efectuada na data da assinatura do aviso de recepção, de que se anexou cópia, e sendo este omisso neste ponto, a citação considera-se efectuada na data em que se comprovar ter sido a carta entregue a quem assinou o aviso de recepção, competindo ao citando alegar e provar que não lhe foi entregue no prazo que a lei lhe confere de dilação em razão da citação não ter sido efectuada na sua pessoa.</font><br>
</p><p><font>r) Compulsados os autos, constata-se que a reclamante apresentou a respectiva oposição, Concluindo, assim, ser legalmente admissível, o oposição apresentada.</font><br>
</p><p><font>s) Aliás, prevê o art. 569.º, n.º 2 do CPC que, em caso do término do prazo de defesa de vários réus em dia distinto, o prazo que termine em último lugar aproveita aos restantes.</font><br>
</p><p><font>t) À luz de tal normativo, revelava-se a referida dilação de extrema importância para a recorrente, pois alargava o seu prazo para apresentar defesa, permitindo uma melhor organização e preparação da mesma.</font><br>
</p><p><font>u) Assim expondo, mais uma vez, de forma clara, a sua total ausência de responsabilidade em tal citação tardia, à luz de tudo o alegado.</font><br>
</p><p><font>v) Revela-se assim inegável que o conhecimento da data em que se mostra assinado o aviso de recepção se revela, assim, um elemento da maior importância, influindo diretamente na defesa da Recorrente contrariamente ao proferido pelo acórdão.</font><br>
</p><p><font>x) A decisão ora em crise merece o mais veemente protesto, porque é frontalmente contrária.</font><br>
</p><p><font>z) O meio de impugnação jurisdicional legalmente adequado para se reagir contra o despacho que não receba o recurso é a reclamação, estando previsto o seu regime processual no artigo 643º do CPC».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir. </font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>II - Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1. </font></b><font>A reclamante, na sua reclamação, reitera os argumentos das suas alegações de revista, chamando a atenção para um alegado erro do acórdão do Tribunal da Relação que não admitiu por extemporaneidade a sua oposição à execução, sem nada dizer sobre a específica questão da admissibilidade do recurso de revista, que infirme a decisão singular que pretende impugnar. </font><br>
</p><p><b><font>2. </font></b><font>Compulsados os autos, verifica-se que a única referência ao recurso de revista excecional foi no requerimento de interposição de recurso em que a recorrente, agora reclamante, exarou o seguinte:</font><br>
</p><p><b><font>«AA,</font></b><font> na qualidade de Recorrente, vem nos termos do disposto no apresentar, </font><b><u><font>recurso de revista excecional nos termos do</font></u></b><font> </font><b><u><font>disposto no nº 1 a) e b) do artº 672º do C.P.C.</font></u></b><font>, com fundamento em manifesto indeferimento do requerido pelo Apelante». </font><br>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Nada tendo sido dito pela recorrente, acerca das alíneas </font><i><font>a)</font></i><font> e </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, nem sequer a mera transcrição das normas jurídicas em que funda o recurso de revista excecional, é manifesto que o recurso de revista excecional não tem objeto idóneo para ser enviado à Formação constituída ao abrigo do n.º 3 do artigo 672.º do CPC. </font><br>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Trata-se não de um caso em que se alegam razões insuficientes, mas ainda sujeitas a apreciação pela Formação, a quem compete exclusivamente esse juízo, mas de uma total falta de objeto idóneo do recurso.</font><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>5</font></b><font>. Assim sendo, indefere-se a reclamação e confirma-se o despacho reclamado. </font><br>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Anexa-se sumário elaborado nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC:</font><br>
</p><p><b><font>I - </font></b><font>Nada tendo sido dito pela recorrente, acerca das alíneas </font><i><font>a)</font></i><font> e </font><i><font>b)</font></i><font> do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, nem sequer a mera transcrição das normas jurídicas em que funda o recurso de revista excecional, é manifesto que o recurso de revista excecional não tem objeto idóneo para ser enviado à Formação constituída ao abrigo do n.º 3 do artigo 672.º do CPC. </font><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>III – Decisão</font></b><font> </font><br>
</p><p><font>Pelo exposto, indefere-se a reclamação.</font><br>
</p><p><font>Custas pela reclamante.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 11 de outubro de 2022</font><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora) </font><br>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves </font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 1] |
5zJnu4YBgYBz1XKv_QLA | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><br>
<font> </font>
<p><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font>
</p><p>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I. Relatório</font></b>
</p><p>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><i><font>Quinta do Solar - Sociedade Imobiliária Lda</font></i><font>., com sede em ……, </font><i><font>AA</font></i><font> e </font><i><font>BB</font></i><font>, residentes na Rua …, …, </font><i><font>CC</font></i><font> e </font><i><font>DD</font></i><font>, residentes na Rua …. e </font><i><font>EE</font></i><font> e </font><i><font>FF</font></i><font>, residentes na Rua …, vieram, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhes foi instaurada por Caixa Geral de Depósitos S.A., com sede na …, em …, deduzir embargos à execução.</font>
</p><p><font>Alegaram, em resumo, a ilegitimidade dos Executados, pessoas singulares, para os termos da execução, a inexequibilidade do título, por inexigibilidade da divida exequenda e por inobservância do benefício da excussão prévia, a ineptidão do requerimento executivo, por omissão de factos que expressem o incumprimento e a mora e a nulidade da cláusula 13ª do documento complementar à escritura, por abusiva e ilegítima.</font>
</p><p><font>Concluíram pela extinção da execução.</font>
</p><p><font>Contestou a Embargada por forma a contradizer a defesa dos Embargantes e a concluir, a final, pela improcedência dos embargos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Considerando que os factos adquiridos nos autos permitiam, sem recurso a outras provas, conhecer das questões suscitadas pelos Embargantes, foi proferido despacho saneador que, conhecendo do mérito da causa, dispôs designadamente a final:</font>
</p><p><i><font>“(…) julgo procedente a exceção de inexequibilidade do título executivo e, em consequência, absolvo os embargantes da instância executiva e determino a extinção da execução”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> A Embargada apelou da decisão e por acórdão desta Relação foi ordenada a substituição da decisão recorrida por outra com vista </font><i><font>ao aperfeiçoamento do requerimento executivo.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> A Embargada juntou aos autos requerimento com vista ao aperfeiçoamento do requerimento executivo ao qual se seguiu saneador-sentença que dispôs designadamente a final:</font>
</p><p><i><font>«(…) </font></i><font> </font><i><font>julgo procedentes os embargos de executado (…) e, consequentemente, determino a extinção da execução requerida por “Caixa Geral de Depósitos, S.A”.» </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> A Embargada recorreu desta sentença para o Tribunal da Relação …, suscitando duas questões: (i) impugnação da decisão de facto e (ii) se o título dado à execução certifica com suficiência a obrigação exequenda, tendo o Tribunal da Relação, após ter indeferido a impugnação quanto à matéria de facto, decidido o seguinte:</font>
</p><p><i><font>«Delibera-se, pelo exposto, na procedência parcial do recurso em:</font></i>
</p><p><i><font>a) revogar a decisão recorrida;</font></i>
</p><p><i><font>b) determinar a execução imediata da quantia de € 185.000,00;</font></i>
</p><p><i><font>c) determinar que os embargos prossigam para liquidação da obrigação de juros, depois de convidada a Exequente, ora apelante, a indicar todos os pressupostos que, de acordo com o título, concorreram para o seu cálculo (taxas de juro aplicáveis, períodos sobre que incide a contagem dos juros capitalizados e respetiva base de incidência demonstrada com as taxas que justificam o cálculo e outros elementos considerados necessários);</font></i>
</p><p><i><font>d) julgar, no mais, improcedentes os embargos.</font></i>
</p><p><i><font>Custas pela Apelante e Apelados na proporção de ½». </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Inconformados, os embargantes interpõem recurso de revista, em cuja alegação, formulam as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font>«A) Rebelam-se os ora Recorrentes contra o decidido no Acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal da Relação …. em 21/05/2020, com enfoque na questão da execução imediata da quantia de € 185.000,00.</font>
</p><p><font>B) Porquanto, o título dado à execução não certifica com suficiência a obrigação exequenda.</font>
</p><p><font>C) A decisão judicial aqui sindicada apresenta-se contraditória e oposta a tudo quanto ressalta anteriormente dos autos e à boa aplicação do direito constituído.</font>
</p><p><font>D) É que, anteriormente, mediante Acórdão do Tribunal da Relação …, datado de 6/12/2018, neste mesmo processo, ficou bem latente que a quantificação de reembolso, com origem no contrato de abertura de crédito, não resulta do título que documenta o contrato, mas dos instrumentos documentais que certificam a utilização do crédito, incumbindo ao exequente instruir o título executivo com tal documentação complementar, sem a qual o contrato não pode haver-se, por insuficiente, como título apto à realização coativa da obrigação.</font>
</p><p><font>E) Como tal, determinou-se aí que fosse a Exequente convidada a aperfeiçoar o requerimento executivo com vista à junção da documentação que, assinada pelos recorridos demonstre as quantias pecuniárias por estes concretamente utilizadas para além da quantia entregue na data do contrato com a discriminação das respectivas datas e montantes.</font>
</p><p><font>F) Porém, apesar do convite formulado pela 1ª instância em ordenação da decisão do tribunal superior, nada disso foi efectivamente feito.</font>
</p><p><font>G) Tendo assim, de novo, o Juízo de Execução do Entroncamento concluído pela inexequibilidade do título oferecido à execução, julgando procedentes os Embargos e determinando a extinção da execução pela qual se peticionava a quantia exequenda de € 339.066,99.</font>
</p><p><font>H) E a nosso ver bem, já que como resulta dessa decisão </font><i><font>“(…) se é certo que na escritura pública fez-se constar a cedência, desde logo, pela exequente à sociedade executada do capital de € 185.000,00, considerando a posterior discriminação feita pela exequente/embargada das prestações vencidas e não pagas pela sociedade executada (prestações 14, 15, 16, 17, 19, 20 e 21), resulta que outras terão sido pagas”.</font></i>
</p><p><font>I) Pelo que como fundamenta o Tribunal, </font><i><font>“incumbia à exequente, para efeito de constituição válida, completa do título (complexo) em que se funda a execução, a junção do extracto da conta da sociedade executada, de onde se pudessem extrair os movimentos a débito, com indicação dos valores e datas das prestações acordadas, vencidas e não pagas, e os movimentos a crédito, com indicação dos valores e datas das prestações acordadas, por forma a extrair-se o valor vencido e não pago pela mutuária, ficando, então, o apuramento da exigibilidade dos demais valores reclamados apenas dependente de simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas do contrato. De facto, tendo os executados/embargantes impugnado o valor da quantia exequenda e da mesma não ressaltando, por si só, do contrato de abertura de crédito, hipoteca e fiança e documento complementar, incumbia à exequente/embargada, na resposta ao convite dirigido pelo Tribunal e a fim de sustentar os valores que aí discriminou, proceder à junção do extracto de conta do empréstimo e de todos os documentos de débito emitidos a respeito do contrato em causa, cuja exigência probatória a mesma reconheceu ao incluir no texto do contrato a cláusula 17ª. nesse exacto sentido.”</font></i>
</p><p><font>J) Sendo que o Acórdão recorrido, o qual revogou assim a decisão da 1ª. instância, contraria não só o que por si foi anteriormente decidido e que transitou em julgado – em violação do art. 625.º, do CPC – como vai contra a maioria da Jurisprudência, nos termos dos acórdãos referidos no corpo alegatório acima descrito, designadamente a doutrina plasmada no Acórdão 10/04/2018, tirado no Proc. n.º18853/12.8YYLSB-A.L1.S2, em que foi Relator o Conselheiro Pinto de Almeida, disponível em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u><font> </font></a>
</p><p><font>K) Se a configuração do título executivo como pressuposto processual não deixa dúvidas, sem embargo da sua articulação com o direito exequendo, quanto à certeza, à exigibilidade e à liquidez da prestação estamos diante condições qualificadas da acção executiva, constituindo mesmo requisitos autónomos da acção executiva quando não resultem propriamente do título executivo.</font>
</p><p><font>L) </font><i><font>In casu, </font></i><font>inexiste título suficiente para a execução; a obrigação exequenda não se apresenta certa, líquida ou exigível.</font>
</p><p><font>M) A exequente não alegou factualidade essencial de que depende a acção, designadamente datas de vencimento das obrigações, da mora ou incumprimento contratual, conforme anteriormente expresso nos Embargos deduzidos. A exequente não cumpriu convenientemente com o despacho-convite que lhe foi endereçado e o Acórdão recorrido posterga o que por si, anteriormente, ficara decidido.</font>
</p><p><font>N) Com este enquadramento, entendemos que o Tribunal </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>quo</font></i><font> violou e errou no que respeita à aplicação da lei de processo, para efeitos do que dispõe o art. 674.º, n.º 1, alínea b), do C.P.C.</font>
</p><p><font>O) A decisão recorrida não logrou a melhor subsunção fáctico-jurídica às normas dos artigos 703.º, n.º 1, alínea b), 707.º, 713.º, 716.º, n.º 1, 724.º, n.º 1, alíneas e), f) e h)., 726.º, n.º 5, 625.º, do CPC.</font>
</p><p><font>P) Ademais, não se alcança qualquer fundamento quanto ao valor pelo qual foi determinada o a execução imediata, ou seja € 185.000,00.</font>
</p><p><font>Q) Não ressalta o mesmo do título oferecido à execução, nem tampouco se extrai de qualquer documento mandado juntar e que inexiste nos autos.</font>
</p><p><font>R) Não apenas impugnaram os Embargantes, na oposição à execução, o valor da quantia exequenda (v.g. artigo 38), como deflui dos autos que um manancial de prestações havia sido pago.</font>
</p><p><font>S) Não podemos deixar de concordar com o Juízo de Execução do Entroncamento quando fundamenta que: </font><i><font>“(…)</font></i><font> </font><i><font>considerando</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>posterior</font></i><font> </font><i><font>discriminação</font></i><font> </font><i><font>feita</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>exequente/embargada</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>prestações</font></i><font> </font><i><font>vencidas</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>pagas</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>sociedade</font></i><font> </font><i><font>executada</font></i><font> </font><i><font>(prestações</font></i><font> </font><i><font>14,</font></i><font> </font><i><font>15,</font></i><font> </font><i><font>16,</font></i><font> </font><i><font>17,</font></i><font> </font><i><font>19,</font></i><font> </font><i><font>20</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>21),</font></i><font> </font><i><font>resulta</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>outras</font></i><font> </font><i><font>terão</font></i><font> </font><i><font>sido</font></i><font> </font><i><font>pagas.</font></i><font> </font><i><font>Ora,</font></i><font> </font><i><font>incumbia</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>exequente,</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>efeito</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>constituição</font></i><font> </font><i><font>válida,</font></i><font> </font><i><font>completa</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>título</font></i><font> </font><i><font>(complexo)</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>funda</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>execução,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>junção</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>extracto</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>conta</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>sociedade</font></i><font> </font><i><font>executada,</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>onde</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>pudessem</font></i><font> </font><i><font>extrair</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>movimentos</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>débito,</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>indicação</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>valores</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>datas</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>prestações</font></i><font> </font><i><font>acordadas,</font></i><font> </font><i><font>vencidas</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>pagas,</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>movimentos</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>crédito,</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>indicação</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>valores</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>datas</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>prestações</font></i><font> </font><i><font>acordadas,</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>forma</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>extrair-se</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>valor</font></i><font> </font><i><font>vencido</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>pago</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>mutuária,</font></i><font> </font><i><font>ficando,</font></i><font> </font><i><font>então,</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>apuramento</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>exigibilidade</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>demais</font></i><font> </font><i><font>valores</font></i><font> </font><i><font>reclamados</font></i><font> </font><i><font>apenas</font></i><font> </font><i><font>dependente</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>simples</font></i><font> </font><i><font>cálculo</font></i><font> </font><i><font>aritmético</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>acordo</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>cláusulas</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>contrato</font></i><font> </font><i><font>(…)”.</font></i>
</p><p><font>T) Neste prisma, o Acórdão recorrido viola a lei substantiva, aqui para efeitos do art. 674.º, n.º 1, alínea a), do CPC. Designadamente, por desaplicação da norma que respeita ao cumprimento das obrigações, estatuída no princípio geral vertido no n.º 1 do art.762.º, do Código Civil, a qual giza que “o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado”.</font>
</p><p><font>U) Fundamentos estes que devem suprimir da ordem jurídica o Acórdão recorrido, atenta a violação das mais básicas garantias e princípios gerais de Direito Executivo.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Nestes</font></b><font> </font><b><font>termos,</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>nos</font></b><font> </font><b><font>melhores</font></b><font> </font><b><font>de</font></b><font> </font><b><font>Direito,</font></b><font> </font><b><font>que</font></b><font> </font><b><font>V. Exas.</font></b><font> </font><b><font>doutamente</font></b><font> </font><b><font>suprirão,</font></b><font> </font><b><font>deve</font></b><font> </font><b><font>o</font></b><font> </font><b><font>Acórdão</font></b><font> </font><b><font>recorrido</font></b><font> </font><b><font>ser</font></b><font> </font><b><font>revogado</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>substituído</font></b><font> </font><b><font>por</font></b><font> </font><b><font>outro</font></b><font> </font><b><font>que,</font></b><font> </font><b><font>como</font></b><font> </font><b><font>fez</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>1ª</font></b><font> </font><b><font>instância,</font></b><font> </font><b><font>determine</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>inexequibilidade</font></b><font> </font><b><font>do</font></b><font> </font><b><font>título</font></b><font> </font><b><font>executivo</font></b><font> </font><b><font>e,</font></b><font> </font><b><font>bem</font></b><font> </font><b><font>assim,</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>extinção</font></b><font> </font><b><font>da</font></b><font> </font><b><font>acção</font></b><font> </font><b><font>executiva,</font></b><font> </font><b><font>com</font></b><font> </font><b><font>legais</font></b><font> </font><b><font>consequências.</font></b><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Fazendo-se</font></b><font> </font><b><font>a</font></b><font> </font><b><font>acostumada</font></b><font> </font><b><font>Justiça!».</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7. </font></b><font>A recorrida, Caixa Geral dos Depósitos, apresentou contra-alegações, que aqui se consideram transcritas, em que pugna pela manutenção do decidido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>8. </font></b><font>Sabido que</font><b><font> </font></b><font>o objeto do recurso se delimita pelas conclusões, a única questão a decidir é a de saber se o título dado à execução certifica com suficiência a obrigação exequenda.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b>
</p><p><b><font>A – Os factos</font></b>
</p><p><font>As instâncias julgaram provados os seguintes factos:</font>
</p><p><font>«1. "CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A." requereu execução para pagamento da quantia de € 339.066,99 contra "Quinta do Solar - Sociedade Imobiliária, Lda.", AA, BB, CC, DD, EE e FF. </font>
</p><p><font>2. No requerimento executivo, a quantia exequenda mostra-se liquidada da seguinte forma: Capital: € 218.119,66; Juros de 20/03/2012 a 21/04/2016: € 120.507,33; Comissões: € 440,00; Soma: € 339.066,99. </font>
</p><p><font>3. Para o efeito, apresentou como título executivo o contrato de "Abertura de Crédito Com Hipoteca e Fiança" celebrado com os executados por escritura pública no dia 29/11/2006, com referência interna PT ……..91, na qual, entre o mais, e com relevo consta o seguinte: «( ... ) pelo presente instrumento, a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A." concede a QUINTA DO SOLAR - SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, LDA. (adiante designada parte devedora) um empréstimo sob a forma de abertura de crédito até ao montante de UM MILHÃO OITOCENTOS E CINQUENTA MIL EUROS, importância de que esta se confessa desde já devedora. Tal empréstimo reger-se-á pelo estipulado no presente instrumento como pelas cláusulas constantes de um documento complementar elaborado nos termos do número dois do artigo sessenta e quatro do Código do Notariado. ( ... ) Mais disseram os segundos outorgantes que se constituem eles próprios e às respetivas mulheres como fiadores solidários e principais pagadores por tudo quanto venha a ser devido à Caixa no âmbito do contrato de empréstimo aqui titulado, quer a título de capital, quer de juros, remuneratórios ou moratórios, comissões, despesas ou quaisquer outros encargos, dando, desde já, o seu acordo a prorrogações do prazo e a moratórias que venham a ser convencionadas entre a Caixa e a parte devedora e renunciando ao benefício do prazo previsto no artigo setecentos e oitenta e dois do Código Civil e ao exercício das excepções previstas no artigo seiscentos e quarenta e dois do mesmo Código. ( ... )». </font>
</p><p><font>4. No documento complementar referido na escritura consta, entre o mais, e com relevo, o seguinte: «( ... ) </font>
</p><p><font>Cláusula 2.ª (Prazos) ----- O presente contrato obedecerá aos seguintes prazos: </font>
</p><p><font>a) Prazo de utilização (prazo durante o qual os fundos são colocados à disposição da parte devedora, vencendo-se juros e outros encargos): quarenta e oito meses, a contar desta data. </font>
</p><p><font>b) Prazo de amortização (período em que haverá lugar à cobrança de prestações de capital e de juros e outros encargos): doze meses, a contar do termo do prazo de utilização. </font>
</p><p><font>c) Prazo global: sessenta meses a contar desta data.</font>
</p><p><font>Cláusula 3.ª (Utilização de fundos) ----- </font>
</p><p><font>1. </font>
</p><p><font>a) Nesta data foi entregue à parte devedora a quantia de cento e oitenta e cinco mil euros, através de crédito lançado na conta de depósito a ordem adiante indicada para o serviço da operação.</font>
</p><p><font>b) A restante parte do capital emprestado, no valor de um milhão seiscentos e sessenta e cinco mil euros, será também entregue por crédito na referida conta de depósito a ordem, por uma ou mais vezes, na sequência de vistorias a efetuar por parte da CAIXA e em função do grau de realização do investimento financiado, apurado em tais vistorias e segundo o critério da mesma CAIXA. </font>
</p><p><font>c) Todavia, a importância correspondente aos últimos cinco por cento da quantia emprestada não será entregue sem que a parte devedora faca prova de haver sido feito o averbamento da construção no registo. </font>
</p><p><font>2. Outra condição necessária para a utilização dos fundos: Estar assegurado o pagamento do imposto selo correspondente. (...) </font>
</p><p><font>Cláusula 6.ª (Pagamento dos juros e do capital) ----- </font>
</p><p><font>1. Antes do prazo de amortização, os juros serão calculados dia a dia sobre o capital em cada momento em dívida e liquidados e pagos, postecipada e sucessivamente, no termo de cada período de contagem de juros. Durante o prazo de amortização, os juros, calculados e liquidados nos mesmos termos, serão pagos em conjunto com as prestações adiante referidas. </font>
</p><p><font>2. Entende-se, para efeitos deste contrato, por período de contagem de juros o trimestre, iniciando-se o primeiro período na data deste contrato. </font>
</p><p><font>3. O capital será reembolsado em prestações trimestrais, sucessivas e iguais, vencendo-se a primeira no trimestre seguinte ao do final do prazo de utilização no dia correspondente ao da realização deste contrato e as restantes em igual dia dos trimestres seguintes. ( ... ) </font>
</p><p><font>Cláusula 11.ª (Capitalização de juros) ----- </font>
</p><p><font>A CAIXA terá a faculdade de, a todo o tempo, capitalizar juros remuneratórios correspondentes a um período não inferior a três meses e juros moratórios correspondentes a um período não inferior a um ano, adicionando tais juros ao capital em dívida e passando aqueles a seguir todo o regime deste. (...) </font>
</p><p><font>Cláusula 17ª (Meios de prova) ----- </font>
</p><p><font>1. Fica convencionado que o extrato de conta do empréstimo e, bem assim, todos os documentos de débito emitidos pela CAIXA relacionados com o presente contrato, serão havidos para todos os efeitos legais e, designadamente, para efeitos do disposto no artigo cinquenta do Código de Processo Civil, como documentos suficientes para prova e determinação dos montantes em dívida, tendo em vista a exigência, a justificação ou a reclamação judicial dos créditos que deles resultarem em qualquer processo. </font>
</p><p><font>2. As partes acordam, ainda, que o registo informático ou a sua reprodução em qualquer suporte constituem meio de prova das operações ou movimentos efetuados (...)». </font>
</p><p><font>5. Por escritos remetidos pela CAIXA aos executados, datados de 2012/02/04, sob o assunto: "Situação de incumprimento" Empréstimo n." PT ……93; PT …….91; PT ……...93; PT ……91, com relevo, consta o seguinte: </font><i><font>«(...) Informamos que os processos relativos às responsabilidades em assunto, face aos atrasos verificados, foram afetos à Direção de Recuperação de Crédito. (...) Caso não se mostre liquidada a situação de atraso a breve prazo e não se perspetive uma solução com vista à sua total regularização, ver-nos-emos forçados ao envio dos processos para cobrança coerciva. ( ... )». </font></i>
</p><p><font>6. Por escritos remetidos pela Direção de Recuperação de Crédito aos executados, datados de 2013/01/21, sob o assunto: "Cobrança de Créditos por Via Judicial" Empréstimo n." PT …….93 - Dívida 1.256,17 euros, em 21-01¬2013; PT …….91 - Dívida 194.323,29 euros, em 21-02-2013; PT ……93 Dívida 1.347,19 euros, em 21-01-2013; PT …….91 - Dívida 249.939,58 euros, em 21-01-2013, com relevo, consta o seguinte</font><i><font>: «( ... ) Atendendo a que todas as ações anteriormente desenvolvidas, no sentido de se recuperar a dívida extra judicialmente se mostraram infrutíferas, informamos V. Ex.ªs de que a Caixa Geral de Depósitos irá proceder à cobrança, através de ação judicial, das importâncias que lhe são devidas ( ... )».</font></i><font> </font>
</p><p><font>7. Por escrito datado de 01/02/2013, a sociedade executada remeteu missiva à CAIXA, na qual constam os seguintes dizeres: </font><i><font>«(...) Em resposta à vossa carta de 21/01/2013, vimos pela presente lamentar a nossa incapacidade para fazer face aos pagamentos que exigem. Em alternativa, vimos propor a V. Exªs que possam aceitar ativos desta sociedade que se encontram hipotecados à Caixa Geral de Depósitos, como forma de cumprir com as exigências e valores em causa. ( ... )».</font></i><font> </font>
</p><p><font>8. Por escrito datado de 2013/02/05, a CAIXA remeteu escrito à sociedade executada sob o assunto: "V/Carta de 01-02-2013 Dação em Pagamento", na qual consta o seguinte: </font><i><font>«(...) No seguimento da nossa reunião de 16-11-2012, bem como do teor da nº/carta c/ Ref. …../8, de 21-01-2013, informamos V. Ex.as que a Caixa não aceita a dação em pagamento dos bens hipotecados à CGD, pelo que reiteramos o teor da carta acima referida. ( ... )».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>B – O Direito</font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> Importa determinar, no caso vertente, se o contrato de abertura de crédito e o documento complementar junto ao requerimento executivo permitem afirmar que estamos perante um título executivo.</font><br>
</p><p><font>A CGD deu à execução um contrato de </font><i><font>abertura de crédito com hipoteca e fiança,</font></i><font> exarado em 29/11/2006, pelo seu notariado privativo (artigo 3º, nº 1, al. </font><i><font>b)</font></i><font> do Código do Notariado aprovado pelo Dec.-Lei nº 207/95, de 14 de agosto) e documento complementar, nos termos da qual </font><i><font>concedeu um empréstimo à embargante Quinta do Solar sob a forma de abertura de crédito até ao montante de € 1.850.000,00, importância de que esta se confessou devedora, </font></i><font>de cujo pagamento os agora recorrentes, pessoas singulares, se constituíram </font><i><font>fiadores solidários e principais pagadores, </font></i><font>com </font><i><font>juros indexados à taxa correspondente à Euribor a três meses, acrescida de um “spread” de 1,625%, ao ano</font></i><font>, com o </font><i><font>prazo de utilização de quarenta e oito meses</font></i><font> a contar de 29/11/2006, durante o qual os fundos colocados à disposição do devedor venciam juros e outros encargos e com um </font><i><font>prazo de amortização de doze meses</font></i><font> a contar do prazo de utilização, durante o qual haveria lugar à cobrança de prestações de capital e juros e outros encargos, </font><i><font>entregando à parte devedora, na data do contrato, através de crédito lançado na conta de depósitos à ordem a quantia de € 185.000,00</font></i><font> e clausulando, em caso de mora, </font><i><font>juros calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificar a mora, estiver em vigor na Caixa para operações ativas da mesma natureza (…) acrescida de uma sobretaxa até quatro por cento ao ano e a título de cláusula penal</font></i><font> (pontos 3 e 4 dos factos provados e cláusulas 4ª e 13ª do documento complementar) e, fundada no incumprimento das “</font><i><font>amortizações”, </font></i><font>liquidou assim a quantia exequenda: “</font><i><font>Capital: € 218.119,66; Juros de 20/3/2012 a 21/4/2016: € 120.507,33; Comissões: € 440,00; Soma: 339.066,99; a partir de 21/4/2016 exclusive, a dívida será agravada diariamente de € 68,65, encargo correspondente a juros calculados à taxa de 11,316%.”</font></i><font> </font>
</p><p><font>A Caixa, convidada para proceder ao aperfeiçoamento do título, sem juntar aos autos qualquer documento adicional, veio justificar o pedido executivo, argumentando, que, para além da quantia de € 185.000,00, não entregou à mutuária qualquer outra quantia em capital e que de acordo com a cláusula 11ª do documento complementar procedeu à capitalização das prestações vencidas nºs 14 (junho/2010), 15 (setembro/2010), 16 (dezembro/2010), 17 (março/2011), 19 (20/6/2011), 20 (20/9/2011) e 21 (20/12/2011), no valor global de € 33.119,66, o qual adicionado à quantia de € 185.000,00 perfaz a quantia de € 218.119,66 peticionada a título de capital no requerimento executivo.</font>
</p><p><font>O tribunal de 1.ª instância, depois de considerar insuficientes os elementos </font><i><font>“trazidos aos autos para configurar a quantia em dívida de € 339.066,99 imediatamente exigível através da ação executiva”</font></i><font>, decidiu não </font><i><font>“estarem reunidos todos os requisitos do título compósito dado à execução”,</font></i><font> concluindo pela inexequibilidade do título, determinando, em consequência, a extinção da execução, com os seguintes fundamentos:</font>
</p><p><i><font>«Destarte, se é certo que na escritura pública fez-se constar a cedência, desde logo, pela exequente à sociedade executada do capital de € 185.000,00, considerando a posterior discriminação feita pela exequente/embargada das prestações vencidas e não pagas pela sociedade executada (prestações 14, 15, 16, 17, 19, 20 e 21), resulta que outras terão sido pagas. Ora, incumbia à exequente, para efeito de constituição válida, completa do título (complexo) em que se funda a execução, a junção do extracto da conta da sociedade executada, de onde se pudessem extrair os movimentos a débito, com indicação dos valores e datas das prestações acordadas, vencidas e não pagas, e os movimentos a crédito, com indicação dos valores e datas das prestações acordadas, vencidas e pagas, por forma a extrair-se o valor vencido e não pago pela mutuária, ficando, então, o apuramento da exigibilidade dos demais valores reclamados apenas dependente de simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas do contrato».</font></i>
</p><p><font>Já o acórdão recorrido, em sentido diverso, entendeu que o presente contrato de abertura de crédito acompanhado do documento complementar, que certifica a entrega pela CGD da quantia de € 185.000,00, através de crédito lançado na conta de depósito a ordem da embargante Quinta do Solar, constitui título executivo suficiente, em relação à quantia que foi efetivamente entregue à devedora, Quinta do Solar, com os seguintes fundamentos:</font>
</p><p><i><font>«(…) a Apelante obrigou-se, é certo, a colocar à disposição da Apelada Quinta do Solar a quantia de € 1.850.000,00 sob a forma de abertura de crédito (ponto 3 dos factos provados) mas entregou-lhe, na data do contrato, a quantia de € 185.000,00 (ponto 4 dos factos provados) e a pretensão executiva reporta-se a esta quantia entregue à Ape | [0 0 0 ... 0 0 0] |
PTJuu4YBgYBz1XKvPweg | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font> </font><b><font>Processo n.º 3072/ 20.8T8SNT.L1.S1 </font></b>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><b><font>I - Relatório</font></b>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> INSTITUTO LUSO-ILÍRIO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO requereu contra o MUNICÍPIO DE MAFRA a </font><b><font>ratificação judicial do Embargo Extrajudicial de Obra Nova </font></b><font>realizado directamente pelo Requerente, na manhã do dia 12.02.2020, tendo por objecto a obra levada a cabo pelo Requerido e consubstanciada na construção de uma estrada que, a realizar-se, desintegraria irremediavelmente os espaços contratualmente cedidos pelo município requerido ao ora requerente, no âmbito de um contrato de comodato celebrado entre as partes em 29.03.2011 (nos termos do qual o município ora requerido cedeu ao ora requerente, a título gratuito, por um período de trinta anos automaticamente renovável, o palácio dos Marqueses de Ponte de Lima e a sua zona imediatamente envolvente, sito na Rua do Castelo, Vila Velha de Mafra).</font>
</p><p><font>Alegou - para tanto - que a aludida </font><b><font>obra </font></b><font>já iniciada pelo Município requerido invade e destrói parcelas da área comodatada à requerente, violando assim os direitos de gozo conferidos à requerente pelo aludido contrato de comodato, visto incidir sobre espaços contratualmente comodatados à requerente e até sobre construções já edificadas por este.</font>
</p><p><font>O Município requerido deduziu </font><b><font>Oposição, </font></b><font>invocando, entre outras, a excepção de </font><b><font>incompetência material dos Tribunais Judiciais, </font></b><font>uma vez que a obra embargada se reporta a uma </font><b><font>obra pública, </font></b><font>em particular, a construção de uma Estrada municipal que liga a Rua do Castelo e a Rua do Malvar, ambas no concelho de Mafra, pertencendo assim a competência para dirimir o presente litígio aos </font><b><font>Tribunais Administrativos e Fiscais, </font></b><font>nos termos e para os efeitos do exposto no art. 4.° n.° 1 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.</font>
</p><p><font>Notificado para se pronunciar quanto à aludida </font><b><font>excepção dilatória de incompetência material dos Tribunais Judiciais, </font></b><font>veio o Requerente pugnar pelo seu indeferimento uma vez que, na sua opinião, o Embargo de Obra Nova em causa nos autos tem como objectivo impedir a prossecução de uma obra da Câmara Municipal de Mafra, cuja execução viola, irremediavelmente, o direito de gozo adquirido pelo Requerente com a celebração do mencionado Contrato de Comodato junto aos autos.</font>
</p><p><font>Findos os articulados, o Tribunal proferiu </font><u><font>Decisão</font></u><font> (datada de 27.03.2020), </font><u><font>com o seguinte teor decisório:</font></u>
</p><p><font>«Pelo que, nada mais resta a este Tribunal senão deferir a excepção de incompetência material dos Tribunais Judiciais absolvendo como tal o Requerido da presente instância, tudo nos termos e para os efeitos do exposto no art. 96.g al. a), 97° n.º 1, 99.g todos do Código de Processo Civil».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2. Inconformado </font></b><font>com o assim decidido, o Requerente </font><b><font>interpôs recurso </font></b><font>da referida Decisão — que foi recebido como de Apelação, com subida imediata e nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, decidido o seguinte:</font>
</p><p><font>«Acordam os juízes desta Relação em </font><b><font>confirmar a Decisão Sumária do relator </font></b><font>que </font><b><i><font>concedeu provimento à Apelação, </font></i></b><i><font>revogando a decisão recorrida e determinando o prosseguimento dos autos, </font></i><font>no Tribunal "a quo", </font><u><font>indeferindo assim a Reclamação contra ela deduzida pelo Município de Mafra ora Apelado.»</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>3. Inconformado com a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, veio o </font><b><font>Município de Mafra</font></b><font> interpor recurso de revista, no qual formulou as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«Da nulidade do acórdão recorrido:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A. Vem o presente recurso interposto do douto acórdão da conferência do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa que, confirmando a decisão sumária do relator, concedeu provimento ao recurso de apelação apresentado pelo aqui Recorrido INSTITUTO LUSO-ILÍRIO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO da douta sentença de fls. (...), dos autos, datada de 27/03/2020 e proferida pela primeira instância.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>B. Por via da sentença então recorrida o tribunal de primeira instância julgou-se incompetente em razão da matéria para conhecer do objeto do procedimento cautelar de embargo de obra nova intentado pelo Recorrido tendo, por conseguinte, absolvido o aqui Recorrente MUNICÍPIO DE MAFRA da instância cautelar.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>C. Inconformado com o ali decidido, o Recorrido dela interpôs recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, que, por decisão sumária, revogou a sentença e determinou o prosseguimento dos autos, sendo o acórdão daquele Venerando Tribunal que agora se coloca em crise.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>D. O Venerando Tribunal da Relação, ao contrário da primeira instância, entendeu que a relação jurídica carreada para os autos pelo Recorrido é de cariz privado, consistente na ofensa do direito de gozo emergente para o Recorrido dum contrato de comodato celebrado com o Recorrente e regido por normas de direito privado – Cfr. Acórdão recorrido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>E. Por conseguinte, entendeu que compete aos tribunais da jurisdição comum – e não aos tribunais administrativos – conhecer da providência cautelar de embargo de obra nova apresentada pelo Recorrido contra o Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>F. O Recorrente leva a cabo a construção de uma Estrada Municipal que liga a Rua do Castelo e a Rua do Malvar, ambas no concelho de Mafra, no prédio confinante com aquele onde se encontra o dito Palácio dos Marqueses de Ponte de Lima.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>G. Isto porque, a Rua do Malvar não apresenta quaisquer condições de segurança para os peões e para os veículos que nela circulam, dado que em alguns pontos da dita rua, designadamente junto ao Palácio, não é possível a circulação de dois veículos em simultâneo e não existem passeios pedonais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>H. Sendo esta a obra que o Recorrido pretende ver embargada por via da providência cautelar que apresentou.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>I. Atendendo ao alegado em sede de requerimento inicial e ao peticionado, verifica-se que a verdadeira pretensão do Recorrido é a paragem da construção da estrada municipal levada a cabo pelo Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>J. O único pedido formulado pelo Recorrido resume-se ao embargo da construção da dita estrada, não tendo sido feito qualquer outro pedido para além do embargo da obra pública.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>K. Nomeadamente, o Recorrido não pediu a restituição provisória da posse, tendo nas suas conclusões do recurso que dirigiu ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa afirmado: “(...) que não é sobre a restituição provisória da posse que nos debruçamos, mas sim sobre a necessidade de parar uma obra (...)” – Cfr. conclusão I) das alegações de recurso do Recorrido dirigidas ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>L. Assim, o Recorrido não faz depender a providência de qualquer outra ação, em particular a restituição provisória da posse que, na verdade, nunca peticionou ao tribunal e que, segundo o próprio, não está em discussão nos autos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>M. Com o pedido de inversão do contencioso, entendeu o Recorrido que a sua pretensão ficava plenamente satisfeita, ou seja, que se bastava com a paragem da obra.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>N. Não resulta nem da causa de pedir, nem dos pedidos formulados que o que está em discussão nos autos é a violação do direito pessoal de gozo do Recorrido, com o consequente pedido de restituição da posse.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O. O Venerando Tribunal da Relação ao tirar por conclusão que o que está em discussão nos autos é a violação do direito pessoal de gozo do Recorrido, com o consequente pedido de restituição da posse a formular em ação principal, está a alterar a causa de pedir e os pedidos formulados pelo Recorrido, o que implica a convolação para uma relação jurídica diversa da controvertida.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>P. Deste modo, o Venerando Tribunal da Relação comete uma nulidade, o que convoca a nulidade do acórdão recorrido (cfr. artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e e), do C.P.C.), que aqui vai expressamente invocada para todos os efeitos e com as legais consequências.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Q. O acórdão recorrido padece, igualmente, de nulidade, uma vez que alteração da causa de pedir e dos pedidos implica a convolação para uma relação jurídica diversa da controvertida. (cfr. artigo 265.º, n.º 6, do C.P.C.), nulidade que que aqui vai expressamente invocada para todos os efeitos e com as legais consequências.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>R. Além disso, o acórdão recorrido viola os princípios do dispositivo (cfr. artigo 5.º, n.º 1 do C.P.C.), do contraditório e da igualdade das partes (crf. Artigos 3.º e 4.º do C.P.C.) da estabilidade da instância (cfr. artigo 260.º do C.P.C.), sendo, por via disso, ilegal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Sem prescindir,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Do erro de julgamento:</font>
</p><p><font>S. A relação jurídica em discussão nos autos e tal como configurada e carreada pelo Recorrido não tem natureza privada, mas sim administrativa.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>T. Com o devido respeito, faz-se confusão entre a relação jurídica emergente do contrato de comodato – e esta não está em discussão nos autos - e aquela que emerge na sequência da construção da obra pública.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>U. Nos presentes autos cautelares, com inversão do contencioso, o Recorrido não pretende discutir o conteúdo e o alcance das obrigações decorrentes do contrato de comodado, nem tampouco a eventual violação das obrigações assumidas pelas partes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>V. O cerne da que estão nos presentes autos é outro: a obra pública executada pelo Recorrente e que o Recorrido pretende ver embargada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>W. E, não é pelo facto de entre o Recorrente e o Recorrido ter sido celebrado um contrato de comodato de um determinado bem imóvel que tanto a construção da estrada municipal, como a relação jurídica estabelecida passam a ter natureza privada e, por via disso, analisada à luz das normas jurídicas de matriz essencialmente civilística.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>X. Muito menos pelo facto de nesse contrato terem as partes atribuído competência aos tribunais comuns para dirimir litígios decorrentes do mesmo, que apenas vale quando o contrato é objeto da ação, que não é o caso dos autos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Y. Os pedidos formulados e a causa de pedir que foi carreada para os autos, tal como configurada, emergem de uma relação de natureza administrativa e não privada, correspondendo tal obra ao exercício de um poder público administrativo pelo Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Z. Estando em presença uma obra que consiste na construção de uma Estrada Municipal levada a cabo por uma entidade pública no exercício de um poder público, e tendo em conta o pedido formulado pelo Recorrido, dúvidas não subsistem de que estamos perante uma relação jurídica de natureza administrativa que deve ser apreciada e analisada à luz das regras do direito administrativo.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>AA. O Venerando Tribunal da Relação não podia ter concluído, como concluiu, que a relação jurídica em presença nos autos é de natureza privada, consistente na ofensa do direito de gozo emergente dum contrato celebrado com o Recorrido e regido por normas de direito privado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>BB. O Venerando Tribunal da Relação ao enquadrar a relação jurídica carreada para os autos pelo Recorrido com uma relação jurídica de cariz privado erra no enquadramento jurídico dos factos constantes do requerimento inicial de embargo de obra nova e, por conseguinte, na competência material dos tribunais comuns para julgar a presente instância cautelar.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>CC. Acresce que o litígio na ação principal terá, eventualmente, por objeto “a responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito público”, e sendo o Recorrente uma pessoa coletiva de direito público isso implica o julgamento da eventual ilicitude de uma atividade de gestão pública, na satisfação de interesses públicos e coletivos, enquadrada por normas de direito público, emergente de relações jurídicas de cariz administrativo, e nesta medida encontra-se abrangido pela alínea f), do n.º 1, do artigo 4º, do E.T.A.F.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>DD. Pelo que sempre seriam os tribunais administrativos os materialmente competentes para conhecer da providência cautelar de embargo de obra nova apresentada pelo Recorrido contra o Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>EE. Ao atribuir competência material aos tribunais comuns para conhecer da presente providência cautelar de embargo de obra nova apresentada pelo Recorrido contra o Recorrente, o acórdão recorrido viola o disposto nos artigos 399.º do Código de Processo Civil, 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, 2.º, n.º 2, alínea q) e artigo 112.º, n.º 2, alínea g), ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, 1.º e 4.º, n.º 1, alíneas a) e f), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>FF. Sem prescindir e uma vez que a obra pública levada a cabo pelo Recorrente e em discussão nos autos mostra-se concluída e tendo em conta a verdadeira pretensão do Recorrido: paragem da construção da estrada municipal levada a cabo pelo Recorrente, a presente instância cautelar mostra-se inútil.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>GG. Pelo que deverá ser declarada extinta, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do C.P.C. absolvendo-se o Recorrente dos pedidos contra ele formulados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Nestes termos e nos demais de direito, que Vexas. doutamente suprirão, o que se impetra, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, por conseguinte, o douto acórdão recorrido ser revogado e julgada procedente a exceção da incompetência material do Tribunal Comum para conhecer da presente providência cautelar de embargo de obra nova, tudo com as legais consequências.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Caso assim não se entenda, sem prescindir, ser declarada extinta instância cautelar, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do C.P.C., absolvendo-se o Recorrente dos pedidos contra ele formulados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>fazendo-se, desta forma, a acostumada Justiça!»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>4.</font></b><font> O recorrido, Instituto Luso-Ilírio para o desenvolvimento humano, apresentou as seguintes contra-alegações:</font>
</p><p><font>«A. Não se conformando com o teor da decisão tomada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, veio a CMM apresentar recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, onde reitera que a obra embargada é pública e a relação jurídica subjacente é por isso administrativa, mais aproveitando o presente recurso para, inadvertida e inusitadamente, suscitar a inutilidade superveniente da lide, juntando, alegadamente como prova, um documento de 19.03.2020, anterior à sentença proferida em 1.ª instância (!).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>B. Alegou-se, por isso e desde logo, que tal pedido, de inutilidade superveniente da lide é em toda a sua extensão e contornos, factualmente inusitado e legalmente inadmissível.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>C. Factualmente inusitado, porque se junta para pretensamente fazer prova do alegado um documento que, não só não prova o alegado, como é de uma data anterior à própria sentença de 1.ª instância, proferida nestes autos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>D. E legalmente inadmissível, pois que para decidir sobre tal pedido, sempre seria necessário ajuizar sobre matéria de facto.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>E. Ora, o Supremo Tribunal de Justiça não conhece sobre o eventual erro na fixação da prova e dos factos materiais em causa e, muito menos, sobre factos não supervenientes, sequer, à decisão proferida em 1.ª instância, embora nunca antes apresentados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>F. E pela mesma razão, não deverá o documento junto ser admitido, por carecer, para além de tudo mais, de novidade que justificasse a sua admissibilidade nesta sede.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>G. Razão pela qual se concluiu que sobre o pedido de inutilidade superveniente da lide deverá o recurso ser rejeitado, por legalmente inadmissível, bem como desentranhado o documento com o qual o Recorrente pretendia fazer provado alegado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>H. No requerimento de ratificação do Embargo Extrajudicial, o Recorrido deixou bem claro qual era o núcleo central da matéria em discussão nos autos: a violação do direito pessoal de gozo sobre o Palácio e jardim circundante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>I. Tudo quanto importava ao agora Recorrido era acautelar o seu direito pessoal de gozo sobre uma área que os trabalhos levados a cabo pela ora Recorrente, ostensivamente, violavam.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>J. E foi precisamente isso que entendeu e decidiu o Acórdão recorrido:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>“Deste modo, são os tribunais comuns– e não os administrativos– os competentes para conhecer duma providência cautelar de ratificação de embargo extrajudicial</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>de obra nova […]”</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>K. Sem prejuízo, o Recorrente apresentou o presente Recurso de Revista, insistindo que a relação jurídica subjacente era pública, porque se pretenda embargar uma obra pública.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>L. Alegou, por isso, o Recorrido, que nunca esteve em causa, nem havia como estar, a natureza de entidade pública da Câmara Municipal de Mafra.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>M. Tudo quanto releva e importa ao Recorrido é a circunstância de que, esta obra, nos termos em que continua a ser realizada pela Recorrente, viola o direito de gozo sobre a área comodatada e, só nessa medida, pretende o seu embargo.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>N. Concluindo-se, sobre esta matéria, que deve improceder a insistência da Recorrente na ideia de que sendo uma obra pública a relação jurídica subjacente é pública e que a discussão nos autos nada teria que ver com o Contrato de Comodato.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O. Conforme bem explica o Acórdão recorrido, bem como inúmeras outras decisões de tribunais superiores, designadamente Tribunal de Conflitos e Supremo Tribunal de Justiça, tal argumentação não procede.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>P. A avaliação do caso presente não tem subjacente qualquer relação jurídico- administrativa, mas simplesmente uma relação jurídico-privada, regulada pelo direito privado, fundada no Contrato de Comodato.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Q. Relação jurídica de direito privado, que fica bem assente, desde logo, no próprio clausulado do Contrato de Comodato celebrado entre as partes, muito particularmente na cláusula compromissória que estabelece o Tribunal da Comarca de Mafra (hoje Comarca de Lisboa Oeste) como o Tribunal eleito pelas Partes em caso de conflito.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>R. Alegou-se, em síntese, e conforme já detalhadamente alegado no âmbito deste processo, que o Contrato de Comodato é a relação jurídica que subjaz ao direito violado pela obra, uma relação jurídica de direito privado, regulada pelo direito privado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>S. Pois que, mais se sustentou, a relação jurídica em causa nos autos não emerge da construção de uma estrada municipal, mas sim do Contrato de Comodato, que atribuiu um direito pessoal ao Recorrido e só nessa medida este pretende ver embargada a obra.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>T. Pelo que se concluiu, neste particular, que não é a Obra Pública o objeto do Embargo, mas sim os trabalhos realizados, aparentemente necessários à realização de tal obra, na área objeto do comodato, por colidirem, invadirem e violarem, o direito pessoal de gozo do ora Recorrido decorrente do contrato de comodato.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>U. Por outro lado, e tendo por base a mesma linha argumentativa, é igualmente incompreensível a alegação do Recorrente de que o Acórdão recorrido alterou a causa de pedir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>V. Razão pela qual se recordou nesta sede o que foi sempre pedido (e alegado) pelo Recorrido ao longo do processo, designadamente e sobretudo, no âmbito do requerimento inicial e na resposta à exceção de incompetência material.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>W. Não resulta do Acórdão recorrido qualquer alteração da causa de pedir, a qual, como detalhadamente descrito nas presentes alegações, visou desde o início parar a obra, sublinhe-se, na estrita medida em que esta violava e colidia com o direito pessoal de gozo do Recorrido, atribuído no âmbito de contrato de comodato, de natureza privada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>X. A referência do Acórdão recorrido ao tema da restituição provisória da posse, ou a alegação do Recorrido em sede de apelação de que o que estava em causa em sede cautelar não era – ao menos ainda – a restituição provisória da posse, foram como resposta e contra-argumento a essa posição».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Sabido que o objeto do recurso, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões (artigos 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil), o recorrente suscitou duas questões:</font>
</p><p><font>I – Nulidades do acórdão recorrido</font>
</p><p><font> II - Tribunal competente em razão da matéria;</font>
</p><p><font> III – Extinção da instância cautelar, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Questão prévia da admissibilidade do recurso</font>
</p><p><font>O recurso foi admitido na sequência de uma reclamação, ao abrigo do artigo 643.º do CPC, mas apenas em relação à determinação do tribunal competente em razão da matéria, conforme despacho que se transcreve:</font>
</p><p><font>«O âmbito do recurso de revista encontra-se definido no artigo 671.º, n.º 1, do CPC, e não abarca os acórdãos proferidos pela Relação no âmbito de procedimentos cautelares, como seria, em princípio aqui o caso, em que estamos perante uma providência cautelar de embargo de obra nova (artigo 370.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC).</font>
</p><p><font> Contudo, o artigo 370º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC, depois de erigir como regra geral a da inadmissibilidade de acesso ao terceiro grau de jurisdição das decisões proferidas em procedimentos cautelares, ressalva, na sua parte final, os casos em que, por virtude de outros dipositivos legais, o recurso é sempre admissível. Assim, surge a necessidade de convocar o regime do nº 2 do artigo 629º do CPC, preceito que enumera os casos em que, independentemente da verificação dos pressupostos de natureza geral de admissibilidade de recurso atinentes ao valor da causa e da sucumbência, o recurso é sempre admissível.</font>
</p><p><font>Entre esses casos avulta o de o recurso ter por fundamento a violação das regras de competência em razão da nacionalidade, matéria ou hierarquia ou quando seja invocada a ofensa de caso julgado, nos termos do artigo 629.º, n.º 2, al. </font><i><font>a),</font></i><font> do CPC.</font>
</p><p><font> Ora, no caso </font><i><font>sub judice,</font></i><font> está em causa uma questão de competência do tribunal em razão da matéria, incluída entre as exceções que admitem sempre o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 629.º, n.º 2, </font><i><font>a),</font></i><font> do CPC, pelo que, admite-se o recurso de revista».</font>
</p><p><font> A questão da inutilidade superveniente da lide não pode estar abrangida pelo objeto do recurso de revista, pois o Supremo Tribunal não tem competência legal para a conhecer, por força do artigo 370º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC, que estabelece como regra geral a da inadmissibilidade de acesso ao terceiro grau de jurisdição das decisões proferidas em procedimentos cautelares. Por outro lado, as instâncias discutiram apenas a questão processual da jurisdição competente, não se tendo pronunciado sobre o mérito, pelo que, ainda que não a lei não estipulasse a regra da inadmissibilidade do recurso de revista, esta questão nunca poderia ser conhecida, por se tratar de uma questão nova. Como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim</font><i><font>, ius nouarum</font></i><font>, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
<b><font>1. Da nulidade do acórdão recorrido</font></b>
</p><p><font> Conhece-se a questão da nulidade do acórdão recorrido, dada a circunstância de ter sido invocada em relação à decisão proferida quanto à competência do tribunal, e de os argumentos debatidos serem pertinentes para a resposta a dar à questão da determinação do tribunal competente em razão da matéria.</font>
</p><p><font>O recorrente,</font><b><font> Município de Mafra, </font></b><font>considera que</font><b><font> </font></b><font>o tribunal recorrido, entendendo que</font><b><font> </font></b><font>o que está em discussão nos autos é a violação do direito pessoal de gozo do requerente, com o consequente pedido de restituição da posse a formular em ação principal, está a alterar a causa de pedir e os pedidos formulados pelo Recorrido, o que implica a convolação para uma relação</font><b><font> </font></b><font>jurídica diversa da controvertida, cometendo uma nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea </font><i><font>d)</font></i><font> e </font><i><font>e)</font></i><font>, do CPC, e violando o</font><b><font> </font></b><font>artigo 265.º, n.º 6, do CPC. Além disso, defende nas suas conclusões que o acórdão recorrido viola os princípios do dispositivo (artigo 5.º, n.º 1 do CPC), do contraditório, da igualdade das partes (artigos 3.º e 4.º do CPC) e da estabilidade da instância (artigo 260.º do CPC), sendo, por via disso, ilegal.</font>
</p><p><font>Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º, a sentença é nula quando: </font><i><font>d)</font></i><font> O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; </font><i><font>e)</font></i><font> O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.</font>
</p><p><font>Trata-se de um vício cometido pelo tribunal quando não respeita o objeto do processo ou do recurso, decidindo questões que não lhe competia decidir porque não foram suscitadas, ou deixando de decidir questões que está vinculado a decidir.</font>
</p><p><font>Ora, na verdade, não padece o acórdão recorrido de qualquer vício neste domínio do </font><i><font>thema decidendum</font></i><font>. O que sucede é que o recorrente usa a invocação de nulidades do acórdão recorrido como uma estratégia para manifestar a sua discordância em relação ao mérito da decisão. Ou seja, não sustenta a sua posição em aspetos formais, mas entra já no mérito da questão objeto do recurso, impugnando a qualificação da relação jurídica invocada nos autos que o tribunal recorrido considerou ter natureza privatística – pressuposto da posição assumida na questão de saber qual o tribunal competente em razão da matéria. Ora, as nulidades da sentença são vícios intrínsecos da formação desta peça processual (</font><i><font>in casu,</font></i><font> do acórdão), taxativamente consagrados no nº1 do artigo 615º do CPC, sendo vícios formais do silogismo judiciário relativos à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento, de facto ou de direito. Como se afirma no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-01-2019, proc. n.º 1699/16.1T8PNF.P2.S2 - 1.ª Secção </font><i><font>«O regime das nulidades destina-se apenas a remover aspectos de ordem formal que, eventualmente, inquinem a decisão, não sendo adequado para manifestar discordância e pugnar pela alteração do decidido». </font></i>
</p><p><font>Nos termos da jurisprudência deste Supremo Tribunal, a omissão ou o excesso de pronúncia afere-se pelo </font><i><font>thema decidendum</font></i><font>, isto é, pelas questões suscitadas pelas partes e que integram o objeto de recurso, no sentido de o juiz estar vinculado a decidi-las, e não pelos argumentos ou fundamentos invocados pelas partes para defender os seus pontos de vista.</font>
</p><p><font>Assim, o acórdão recorrido não padece de nulidade por omissão de pronúncia, nem por excesso de pronúncia, tendo-se pronunciado sobre a única questão suscitada no recurso de apelação – a competência do tribunal em razão da matéria – constituindo as supostas questões que iriam além do pedido ou que, na perspetiva do recorrente, alteravam a causa de pedir, meros argumentos ou razões que o tribunal recorrido usou para fundamentar a sua decisão. Por outro lado, sendo o direito do comodatário um direito pessoal de gozo que incide sobre bens imóveis, que podem ser objeto de uma ação de restituição da posse, não significa qualquer violação da causa de pedir a referência, pelo acórdão recorrido, a esta ação principal, a qual, apesar de não ter sido ainda intentada porque foi peticionada a inversão do contencioso (artigo 369.º do CPC), o requerente pode ainda vir a intentar. Em consequência, também não se verificou a alegada violação da causa de pedir ou do princípio da estabilidade da instância.</font>
</p><p><font>Como decorrência do exposto também não houve qualquer violação dos princípios do contraditório, do dispositivo e da igualdade.</font>
</p><p><font>Nos termos do princípio do contraditório, não é lícito ao juiz </font><i><font>"decidir questões de direito ou de facto, mesmo que do conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem"</font></i><font>, exigindo-se, assim, que as decisões judiciais sejam proferidas depois de ser garantida a cada uma das partes a possibilidade de tomar parte do debate nos articulados ou nas alegações de recurso. </font>
</p><p><font>O princípio do dispositivo, por sua vez, impede que o tribunal decida para além ou diversamente do que foi pedido, mas não obsta a que profira decisão que se inscreva no âmbito da pretensão formulada.</font>
</p><p><font>Ora, resulta do atrás a | [0 0 0 ... 0 0 0] |
yTJxu4YBgYBz1XKv5gmS | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Supremo Tribunal de Justiça 1." Secção Cível</font></div><br>
<font>Proc. n.° 17289/18.1 T8PRT.P1.S1</font>
<p><font>Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal da Justiça</font>
</p><p><font>I – Relatório</font>
</p><p><font>1. FIDELIDADE – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., Recorrente nos autos de ação sob a forma de processo comum, em que é Recorrido o FGA – FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, notificada da decisão singular de não admissão do recurso de revista, proferida pela Relatora neste Supremo Tribuna lde Justiça, vem, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 652.º, n.º 3, do CPC, requerer que a decisão singular seja submetida à conferência e revogada, para prolação de acórdão que admita o recurso de revista, para os efeitos do disposto no artigo 671.º, n.º 1, do CPC.</font>
</p><p><font>2. Apresenta a reclamante as seguintes conclusões:<br>
«1. A Recorrente não pode concordar com a posição expressa pela Sra. Juíza Conselheira Relatora no douto despacho de fls… e no qual é indeferido o recurso interposto pela Recorrente.</font><br>
<font>2. Na verdade, dispõe o art.º 671.º, n.º 1 do CPC que “Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo (…)”.</font><br>
<font>3. Para aferição da admissibilidade da revista, é atribuído relevo ao efeito extintivo da instância que emana do acórdão da Relação, independentemente daquele que produzira a decisão da primeira instância sobre que incidiu.</font><br>
<font>4. Aqui se integra o acórdão que, conquanto não aprecie o mérito da causa (situação já contida no primeiro segmento do preceito), ponha termo (total ou parcial) ao processo quanto a todos ou algum dos réus ou quanto a todos ou algum dos pedidos ou pedido reconvencional.</font>
</p><p><font>5. A ponderação do elemento histórico permite concluir que ficam abarcados por tal segmento normativo os acórdãos em que a Relação se tenha envolvido efectivamente na resolução material do litígio, no todo ou em parte, incluindo os casos em que aprecie a procedência ou improcedência de alguma excepção (v.g. prescrição, caducidade, nulidade, anulabilidade, compensação, etc).</font><br>
<font>6. Não faria qualquer sentido que resolvendo o acórdão da Relação do Porto uma parte da questão que se encontra a ser dirimida (a prescrição do direito da Recorrida) se considere que como o processo “baixa” à primeira instância a questão da prescrição não resultou no conhecimento do mérito da causa relativamente a essa questão.</font>
</p><p><font>7. Se esta decisão tivesse sido tomada pelo Tribunal de primeira instância depois de realizado o julgamento e o Tribunal da Relação tivesse decidido em sentido inverso, a ora Recorrente, segundo parece ser a posição da Senhora Conselheira, já poderia recorrer.</font>
</p><p><font>8. Como o processo baixa à primeira instância, já não poderá recorrer.</font>
</p><p><font>9. Num caso existiria possibilidade de recurso ao Supremo Tribunal de Justiça.</font>
</p><p><font>10. No caso dos autos, para discussão da mesmíssima decisão, já não se considera admissível o recurso ao Supremo Tribunal de Justiça.</font>
</p><p><font>11. O Legislador preconizou, para este caso, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça uma vez que a decisão impugnada revoga a decisão do Tribunal de primeira instância e existe alçada para recurso.</font><br>
<font>12. A interpretação manifestada no douto despacho agora colocado em crise não faz qualquer sentido e não foi essa, com toda a certeza, a intenção do legislador.</font>
</p><p><font>13. A Recorrente não concorda, de todo em todo, com esta apreciação, pois no que à prescrição invocada por si nos presentes autos diz respeito, o Tribunal da Relação do Porto tomou uma decisão de mérito, conheceu do mérito da causa.</font><br>
<font>14. O recurso interposto pela Recorrente sempre teria que ser admitido, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 671.º, n.º 1 do CPC.</font>
</p><p><font>15. A douta decisão deverá ser submetida à conferência, para prolação de acórdão, uma vez que o douto despacho viola, de forma clara, o disposto no art.º 671.º, n.º 1 do CPC devendo, pois, ser revogada».</font>
</p><p><font>3. O FGA, notificado da reclamação apresentada, respondeu, dizendo que concorda e adere integralmente aos fundamentos e conclusões vertidos na decisão singular.</font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font>II – Fundamentação</font>
</p><p><font>A decisão reclamada considerou o recurso inadmissível, por não estarem preenchidos os requisitos do artigo 671.º, n.º 1, do CPC.</font>
</p><p><font>Entende, contudo, em síntese, a reclamante que esta decisão de não admissibilidade do recurso viola o artigo 671.º, n.º 1, do CPC, e não tem em conta a intenção do legislador que quis admitir neste tipo de casos o recurso de revista, uma vez que a decisão impugnada revoga a decisão do tribunal de primeira instância e existe alçada para recurso, e que decidindo que não se verificava a exceção da prescrição, ordenando a baixa do processo, pronunciou-se sobre o mérito (não na totalidade, mas parcialmente) no que diz respeito à prescrição por si invocada. Considera, ainda, com base num argumento histórico, que se deve admitir o recurso de revista nos casos em que «a Relação se tenha envolvido efectivamente na resolução material do litígio, no todo ou em parte, incluindo os casos em que aprecie a procedência ou improcedência de alguma excepção (v.g. prescrição, caducidade, nulidade, anulabilidade, compensação, etc.)».</font>
</p><p><font>Mas não tem razão.</font>
</p><p><font>A admissibilidade do recurso de revista, nos termos que constam do artigo 671º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, deixou de estar associada ao teor da decisão da 1ª instância, como se previa no artigo 721º, nº 1, do CPC de 1961, e passou a ter por referencial o resultado declarado no próprio acórdão da Relação.</font>
</p><p><font>Esta alteração não teve como objetivo restringir o âmbito da revista, mas prever a sua admissibilidade, para além dos casos em que o acórdão da Relação, incidindo sobre decisão da 1.ª instância, aprecia o mérito da causa, aos casos em que o acórdão da Relação põe termo total ou parcial ao processo por razões de natureza adjetiva.</font>
</p><p><font>Em face da argumentação da reclamante - que defende que o conhecimento da exceção perentória da prescrição corresponde ao conhecimento parcial de um dos segmentos do mérito da causa - importa em primeiro lugar afirmar o que se entende por decisão que aprecia o mérito da causa e, em segundo lugar, aferir da questão de saber se põe ou não termo ao processo.</font>
</p><p><font>Inexiste um precito delimitador do conceito de decisão que incida sobre o </font><i><font>“mérito da causa”. </font></i><font>Defende a reclamante que se deve seguir o critério que Abrantes Geraldes (cf </font><i><font>Recursos no Novo Código de Processo Civil, </font></i><font>Almedina, Coimbra, 2013) propõe para o artigo 644.º, n.º 1, al. </font><i><font>b), </font></i><font>do CPC, segundo o qual se considera decisão sobre o mérito da causa aquela que julga procedente ou improcedente algum ou alguns dos pedidos relativamente a todos ou alguns dos interessados; outrossim quando, independentemente da solução dada ou da posterior evolução processual, nela se apreciem exceções perentórias, como a caducidade, a prescrição, a anulabilidade.</font>
</p><p><font>Os acórdãos da Relação que conhecem do mérito são aqueles em que a Relação se envolve efetivamente na resolução material do litígio, no todo ou em parte. Ora, apesar de o conhecimento de exceção perentória, enquanto meio de defesa material, se considerar uma questão de mérito, como afirma a reclamante, porque incide sobre a existência ou não do direito do autor, não se pode perder de vista que essencial para a admissibilidade do recurso é, não a fundamentação do acórdão recorrido, mas o seu dispositivo, bem como o efeito processual decretado.</font>
</p><p><font>Assim, para decidir a questão da admissibilidade do recurso há que atender, como fator decisivo, ao </font><i><font>efeito processual </font></i><font>do acórdão do Tribunal da Relação. Ora, tendo o acórdão recorrido revogado a decisão de 1.ª instância, que decretou a absolvição da instância, e ordenado o prosseguimento do processo, o recurso de revista não deve ser admitido por não pôr termo ao processo.</font>
</p><p><font>Este Supremo Tribunal tem seguido uma interpretação alargada acerca do que significa pôr termo ao processo, para admitir o recurso de revista do acórdão da Relação que não admite o recurso de apelação, por razões estritamente formais, por exemplo, por cumprimento deficiente do ónus de conclusão (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-01-2016, proc. n.º 1006/12.2TBPRD.P1-A.S1), entendendo, embora não de forma unânime, que, para além dos casos de extinção da instância, também estes que resultam do incumprimento de ónus formais põem termo ao processo para o efeito de admissibilidade da revista. Assim, concluiu-se no Acórdão deste Supremo tribunal, de 3 de março de 2020 (proc. n.º 3402/08.0TBVLG-E.P1.S1), o seguinte: </font><i><font>«Deve considerar-se incluída entre os fundamentos da revista a decisão do Tribunal da Relação, que rejeita o recurso de apelação por falta de conclusões, ao abrigo do artigo 641.º, n.º 1, alínea b), do CPC, enquanto decisão que põe termo ao processo nos termos do artigo 671. º, n. º 1, em conjugação com o artigo 674. º, n. º 1, alínea b), ambos do CPC».</font></i>
</p><p><font>Contudo, este raciocínio não é aplicável aos casos em que o acórdão da Relação se limita a decidir o prosseguimento do processo, como o caso do acórdão recorrido, que considerou o recurso improcedente e ordenou a baixa do processo ao tribunal de 1.ª instância.</font><br>
<font>Conforme se afirmou, para a delimitação da revista é de considerar o </font><i><font>efeito processual </font></i><font>que emana do acórdão recorrido, independentemente daquele que tenderia a produzir a decisão de 1.ª instância.</font>
</p><p><font>Neste sentido, estão excluídos de recurso de revista os acórdãos da Relação que, revogando a sentença que absolveu o réu da instância, determinem o prosseguimento dos autos (cf Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Pires de Sousa, </font><i><font>Código de Processo Civil Anotado, </font></i><font>Vol. I, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, p. 835).</font>
</p><p><font>Ora, foi o que sucedeu no caso em apreço. O Tribunal da Relação, no dispositivo, não se pronunciou sobre o mérito e apenas ordenou a baixa do processo ao tribunal de 1.ª instância: </font><i><font>«Acordam, pois, os juízes que compõem a 3</font></i><i><sup><font>a </font></sup></i><i><font>Secção (Cível) do Tribunal da Relação do Porto, em conceder provimento ao presente recurso e revogar o saneador sentença recorrido, com a consequente baixa dos autos à 1</font></i><i><sup><font>a</font></sup></i><i><font> instância para prosseguimento dos ulteriores termos da acção».</font></i>
</p><p><font>Deve notar-se, também, que a reclamante poderá ainda fazer valer a sua perspetiva no processo quanto à prescrição do direito, em sede de recurso de revista do acórdão da Relação que vier a ser proferido neste processo.</font>
</p><p><font>É que, sendo o acórdão agora recorrido um acórdão interlocutório, que ordenou a baixa do processo, a sua impugnação é, por princípio, diferida para a revista que vier a ser interposta ao abrigo do artigo 671.º (artigo 673.º e 671.º, n.º 4, ambos do CPC), pelo que a reclamante, pode ainda vir a questionar o decidido quanto à prescrição em recurso de revista do acórdão da Relação que vier a ser proferido na sequência de sentença de 1.ª instância que conheça dos requisitos do enriquecimento sem causa.</font>
</p><p><font>Em consequência, indefere-se a reclamação e confirma-se a decisão reclamada.</font>
</p><p><font>III - Decisão</font>
</p><p><font>Pelo exposto, acorda-se, neste Supremo Tribunal de Justiça, em indeferir a reclamação e confirmar a decisão reclamada.</font>
</p><p><font>Custas pela reclamante.</font></p><div><br>
</div><br>
<div><br>
<p><font>Supremo Tribunal de Justiça, 29 de setembro.</font></p></div><br>
<font>Nos termos do artigo 15.º-A do DL 20/2020, de 1 de maio, atesto o voto de conformidade do Juiz Conselheiro Alexandre Reis (1.º Adjunto) e do Juiz Conselheiro Pedro de Lima Gonçalves (2.º Adjunto).</font>
<p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora)</font>
</p><p><font>Alexandre Reis (1.º Adjunto)</font>
</p></font><p><font><font>Pedro de Lima Gonçalves (2.º Adjunto</font><b><font>)</font></b></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
FDFfu4YBgYBz1XKvhv3o | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<font>Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font><b><font> </font></b></div><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<p><b><font>I - Relatório</font></b><br>
</p><p><b><font>1. ADB – ÁGUAS DE BARCELOS, S.A.,</font></b><font> notificada do acórdão do Tribunal da Relação, proferido, em conferência, em 09.03.2021, que confirmou a decisão singular do Relator, que, por sua vez, confirmara o despacho Saneador-Sentença que </font><i><font>julgou a ação improcedente,</font></i><font> e, em consequência </font><i><font>absolveu os RR. Município de Barcelos, Bankia, S.A.- Sucursal em Portugal e Banco Comercial Português, S.A. de todos os pedidos formulados pela A. AdB- Águas de Barcelos, S.A.,</font></i><font> mas com ele não se conformando, veio interpor recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no artigo 652.º, n.º 5, al. </font><i><font>b),</font></i><font> 672.º, n.º 1, als.</font><i><font> a)</font></i><font> e </font><i><font>b)</font></i><font>, do Código de Processo Civil (CPC), por estarem em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do Direito, e por estarem em causa interesses de relevância social.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Na sua alegação de recurso formulou as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font>«A) Estão plenamente preenchidos os pressupostos de que a lei faz depender a admissão da revista excepcional ao abrigo da alínea a) e b), do art. 672.º, n.º 1, do CPC., por estarem em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do Direito, e por estarem em causa interesses de relevância social.</font>
</p><p><font>B) Os problemas suscitados pelo caso </font><i><font>sub judice</font></i><font> prendem-se, em primeira linha, como a interpretação do disposto no art. 853.º, n.º 1, al. c), do CC, e a respectiva articulação com o art. 170.º, n.º 2, al. </font><i><font>a)</font></i><font> do CPTA e o art. 172.º, n.º 2 do CPA.</font>
</p><p><font>C) Nos presentes autos, a Recorrente tem um crédito judicialmente reconhecido, por acórdão transitado em julgado, e, com fundamento no referido acórdão condenatório, intentou a competente acção executiva contra o Município de Barcelos, encontrando-se a acção suspensa com fundamento na negociação de acordo entre as partes.</font>
</p><p><font>D) Apesar de o Município ter sido condenado ao pagamento de determinada quantia, nunca efectuou o pagamento e accionou uma garantia bancária – tendo o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> entendido que não se chegou a verificar o efeito extintivo da compensação.</font>
</p><p><font>E) Coloca-se a questão de saber, por um lado, se pode o art. 853.º, n.º 1, al. c), do CC, ser interpretado no sentido de excluir a compensação de um crédito do Estado (ou outra pessoa colectiva pública) perante um crédito judicialmente reconhecido (mormente por acórdão transitado em julgado), e, por outro lado, se pode o Município executar a garantia bancária quando se encontra em incumprimento do contrato de concessão – não obstante ter sido condenado para o efeito por acórdão transitado em julgado – não lhe sendo oponível a excepção de não cumprimento,</font>
</p><p><font>nem radicando a conduta em abuso do direito (considerando, ainda, que o alegado facto impeditivo da compensação foi provocado pelo próprio Município, mormente através da suspensão dos autos executivos).</font>
</p><p><font>F) A Recorrente discorda do entendimento do Tribunal ad quo, e, estando em causa questões novas, complexas, nas quais são mobilizados vários regimes jurídicos, e susceptíveis de se reflectir num sem número de litígios, é necessária uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça que contribua para a boa e uniforme aplicação do direito.</font>
</p><p><font>G) Por outro lado, a situação </font><i><font>sub judice</font></i><font> faz perigar a sustentabilidade do contrato de concessão, cujo objecto é a exploração e gestão dos serviços públicos municipais de água e de saneamento de Barcelos, serviços públicos essenciais.</font>
</p><p><font>H) A situação provocada pela falta de pagamento do Município (e, no limite, pela não compensação de créditos, no que não se concede) coloca em risco esses serviços públicos essenciais, afectando, simultaneamente, a qualidade de vida dos cidadãos bem como do ambiente.</font>
</p><p><font>I) Dada a essencialidade do serviço em causa, a discussão dos presentes autos poderia ser travada com qualquer município do país, colocando em risco, potencialmente, o serviço de abastecimento e saneamento de águas e resíduos de qualquer município do país.</font>
</p><p><font>J) O caso </font><i><font>sub judice</font></i><font> revela-se flagrantemente injusto, dando prerrogativas injustificadas ao Município devedor (estando devidamente provisionado o crédito da Recorrente na sua contabilidade), abalando a confiança dos cidadãos no Direito e nas instituições.</font>
</p><p><font>K) Deve, pois, admitir-se o presente recurso como revista excepcional, ao abrigo do disposto no art. 672.º, n.º 1, al. a) e b), do CPC.</font><br>
</p><p><font>b. Da tempestividade do recurso</font>
</p><p><font>L) A Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, veio proceder à nona alteração da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de Março, nos termos da qual todos os prazos judiciais, de acordo com as regras emergentes do art. 6.º-B da referida lei, se encontravam suspensos desde 22 de Janeiro de 2021. A Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril, determinou, por sua vez, o reinício da contagem dos prazos a 6 de Abril de 2021.</font>
</p><p><font>M) O disposto no art. 6.º-B, n.º 5, al. d), da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, não tem aplicabilidade no presente caso, porquanto as partes não se pronunciaram afirmativamente quanto à possibilidade de realização de actos através das plataformas informáticas, e, por outro lado, porquanto a decisão ora recorrida emerge de uma reclamação para a conferência formulada pela Recorrente ao abrigo do art. 652.º, n.º 3 do CPC, e não de um recurso, não sendo uma das situações previstas pelo legislador na redacção do artigo.</font><br>
</p><p><font>c. Do mérito do recurso</font><br>
</p><p><font>N) A compensação aqui em causa é legalmente admissível e eficaz.</font>
</p><p><font>O) A proibição de compensação com créditos do Estado (art. 853.º, n.º 1, alínea c) do CC) não é absoluta e que não tem aplicação no caso da Águas de Barcelos, dada a iniquidade e injustiça de tal situação, por causa da existência de i) um contrato entre o Município e uma Concessionária; ii) uma sentença de condenação do Estado (Município) ao pagamento de uma compensação financeira à Concessionária (reconhecimento judicial do crédito); iii) e uma declaração antecipada do Município de incumprimento da decisão arbitral (cfr. imprensa local).</font>
</p><p><font>P) Aliás, no caso dos presentes autos a </font><i><font>ratio legis</font></i><font> de tal proibição (dificuldades na contabilidade pública) nem sequer se aplica, uma vez que perante uma sentença condenatória no pagamento de uma determinada quantia, sentença essa já transitada em julgado o Município deverá seguramente registar na sua contabilidade o valor em causa.</font>
</p><p><font>Q) Encontrando-se devidamente provisionado o crédito da Requerente, a compensação do mesmo já não provocará quaisquer dificuldades na contabilidade pública, não se verificando assim a razão de ser da aplicação da proibição constante do citado art. 853º, n.º 1, alínea c) do CC.</font>
</p><p><font>R) Para além disso, a interpretação defendida pelo Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> do artigo 853.º, n.º 1, alínea c), do CC deve ter-se por inconstitucional pelos seguintes motivos:</font>
</p><p><font>a. por conceder ao Estado aquilo que se proíbe ao particular poderá parecer ofender o princípio da igualdade (artº 13º da CRP) desde o momento em que se considere que o fundamento em que se alicerçou o privilégio inicial (como se apontou, de evitar percalços e inconveniências de tesouraria, contabilidade e orçamental) tenha, nos tempos modernos, perdido o sentido útil que esteve na base da sua consagração pelo legislador ordinário e por corresponder a uma restrição desnecessária e desproporcionada do direito de propriedade (relativo ao crédito do particular / Concessionária), sendo, por isso, uma violação dos arts. 62º, n.º 1, 17º e 18º, n.º 2 da CRP</font>
</p><p><font>b. por pretender aplicar a previsão do artigo 853.º, n.º 1, alínea c), do CC a um crédito reconhecido por uma sentença de um tribunal – como são inequivocamente os tribunais arbitrais, segundo o disposto no artigo 209.º, n.º 2, da Constituição –, excluindo assim a possibilidade de compensação extra-judicial de um crédito do Estado ou outra pessoa coletiva pública mcom um crédito sobre essa mesma pessoa coletiva fixado numa sentença marbitral irrecorrível, configura uma interpretação daquela norma do CC claramente violadora do disposto no artigo 205.º, n.º 2, da Constituição.</font>
</p><p><font>S) A factualidade provada impõe a conclusão de que o crédito do Município se extinguiu, por compensação extrajudicial, nos termos do disposto no art. 847º, n.º 1 do Código Civil (ver factos provados 7, 8, 9, 11 a 20 da sentença proferida em 1.ª instância), logo não pode o Município executar a garantia bancária com base num crédito extinto, por força da compensação.</font>
</p><p><font>T) Independentemente disso, também não pode executar a garantia bancária por o Município se encontrar em incumprimento do Contrato de Concessão, designadamente, quanto ao direito da Recorrente à reposição do equilíbrio económico-financeiro, ao qual foi condenado por acórdão arbitral transitado em mjulgado e que não cumpriu até à data, sendo-lhe, por isso, oponível a excepção de não cumprimento.</font>
</p><p><font>U) No caso dos autos, o accionamento da garantia bancária para a cobrança da retribuição anual constitui um manifesto abuso de direito, em dois planos distintos (embora interligados).</font>
</p><p><font>V) Ora, é ponto assente que houve um acordo entre as partes no sentido de se suspender a acção executiva proposta pela Recorrente, com fundamento nas negociações de um acordo sobre o objecto do litígio.</font>
</p><p><font>W) Na situação </font><i><font>sub judice</font></i><font>, o Município evitou o decretamento formal da compensação, dando azo à suspensão da execução. Não obstante ter contribuído para esta situação, criando, simultaneamente, a legítima expectativa e confiança de que um consenso poderia ser alcançado entre as partes, veio accionar a garantia bancária – escudando-se numa situação meramente formal que a própria criou!</font>
</p><p><font>X) Assim, o Município não pode beneficiar da ausência de despacho que decrete a compensação quando o próprio contribuiu para tal situação, sob pena de um manifesto abuso de direito.</font>
</p><p><font>Y) Simultaneamente, o Município, com a sua conduta, criou a convicção de que a garantia bancária não seria accionada para cobrança de crédito relativo às rendas.</font>
</p><p><font>Z) De facto, decorrido quase um ano, o Recorrido criou na Recorrente a convicção de aceitação da compensação extrajudicial relativamente ao valor correspondente à retribuição anual (</font><i><font>factum proprium</font></i><font>) – tendo o Recorrido recusado apenas a compensação relativa à taxa de resíduos sólidos – e, passados 10 meses, veio accionar a garantia bancária para cobrança de rendas!</font><br>
</p><p><font>AA) Há um </font><i><font>factum proprium</font></i><font> gerador da confiança legítima de que o Recorrido procuraria desenvolver esforços, junto do Recorrente, para a obtenção de um consenso. Contudo, contrariando assim intrinsecamente o seu comportamento anterior, o Recorrido vem requerer esse pagamento.</font><br>
</p><p><font>BB) Pelo exposto, o Tribunal não pode considerar legítimo o accionamento da garantia pelo Recorrido, que incorre em flagrante abuso de direito em dois planos distintos (e interligados), como exposto.</font>
</p><p><font>CC) Perante o exercício pelo Município do direito à execução da garantia bancária, em manifesto abuso de direito, deverão também os bancos Requeridos se absterem de proceder ao pagamento da quantia solicitada.</font><br>
</p><p><font>DD) Estando ainda em tempo de deduzir tal pretensão, e por se encontrarem verificados os pressupostos legais para o efeito, a Recorrente vem requerer que este Tribunal a dispense do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas, tendo em conta que o recurso não reveste especial complexidade, nos termos do art. 530.º do CPC, e que a conduta processual das partes não merece censura.</font><br>
</p><p><font>EE) Nestes termos e nos de mais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado e consequentemente revogado o acórdão recorrido.</font>
</p><p><font>NESTES TERMOS E NOS DE MAIS DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO E CONSEQUENTEMENTE REVOGADO O ACÓRDÃO RECORRIDO, E DEVE A RECORRENTE SER DISPENSADA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA, FAZENDO-SE, ASSIM,</font><br>
</p><p><font>JUSTIÇA».</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> O Município, recorrido, apresenta contra-alegações em que, após defender a intempestividade do recurso, pugna pela não verificação dos requisitos de revista excecional e pela manutenção do decidido quanto à interpretação do artigo 853.º, n.º 1, al</font><i><font>. c),</font></i><font> do CPC, alegando não ter o acórdão recorrido cometido qualquer erro de julgamento e sustentando a manutenção do decidido.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Cumprindo à agora Relatora averiguar se estão preenchidos os requisitos do recurso de revista geral, foi proferido despacho singular, em que reconheceu a verificação dos requisitos gerais de recorribilidade, afirmando a tempestividade do recurso, por remissão para os motivos exarados no despacho de admissibilidade proferido pelo Tribunal da Relação, em 29-09-2021, quanto à interpretação da Lei nº 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e constatando a dupla conformidade, terminando com o envio do processo à formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, para o efeito de indagação dos requisitos específicos da revista excecional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.1. </font></b><font>O despacho do Tribunal da Relação, relativo à interpretação do artigo 6.º B da Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, para o qual remeteu o despacho da Relatora, tem o seguinte teor:</font>
</p><p><font> «No entanto, afigura-se-nos que essa interpretação terá que ser menos literal e ter em consideração a época especial em que o diploma foi publicado. E aqui tendemos para acompanhar a posição expressa por José Joaquim Fernandes Oliveira Martins na Revista “Julgar”, em artigo que pode ser consultado em </font><a><u><font>http://julgar.pt/a-lei-n-o-1-a2020-de-19-de-marco-e-a-terceira-vaga-da</font></u></a><font> pandemia-covid-19/ e que, com a devida vénia, passamos a transcrever : </font>
</p><p><i><font>“De facto, a regra geral do nº 1 é a da suspensão (total) dos prazos processuais, mas admite-se agora que se efetue a “tramitação” de processos não urgentes (nos tribunais superiores e nos tribunais de primeira instância). Ora, o que significa, para efeito deste artigo, a “tramitação dos processos”?</font></i><font> </font><i><font>Que os prazos processuais não ficam, neste caso, suspensos e decorrem normalmente? Que essa tramitação dos processos se limita à actividade das secretarias judiciais e à possibilidade de prática de actos processuais não presenciais? E o que são “actos” e “diligências não urgentes”, são todas as diligências em processos não urgentes ou pode haver diligências não urgentes em processos urgentes e vice-versa? Só as partes é que devem apreciar se têm “condições para assegurar a sua prática através das plataformas informáticas que possibilitam a sua realização por via eletrónica”, mas não já o juiz? E quais são, em concreto, os “meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente” (e há meios inadequados?) e como se realizam os mesmos? Esta nova redação é, novamente, perfeitamente infeliz e vai, de novo (e talvez até mais do que anteriormente), conduzir a interpretações e práticas díspares e até opostas, procurando-se, de seguida e o melhor que se conseguir (o que não foi muito, reconheça-se), esclarecer o que se terá pretendido com esta modificação. Considera-se, tal como sucedeu anteriormente, que o legislador quis evitar a total paragem dos processos não urgentes com a suspensão dos respectivos prazos processuais, permitindo que possam continuar a ser tramitados, com algumas restrições, deixando na disposição das próprias “partes”, mas também, necessariamente, do juiz, o saber se existem condições para prosseguir a “prática de actos” e a “realização de diligências não urgentes”. Deste modo, parece-me que, procurando retirar algum nexo lógico e prático destas alíneas, nos processos não urgentes a regra será sempre, nos termos do nº 1, a da suspensão dos prazos e das diligências processuais, o que não impede que, em alguma medida, prossiga a “tramitação do processo”, permitindo que as secretarias judiciais procedam, por exemplo, a citações ou notificações, mesmo que se mantendo suspensos, em regra, os respetivos prazos processuais decorrentes desses actos. Essa suspensão dos actos e diligências processuais a praticar/realizar pelas partes e pelo julgador só cessará se o juiz entender que existem condições para se manter a tramitação integral do processo e notificar as partes desse entendimento, advertindo-as que esse prazo para a sua audição não se encontra suspenso nos termos do nº 1 (sob pena de se retirar, claro, qualquer utilidade prática a esta alínea). Se todos os sujeitos processuais estiverem de acordo com a manutenção da tramitação (e manifestarem essa vontade de forma expressa, não bastando o seu consentimento tácito) e com a “prática de actos” processuais e a realização de “diligências não urgentes” através das “plataformas informáticas que possibilitam a sua realização por via electrónica ou através de meios de comunicação à distância adequados”, o juiz deverá determinar o reinício da tramitação integral do processo e dos respectivos prazos processuais, a ocorrer após a notificação às partes do respetivo despacho fundamentado”.</font></i><font> </font>
</p><p><font>Assim sendo, e aderindo a esta interpretação da Lei nº 4-B/2021, de 1/2, entendemos ser o recurso interposto pela apelante “ADB – Águas de Barcelos, S. A.” tempestivo, uma vez que o Acórdão recorrido foi proferido em 9/3/2021, nessa mesma data (já na vigência da referida Lei) foi notificado às partes. Tendo a contagem dos prazos sido retomada em 6/4/2021, e sendo o prazo para apresentação de recurso de 30 dias, conclui-se que o prazo terminava em 5/5/2021. Como foi interposto nessa mesma data, é tempestivo».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> O recorrido, Município de Barcelos, inconformado com o despacho da Relatora que remeteu o processo para a formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, reclamou para a Conferência, nos termos do n.º 3 do art.º 652.º, </font><i><font>ex vi</font></i><font> do artigo 679.º, todos do Código de Processo Civil (CPC), invocando os seguintes fundamentos:</font>
</p><p><font>«I. O Reclamante não se pode conformar com o despacho proferido pela Exma. Sra. Juíza Conselheira relatora em 21.01.2022, o qual, entre outros, admite, por tempestivo, o recurso de revista excepcional interposto pela Recorrente.</font>
</p><p><font>II. O despacho reclamado limita-se a remeter, para sustentar a sua posição, para a fundamentação contida no despacho do Tribunal da Relação de Lisboa que admite a subida do recurso de revista excepcional.</font>
</p><p><font>III. Na óptica do Reclamante a interposição do presente recurso de revista excepcional é intempestivo, o que sempre há-de ser reconhecido pela Conferência no acórdão que vier a proferir sobre a matéria e que ora é requerido.</font>
</p><p><font>IV. O Reclamante não adere à interpretação dada pelo despacho do TRL à Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, uma vez que essa interpretação não tem a menor adesão à letra da lei, nem tampouco ao pensamento legislativo.</font>
</p><p><font>V. A decisão recorrida foi proferida e notificada em 09.03.2021.</font>
</p><p><font>VI. Nessa data, e com efeitos retroactivos a 22 de Janeiro de 2021, a generalidade dos prazos processuais encontrava-se suspenso por força da vigência da já aludida Lei n.º 4-B/2021, com excepção dos processos não urgentes que se encontrassem a tramitar nos tribunais superiores, sem prejuízo do cumprimento do disposto na al. c) quando estiver em causa a realização de atos presenciais.</font>
</p><p><font>VII. Por outro lado, não se encontravam também suspensos os prazos para interposição de recurso, arguição de nulidades ou requerimento da retificação ou reforma da decisão. Segundo a jurisprudência, deve interpretar-se a al. d) do n.º 5 do art.º 6.º-B da Lei n.º 4-B/2021, como aplicando-se </font><i><font>«a todas as decisões de mérito, no todo ou em parte, proferidas nos autos, sejam elas em que fase processual for porque, quanto ao que nelas se decidiu, o poder jurisdicional mostra-se igualmente esgotado»</font></i><a><u><sup><font>[1]</font></sup></u></a><font>.</font>
</p><p><font>VIII. O que legislador pretendeu com a publicação da Lei n.º 4-B/2021 foi, essencialmente, suspender a prática de atos processuais e as diligências nos processos não urgentes em que se revelasse necessária a prática de atos presenciais, uma vez que a </font><i><font>ratio </font></i><font>da suspensão é a redução da mobilidade e dos contactos sociais como medida de prevenção à transmissão da COVID-19.</font>
</p><p><font>IX. Face a esta declarada e expressa intenção, e tendo em conta a experiência já adquirida em 2020 na tramitação eletrónica de processos e na realização de diligências por meios de comunicação à distância, o legislador preocupou-se em prever um conjunto amplo de exceções à regra geral da suspensão dos prazos para a prática de atos processuais, mitigando os efeitos da generalizada suspensão.</font>
</p><p><font>X. Essas exceções, grosso-modo, podem agrupar-se em dois grandes grupos: tramitação e prática de atos processuais não presenciais e tramitação e prática de atos presenciais através de meios de comunicação à distância quando todos os sujeitos processuais o aceitem.</font>
</p><p><font>XI. Por princípio, nos processos não urgentes onde não se revelasse necessária a prática de actos processuais presenciais, os prazos não se encontravam suspensos.</font>
</p><p><font>XII. No que respeita aos processos que corram termos em tribunais superiores, </font><i><font>maxime</font></i><font> em fase de recurso, as diligências presenciais são a excepção, e, </font><i><font>in casu</font></i><font>, nunca teriam lugar.</font>
</p><p><font>XIII. Os prazos para a prática de actos processuais no âmbito do presente processo, </font><i><font>maxime</font></i><font> para a apresentação de recurso de revista excepcional, tramitado integralmente por via eletrónica, NÃO se encontravam suspensos, por força da excepção contida na al. a) do n.º 5 do art.º 6.º-B da Lei 4-B/2021 e da própria </font><i><font>ratio</font></i><font> do regime de suspensão instituído pela aludida lei, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.</font>
</p><p><font>XIV. Tendo o Acórdão da Conferência sido notificado às partes em 09.03.2021, e sendo o prazo para recorrer de 30 dias (art.º 638.º, n.º 1 do CPC), o prazo para interposição do recurso de revista excepcional findou em 20 de Abril de 2021.</font>
</p><p><font>XV. Havendo, ainda, a possibilidade de prática do acto até ao 3.º dia útil com o pagamento da respectiva multa, nos termos do n.º 5 do art.º 139.º do CPC, ou seja, até 23 de Abril de 2021.</font>
</p><p><font>XVI. O requerimento de interposição de recurso de revista excepcional e as respectivas alegações foram somente apresentadas e notificadas às partes em 05 de Maio de 2021, num momento em que já se haviam esgotado todos os prazos e sem que houvesse sido invocado o justo impedimento.</font>
</p><p><font>XVII. Devia o Despacho reclamado ter indeferido, por intempestivo, o requerimento de interposição de recurso, nos termos da al. a) do n.º 2 do art.º 641.º do CPC.</font>
</p><p><font>XVIII. Vide, </font><i><font>inter alia</font></i><font>, o Ac. do TRL de 13.05.2021 (proc. n.º 598/18.7T8LSB.L1-8), o Ac. do STJ de 25.05.2021 (proc. n.º 11888/15.0T8LRS.L1-A.S1) e de 13.10.2021 (proc. n.º 24015/19.6T8LSB.L1-A.S1).</font>
</p><p><font>XIX. O recurso de revista excepcional interposto pela Recorrente é extemporâneo, pelo nunca deveria ter sido admitido, o que se impõe ser reconhecido por acórdão da Conferência, o que se requer.</font>
</p><p><font>Nestes termos, e nos melhores que V. Exas. sempre suprirão, deve esta Reclamação ser declara procedente e, em consequência, ser revogado o despacho reclamado na parte que admitiu o recurso por tempestivo, substituindo-se essa decisão por outra que julgue o recurso de revista excepcional extemporâneo e, por isso, inadmissível, só assim se fazendo JUSTIÇA!»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7.</font></b><font> ADB – ÁGUAS DE BARCELOS, S.A., Recorrente, notificada da reclamação para a Conferência apresentada pelo Recorrido, relativamente ao despacho de 21.02.2022, veio apresentar resposta, que aqui se considera transcrita, pugnando pelo indeferimento da reclamação, por entender que o ato de interposição de recurso está abrangido pela regra da suspensão de prazos, fixada no n.º 1, do artigo 6.º B da Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, concluindo as suas alegações afirmando que </font><i><font>«Em face do exposto, observando a regra de que a interpretação da lei deve estar assente na letra da lei, conclui-se que o n.º 5 não impõe o levantamento da suspensão consagrada como regra no n.º 1, antes o permite quanto à tramitação processual e quanto à prática de atos e realização diligências, com a decisão do tribunal e a pronúncia das partes».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> A questão suscitada prende-se com a interpretação do disposto no artigo 6.º B, n.º 5, alíneas </font><i><font>a)</font></i><font> e </font><i><font>d)</font></i><font> da Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro, para o efeito de aferir se a regra da suspensão de prazos se aplica ou não ao ato de interposição de recurso. </font>
</p><p><font>O Município de Barcelos defende que, com efeitos retroativos a 22 de janeiro de 2021, a generalidade dos prazos processuais se encontrava suspenso por força da vigência da Lei n.º 4-B/2021, com exceção dos processos não urgentes que se encontrassem a tramitar nos tribunais superiores, sem prejuízo do cumprimento do disposto na al. </font><i><font>c)</font></i><font> quando esteja em causa a realização de atos presenciais. Entende, ao abrigo deste preceito, que não se encontravam suspensos os prazos para interposição de recurso, arguição de nulidades ou requerimento da retificação ou reforma da decisão. Invoca também jurisprudência segundo a qual deve interpretar-se a al. </font><i><font>d)</font></i><font> do n.º 5 do art.º 6.º-B da Lei n.º 4-B/2021, como aplicando-se </font><i><font>«a todas as decisões de mérito, no todo ou em parte, proferidas nos autos, sejam elas em que fase processual for porque, quanto ao que nelas se decidiu, o poder jurisdicional mostra-se igualmente esgotado».</font></i>
</p><p><font>Por sua vez a recorrente, Águas de Barcelos, sustenta que a pretensão do Recorrido não pode proceder, pois que, quando </font><i><font>“(…)o legislador refere que “o disposto no n.º 1 não obsta” pretendeu dizer que não impedia as situações previstas nas alíneas do n.º 5, ou dito de outro modo, pela positiva, quer dizer que podiam acontecer aquelas situações. Ao prever que “o disposto no n.º 1 não obsta”, o legislador não afastou, não excecionou a regra prevista no n.º 1 da suspensão da prática de atos, diligências e dos prazos processuais. Ou seja, o legislador quis prever que, apesar da suspensão, podiam ser tramitados os processos, praticados atos e realizadas diligências e proferidas decisões finais. Tudo, sem prejuízo da suspensão, reitere-se.”</font></i><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3. </font></b><font>O artigo 6.º-B da Lei 4-B/2021, sob a epígrafe “Prazos e diligências”, estipula, para o que aqui releva, o seguinte:</font>
</p><p><font>«</font><i><font>1- São suspensas todas as diligências e todos os prazos para a prática de atos processuais, procedimentais e administrativos que devam ser praticados no âmbito dos processo e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional e entidades que junto dele funcionem, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.</font></i>
</p><p><i><font>(…)</font></i>
</p><p><i><font> 5 – O disposto no n.º 1 não obsta:</font></i>
</p><p><i><font>a) À tramitação nos tribunais superiores de processos não urgentes, sem prejuízo do cumprimento do disposto na alínea c) quando estiver em causa a realização de atos presenciais;</font></i>
</p><p><i><font>(…)</font></i>
</p><p><i><font>d) A que seja proferida decisão final nos processos e procedimentos em relação aos quais o tribunal e demais entidades referidas no n.º 1 entendam não ser necessária a realização de novas diligências, caso em que não se suspendem os prazos para interposição de recurso, arguição de nulidades ou requerimento da retificação ou reforma da decisão.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A regra, contida no n.º 1 do citado preceito, é a da suspensão de todas as diligências e prazos para a prática de atos processuais no âmbito dos processos que corram termos nos tribunais judiciais.</font>
</p><p><font>A controvérsia reside na interpretação da al. </font><i><font>a)</font></i><font> do n.º 5 do artigo 6.º-B, que afirma que </font><i><font>«5 - O disposto no n.º 1 não obsta: a) À tramitação nos tribunais superiores de processos não urgentes, sem prejuízo do cumprimento do disposto na alínea c) quando estiver em causa a realização de atos presenciais</font></i><font>».</font>
</p><p><font>Impõe esta norma uma exceção à regra da suspensão como sustenta o recorrido, ou consiste apenas, como entende o recorrente, numa previsão do legislador de que, apesar da suspensão dos prazos, não há impedimento à tramitação do processo, à prática de atos e de diligências, nem a que sejam proferidas decisões finais, sem que tal possibilidade tenha o valor de exceção? </font>
</p><p><font>De acordo com a recorrente, a alínea </font><i><font>a)</font></i><font> do n.º 5 do artigo 6.º B não teria o valor de uma exceção à regra da suspensão, não obrigando pois a parte à prática do ato processual de interposição de recurso, durante o período de suspensão fixado no n.º 1. No que concerne à alínea </font><i><font>d)</font></i><font> do n.º 5, entende a recorrente que da mesma não se extraí que o recurso de revista excecional seja extemporâneo, </font><i><font>“porquanto, da citada norma resulta que os prazos para interposição de recurso, arguição de nulidade ou requerimento da retificação ou reforma da decisão da decisão final não se suspendem caso o tribunal e demais entidades referidas no n.º 1 entendam não ser necessária a realização de novas diligências. Ora, este entendimento tem que ser expresso pelo tribunal e notificado às partes para se pronunciarem, sob pena de violação do direito ao contraditório, vertido no art. 3.º, n.º 3 do CPC, uma das vertentes do direito de acesso à justiça, consagrado no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP)”.</font></i><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font>Quid iuris?</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> A Lei n.º 4-B | [0 0 0 ... 0 0 0] |
0TJvu4YBgYBz1XKvEwc8 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<b><font>Processo n.º 3077/15.0T8PBL.C1-A.S1</font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font> Acordam, em Conferência, no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>AA e outros</font></b><font>, autores de uma ação declarativa sob a forma de processo comum contra</font><b><font> BB e outro/a(s)</font></b><font>, na qual invocaram, em síntese, serem proprietários do prédio urbano descrito no artigo 1.° da petição inicial, que confronta com o prédio dos réus, e peticionaram que seja marcada a linha divisória entre ambos os prédios, notificados do despacho da Relatora que confirmou o despacho do Tribunal da Relação de ..... AA, que não admitiu o recurso de revista, vêm reclamar deste despacho ao abrigo do artigo 643.º, n.º 4, e 652.º, n.º 3, ambos do CPC, requerendo que sobre ele recaia um acórdão, apresentando as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«1º. Apoiou-se o recurso (e a presente reclamação) na autoridade de caso julgado com apoio na mais recente jurisprudência, sobretudo do STJ que entende e compreende, na integra, no âmbito do artº 621º do C.P.C não só o conteúdo literal desse artigo, como os antecedentes lógicos/indispensáveis da decisão.</font>
</p><p><font>2º. Na verdade a decisão (que versa, quanto a nós, do exercício da posse em nome próprio que conduziu à aquisição do prédio – máxime, para o que aqui interessa, do rústico) tal como ficou plasmado na parte injuntiva da sentença, não pode dispensar a “declaração da extensão da propriedade” de que fala Pires de Lima na anotação ao artº 1353º do C.C Anotado que ele também denomina de “Acertamento”.</font>
</p><p><font>3º. Na verdade foi com a prova de que os actos de posse exercidos pelo tempo necessário para o usucapião pelos AA sobre esse imóvel, “chegavam” à “adega” onde se guardavam os frutos e produtos que eles, AA, cultivavam e colhiam da terra, que se decidiu, como consta da parte “dispositiva da sentença” da acção de reivindicação, que o imóvel era propriedade dos AA..</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>4º. Ademais, se a acção ora em apreço não carecesse do valor necessário para se recorrer até ao Supremo, poder-se-ia recorrer com fundamento na existências de “titulo suficiente” para dar como provada a área dos prédios dos AA e obviar desse modo à “amputação radical” de uma parte significativa do rústico dos AA em proveito do dos RR de forma arbitrária (ver artº 1354º, nº1, seu início e 1354º, nº 2, in fine).</font>
</p><p><font>5º. Dispensar-se-ia – e os Exmos Sr.s Desembargadores dispunham dessa matéria em termos de recurso para a Relação – desse modo, o argumento de ofensa da autoridade do caso julgado, titulo de que, a nosso ver, os AA ora dispõem, mas poderiam apenas recorrer às certidões matriciais e às respectivas áreas, ou as certidões de registo e respectivas áreas que, constituindo embora meras presunções, dispensariam como reza a autoridade de Pires de Lima e Antunes Varela, a cómoda mas arbitrária e oportunista decisão de recurso “à distribuição do terreno em litígios em partes iguais” (nº 2, in fine, do artº 1354º do C.C) pois na hierarquia das provas sobre os limites do terreno também existe a prova … por presunção antes do recurso à medida salomónica (anotação 4ª e 5ª ao artº 1354º do C.C) em remissão para a doutrina de Pescatore – Albano e De Martino.</font>
</p><p><font>6º. Por fim, sendo a parte decisória da sentença, tão parcimoniosa em fundamentos (remetendo, aliás para o artº 1º da P.I – e este para a alínea a) dos factos assentes) (ver alínea a) – 1 da decisão) em que se reconhece o direito de propriedade sobre 150 m2 de logradouros de uma casa de habitação com 30 m2 de área coberta e 2 800 m2 de quintal, estando tais elementos constantes da matriz e do registo, mas constando também da sentença que os AA cultivavam “parte não concretamente apurada de tal quintal mas DEMARCANDO esse cultivo” (facto documentado na sentença) cultivo que tinha como limite a área anterior à zona indicada no doc. de fls.108 como “lagar” – e era ali “no lagar” que os AA (reivindicantes) recolhiam os frutos e produtos que semeavam para depois os consumirem – parece óbvio, no nosso modesto entender, que os actos de posse incidem em tal área de terreno situada antes do lagar mas onde se incluia o próprio “lagar” – pelo que a demarcação ou “declaração de extensão de propriedade naquele local” está feita por documento (sentença) baseada na posse em nome próprio que não pode ser alterada (suprimida) sem violação do caso julgado e de forma tão drástica que não pode ser aceite pelos AA..</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Atento o supra exposto se vem requerer a V.Exas, Venerandos Conselheiros, e nos termos do artº 643º, nº 4 e 652º, nº 3, do C.P. Civil, se dignem receber a presente impugnação do despacho de fls…, fazendo recair sobre a matéria de que este versa o competente acórdão em que se admita o recurso interposto e julgando-o procedente como se pede.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>E assim se fará a costumada</font>
</p><p><font>justiça!»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> 2. </font></b><font>Os recorridos, notificados da reclamação dos recorrentes, vieram apresentar contra-alegações, nas quais pugnam pela confirmação do despacho reclamado.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> No recurso de revista, está em causa uma alegada violação do caso julgado consubstanciado na decisão proferida no processo nº 2148/06....., que correu termos no 1º Juízo do Tribunal ..... , e que na perspetiva dos recorrentes, seria incompatível com o decidido no presente processo, que procedeu à divisão do terreno em litígio em partes iguais, nos termos do artigo 1354.º do Código Civil.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> O despacho da Relação ..... não admitiu o recurso, por entender que</font><b><font> </font></b><b><i><font>«</font></i></b><i><font>o caso julgado invocado pelos ora recorrentes respeita a uma decisão transitada e proferida no p. 2148 do extinto 1º Juízo do T. J. da Comarca ....., decisão que, visto o seu teor constante do facto provado em 2., em nada pode colidir com o acórdão de que se quer interpor recurso. Assim, não admito o recurso. Custas pelos recorrentes».</font></i>
</p><p><i><font> </font></i><br>
<font> </font><b><font>5.</font></b><font> O despacho da Relatora agora reclamado, analisou a sentença transitada em julgado, invocada pelos reclamantes, e o acórdão recorrido, e constatou que da matéria de facto da citada sentença proferida no processo n.º 2148/06..... não se extrai a delimitação entre prédios pretendida pelos autores na petição inicial do presente processo, concluindo que </font><i><font>“não se verificando qualquer ofensa do caso julgado, não estamos perante um caso em que o recurso seja sempre admissível nos termos do artigo 629.º, n.º 2, al. a), do CPC”.</font></i><br>
<font> </font><br>
<font> Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
<font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>II</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font> </font><b><font>1.</font></b><font> A presente ação tem o valor de 5.000,01 euros.</font>
</p><p><font> Em princípio, a parte vencida apenas poderá recorrer da decisão se o valor do respetivo processo exceder a alçada do tribunal que a proferiu e se, além disso, se verificar o seu decaimento em, pelo menos, metade dessa alçada. O objetivo deste requisito de admissibilidade do recurso é compatibilizar o interesse da segurança jurídica potenciada por múltiplos graus de jurisdição com outros interesses, como a celeridade processual e a racionalização dos meios humanos e materiais, bem como a dignificação e valorização da intervenção dos tribunais superiores.</font>
</p><p><font> Contudo, mesmo faltando o requisito do valor, é sempre admissível recurso das decisões que ofendam o caso julgado, nos termos do artigo 629.º, n.º 2, al. </font><i><font>a),</font></i><font> 2.ª parte, do Código de Processo Civil.</font>
</p><p><font> O despacho do Tribunal da Relação ...... , entendendo que a decisão transitada em julgado, invocada pelos recorrentes, em nada colidia com o acórdão recorrido, não admitiu o recurso de revista.</font>
</p><p><font> O despacho da Relatora, agora reclamado, analisando o acórdão recorrido e a sentença transitada em julgado, concluiu do mesmo modo.</font>
</p><p><font> O presente processo é uma ação de demarcação, enquanto aquele em que foi proferida a sentença transitada em julgado é uma ação de reivindicação, baseada na aquisição da propriedade por usucapião, que correu termos entre os mesmos sujeitos que agora ocupam a posição de autores e de réus, proprietários de prédios confinantes.</font>
</p><p><font> Conforme se afirma no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-01-2004 (proc. n.º 03B3444), </font><i><font>«O caso julgado caracteriza-se essencialmente na insuscetibilidade de impugnação de uma decisão em razão do seu trânsito em julgado decorrente, por seu turno, da insuscetibilidade de interposição de recurso ordinário ou de reclamação, e o caso julgado material abrange o envolvente segmento decisório e o relativo a questões preliminares que sejam seu antecedente lógico necessário. A interposição de recurso com fundamento na ofensa de caso julgado depende de a decisão recorrida contrariar uma outra que lhe seja anterior, transitada em julgado, proferida entre as mesmas partes, sobre o mesmo objeto e baseada na mesma causa de pedir. (…) Na decisão sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade de recurso com fundamento em ofensa de caso julgado é sindicável a existência de decisão transitada em julgado suscetível de ofensa e a identidade entre ela e a recorrida no plano dos sujeitos, do pedido e da causa de pedir».</font></i>
</p><p><font> Apesar de nestas ações (de reivindicação e de demarcação), o pedido e a causa de pedir serem distintos, importa analisar o conteúdo da sentença transitada em julgado a fim de verificar se, do que nela foi definido quanto ao direito de propriedade dos autores sobre o imóvel então em litígio, resulta o estabelecimento de uma linha de demarcação entre os prédios confinantes incompatível com a fixada no acórdão recorrido.</font>
</p><p><font> Aceita-se, como afirmam os reclamantes, citando doutrina e jurisprudência, que o instituto do caso julgado abrange não só o respetivo segmento decisório, como também a decisão das questões preliminares que tenham constituído antecedentes lógicos indispensáveis da emissão da decisão final. </font>
</p><p><font> Como afirma Miguel Teixeira de Sousa (</font><i><font>Estudos sobre o Novo Processo Civil</font></i><font>, pág. 578), </font><i><font>«O caso julgado abrange a parte decisória do despacho, sentença ou acórdão, isto é, a conclusão extraída dos seus fundamentos (art. 659.°, n.º 2, “in fine”, e 713.° n.º 2), que pode ser, por exemplo, a condenação ou absolvição do réu ou o deferimento ou indeferimento da providência solicitada. Como toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto e de direito), o respectivo caso julgado encontra-se sempre referenciado a certos fundamentos. Assim, reconhecer que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha, com esse valor, por si mesma e independentemente dos respectivos fundamentos. Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão».</font></i>
</p><p><font> Todavia, analisando a sentença que os reclamantes juntaram aos autos, proferida na ação de reivindicação do processo n.º 2148/06....., quer no seu dispositivo, quer nos seus fundamentos de facto, conclui-se que nela não está definida a linha de demarcação dos prédios dos autores e dos réus de modo exato e incompatível com o decidido pelo acórdão recorrido. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>2.</font></b><font> No acórdão recorrido, foi determinada a linha divisória entre dois prédios, o prédio dos autores, descrito no ponto 1 da matéria de facto, e o prédio dos réus, descrito no ponto 4 da matéria de facto, da seguinte forma:</font>
</p><p><i><font>«Pelo exposto, na procedência da apelação, revogam a sentença recorrida, e, em função disso, determinam que a linha divisória em causa, atinente à delimitação norte do prédio dos AA. e sul do prédio dos RR., prédios que estão descritos em 1 e 4 dos factos provados, é a que resulta da divisão em duas parcelas iguais de 983 m2 para cada uma das partes do terreno constituído pelo polígono que é formado pelos pontos B, C, G, H, I, J,N e L da planta de fls. 505».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Os autores invocam no recurso de revista que esta linha divisória tinha sido determinada, de forma distinta, na ação de reivindicação do processo n.º 2148/06....., e que o acórdão agora recorrido teria violado o estabelecido nesta decisão transitada em julgado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Ora, na sentença transitada em julgado, ficou estabelecido o seguinte, na sua parte dispositiva:</font>
</p><p><i><font>"Por todo o exposto, nos termos e por força das disposições legais referidas, decide-se: </font></i>
</p><p><i><font>1. Na procedência parcial da acção:</font></i>
</p><p><i><font>a. Condenar os Réus a reconhecerem que o direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 1°. da petição inicial se integra, nas proporções resultantes dos regimes vigentes á data de cada uma das sucessões e respeitando a sua ordem, nas heranças abertas, respectivamente, por óbito de CC, DD e FF, determinando-se o cancelamento de qualquer registo que os Réus porventura hajam feito sobre o mesmo;</font></i>
</p><p><i><font>b. Absolver os Réus da parte do pedido não incluída em a); </font></i>
</p><p><i><font>2. Na total improcedência da Reconvenção, absolver os Reconvindas de todo o pedido reconvencional deduzido".</font></i>
</p><p><font> </font><br>
<font> O acórdão recorrido deu como provados, no que diz respeito ao prédio dos autores, o seguinte:</font>
</p><p><i><font>1. Encontra-se registado em nome dos autores GG, HH, II, casado com JJ e<br>
AA e ainda de FF, sob a ficha n.° … da Conservatória do<br>
Registo Predial.... , o direito de propriedade sobre o prédio urbano, sito na freguesia<br>
..... e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo …., composto de casa de<br>
habitação em taipa, de r/c com 3 divisões e dois vãos, com superfície coberta de 30 ml,<br>
logradouro de 150 ml e quintal com 2 800 m2, a confrontar do Norte com LL , Sul<br>
com MM, Nascente com Caminho e Poente com NN.</font></i>
</p><p><i><font>2. Por sentença transitada em julgado a 22.01.2013, no âmbito do processo n.°<br>
2148/06....., foram os réus condenados a reconhecer que o direito de propriedade sobre<br>
o prédio identificado no ponto 1 se integra, nas proporções resultantes dos regimes vigentes<br>
à data de cada uma das sucessões e respeitando a sua ordem, nas heranças abertas,<br>
respectivamente por óbito de CC, DD e FF.</font></i><br>
<font> </font><br>
<font>No facto provado 2, o acórdão recorrido reporta-se ao dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal Judicial ..... (processo n.°2148/06.....) que os reclamantes agora invocam como constituindo uma decisão transitada em julgado, incompatível com a decisão do acórdão recorrido quanto à demarcação dos prédios confinantes. </font><br>
<font>Nenhuma das instâncias no presente processo se fundamentou nessa sentença para definir a linha de demarcação dos prédios. Esta decisão transitada em julgado, tendo considerado procedente o pedido de aquisição originária dos autores, não definiu qualquer linha divisória entre os prédios dos autores e réus, limitando-se a reconhecer a titularidade dos direitos sobre a herança da qual fazia parte o prédio identificado nos presentes autos, no ponto 1 da matéria de facto dada como provada. Mas nada mais foi determinado pela citada sentença proferida no processo n.º 2148/06....., em termos dos limites concretos do respetivo imóvel. </font><br>
<font> Considerando os pressupostos de facto da sentença proferida no processo n.º 2148/06....., verifica-se que, no ponto 19 da matéria de facto dada como provada, invocado pelos autores para fundamentar a sua tese, se consignou o seguinte:</font><br>
<i><font>"Os pais dos Autores (aqui Recorrentes) e estes, enquanto se manteve o referido em "16", cultivaram parte não concretamente apurada do quintal do prédio em "1", cujo limite se situava antes da zona indicada no documento de fIs. 108 como «lagar», aí colhendo depois os produtos que antes semearam ou plantaram, consumindo-os (resposta ao quesito 2.º)". </font></i><br>
<i><font> </font></i><font>Contudo, deste facto não se extrai o limite da posse exercida pelos autores, designadamente não se estabelece que o limite dos prédios seja o “lagar”, como pretendem o autores, significando apenas, conforme se transcreve, que </font><i><font>o "limite desse lado se situava </font></i><i><u><font>antes da zona</font></u></i><i><font> indicada como «lagar»", </font></i><font>sem determinar o ponto exato de referência para a definição da linha de estrema entre os prédios confinantes. </font><br>
<font> Assim, não decorre da matéria de facto da sentença transitada em julgado a delimitação entre prédios pretendida pelos autores na petição inicial do presente processo, tendo o acórdão recorrido constatado que não existe título, nem outro meio de prova nos autos que demonstrem a tese defendida pelos autores, que faz coincidir a linha divisória com o lagar, entendendo também que não era possível estabelecer a linha divisória dessa forma por falta de identificação dos seus dois pontos terminais:</font>
</p><p><font>«A sentença recorrida considerou que não havia títulos suficientemente elucidativos e ainda que não ficou demonstrada a extensão da posse de qualquer dos antagonistas sobre cada um dos respectivos prédios. Em consequência, baseou-se em </font><i><font>outros meios de prova, </font></i><font>que no caso foram os depoimentos de </font><i><font>PP, QQ </font></i><font>e </font><i><font>RR, </font></i><font>depoimentos que convenceram o tribunal recorrido de que a </font><i><font>estrema norte do prédio dos Autores se situa imediatamente antes da empena do lagar/lagariça que hoje constitui a construção mais a sul do conjunto de ruínas existente no prédio dos Réus </font></i><font>e </font><i><font>segue em linha recta até à estrema poente na qual confina com prédio de terceiro mediante um declive de cerca de 50 cm.'</font></i>
</p><p><font>Acontece que esta matéria não integra uma linha divisória visto que para ela se achar minimamente definida teriam que ser identificados, pelo menos, os seus dois pontos terminais. Ou seja, não foi alcançada uma linha divisória pelos primeiros dois caminhos constantes da lei. De sorte que resta a derradeira solução legal de dividir o terreno em litígio em partes iguais.</font>
</p><p><font>Ora, deflui justamente do facto provado em </font><i><font>8 </font></i><font>que esse terreno tem a área de </font><i><font>1966 </font></i><b><i><font>m.2 </font></i></b><font>estando preenchida pelo polígono decorrente da união dos pontos identificados a fls. 504 por referência à planta de fls. 505.</font>
</p><p><font>Deste modo, a divisão do terreno em litígio opera-se pela repartição dessa área para AA. E RR., em duas parcelas de 983 m2 para cada uma das partes.»</font>
</p><p><font> </font><br>
<font> Pelo que não se verificando qualquer violação do caso julgado, não estamos perante um caso em que o recurso seja sempre admissível nos termos do artigo 629.º, n.º 2, al</font><i><font>. a),</font></i><font> do CPC.</font><br>
<font> Assim, não se admite o recurso de revista, confirmando-se o despacho reclamado.</font>
</p><p><b><font> </font></b><br>
<b><font>III</font></b><br>
<b><font> </font></b><br>
<font> Pelo exposto, indefere-se a reclamação e confirma-se o despacho reclamado.</font><br>
<font> </font><br>
<font> Custas pelos reclamantes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Nos termos do artigo 15.º-A do DL 20/2020, de 1 de maio, atesto o voto de conformidade do Juiz Conselheiro Alexandre Reis (1.º Adjunto) e o Juiz Conselheiro Pedro de Lima Gonçalves (2.º Adjunto).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Supremo Tribunal de Justiça, 2 de dezembro de 2020</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor – (Relatora)</font>
</p><p><font>Alexandre Reis</font>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves</font>
</p><p><font> </font>
</p></font><p><font><font> </font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
UDKPu4YBgYBz1XKvchs8 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font> </font>
<p><b><font>Processo n.º 189/14.1TBVNO-A.C1-A.S1 </font></b>
</p><p><b><font>1.ª Secção</font></b>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<b><font>I</font></b></div><br>
<b><font> AA, </font></b><font>recorrente, no processo à margem referenciado, em que é recorrido, </font><b><font>BB</font></b><font>, não se conformando com o despacho do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 30-03-2015, na parte em que não admitiu o recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, vem dele reclamar, ao abrigo do disposto no actual art. 643.º, n.º 1 do CPC.</font>
<p><font> </font>
</p><p><font> 1. O recorrido requereu a declaração de insolvência do reclamante (arts 3.º e 20.º, n.º 1, alíneas b) e e) do CIRE), fundamentando a sua pretensão apenas e só num documento particular (impugnado, desde logo, pelo Reclamante), no qual alega que o recorrente confessou ser devedor da quantia de € 350.000,00.</font>
</p><p><font> Os documentos juntos pelo recorrido foram sendo impugnados, conforme consta dos autos.</font>
</p><p><font>Realizou-se audiência de julgamento e por sentença, decidiu-se declarar a insolvência do reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>2. Inconformado o agora reclamante, declarado insolvente, apresentou recurso de tal sentença, tendo sido admitido e consignado que o mesmo suspende a liquidação e partilha do ativo, nos termos do art. 40.º, n.º 3 do CIRE.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>3. Contudo, por despacho, o Meritíssimo juiz Relator decidiu </font><i><font>“Que se proceda à rejeição imediata do recurso no que concerne à matéria de facto baseada nos depoimentos prestados, o que ora se decide…”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>4. Não se conformando com este despacho, o reclamante apresentou reclamação para a conferência e em sede de recurso foi deliberado no acórdão recorrido indeferir a reclamação e, julgando improcedente a apelação, manter o decidido na sentença recorrida, condenando o apelante como litigante de má fé na multa de 2 UC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>5. O reclamante apresentou recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando as conclusões de fls. 17 a 23, que aqui se consideram integradas. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>6. Por despacho singular no tribunal da Relação de Coimbra, decidiu-se o seguinte: </font><i><font>“…Assim, admite-se o recurso para o STJ do acórdão de 13-01-2015 (fls. 891 a 976), mas apenas quanto à matéria da litigância de má fé nele decidida, recurso esse que é de Revista….”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>7. Afirmou o reclamante, na reclamação dirigida a este Supremo com base no art. 643.º do CPC, que, no despacho reclamado, se entende que “</font><i><font>o recurso fundado na oposição de acórdãos, que constitui a exceção prevista na 2.ª parte do preceito, só é viável se o valor da causa exceder a alçada da Relação”, </font></i><font>o que, na opinião do reclamante não se compreende, porque em processo de insolvência basta a verificação da “oposição de acórdãos da Relação” a que se refere o art. 14.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Imprensas, para que a revista seja admissível.</font>
</p><p><font>Na redacção do art. 14.º não consta qualquer limite quanto ao valor da acção para saber se a decisão é recorrível ou não. </font>
</p><p><font>Defendeu o reclamante que o valor da causa não releva para o efeito de ser admitido recurso para o STJ, caso se verifique a oposição prevista no artigo 14.º do CIRE.</font>
</p><p><font>O reclamante indicou os acórdãos que considera em oposição com o acórdão recorrido e juntou acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, de 3-12-2009, no processo 3601/08.5TJCBR.C1.</font>
</p><p><font>Contestou o reclamante o valor que foi fixado para a ação, com base no art. 301.º do CPC e no art. 297.º do CPC e defende ainda que, no processo de insolvência, de acordo com o art. 15.º do CIRE, o valor da causa para efeitos processuais sempre seria determinado pelo valor ativo indicado na petição inicial, o que significa que sempre seria o de € 80.000,00.</font>
</p><p><font>Argumentou que o valor determinado na sentença é provisório, não fazendo sentido limitar ao reclamante o direito de acesso à justiça por um mero cêntimo.</font>
</p><p><font>Assim estabelece o art. 629.º, n.º2 do CPC, ao admitir o recurso em caso de contradição de acórdãos dos Tribunais da Relação, se a razão pela qual não cabe recurso for estranha à alçada do tribunal.</font>
</p><p><font>Entendeu, portanto, o reclamante que o despacho reclamado não foi fundamentado nem de facto nem de direito, sofrendo de nulidade por violação do disposto nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC e violando os arts. 205.º e 204.º da CRP, bem como os princípios consignados nos arts 13.º e 20.º da CRP, e o n.º 2 do art. 202.º da CRP. </font>
</p><p><font>Requereu, em consequência a revogação do despacho reclamado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>8. O recorrido contra-alegou, pugnando pela não admissibilidade do recurso de revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>9. Por despacho singular, a agora Relatora indeferiu a reclamação e declarou a não admissibilidade do recurso de revista, nos termos em que o fez o despacho reclamado, isto é, admitindo apenas o recurso quanto à condenação do reclamante por litigância de má fé.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>10. O reclamante, </font><b><font>AA,</font></b><font> não se conformando com a decisão singular, vem dela reclamar para a Conferência, requerendo que sobre a matéria de direito recaia um Acórdão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>11. Para o efeito apresentou as conclusões exaradas a fls. 352 a 357, que aqui se consideram reproduzidas, terminando as mesmas requerendo a revogação da decisão singular e o consequente recebimento do recurso de revista interposto.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Cumpre decidir.</font></p><div><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font>II </font></b>
</p><p><b><font> </font></b></p></div><br>
<b><font>1.</font></b><font> A questão objeto da reclamação traduz-se em saber se o despacho singular, que indeferiu a reclamação, procedeu a uma correta interpretação e aplicação da lei e padece das nulidades previstas no art. 615.º, n.º 1, als b), c) e d) do CPC, designadamente, se está fundamentado de facto e de direito, se existe alguma contradição entre os fundamentos e a decisão e se deixou de se pronunciar sobre algumas questões essenciais à boa decisão da causa.</font>
<p><font> </font>
</p><p><font>Está em causa um recurso de revista contra um acórdão que confirmou a sentença do tribunal de 1.ª instância, que declarou a insolvência do agora reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso </font><i><font>sub judice</font></i><font> verifica-se uma dupla conforme, prevista no art. 671.º, n.º 1 do CPC, isto é, a decisão das instâncias, o seu conteúdo e fundamentação são idênticos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O valor da causa foi fixado, na sentença, conforme fls. 535, em € 30.000,00, até que não exista inventário nestes autos (art. 301.º do CIRE), não excedendo, portanto, a alçada desta Relação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso concreto, estamos perante a causa de irrecorribilidade de falta de valor da ação (art. 629.º, n.º 1 do CPC), não relevando para a questão da admissibilidade do recurso a justeza dos motivos invocados pelo reclamante para impugnar a declaração de insolvência, os quais não podem, nesta sede, ser apreciados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> O despacho reclamado não padece de qualquer nulidade por falta de ou obscuridade de fundamentação, pois explica quais são as regras do recurso segundo os artigos 629.º, n.º 2 e 671.º, n.º 3 do CPC, referindo-se à evolução legislativa da questão, à jurisprudência e à posição da doutrina, pelo que consideramos que se encontra devidamente fundamentado, de facto e de direito, e que não padece das nulidades invocadas nem viola normas e princípios de direito constitucional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O despacho também não padece da nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão ou de ambiguidade que torne a decisão ininteligível, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, pois esta nulidade apenas ocorre quando a contradição é insanável ou quando a decisão aplica normas contraditórias e incompatíveis entre si, ou ainda nos casos em que o pensamento do juiz se afigura impercetível ou incompreensível. Ora a fundamentação do despacho reclamado obedece a uma construção lógica, não padece de contradições e é percetível.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Também não se verifica qualquer nulidade por omissão de pronúncia, pois o despacho que não admitiu o recurso tratou a questão submetida à apreciação do juiz – a admissibilidade ou não do recurso – e o conceito de questão não se confunde com argumentos, motivos, razões ou juízos de valor. Por outro lado, os elementos do processo a que se refere o reclamante e que não foram considerados na decisão singular, como por exemplo o documento de confissão de dívida impugnado, também não o poderiam ter sido pois referem-se aos fundamentos de facto e ao mérito da decisão que declara a insolvência e só poderiam ser considerados caso o recurso de revista tivesse sido admitido, mas não para apreciar a questão da recorribilidade da decisão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> O despacho reclamado indeferiu a reclamação quanto à não admissibilidade do recurso de revista sobre a questão da declaração de insolvência e seus pressupostos, em virtude de o valor da causa não o permitir, não sendo possível nem a revista excecional prevista no art. 672.º do CPC, a qual só pode interpor-se desde que verificados os pressupostos gerais do art. 629.º, n.º 1 do CPC, nem a recorribilidade estatuída no art. 14.º, n.º 1 do CIRE, norma que não prescinde da exigência dos requisitos gerais de recorribilidade.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Entende o reclamante que o art. 14.º da CIRE não exige qualquer valor da ação como requisito de admissibilidade do recurso e que o art. 629.º, n.º 2, al. d) do CPC, admite o recurso baseado na oposição de acórdãos, independentemente do valor da ação e da sucumbência. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O despacho reclamado interpretou e aplicou corretamente as normas jurídicas relativas à admissibilidade de recurso.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Vejamos:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Tem-se entendido, na jurisprudência deste Supremo Tribunal, que, quer o recurso de revista baseado na oposição de acórdãos (art. 629.º, n.º 2, al. d) do CPC), quer o recurso de revista excepcional (art. 672.º do CPC) só são viáveis se o valor da causa exceder a alçada da Relação, não dispensando assim “a verificação das condições gerais de admissibilidade de recurso” previstas no art. 629.º, n.º 1 do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A reforma de 2013 abriu mais uma possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça consagrada no art. 629.º, n.º 2, al. d) do NCPC e que tinha sido eliminado pela reforma de 2007 (Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A justificação para a previsão do art. 629.º, n.º 2, do NCPC é a de garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações em matérias que nunca podem vir a ser apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça e assim se contribuir para uma estabilização das orientações jurisprudenciais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O art. 629.º, n.º 2, do NCPC veio reintroduzir um caso especial de admissibilidade de revista, restrito aos casos em que a razão da inadmissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça seja estranha à alçada e o acórdão recorrido esteja em contradição com outro, da Relação, proferido «no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito (…)» (cf. acórdão deste Supremo Tribunal, de 18-09-2014, processo n.º 1852/12.7TBLLE-C.E1.S1, relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Beleza).</font>
</p><p><font>No mesmo sentido, veja-se o sumário do acórdão deste Supremo Tribunal, de 26-03-2015 (2992/13.0TBFAF-A.E1.S1), relatado pelo Conselheiro Tomé Gomes: </font>
</p><p><font>«Para os efeitos da alínea c) [d] do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, só é admissível recurso para o STJ com o fundamento especial ali previsto, quando o mesmo seja vedado por motivo exclusivamente alheio à alçada do tribunal recorrido e, cumulativamente, quando o valor da causa, em termos gerais, o permitisse».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso do art. 629.º, n.º2, al. d) – oposição de acórdãos – a lei exige que não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, o que significa, conforme esclarece o Conselheiro Abrantes Geraldes (cf. Abrantes Geraldes</font><i><font>, Recursos no Novo Código de Processo Civil, </font></i><font>Almedina, Coimbra, 2013, p. 45), que o impedimento ao recurso não pode residir no facto de o valor da ação ou o da sucumbência ser inferior aos limites mínimos resultantes do n.º 1 do art. 629.º, mas noutro motivo de ordem legal. Depreende-se, assim, da redação desta norma, que, para que se verifique esta modalidade de recurso de revista o valor da ação deve exceder a alçada, estando restringido o impedimento ao recurso a outro motivo de ordem legal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No mesmo sentido, tem entendido a jurisprudência deste Supremo Tribunal, que o art. 14.º do CIRE exige a verificação do requisito geral do valor da ação para se admitir o recurso de revista contra a declaração de insolvência, com base na contradição de acórdãos, conforme se decidiu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-09-2014 (processo n.º 1852/12.7TBLLE-C.E1.S1), relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Beleza, em cujo sumário se afirmou o seguinte:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«I - São aplicáveis ao processo de insolvência as regras definidas no CPC para os recursos, salvo se do CIRE resultar regime diverso.</font>
</p><p><font>II - O art. 14.º do CIRE – ao restringir a admissibilidade do recurso de revista à hipótese de o acórdão recorrido estar em oposição com outro – não dispensa a verificação das condições gerais de admissibilidade de recurso, entre as quais figura a relação entre o valor da causa (e da sucumbência) e a alçada.</font>
</p><p><font>III - O art. 629.º, n.º 2, do NCPC (2013) veio reintroduzir um caso especial de admissibilidade de revista, restrito aos casos em que a razão da inadmissibilidade de recurso para o STJ seja estranha à alçada e o acórdão recorrido esteja em contradição com outro, da Relação, proferido «no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito (…)».</font>
</p><p><font>IV - A justificação para a previsão do art. 629.º, n.º 2, do NCPC (2013) é a de garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações em matérias que nunca podem vir a ser apreciadas pelo STJ, como é o caso das decisões proferidas nos procedimentos cautelares, mas já não dos processos de insolvência».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>O recurso excecional com base na contradição de acórdãos relativamente à mesma questão de direito não se aplica ao caso </font><i><font>sub judice</font></i><font> , por a lei exigir, no art. 629.º, n.º 2, al. d) do CPC, que não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na insolvência, o regime dos recursos está definido no art. 14.º, n.º1, do CIRE, com a delimitação do grau de recurso até à Relação relativamente à causa - o objeto do processo de insolvência (art. 1.º do CIRE).</font>
</p><p><font>Na verdade, o normativo citado vem restringir a admissibilidade do recurso de revista à hipótese de o acórdão recorrido estar “em oposição com outro, proferido por alguma das Relações, ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e que haja decidido de forma divergente a mesma questão fundamental de direito e não houver sido fixada” pelo Supremo Tribunal de Justiça “ com ele conforme. </font>
</p><p><font>Deste modo teremos que nos debruçar previamente, ou seja, antes de verificarmos da existência ou não de contradição de acórdãos, sobre os pressupostos de admissibilidade previstos no CPC, nomeadamente e para o que aqui interessa, sobre o valor do processo.</font>
</p><p><font>É que a parte vencida apenas pode recorrer da decisão se o valor respetivo exceder a alçada do tribunal que a proferiu e se, além disso, se verificar o seu decaimento em, pelo menos, metade dessa alçada.</font>
</p><p><font>O art. 14.º do CIRE não implica qualquer derrogação das regras gerais da lei processual relativa aos recursos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso </font><i><font>sub judice,</font></i><font> o valor da ação é de € 30.000,00, portanto, inferior ao valor da alçada da Relação, € 30.000,01, e a lei processual exige que, para ser admissível o recurso com base na contradição de acórdãos relativamente à mesma questão de direito, conforme previsto no art. 629.º, n.º 2 al. d) do NCPC, não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, sucedendo neste caso que o valor da ação não permite recurso ordinário de revista. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Também o art. 14.º do CIRE, admitindo o recurso para o STJ de acórdãos em oposição com outros proferidos pelos tribunais superiores, tem sido interpretado no sentido de exigir os requisitos gerais do recurso, entre os quais se enquadra o valor da alçada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Neste sentido se tem orientado a jurisprudência deste Supremo Tribunal (cf. acórdão de 24-05-2011, proferido no processo n.º 148/08.3TJPRT.P1.S1):</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«O art. 14º-1 do CIRE, invocado pelo Recorrente, começa por proibir o recurso dos acórdãos proferidos pela Relação nos processos de insolvência para, de seguida, à semelhança do que sucedia com os anteriores arts. 678º-4 e 754º-2, abrir a excepção: - a decisão terá recurso se o acórdão estiver em oposição com outro, em que se tenha decidido a mesma questão fundamental de direito e não haja jurisprudência uniformizada.</font>
</p><p><font>Trata-se, sem dúvida, de um regime especial que, começando por limitar o regime geral, ao admitir apenas recorribilidade até à Relação, estabelece pressupostos excepcionais de admissibilidade da decisão da 2ª Instância.</font>
</p><p><font>Condição </font><i><font>sine qua non</font></i><font> de recorribilidade do acórdão da Relação é, pois, a verificação do requisito oposição de acórdãos.</font>
</p><p><font>Consequentemente, e concretizando, do acórdão da Relação proferido em processo de insolvência só é admissível recurso desde que, além de concorrerem os demais requisitos gerais, esse acórdão esteja em oposição com outro sobre a mesma questão fundamental de direito. </font>
</p><p><font>Não basta, pois, a oposição de acórdãos. É necessário o concurso dos requisitos de admissibilidade, a que este tem de acrescer para escapar à limitação excepcional de recorribilidade estabelecida para o processo de insolvência».</font>
</p><p><font>(…)</font>
</p><p><font>«Por isso se reitera a afirmação/conclusão de que as normas – regra e excepção – contidas no art. 14º-1 do CIRE, que antes poderiam valer para a admissibilidade dos recursos de revista e de agravo (cujo regime coincidia com o geral), terão, com a reforma processual, ficado com o âmbito de aplicação comprimido, na medida em que são apenas aplicáveis aos casos em que a lei processual prevê e admite o recurso de revista, acrescendo-lhes como condição especial da sua admissibilidade».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No mesmo sentido, se pronunciou, o acórdão deste Supremo Tribunal de 08-01-2015, processo n.º 2465/13.1TBVCT-G.G1-A.S1, relatado pelo Conselheiro João Trindade:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«II - O direito ao recurso está assegurado quando se verifica a existência de um duplo grau de jurisdição, sendo que o triplo grau de jurisdição só existe nos casos em que a lei o determinar.</font>
</p><p><font>III - Tendo o valor da insolvência sido fixado em € 2000, e não tendo ainda havido qualquer decisão que altere tal valor, não é admissível recurso para o STJ do despacho que – nessa mesma insolvência – indeferiu o requerimento de exoneração do passivo restante.</font>
</p><p><font>IV - Ademais, a oposição de julgados a que alude o art. 14.º do CIRE – a que só seria de atender caso a decisão admitisse recurso em função do valor – não se compadece com a indicação genérica de acórdão em oposição com o recorrido, antes impondo a explicitação dos fundamentos da oposição».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> O reclamante defende que nos termos do artº 15º do CIRE este valor de 30.000 euros deverá ser corrigido e fixado em montante superior ao da alçada da Relação pelos seguintes motivos:</font>
</p><p><font>- No presente processo está em causa um valor de confissão de dívida de € 350.000;</font>
</p><p><font>- O art. 301.º do CPC estabelece que o valor da ação haverá de ser o valor do ato jurídico determinado pelo seu preço ou estipulado pelas partes e o art. 297.º do CPC determina que o valor da ação haverá de ser a quantia certa em dinheiro que se pretende obter;</font>
</p><p><font>- No processo de insolvência, de acordo com o art. 15.º do CIRE, o valor da causa para efeitos processuais seria sempre determinado pelo valor do ativo indicado na petição inicial, o que significa que seria o valor de € 80.000 ou o valor do ativo indicado pelo administrador de insolvência o qual, conforme resulta dos autos, nomeadamente de Relatório elaborado nos termos do at. 155.º, n.º do CIRE, seria superior a €30.000. </font>
</p><p><font> - O valor determinado na sentença (€ 30.000,00) é meramente provisório, não fazendo sentido limitar o direito de acesso à justiça por 1 cêntimo.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Vejamos:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A alçada é o limite de valor até ao qual o tribunal julga sem recurso ordinário. </font>
</p><p><font>Em princípio, a parte vencida apenas pode recorrer da decisão se o valor do respetivo processo exceder a alçada do tribunal que a proferiu e se, além disso, se verificar o seu decaimento em, pelo menos, metade dessa alçada.</font>
</p><p><font>Os critérios aferidores do valor da causa podem ser gerais ou especiais. Os critérios gerais determinam que o valor da causa é o valor da quantia certa em dinheiro que se pretende obter ou, quando se pretende obter um benefício diverso, o valor da quantia em dinheiro correspondente a esse benefício (artº 297.º, nº 1 do CPC).</font>
</p><p><font>O critério geral é o seguinte: o valor da causa há-de representar a utilidade económica que pela acção se pretende obter (artºs 296.º, nº 1 e 297.º, nº 1 do CPC). O princípio fundamental é, portanto, este: o valor da causa é igual ao valor do pedido expresso em moeda legal.</font>
</p><p><font> A toda a causa deve ser atribuído um valor, a indicar na petição inicial, sob pena de esta não ser recebida pela Secretaria (arts. 552.º, n.º 1, al. f), e 305.º, n.º 3 do CPC).</font>
</p><p><font> Esse valor deve ser certo, expresso em moeda legal, que representa a utilidade económica imediata do pedido, e ao qual se atende para determinar a competência do tribunal, a forma do processo de execução comum e a relação da causa com a alçada do tribunal (artº 296 nºs 1 e 2 do CPC).</font>
</p><p><font>O valor da ação para efeitos de recorribilidade da decisão é, em regra, aquele que fica definido no despacho saneador (art. 306.º, n.º 2 do CPC).</font>
</p><p><font>No tocante ao valor processual da causa, o princípio geral é, assim, o da imutabilidade do valor, fixado em atenção ao momento da proposição da acção. Dito doutro modo: irrelevância das alterações resultantes de factos posteriores à proposição da acção. O que conta, quer quanto ao tempo, quer quanto aos factos, é a situação existente naquela data (artº 299 nº 1 do NCPC).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No caso concreto, o juiz definiu, na sentença, o valor da causa em 30.000,00 euros.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A decisão incidental de fixação do valor da ação é sempre recorrível se tiver por fundamento a alegação de que o valor processual excede a alçada do tribunal </font><i><font>a quo. </font></i>
</p><p><font>O recurso autónomo só é admissível da decisão que ponha termo ao incidente (art. 644.º, n.º 1, al. a) do CPC).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Ora o recorrente não apresentou recurso contra a fixação do valor da ação, pelo que esta questão não poderá ser agora conhecida.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>É certo que o artigo 15º do CIRE, conforme invoca o reclamante, prevê que o valor da causa comece por corresponder ao “valor do ativo do devedor indicado na petição” e possa vir a ser corrigido “logo que se verifique ser diferente o valor real”. </font>
</p><p><font>Não houve, nem o reclamante a invoca, qualquer decisão de alteração do valor fixado à causa, ainda que sem carácter de definitividade; o que significa que não é possível admitir o presente recurso, porque não foi definido para a causa um valor superior à alçada da Relação.</font>
</p><p><font>A tal conclusão não obsta a invocada inconstitucionalidade da interpretação das disposições conjugadas do artigo 14.° do CIRE e do n.° 1 do artigo 629.° do CPC, que serviram de fundamento ao despacho reclamado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na verdade, tal como se encontra configurada a situação em apreço, afigura-se-‑nos que não se verifica a invocada inconstitucionalidade, dado que está e foi garantido o direito constitucional de acesso ao tribunal e ao recurso. Este direito não é minimamente afetado quando está assegurado, como no caso, um duplo grau de jurisdição. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Estando garantido o direito a um duplo grau de jurisdição, cabe ao legislador fixar as regras sobre a recorribilidade e possibilidade de recurso. O triplo grau de jurisdição como pretende o reclamante só existe nos casos em que a lei determinar (art. 210.º, n.º 5 da CRP).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em consequência, faltando um dos pressupostos da revista normal – o valor da alçada – não poderá ser admitido o recurso com base na contradição de acórdãos dos tribunais superiores, como resulta da correta interpretação do art. 629.º, n.º 2, al. d) do CPC e do art. 14.º, n.º 1 do CIRE em conjugação com o art. 629.º, n.º 1 do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Improcedem, assim, todas as conclusões da alegação do reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<b><font>III</font></b>
<p><font> </font></p></div><br>
<font> Pelo exposto, indefere-se a reclamação e declara-se a não admissibilidade do recurso de revista, nos termos em que o fez o despacho reclamado.</font>
<p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Custas pelo reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Lisboa, 16 de Setembro de 2015</font></p><div><br>
<font> </font>
<p><font> </font></p></div><br>
<font>Maria Clara Sottomayor (Relatora)</font>
<p><font> </font></p><div><br>
<font> </font></div><br>
<font>Sebastião Póvoas</font>
<p><font> </font></p><div><br>
<font> </font></div><br>
<font>Alves Velho</font><b><font> </font></b></font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
gDFXu4YBgYBz1XKvnveD | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça</font><br>
<p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>I – Relatório </font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> </font><b><font>SPORTING CLUBE DE BRAGA,</font></b><font> notificado da Decisão Singular da Relatora que confirma o despacho reclamado (proferido pelo Tribunal da Relação), na parte em que neste não se admite o recurso de revista como revista “normal”, vem reclamar para a Conferência ao abrigo do disposto no artigo 652.º, n.º 3, do CPC, aplicável à revista por força da remissão do artigo 643.º, n.º 4, do CPC, com os seguintes fundamentos:</font><br>
</p><p><font>«1. O Recorrente, quando notificado do douto acórdão da Relação de Guimarães que confirmou o saneador-sentença que havia julgado a acção improcedente por não provada e absolvido o Réu AA dos pedidos, interpôs dele recurso de revista, nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><font>a) Interpôs recurso de revista “normal”, nos termos do disposto no artigo 671.º, n.º 1, do C.P.C.;</font><br>
</p><p><font>b) Interpôs também, prevenindo a hipótese de aquele não ser admissível, recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 672.º, n.º 1, al. </font><i><font>a),</font></i><font> do C.P.C., por estarem em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do Direito.</font><br>
</p><p><font>2. No que se refere ao recurso de revista “normal”, o Mmo. Desembargador Relator não o admitiu por entender que existe no processo dupla conforme, pelo que não eria admissível recurso ordinário de revista.</font><br>
</p><p><font>3. A Mma. Conselheira-Relatora, pronunciando-se sobre a reclamação deduzida pelo Recorrente, entendeu, quanto à questão da dupla conformidade, que </font><i><font>“tendo o Tribunal da Relação exercido os seus poderes de substituição, cumprindo o contraditório omitido no tribunal de 1.ª instância e decidido a questão da autoridade do caso julgado, ficou sanada a nulidade da sentença e estamos perante uma situação de dupla conformidade, impeditiva da revista normal”.</font></i><br>
</p><p><font>4. No entender do Recorrente, pese embora o douto entendimento contido na Decisão Singular a este respeito, não existe efectivamente dupla conformidade impeditiva da revista normal por não existirem duas pronúncias das instâncias sobre a questão da autoridade do caso julgado, razão pela qual deduz a presente reclamação para a Conferência, com os fundamentos que seguidamente expõe.</font><br>
</p><p><font>5. Como se disse, o recurso de revista “normal” foi rejeitado pela Mma. Conselheira Relatora por entender que existe dupla conforme, dado que a Relação usou os seus poderes de substituição e, cumprindo o contraditório omitido em Primeira Instância sobre a questão da autoridade do caso julgado, decidiu essa questão ficando assim sanada a nulidade da sentença recorrida.</font><br>
</p><p><font>6. O Recorrente permite-se discordar da afirmação de que a utilização dos poderes de substituição pela Relação, ao abrigo do artigo 665.º do C.P.C., sanou a nulidade da decisão recorrida — pelo menos se entendida com o sentido de que tal substituição convalida a decisão recorrida de modo a esta passar a valer com o sentido dado pela decisão do recurso.</font><br>
</p><p><font>7. Na realidade, e sempre ressalvado o respeito por diverso entendimento, afigura-se ao Recorrente que a substituição ao tribunal recorrido, quando o recurso se funda em nulidade da decisão recorrida, supõe que a Relação julgue nula esta decisão, caso em que, quando disponha dos elementos necessários para o efeito, a Relação pode ainda assim conhecer do objecto da apelação em lugar de ordenar a descida dos autos para ser proferida nova decisão pela Primeira Instância (artigo 665.º, n.º 1, do C.P.C.).</font><br>
</p><p><font>8. O que, aliás, é consonante com a constatação de que a substituição ao tribunal recorrido conduz à supressão de um grau de jurisdição (LEBRE DE FREITAS e RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3.º, tomo I, 2.ª ed., p. 132).</font><br>
</p><p><font>9. Assim, a sentença recorrida não fica sanada — pelo contrário, ela é julgada nula. O vício de que o processo padecia em resultado da sua nulidade é que é sanado por força da substituição da sentença recorrida pelo julgamento feito em sede de recurso.</font><br>
</p><p><font>10. Ora, se assim é, como parece dever ser, então não ocorre no processo dupla conforme e não tem aplicação o disposto no n.º 3 do artigo 671.º.</font><br>
</p><p><font>11. Na situação </font><i><font>sub judice, </font></i><font>a decisão proferida pela Relação assenta no juízo que a Relação fez sobre a existência de uma vinculação do Tribunal, na acção, ao decidido no recurso de revisão que foi interposto numa acção laboral que a precedeu.</font><br>
</p><p><font>12. Concretamente, entendeu a Relação que, tendo aquele recurso de revisão decidido pela não verificação da falsidade de um recibo de vencimento apresentado pelo aqui Réu na acção laboral, e sendo essa questão da falsidade do recibo causa de pedir da presente acção, tal questão não pode ser novamente apreciada e decidida sob pena de desrespeito pela autoridade do caso julgado ali formado.</font><br>
</p><p><font>13. Sucede que o acórdão recorrido reconhece, do mesmo passo, que a questão da autoridade do caso julgado não foi discutida em Primeira Instância, e reconhece também que isso é causa de nulidade do saneador-sentença por excesso de pronúncia, por constituir decisão-surpresa, em violação do contraditório.</font><br>
</p><p><font>14. É inequívoco o acórdão a este respeito: </font><i><font>“A sentença recorrida padece pois de nulidade por excesso de pronúncia, podendo este Tribunal supri-la ao abrigo do disposto no art. 665º, nº 1 do C. P. Civil”.</font></i><br>
</p><p><font>15. Usando os seus poderes de substituição, a Relação, tendo considerado que as partes tiveram oportunidade de discutir a questão nas alegações do recurso de apelação, conheceu do objecto do recurso.</font><br>
</p><p><font>16. Ora, daqui decorre que a questão da autoridade do caso julgado só foi efectivamente discutida nos autos uma única vez, perante a Relação, no recurso de apelação. E também só foi validamente apreciada uma vez, pela própria Relação, em decisão do recurso de apelação, uma vez que a decisão proferida em Primeira Instância é nula nessa parte.</font><br>
</p><p><font>17. Assim sendo, esta questão da autoridade do caso julgado constitui, no processo, uma questão nova que, para todos os efeitos, só foi discutida perante a Relação e validamente decidida pela Relação.</font><br>
</p><p><font>18. Por conseguinte, deve admitir-se o recurso de revista para se assegurar, relativamente a esta questão, um grau de recurso.</font><br>
</p><p><font>19. Assinale-se que, na doutrina e na jurisprudência do S.T.J., é reconhecido o direito a revista “normal” sempre que a Relação, no âmbito do recurso de apelação, apreciou uma questão nova que não foi contemplada na decisão da Primeira Instância e que justifica, por isso, que possa haver lugar à sua reapreciação pelo Supremo Tribunal (assim, ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, 7.ª ed., p. 430).</font><br>
</p><p><font>20. Ora, como se disse, deve ficar submetida ao mesmo regime a situação em que a questão é nova porque não foi suscitada e discutida em primeira instância, pelo que, apesar de ter sido objecto da sentença, tudo se passa como se tal não tivesse acontecido, uma vez que a sentença é nula nessa parte.</font><br>
</p><p><font>21. É essa, como se viu, a situação dos presentes autos relativamente à questão da autoridade do caso julgado, que indiscutivelmente constituiu a </font><i><font>ratio decidendi</font></i><font> do douto acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font>22. Por conseguinte, não ocorre dupla conforme que obste à admissão do recurso como revista “normal”, pelo que o recurso deve ser como tal admitido.</font><br>
</p><p><font>Termos em que deve julgar-se procedente a presente reclamação e, consequentemente, admitir-se o recurso de revista como revista “normal”, com as legais consequências — sem prejuízo de, caso assim não se entender, se manter a douta Decisão Singular de anulação do despacho reclamado e remessa do processo à Formação constituída nos termos do n.º 3 do artigo 672.º do C.P.C.».</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>2. AA, </font></b><font>Recorrido nos presentes autos, tendo sido notificado da Reclamação para a Conferência da decisão singular proferida pela Relatora, vem, nos termos dos artigos 643.º, n.º 2 do CPC, apresentar a sua resposta, nos termos e com os seguintes fundamentos:</font><br>
</p><p><font>«Entende o Reclamado que a Exma. Conselheira Relatora deveria ter decidido admitir a revista “normal”, uma vez que considera não existir dupla conforme.</font><br>
</p><p><font>A falta de fundamento para a pretensão manifestada pelo Reclamante resulta das razões que doutamente são explicitadas no douto despacho que não admite o recurso e que o Reclamante pretende colocar em crise - e que aqui se dão por reproduzidas -, as quais deverão levar necessariamente à sua confirmação.</font><br>
</p><p><font>Vejamos, pois:</font><br>
</p><p><font>Quer o Reclamante ficcionar como admissível um Recurso de Revista (seja ao abrigo do normal regime previsto no artigo 671.º nº 1 do CPC, seja a título excecional, em consonância com o disposto nos artigos 671.º nº 3, </font><i><font>in fine</font></i><font> e 672° do mesmo diploma), o que faz não só ao arrepio da lei aplicável, como, ademais, com assento em supostos factos, inteiramente falsos, que sem qualquer pejo apresenta como verdadeiros.</font><br>
</p><p><font>Em primeiro lugar, por forma a tentar justificar a sua posição, vem o Reclamante invocar a inexistência da chamada “dupla conforme”.</font><br>
</p><p><font>No entanto, efetivamente foi isso que se verificou, pelo que o presente recurso não é admissível e, como tal, bem andou a Exma. Conselheira Relatora em negar o recurso com base nesta premissa.</font><br>
</p><p><font>De forma sintética, RUI PINTO elucida que a existência de “dupla conforme” pressupõe um requisito subjetivo (ausência de voto de vencido) e dois requisitos objetivos</font><br>
</p><p><font>– (i) a conformidade decisória (reportado à decisão) e a (ii) conformidade essencial de fundamentação (incidindo sobre a fundamentação).</font><br>
</p><p><font>Na situação dos autos verifica-se que a Relação confirmou a sentença da primeira instância (confirmação decisória recorrida) e confirmou exaustivamente cada um dos fundamentos aduzidos da sentença (“a decisão proferida no recurso de revisão impõe a sua autoridade à presente” e que “a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado”).</font><br>
</p><p><font>Neste contexto, porque o fundamento da força do caso julgado material foi confirmado em ambas as instâncias, há conformidade de fundamentação, logo dupla conforme.</font><br>
</p><p><font>De facto, é esse o entendimento da douta decisão recorrida: “Relativamente à questão da dupla conformidade entendo que, tendo o Tribunal da Relação exercido os seus poderes de substituição, cumprindo o contraditório omitido no tribunal de 1.ª instância e decidido a questão da autoridade do caso julgado, ficou sanada a nulidade da sentença e estamos perante uma situação de dupla conformidade, impeditiva da revista normal.”</font><br>
</p><p><font>Assim, ainda que se considere que o Reclamante não teve oportunidade de se pronunciar sobre o caso julgado em primeira instância, a verdade é que o Venerando Tribunal da Relação colmatou essa falha, a existir.</font><br>
</p><p><font>Como tal, não pode o Reclamante alegar que não teve oportunidade de emitir a sua opinião sobre a autoridade do caso julgado, e que essa questão apenas foi discutida perante a Relação.</font><br>
</p><p><font>Acresce, ainda, que a questão da omissão do contraditório, sendo causa que pode influir na decisão da causa, se configura como uma nulidade que deveria ter sido arguida perante o tribunal de primeira instância e não perante o tribunal de recurso! –</font><br>
</p><p><font>“Não se pondo em causa que a omissão em causa é suscetível de influir na decisão da causa, tal nulidade deveria ter sido invocada no prazo de 10 dias, a contar do conhecimento da mesma, perante o tribunal onde foi cometida.”</font><br>
</p><p><font>Em todo o caso, como se considera na douta decisão singular recorrida, mesmo admitindo-se que a arguição da existência de uma nulidade decorrente da violação do princípio do contraditório possa ocorrer em sede de recurso interposto da decisão, o Tribunal da Relação supriu a mesma ao abrigo do disposto no art.º 665º, nº 1 do C. P. Civil.</font><br>
</p><p><font>E verifica-se que, no caso, o Reclamante pronunciou-se sobre a autoridade do caso julgado no seu recurso e o Reclamado teve igual oportunidade de se pronunciar nas suas contra-alegações, estando assim cumprido o contraditório. </font><br>
</p><p><font>Assim sendo, como se entende ser, falece o argumento do Reclamante, que invoca a questão da omissão de contraditório como forma de se “esquivar” da dupla conforme e, consequentemente, procurar encontrar um argumento para conseguir a admissão da revista.</font><br>
</p><p><font>Nessa conformidade, e tendo em conta tudo quanto foi exposto, só se pode concluir que a decisão não merece censura.</font><br>
</p><p><font>TERMOS EM QUE,</font><br>
</p><p><font>como certamente Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser negado provimento à Reclamação e manter-se a douta decisão recorrida e, deste modo, farão V/ Exas. a tão acostumada</font><br>
</p><p><font>JUSTIÇA !».</font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>II – Fundamentação</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> A questão </font><i><font>decidenda</font></i><font> diz respeito à existência ou inexistência de dupla conforme num caso em que o acórdão da Relação, declarando a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, com base na violação do princípio do contraditório, vem, exercendo o seu poder de substituição, a adotar uma decisão idêntica à do tribunal de 1.ª instância e com o mesmo fundamento, sem que haja qualquer voto de vencido no acórdão do tribunal superior.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>2.</font></b><font> Tendo sido proferida decisão singular que entendeu verificada a dupla conforme e remeteu o processo para a formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, o recorrente, agora reclamante, entende que </font><i><font>“a</font></i><font> </font><i><font>questão da autoridade do caso julgado constitui, no processo, uma questão nova que, para todos os efeitos, só foi discutida perante a Relação e validamente decidida pela Relação. Por conseguinte, deve admitir-se o recurso de revista para se assegurar, relativamente a esta questão, um grau de recurso.</font></i><font>” Por seu lado, o recorrido, agora reclamado, entende que o reclamante apenas pretende furtar-se à dupla conformidade em virtude de o tribunal de 1.ª instância ter omitido o contraditório em relação à questão da autoridade do caso julgado, contraditório que foi cumprido pelo Tribunal da Relação, assim se sanando o vício. </font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Com relevância para a decisão a proferir, cumpre considerar os seguintes elementos:</font>
</p><p><font>3.1. Em 17-11-2021, foi proferido despacho saneador-sentença que concluiu pela verificação da exceção de autoridade do caso julgado e, em consequência, absolveu o réu dos pedidos formulados pelo autor;</font>
</p><p><font>3.2. O recorrente interpôs recurso de apelação, invocando, no que aqui releva, a nulidade da sentença da 1.ª instância por violação do princípio do contraditório e ainda por excesso de pronúncia por ter o tribunal da 1.ª instância conhecido de matéria que não lhe era lícito conhecer.</font>
</p><p><font>3.3. O Tribunal da Relação proferiu acórdão, tendo concluído pela nulidade do saneador-sentença, por excesso de pronúncia, com o seguinte fundamento:</font>
</p><p><font>«A sentença recorrida padece pois de nulidade por excesso de pronúncia, podendo este Tribunal supri-la ao abrigo do disposto no art. 665º, nº 1 do C. P. Civil. </font>
</p><p><font>No caso, o Recorrente, no seu recurso, já se pronunciou sobre a autoridade do caso julgado e o Réu, ao serem-lhe notificadas as alegações do recurso interposto pelo Autor, teve igual oportunidade, estando cumprido o contraditório relativamente a tal matéria, pelo que, atualmente, não há qualquer necessidade de fazer cumprir o preceituado nos arts. 3º, nº 3 ou no 665º, nº 3, ambos do C. P. Civil, estando, pois, o presente processo pronto para se conhecer do objeto da apelação, o que se irá fazer de seguida».</font>
</p><p><font>3.4. Nessa sequência o Tribunal da Relação, considerando ter sido já cumprido o contraditório quanto à matéria da autoridade do caso julgado e fazendo uso dos seus poderes de substituição proferiu, de imediato, decisão quanto à mencionada exceção de autoridade do caso julgado, deixando escrito, a esse propósito, que “</font><i><font>concorda-se, pois, com a decisão recorrida ao considerar que a decisão proferida no recurso de revisão impõe a sua autoridade à presente, sendo certo que, como é entendimento dominante da jurisprudência a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado, pois, como refere Rui Pinto (ob. cit, pág. 19) “a parte dispositiva constitui a conclusão decorrente de silogismos internos de uma decisão, nos quais os fundamentos de facto ou de direito são as permissas. (…) Em suma: apenas à luz dos fundamentos de uma decisão se pode dar a qualificação jurídica à parte dispositiva. O título jurídico de onde emanam os afeitos para a esfera do destinatário da decisão é, assim, a parte dispositiva nos termos dos fundamentos</font></i><font>.”.</font>
</p><p><font>3.5. O Tribunal da Relação julgou, assim, improcedente o recurso de apelação, proferindo o seguinte dispositivo:</font><i><font> «Pelo exposto, decide-se julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida».</font></i>
</p><p><font>3.6. O sumário do acórdão da Relação foi o seguinte:</font>
</p><p><font>«1 – Quando há violação do princípio do contraditório, constituindo a sentença uma decisão surpresa, a nulidade processual decorrente dessa violação é consumida por uma nulidade da sentença por excesso de pronúncia, dado que, sem a prévia audição das partes, o tribunal não podia conhecer do fundamento que utilizou na sua decisão. </font>
</p><p><font>2 – O Tribunal de recurso pode suprir tal nulidade ao abrigo do disposto no art. 665º, nº 1 do C. P. Civil, uma vez que o Recorrente, no seu recurso, já se pronunciou sobre a matéria analisada na decisão surpresa e o Réu, ao serem-lhe notificadas as alegações do recurso interposto pelo Autor, teve igual oportunidade, estando cumprido o contraditório relativamente a tal matéria, não havendo nesta fase necessidade de fazer cumprir o preceituado nos arts. 3º, nº 3 ou no 665º, nº 3, ambos do C. P. Civil, estando o processo pronto para se conhecer do objeto da apelação. </font>
</p><p><font> 3 - A autoridade de caso julgado tem a ver com a existência de relação de prejudicialidade entre ações, quando a decisão de uma pode afetar o julgamento a proferir na outra». </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>4.</font></b><font> Chegados aqui, cumpre tomar posição quanto à eventual verificação de uma situação de dupla conformidade decisória, sendo certo que como as partes reconhecem a fundamentação propugnada pelas instâncias é, na sua essência, a mesma. </font>
</p><p><font>A questão que se coloca é, então, a de saber se a anulação da sentença da 1.ª instância seguida do proferimento de acórdão pelo Tribunal da Relação com o mesmo teor pode ser equiparada à confirmação da sentença da 1.ª instância para efeitos de verificação de uma situação de dupla conforme, ou se, pelo contrário, como defende o recorrente, o modelo da substituição conduz à supressão de um grau de jurisdição.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>5.</font></b><font> Dispõe o artigo 665.º, n.º 1, do CPC que “</font><i><font>Ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação</font></i><font>.”.</font>
</p><p><font>Vigora na nossa ordem jurídica, o modelo de substituição ou de plena jurisdição, que implica que a procedência do recurso pode ter por consequência apenas a revogação (ou a anulação) da decisão recorrida ou, cumulativamente, a sua revogação e a sua substituição por outra</font><i><font>. </font></i><font>Designa-se este regime</font><i><font> </font></i><font>de </font><i><font>recurso de substituição ou substitutivo</font></i><font>.</font><i><font> </font></i><font>Este modelo é o predominante no nosso sistema de recursos: a procedência do recurso importa, em regra, além da revogação da decisão impugnada, a sua substituição por outra emitida pelo tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>.</font><i><font> </font></i><font>A doutrina tem entendido que esta regra da substituição (da Relação) ao tribunal recorrido acarreta, na hipótese prevista no n.º 2 do artigo 665º e, por vezes, também na do seu nº 1, a supressão de um grau de jurisdição e, consequentemente, a instituição de uma instância única (cfr. Carlos Ferreira de Almeida, </font><i><font>Direito Processual Civil,</font></i><font> Vol. II, Almedina, 2020, pp. 466 e 559). </font>
</p><p><font>Como afirma Abrantes Geraldes (in </font><i><font>Recursos em Processo Civil</font></i><font>, 6.ª edição atualizada, Almedina, Coimbra, 2020, p. 381): </font><i><font>«(…) a anulação da decisão (v.g. por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objeto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nesta eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo. Ao invés, deve prosseguir com a apreciação das demais questões que tenham sido suscitadas, conhecendo do mérito da apelação, nos termos do art. 665.º, n.º 2».</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Todavia, a afirmação de que, nos casos de nulidade da sentença, existe apenas uma única decisão, a que substitui a declarada nula, não tem por consequência automática que na situação destes autos, em que o acórdão do Tribunal da Relação declarou a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, mas, supriu a mesma e decidiu do mesmo modo e com o mesmo fundamento do 1.º grau, confirmando-a, fique afastada a dupla conformidade para o efeito da aferição do acesso ao segundo grau de recurso. </font>
</p><p><font>Há que atender ao fundamento da nulidade da sentença. </font>
</p><p><font>Vejamos:</font>
</p><p><font>Tratando-se de uma nulidade por omissão de pronúncia fica afastada a dupla conforme, pois, se o tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font> suprir a nulidade, decide necessariamente uma questão nova e com uma fundamentação essencialmente diferente</font><i><font> </font></i><font>(cfr. Acórdãos de 11-03-2021, proc. n.º 1299/17.9T8LRA.C1.S1 e de 12-01-2021, proc. n.º 379/13.4TBGMR-B.G1.S1). </font>
</p><p><font>Se a nulidade se basear em falta de fundamentação de facto ou de direito também não se verifica dupla conformidade, </font><i><font>«pois carecendo a sentença de fundamentação de direito não poder dizer-se que a fundamentação do acórdão não é “essencialmente diferente” (art. 671.º, n.º 3, do CPC)»</font></i><font> (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21-01-2021, proc. n.º 268/12.0TBMGD-A.G1.S1).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>6.</font></b><font> Todavia, no caso que nos ocupa, a conclusão é diferente. Estamos perante uma nulidade por excesso de pronúncia por violação do princípio do contraditório no tribunal de 1.ª instância. Esta nulidade foi suprida pelo Tribunal da Relação, notificando as partes para se pronunciarem, tendo depois o Tribunal da Relação conhecido do objeto do recurso e confirmado a sentença de 1.ª instância. É certo que, no plano jurídico-formal, existe apenas uma única decisão sobre a matéria em crise nos autos, mas no plano substancial, após a sanação do vício, pode dizer-se que existem duas decisões que se pronunciaram do mesmo modo sobre as mesmas questões, não se podendo ignorar que entre essas decisões se verifica uma sobreposição </font><i><font>material</font></i><font>, quer no dispositivo, quer na fundamentação. </font>
</p><p><font>A aparente simplicidade do artigo 671.º, n.º 3, do CPC não deixa de exigir algum esforço interpretativo, evitando a afirmação de uma desconformidade ou de uma conformidade aferidas exclusivamente por critérios formais. Tem-se entendido que o critério deve ser substancial e aferido em função da finalidade do regime da dupla conformidade: a racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.</font>
</p><p><font>Assim, atendendo à razão de ser da irrecorribilidade das situações de dupla conformidade – o presumido acerto da decisão coincidente em ambas as instâncias e a finalidade de concentrar o Supremo Tribunal de Justiça em casos complexos e que gerem dúvidas ou decisões contraditórias – tem que se constatar que, não obstante a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, houve, no plano substancial, uma dupla apreciação da matéria em crise, suscetível de dispensar o terceiro grau de recurso como revista normal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>7. </font></b><font>Tendo o recorrente invocado também, subsidiariamente, o recurso de revista excecional ao abrigo do artigo 672.º do CPC, deve remeter-se o processo à Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, para apreciação dos requisitos específicos desta espécie de recurso extraordinário expostos pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>8.</font></b><font> </font><b><font>Anexa-se sumário elaborado de acordo com o artigo 663.º, n.º 7, do CPC:</font></b><font> </font>
</p><p><font>I – Vigora no nosso sistema de recursos um modelo</font><i><font> de substituição ou substitutivo</font></i><font>, de acordo com o qual a procedência do recurso importa, em regra, além da revogação da decisão impugnada, a sua substituição por outra emitida pelo tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>.</font>
</p><p><font>II - Atendendo à razão de ser da irrecorribilidade das situações de dupla conformidade – o presumido acerto da decisão coincidente em ambas as instâncias e a finalidade de concentrar o Supremo Tribunal de Justiça em casos complexos e que gerem dúvidas ou decisões contraditórias – tem que se constatar que, não obstante a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, houve, no plano substancial, uma dupla apreciação da matéria em crise, suscetível de dispensar o terceiro grau de recurso como revista normal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>III – Decisão</font></b>
</p><p><font>Pelo exposto, indefere-se a reclamação, mantendo-se o despacho da Relatora e determinando-se a subida do recurso. </font>
</p><p><font>Custas pelo reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Lisboa, 17 de janeiro de 2022</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor (Relatora)</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Pedro de Lima Gonçalves (1.º Adjunto)</font>
</p><p><font> </font>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2.ª Adjunta) </font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
1jJ1u4YBgYBz1XKvbAt6 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b>
<p><b><font> </font></b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> I - Relatório</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>1. AA, Lda, </font></b><font>ré e recorrente, identificada nos autos à margem referenciados,</font><b><font> </font></b><font>interpôs recurso de revista do acórdão da Relação de Coimbra, que julgou improcedente o recurso de apelação e manteve a decisão recorrida, ainda que com um fundamento distinto. Mais afirmou que o recurso de revista seria de admitir como revista excecional, ao abrigo do artigo 672.º, n.º1, al. c), do CPC, por o acórdão de que pretende recorrer estar em oposição com outro, no domínio da mesma legislação e que decidiu, de forma divergente, a mesma questão de direito, tendo para o efeito juntado acórdãos fundamento, proferidos pelos tribunais superiores.</font>
</p><p><font>O Tribunal da Relação de Coimbra, classificando o caso como de dupla conformidade absoluta, não admitiu o recurso de revista excecional, por entender que se encontrava não verificado o requisito do valor da ação.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>2. AA, Lda,</font></b><font> tendo sido notificada do despacho de não admissão do recurso de Revista Excecional para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), veio dele reclamar, nos termos e para os efeitos do artigo 643.º do Código de Processo Civil (CPC), na medida em que se lhe afigura errónea a interpretação havida no que concerne à verificação dos pressupostos gerais de recorribilidade, designadamente à verificação do valor de ação para o efeito de apreciação de admissão de revista excecional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por decisão singular, datada de 2 de outubro de 2019, a Relatora indeferiu a reclamação e confirmou a decisão reclamada, com a seguinte fundamentação:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>«A presente ação foi instaurada em 2017 e o acórdão recorrido data de 20 de fevereiro de 2019, já após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.</font>
</p><p><font>Assim, o regime recursório aplicável aos presentes autos, no que respeita à interposição e alegação do recurso de revista, atenta a data em que foi proferido o acórdão recorrido, é já o do novo Código de Processo Civil, por força do princípio da aplicação imediata da lei processual.</font>
</p><p><font>A reclamante interpôs recurso de revista, ao abrigo do artigo 671.º, n.ºs 1 e 3, do CPC, entendendo que não estão verificados os requisitos de dupla conformidade, por ter sido essencialmente diferente a fundamentação da sentença de 1.ª instância e do acórdão do Tribunal da Relação.</font>
</p><p><font>Subsidiariamente, interpõe revista excecional, por o acórdão de que pretende recorrer estar em oposição com outro, proferido por alguma das relações, ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e que haja decidido de forma divergente a mesma questão fundamental de direito e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 686.º e 687.º do CPC, jurisprudência com ele conforme.</font>
</p><p><font>O Tribunal da Relação entendeu que se verificava uma situação de dupla conformidade absoluta, pelo que não haveria fundamento para recurso do acórdão recorrido.</font>
</p><p><font>Porém, uma vez que a recorrente invoca também o recurso de revista excecional, o Tribunal da Relação, ao verificar os pressupostos gerais de recorribilidade, entendeu que, tendo presente que o valor da ação, de montante equivalente ao valor do pedido – 16.510, 37 euros, acrescidos de juros de mora – é inferior à alçada do tribunal da Relação (30.000 euros), o recurso não é admissível.</font>
</p><p><font>A reclamante discorda da decisão, invocando a norma do artigo 629.º, n.º 2, do CPC, segundo a qual «Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso», indicando, designadamente, as alíneas c) e d) da citada norma do CPC.</font>
</p><p><font>Contudo, não tem razão.</font>
</p><p><font>Na verdade, existe já uma jurisprudência sedimentada, neste Supremo Tribunal de Justiça, que interpreta as normas do CPC relativas ao recurso de revista excecional, como condicionando sempre a admissibilidade desta espécie de recurso aos requisitos gerais de admissibilidade do recurso de revista, inclusive ao requisito do valor e da sucumbência, mesmo nos casos de oposição de julgados.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Nestes termos, </font><i><font>vide</font></i><font> o Acórdão de 04-07-2017, Reclamação n.º 224/08.2TBESP.1.P2-B.S1 - 1.ª Secção, em cujo sumário se afirma que:</font>
</p><p><font> «Só é admissível recurso de revista excepcional, caso se verifiquem os pressupostos gerais atinentes ao valor da causa e à sucumbência. II - Sendo o valor da causa (€ 28 481, 80) inferior à alçada do tribunal da Relação (€ 30 000), não é admissível recurso de revista, excepcional ou normal (art. 629.º, n.º 1, do CPC e o actual art. 44.º da LOSJ). III - A jurisprudência, designadamente a do TC, vem assumindo que, no nosso ordenamento jurídico, o direito de acesso aos tribunais, em matéria cível, não integra forçosamente um triplo ou, sequer, um duplo grau de jurisdição, apenas estando vedado ao legislador ordinário o estabelecimento do conteúdo do genérico direito ao recurso de actos jurisdicionais com uma redução intolerável ou arbitrária, arbitrariedade que não afecta, manifestamente, o disposto na norma do art. 629.º, n.º 1, do CPC». </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No mesmo sentido o acórdão deste Supremo Tribunal, de 20-12-2017 (2841/16.8T8LSB.L1.S1), conclui o seguinte:</font>
</p><p><font>«III- A lei processual civil consagra, quanto à admissibilidade de recurso, um regime que o faz depender, cumulativamente, do valor da causa (alçada) e do valor da sucumbência (da perda, do decaimento relativamente ao(s) pedido(s) formulado(s)), relevando, no entanto, apenas aquele, em caso de fundada dúvida sobre este.</font>
</p><p><font>IV – No presente caso a Reclamante/Recorrente invoca a contradição do Acórdão recorrido com outros Acórdãos proferidos pelos Tribunais da Relação do Porto, Coimbra e Guimarães (art. 629º, nº 2, alínea d), do CPC). Sucede que, para além da existência da contradição de Acórdãos no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, o art. 629º, n.º 2, al. d), exige também que do Acórdão recorrido “… não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal…”. Nessa medida, a previsão do art. 629º, n.º 2, al. d), do CPC, não é aplicável ao caso </font><i><font>sub judice</font></i><font>, uma vez que o Acórdão recorrido não é passível de recurso ordinário justamente por causa da alçada do Tribunal e não por qualquer outro motivo legal estranho àquele requisito.</font>
</p><p><font>V – O recurso de revista excepcional não constitui uma modalidade extraordinária de recurso, mas antes um recurso ordinário de revista, criado pelo legislador, na reforma operada ao Código de Processo Civil, com vista a permitir o recurso nos casos em que o mesmo não seja admissível em face da dupla conformidade de julgados, nos termos do art. 671º, nº 3, do CPC, e desde que se verifique um dos requisitos consagrados no art. 672º, nº 1, do mesmo Código. Por conseguinte, a sua admissibilidade está igualmente dependente da verificação das condições gerais de admissão do recurso de revista, como sejam o valor da causa e o da sucumbência, exigidas nos termos enunciados pelo nº 1, do art. 629º, do CPC.»</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> No mesmo sentido, veja-se, também, entre outros, o acórdão de 17-11-2015 (proc. n.º 3709/12.2YYPRT.P1.S1), onde se entendeu estar a admissibilidade do recurso de revista excecional baseado em oposição de acórdãos relativamente à mesma questão de direito ou em violação de jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal dependente do critério do valor da ação.</font>
</p><p><font>Esta interpretação normativa está em conformidade com a Constituição, pois o artigo 20.º da CRP não impõe um segundo grau de recurso e admite, por razões de racionalidade, a estipulação pelo legislador ordinário de critérios de admissibilidade do recurso que tenham em conta o valor da ação.</font>
</p><p><font> Também não é violado o princípio da igualdade, ínsito no artigo 13.º da CRP. As alçadas, bem como todos os mecanismos de 'filtragem' de recursos, originam desigualdades (partes há que podem recorrer e outras não), mas estas não se configuram como discriminatórias, já que todas as ações contidas no espaço de determinada alçada são, em matéria de recurso, tratadas da mesma forma. </font>
</p><p><font>O legislador dispõe de margem de determinação para fazer prevalecer, em matéria de recurso para o Supremo, a racionalização do sistema judiciário, de forma a evitar que toda e qualquer questão possa ser submetida a um terceiro grau de jurisdição. </font>
</p><p><font> A existência de limitações de recorribilidade, designadamente através do estabelecimento de alçadas (de limites de valor até ao qual um determinado tribunal decide sem recurso), funciona como mecanismo de racionalização do sistema judiciário, permitindo que o acesso à justiça não seja, na prática, posto em causa pelo colapso do sistema, decorrente da chegada de todas (ou da esmagadora maioria) das ações aos diversos 'patamares' de recurso. </font>
</p><p><font>A interpretação adotada pelo Tribunal da Relação não fere assim qualquer preceito nem princípio constitucional».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>3.</font></b><font> Inconformada a reclamante, </font><b><font>AA, Lda,</font></b><font> veio, nos termos do artigo 652.º, n.º 3, do CPC, apresentar reclamação para a conferência, formulando alegações, que aqui se consideram integralmente reproduzidas, nas quais conclui que:</font>
</p><p><i><font> «Não se compreende assim a não admissão do recurso interposto com sustento em não verificação do requisito do valor, que se afigura manifestamente ilegal, violando os princípios da legalidade, da igualdade, da realização da justiça, do acesso ao direito, e da certeza e segurança jurídica, plasmados na Constituição da República Portuguesa (CRP).</font></i>
</p><p><i><font>Assim, e porque a lei directa e expressamente determina e prevê a derrogação do dito critério do valor, deve o recurso ser deferido/recebido e devidamente tramitado».</font></i>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font> Cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font> II - Fundamentação</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>1.</font></b><font> A reclamante defende que a orientação adotada na decisão singular, para além de não ser unânime, é </font><i><font>contra legem</font></i><font>, entendendo que o recurso de revista excecional é sempre admissível, independentemente do valor e da sucumbência nos casos das alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil. Afirma a reclamante que, não obstante existir uma corrente jurisprudencial no Supremo Tribunal de Justiça que procede a uma interpretação conjunta dos artigos 671.º, n.º1, 672.º, n.º 1, al. c), e 629.º, n.º 2, do CPC, no sentido de a admissibilidade da revista excecional estar sempre dependente da verificação dos requisitos da revista geral, designadamente do requisito da alçada, mesmo nos casos de contradição de acórdãos, esta interpretação viola a letra da lei e o seu espírito, bem como normas e princípios constitucionais designadamente os princípios da legalidade, da igualdade, da realização da justiça, do acesso ao direito, e da certeza e segurança jurídica, plasmados na Constituição da República Portuguesa (artigos 3.º, 13.º, 20.º e 266.º da CRP), bem como o princípio da separação dos poderes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Contudo, não tem razão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na verdade, a orientação jurisprudencial agora impugnada reporta-se à redação atual das normas do Código de Processo Civil.</font>
</p><p><font>As normas aplicáveis dispõem o seguinte:</font>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<font> Artigo 629.º</font>
<p><font>Decisões que admitem recurso</font></p></div><br>
<font>1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.</font>
<p><font>2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:</font>
</p><p><a></a><font>a) (…)</font>
</p><p><font>b) (…)</font>
</p><p><font>c) (…)</font>
</p><p><font>d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário </font><b><font>por motivo estranho à alçada do tribunal</font></b><font>, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme. (realce nosso)</font>
</p><p><font>3 - (…)</font>
</p><p><font>a) (…)</font>
</p><p><font>b) (…)</font>
</p><p><font>c) (…)</font></p><div><br>
<font>Artigo 671.º</font>
<p><font>Decisões que comportam revista</font></p></div><br>
<font>1 - Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, </font><a></a><font>absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos.</font>
<p><font>2 - (…)</font>
</p><p><font>3 - Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.</font>
</p><p><font>4 - (…)</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<font>Artigo 672.º - Revista excecional</font></div><br>
<font> 1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando:</font>
<p><font> a) ….</font>
</p><p><font> b) ….</font>
</p><p><font> c) O acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem entendido que só é admissível recurso de revista excecional, baseado em oposição de acórdãos relativamente à mesma questão de direito ou em violação de jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal caso se verifiquem os pressupostos gerais atinentes ao valor da causa e à sucumbência (cfr., entre outros, Acórdãos de 04-07-2017, Reclamação n.º 224/08.2TBESP.1.P2-B.S1 e o acórdão de 17-11-2015, proc. n.º 3709/12.2YYPRT.P1.S1).</font>
</p><p><font>A interpretação das normas relativas à admissibilidade do recurso de revista deve ser feita de forma conjugada e atendendo a todos os elementos de interpretação da teoria do direito. O reclamante baseia essencialmente a sua tese na letra do artigo 629.º, n.º 2, do CPC, na parte em que o legislador afirma “independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso”, sem a conjugar com a expressão constante da al. </font><i><font>d)</font></i><font> do n.º 2 do artigo 629.º, que se refere ao «motivo estranho à alçada», nem com a </font><i><font>ratio</font></i><font> das normas que definem os pressupostos do recurso de revista geral e do recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, designadamente os artigos 671.º e 672.º do CPC.</font><br>
<font>A letra da lei consiste apenas num ponto de partida, que deve ser ponderado juntamente com o elemento histórico, racional e sistemático de interpretação, para, assim, reconstituir o pensamento legislativo.</font><br>
<font>Vejamos:</font><br>
<font>O recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea </font><i><font>d)</font></i><font>, do atual CPC, reintroduzido pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, encontra o seu precedente histórico no artigo 678.º, n.º 4, do CPC anterior à Reforma de 2007. Este último preceito foi, por sua vez, introduzido no regime de recursos civis pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro, dispondo que </font><i><font>«É sempre admissível recurso, a processar nos termos dos </font></i><a></a><i><font>artigos 732.º-A e 732.º-B, do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se a orientação nele perfilhada estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça».</font></i><font> Tal redação foi alterada pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março, que suprimiu a referência ao processamento do recurso nos termos dos artigos 732.º-A e 732.º-B do CPC. </font><br>
<font>O Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, que operou a reforma do CPC anterior à vigente, centrada essencialmente em matéria de recursos e movida por objetivos de simplificação, celeridade processual e racionalização no acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, acentuou, deste modo, a sua função de orientação e uniformização de jurisprudência, revogando o </font><a></a><font>artigo 678.º, n.º 4, do CPC. </font><br>
<font> O recurso prescrito na alínea </font><i><font>d)</font></i><font> do n.º 2 do artigo 629.º do CPC tem como justificação o objetivo de garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações, em matérias que, por motivos de ordem legal que não dizem respeito à alçada do tribunal, nunca poderiam vir a ser apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça – como por exemplo, em sede de insolvência (artigo 14.º, n.º 1, do CIRE), expropriações (artigo 66.º, n.º 5, do Código das Expropriações) ou providências cautelares (artigo 370.º, n.º 2, do CPC). </font><br>
<font>No mesmo sentido, a doutrina (Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 2 de junho de 2015, Blog do IPPC (Instituto Português de Processo Civil), disponível em </font><a><u><font>https://blogippc.blogspot.com/2015/06/jurisprudencia-157.html</font></u></a><font>), entende que «o art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC só é aplicável se houver uma exclusão legal da revista por um motivo que nada tenha a ver com a relação entre o valor da causa e a alçada do tribunal ou, mais em concreto, se a lei excluir a admissibilidade de uma revista que, de outro modo, seria admissível». Afirma o autor que «há uma (boa) razão de ordem sistemática para se entender que o disposto no art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC não pode dispensar a admissibilidade da revista nos termos gerais (sendo nomeadamente necessário, para a admissibilidade da revista, que o valor da causa exceda a alçada da Relação)», desde logo, porque «se todos os acórdãos da Relação em contradição com outros acórdãos da Relação admitissem a revista "ordinária" nos termos do art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC, deixaria necessariamente de haver qualquer justificação para construir um regime de revista excecional para a contradição entre acórdãos das Relações tal como se encontra no art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC». Assim, defende que «a única forma de atribuir algum sentido útil à contradição de julgados das Relações que consta, em sede de revista excecional, do art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC é pressupor que a revista "ordinária" não é admissível sempre que se verifique essa mesma contradição», na medida em que só «nesta base é possível compatibilizar a vigência do art. 672.º, n.º 1, al. c), CPC com a do art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC». </font><br>
<font>Resumindo o que entende ser a fórmula que traduz a teleologia do «art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC», o mesmo autor conclui que «este preceito estabelece uma recorribilidade para acórdãos que são recorríveis nos termos gerais e irrecorríveis por exclusão legal», justificando que dada a «exclusão da revista por um critério legal independente da relação do valor da causa com a alçada do tribunal, há que instituir um regime que permita que o STJ possa pronunciar-se (e, nomeadamente, uniformizar jurisprudência) sobre matérias relativas aos procedimentos cautelares e aos processos de jurisdição voluntária», sendo que é «precisamente essa a função do disposto no art. 629.º, n.º 2, al. d), CPC».</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>O artigo 671.º, n.º 1, do CPC vigente, cuja epígrafe se cifra em «Decisões que comportam revista», integrando-se no Capítulo III, atinente ao recurso de revista, consiste numa norma de enquadramento que delimita, em termos gerais, o recurso de revista, cuja amplitude se justifica, como refere Armindo Ribeiro Mendes (Recursos em Processo Civil, Reforma 2007, Coimbra Editora, 2009, p. 143) por uma «política assumida de restringir o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça». De facto, a limitação do acesso ao órgão de cúpula da ordem jurisdicional tem sido uma preocupação do legislador manifestamente presente nas últimas reformas do sistema de recursos em processo civil, com maior expressão na reforma de 2007 (operada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto), que incidiu fortemente na disciplina dos recursos, na qual se assumiu expressamente o desiderato de «dar resposta à notória tendência de crescimento de recursos cíveis entrados neste [Supremo Tribunal de Justiça], (…) assim criando condições para um melhor exercício da sua função de orientação e uniformização da jurisprudência». </font><br>
<font>No CPC aprovado pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, no n.º 1 do artigo 721.º, antecessor do atual n.º 1 do artigo 671.º do CPC, dispunha-se que «cabe recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação proferido ao abrigo do n.º 1 e da alínea </font><i><font>h)</font></i><font> do n.º 2 do artigo 691.º», isto é, do acórdão que se pronuncie sobre decisão do tribunal de 1.ª instância que ponha termo ao processo ou que, sem pôr termo ao processo, decida, por despacho saneador, do mérito da causa». Já no sistema de recursos anterior à reforma de 2007, o artigo 721.º, n.º 1, do CPC, preceituava que «cabe recurso de revista do acórdão da Relação que decida do mérito da causa», tomando, assim, por referência, para a admissibilidade do recurso de revista, o conteúdo do acórdão proferido pela Relação, independentemente do sentido da decisão proferida em 1.ª instância. </font><br>
<font>Na reforma de 2013, o setor dos recursos não sofreu alterações substanciais, tendo o legislador sido sensível ao facto de a reforma de 2007 estar ainda numa fase muito inicial, que «desaconselhava uma remodelação do quadro legal instituído» (</font><i><font>vide </font></i><font>Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII). Logo, o CPC de 2013 manteve presente os objetivos da reforma de 2007, designadamente, o de racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, que se concretizou com o «aumento do valor das alçadas e as restrições específicas ao recurso de revista», deste modo, permitindo «requalificar a função» de tal instância superior (</font><i><font>vide</font></i><font> Abrantes Geraldes, </font><i><font>Recursos no Novo Código de Processo Civil,</font></i><font> Almedina, 2013, p. 14). </font><br>
<font>Assim, tem sido apanágio das reformas legislativas operadas em matéria de recursos cíveis a compatibilização entre o direito ao recurso, que visa potenciar a segurança jurídica, e a necessidade de racionalizar, de modo equilibrado, a gestão dos meios humanos e materiais, atribuindo-se, sucessivamente, um caráter excecional à intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, que se pretende reservado para as questões de maior merecimento jurídico.</font><br>
<font>A limitação da admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, contra a qual o reclamante se insurge, entendendo que a mesma padece de ilegalidade e de inconstitucionalidade, resulta da </font><i><font>ratio</font></i><font> do recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea </font><i><font>d)</font></i><font>, do CPC – que visa garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações em processos que, pela especialidade da matéria, não têm possibilidade de alcançar o Supremo Tribunal de Justiça, por nunca ser admissível o recurso de revista </font><b><font>por motivo estranho à alçada</font></b><font> (realce nosso) – conjugada com o objetivo de racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, que se pretende reservado à sua qualificada função de estabilização da interpretação e aplicação da lei, em ordem a garantir a unidade do direito.</font>
</p><p><font>Ora, tal limitação assenta na ponderação dos requisitos de admissibilidade que estreita o acesso ao triplo grau de jurisdição da revista excecional, dirigida à uniformização de jurisprudência dos tribunais da Relação, com base no critério do valor da ação. Na verdade, o alcance amplo que a reclamante pretende dar ao artigo 629.º, n.º 2, alínea </font><i><font>d),</font></i><font> do CPC, determinaria uma incoerência teleológica no sistema de recursos, na medida que o recurso de revista ordinário, baseado na contradição entre acórdãos dos tribunais da Relação, não dependeria do critério do valor nem da sucumbência, enquanto o recurso de revista excecional para dirimir conflitos de jurisprudência, previsto no artigo 672.º, n.º 1, al. </font><i><font>c)</font></i><font>, do CPC, estaria sujeito ao requisito do valor e da sucumbência como resulta das regras gerais do recurso. Contudo, o artigo 629.º, n.º 2, al. </font><i><font>d),</font></i><font> reporta-se, como vimos, apenas </font><u><font>às matérias (e só a estas) que não admitem recurso por motivo estranho à alçada (por exemplo, como vimos, questões de insolvência e de expropriações)</font></u><font>, e que passam a admiti-lo quando haja conflito de jurisprudência entre acórdãos dos tribunais da Relação, não prescindindo a lei processual, interpretada no seu conjunto, do critério de recorribilidade do valor da ação e da sucumbência, nos termos do artigo 629.º, n.º 1, do CPC (cfr. O Acórdão de 14/05/2019, proc. n.º 12/12.1TBGMR-F.G1.S2, a propósito do artigo 14.º, n.º 1, do CIRE, e a jurisprudência nele citada, segundo a qual, em matéria de insolvência, o recurso por contradição de acórdãos não dispensa a verificação dos pressupostos gerais do valor da causa e da sucumbência em confronto com a alçada legal).</font><br>
<font> Estas limitações ao recurso de revista foram pretendidas pelo legislador, de acordo com os objetivos das sucessivas reformas do CPC, que visaram alcançar um descongestionamento do Supremo Tribunal de Justiça, afastando do terceiro grau de jurisdição os casos de diminuto valor económico, mesmo que as decisões impugnadas estejam em contradição com outras dos tribunais da Relação. A justificação desta solução, tal como as restantes limitações ao direito ao recurso, decorre, como refere Lopes do Rego (</font><i><font>O direito fundamental do acesso aos tribunais e a reforma do processo civil</font></i><font>, </font><i><font>in</font></i><font> Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, Vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, p. 764), «(…) da própria natureza das coisas, da necessidade imposta por razões de serviço e pela própria estrutura da organização judiciária de não sobrecarregar os Tribunais Superiores com a eventual reapreciação de todas as decisões proferidas pelos restantes tribunais».</font>
</p><p><font> </font><br>
<b><font>2.</font></b><font> Relativamente à pretensa questão de constitucionalidade suscitada ao tribunal recorrido, também não tem razão a reclamante.</font><br>
<font>Em primeiro lugar, é duvidoso que se possa entender que a forma como a questão está formulada, no artigo 17.º das alegações, observa o requisito de admissibilidade do recurso de constitucionalidade, que consiste na suscitação prévia e processualmente adequada de uma questão de constitucionalidade normativa, nos termos exigidos pela jurisprudência do Tribunal Constitucional. É que a alegada violação de normas e princípios constitucionais parece ser imputada à decisão recorrida e não a uma interpretação normativa, definida em termos gerais e abstratos, destacados da especificidade do caso concreto.</font><br>
<font>Ainda assim, interpretando o artigo 17.º das alegações, contextualizado na totalidade do corpo das mesmas, conhece-se a pretensa questão de constitucionalidade da interpretação que sujeita a admissibilidade do recurso de revista excecional, baseado em contradição de acórdãos, nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alínea </font><i><font>c),</font></i><font> do CPC, ao critério do valor da ação, com base na interpretação conjugada do arco normativo composto pelos artigos 629.º, n.º 2, alínea </font><i><font>d)</font></i><font>, 671.º, n.º 1, e 672.º, n.º 1, al. </font><i><font>c)</font></i><font>, todos do CPC.</font><br>
<font>O Tribunal Constitucional tem entendido que «o direito ao recurso em processo civil, e sobretudo o acesso ao recurso junto do Supremo Tribunal de Justiça, não encontra previsão expressa no artigo 20.º da Constituição, não resultando como uma imposição constitucional dirigida ao legislador, que, neste âmbito, dispõe de uma ampla margem de liberdade» (cfr. entre outros, Acórdão n.º 361/2018). O referido aresto sustentou tal conclusão na jurisprudência consolidada do Tribunal Constitucional quanto à densificação do direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, da qual destacou o Acórdão n.º 638/98, que, no que ora importa, dispõe do seguinte modo:</font>
</p><p><font>«O artigo 20º, nº 1, da Constituição assegura a todos «o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos».</font>
</p><p><font>Tal direito consiste no direito a ver solucionados os conflitos, segundo a lei aplicável, por um órgão que ofereça garantias de imparcialidade e independência, e face ao qual as partes se encontrem em condições de plena igualdade no que diz respeito à defesa dos respetivos pontos de vista (designadamente sem que a insuficiência de meios económicos possa prejudicar tal possibilidade). Ao fim e ao cabo, este direito é ele próprio uma garantia geral de todos os restantes direitos e interesses legalmente protegidos.</font>
</p><p><font>Mas terá de ser assegurado em mais de um grau de jurisdição, incluindo-se nele também a garantia de recurso? Ou bastará um grau de jurisdição?</font>
</p><p><font>A Constituição não contém preceito expresso que consagre o direito ao recurso para um outro tribunal, nem em processo administrativo, nem em processo civil; e, em processo penal, só após a última revisão constitucional (constante da Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de setembro), passou a incluir, no artigo 32º, a menção expressa ao recurso, incluído nas garantias de defesa, assim consagrando, aliás, a jurisprudência constitucional anterior a esta revisão, e segundo a qual a Constituição consagra o duplo grau de jurisdição em matéria penal, na medida (mas só na medida) em que o direito ao recurso integra esse núcleo essencial das garantias de defesa previstas naquele artigo 32º.</font>
</p><p><font>Para além disso, algumas vozes têm considerado como constitucionalmente incluído no princípio do Estado de direito democrático o direito ao recurso de decisões que afetem direitos, liberdades e garantias constitucionalmente garantidos, mesmo fora | [0 0 0 ... 0 0 0] |
pTJ4u4YBgYBz1XKvYw1s | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>AA, Lda</font></b><font> intentou ação declarativa ordinária contra </font><b><font>BB SA</font></b><font>, pedindo que esta fosse condenada: </font>
</p><p><font>a) A vender-lhe o prédio misto denominado CC, inscrito na matriz predial quanto à parte urbana no ano de 1959, sob o artigo 784 e quanto à parte rústica sob o nº 2 da secção “1”, descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., pelo preço que, em peritagem, se vier a apurar, como justo e equitativo, considerando que o valor ajustado da venda (no montante de € 4.500.000,00) - previa a possibilidade de 2.900 m2 de área passível de construção e ela não existe, </font>
</p><p><font>ou subsidiariamente, </font>
</p><p><font>b) A devolver-lhe o sinal entregue no montante de € 1.000.000,00, acrescidos dos juros que contados à taxa comercial de 9,5% ano, desde a sua entrega se vencerem até integral e efetivo pagamento, fazendo-se operar os efeitos da anulabilidade do negócio contratado, com a sua redução se possível ou a sua restituição; </font>
</p><p><font>e em alternativa, </font>
</p><p><font>c) A devolver à A. o sinal em dobro, por ter incumprido o contrato promessa ajustado, tendo omitido factos a si imputáveis, num quadro de censura ético-jurídica, que se traduzem na falta de informação sobre as características da propriedade e omissão da escritura no prazo acordado. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegou que para o efeito o seguinte:</font>
</p><p><font>Por contrato promessa de 23.12.2008 prometeu comprar e a ré prometeu vender-lhe determinado imóvel, pelo preço de € 4.500.000,00, sendo que celebrou tal contrato com base na informação, para si essencial, de que o imóvel tinha 15.500 m2 de área urbana e 2.900 m2 de área passível de nova construção. </font>
</p><p><font>Posteriormente, veio a tomar conhecimento de que existia uma mancha de REN sobre 2/3 do imóvel o que impossibilitava nova construção, inviabilizando os 2.900 m2 de área passível de nova construção. </font>
</p><p><font>Contactada a ré, os seus legais representantes afirmaram que se tratava de um “erro de impressão” nos mapas da REN e que essa situação estava sob controlo e bem assessorada por gente da Câmara que lá se mexia muito bem, e que ficasse descansada. </font>
</p><p><font>Convencida com tal explicação acabou por proceder ao reforço do sinal no valor de € 250.000,00 na data acordada no contrato-promessa. </font>
</p><p><font>Tendo porém confirmado aquela informação, que havia obtido, contactou a ré com vista a pôr termo ao negócio, tendo acordado fazê-lo. Todavia, a ré veio a comunicar a falta de disponibilidade imediata para devolver o sinal entregue, sugerindo que se fizesse um aditamento ao contrato-promessa adiando a realização da escritura (que se mostrava prevista para 28/2/2009), na medida em que não pretendia entrar em incumprimento relativamente à data acordada para a feitura da escritura. </font>
</p><p><font>A A. não concordou, tendo então acordado ambas verbalmente que a R. não marcaria a escritura e a A. não invocaria esse facto para alegar o incumprimento daquela. Sucede que a R. marcou a escritura afirmando, contudo, que aquele acordo verbal se mantinha, em face do que a A. respondeu que mantinha o propósito de compra no pressuposto da acima referida capacidade construtiva. A R. marcou a escritura para 27/3/2009 e ao mesmo tempo enviou à A. uma proposta de entendimento (a resolução do contrato-promessa e a devolução do sinal, em prestações), com o que a A. não concordou. </font>
</p><p><font>Pretende a A a anulação do negócio, porque a declaração negocial inexatamente transmitida por quem esteja incumbido de a transmitir pode ser anulada, como pode ser anulado o negócio quando o que o determinou foi um erro sobre o objeto, admitindo também a redução do negócio tendo por fundamento a inexistência dos 2 900 m2 de área passível de nova construção acordada - a não ser que se conclua que a R. omitiu informações dolosamente, caso em que pretende o sinal em dobro. </font>
</p><p><font> A </font><u><font>ré contestou</font></u><font>, alegando, no essencial, que autora apenas pretendia investir em imobiliário, no âmbito da sua atividade de compra e venda de imóveis e que nunca disse à ré ou à sociedade intermediária que a área passível de construção era importante ou essencial à concretização do negócio, sendo condição da sua realização, não tendo sequer informado a ré relativamente a uma específica finalidade que pretendesse dar ao imóvel, a não ser aquele intuito de comprar para vender com mais valias, e que foi a autora que lhe pediu a prorrogação do prazo para a celebração da escritura, alegando que ainda não tinha aprovado o crédito bancário e que depois se recusou a assinar o aditamento ao contrato, alegando que queria desistir do mesmo, sem que invocasse qualquer fundamento para tanto, mostrando-se interessada numa resolução consensual do contrato. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A autora replicou, mantendo a sua posição.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Saneado o processo, realizada a perícia requerida pela autora e realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><u><font>sentença</font></u><font>, na qual a</font><b><font> ação foi julgada improcedente</font></b><font>, </font><u><font>sendo a ré absolvida do pedido</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de apelação da autora, </font><b><font>a Relação de Lisboa</font></b><font>, julgando procedente tal recurso, </font><b><font>veio a revogar a sentença recorrida</font></b><font>, </font><u><font>condenando a ré, em função do contrato promessa de compra e venda a que os autos se reportam, a outorgar na venda do imóvel a que o mesmo respeita, pelo preço de € 3.948.407,50.</font></u>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a ré o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes c</font><u><font>onclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>I. O julgador é livre na subsunção do direito aos factos, mas encontra-se espartilhado nessa liberdade, aos factos que as partes carrearam para os autos e aqueles que as partes conseguiram provar nos próprios autos, nos termos da distribuição do ónus da prova que lhes cabia - artigo 342º do Código Civil.</font>
</p><p><font>II. No âmbito do processo civil, além dos factos a que se faz alusão no anterior número 4, o julgador apenas pode considerar, para efeitos decisórios, factos públicos ou notórios, nos termos do disposto no artigo 412º do CPC, que não carecem de ser alegados ou provados, bem como os factos instrumentais, que decorrem dos factos alegados pelas partes - artigo 5º, nº 2, do CPC. </font>
</p><p><font>III. Ora, foi com base no princípio do dispositivo e com as limitações que decorrem do disposto, designadamente, no artigo 5º e artigo 607º, ambos do CPC, que o Tribunal de 1ª Instância, considerou provados e não provados, os factos acima transcritos, e que por economia processual, aqui se dão como integralmente reproduzidos. </font>
</p><p><font> IV. Uma vez que o Recurso de Apelação, que interpôs a aqui Recorrida, não formulou qualquer pedido, para reapreciação ou modificação da matéria factual provada pelo Tribunal de 1ª Instância, o Tribunal da Relação de Lisboa estava impedido, em cumprimento da previsão contida no nº 1, do artigo 662º, do Código Processo Civil, de alterar a matéria factual provada, uma vez que esta reapreciação depende da efetiva alegação do Recorrente, para obtenção desse efeito. </font>
</p><p><font>V. Quer isto dizer, que o Tribunal da Relação de Lisboa não podia, conforme demonstraremos que fez, fundamentar a sua decisão em factos que não se encontram provados ou que estão em contradição, quando sopesados na argumentação do acórdão, com factos que se encontram igualmente provados, os quais, manifestamente, foram omitidos pelo Acórdão de que se recorre e proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa. </font>
</p><p><font> VI. Deste modo, e sendo verdade que os Venerandos Desembargadores são livres de aplicar o direito, só o podem fazer com fundamento nos factos provados e não provados na mui douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, sem prejuízo do disposto no artigo 662º, nº 2, do CPC, o qual, não se aplica ao caso concreto. </font>
</p><p><font>VII. Ora, a aqui Recorrente realçou, aquando da sua transcrição, factos provados e não provados que colidem em absoluto com a subsunção jurídica que o Tribunal da Relação de Lisboa veio a fazer, a final, a saber, que os factos provados e não provados em Tribunal pelas partes, se subsumia a um contrato de compra e venda de coisa defeituosa, nos termos do disposto no artigo 913º do Código Civil.</font>
</p><p><font>VIII. Para alicerçar o seu raciocínio, os Venerandos Desembargadores partem, antes de mais, da análise de um relatório de avaliação, no qual, alegadamente, dir-se-á, que o o terreno do imóvel permite construir uma área de 436m2. </font>
</p><p><font> IX. A área de construção de um imóvel, apenas depende do Plano Director Municipal, aprovado por cada Câmara Municipal do país e não de qualquer relatório de avaliação e define-se, como se segue: </font><i><font>“É o valor numérico expresso em m2, resultante do somatório das áreas brutas de todos os pavimentos acima e abaixo do solo, medida pelo extradorso das paredes exteriores, com exclusão de: sótãos não habitáveis, garagens, quando localizadas em caves, áreas técnicas ( ... ) e de galerias exteriores públicas, arruamentos, e outros espaços livres de uso público cobertos pela edificação”</font></i><font>. (retirada de um site da internet, não identificado, mas que resulta de qualquer consulta livremente efetuada). </font>
</p><p><font>X. Ora, é com base num conceito absolutamente errado e cujo facto, contrariamente ao que decorre do acórdão de que se recorre, foi considerado não provado pelo Tribunal de 1ª Instância, que se alicerça a tese da compra e venda de bem defeituoso, que vem a ser decidida, a final. </font>
</p><p><font>XI. Do que acima fica escrito, conclui-se que a área construtiva de um determinado imóvel depende sempre do plano diretor municipal, que é público na página da Câmara Municipal de .... </font>
</p><p><font>XII. Uma sociedade comercial por quotas, na qual um dos sócios é advogado (mulher do sócio-gerente), manifestar o interesse na compra de um imóvel do Século XVIII e confiar que a sua área construtiva (e não terreno para construção) depende de um relatório de avaliação, é o mesmo que afirmar, que o desconhecimento da lei, permite a sua violação, por todos quantos a desconheçam, o que não é o caso. </font>
</p><p><font>XIII. Aliás, é pouco crível a qualquer homem médio, que uma pessoa singular ou colectiva opte por comprar um imóvel apalaçado, cuja construção remonta ao século XIII, para nele construir o que quer que seja.</font>
</p><p><font>XIV. Mais, é absolutamente expectável, para um homem médio, que nos termos da lei do urbanismo e da preservação de construções com traça antiga, a Câmara Municipal de ... não permitisse a construção naquele local de um qualquer outro edifício, sendo, deste modo, apenas possível, a reconstrução do mesmo. </font>
</p><p><font> XV. Basta uma consulta na Internet, para logo se encontrar, numa página da Junta de Freguesia de ..., uma descrição do imóvel, com as suas caraterísticas arquitetónicas, que permitem concluir, que o que a Recorrida pretende através da presente ação judicial é comprar um imóvel que prometeu comprar pelo preço de € 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos mil euros), pelo preço mais barato possível, uma vez que os seus argumentos, além de não terem sido provados, são, no mínimo, inverosímeis. </font>
</p><p><font> XVI. Mas, e ainda que se entendesse, que estes argumentos - publicidade do plano diretor municipal e incredulidade na convicção de que a Câmara Municipal de ... permitiria construir em tal edifício, obra que o descaracterizasse - - não eram suficientes, para afastar o entendimento plasmado no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, não poderia, como fez este Tribunal, concluir que os factos provados e não provados, se subsumem à compra e venda de um bem defeituoso, e isto, porquanto: </font>
</p><p><font>XVII. Resulta da matéria provada, que em momento anterior à celebração do contrato promessa de compra e venda, que ocorreu em 23 de Dezembro de 2008, a Recorrida terá recebido o relatório de avaliação a que se faz referência no factos provados sob as letras A, B, C e M e outras informações relativamente ao imóvel denominado CC. </font>
</p><p><font>XVIII. Que a Recorrida terá oferecido o preço de € 5.000.000,00 (cinco milhões de euros), pela compra do imóvel (facto sob a letra K). </font>
</p><p><font>XIX. O qual, posteriormente, veio a reduzir, para o preço de € 4.500,000, 00 (quatro milhões e quinhentos mil euros), porquanto tenham verificado - Recorrente e Recorrida - que a área construída era menor do que a área indicada nos documentos fornecidos à Recorrida, tudo conforme decorre dos factos provados sob as letras (factos provados sob a letras N, O, P, Q, R, S, T, U e V). </font>
</p><p><font> XX. Daqui decorre que a Recorrida, desde a data em que recebeu os documentos da representante da mediadora imobiliária - DD - até à data da celebração do contrato promessa de compra e venda pôde visitar, e visitou de facto, o imóvel em causa, indagou sobre as áreas construídas e foi esclarecido sobre as mesmas; simultaneamente, decorre que a Recorrente acolheu a Recorrida, colocou o imóvel à sua disposição, para que pudesse verificar no local, se o mesmo a satisfazia, e aliás, assumiu as despesas inerentes à destruição de uma parede, para verificação e esclarecimento das dúvidas que a Recorrida manifestou. </font>
</p><p><font>XXI. A Recorrente, nesse mesmo período, isto é, até à data da celebração do contrato promessa de compra e venda, teria tido tempo e oportunidade, para consultar o PDM, a qual é feita através da consulta do sítio da Câmara Municipal de ..., na internet, e poderia, aliás, ter-se deslocado pessoalmente à Câmara Municipal de ..., para se inteirar sobre a área construtiva do imóvel, tanto mais, que o mesmo se trata de uma Quinta erigida no século XVIII, constituída por um prédio rústico e um prédio urbano, o que determinava que fosse absolutamente expectável que houvesse limitações à sua ampliação ou aumento da área de construção. </font>
</p><p><font>XXII. Todavia, a Recorrida preferiu não o fazer ou omitir nos presentes autos que o fez.</font>
</p><p><font>XXIII. Ficou apenas provado, que em data posterior à celebração do contrato promessa de compra e venda, mas em data anterior ao pagamento do reforço do sinal, no valor de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), o sócio-gerente da Recorrida terá ido à Câmara Municipal de ..., conversado com o arquiteto EE, o qual tê-lo-á informado, que sobre a CC existia uma área de Reserva Ecológica Nacional (note-se que na CC, existem animais selvagens à solta, o que terá sido percecionado, também, pelo sócio-gerente da Recorrida), e que esse facto impossibilitava uma nova construção, nessa área, tudo como resulta dos factos provados sob as letras W, X, Y, D e documento de fls. 82, mencionado no facto provado sob a letra F. </font>
</p><p><font> XXIV. Todavia, o facto da Recorrida ter tido conhecimento deste facto, não a impediu, ainda assim, de pagar o reforço de sinal, no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), quantia bastante elevada, se atentarmos na possibilidade de, a essa data, a Recorrida já ter conhecimento daquele que seria o fundamento dado como provado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, para redução do preço acordado (note-se, segunda redução do preço), que as qualidades do imóvel, alegadamente asseguradas pela Recorrente, não se encontravam, também alegadamente, preenchidas. </font>
</p><p><font> XXV. Ora, sem perder de vista que o fundamento invocado pelo Tribunal da Relação de Lisboa foi o de </font><i><font>“a coisa objeto do contrato promessa não tem as qualidades asseguradas pelo devedor”</font></i><font>, temos agora que focar a nossa atenção, para os factos que o Tribunal de lª Instância considerou não provados, para avaliação da suscetibilidade do preenchimento de tal conclusão ou fundamento, pelo Tribunal da Relação de Lisboa. </font>
</p><p><font>XXVI. Com efeito, e conforme decorre dos factos não provados sob as letras A, B, C, O, E, F, G, a Recorrida não logrou demonstrar qual o fim a que destinava o imóvel em causa; que tivesse comunicado esse fim à Recorrente; que a Recorrente tivesse informado a Recorrida que a propriedade tinha 15.500 m2 de área urbana e urbanizável e 2.900m2 de área passível de construção e que esta condição tivesse sido essencial, para a celebração do contrato promessa de compra e venda, condição essa comunicada pela Recorrida à Recorrente e por esta aceite e compreendida. </font>
</p><p><font>XXVII. Mais, a Recorrida também não logrou provar que tivesse contactado um arquiteto e tivesse em 15 de Janeiro de 2009, proposto uma reunião com os sócios-gerentes da Recorrente (factos não provados sob as letras H e I). </font>
</p><p><font>XXVIII. Em consequência, também não conseguiu provar a Recorrida, que a Recorrente, tivesse afirmado que a mancha REN era um erro de impressão, facto, aliás, só crível a incautos. </font>
</p><p><font> XXIX. Também não provou a Recorrida que a Recorrente afirmou que tivesse conhecimentos na Câmara Municipal de ..., com pessoas que se mexiam bem, pelo que poderiam construir no imóvel, nos termos em que tinham ambos, alegadamente, conversado. (factos não provados com as letras J, K, L, M). </font>
</p><p><font>XXX. Donde decorra, que a Recorrida não conseguiu sequer provar, porque razão, em data em que, alegadamente, já tinha conhecimento que as qualidades do imóvel (ou a sua ausência) não estivessem preenchidas, entregou à Recorrente, a quantia, não irrelevante, dir-se-á, de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros). </font>
</p><p><font>XXXI. Ora, claro se torna, que a terem sido asseguradas qualidades daquele imóvel em concreto, pela Recorrente, diferente das qualidades inerentes aos imóveis em geral, e em particular a um imóvel do século XIII, tal conclusão foi extraída pelo Tribunal da Relação de Lisboa, sem qualquer meio de prova que a sustente. </font>
</p><p><font>XXXII. Com efeito, o Tribunal da Relação de Lisboa, parece apenas preocupar-se com a avaliação junta a fls. 21 a 75 e com o teor da carta junta aos autos a fls.84e 85.</font>
</p><p><font>XXXIII. O relatório de avaliação, que não se encontra assinado pela Recorrente e que não foi entregue por este à Recorrida, conforme resulta dos factos provados, não tem a faculdade de demonstrar que: a Recorrente sabia que a eventual área de construção ou suscetibilidade, aliás, de construir, era uma condição essencial para a celebração do negócio e, muito menos, que a Recorrida tenha comunicado este facto à Recorrente.</font>
</p><p><font>XXXIV. Do mesmo modo, a carta que se junta aos autos a fls: 84 e 85, não é mais do que uma narrativa de factos que foram escritos pela Recorrida à Recorrente, que, conforme consta dos factos não provados no Tribunal de 1ª instância, a Recorrida não logrou provar.</font>
</p><p><font>XXXV. Isto é, a história que contou a Recorrida na carta junta a fls. 84 e 85 dos autos, não foi provada pela Recorrida em Tribunal, sendo que, se a Recorrida não lavra em erro, só a prova demonstrada nos autos é suscetível de ser valorada, para efeitos de decisão final, tudo conforme resulta do disposto nos artigos 607º, números 3 e 4, 609º, 6159, nº 1, alíneas b), d) e e) e artigo 619º, nº 1, todos do CPC.</font>
</p><p><font>XXXVI. Ora, para que se aplique a consequência jurídica que o Tribunal da Relação de Lisboa veio a aplicar - redução do preço, previsto no artigo 911º do Código Civil, por remissão do artigo 913º do Código Civil- a Recorrente teria que ter provado quais as qualidades em concreto que teriam sido asseguradas pelo vendedor - aqui Recorrente - e quais aquelas que não se teriam verificado.</font>
</p><p><font>XXXVII. Ora, como já se disse anteriormente, o Tribunal de 1ª Instância não considerou provados factos que pudessem conduzir a este raciocínio e conclusão. </font>
</p><p><font> XXXVIII. Designadamente, não considerou o Tribunal de 1ª Instância provado que: </font>
</p><p><font> XXXIX. </font><i><font>“Os 2.900 m2 de área passível de construção, eram elemento essencial para a finalidade que a A. queria dar à Quinta. “</font></i><font> </font>
</p><p><font> XL. </font><i><font>“Desde os contactos iniciais entre Autora e Ré foi sempre transmitido pelos legais representantes desta ao sócio-gerente da Autora que a CC tinha 15.500 m2 de área em regime urbano/urbanizável.”</font></i><font> </font>
</p><p><font> XLI. </font><i><font>“E com capacidade para nova construção tendo 2.900 m2 de área passível de construção”.</font></i><font> </font>
</p><p><font> XLII. </font><i><font>“Foi com base na informação constante da ai. C} dos Factos Provados, que o sóciogerente da Autora tomou como boa, que este formou a sua intenção de compra da CC.”</font></i><font> </font>
</p><p><font> XLIII. </font><i><font>“Foi na convicção de que a CC tinha garantidamente uma capacidade construtiva de 2.900 m2, que o sócio-gerente da Autora ajustou a compra e venda da propriedade pelo valor de 4.500.000 euros, assinando o respectivo contrato-promessa.”</font></i><font> </font>
</p><p><font>XLIV. E não resulta das regras da experiência comum que a Recorrente tivesse assegurada tais qualidades - área de construção - à Recorrida, e esta o tivesse acreditado, face, quer à natureza do imóvel em apreço, quer ao objeto social da aqui Recorrida. </font>
</p><p><font>XLV. Pelo que, não tendo havido o pedido de reapreciação da prova factual, não poderia o Tribunal da Relação de Lisboa subsumir factos não provados a uma consequência jurídica que só poderia ter decorrido, se esses mesmos factos, tivessem resultado provados. </font>
</p><p><font>Face ao exposto, tudo com o mui douto suprimento de V.Exas, deve o presente recurso de Revista proceder, e em consequência, ser revogado o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, mantendo-se integralmente, a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>A autora contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.</font>
</p><p><font> A Relação, em conferência, tomou posição e decisão no sentido da inexistência de nulidades que devessem ser supridas.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>Colhidos os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>Em face do conteúdo das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, a questão de que cumpre conhecer tem a ver com a prova do erro sobre as qualidades do prédio objeto do negócio (área passível de construção) conducente à redução do preço.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>É a seguinte a </font><b><u><font>factualidade dada como provada e como não provada pelas instâncias</font></u></b><font>:</font>
</p><p><u><font>Factos provados:</font></u><font> </font>
</p><p><font>A. No final do ano de 2008, a Autora contactou uma Imobiliária, na ..., com vista a informar-se sobre a existência de uma propriedade onde pudesse investir. </font>
</p><p><font>B. Esta Imobiliária veio a entregar à Autora a avaliação que se mostra junta a estes autos, como doc. nº 4, junto com a p.i., a fazer fls. 21 a 75 dos autos. </font>
</p><p><font>C. Dessa avaliação consta, conforme fls. 23 dos autos, sob a epígrafe “Área Passível de Construção”: “Área (m2) 2 900, 00”. </font>
</p><p><font>D. Autora e Ré celebraram o Contrato Promessa de Compra e Venda cuja cópia se mostra junta aos autos a fls. 76 a 81, no dia 23/12/08, liquidando, a Autora, a título de sinal, a quantia de 750.000,00 euros, por meio de cheque.</font>
</p><p><font> E. Nos termos da cláusula Terceira deste Contrato Promessa Compra e Venda a escritura pública de compra e venda teria lugar até 28/02/09 e a Promitente Vendedora comunicaria com uma antecedência mínima de 10 dias à Promitente Compradora o Cartório, dia e hora para a realização da mesma. </font>
</p><p><font>F. Em 17/02/09, a ilustre mandatária da Ré enviou à Autora e esta recebeu a missiva que se mostra junta a fls. 82 dos autos, em que a Ré comunicava à Autora a data marcada para a realização da escritura. </font>
</p><p><font>G. Face à notificação para outorga da escritura, a Autora respondeu nos termos da missiva que se mostra junta, com a p.i., como doc. nº 7, a fazer fls. 84/85 dos autos, em que, além do mais, declara manter então o propósito da compra ajustada no pressuposto de se confirmar a aptidão construtiva da propriedade. </font>
</p><p><font>H. A essa carta, a Ré reagiu nos termos da carta junta como doc. 8, junto com a p.i., a fazer fls. 86 a 88 dos autos.</font>
</p><p><font> I. Nessa sequência, a Ré marcou a escritura para 27/03/09. </font>
</p><p><font>J. No início de Dezembro de 2008, DD enviou ao sócio gerente da Autora duas comunicações via email, informando-o da existência de diversas propriedades que se encontravam à venda, entre as quais a denominada “CC”.</font>
</p><p><font> K. A Autora veio a efetuar uma oferta de compra da CC por cinco milhões de euros. </font>
</p><p><font>L. DD e GG anunciavam aquela Quinta e serviam de intermediários entre a Autora e a Ré. </font>
</p><p><font>M. Uns dias depois, a referida D. DD enviou ao sócio-gerente da Autora algumas informações sobre a CC. </font>
</p><p><font>N. O sócio-gerente da Autora apresentou à Ré dúvidas sobre a exata área da propriedade ao nível do rés-do-chão, da área construída.</font>
</p><p><font> O. Em reunião que, então, teve lugar, na CC, o sócio-gerente da Autora colocou aos representantes da Ré (HH e II) e aos intermediários (GG e DD) essa dúvida. </font>
</p><p><font>P. Concretamente, entendia que faltava “construção” ao nível do rés-do-chão, face aos documentos que lhe tinham sido facultados. </font>
</p><p><font> Q. A representante da Ré afirmou que a área construída era a constante dos documentos.</font>
</p><p><font> R. E afirmou que lhe havia sido transmitido que os anteriores proprietários, aquando do 25 de Abril de 1974, tinham mandado emparedar uma parte do rés-do-chão, que assim se mostrava escondida, mas que existia.</font>
</p><p><font> S. Em face dessa afirmação, o sócio-gerente da Autora solicitou então que fosse deitada abaixo essa parede, com vista a averiguar da existência dessa área construída.</font>
</p><p><font> T. O que foi feito, tendo-se apurado que, de facto, essa área, que se encontraria escondida, não existia. </font>
</p><p><font>U. Assim, apurou-se que a propriedade tinha menor área bruta construída que a constante dos documentos identificativos do imóvel, relativamente ao R/C, na medida de cerca de 300 m2. </font>
</p><p><font> V. Em face dessa circunstância, o sócio-gerente da Autora reduziu para 4,5 milhões de euros a proposta inicialmente feita para aquisição da CC, o que foi aceite pela Ré. </font>
</p><p><font>W. Em data que concretamente não logrou apurar-se, mas, não posterior a 15 de Janeiro de 2009, o sócio gerente da Autora dirigiu-se à Câmara Municipal de ... e falou com o Arquiteto EE. </font>
</p><p><font>X. Nessa ocasião, foi transmitido a este sócio-gerente que existia uma mancha da REN (Reserva Ecológica Nacional) sobre parte da CC.</font>
</p><p><font> Y. E que isso impossibilitava uma nova construção, nessa área. </font>
</p><p><font> Z. A CC, que tem a área total de 41.520 m2, apresenta uma mancha de REN com a área de 10.597 m2. </font>
</p><p><font>AA. Na CC, a área em regime urbano/urbanizável, sobreposta à área de REN, é de 5801 m2; e a restante área em regime urbano/urbanizável (não sobreposta à área de REN) é de 7 788 m2; incluindo-se, nesta última, a área urbanizável de uso habitacional, que é de 2181 m2.</font>
</p><p><font> BB. Na CC, a área de terreno onde é possível construir/passível de nova construção, é de 2.181 m2 e a área de construção, face aos parâmetros consignados pelo PDM, é de 436 m2. </font>
</p><p><font>CC. Em termos pecuniários, a diferença entre a possibilidade de ser erigida construção, na CC, ocupando a área de 2 900 m2 ou ocupando, apenas, a área de 436 m2, apresenta o valor de 541.592, 50 euros. </font>
</p><p><u><font>Factos não provados:</font></u>
</p><p><font>A. A Autora, ao celebrar o contrato-promessa objeto dos autos, pretendia, nessa propriedade sobre a qual se informou (CC) realizar eventos, em alternativa à FF.</font>
</p><p><font> B. Constava do anuncio enviado à Autora por DD que a propriedade tinha 15.500 m2 de área urbana e urbanizável.</font>
</p><p><font> C. Os 2.900 m2 de área passível de construção, eram elemento essencial para a finalidade que a A. queria dar à Quinta.</font>
</p><p><font> D. Desde os contactos iniciais entre Autora e Ré foi sempre transmitido pelos legais representantes desta ao sócio-gerente da Autora que a CC tinha 15.500 m2 de área em regime urbano/urbanizável. </font>
</p><p><font>E. E com capacidade para nova construção tendo 2.900 m2 de área passível de construção. </font>
</p><p><font>F. Foi com base na informação constante da al. C) dos Factos Provados, que o sócio-gerente da Autora tomou como boa, que este formou a sua intenção de compra da CC.</font>
</p><p><font> G. Foi na convicção de que a CC tinha garantidamente uma capacidade construtiva de 2.900 m2, que o sócio-gerente da Autora ajustou a compra e venda da propriedade pelo valor de 4.500.000 euros, assinando o respetivo contrato-promessa. </font>
</p><p><font>H. Depois das festas natalícias e do final do ano de 2008, o sócio-gerente da Autora iniciou contactos com um arquiteto com vista a projetar as obras de reparação e de construção da Quinta.</font>
</p><p><font> I. Em 15 de Janeiro de 2009, o sócio-gerente da Autora entrou em contacto com os representantes da Ré propondo uma reunião urgente.</font>
</p><p><font> J. Nessa ocasião, os representantes da Ré disseram à Autora que se tratava de um engano, “um erro de impressão” nos mapas da REN. </font>
</p><p><font>K. E que a situação estava sob controlo e bem assessorada na Câmara de .... </font>
</p><p><font>L. Por “gente” competente que lá se mexia muito bem. </font>
</p><p><font>M. E que a Autora ficasse descansada pois era possível construir obra nova na Quinta, tal como haviam sempre dito. </font>
</p><p><font>N. Foi na convicção de que tudo se haveria de resolver com estes conhecimentos indicados pela Ré, que a sócio-gerente da Autora aceitou efectuar o reforço de sinal acordado no acima aludido contrato-promessa, no valor de 250.000,00 euros, no prazo previsto pelo sobredito contrato-promessa. | [0 0 0 ... 0 1 0] |
IjJ9u4YBgYBz1XKv8hGw | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
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<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - AA e mulher, e outros, intentaram ação declarativa comum, contra BB, S.A., Companhia de Seguros CC, S.A., e Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL, pedindo que as rés fossem condenadas solidariamente: a) A proceder à execução das obras de estabilização e contenção estrutural do prédio dos autores que se vieram a apurar em incidente de liquidação de sentença, no prazo de 20 dias após trânsito da sentença; b) A proceder à execução das obras de reparação dos danos verificados em cada uma das frações e no edifício dos autores, que se vieram a apurar em incidente de liquidação de sentença, no prazo de 40 dias após trânsito da mesma; c) No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 5.000,00 por mês desde a data que for fixada na sentença para realização das obras referidas a); d) No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 2.000,00 por mês desde a data que for fixada na sentença para realização das obras referidas b); e) No pagamento de uma indemnização a favor de cada um dos autores correspondente à desvalorização que cada uma das fracções de que são proprietários sofreu por via dos danos em que incorreram em consequência da escavação efectuada no prédio da terceira ré, a liquidar em execução de sentença e correspondente à diferença de valor de cada uma das fracções antes do prédio sofrer os danos e depois das obras de reparação; f) E no pagamento de uma indemnização a favor dos primeiros autores correspondente à quantia mensal de € 500,00, desde Março de 2008 até completa reparação da fracção “A”. </font>
<p><font>Alegaram, para o efeito e em resumo, a realização de obras num prédio da Ré Caixa de Crédito Agrícola, por parte da Ré BB, que havia transferido a responsabilidade civil emergente da execução de tais obras para a Ré Companhia de Seguros CC, e a circunstância de tais obras terem provocado deslizamentos subterrâneos de terra que causaram o assentamento da parede Sul e do piso térreo do prédio dos Autores e originaram prejuízos vários nas diversas frações. </font>
</p><p><font>Na sua contestação, a Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL defendeu-se por impugnação e invocou a ilegitimidade dos autores. A Ré Companhia de Seguros CC, S.A., para além de se defender por impugnação, invocou a prescrição do direito dos autores. Por sua vez a Ré BB, para além de se defender por impugnação e invocar a prescrição do direito dos autores, também invocou a sua ilegitimidade. </font>
</p><p><font>No </font><u><font>despacho saneador</font></u><font> foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade e relegou-se para a decisão final o conhecimento da excepção de prescrição. </font>
</p><p><u><font>Na sentença,</font></u><font> a ação foi julgada parcialmente procedente, condenando-se solidariamente as Rés (sendo-o a ré CC, S.A. até ao limite do capital e com redução do valor da franquia): a) A executar as obras de estabilização e contenção estrutural do prédio dos autores que se vierem a apurar em incidente de liquidação de sentença, no prazo de 20 dias após o trânsito em julgado da respetiva sentença; b) A executar as obras de reparação dos danos existentes em cada uma das frações e no edifício dos autores que se vierem a apurar em incidente de liquidação da sentença, no prazo de 40 dias após o trânsito em julgado da respetiva sentença; </font>
</p><p><font>c) No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de cinco mil euros por mês pelo incumprimento do prazo fixado para a realização das obras referidas na alínea a); d) No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de dois mil euros por mês pelo incumprimento do prazo fixado para a realização das obras referidas na alínea b). E absolvendo-se as rés do demais pedido. </font>
</p><p><font>Na sequência de </font><u><font>recursos de apelação das Rés e dos autores (recurso subordinado</font></u><font>), </font><u><font>a Relação do Porto</font></u><font>, por acórdão proferido nos autos: </font><i><font>- Julgou procedentes as apelações das Rés BB, S.A., e Companhia de Seguros CC, S.A., julgando, quanto a elas, a acção improcedente, e absolvendo-as dos respectivos pedidos, com a consequente revogação da sentença nesta parte; - Julgou improcedente a apelação da Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL, confirmando-se, quanto a ela, a sentença recorrida;</font></i><br>
<i><font>- E, julgando parcialmente procedente a apelação dos autores, condenou a Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL, ainda, no pagamento. aos Autores AA e mulher, a título de indemnização, da quantia mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), a contar de Março de 2008 até à completa reparação da fracção A do prédio identificado em 1 dos factos provados.</font></i><br>
<br>
<br>
<font>Inconformada, </font><u><font>interpôs a Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL o presente recurso de revista</font></u><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
<br>
<font>1ª - O Acórdão recorrido não interpretou bem os factos, errando na interpretação, na aplicação e na determinação da lei substantiva e das normas aplicáveis. 2ª -Também fez errada aplicação da lei do processo. Na verdade, </font><br>
<font>3ª - Provado que a “escavação atingiu mais de 6 metros de profundidade, que a obra foi realizada até à extrema do terreno que confronta com o prédio dos Autores, com o objectivo de construir os dois pisos de cave do edifício da 3ª Ré”, embora em si possa não constituir um acto ilícito por parte do dono da obra, constituirá certamente um acto que merece especial atenção por parte do construtor, como se salientada decisão de primeira instância e se alude a fls. 1477 do Acórdão em crise, donde resulta claramente a necessidade de tomar medidas de contenção ou impermeabilização que o terreno impunha. 4ª - Todos sabemos que estamos perante factos notórios, os quais não carecem nem de alegação, nem de prova (artº 412º do CPC. </font><br>
<font>5ª - De acordo com este tipo de consideração, o Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto no artigo 412º -1 do CPC, podia e devia considerar certos factos como notórios ainda que não alegados ou mesmo, “independentemente - até - de os mesmos, no caso de terem sido levados ao questionário, terem obtido resposta negativa por parte do tribunal”. 6ª - Tal como este Venerando Tribunal o pode fazer. </font><br>
<font>7ª - Qualquer cidadão (quanto mais uma empresa de construção civil, dotada de técnicos especializados, como engenheiros e arquitectos, e de meios de execução adequados para execução de uma obra daquela envergadura), colocado naquela posição e pela experiência comum, sabia que deveria ter tomado as cautelas e os cuidados que a situação objectiva e subjectivamente merecia. </font><br>
<font> 8ª - Contrariamente ao sustentado no Acórdão em crise, a responsabilidade do dono da obra é solidária com a do empreiteiro... - art.° 497, n.º 1, do CC. </font><br>
<font> 9ª - Atento o disposto nos art.ºs 497º- 2 e 524º do CC, o dono da obra, sobre o qual recai (sem culpa) a obrigação de indemnizar os proprietários vizinhos (que sofram danos resultantes de escavações para construção de edifício no prédio daquele), tem o direito de ser reembolsado pelo empreiteiro executante dos trabalhos da indemnização que pagou, fundando-se o reembolso no direito de regresso. 10ª - O empreiteiro não é um mandatário do dono da obra, pois age, diversamente, com inteira autonomia na respectiva execução, escolhendo os meios e utilizando as regras de arte que tenha por próprias e adequadas para cumprimento da exacta prestação correspondente ao resultado contratado, sem qualquer vínculo de subordinação ou relação de dependência. 11ª - À mesma conclusão, neste pressuposto, podemos chegar através do instituto plasmado no artº 483° do CC, pois se qualificarmos o tipo de actividade desenvolvida pela empresa que executou a obra como normal, ainda que sujeita a um nível de riscos acrescidos, não se opera a subsunção na previsão do artº 493º do CC, mas antes na previsão geral da responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana contida no art. 483°- 1, do mesmo código. 12ª - Na realidade, ao não ter procedido à avaliação das condições do terreno onde iria organizar os trabalhos e sabendo que a amplitude e a natureza das escavações e as máquinas a usar possuíam um poder de influenciar a estrutura do terreno e transmitir esses efeitos ao edifício vizinho, a demandada “BB, Lda” negligenciou um dos deveres de diligência e cuidado que deveria ter observado, em momento anterior, à execução da obra ou à utilização da maquinaria. 13ª - Ao ter omitido um dever de cuidado que o risco inerente à utilização da maquinaria que viria a utilizar exigia e reclamava, agiu em desconformidade com uma obrigação de prevenção e cautela negligenciadora dos eventuais efeitos danosos que poderiam ocorrer e percutir na esfera de interesses (legítimos) de terceiros, o que a faz incorrer em responsabilidade civil. 14ª - A factualidade provada é suficiente para revelar a culpa da ré “BB” na produção dos danos sofridos pelos AA, sendo certo que o dono da obra mantém com a coisa a ligação característica do proprietário, com os inerentes direitos e deveres (nomeadamente, quanto à responsabilidade pelos prejuízos), sem embargo do exercício do direito de regresso contra o empreiteiro. 15ª - Em tais circunstâncias, a “BB” passou a deter a coisa, em vista da realização da obra, segundo os seus critérios técnicos e funcionais e, com essa detenção, assumiu os poderes de direcção e controle que caracterizam o dever de guarda e de vigilância. 16ª - É, pois, concludente que no caso de realização de uma obra, como aquela que está aqui em causa, resultando, em consequência das escavações, danos no prédio vizinho, são responsáveis pelo pagamento desses danos, quer o dono da obra (o proprietário do prédio no qual as escavações são efectuadas), que responde independentemente de culpa sua, quer o empreiteiro que levou a cabo a realização material das escavações. 17ª - Perante a factualidade provada, dúvidas não podem subsistir em como os danos sofridos pelo prédio dos AA foram provocados pelas obras levadas a efeito pela empreiteira “BB”, ou seja e em concreto, pelas escavações por ela levadas a efeito. 18ª - Empreiteira essa que violou as mais elementares regras de segurança, nomeadamente o disposto nos artºs 138° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382 de 7 de Agosto de 1951 e 81° do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, aprovado pelo Decreto na 41.821/58, de 11 de Agosto de 1958. 19ª - Foi, pois, a omissão dos cuidados técnicos necessários, por parte da R BB, enquanto empreiteira, na realização da obra, a causa directa e adequada dos danos produzidos no prédio dos AA. 20ª - É um facto notório que as escavações num prédio exigem particulares cuidados decorrentes do facto de a retirada de terras poder provocar movimentos nos prédios vizinhos. 21ª - Qualquer cidadão comum sabe disso e conhece esses riscos, ainda que careça de conhecimentos técnicos ou especializados para os avaliar. 22ª - Estamos, assim, perante uma actuação/omissão em que, simultaneamente, se violam interesses das partes contratantes, bem como direitos de terceiros, como resulta dos artºs. 799º - 1 e 483º - 1 do Código Civil. </font><br>
<font>23ª - Se no contexto da execução de um contrato de empreitada, o empreiteiro causa lesão directamente a terceiro, por má prática profissional ou por violação das regras da arte (“legis artes”), seria de infundado formalismo considerar que os danos do terceiro não seriam indemnizáveis por aquele, quando é certo que no caso em apreço os AA recorreram a juízo para civilmente também responsabilizarem os causadores do dano. 24ª - O Tribunal não está vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art° 5°- 3 do CPC). </font><br>
<font> 25ª - Todos os prejuízos sofridos pelo dono da obra, em consequência da prestação defeituosa, integram uma responsabilidade contratual do empreiteiro, uma vez que esta tem origem na violação do direito creditício daquele à execução da obra sem defeitos e, por isso, a situação responsabilidade contratual consome o regime da responsabilidade extracontratual, sendo ele o aplicável, uma vez que entre lesante e lesado existe uma relação obrigacional na qual ocorreu o facto lesivo, justificando-se, pois, a sobreposição da responsabilidade adequada à violação dos contratos, evidenciando- se a responsabilidade contratual por violação de deveres laterais do empreiteiro. 26ª - Sem prescindir, o caso previsto no art.º 493º- 2 do CC, representa uma responsabilidade subjectiva agravada ou objectiva atenuada - uma solução intermédia entre uma e outra - de modo tal que o lesante só ficaria exonerado quando tenha adoptado todos os procedimentos idóneos, segundo o estado da ciência e da técnica ao tempo em que actua, para evitar a eclosão dos danos. 27ª – A R. BB é também responsável pelos danos causados no prédio dos AA e, por conseguinte, igualmente a R. Seguradora CC, por virtude do contrato de seguro celebrado com aquela, nas condições da apólice plasmadas nos autos. </font><br>
<font>28ª - As RR. BB e CC devem ser co-responsabilizadas e condenadas, em regime de obrigação solidária, nos pedidos em que vier a ser condenada a ora recorrente, ao abrigo do previsto nos artºs 483°, 486°, 493°-1 e 497°, todos do Código Civil. 29ª - O direito à indemnização configura-se como o direito à compensação ou preenchimento da diferença patrimonial entre a situação real e a situação hipotética em que o lesado se encontraria não fora o dano (art, 566° nº 2 CC). </font><br>
<font>30ª - Nestes casos, os factos relevantes determinantes da diminuição (ou não aumento) patrimonial verificada, devem ser alegados e demonstrados, como constitutivos do direito à indemnização (art. 342°-1 do CC). 31ª - Muito embora os AA tivessem enunciado o valor locativo da fracção, susceptível de funcionar como critério de fixação da medida da indemnização pela via da equiparação a lucros cessantes (teoria da comercialização do valor de uso), os AA não lograram demonstrar que esse ou outro prejuízo e muito menos que a fracção tinha, à data das escavações (“sinistro”) uma concreta utilização relevante. </font><br>
<font>32ª - Os AA não usavam a fracção, nem tinham intenções de a usar, pois a mesma à data das obras era ocupada por uma irmã do Autor AA, com a qual o mesmo e sua mulher estavam de relações cortadas e com a qual não falavam. </font><br>
<font>33ª - Ou seja, ainda que aderíssemos à tese plasmada do Acórdão - a privação do uso de um bem traduz um prejuízo para o respectivo proprietário - a plenitude do direito de propriedade não implica necessariamente o uso ou fruição do bem, como é o caso. 34ª - O exercício do uso e fruição corresponde a meras faculdades do proprietário, já que o direito de propriedade envolve apenas e tão só a mera faculdade (que pode ser exercida ou não...) de uso e fruição, logo, o exercício de tal faculdade configura uma manifestação de liberdade do dono no que concerne ao aproveitamento dos seus bens: o proprietário absentista que não usa nem cede o uso nem tenciona fazê-lo, isto é, o que não aproveita nem permite que os outros aproveitem, não sofre dano de privação do uso, pois que nenhuma desvantagem patrimonial lhe advém da eventual actuação de terceiro susceptível de impedir o seu uso... 35ª - A manter-se esta decisão, teremos certamente alguém (os AA.) que na perspectiva de receber mensalmente 250,00€ sem qualquer esforço, vão não só beneficiar de uma quantia que nunca pensaram poder vir a receber (ainda que pela via locativa, pois a fracção estava ocupada gratuitamente pela irmã...) e “esticar” ao máximo a resolução definitiva deste assunto, contrariando e “contaminando” a realização das obras no prédio, como tão bem têm sabido gerir ao longo de todo este tempo. 36ª - A mera privação do uso, independentemente da demonstração de factos reveladores de um dano específico emergente ou de um lucro cessante, é insusceptível de fundar a obrigação de indemnização, no quadro da responsabilidade civil. 37ª - Tomar como certo que a toda a privação, sem mais, corresponde um dano, será manter habilidades ou jogos de interesses que os Tribunais não podem alimentar. 38ª - Ainda que assim se não entenda, a quantia de 250,00€ fixada mostra-se manifestamente excessiva e desajustada à realidade do caso em apreço, devendo, nessa medida ser substancialmente reduzida nunca ultrapassar os 100,00€ mensais. 39ª - A condenação da R. Caixa na quantia de 250,00€ também, por esta razão, não deve manter-se. 40ª - Ou a manter-se, a mesma deve ser paga solidariamente também pelas RR. BB e CC, nos termos e pelas razões supra apontadas. 41ª - Mostram-se violados os preceitos legais, as regras substantivas e do processo acima identificados. Nestes termos e nos mais que por certo Vossas Excelências doutamente suprirão, deve dar-se provimento ao recurso e, nessa medida, revogar-se o douto Acórdão recorrido, com as legais consequências. </font><br>
<br>
<font>A R. BB apresentou contra-alegações, nas quais invocou a ilegitimidade da recorrente Caixa de Crédito Agrícola Mútuo relativamente à parte em que pretende a condenação solidárias das RR BB e CC e pugnando ainda pela improcedência do recurso, nessa parte,</font><br>
<br>
<font>Para além de apresentarem contra-alegações, nas quais pugnaram pela improcedência da revista, os AA., em requerimento autónomo) tomarem posição no sentido de - pugnando a recorrentes pela alteração da condenação das demais RR. quanto à obrigação de reparar o imóvel e pela alteração da sua condenação no pagamento de indemnização pela privação do uso da fração deles AA. - existir dupla conforme quanto ao 1º ponto e no sentido de em relação ao 2º ponto se não verificar o critério da sucumbência.</font><br>
<br>
<font>Colhidos os vistos, cumpre decidir:</font>
</p><p><font>II - </font><u><font>Questão prévia (admissibilidade da revista):</font></u>
</p><p>
</p><p><u><font>Quanto à ilegitimidade:</font></u><font> </font>
</p><p>
</p><p><font>Por despacho do Relator, de 10.05.2018, foi julgada improcedente a questão da ilegitimidade suscitada pela R. BB, ora recorrida. </font>
</p><p><font>E, inconformada com tal despacho do Relator, veio a mesma reclamar para a conferência, defendendo a ilegitimidade da R. Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL (na parte em que pretende a condenação solidária das co-rés), Alega para o efeito e em resumo que a condenação das co-rés em primeira instância em nada deve contribuir para a verificação da legitimidade da Recorrente para interpor o presente recurso, já que esta não pode ser aferida através da comparação entre a situação em que a Recorrente estaria quando abrangida pela decisão de primeira instância e a situação em que estaria quando abrangida pela decisão de segunda instância, que é o que aparenta acontecer no despacho de que ora se reclama e que a legitimidade do Recorrente deve ser aferida em função do prejuízo que para si decorre da decisão de que está a recorrer e da sua posição processual face aos demais intervenientes, nos termos do artigo 631º do CPC. </font><br>
<font> Mais alega que o apresentado pela Recorrente incide efetivamente sobre matéria relativamente à qual esta não figura como vencida, mas antes sobre matéria sobre a qual a Autora ficou vencida, vendo o peticionado ser apenas parcialmente considerado procedente, sendo que para que pudesse efetivamente interpor recurso contra a sua co-ré (aqui Recorrida), a Recorrente, teria que ter feito contra esta algum pedido, como por exemplo, o reconhecimento de um eventual direito de regresso e que, ao não peticionar no processo, o reconhecimento do seu eventual direito de regresso, deduzindo o respetivo pedido contra as co-rés, a Recorrente sabia que, se as Rés fossem solidariamente responsabilizadas, cumprindo integralmente a sentença, teria eventualmente e por força da lei, direito de regresso, mas sabia também que, caso a responsabilidade recaísse somente sobre si, não tendo pedido o reconhecimento de tal direito, não teria legitimidade para recorrer com esse fundamento. </font><br>
<font> </font><br>
<font> No despacho do relator a afirmação da legitimidade da recorrente baseou-se na seguinte fundamentação:</font><br>
<br>
<font> </font><i><font>“Diz a ora recorrida R. BB que o recurso ora apresentado pela recorrente incide sobre matéria relativamente à qual esta não ficou vencida. </font></i><br>
<i><font>Dispõe-se efetivamente no nº 1 do art. 631º do CPC que, “sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes (o que não está ora em causa) os recursos só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido”.</font></i><br>
<i><font>Como diz A. Geraldes (in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., pag. 67 “é parte vencida aquela que é objetivamente afetada pela decisão, ou seja, a que não tenha obtido a decisão mais favorável aos seus interesses”. </font></i><br>
<i><font>Segundo Miguel Teixeira de Sousa (in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutro Armando M. Marques Guedes, Coimbra, 2004, pag. 948) “o interesse em recorrer… não assenta numa relação da parte com o objeto da causa, mas antes nas consequências que uma decisão judicial pode produzir na esfera jurídica desse sujeito” </font></i><br>
<i><font>É certo que no acórdão da Relação, de que recorre apenas a R. Caixa Agrícola, só esta foi condenada – o que, a priori, poderia levar à conclusão de que a mesma nada tinha a ver com a absolvição das demais RR. (que, com ela, também haviam sido condenadas na 1ª instância), ou seja, que a absolvição das demais RR. não constituía para si qualquer prejuízo.</font></i><br>
<i><font>É, de resto, neste sentido que a R. BB coloca e defende a questão da ilegitimidade da recorrente.</font></i><br>
<i><font>Todavia também é certo que a R. ora recorrente havia sido condenada com as demais RR. (e nos termos peticionados pelos autores) e</font></i><i><u><font>m regime de solidariedade.</font></u></i><br>
<i><font>Em suma, em vez de ficar responsável pelo pagamento das indemnizações e pelo cumprimento das demais imposições (nos termos do decidido na 1ª instância), juntamente com as demais RR., em regime de solidariedade, a R. Caixa de Crédito Agrícola passou a ficar sozinha nessa responsabilidade. E isso traduz-se, para si, num claro prejuízo – conforme bem defende a recorrente.</font></i><br>
<i><font>É o que resulta claramente do disposto no art. 524º do C. Civil, nos termos do qual “o devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competir tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a estes compete”.</font></i><br>
<i><font>Resultando da lei (art. 513º do C. Civil) que a solidariedade entre devedores emerge da lei ou da vontade das partes, conforme diz Vaz Serra (in RLJ, 103º - 108) “o dever de regresso destina-se a nivelar as situações de vários devedores parecendo que, por corresponder ao “quod plerumque accidit” ou pela impossibilidade de firmar outra presunção, as quotas dos devedores devem ser iguais, salvo se coisa diversa se tiver determinado”.</font></i><br>
<i><font>Assim, tendo em conta a alteração produzida pela Relação, em termos finais, em vez de o resultado da condenação se vir a repercutir no património das três RR. (na proporção a discutir e determinar oportunamente, noutro âmbito) o mesmo acaba por se repercutir apenas no património da R. recorrente.</font></i><br>
<i><u><font>É assim manifesta a legitimidade da R. recorrente, na parte em que pretende que as demais RR, sejam com ela condenadas em regime de solidariedade</font></u></i><i><font> (nos termos em que haviam sido condenadas na 1ª instância). (…)</font></i><br>
<i><font>Impõe-se assim concluir no sentido da legitimidade da R. Caixa Crédito Agrícola para recorrer do acórdão da Relação.”</font></i><br>
<font> </font><br>
<font>Analisada a questão </font><i><font>sub judice</font></i><font>, afigura-se-nos como sendo inteiramente ajustada a decisão do Relator relativamente à questão da ilegitimidade em questão, da recorrente Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL – atenta a respetiva fundamentação que ora se subscreve.</font><br>
<font>Importa ainda dizer que, contrariamente ao que defende a R. reclamante BB, não fazer sentido, para os efeitos em questão, a exigência da dedução no processo de um pedido de reconhecimento do seu direito de regresso contra as co-rés, na medida em, conforme decorre nomeadamente do nº 1 do art. 576º do CPC, o pedido reconvencional apenas poderia ser deduzido contra a Autora.</font><br>
<br>
<font>Assim, indeferindo-se a reclamação, afirma-se a legitimidade da Ré recorrente.</font><br>
<br>
<u><font>Quanto à dupla conforme:</font></u><br>
<br>
<font>Defendem os Autores ora recorridos a inadmissibilidade da revista, na parte respeitante à pretensão de alteração do decidido pela Relação, no sentido da também condenação das demais Rés, face à existência de dupla conforme.</font><br>
<font>Todavia sem razão, na medida em que, pressupondo a dupla conforme, enquanto impedimento da admissibilidade da revista normal, previsto no nº 3 do art. 671º do CPC, para além do mais, a confirmação pela Relação da decisão proferida na 1ª instância, </font><i><font>in casu, </font></i><font>não se verifica tal confirmação, na medida em que uma coisa é a condenação da Ré recorrente juntamente com as demais Rés, em regime de solidariedade, nos termos decididos na 1ª instância, e outra coisa, bem diferente, é a condenação apenas da Ré recorrente (com diferentes efeitos jurídicos, quer quanto a esta, nos termos supra mencionados, quer quanto aos próprios Autores recorridos). Inexiste, pois, a invocada dupla conforme.</font><br>
<br>
<u><font>Quanto à sucumbência:</font></u><br>
<br>
<font>Defendem ainda os Autores recorridos a inadmissibilidade da revista na parte respeitante ao valor da sucumbência, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do art. 629º do CPC. Isto, porque, ainda segundo os mesmos, tendo o valor da causa sido fixado em € 30.000,01, ou seja em valor superior à alçada da Relação (€ 30.000,00), a decisão relativa à condenação da Ré recorrente em indemnização mensal pela privação do uso da fração A, é desfavorável a esta em valor inferior à metade dessa alçada.</font><br>
<font>Trata-se todavia de questão que apenas se poderia colocar no caso da inadmissibilidade do recurso na parte restante – o que, como vimos, não ocorre.</font><br>
<br>
<font>Em face do exposto, nada obsta ao conhecimento da revista.</font>
</p><p>
</p><p><font>III – </font><u><font>Questões a conhecer:</font></u>
</p><p>
</p><p><font>Em face do conteúdo das conclusões das alegações do recorrente, enquanto delimitativas do objeto do recurso (arts. 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2 do CPC), são as seguintes as questões de que cumpre conhecer:</font>
</p><p><font>- condenação das demais Rés;</font>
</p><p><font>- indemnização pela privação do uso da fração.</font><br>
<br>
<br>
<font>IV- </font><u><font>Factualidade provada:</font></u><br>
<br>
<font>Tendo-se com conta as alterações introduzidas pela Relação, em resultado do julgamento da impugnação da matéria de facto, é a seguinte a </font><u><font>factualidade que se mostra provada</font></u><font> (renumerada, em função das alterações efetuadas pela Relação):</font><br>
<br>
<font>1) Os Autores são donos e legítimos proprietários do prédio constituído em propriedade horizontal sito no ..., prédio esse constituído por cinco fracções e descrito na Conservatória sob o n.º 1709 e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 8075. 2) Os Autores AA e mulher são donos das fracções “A”, “D” e “E” desse prédio. 3) A fracção “C”, é propriedade da Autora “DD, CRL”. 4) A fracção “B” é propriedade de EE e mulher, FF e GG, em compropriedade. 5) Encontra-se registada a favor de cada um deles a respectiva propriedade na indicada descrição predial da Conservatória do Registo Predial da .... 6) A Ré Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ..., CRL, é dona do prédio sito no ..., da mesma freguesia e concelho, prédio esse descrito na Conservatória do Registo Predial da ... sob o n.º 3225 e inscrito na matriz respectiva sob o artigo urbano 2648. 7) Prédio este contíguo ao prédio dos Autores confrontando os prédios pelos lados Sul e Poente do prédio dos Autores. 8) A Ré CCAM construiu a sua actual sede social nesse seu prédio. 9) A Ré BB, S.A. foi a sociedade que construiu esse edifício tendo celebrado um contrato de seguro com a Ré CC, S.A. quanto aos danos resultantes da sua obra, titulado pela apólice 0000000. 10) A obra foi titulada pelo alvará de licença de obras emitido pela Camara Municipal da .... em 12.11.2007. 11) Na execução dessas obras a primeira Ré iniciou a escavação desse terreno a qual atingiu mais de 6 metros de profundidade e foi realizada até à extrema do terreno que confronta com o prédio dos Autores com o objectivo de construir os dois pisos de cave do edifício da CCAM. 12) Na execução dessa escavação, verificaram-se deslizamentos subterrâneos de terra que vieram a causar a alteração do solo do terreno onde se encontra erigido o edifício dos Autores (em resultado da alteração feita pela Relação). </font><br>
<font>13) O que veio a causar o assentamento da parede Sul e do piso térreo do prédio dos Autores. 14) A fracção A (cave) do edifício encontra-se inabitável devido ao assentamento do piso térreo e às inúmeras e profundas fendas das paredes exteriores. 15) A parede sul do edifício, ao nível da fracção térrea, apresenta enormes fendas por onde se vê de dentro da fracção para fora. 16) Esta parede é estrutural porquanto nela se apoiam várias vigas de betão. 17) O edifício encontra-se em esforço e em carga. 18) As paredes interiores desta fracção apresentam grandes fissuras e fendas por onde se vê de um compartimento para o outro e por onde passa uma mão. </font><br>
<font>19) Os peitoris das janelas encontram-se desnivelados não funcionando as janelas de correr. 20) Todos os andares superiores apresentam, do lado Sul, fissuras. 21) Algumas janelas do lado Sul de cada uma dessas fracções deixaram de funcionar devido ao desnivelamento do edifício. 22) Todos estes defeitos foram consequência directa da obra de escavação levada a cabo no terreno da Ré CCAM pela Ré BB. 23) Ainda devido às obras da Ré BB e aos seus efeitos sobre a estrutura do prédio dos AA., as canalizações de água e saneamento existentes no pavimento térreo – fracção A - acabaram por estalar e partir. 24) Nesta data ainda vão aparecendo fissuras nos andares superiores do lado Sul. 25) Os danos estruturais que o edifício sofreu são profundos e irreversíveis. 26) A inclinação do edifício não é passível de reparação mas tão só de contenção e estabilização. 27) As obras de contenção estabilização importarão a injecção de calda de betão no subsolo para a estabilização do terreno. 28) Não é, ainda, possível concretizar as obras necessárias sendo necessário proceder a estudos geotécnicos. 29) Para além das obras de intervenção na estrutura do edifício são necessárias obras de reparação na cave e nas restantes frações do prédio. 30) É necessário proceder à reparação do saneamento do edifício nomeadamente das condutas principais cuja tubagem se partiu. 31) É necessário reparar as janelas e caixilhos que deixaram de funcionar por via dos danos no edifício (Em resultado da alteração feita pela Relação). 32) É necessário reparar as paredes de cada uma das fracções que se encontram fissuradas por via dos danos no edifício. 33) Na fracção A é necessário reparar os danos nas paredes e saneamento e os que vierem a decorrer por via das obras de contenção e estabilização do edifício. 34) É necessário reparar os danos que no decorrer da acção se venham a verificar das fracções em consequência do assentamento do edifício. 35) Em consequência das obras levadas a cabo pela Ré BB no prédio da Ré CCAM a fracção A, propriedade dos Autores AA e mulher | [0 0 0 ... 0 0 0] |
ITJ9u4YBgYBz1XKv8RFP | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font>
<p><b><font> </font></b><font> </font><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I - AA, S.A.</font></b><font> (com a atual denominação de </font><b><font>BB, S.A.</font></b><font>) intentou ação declarativa ordinária contra </font><b><font>CC, Lda.</font></b><font>, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 714.377,20, acrescida de juros de mora vencidos desde a data de citação até ao seu integral pagamento. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegou para tanto e em resumo que tendo acordado com a Ré o exclusivo de distribuição dos produtos desta da linha “Tena” e “Libero”, para as farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos em Portugal continental, organizou uma estrutura logística para armazenamento e venda, fez subir o volume de vendas daqueles produtos às farmácias e armazenistas e que, numa reunião, a Ré lhe comunicou que ia passar a fornecer diretamente os ditos produtos às farmácias e armazenistas - o que lhe acarretou prejuízos cuja reparação peticiona e discrimina da seguinte forma: - € 209.099,00, a título de </font><u><font>indemnização por falta de pré-aviso</font></u><font>, nos termos do art. 29.º do DL n.º 178/86, de 03-07, correspondente à remuneração média mensal da autora no ano anterior multiplicada pelo tempo de pré-aviso não respeitado de 6 meses;</font>
</p><p><font>- € 405.278,20, a título de </font><u><font>indemnização de clientela</font></u><font>, nos termos dos arts. 33.º e 34.º do DL n.º 178/86, de 03-07;</font>
</p><p><font>- € 100.000, a título de </font><u><font>indemnização por danos de imagem</font></u><font>.</font>
</p><p><font>A Ré contestou, defendendo-se por impugnação, invocando a litigância de má-fé da Autora, e deduziu reconvenção, pedindo a condenação da utora/Reconvinda a pagar-lhe a quantia de € 175.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a notificação da reconvenção até integral pagamento e como litigante de má-fé num valor não inferior a € 200.000,00. </font>
</p><p><font>Realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><b><font>sentença</font></b><font>, nos termos da qual </font><u><font>a ação foi julgada parcialmente procedente</font></u><font>: </font><i><font>- Condenando-se a R. a pagar à A. a quantia que se apurar em liquidação de sentença a título de indemnização pela denúncia sem um pré-aviso aviso de seis meses, tendo por referência o valor do lucro líquido médio mensal obtido pela A. no ano de 2004, multiplicada por seis (artigo 29º, n.º2, DL n.º178/86, de 3 de Julho), com o limite máximo de € 209.099,00; </font></i>
</p><p><i><font>- Condenando-se a R. a pagar à A. a quantia de € 200.000,00 a título de indemnização de clientela, acrescida de juros, à taxa comercial, desde a presente data até integral pagamento; </font></i>
</p><p><i><font>E absolvendo-se a R. do mais peticionado; </font></i>
</p><p><i><font>Por sua vez, </font></i><i><u><font>a reconvenção foi julgada totalmente improcedente</font></u></i><i><font>, sendo a A. absolvida do pedido reconvencional. E considerou-se não se verificar a litigância de má-fé da A. invocada pela R.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Inconformadas, recorreram de apelação a Ré (recurso principal) e bem assim a Autora (recurso subordinado).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Conhecendo de tais recursos, </font><b><u><font>a Relação de Évora:</font></u></b><b><font> </font></b><i><font>- Julgando parcialmente procedente a apelação da R., </font></i><i><u><font>revogou a sentença na parte em que a R. foi condenada a pagar à A. a quantia de € 200.000,00 a título de indemnização de clientela, acrescida de juros, à taxa comercial, desde a presente data até integral pagamento</font></u></i><i><font>;</font></i>
</p><p><i><font>- E julgou totalmente improcedente o recurso da A.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Inconformadas, </font><b><font>recorreram de revista ambas as partes</font></b><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><u><font>A R. SCA</font></u></b><font> formulou na sua revista as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> DA EXCLUSIVIDADE DO CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO: </font>
</p><p><font>A) Entendeu o Douto Acórdão ora recorrido de que o contrato firmado entre Recorrente e Recorrida era de distribuição comercial e com carácter de exclusividade uma vez que ficou provado no ponto 5 de que “As encomendas de fraldas “Tena” e “Libero” das farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos feitas à R. eram reencaminhados por esta para a AA, S.A.”. </font>
</p><p><font>B) Porém não só este ponto não prova a existência de qualquer venda exclusiva da Recorrente à Recorrida, como o há que concatenar com os pontos que lhe são prévios, mormente os pontos nºs 3 e 4 os quais dispõem que:</font>
</p><p><i><font>- De 1999 até 2005, a AA S.A. (Autora) comprou todas as fraldas “Tena” e “Libero” apenas à R. para posterior venda às farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos; </font></i>
</p><p><i><font>- Os preços de venda das fraldas “Tena” e Libero” da AA, S.A.” às farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos eram fixados pela R., através de tabelas que esta remetia àquela;</font></i>
</p><p><font>e com o ponto nº 10, ulterior, no qual é referido que: </font>
</p><p><i><font>- Pelo menos a partir de 2002, a R. remunerava a AA, S.A., com um desconto adicional de 2,5% do valor de compras efectuado por esta, por apenas se dedicar, quanto a fraldas de incontinência, à venda junto das farmácias e armazenistas de produtos financeiros das linhas “Tena” e “Libero”.</font></i><font> </font>
</p><p><font>C) Basta este ponto nº 10 ter sido dado como provado que impossibilita a possibilidade da tese do contrato de distribuição exclusiva poder vingar. </font>
</p><p><font>D) Do conjunto da matéria dada como provada e supra referida só se pode concluir estarmos, “in casu”, perante uma situação de marca exclusiva e não de distribuição exclusiva. </font>
</p><p><font> E) Um contrato de distribuição exclusiva imporia, em primeiro lugar, que fosse a Recorrente a vender apenas à Recorrida e não a Recorrida a comprar apenas à Recorrente para obter assim benefícios comerciais e económicos. </font>
</p><p><font>F) O ponto nº 5 da matéria provada acaba por confirmar de que a Recorrida apenas comprava à Recorrente pois esta reencaminhava-lhe as encomendas de forma a incentiva-la a vender mais e assim a receber os benefícios pecuniários decorrentes de só a ela comprar este tipo de produtos e através das tabelas que lhe enviava. </font>
</p><p><font>G) Se estivéssemos perante um contrato de distribuição exclusiva, entre duas empresas autónomas e totalmente independentes, a Recorrente teria de se ter vinculado a vender os seus produtos unicamente à Recorrida, a Recorrida revendia os produtos aos preços e condições que entendesse por convenientes, a Recorrente nunca atribuiria um prémio consubstanciado no desconto adicional de 2,5% pelo facto da Recorrida só vender os seus produtos, pois esta estaria “ab initio” vinculada e obrigada a vender, unicamente, os seus produtos. </font>
</p><p><font>H) Caso existisse, realmente, um contrato de distribuição exclusiva não havia razão alguma para que existissem descontos adicionais pelo facto do distribuidor apenas vender produtos da concedente junto das farmácias. </font>
</p><p><font>I) Caso existisse um contrato de distribuição exclusiva, nunca existiriam tabelas de preços dirigidas a todos os revendedores, conforme resulta dos docs. nº s 4 a 7 junto à PI bem como do ponto nº 4 da matéria provada, sendo certo que com valores mais favoráveis para a Recorrida pelo que, caso algum fornecedor pretendesse adquirir algum produto à Recorrente pelo preço da tabela, esta vender-lho-ia necessariamente. </font>
</p><p><font> J)Acresce ainda que, conforme decorre do teor dos documentos nºs 26 a 94 junto ao articulado de contestação/reconvenção, a Recorrente nunca deixou de vender estes seus produtos a outras entidades que não, exclusivamente, a Recorrida. </font>
</p><p><font>K) Esta evidência foi ainda confirmada pelo relatório pericial notificado às partes em 22.10.2012, nomeadamente na resposta à 1ª, 2ª e 4ª questões no qual é referido, de forma expressa que </font><i><font>“Pela análise documental do quesito verificámos que a Ré continuou a fornecer armazenistas de produtos farmacêuticos.”</font></i><font> DA DENÚNCIA TÁCITA: L) É entendido no Douto Acórdão ora recorrido de que a alteração das condições do contrato por parte da Recorrente equivale à sua denúncia tácita, o que esta não pode aceitar. M) Com efeito, entende a Recorrente que, aplicando-se “in casu” o artigo 28º nº 1 do D.L. nº 178/86 de 03 de Julho, conforme decorre aliás de forma expressa do Douto Aresto ora colocado em crise, o qual impõe e exige que a denúncia contratual seja sempre efectuada por escrito, não pode ser admissível a denúncia tácita. </font>
</p><p><font>N) Aliás, é relevante o facto da Anotação do Sr. Prof. Batista Machado invocada no Douto Acórdão ora recorrido ser anterior à entrada em vigor do supra mencionado preceito legal e daí ser de difícil aplicação ao presente caso. </font>
</p><p><font>O) Existindo a partir de 01.07.1986 uma lei especial, a qual exige que a denúncia seja escrita, não se pode admitir, no entendimento da Recorrente, a aplicabilidade do artigo 217º do Código Civil aplicando-se o princípio </font><i><font>“lex specialis derrogat legi generali”</font></i><font> conforme decorre do nº 2 do artigo 7º mesmo Código. </font>
</p><p><font>P) Mesmo que tal se não entenda e se admita “in casu” e em abstracto, a possibilidade de existência da denúncia tácita, da matéria provada nunca se poderia concluir por tal denúncia. </font>
</p><p><font>Q) A denúncia tem sempre como desiderato último, terminar com uma relação contratual. </font>
</p><p><font>R) Em momento algum a Recorrente teve a intenção de terminar com o contrato que detinha e ainda detém actualmente com a Recorrida, conforme decorre de pontos da matéria provada como o nº 35, a saber;</font>
</p><p><i><font>- A AA, S.A. nos meses de Julho, Agosto, Setembro Outubro, Novembro e Dezembro de 2005, teve um volume de vendas das fraldas “Tena” e “Libero” de, respectivamente; €: 63.305,94, €: 38.541,91, €: 41.455,53, €: 29.528,74; €: 18.824,27 e €: 11.536, 22, perfazendo o valor total de €: 203.192,61; </font></i><font> </font>
</p><p><font>S) E da matéria não provada com os nºs 5 e 8, a saber:</font>
</p><p><i><font>- Após Julho de 2005, a AA deixou “praticamente” de receber qualquer retribuição pelas vendas realizadas a farmácias e distribuidores de produtos farmacêuticos;</font></i>
</p><p><i><font>- A AA, S.A. desinteressou-se do “negócio” com a R., não realizou compras e quis pôr termo àquele, o que provocou “danos à imagem”; </font></i>
</p><p><font> T) Interpretando estes factos ao abrigo do disposto no artigo 236º do Código Civil, parece evidente, face à matéria dada como provada e não provada na presente lide de que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, concluiria que tanto a Recorrente como a Recorrida pretenderam manter até hoje o contrato apesar das alterações nele introduzidas. </font>
</p><p><font>U) O que é bem comprovado pelo facto da Recorrente continuar a vender à Recorrida e esta continuar a comprar os produtos em causa, sem qualquer hiato temporal, desde Junho de 2005 até à presente data, com os mesmos três vendedores, o empregado de armazém e o administrativo, conforme decorre do ponto 41 da matéria provada e mantendo interesse na sua manutenção, conforme resulta inelutavelmente do ponto 8 da matéria não provada </font><i><font>“a contrario”.</font></i>
</p><p><font>V) Assim, é bem evidente que inexistiu qualquer denúncia tácita do contrato de distribuição pois tal denúncia não pode ser extraída de uma forma objectiva, inequívoca e/ou com elevado grau de probabilidade, do comportamento da Recorrente. </font>
</p><p><font>W) Assim, inexistindo qualquer denúncia tácita por parte da Recorrente por não estarem preenchidos os pressupostos previstos no artigo 217º nº 2 do Código Civil, inexiste igualmente a obrigatoriedade de pagamento de qualquer indemnização ao abrigo do disposto nos artigos 28º nº 1 e 29º do D.L. nº 178/86. </font>
</p><p><font>X) O Douto Acórdão ora recorrido violou os artigos 7º nº 2, 217º nº 2 e 236º do Código Civil bem como os artigos 28º nº 1 e 29º do D.L.nº 178/86. Ao revogarem o Douto Despacho ora recorrido e substituindo-o por outro que dê integral provimento à presente revista apresentada pela Recorrente, estarão V. Exas., Venerandos Conselheiros, a produzir a tão costumada e habitual justiça!</font>
</p><p><font> </font><b><font>A A. apresentou contra-alegações</font></b><font> nas quais, para além de pugnar pela improcedência da revista da R., </font><u><font>suscitou a questão da inadmissibilidade da mesma,</font></u><font> sendo que, convidada a pronunciar-se, a R. tomou posição no sentido da admissibilidade do recurso (</font><u><font>nos termos a que adiante aludiremos)</font></u><font>. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por sua vez, </font><b><u><font>a A. OCP</font></u></b><b><font> </font></b><font>formulou na sua revista as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1ª - Prevendo-se nos artigos 33.0 e 34.0 do RJCA a indemnização de clientela para os contratos de agência é entendimento unânime que a função desempenhada pelo concessionário, no contrato de concessão, reclama, em abstrato, tutela semelhante, pois, prosseguindo o concessionário objetivos relacionados com a distribuição ou venda dos produtos ou com a prestação de serviços, a sua atividade é suscetível de se projetar também positivamente na esfera do concedente. </font>
</p><p><font>2ª - Da matéria de facto provada resulta que o acordo celebrado entre a Autora e a Ré se trata de um contrato de concessão comercial e, em particular, que a forma como o mesmo foi modelado pelas partes previa uma vigorosa integração da Autora na rede da Ré justificando a aplicação analógica do disposto no artigo 33.º do RJCA. </font>
</p><p><font>3ª - Ficou provado que, durante mais de 6 anos, a Autora foi distribuidora exclusiva, em Portugal continental, das fraldas "Tena" e "Libero" junto das farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos, efeito para o qual se dotou de uma estrutura logística e de recursos humanos adequados (cf. factos provados 3, 5, 11 e 12) </font>
</p><p><font>4ª - A integração da Autora na rede de distribuição da Ré resulta patente, entre outros índices, do facto de a Ré fixar os termos do contrato de distribuição, particularmente o preço dos produtos e fixando objectivos de venda, bem como da definição conjunta de políticas de marketing (cf. factos provados 4, 6, 7, 8, 9 e 10) </font>
</p><p><font>5ª - A justificação avançada pelo Tribunal da Relação para se afastar do entendimento exemplarmente fundamentado do Tribunal de Comarca, para além de ser pobre e parcamente alicerçado, sobrepõe-se claramente à realidade dos factos, porquanto não tem consideração nem se debruça, de modo elucidativo, sobre os contornos da relação comercial estabelecida em concreto entre a Ré e a Autora. </font>
</p><p><font>6ª - A decisão avançada pelo Tribunal da Relação é, aliás, contrária aos mais elementares princípios de lógica e raciocínio, não só jurídicos, mas mesmo lógicos, porquanto afirma que </font><i><font>"é certo que da matéria de facto provada resulta que entre o ano de 1999 e o ano de 2004, a AA, S.A. angariou novos clientes para as fraldas "Tena" e "Libero" e aumentou o seu volume de vendas, o qual subiu do valor de €682.671,00 para €2.052.092,37"</font></i><font>, mas logo de seguida conclui, com base nesse facto, não se ter patenteado que </font><i><font>"tenha havido por parte da Autora, ao contrário de muitos concessionários, um empenho vigoroso na angariação da clientela para os produtos da Ré".</font></i><font> </font>
</p><p><font>7ª - De matéria de facto provada resulta que a Autora vendeu em 1999, €682.671,00 em fraldas Tena e Libero, valor esse que aumentou para um total de €2.052.095 em 2004, sendo tal quadruplicação de valores elucidativa do empenho vigoroso da Autora na angariação de novos clientes para os produtos da Ré, e nega-lo é contrário às regras da lógica e experiência (cf. factos provados 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 35,36,37,38,39,40 e 41). </font>
</p><p><font>8ª - Mais nenhuma justificação é avançada pelo Tribunal da Relação de Évora para sustentar a não aplicação analógica da indemnização de clientela ao contrato de concessão comercial em escrutínio. </font>
</p><p><font>9ª - Pelo que se deve entender, sob pena de se incorrer numa aplicação do Direito errada e desfasada dos factos provados, que o contrato de concessão comercial celebrado entre a Autora e a Ré, dado os seus contornos específicos, eram aptos a, verificados que estejam os pressupostos previstos no art. 33.0 do RJCA, justificar a aplicação analógica da indemnização de clientela. </font>
</p><p><font>10ª - Relativamente aos requisitos de que depende a aplicação, em concreto, da indemnização de clientela, é entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência não aplicação aos contratos de concessão comercial do disposto na aI. c) do artigo 33.0 do RJCA, por ser específico do contrato de agência, o que foi corroborado nestes autos pela l.ª e pela 2.ª Instância. </font>
</p><p><font>11ª - Quanto ao requisito previsto na al. a) do art. 33.º do RJCA, fico provado que fruto da iniciativa da Autora e sua equipa de vendas, os produtos Tena e Libero rapidamente se impuseram no mercado das farmácias e armazenistas distribuidores de produtos farmacêuticos, tendo a Autora angariado inúmeros novos clientes para os produtos da Ré e aumentado substancialmente, e de forma crescente e consistente, o volume de venda daqueles produtos, o qual subiu de €682.671,00 em 1999 para €2.052.092,37 em 2004 (cf. factos provados 15,16,17,18,19,20,21,22,23,24,25,26,27,28). </font>
</p><p><font>12ª - Relativamente à al. b), a cessação do contrato de concessão comercial com a Autora levou a que a Ré se aproveitasse, desavergonhadamente, do seu esforço e capacidade comercial na promoção e venda dos produtos Tena e Libero no canal de farmácias, através da venda direta a clientes angariados e trabalhados para aqueles produtos pela Autora, feita, inclusive, com recurso ao agente externo da Autora, DD. </font>
</p><p><font>13ª - Prova disso mesmo é que, no primeiro semestre de 2005 as vendas acumuladas ascendiam a €948,444,OO, tendo diminuído abruptamente, no segundo semestre de 2005, após a cessação do contrato pela Ré, para €203.192,61, o que se traduziu numa quebra das vendas nesse ano no valor total de €900,458,02, e na redução para menos de 2/3, no segundo semestre, da venda das fraldas Tena e Libero pela Autora, o que se deveu à venda directa de tais fraldas pela Ré às farmácias e armazenistas distribuidores de produtos farmacêuticos (cf. factos provados 35, 36, 37, 38, 39 e 40). </font>
</p><p><font>14ª - Por comparação, ficou provado que no ano anterior de 2004, a Autora havia vendido, no segundo semestre, a quantia total de €965.017,73 (cf. facto 37). </font>
</p><p><font>15ª - Ficou provado que a queda das vendas no segundo semestre de 2005 resultou numa diminuição, em relação a igual período do ano anterior, de 78,40% dos lucros da Autora, o que constitui uma quebra de vendas no valor total de €900,458,02, dos quais €761.825,12 se verificaram no segundo semestre, coincidente com a cessação do contrato pela Ré (cf. factos provados 35,36,37,38,39 e 40). </font>
</p><p><font>16ª - É notório que a Ré viu canalizada para si a procura de fraldas para bebé e incontinência, tendo continuado a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, do aumento da mesma gerado pela atuação comercial da Autora junto das farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos, a quem a Ré passou a distribuir diretamente, com o auxílio de DD, as fraldas Tena e Libero, ou, pelo menos, que lhe terá ficado aberta tal potencialidade em virtude do trabalho desenvolvido pela Autora, conforme decorre do critério constante da parte final do n.º 4 do artigo 607.º do CPC. </font>
</p><p><font>17ª - O facto de que durante a vigência do contrato de concessão comercial a Ré ter sido esporadicamente contactada por farmácias e armazenistas de produtos farmacêuticos que lhe encomendavam fraldas "Tena" e "Libero" (e que a Ré reencaminhava depois para a Autora) não afasta ou diminui o aproveitamento feito pela Ré do trabalho desenvolvido pela Autora, nem leva à conclusão de que esta era já uma força motriz na angariação de clientela. </font>
</p><p><font>18ª - Tais contactos eram meramente residuais e antes da intervenção da Autora, já a Ré não explorava há mais de cinco anos o canal farmácias e, quando explorava, o seu mercado era meramente incipiente, só se tendo tornado relevante a presença das marcas "Tena" e "Libero" no canal farmácias após e por força da intervenção da Autora. </font>
</p><p><font>19ª - O contacto do concedente por potenciais clientes é, aliás, inerente aos próprios contratos de agência e concessão comercial, na medida por vezes que estes contactam, fruto do desenvolvimento e trabalho de implementação da marca levado a cabo pelos concessionários, os titulares da marca em si mesmos. </font>
</p><p><font>20ª - Nem a lei nem a jurisprudência consideram necessário que a aquisição ou incremento da clientela tenha de ser exclusivamente imputada à atividade do concessionário, pois a eventual atividade do concedente, que no caso dos autos não existiu, não retira o mérito e o resultado da efetiva e relevante atividade empresarial desenvolvida pela Autora, evidenciada pelo aumento do valor das vendas no decurso dos anos por que vigorou a sua relação comercial. </font>
</p><p><font>21ª - A lei não exige o efetivo aproveitamento que a Ré fez do trabalho da Autora ou a prova desse aproveitamento, mas sim num juízo de prognose que permita aferir se à Ré foi proporcionada a possibilidade de obter ganhos com a clientela angariada pela Autora. </font>
</p><p><font>22ª - Pelo que se deve entender que o disposto na al. b) do DL n.º 178/86 se encontra inegavelmente verificado, uma vez que, de acordo com um juízo de prognose, é incontestável que a atuação da Autora tenha sido idónea ao aproveitamento da clientela por esta angariada pela Ré após a cessação do contrato, a qual beneficiou de uma carteira de clientes até então inexistente e da implementação de uma marca no mercado que, até 1999, nenhuma expressão tinha. </font>
</p><p><font>23ª - Bem decidiu a 1.ª Instância ao dar verificado o pressuposto plasmado na al. b) do artigo 33.° do RCJA, pelo que não pode ser admitida a revogação da sentença, na parte em que condena a Ré a pagar uma indemnização de clientela à Autora, nos termos propugnados pelo Tribunal da Relação. </font>
</p><p><font>24ª - A Ré deve ser condenada no pagamento de uma indemnização de clientela no montante de €405.278,20, quantia esta que corresponde à média anual das remunerações recebidas pela Autora entre os anos de 2000 e 2004. </font>
</p><p><font>25ª - A quantificação da indemnização de clientela levada a cabo pelo tribunal de 1.ª Instância não sopesou devidamente a globalidade das circunstâncias quantitativas e qualitativas que rodearam o contrato de concessão comercial </font><i><font>sub judice</font></i><font>, pelo que a decisão por si proferida quanto a esta matéria não foi équa. </font>
</p><p><font>26ª - Segundo a jurisprudência dos nossos tribunais superiores, entre os fatores a que o tribunal deve atribuir relevo no seu juízo de equidade conducente à fixação do montante devido, deve dar-se destaque positivo, nomeadamente à longa duração do contrato; ao esforço de implantação da marca, feito pela concessionária, nomeadamente através de campanhas de marketing; ao número de clientes angariado e ao volume de negócios; ao volume de compras efetuado pela concessionária ao concedente; aos investimentos feitos pela concessionária para obter os objetivos visados pelo contrato e a outros aspetos que, no caso concreto, venham a assumir relevância. </font>
</p><p><font>27ª - No caso dos autos, o contrato durou seis anos, teve carácter de exclusividade, a Autora fez inúmeras campanhas de marketing e formação, dedicou a título principal uma equipa de 5 pessoas e dotou-se de meios logísticos para garantir a implementação das marcas da Ré no canal de farmácias (cf. factos provados 3, 14,8, 11 e 12) </font>
</p><p><font>28ª - Fruto da iniciativa e esforço da Autora e sua equipa de vendas, os produtos Tena e Libero impuseram-se no mercado das farmácias e armazenistas distribuidores de produtos farmacêuticos, tendo a Autora angariado inúmeros novos clientes para os produtos da Ré e aumentado substancialmente, e de forma crescente e consistente, o volume de venda daqueles produtos, o qual subiu de €682.671,OO em 1999 para €2.052.092,37 em 2004 (cf. factos provados n.º 15 e 20); </font>
</p><p><font>29ª - O incremento do lucro da Autora e a implementação no mercado das marcas Tena e Libero tiveram como correspetivo direto o incremento das vendas e aumento de lucros por parte da Ré, que, em 2004, triplicou as vendas daquelas fraldas em relação a 1999. </font>
</p><p><font>30ª - Verificando o crescimento constante das vendas e lucros realizados ela Autora e certa da implementação das marcas Tena e Libero no mercado, a Ré, em 2005, quis trazer para si o negócio das fraldas e suprimir a Autora da cadeia de distribuição, passando a própria Ré a fornecer diretamente a farmácias e armazenistas distribuidores de produtos farmacêuticos. </font>
</p><p><font>31ª - Após a cessação do contrato pela Ré, a queda das vendas no segundo semestre de 2005 resultou numa diminuição, em relação a igual período do ano anterior, de 78,40% dos lucros da Autora, o que constitui uma quebra de vendas no valor total de €900.458,02. </font>
</p><p><font>32ª - É notório que a Ré viu canalizada para si aquela procura de fraldas para bebé e in | [0 0 0 ... 0 0 0] |
HDJ6u4YBgYBz1XKvug-z | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Os executados </font><b><font>AA </font></b><font>e</font><b><font> BB</font></b><font> deduziram oposição à execução que lhes foi movida pela exequente </font><b><font>CC, SA</font></b><font>, pedindo a extinção da execução.</font>
</p><p><font> Alegaram para o efeito e em resumo que desde que deixaram de cumprir com o pagamento das prestações relativas ao crédito que na execução lhes é exigido (emergente de dois contratos de mútuo no valor total de cerca de € 590.000, com garantia de hipoteca sobre um imóvel no valor de € 620.000), fizeram várias tentativas de regularização do incumprimento, com propostas que fizeram, recebendo contrapropostas incomportáveis ou falta de resposta por parte da exequente CC, com a consequente impossibilidade se se concretizarem, e que tal crédito não foi integrado pela exequente CC no PERSI.., como lhe era imposto pelos arts. 14 e 39 do DL 227/2012, de 25/10. E alegaram ainda que, por força do regime deste diploma, a exequente estava impedida de resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento e de intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito – razão pela qual não podia ter requerido a execução.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> A exequente contestou por impugnação. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><b><font>sentença</font></b><font>, </font><u><font>na qual a oposição à execução foi julgada improcedente, ordenando-se o prosseguimento da mesma</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Na sequência de recurso de apelação interposto pelos executados/embargantes, no qual impugnaram a matéria de facto, </font><b><font>a Relação de Lisboa</font></b><font>, eliminando os pontos 20, 21, 25, 27 e 29 dos factos dados como provados, </font><b><font>veio a julgar procedente o recurso</font></b><font>, considerando verificada a invocada falta da condição objetiva de procedibilidade. </font>
</p><p><font> Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a exequente/embargada o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1ª - O presente recurso foi interposto do Douto Acórdão proferido em 07.06.2018 pelos Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores a fls...do processo, o qual julgou procedente o recurso interposto pelos Executados. </font>
</p><p><font>2ª - Decidindo como decidiram, e salvo o devido respeito, os Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores não fizeram correta nem adequada aplicação do Direito. </font>
</p><p><font>3ª - A Apelante está, pois, convicta que Vossas Excelências, reapreciando a matéria dos autos e, subsumindo-a nas normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa. </font>
</p><p><font>4ª - Atentemos: em 17.08.2010, a pedido dos mutuários/aqui Recorridos AA e BB a ora Recorrente CC concedeu aos primeiros dois empréstimos nos valores de €306.133,92 e €285.865,42. </font>
</p><p><font>5ª - Para garantia dos dois contratos de mútuo, foram constituídas duas hipotecas sobre o imóvel melhor identificado nos autos. </font>
</p><p><font>6ª - Porém, volvido cerca de um ano, mais concretamente em 17.09.2011, os mutuários deixaram de pagar as prestações convencionadas, o que, nos termos contratuais e do art. 781.º do Código Civil, determinou o imediato vencimento de toda a dívida. </font>
</p><p><font>7ª - Por via disso, iniciaram-se negociações entre a aqui Recorrente e os Recorridos, e, frustrando-se as mesmas, a primeira viu-se compelida em 11.03.2013 a instaurar ação executiva contra os segundos. </font>
</p><p><font>8ª - Com efeito, vieram os Executados, ora Recorridos, sumariamente alegar em sede de embargos que a Recorrente CC não procedeu à integração dos mesmos no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (adiante designado por PERSI...), instituído pelo Decreto-lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro. </font>
</p><p><font>9ª - Após produção de prova e realização da audiência de discussão e julgamento, veio o Tribunal de primeira instância julgar os embargos totalmente improcedentes, por não provados, tendo os ali Embargantes recorrido de tal decisão para o douto Tribunal da Relação, o qual, por sua vez, julgou procedente o recurso interposto, revogando a douta decisão proferida pela primeira instância. </font>
</p><p><font>10ª - Contudo, e salvo o devido respeito, que é muito, considera a Recorrente que esta última decisão não fez correta nem adequada aplicação do Direito, devendo portanto ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da ação principal até ao efetivo e integral pagamento da quantia exequenda. </font>
</p><p><font>11ª - Vejamos então: em primeiro lugar, e conforme doutamente decidido na primeira instância, a Recorrente, não estava, </font><i><font>in casu</font></i><font>, obrigada a integrar os mutuários, ora Recorridos, no âmbito do PERSI pese embora a Recorrente o tenha feito. </font>
</p><p><font>12ª - Todavia, salvo o devido respeito, o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> errou ao não admitir as cartas juntas pela Recorrente em sede de contestação, mormente os Doc. 1 e Doc. 7, por considerar que não ficou demonstrado o seu envio, atenta a não junção de registos postais e/ou avisos de receção. </font>
</p><p><font>13ª - Desta feita, o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> esqueceu-se de algo extremamente relevante, na medida em que várias das cartas enviadas pelos Recorridos também não se mostram acompanhadas de comprovativos de entrega e/ou receção, nomeadamente no que respeita o Doc. 2, o Doc. 3 e o Doc. 4. </font>
</p><p><font>14ª - E, ainda assim, muito estranhamente o Tribunal deu como provado o envio destas cartas (Doc. 2, Doc. 3 e Doc. 4 juntas nos embargos) mas, ao invés, não deu como provado o envio das cartas juntas como Doc. 1 e Doc. 7 na contestação. Todas sem registo postal, repita-se. </font>
</p><p><font>15ª - Significa isto que o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> exige que a Recorrente demonstre a entrega das suas missivas mas o mesmo não exige à outra parte, </font><i><font>in casu</font></i><font>, aos Recorridos, desigualdade esta de tratamento que não pode ser admitida. </font>
</p><p><font>16ª - Da mesma forma, no Doc. 6 junto pelos Recorridos em sede de embargos, é, desde logo, mencionado que </font><i><font>“Na sequência da nossa reunião de hoje à tarde ( ... )”</font></i><font>, encontrando-se menção idêntica no Doc. 7 junto na mesma peça, reconhecendo os mesmos a existência de contactos estabelecidos com a Recorrente, pelo que, mais uma vez, muito se estranha o facto de o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> não considerar provada a existência de negociações entre as partes. </font>
</p><p><font>17ª - Não sendo correto afirmar, tal como fez o douto Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>, que </font><i><font>“aqueles que, no momento, têm a faca e o queijo na mão, deixam os outros à espera, em fogo lento, desesperados, para acabarem por se resignarem e aceitarem tudo.”</font></i><font>!! </font>
</p><p><font>18ª - Efetivamente, tal como referido anteriormente, a Recorrente e os Recorridos trocaram diversas comunicações e realizaram várias reuniões, com vista à obtenção de uma possível solução extrajudicial, o que desde logo resulta da carta datada de Dezembro de 2011 (cfr. a carta junta pelos Recorridos como Doc. 1 em sede de embargos). </font>
</p><p><font>19ª - Com efeito, em 24.07.2012 a Recorrente enviou uma carta aos Recorrentes a informar que, para analisar a proposta submetida, necessitaria de alguns elementos, os quais foram devidamente citados (cfr. a carta junta na contestação como Doc. 1). Todavia, a CC não recebeu qualquer resposta dos Recorridos, nem recebeu os documentos então solicitados àqueles, pelo que enviou nova missiva em 27.09.2012 (cfr. o Doc. 7 junto na contestação). </font>
</p><p><font>20ª - Não obstante, apesar de terem sido estudadas as várias propostas apresentadas pelos Recorridos (adesão ao Fundo de Arrendamento-FIIAH, dação em pagamento e venda do imóvel a terceiros por valor inferior ao da dívida), as mesmas não foram aceites porque concluiu-se pela inviabilidade das propostas nos moldes sugeridos. </font>
</p><p><font>21ª - No entanto, por um lado, os Recorridos não comprovaram ter capacidade financeira para suportar os encargos relativos ao pagamento do remanescente em dívida, tendo os próprios apontado essas dificuldades financeiras nas missivas enviadas à CC, nomeadamente no Doc. 7 junto nos embargos. </font>
</p><p><font>22ª - Desta feita, a Recorrente analisou e considerou todas as propostas, tendo respondido às mesmas, pese embora as negociações resultarem goradas face à falta de capacidade financeira dos mutuários, pelo que os Recorridos não lograram demonstrar a ausência de resposta da Recorrente às propostas apresentadas, ao contrário do sustentado por aqueles e pelo Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>. </font>
</p><p><font>23ª – O mesmo se diga no que concerne ao PERSI., pese embora a Recorrente não estivesse obrigada à sua integração. </font>
</p><p><font>24ª - Senão vejamos: mais uma vez, o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> errou ao não admitir as cartas juntas como Doc. 3, Doc. 4, Doc. 5 e Doc. 6 em sede de contestação, todas referentes ao PERSI, sustentando tal-qualmente a sua posição no facto de a Recorrente não ter juntado comprovativos de expedição das mesmas. </font>
</p><p><font>25ª - Considerou o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> que, ao mencionar nas cartas que “</font><i><font>Se dispõe do serviço Caixa Directa On-Line, as próximas comunicações sobre este tema serão disponibilizadas no mesmo”</font></i><font>, tal significaria, para o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>, repita-se, que as mesmas nunca poderiam ter sido enviadas por e-mail através do serviço Caixa Direta mas unicamente por correio e, inexistindo o seu registo postal, isso exprimiria o seu não envio.</font>
</p><p><font>26ª - No entanto, e salvo o devido respeito, o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> não fez uma interpretação correta de tais comunicações, porquanto, no que respeita ao Recorrido AA, a carta de integração do PERSI..., junta como Doc. 3 na contestação, tem uma morada ali registada. E, no final do mencionado Doc. 3, consta efetivamente a menção que </font><i><font>“Se dispõe do serviço Caixa Directa On-Line, as próximas comunicações sobre este tema serão disponibilizadas no mesmo”</font></i><font>. </font>
</p><p><font>27ª - Nesse seguimento, e sendo uma carta posterior àquela, a carta de extinção do PERSI... do mesmo Recorrido, junta como Doc. 6 na contestação, já não tem morada por ter sido enviada através do serviço Caixa Directa, cuja forma de erro tinha sido oportunamente comunicada através do Doc. 3. </font>
</p><p><font>28ª - Noutras palavras: a carta de extinção do Recorrido AA do âmbito do PERSI (Doc. 6) foi enviada após o “aviso” de que as comunicações posteriores seriam remetidas via Caixa Direta (Doc. 3). </font>
</p><p><font>29ª - Ao invés, as missivas enviadas para a Recorrida BB, seja a carta de integração (Doc. 4), seja a carta de extinção (Doc. 5), têm ambas a morada indicada. </font>
</p><p><font>30ª - Atente-se noutra diferença: a carta (sem morada) de extinção do Recorrido AA do âmbito do PERSI... (Doc. 6) tem o logotipo do Caixa Direta no rodapé da mesma, ao contrário da carta (com morada) de extinção enviada à Recorrida BB, a qual já não tem o logotipo do Caixa Direta (por a este serviço não ter aderido). </font>
</p><p><font>31ª - Daqui resulta, sem margem para dúvidas, que a carta de extinção foi enviada por e-mail através do serviço Caixa Direta. </font>
</p><p><font>32ª - Mais: não existe qualquer obrigação legal de proceder ao seu envio por correio registado e/ou com aviso de receção, pelo que, </font><i><font>a contrario</font></i><font>, é admitido o seu envio por correio simples ou por meios alternativos, mormente e-mail através do serviço Caixa Direta. </font>
</p><p><font>33ª - Adicionalmente, o Tribunal considerou a carta junta como Doe. 8 nos embargos, a qual corresponde à carta de resposta enviada pelo ora subscritor, na qualidade de mandatário da Recorrente, ao ilustre mandatário dos aqui Recorridos, por via da qual a Recorrente comunica que recusou, em definitivo, a proposta formulada pelos Recorridos. </font>
</p><p><font>34ª - Ora, se o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> admite a existência desta missiva (até porque os próprios Recorridos confessam a sua receção ao proceder à sua junção em sede de embargos), por que motivo perfilha o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> o entendimento de que não ficou demonstrada a existência de negociações entre as partes e de respostas da Recorrente aos Recorridos? </font>
</p><p><font>35ª - A que acresce as menções contidas no Doc. 6 e no Doc. 7 junto nos embargos por via do qual os Recorridos reconhecem a existência de reuniões e inerentes negociações. </font>
</p><p><font>36ª - Da mesma forma, não se concebe a posição do Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> ao desconsiderar em absoluto os depoimentos prestados pelas testemunhas da Recorrente, pois </font><i><font>“nada dizem de útil”</font></i><font> e “</font><i><font>pouco fica”</font></i><font>, testemunhas estas que depuseram de forma séria e credível sobre as inúmeras negociações havidas entre as partes, nas quais intervieram de forma direta, participando nas reuniões, decidindo, elaborando as missivas de resposta e assinando as mesmas. </font>
</p><p><font>37ª - Ao contrário da testemunha dos Recorridos, irmão do Recorrido AA, cujo depoimento foi (erradamente) considerado pelo Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>, pese embora nunca tenha participado nas negociações (ao contrário das testemunhas da Recorrente), limitando-se a descrever as alegadas “queixas” e os alegados “desabafos” do irmão e a depor sobre o que alegadamente terá ouvido dizer. </font>
</p><p><font>38ª - Note-se, ainda a este propósito, a total diferença de perceção entre a primeira instância e o Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>, porquanto a credibilidade das testemunhas da Recorrente foi amplamente destacada pelo douto Tribunal de primeira instância. </font>
</p><p><font>39ª - E, mais uma vez se diga, as testemunhas da Recorrente descreveram os inúmeros contactos havidos entre as partes, tendo inclusivamente a testemunha DD dito repetidamente que tinha sido a própria, através do seu próprio punho, a assinar algumas das cartas. </font>
</p><p><font>40ª - Pelo que mais uma vez, e salvo o devido respeito, não se concebe o raciocínio do douto Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> ao atender somente à alegada inexistência de prova de expedição das cartas, até porque, para além da prova documental, pode e deve ser considerada a prova testemunhal, não se compreendendo a circunstância de o douto Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> desvalorizar em absoluto os depoimentos prestados de forma idónea, séria e credível pelas testemunhas da Recorrente. </font>
</p><p><font>41ª - É certo que os Recorridos impugnaram as cartas mas também é certo que, de forma expressa, não alegaram a falsidade das mesmas. Nem poderiam. </font>
</p><p><font>42ª - Voltando ao PERSI e à eventual obrigação de integração dos Recorridos neste regime, resulta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro que, no âmbito do PERSI, </font><i><font>“as instituições de crédito devem aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do consumidor”</font></i><font>. </font>
</p><p><font>43ª - Efetivamente, </font><i><font>“Tendo a ação executiva sido intentada no ano de 2013 (depois da entrada em vigor do DL n.º 272/2012) e situando-se o incumprimento dos executados em 2011, o mencionado regime seria, em princípio, aplicável ao caso”</font></i><font> (cfr. o Acórdão de 09.02.2017 do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do Proc. n.º 194j13.5TBCMN-AGl.S1). </font>
</p><p><font>44ª - E, sublinhe-se, a aplicação deste regime seria, em princípio, aplicável aos autos, porquanto desde Dezembro de 2011 (ou seja, antes da entrada em vigor do mencionado Decreto-lei) que as partes se encontravam em negociações, procedimento este equiparado ao PERSI, e que somente não se concretizou um acordo devido à falta de capacidade financeira dos mutuários, isto é, por facto imputável aos Recorridos. </font>
</p><p><font>45ª - Por conseguinte, ainda que os mutuários não tivessem sido formalmente integrados no PERSI (apesar de, como se alegou, até terem sido integrados em tal regime), tal </font><i><font>“não lhes retirou direitos, nem lhes reduziu expectativas legítimas, posto que a ação executiva só foi instaurada depois de gorada a concretização da solução negociada por razoes só àqueles imputáveis”</font></i><font> (cfr. o mencionado Acórdão de 09.02.2017). </font>
</p><p><font>46ª - Isto porque </font><i><font>“O objetivo prosseguido pelo Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), previsto no DL 227/2012 de 25/10, é o de envolver as instituições de crédito na apresentação de propostas de regularização de situações de incumprimento adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do consumidor” </font></i><font>(cfr. o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02.05.2016, atinente ao Proc. n.º 194/13.5TBCMN-A.G1). </font>
</p><p><font>47ª - Ora, e continua o acórdão mencionado, </font><i><font>“as partes nestes contratos de crédito, tentaram ativamente obter um acordo de regularização das situações de incumprimento (...)”</font></i><font>, pelo que </font><i><font>“Não teria qualquer sentido integrar esta situação de incumprimento no PERSI, quando tudo o que este preconiza já tinha sido levado a cabo pelas partes durante mais de ano e meio, tendo logrado obter o acordo para a regularização da situação de incumprimento, antes da entrada em vigor daquele diploma”. </font></i>
</p><p><font>48ª - Fundamenta o douto Tribunal na necessidade de não cingir a interpretação da lei à sua letra, </font><i><font>“devendo procurar-se reconstituir o pensamento legislativo a partir do seu texto, tendo, sobretudo, em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas em que é aplicada (artigo 99 do Código Civil)”</font></i><font>.</font>
</p><p><font>49ª - Até porque, e conforme resulta da documentação carreada para os autos e dos depoimentos prestados, os Recorridos, desde Dezembro de 2011 até Março de 2013, beneficiaram materialmente de um conjunto de medidas que deram plena concretização aos objetivos do PERSI, entretanto instituído pelo Decreto-Lei n.º 272/2012, de 25 de Outubro. </font>
</p><p><font>50ª - Não obstante, ainda que se considerasse que a Recorrente estava obrigada a integrar os mutuários no PERSI (o que não se admite e apenas se coloca por mero dever de patrocínio), sempre se dirá que aqueles foram, sem margem para dúvidas, integrados no âmbito do PERSI, à luz do estatuído no art. 2.º do Decreto-Lei n.2 227/2012, de 25 de Outubro, conforme anteriormente mencionado. </font>
</p><p><font>51ª - E, através de tais comunicações, a Recorrente comunicou aos Recorridos que, atento o incumprimento registado nos dois empréstimos, procedeu à sua integração no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), ao abrigo do disposto nos artigos 12.º, 13.º e 14.º do Decreto-lei n.º 227/2012, de 2S de Outubro. </font>
</p><p><font>52ª - Para o efeito, e ao abrigo do princípio da colaboração entre as partes, foi igualmente solicitada a entrega numa agência da CC de documentos comprovativos da última declaração de IRS e respetivo conta de liquidação, bem como os documentos comprovativos de rendimentos auferidos, sendo que tais cartas foram enviadas para a morada na qual os Recorridos foram citados para a presente ação. </font>
</p><p><font>53ª - E, em resposta à carta de integração do PERSI, o mandatário dos Recorrentes enviou à CC uma carta em 29.01.2013 (Doc. 7 junto nos embargos), onde apresentou uma nova proposta de dação em pagamento, argumentando ser a única proposta possível e alegando que os Recorridos não tinham capacidade para suportar as prestações bancárias.</font>
</p><p><font>54ª - O que se encontra em consonância com o fundamento contido na comunicação de extinção do PERSI, ou seja, a falta de capacidade financeira, como se desenvolverá. </font>
</p><p><font>55ª - Em resposta, a Recorrente recusou (novamente) tal proposta de dação por carta de 05.03.2013, correspondente ao Doc. 8 junto nos embargos. </font>
</p><p><font>56ª - Por outro lado, 26.02.2013 e 27.02.2013, a CC deu ainda nota da possibilidade de os aqui Recorridos apresentarem um requerimento para efeitos de aplicação das medidas extraordinárias previstas na Lei n.º 58/2012, caso os mesmos reunissem as condições de acesso ao regime extraordinário consagrado naquele diploma legal. </font>
</p><p><font>57ª - Tendo, aliás, a testemunha da Recorrente Gabriel Fernandes dito, em sede de julgamento, que o próprio Recorrido AA lhe tinha confirmado ter recebido tal carta de integração. </font>
</p><p><font>58ª - Posto isto, é manifesto que a Recorrente promoveu todas as </font><i><font>“diligências necessárias à implementação do Procedimento extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento”</font></i><font>, à luz do disposto no art. 12.º do Decreto-Lei n.º 227/2012. </font>
</p><p><font>59ª - Com efeito, consignam as alíneas c), d) e g) do n.º 2 do n.º 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012 que o PERSI extingue-se, designadamente, quando </font><i><font>“A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI”</font></i><font>; </font><i><font>“O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior",' e "A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior”.</font></i><font> </font>
</p><p><font>60º - Uma vez decorrida a fase de avaliação e de negociação, em 26,02.2013 e 27.02.2013, a Recorrente CC comunicou aos Recorridos que o PERSI foi extinto naquela data por, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º do Decreto-lei n.º 227/2012, ter concluído que os mesmos não dispõem de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 17.º do referido Decreto-lei (cfr. as comunicações juntas em sede de contestação como Doc. 5 e Doc. 6). O motivo da extinção do PERSI (falta de capacidade financeira) ficou, assim, inequivocamente indicado em tal comunicação e foi legalmente fundamentado. </font>
</p><p><font>61ª - Uma vez comunicada a extinção do PERSI nos termos supra expostos, e encontrando-se a extinção legalmente fundamentada, a mesma produziu pelos efeitos, em conformidade com o n.º 4 do último artigo mencionado. </font>
</p><p><font>62ª - No período compreendido entre a data de integração dos Recorridos no PERSI e a extinção deste procedimento, a CC não intentou qualquer ação judicial para cobrança do seu crédito, somente o tendo feito em 11.03.2013 (data da instauração da presente ação), ou seja, quando tal procedimento já se encontrava extinto desde Fevereiro, no estrito cumprimento do preceituado no n.º 1 do artigo 18.º do Decreto-lei n.º 227/2012. </font>
</p><p><font>63ª - O que legitima desde logo a instauração da presente ação executiva por parte da CC. </font>
</p><p><font>64ª - Ao longo de todo o procedimento, a CC sempre atuou com respeito pelos princípios da independência, imparcialidade, legalidade, transparência, diligência e lealdade, conforme determina o artigo 29.º do Decreto-lei n.º 227/2012. </font>
</p><p><font>65ª - Ademais, a alínea h) do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 227/2012 define </font><i><font>“Suporte duradouro”</font></i><font> e, na Instrução do Banco de Portugal n.º 44/2012 (a qual regulamenta o Decreto-Lei n.º 227/2012), não há qualquer exigência legal de que as comunicações referentes ao PERSI (seja a integração, seja a extinção) sejam remetidas por correio registado e/ou com aviso de receção. </font>
</p><p><font>66ª - Em lugar algum o Decreto-Lei n.º 227/2012 prescreve a necessidade de envio das cartas por correio registado, pelo que, </font><i><font>a contrario</font></i><font>, é admissível o seu envio por correio simples e por meios eletrónicos através de endereço de email, por via da adesão ao sistema da Caixa Directa. </font>
</p><p><font>67ª - Com efeito, e salvo o devido respeito, se o diploma que rege o PERSI e a Instrução que o regulamenta não preveem esta forma registada, não poderá o julgador exigir tal formalidade, cabendo à Recorrente a expedição de tais comunicações mas não a prova da sua receção por parte dos Recorridos. </font>
</p><p><font>68ª - Deste modo, da prova documental e testemunhal produzida (cópias das cartas de integração e extinção no PERSI juntas em sede de contestação e depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento por parte das testemunhas da Recorrente), é forçoso concluir que as cartas de integração e extinção do PERSI foram efetivamente remetidas pela Recorrente aos Recorridos, no estrito cumprimento do postulado no Decreto-Lei n.º 227/2012. </font>
</p><p><font>69ª - Mais resultando que, para além de enviar as cartas, também realizou diversos contactos ao longo das negociações que subsistiram desde Dezembro de 2011 até Março de 2013, pelo que os Recorridos não agem de boa fé, tentando omitir factos relevantes para a boa decisão da causa, por forma a escusar-se ao pagamento de uma dívida. </font>
</p><p><font>70ª - Note-se: os contratos foram celebrados em Agosto de 2010, as prestações deixaram de ser pagas em Setembro de 2011, as cartas referentes ao PERSI foram enviadas em Janeiro de 2013 e a ação executiva foi instaurada em Março de 2013 após várias e derradeiras tentativas de acordo frustradas. </font>
</p><p><font>71ª - Em suma, a Recorrente cumpriu integralmente o postulado no diploma legal que regulamenta o PERSI, tendo procedido à integração e posterior extinção (fundamentada) nos termos legais. </font>
</p><p><font>72ª - Aliás, a Recorrente não tinha qualquer interesse em não integrar os Recorridos no PERSI. </font>
</p><p><font>73ª - A CC é uma instituição séria, de bem e de referência nacional, pautando a sua atividade negocial com ética, transparência, correção e seriedade, tendo sempre norteado a sua atividade no estrito cumprimento da lei e da boa fé, bem como das diretivas e instruções das entidades reguladores do sector. E, enquanto instituição de crédito, em nada seria beneficiada por não integrar estes clientes no PERSI, pois sabe a prescrição contida no art. 37.º do mencionado diploma legal. </font>
</p><p><font>74ª - Ou seja, sabendo a Recorrente que o cumprimento das obrigações postuladas no Decreto-Lei é fiscalizado pelo Banco de Portugal e que o seu incumprimento é sancionado, por que motivo iria a Recorrente não integrar os mutuários no PERSI? </font>
</p><p><font>75ª - Concluindo: em primeiro lugar, a Recorrente não estava legalmente obrigada a integrar os Recorridos no âmbito do PERSI porquanto, à data da entrada em vigor do diploma que regulamenta tal regime, já as partes se encontravam em negociações há mais de um ano, beneficiando, assim, de um conjunto de medidas que deram plena e total concretização ao objetivo último do PERSI. </font>
</p><p><font>76ª - A Recorrente considerou todas as propostas e respondeu a todas elas, existindo inúmera troca de correspondência entre as partes no período compreendido entre Dezembro de 2011 e Março de 2013. </font>
</p><p><font>77ª - Neste período, foram consideradas propostas de reestruturação, de arrendamento (através da adesão ao FIIAH), de venda a terceiros do imóvel dado de garantia, de dação em pagamento com pagamento do remanescente, de reforço de garantias com constituição de hipoteca sobre outros dois imóveis. </font>
</p><p><font>78ª - E, na pendência destas negociações, concluiu-se pela falta de capacidade financeira dos Recorridos. </font>
</p><p><font>79ª - Por outro lado, e apesar de não estar legalmente obrigada, a Recorrente integrou os Recorridos no âmbito do PERSI e comunicou aos mesmos, fundamentadamente, a decisão de extinção, não existindo qualquer obrigação legal de proceder ao seu envio por correio registado e/ou com aviso de receção, pelo que, a contrario, é admitido o seu envio por correio simples ou por meios alternativos, mormente e-mail através do serviço Caixa Direta. </font>
</p><p><font>80ª - E, em resposta à carta de integração do PERSI, o mandatário dos Recorrentes enviou à Recorrente a carta junta como Doc. 7 nos embargos, argumentando ser a única proposta possível e alegando que os Recorridos não tinham capacidade para suportar as prestações bancárias, à qual respondeu a Recorrente através do Doc. 8 junto na mesma peça processual. </font>
</p><p><font>81ª - Com efeito, existindo tal conclusão de falta de capacidade financeira, não restam dúvidas de que tal situação foi cuidadamente analisada, não podendo, os Recorridos teimar na tese de que não foi dado cumprimento ao PERSI. </font>
</p><p><font>82ª - Se, durante mais de um ano, a Recorrente analisou propostas dos Recorridos e tentou obter uma solução extrajudicial, por que motivo não iria integrar os mesmos no PERSI? </font>
</p><p><font>83ª - Pelo exposto, dúvidas não restam de que a atuação da Recorrente sempre se baseou na observância dos ditames da boa fé e no cumprimento dos deveres de diligência e transparência que lhe são aplicáveis, tendo encetado todos os esforços com vista à obtenção da regularização dos empréstimos em situação de incumprimento, tendo reiteradamente interpelado os Recorridos para o efeito. </font>
</p><p><font>84ª - Pelo que, ao assim não ter considerado, a decisão em crise fez uma incorreta interpretação e desadequada aplicação do Direito, designadamente das citadas disposições legais, devendo por isso, ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da ação executiva até ao efetivo e integral pagamento. </font>
</p><p><font>Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, dando provimento ao presente recurso de revista e revogando o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, substituindo-o por outro que ordene o prosseguimento da ação executiva contra os Executados/Recorridos, até ao efetivo e integral pagamento, sempre com inteira e sã justiça.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Não foram apresentadas contra-alegações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>Colhidos os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
QzJvu4YBgYBz1XKvzQjr | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font>Revista nº 1572/14.8TBVNG.P1.S1</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p>
</p><p><b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>Notificada do nosso acórdão que, negando-lhe a revista (excecional), confirmou o acórdão da Relação que, por sua vez, havia confirmado a sentença da 1ª instância que julgou improcedente a ação de condenação que moveu às rés C.P. - Comboios de Portugal, EPE e Infraestruturas de Portugal, S.A., veio a autora recorrente, </font><b><font>AA</font></b><font> invocar a nulidade do acórdão, a que alude a al. d) do nº 1 do artigo 615º do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Isto, porque, segundo a mesma, se verifica omissão de pronúncia quanto à questão de se saber se a passagem pedonal existente na Estação de Caminho de Ferro da…., que liga e serve o trânsito pedonal entre dois espaços públicos assinalados, aí existente há muitos anos, deve ou não ser qualificada como passagem de nível pedonal.</font>
</p><p><font>Diz que a questão decorre das conclusões recursórias, sendo que a Formação (que admitiu a revista excecional, afirmou que </font><i><font>“especificamente sobre a dicotomia entre o regime jurídico do atravessamento em passagens de nível e em estações ou apeadeiros, não cremos que haja jurisprudência satisfatória” </font></i><font> e que não se vê que deva ser excluída à partida a existência de atravessamento pedonal (lícito) de pessoas em estações e apeadeiros, sem serem apenas os utentes dos comboios e pessoal de serviço</font><b><font>.</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Não foi apresentada resposta.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Cumpre decidir:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Com relevo, sobre esta matéria, a recorrente apenas disse, nas suas conclusões f) e g) da revista excecional, o seguinte:</font>
</p><p><i><font>f) De facto, a questão da qualificação da passagem existente na estação da Granja, atravessamento de cais, ou passagem de nível, merece ser apreciada, não somente pelas consequências que daí advêm para a A. e outros utentes dessa passagem, mas também para prevenir acidentes ferroviários; sendo propósito firme do legislador contribuir para a modernização das estruturas, a fim de salvaguardar os interesses de pessoas e bens, têm o dever os tribunais de aplicar as leis que tendem a esse fim. A questão tem assim uma vertente de interesse social, não deixando de ter o seu ineditismo, atenta a jurisprudência consultada sobre o assunto.</font></i>
</p><p><i><font>g) Salvo todo o respeito, </font></i><b><i><font>a douta decisão recorrida não qualificou devidamente, face à realidade concreta, o espaço de travessia pedonal da estação da …... A matéria provada afirma que ele interliga dois espaços públicos (ruas ou estradas) – artº 1º do Regulamento do DL 568/99 de 23-12</font></i></b><i><font> -, pelo que só por isso deve ser arredada a qualificação de atravessamento de cais, de uso exclusivo à estação (artº 2º nº 3 do Regulamento).</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Assim a única questão ali colocada</font></u><font> (para além das outras questões colocadas nas restantes alíneas, que foram objeto de apreciação e não estão ora em causa), </font><u><font>conforme foi identificada no acórdão tinha a ver com </font></u><i><u><font>“a qualificação da travessia pedonal da estação da … como passagem de nível”.</font></u></i>
</p><p><font>Isto, aliás, na senda da questão identificada pela Formação (como relevante para justificar a revista excecional) como tendo a ver com o</font><i><font> “regime jurídico do atravessamento em passagens de nível e em estações ou apeadeiros”.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i><font>Foi essa a questão suscitada (para além das outras, ora sem interesse, relativas à “falta de fundamentação de facto provada”, à “inexistência de culpa da autora recorrente” à “concorrência de culpas ou de culpa e risco” e ao “ressarcimento dos danos”- de que se conheceu).</font>
</p><p><font> E foi essa a questão de que se conheceu, para se concluir, sumariamente, no sentido de que “ao atravessamento nas plataformas das estações de caminhos de ferro não se aplica o regime jurídico estabelecido no Regulamento das Passagens de Nível aprovado pelo DL nº 568/99, de 23 de dezembro, onde se estabelece a imposição de determinada sinalização, mas sim as regras de atravessamento, circulação e estacionamento nas estações e apeadeiros estabelecidas no Regime Jurídico do Domínio Público Ferroviário, aprovado pelo DL nº 276/2003 de novembro”- retirando-se daí as consequentes ilações no sentido da inexistência do invocado dever de sinalização por parte das rés. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Não se verifica assim a invocada omissão de pronúncia, razão pela qual improcede a invocada nulidade do acórdão.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em indeferir a invocada nulidade do acórdão.</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Custas pela autora recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Lx., 17.11.2020</font>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font>
</p><p><font> Acácio das Neves (Relator) </font>
</p><p><font> Fernando Samões (1º Adjunto)</font>
</p><p><font> Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font>
</p></font><p><font><font> </font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
QDJru4YBgYBz1XKvZgWq | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><font>Notificada do mesmo, veio a autora recorrida, </font><b><font>Alexandre Barbosa Borges, S.A., </font></b><font> </font><b><font>requerer a retificação e reforma do nosso acórdão </font></b><font>que, conhecendo da revista da ré Ageas Portugal – Companhia de Seguros, S.A. revogou o acórdão da Relação (que, revogando a sentença da 1ª instância na qual a ação havia sido julgada improcedente, julgou a ação parcialmente procedente) e repristinou a decisão da 1ª instância, </font><u><font>requerendo a revogação do nosso acórdão e a confirmação do acórdão da Relação</font></u><font>, objeto da revista.</font><br>
</p><p><font> Alegou para o efeito o que resumiu nas seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
</p><p><font>I. Com o devido respeito, que é muito, o douto Acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font> não se pronunciou sobre todas as questões invocadas no recurso apresentado pelo Recorrente, assim como pelo recorrido nas contra-alegações.</font><br>
</p><p><font>II. Importa destacar, que, o acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font>, que alterou a decisão da Relação, a qual tomou a posição no sentido de se mostrarem verificados os pressupostos da responsabilidade civil, na deterioração do Furo F10, por violação do direito de propriedade de terceiros, por via da conduta negligente do recorrido na execução da obra.</font><br>
</p><p><font>III. Contudo, o acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font> concluiu no sentido de os danos em questão, provocados no Furo F10, não estarem abrangidos no Contrato de Seguro “uma vez que a autora não logrou provar (ou sequer alegou), conforme lhe competia, que, nos termos exigidos nas Condições Particulares, relativas às Coberturas, tais danos ocorreram em consequência da inexistência e/ou impossibilidade provadas de obtenção prévia dos referidos planos ou traçados”. </font><br>
</p><p><font>IV. E, que, só nesta eventualidade é que os danos em questão ficariam cobertos pelo Contrato de Seguro.</font><br>
</p><p><font>V. No entanto, o douto acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font>, e em primeiro lugar, não se pronunciou/decidiu quanto às demais Coberturas abrangidas pelo Contrato de Seguro, e que constam do Ponto 25 a 27 dos Factos Provados, nomeadamente, alínea c) e d).</font><br>
</p><p><font>VI. Assim, estamos perante uma evidente omissão de pronúncia, quanto às Coberturas constantes dos factos provados, designadamente, das alíneas c) e d) do ponto provado n.º 27, invocadas pelo aqui recorrido/autor nas contra-alegações.</font><br>
</p><p><font>VII. Sendo que, as coberturas relativas à alínea c) R. Civil por Trabalhos de Derrube ou Demolição garantem os danos derivados de trabalhos de derrube ou demolição em obras cujos bens móveis e/ou imóveis adjacentes e/ou contíguos ao local dos trabalhos, pertença de terceiros e, MAIS PRÓPRIAMENTE, as coberturas relativas à alínea d) Responsabilidade Civil por trabalhos de Escavação (necessários à instalação da Ensecadeira - e que, implicaram a efetivação do risco coberto, abrangendo as indemnizações decorrentes das lesões materiais causadas durante e devido à execução dos trabalhos seguros no Furo F10.</font><br>
</p><p><font>VIII. Isto porque, a execução de trabalhos de Escavação para instalação da Ensecadeira, em pleno Rio Vouga, quer pela sua natureza, quer pelos meios utilizados, trata-se de uma atividade portadora de perigosidade e geradora de risco, uma que implicou a realização de escavações, fundações e outras infra-estruturas marítimas e fluviais, para além de panóplia de outras operações técnicas.</font><br>
</p><p><font>IX. O que, provocou o aumento do caudal do rio e os danos subsequentes no furo de captação de água (furo f10 propriedade da empresa municipal Águas de Aveiro), em razão do manifesto aumento de velocidade do escoamento.</font><br>
</p><p><font>X. Em Segundo lugar, para além das referidas coberturas, o Recorrido contratou ainda com a Recorrente a Cláusula Especial relativa a “Responsabilidade Civil por danos a estruturas e/ou propriedades, adjacentes e/ou contíguas de terceiras”: (Cfr. Cláusula Especial junta pelo Autor com a Petição Inicial como Documento n.º 3 e, junto pelo Recorrido com a Contestação como Documento n.º 4).</font><br>
</p><p><font>XI. Sendo que, no que concerne ao requisito para a validade da cobertura, nomeadamente, da vistoria prévia dos bens contíguos, referir que o Recorrido vistoriou previamente os bens contíguos com vista a certificar-se dos danos já existentes, e efetuou registo dessa vistoria, tendo inclusivamente informado a Seguradora/Recorrente, conforme Doc. n.º 8 junto com a Petição Inicial.</font><br>
</p><p><font>XII. Por outro lado, às referidas coberturas, acresce a contratação das garantias previstas na Cláusula Especial 41 – Responsabilidade Civil – Construção Civil. (Cfr. Contrato de Seguro junto pelo Autor com a Petição Inicial como Documento n.º 3, a fls. (…)), </font><br>
</p><p><i><font>Cláusula Especial 41 – Responsabilidade Civil – Construção Civil. “Artigo 1.º - Objecto, âmbito e garantia do contrato</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Nos termos desta Condição Especial, o Segurador garante a responsabilidade civil extracontratual do Segurado emergente da atividade especificada na proposta de contrato, nos seguintes termos:</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>2.5. Pelos danos sofridos pelas condutas, canalizações e outras infra-estruturas enterradas que ocorram durante a execução dos trabalhos seguros, e que não façam parte dos mesmos, nas seguintes condições:</font></i><br>
</p><p><i><font>2.6. Pelos danos patrimoniais decorrentes de lesões materiais causadas a estruturas e/ou contíguas ao local dos trabalhos, pertença de terceiros, durante e devido à execução dos trabalhos seguros, desde que tais danos resultem de acidentes diretamente relacionados com a execução dos trabalhos seguros, nas seguintes condições:</font></i><br>
</p><p><font>XIII. Em Terceiro lugar, quanto ao facto de se tratar de uma atividade portadora de perigosidade e geradora de risco, invocado que foi pelo Recorrido, subsidiariamente, a responsabilidade pelo risco, nos pontos 50 a 59 das Contra Alegações, também ocorreu omissão de pronúncia quanto à tutela do interesse do Recorrido nesta modalidade (pelo risco) para efeitos da aplicação do n.º do artigo 493.º do Código Civil.</font><br>
</p><p><font>XIV. Constitui entendimento corrente na doutrina e na jurisprudência que, para que se efetive a responsabilidade pelo risco, basta a ocorrência de um facto naturalístico – licito ou ilícito – e de um nexo de causalidade entre facto e o dano.</font><br>
</p><p><font>XV. E, a execução dos trabalhos que o Recorrido levou a cabo deve ser considerada uma atividade perigosa pela própria natureza, isto porque, para além dos meios utilizados, ocupou mais de metade do leito do Rio – tomou posse de 40 metros do leito do Rio numa extensão de 60 metros, reduzindo o causal do rio para apenas 20 metros – levando ao estreitamento do Rio.</font><br>
</p><p><font>XVI. Defender o contrário produz um resultado injusto, ilógico e contrário ao espírito da lei e do contrato, porque se estará a ignorar os pressupostos de direito à indemnização previsto nas referidas cláusulas garantidas.</font><br>
</p><p><font>XVII. Aliás, por seu turno, impunha-se à seguradora invocar e provar os factos ou circunstâncias excludentes da referida perigosidade/risco ou aqueles que sejam suscetíveis de retirar a natureza fortuita que os mesmos revelaram ma sua aparência factual, a título de factos impeditivos, o que não sucedeu nos presentes autos.</font><br>
</p><p><font>XVIII. Em Terceiro lugar, apesar de invocado pelo Recorrido, nos pontos 47 a 49 das Contra Alegações, o regime do sentido normal da declaração previsto no artigo 236.º do Código Civil, também ocorreu omissão de pronúncia quanto à tutela do interesse do Recorrido nesta modalidade, por clamorosa violação dos ditames da boa-fé.</font><br>
</p><p><font>XIX. E, tal implica que se considere que as cláusulas abusivas são nulas, por aplicação do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (Decreto – Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro), mormente dos seus artigos 15.º e 16.º, por clamorosa violação dos ditames da boa-fé.</font><br>
</p><p><font>XX. Sendo seguro que, o contrato de seguro em causa designa-se “contrato de seguro do ramo responsabilidade civil”, com as coberturas identificadas, pelo que, aos olhos de um declaratário normal e de boa-fé, os custos relativos à reparação dos danos causados nos furos de captação de água não está excluído.</font><br>
</p><p><font>XXI. E, porque também neste domínio a ponderação da boa-fé deverá ser feita em função da confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação e teor do contrato singular celebrado.</font><br>
</p><p><font>XXII. Pelo exposto, consideradas as omissões de pronúncia em epígrafe enunciadas, entende o Recorrido que deverá ser determinada a nulidade do Acordão s</font><i><font>ub judice</font></i><font>, atendo o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), uma vez não conhecer de todas as questões que deviam ser conhecidas, e devendo o novo Acórdão a proferir conhecer das questões supra referidas, revogando-se o Acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font> e confirmando-se o Acórdão da Relação.</font><br>
</p><p><font>XXIII. Por estas razões, não se poderá deixar desprovido de tutela o interesse da Recorrida que foi lesada pelo incumprimento do Contrato de Seguro celebrado com a Recorrente.</font><br>
</p><p><font>Termos em que, nos melhores de Direito e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser revogado o Acórdão </font><i><font>sub judice</font></i><font> e confirmando-se o Acórdão da Relação, com todas as legais consequências.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><u><font>A parte contrária respondeu</font></u><font>, tomando posição no sentido do indeferimento da pretendida reforma. </font><br>
</p><p><u><font>Cumpre decidir:</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>1) Como fundamento da reforma do acórdão, </font><u><font>começa a recorrida ora requerente por dizer</font></u><font> que, tendo-se ali concluído no sentido de os danos em questão, provocados no Furo F10, não estarem abrangidos no Contrato de Seguro </font><i><font>“uma vez que a autora não logrou provar (ou sequer alegou), conforme lhe competia, que, nos termos exigidos nas Condições Particulares, relativas às Coberturas, tais danos ocorreram em consequência da inexistência e/ou impossibilidade provadas de obtenção prévia dos referidos planos ou traçados”</font></i><font> e que só nesta eventualidade é que os danos em questão ficariam cobertos pelo contrato de seguro, </font><b><u><font>o mesmo não se pronunciou/decidiu quanto às demais Coberturas abrangidas pelo Contrato de Seguro, e que constam do Ponto 25 a 27 dos Factos Provados, nomeadamente, alínea c) e d</font></u></b><font>), por si invocadas nas contra-alegações.</font><br>
</p><p><font>Todavia, </font><u><font>sem razão</font></u><font>. </font><br>
</p><p><font>Desde logo porque, conforme a requerente reconhece, </font><u><font>esta questão não foi suscitada nas conclusões da revista da ré, a única recorrente, mas sim por si nas suas contra-alegações</font></u><font>.</font><br>
</p><p><font>Ora, como é sabido, e tem sido pacificamente entendido na jurisprudência, a menos que se trate de questões que sejam de conhecimento oficioso (o que não está em causa nem é sequer invocado) o tribunal de recurso apenas pode conhecer das questões suscitadas nas respetivas conclusões recursórias (acórdão do STJ de 06.06.2018 – proc. nº 4691/16.2T8LSB.L1.S1, in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>).</font><br>
</p><p><font>Assim, para que no acórdão ora sob censura, tivéssemos que apreciar quaisquer outras questões (designadamente a questão ora em questão), para além daquelas que foram suscitadas pela ré recorrente, </font><u><font>a autora recorrida teria que se socorrer do recurso subordinado ou da ampliação do âmbito do recurso, nos termos dos artigos 633º e 636º do CPC – o que não sucedeu.</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>E </font><u><font>mesmo que assim não fosse, sempre o conhecimento da questão estaria claramente prejudicado</font></u><font>, pela solução dada, no acórdão. às demais questões suscitadas e de que foram objeto de apreciação.</font><br>
</p><p><font>Com efeito, tendo-se dado resposta negativa às demais questões suscitadas na revista da ré recorrente (inexistência de responsabilidade da autora na produção do evento danoso, por inexistência de conduta ilícita da mesma ou de responsabilidade objetiva; exclusão do contrato de seguro dos danos em questão, pelo facto de a empreitada ter sido realizada em consórcio; exclusão dos danos em questão com base na cláusula constante da al. j) do artigo 2º da Condição Especial 41), e reconhecido que o Furo 10 constitui uma conduta ou canalização subterrânea, nos termos previstos na cobertura do seguro, o acórdão sob censura até reconheceu que, </font><i><font>a priori,</font></i><font> os danos em questão estariam cobertos pelo seguro celebrado pela autora com a r é seguradora.</font><br>
</p><p><font>Todavia, considerou que, não obstante isso, a cobertura do seguro, ou seja, a responsabilidade da ré </font><u><font>dependeria, nos termos contratuais, da prova pela autora (prova esse que não foi feita por esta</font></u><font>, conforme lhe competia - e não foi sequer alegado) de que os danos em questão tivessem ocorrido “em condutas ou canalizações subterrâneas de qualquer tipo </font><b><font>em consequência da inexistência e/ou impossibilidade provadas de obtenção prévia dos referidos planos ou traçados</font></b><font>”, sendo que só nesta eventualidade é que danos em questão ficariam cobertos pelo contrato de seguro. </font><br>
</p><p><font>E diz ainda a recorrida/requerente que, </font><u><font>para além daquelas coberturas ainda contratou com a recorrente a Cláusula Especial relativa Diz ainda a requerente a “Responsabilidade Civil por danos a estruturas e/ou propriedades, adjacentes e/ou contíguas de terceiras”</font></u><font>: (Cfr. Cláusula Especial junta pelo Autor com a Petição Inicial como Documento n.º 3 e, junto pelo Recorrido com a Contestação como Documento n.º 4), sendo que, </font><u><font>no que respeita à validade da cobertura, nomeadamente, da vistoria prévia dos bens contíguos, vistoriou previamente os bens contíguos com vista a certificar-se dos danos já existentes, e efetuou registo dessa vistoria, tendo inclusivamente informado a Seguradora/Recorrente,</font></u><font> conforme Doc. n.º 8 junto com a Petição Inicial.</font><br>
</p><p><font>Isto para além de fazer referência às garantias previstas na Cláusula Especial 41 – Responsabilidade Civil – Construção Civil (que remete para documento junto aos autos). </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Para além de se tratar de questões cujo conhecimento se não impunha, pelas razões acabadas de expor, uma vez que não forama suscitadas pelas partes, esta </font><u><font>factualidade ora invocada, conforme a ora requerente reconhece, não está provada nos autos</font></u><font>, sendo que, conforme se afirmou no acórdão, não lhe competindo fixar a matéria de facto, o STJ (que, por princípio apenas conhece de direito), na aplicação do direito, apenas se pode basear na factualidade dada por provada pelas instâncias.</font><br>
</p><p><font>Para além disso trata-se de </font><u><font>matéria que não poderia relevar no sentido da pretendida alteração da decisão proferida</font></u><font>. E daí que o seu conhecimento, pelas mesmas razões já supra assinaladas, sempre estivesse prejudicado.</font><br>
</p><p><u><font>Com efeito se, relativamente à primeira parte (sobre as ora invocadas cláusulas de cobertura</font></u><font>), pelas razões invocadas no acórdão e acabadas de expor, a cobertura dos danos em questão à luz de tais cláusulas e, consequentemente, a responsabilidade da ré, sempre estaria </font><u><font>dependente da prova da “inexistência e/ou impossibilidade provadas de obtenção prévia dos referidos planos ou traçados” – prova esta que, conforme já supra afirmado, não foi feita</font></u><font>, </font><u><font>relativamente à segunda parte</font></u><font> (realização de vistoria), a factualidade ora alegada nem se afigura </font><u><font>suficiente para se considerar provada a “inexistência e/ou impossibilidade provadas de obtenção prévia dos referidos planos ou traçados”.</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>Não se verifica assim neste âmbito a alegada omissão de pronúncia e, por consequência, a invocada nulidade do acórdão, ou fundamento que impusesse a alteração do acórdão nos termos pretendidos. </font><br>
</p><p><font>2) </font><b><font>Invoca ainda a recorrida a nulidade do acórdão</font></b><font> decorrente da </font><u><font>falta de pronúncia sobre a questão por si suscitada nas contra-alegações relativa à responsabilidade pelo risco</font></u><font>, pelo facto de se tratar de uma atividade portadora de perigosidade e geradora de risco.</font><br>
</p><p><font>Todavia, </font><b><font>também aqui sem razão.</font></b><br>
</p><p><font>Desde logo porque, pelas razões já supra referidas, apenas se impunha o conhecimento das questões suscitadas pela parte recorrente.</font><br>
</p><p><font>E por outro lado, porque o conhecimento de tal questão, que até foi suscitada e identificada como tal no acórdão como questão </font><i><font>decidenda</font></i><font> (“inexistência de responsabilidade da autora na produção do evento danoso, por inexistência de conduta ilícita da mesma </font><b><font>ou de responsabilidade objetiva</font></b><font>”) </font><u><font>ficou de todo prejudicado pela solução dada no sentido de existência de conduta ilícita negligente</font></u><font>, passível de gerar responsabilidade civil.</font><br>
</p><p><font>Com efeito, conforme se refere no acórdão, tendo a 1ª instância decidido no sentido da improcedência da ação pelo facto de considerar que, tendo o contrato de seguro em causa nos autos, celebrado entre as partes, por objeto a responsabilidade civil extracontratual da autora perante terceiros, se não mostram provados os requisitos desta, relativos à ilicitude e à culpa, a Relação, invertendo aquela decisão, considerou verificados os pressupostos da responsabilidade civil da autora por via da sua conduta ilícita/negligente na execução da obra.</font><br>
</p><p><font>E foi por isso que, na sua revista, a ré recorrente suscitou a questão que supra identificámos, defendendo que o comportamento da autora não é ilícito, inexistindo culpa, ainda que negligente, e defendendo ainda, supletivamente, a inexistência de responsabilidade da autora “mesmo que se considere estarmos em presença de uma atividade perigosa”. </font><br>
</p><p><font>Assim, tendo o acórdão concluído no sentido da responsabilidade da autora na reparação dos danos causados a terceiro, no Furo 10, com base na sua conduta ilícita (negligente), afastada se mostrava a eventual responsabilidade objetiva/perigosa.</font><br>
</p><p><font>Não se verifica assim, também neste âmbito, a alegada omissão de pronúncia e, por consequência, a invocada nulidade do acórdão. </font><br>
</p><p><font>3) Diz ainda a recorrida que, apesar de tal questão também ter sido invocada por si nas contra-alegações, ocorreu </font><b><font>omissão de pronúncia quanto à tutela do interesse da recorrida nesta modalidade, </font></b><font>por clamorosa violação dos ditames da boa-fé, o que implica que se considere que as cláusulas abusivas são nulas, por aplicação do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (Decreto – Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro), mormente dos seus artigos 15.º e 16.º, por clamorosa violação dos ditames da boa-fé.</font><br>
</p><p><font>Trata-se todavia de </font><u><font>questão da qual não tínhamos que conhecer</font></u><font>, pelas mesmas razões já supra expostas - uma vez que, não tendo a recorrida, ora recorrente, recorrido subordinadamente ou requerido a ampliação do âmbito da revista, tal questão não foi suscitada (aliás, naturalmente) nas conclusões da recorrente. </font><br>
</p><p><font>Improcedendo assim as invocadas nulidades, impõe-se indeferir a pretendida reforma do acórdão.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em indeferir a requerida (pela autora recorrida) reforma do nosso acórdão que conheceu da revista da ré recorrente.</font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><font>Custas pela recorrida/requerente.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lx. 09.03.2021</font><br>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font><br>
</p><p><font>Acácio das Neves (Relator)</font><br>
</p><p><font>Fernando Samões (1º Adjunto)</font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
PTJ2u4YBgYBz1XKvHQxJ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p>
</p><p><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>AA </font></b><font>deduziu oposição por embargos de executado à execução que lhe foi movida pela exequente </font><b><font>“BB – Sucursal em Portugal”</font></b><font>, alegando para o efeito que, na sua qualidade de avalista das duas livranças dadas à execução, não foi interpelada pela exequente/embragada, para proceder ao pagamento de eventuais montantes em dívida e ainda que a mesma lhe não deu conhecimento de que iria proceder ao preenchimento de tais livranças avalizadas em branco. </font>
</p><p><font> Invocou a ineptidão, por ininteligibilidade, do requerimento executivo, o preenchimento abusivo das livranças dadas à execução, a inexistência do direito a juros remuneratórios e ainda a prescrição dos juros contabilizados para além dos últimos cinco anos que antecederam a data de vencimento dos títulos. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A exequente contestou, defendendo-se por impugnação e defendendo a improcedência dos embargos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No despacho saneador foi julgada improcedente a invocada ineptidão do requerimento executivo e, realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><u><font>sentença</font></u><font>, na qual os embargos foram julgados apenas parcialmente procedentes, determinando-se o prosseguimento da ação executiva apenas para pagamento da quantia global de € 394.108,26, acrescida dos juros moratórios vincendos, à taxa legal de 4 %, contados a partir de 11/11/2014, até integral pagamento. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de apelação da embargante, a </font><u><font>Relação do Porto</font></u><font> anulou a sentença por considerar indispensável a ampliação da matéria de facto (vertida nos artigos 9.° a 15.º do Requerimento Inicial) e determinou que o Tribunal recorrido procedesse à apreciação da exceção perentória invocada pela embargante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Realizada a nova audiência de julgamento, foi proferida </font><b><u><font>nova sentença</font></u></b><font>, na qual se decidiu </font><i><font>“julgar parcialmente procedentes, por parcialmente provados, os embargos de executado deduzidos pela embargante CC e, em consequência, determinar o prosseguimento da ação executiva intentada pela embargada BB, SA, Sucursal em Portugal, mas apenas para pagamento da quantia global de € 394.108,26 (€ 213.325,89 +€ 180.782,37), acrescida dos juros moratórios vincendos, à taxa legal de 4 %, contados a partir de 11/11/2014, até integral pagamento.”</font></i><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Uma vez mais inconformada, interpôs a embargante novo </font><u><font>recurso de apelação – recurso esse que a Relação do Porto veio a julgar improcedente, sendo confirmada a sentença.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>De novo inconformada, </font><b><u><font>interpôs a embargante recurso de revista excecional</font></u></b><font> (admitido pela Formação a que alude o nº 3 do art. 672º do CPC), no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>I. A recorrente, não se conformando com o teor do acórdão proferido pela 2ª secção cível do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO que julgou improcedente o recurso por si interposto, vem dele interpor recurso de revista excecional. </font>
</p><p><font>II. Assim, nos termos do disposto no art. 629° n01 do CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL (doravante CPC), considerando o valor processual da causa, que ascende a 394.108,26 €, e o facto de ser parte vencida, tendo sucumbido na sua totalidade, verificar-se-iam as condições gerais de admissibilidade do recurso ordinário de Revista, se não fosse a dupla conforme. </font>
</p><p><font>III. Todavia, e atento o disposto no n.º 3 do artigo 671.° do CPC, o recurso será admitido, de forma excecional, apenas se ocorrer uma de três circunstâncias previstas nas alíneas a) a c) do n.01 do artigo 672. ° do CPC.</font>
</p><p><font>IV. Na senda da demonstração do preenchimento dos requisitos patentes o corpo do referido normativo, </font><i><font>maxime</font></i><font>, a dupla conforme, no âmbito de uma ação executiva que teve na sua génese duas livranças em branco, a aqui recorrente, figurando ali enquanto executada na qualidade de avalista, deduziu oposição à execução. </font>
</p><p><font>V. Perante os embargos deduzidos pela ali embargante, e em face da correspetiva improcedência total, recorreu para o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, tendo este mantido a decisão recorrida na sua íntegra conforme melhor se explanará infra. </font>
</p><p><font>VI. Tendo em conta o supra citado art.º 672°, o presente recurso enquadra-se na hipótese vertida na al. c) (contradição de julgados), e também o requisito da inexistência de acórdão uniformizador se encontra cumprido. </font>
</p><p><font>VII. Ademais, sobre o recorrente recai o ónus de demonstrar "os aspetos de identidade que determinam a contradição alegada', o que infra fará, sendo certo que, tendo o acórdão recorrido sufragado, quanto a cada uma das concretas questões de direito em causa, solução jurídica contraditória, com a firmada pelos supra referidos acórdão fundamento, relativa à mesma questão fundamental de direito, justifica-se, salvo melhor opinião, a admissão do recurso de revista excecional, conforme o disposto na al, c) do n.º l do art.º 672° do CPC. </font>
</p><p><font>VIII. Ora, uma vez que são três as questões jurídicas objeto de reapreciação, encontrando-se, cada uma delas per si, em contradição com um acórdão transitado em julgado, proferido no âmbito da mesma legislação e sobre uma mesma questão fundamental de direito, o seu tratamento será devidamente individualizado, dado tratar-se de distintas questões de direito que consubstanciaram pedidos subsidiários. </font>
</p><p><font>IX. Assim, e no que concerne a primeira questão de direito invocada - prescrição do direito de ação por referência à correta data de vencimento das livranças, que não é aquela que foi aposta nas livranças (consubstanciando preenchimento abusivo) - o acórdão recorrido encontra-se em contradição com o sufragado no acórdão do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, de 30-04-2002, proferido no âmbito do processo 02A998 (cuja cópia se junta em anexo juntamente com a respetiva certidão com nota de trânsito nos termos do disposto no artigo 637.° n.02 e artigo 672.° n.º 2 al. c) do CPC), na parte em que, ficando provada a concreta data de vencimento das livranças em branco, que não corresponde àquela que foi aposta nas livranças - em desrespeito pelo pacto de preenchimento -, aquele (acórdão recorrido) considerou que tal circunstância não releva em termos de prescrição, mas somente em sede de preenchimento abusivo, e não retirando qualquer consequência jurídica relevante da factualidade provada referente à falta de correspondência entre a correta data de vencimento e aquela que veio a ser aposta (bem posterior à data do efetivo vencimento), enquanto este (acórdão fundamento) considerou que a referida factualidade consubstancia preenchimento abusivo, e, como tal, por referência à correta data de vencimento, o direito cambiário já se encontrava prescrito aquando da propositura da ação executiva (tudo cfr. arts. ° 70° e 10º da LULL aplicáveis </font><i><font>ex vi</font></i><font> do disposto no art.º 77° do mesmo diploma) - efetuando, com efeito, o acórdão fundamento, e conforme se impõe, uma correta interpretação e aplicação do direito aplicável: a análise conjunta de ambas as exceções para a qual influi a sobredita factualidade. </font>
</p><p><font>X. A este respeito, através do recurso interposto para o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, invocou a recorrente a prescrição do direito de ação da exequente, porquanto, e atenta a factualidade assente, a embargada havia resolvido os contratos em 13/08/2007 (com o incumprimento da mutuária - facto provado n.º 1l), procedendo ao preenchimento das livranças apenas em 08/02/2012, e propondo ação executiva apenas em 21/08/2014, consubstanciando, tal factualidade assente, preenchimento abusivo e, como tal, à data da ação executiva já o direito cambiário havia, há muito, prescrito. </font>
</p><p><font>XI. Ora, no que concerne esta concreta questão de direito, e com magno relevo para a presente revista excecional, importa atentar à factualidade provada pelo Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> (e mantida pelo Tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>) sob os nºs 7), 11) e 19) da factualidade provada reproduzida no acórdão recorrido cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. </font>
</p><p><font>XII. Todavia, face à referida factualidade provada, o acórdão recorrido não efetuou, contrariamente ao sucedido no acórdão fundamento, uma correta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis supra referidas, alheando-se ao conceito de justiça intrínseco às normas jurídicas, bem assim, ao que evidenciavam os factos assentes: o decurso do prazo prescricional previsto no artº 70° por verificação do disposto no art.º 10º da LULL (ambos aplicáveis </font><i><font>ex vi</font></i><font> do disposto no art.º 770 1§ e 2§), i.e., a indicação de uma data de vencimento posterior àquela que é a verdadeira e comprovada data de vencimento, consubstancia preenchimento abusivo e culposo nos termos do art.º 10° da LULL que, por sua vez, determina a verificação da prescrição do direito cambiário. </font>
</p><p><font>XIII. Ora, o acórdão recorrido, não obstante a alegação da recorrente da verificação do preenchimento abusivo das livranças no que respeita a concreta data de vencimento - a qual resulta comprovada dos autos e que não corresponde àquela que veio a ser aposta nas mesmas - entendeu que </font><i><font>“a falta de correspondência entre esse pacto e o teor do título não releva em termos de prescrição, mas diversamente em sede de preenchimento abusivo do mesmo”</font></i><font>, desconsiderando a alegação da recorrente no sentido em que a prescrição e o preenchimento abusivo concorrem, em conjunto, para a aferição da prescrição cambiária. </font>
</p><p><font>XIV. Com efeito, o acórdão recorrido não considerou que a factualidade provada referente à divergência entre a data aposta nas livranças como data de vencimento e a correta data de vencimento consubstanciasse uma violação do pacto de preenchimento, considerando que, ao exequente, tratando-se de uma livrança em branco, não se impunha qualquer limite temporal, podendo este proceder ao preenchimento quando bem entendesse e </font><i><font>“quando o considerar oportuno”</font></i><font>.</font>
</p><p><font>XV. Ora, no acórdão do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (acórdão fundamento), datado de 30-04-2002, no âmbito do processo n. ° 02A998, já transitado em julgado (cfr. certidão. junta), estava também em causa uma mesmíssima situação: no âmbito de uma ação executiva, o executado deduziu embargos pugnando que a data inscrita no título violou o acordo convencionado, uma vez que a data que veio a ser inscrita no título não corresponde à data de vencimento (resolução do contrato), e, por conseguinte, e por referência à verdadeira data de vencimento, o título já se encontrava prescrito. </font>
</p><p><font>XVI. Ora, não obstante na situação do acórdão fundamento estar em causa uma letra (e não uma livrança), tal circunstância não torna as situações distintas, </font><i><font>maxime</font></i><font> tratando-se de uma letra em branco, cujas normas aplicáveis às livranças nesta concreta questão de direito são precisamente as normas previstas para as letras (arts.º 70°,33° a 37° e 10° da LULL).</font>
</p><p><font>XVII. Ademais, o acórdão fundamento, e em abono do entendimento jurídico aí propalado, elucidou que ainda que o título seja subscrito em branco, tal não significa que o portador o possa preencher livremente, impondo-se a verificação de limites temporais – </font><i><font>“não é só o resultado dos termos em que as partes se exprimiram/ como também corresponde a um interesse atendível por parte dos devedores - em especial o ora recorrente/ que é apenas o garante de obrigações assumidas por outrem em contrato em que não foi parte e em relação ao qual se deve reconhecer o interesse em ver delimitada claramente no tempo a sua responsabilidade”</font></i><font>. </font>
</p><p><font>XVIII. Acrescentando, ainda, o acórdão fundamento, que </font><i><font>“o acórdão recorrido, não atendendo a esta imperatividade, opinou, sem qualquer justificação razoável, não ser abusivo o preenchimento com vencimento à vista, o qual iria, afinal, permitir um prolongamento temporal indefinido em tudo contrário ao propósito evidenciado pelo contrato de preenchimento”. </font></i>
</p><p><font>XIX. Em súmula, entendeu este Venerado Tribunal no referido acórdão fundamento, perante a mesma factualidade do acórdão recorrido, que a circunstância da data aposta no título como data de vencimento não corresponder à verdadeira data de vencimento, “</font><i><font>implica um indevido protelamento do início do decurso do prazo prescricional”</font></i><font>, consubstanciando preenchimento abusivo e julgando verificada a exceção da prescrição, extinguindo, por conseguinte, a execução. </font>
</p><p><font>XX. Improcedendo, no entanto, o recurso da ora recorrente, no domínio da mesma factualidade concreta, da mesma questão fundamental de direito e da mesma legislação, pois, em ambas situações, atenta a correta data de vencimento e a data da propositura das respetivas ações executivas, já há muito havia decorrido o prazo prescricional de três anos. </font>
</p><p><font>XXI. A este respeito, e relativamente a esta concreta questão de direito, cremos não ser despiciendo referenciar o entendimento propalado e citado no acórdão deste Venerado Tribunal no âmbito do apenso A dos presentes autos relativamente aos limites temporais que se impõem quando o título é subscrito em branco (o qual foi cabalmente subscrito nas alegações de recurso da ora recorrente que mereceram a decisão patente no acórdão recorrido), referindo que </font><i><font>“impende sobre si</font></i><font> [exequente] </font><i><font>o ónus de o fazer com alguma brevidade, sob pena de, decorridos (no máximo) três anos sobre esse instante perder definitivamente a possibilidade de exercitar o direito cambiário. Se persistir em preencher e/ou assinar o título para lá desse limite temporal, indicando uma data de vencimento posterior, incorre em preenchimento abusivo e culposo nos termos do art. 10º da LU e, por referência à data de vencimento correta, o direito cambiário deve considerar-se prescrito”</font></i><font>. </font>
</p><p><font>XXII. Por conseguinte, perante a evidente contradição de julgados, ressalta, com todo o respeito, o erro de interpretação e aplicação das normas da LULL, </font><i><font>maxime</font></i><font>, dos arts.º 70°, 33° e 10°), constituindo, portanto, fundamento do presente recurso nos termos do preceituado no art.º 674°, n.º 1 al. a) do CPC, impondo-se, com efeito, a revogação deste último. </font>
</p><p><font>XXIII. Por outro lado, e subsidiariamente à prescrição invocada por verificação do preenchimento abusivo das livranças dadas à execução, invocou a recorrente a inexigibilidade da quantia exequenda perante a avalista por falta de interpelação (2ª concreta questão de direito).</font>
</p><p><font>XXIV. Quanto a esta concreta questão de direito, o acórdão recorrido encontra-se em contradição com o sufragado no acórdão do TRIBUNAL DA RELACÃO DE ÉVORA, de 27/02/2014, proferido no âmbito do processo n.º 1470/11.7TBSTB-A.E1 (cuja cópia se junta em anexo juntamente com a respetiva certidão com nota de trânsito nos termos do disposto no artigo 637.° n.º 2 e artigo 672.° n.º 2 al. c) do CPC), na parte em que, ficando provada a falta de interpelação prévia da avalista (como ficou quer no acórdão recorrido quer no acórdão fundamento),aquele (acórdão recorrido) considerou que tal circunstância apenas releva em sede de contagem de juros moratórios, enquanto este (acórdão fundamento) considerou que a referida circunstância consubstancia a inexigibilidade de quantia aposta nas livranças, extinguindo, por conseguinte, a execução. </font>
</p><p><font>XXV. Releva, quanto a esta concreta questão de direito, a factualidade provada nº 16), 17) e 18) reproduzida no acórdão recorrido e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, a qual foi mantida pelo Tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font>, e da qual resulta a embargada não comunicou, em momento algum, à embargante o incumprimento da mutuária e respetivos valores em dívida - momento que a legitimaria a preencher os títulos - cfr. facto provado n.º 7; por outro lado, o comportamento da embargada em ignorar a existência da ora recorrente, persistiu, quando, volvidos cerca de cinco anos a contar do referido incumprimento da mutuária, a embargada procede unilateralmente ao preenchimento das livranças em branco sem, contudo, previamente lhe comunicar que o iria fazer, bem como os elementos que iria inscrever na mesma; e, por fim, mesmo após o preenchimento das referidas livranças, a embargada manteve a mesma atitude, não a interpelando para proceder ao respetivo pagamento. </font>
</p><p><font>XVI. Porém, o acórdão recorrido considerou que a referida circunstância em nada afetaria a obrigação exequenda. </font>
</p><p><font>XVII. Já o acórdão fundamento considerou que </font><i><font>“Temos para nós como pacífico que a não apresentação da livrança a pagamento ao avalista não lhe retira a exequibilidade,</font></i><font> </font><i><font>por ser um título pagável à vista. Todavia, é necessária a interpelação prévia do avalista, no caso do título ter sido entregue em branco ao credor, para este preencher, pois só assim o avalista terá efetivo conhecimento do montante exato e da data de vencimento da garantia prestada. </font></i><font>Ou seja, neste caso, a interpelação do avalista </font><i><font>“é essencial para a prova de que o respetivo vencimento se deu na data em que a exequente apôs no título, de acordo com o pacto de preenchimento”.</font></i>
</p><p><font>XXVIII. No acórdão fundamento considerou-se provada a não interpelação do avalista para os referidos termos, desconhecendo este por completo o montante exato e a data em que se vencia a obrigação avalizada, tendo o mesmo alegado ter sido apanhado de surpresa com a citação, tal qual sucedeu no acórdão recorrido. </font>
</p><p><font>XXIX. Em suma, entendeu o acórdão fundamento, no âmbito da mesma questão jurídica e perante a mesma factualidade provada, que </font><i><font>"a exigibilidade perante o avalista duma livrança subscrita em branco, pressupõe a necessária interpelação prévia daquele, por só assim ele ter conhecimento do montante exato da dívida e da data em que se vence a garantia prestada" </font></i><font>(…), julgando, pois, </font><i><font>“procedente a apelação”</font></i><font>, “</font><i><font>determinando-se a extinção da execução no que se refere ao recorrente”</font></i><font>, improcedendo, no entanto, o recurso da ora recorrente, no domínio da mesma factualidade concreta, da mesma questão fundamental de direito e da mesma legislação.</font>
</p><p><font>XXX. Por conseguinte, perante a evidente contradição de julgados, ressalta, com todo o respeito, o erro de interpretação e aplicação das normas da LULL e do CC (nomeadamente do art.° 762° n.°2 - boa-fé contratual), constituindo, portanto, fundamento do presente recurso nos termos do preceituado no art.º 674°, n.º l al. a) do CPC, impondo-se, com efeito, a revogação deste último. </font>
</p><p><font>XXXI. Por último, invocou ainda a recorrente o preenchimento abusivo das livranças com outros fundamentos, designadamente como decorrência da falta de interpelação da avalista. </font>
</p><p><font>XXXII. No que respeita esta concreta questão de direito, o acórdão recorrido encontra-se em contradição com o sufragado no acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, de 11-10-2016, proferido no âmbito do processo n.º 4233/10.3TBVFX-A.L1-7 (cuja cópia se junta em anexo juntamente com a respetiva certidão com nota de trânsito nos termos do disposto no artigo 637,° n.º 2 e artigo 672.° n.º 2 al. c) do CPC), na parte em que, ficando provada a falta de interpelação do avalista do título em branco, aquele (acórdão recorrido) considerou que tal circunstância não consubstancia qualquer situação de preenchimento abusivo, enquanto este (acórdão fundamento) considerou que a referida circunstância consubstancia preenchimento abusivo, extinguindo, por esse motivo, a execução. </font>
</p><p><font>XXXIII. Ora, a este respeito, alegou a recorrente que </font><i><font>“do incumprimento da necessária interpelação prévia, cumpre concluir-se que o Banco/recorrido atuou, em relação à ora recorrente, de modo contrário àquele imperativo de boa-fé, ao fim do aval e aos princípios constitucionais da proporcionalidade e da justiça, o que torna ilegítimo o exercício que pretendeu fazer valer, devendo, pois, ser fundamento de extinção da execução”.</font></i>
</p><p><font>XXXIV. Relevando, quanto a esta concreta questão jurídica, a factualidade provada sob os nºs 16), 17) e 18) reproduzida no acórdão recorrido e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.</font>
</p><p><font>XXXV. Porém, entendeu o acórdão recorrido que a atuação da exequente em não interpelar a avalista foi legítima, considerando, com efeito, não verificado, o preenchimento abusivo das livranças dadas à execução. </font>
</p><p><font>XXXVI. Já o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA no acórdão fundamento, datado de 11-10-2016, proferido no âmbito do processo n.º 4233/10.3TBVFX-A.L1-7, já transitado em julgado (cfr. certidão junta), no qual estava também em causa uma ação executiva à qual subjaz uma livrança em branco e subsequente oposição à execução por parte do avalista invocando a sua falta de interpelação prévia, foi a execução declarada extinta porquanto, considerou aquela douta Relação que o preenchimento da livrança em branco com ausência de interpelação prévia do avalista é abusivo. </font>
</p><p><font>XXXVII. Considerando, ainda, que, </font><i><font>“tratando-se do vencimento das prestações futuras em que se desdobrava o cumprimento do negócio subjacente, bem como do exercício à resolução do negócio por incumprimento do mutuário, invocado pelo avalista ou pelo subscritor o abusivo preenchimento da livrança entregue em branco, competia ao portador do título demonstrar o pressuposto básico e fundamental que lhe permitia proceder licitamente ao preenchimento do título, ou seja, a prévia interpelação daqueles”</font></i><font>, e que </font><i><font>“não provando a exequente que, na relação subjacente à emissão do título e no âmbito das suas relações imediatas (entre portsdor, subscritor e seus avalistas), realizou efetivamente o ato de interpelação dos devedores subscritores da livrança em branco, procede a oposição de executado deduzida pelo avalista com este fundamento”</font></i><font>, tendo, por conseguinte, julgado extinta a execução, improcedendo, no entanto, o recurso da ora recorrente, no domínio da mesma factualidade concreta, da mesma questão fundamental de direito e da mesma legislação. </font>
</p><p><font>XXXVIII. Por conseguinte, perante a evidente contradição de julgados, ressalta, com todo o respeito, o erro de interpretação e aplicação das normas da LULL e do CC (nomeadamente dos arts.º 813.º - mora do credor- e 762° n.º 2 do CC - boa-fé contratual), constituindo, portanto, fundamento do presente recurso nos termos do preceituado no art.º 674°, n.º l al. a) do CPC, impondo-se, com efeito, a revogação do acórdão recorrido. </font>
</p><p><font>XXXIX. Termos em que, deverá o presente recurso ser admitido, e concedido provimento ao mesmo nos termos propalados, com as devidas e legais consequências apontadas no vindo de referir, só assim se fazendo a mais elementar justiça. </font>
</p><p><font>Nestes termos e nos mais de Direito, </font><i><font>maxime</font></i><font> nos douta e superiormente supríveis, Venerandos Julgadores, deve o presente recurso ser admitido, e, concedido provimento ao mesmo, proferido douto acórdão que revogue aquele que motiva o presente Recurso de Revista Excecional nos termos supra propalados, extinguindo-se, por conseguinte, a instância executiva no que respeita a ora recorrente, fazendo-se, assim, a melhor e mais elementar JUSTIÇA. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Não foram apresentadas contra-alegações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Colhidos os vistos cumpre decidir:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Perante o conteúdo das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista (e decidida que se mostra, pela Formação, a questão da admissibilidade da revista excecional), são as seguintes as questões de que cumpre conhecer:</font>
</p><p><font> </font><br>
<b><font>-</font></b><font> preenchimento abusivo das livranças;</font><br>
<b><font> -</font></b><font> prescrição do direito de ação;</font><br>
<b><font> -</font></b><font> inexigibilidade da quantia exequenda por falta de interpelação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>É a seguinte a factualidade dada como provada e como não provada pelas instâncias:</font></u>
</p><p><u><font>Factos provados:</font></u>
</p><p><font>1) A exequente Banco BB, SA, Sucursal em Portugal, intentou contra os executados DD, Lda, EE, AA, FF, GG, HH e II, a ação executiva de que estes autos são apenso, dando à execução as duas livranças cujos originais estão integrados no processo executivo, aqui dados por integralmente reproduzido; </font>
</p><p><font>2) As referidas livranças, com os nºs ... e ..., foram subscritas, em branco, pela sociedade JJ, Lda, e avalizadas, pelo menos, pela executada AA, para garantia do efetivo cumprimento das obrigações decorrentes da celebração dos contratos de compra e venda e mútuo com hipoteca e de mútuo com hipoteca e respetivos documentos complementares, ambos celebrados em 01/09/2005, constantes dos documentos apresentados como requerimento executivo, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido; </font>
</p><p><font>3) Através do primeiro dos referidos contratos (compra e venda e mútuo com hipoteca), a exequente (nessa altura denominada BB, com o nome comercial de "KK"), concedeu à sociedade JJ, Lda, um empréstimo no montante de € 149.639,37, nos termos e condições constantes do documento complementar anexo, destinado a financiar a aquisição pela mesma da fiação autónoma designada pela letra "E", correspondente a um armazém industrial com a área de 750m2, do prédio sito na Rua ..., em ..., ..., descrito na Conservatória do Registo Predial da ... sob o n° … e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ..., sobre a qual foi constituída hipoteca voluntária a favor da exequente; </font>
</p><p><font>4) Por sua vez, através do segundo dos mencionados contratos (mútuo com hipoteca), a exequente concedeu à referida sociedade JJ, Lda, um empréstimo, no montante de € 126.860,63, nos termos e condições constantes do documento complementar anexo, sendo o mesmo exclusivamente destinado a apoiar a realização de obras de beneficiação das instalações comerciais da mutuária e, em garantia, foi constituída a favor da exequente hipoteca voluntária sobre a referida fração autónoma designada pela letra "E", do prédio sito na Rua ..., em ..., ...;</font>
</p><p><font>5) Em conformidade com o estipulado nas cláusulas segunda e sexta dos documentos complementares anexos aos dois aludidos contratos, as quantias mutuadas foram utilizadas de uma só vez, através de crédito na conta de depósito à ordem da mutuária, devendo ser reembolsada em 180 prestações mensais de capital e juros;</font>
</p><p><font>6) Na cláusula nona dos referidos documentos complementares, convencionou-se que as mencionadas obrigações seriam ainda garantidas pela emissão de livranças, subscritas pela mutuária JJ, Lda, e avalizadas por DD, Lda, EE, AA</font>
</p><p><font>, HH, II, FF e GG, ali se estabelecendo que </font><i><font>"Em caso de incumprimento de todas as obrigações e responsabilidades constituídas ou a constituir perante a BB, decorrentes do presente contrato, suas renovações c substituições e até integral pagamento, a BB fica desde já autorizada a preencher e a descontar a referidas livrança pelo valor que lhe for devido, conforme o preceituado neste Contrato, a fixar as datas de emissão e vencimento, a designar o local de pagamento, bem como a proceder ao débito na conta de Depósitos à Ordem da Mutuária do valor devido pelo correspondente imposto de selo"</font></i><font>; </font>
</p><p><font>7) Na cláusula décima segunda dos mencionados documentos complementares, na parte que agora releva, estabeleceu-se: "</font><i><font>Considerar-se-á como imediata e automaticamente vencido e consequentemente exigível, tudo quanto constitua o crédito da BB, se c quando ocorrer qualquer um dos seguintes factos: a) A Mutuária suspender ou deixar de satisfazer qualquer obrigação e/ou responsabilidade decorrente ou assumida no presente Contrato, quer tenha natureza pecuniária ou não (...) c) A Mutuária e/ou os Avalistas reconhecerem a sua incapacidade para solverem os seus débitos, entrarem em concordatas, acordos de credores ou em quaisquer outros processos preventivos ou preparatórios de falência ou insolvência, outros processos de recuperação de empresas e proteção de credores, apreensão de bens, expropriação, gestão controlada, intervencionada, direta ou indiretamente, pelo estado ou vier a ser declarada a sua falência ou insolvência, bem como se praticarem qualquer ato de natureza ou efeitos análogos (...) d) A Mutuária e/ou os Avalistas foram executados judicialmente"</font></i><font>; </font>
</p><p><font>8) Na cláusula quarta dos aludidos documentos complementares, na parte que agora releva, estabeleceu-se: </font><i><font>"1 - O presente empréstimo vencerá juros à taxa nominal anual inicial de 4,25 (quatro virgula vinte e cinco por cento). 2 - Sobre o capital mutuado incidem juros a uma taxa equivalente à taxa EURIBOR ( ... ) a seis meses, à data da tomada de fundos, a arredondar para o ~ percentual superior, acrescida de uma margem (spread) de 2,00% ( ... ), ajustável no início de cada semestre, em função aos variações que venham a ocorrer no indexante (... ) 3 - Fica desde já convencionado que a taxa aplicável em cada momento não poderá ser inferior a ./,25% ( ... ) nominal anual, pelo que será esta a taxa a aplicar no caso de algum ajustamento periódico, nos termos previstos no número anterior, produzir como resultado uma taxa inferior (... ) 8 - No caso de a BB considerar os seus créditos integralmente vencidos devido ao incumprimento da Mutuário, acrescerá à taxa de juro contratual, a título de cláusula penal, uma sobretaxa de 4,00% ( ... ) ou aquela que estiver em vigor, que incidirá sobre o capital em dívida pelo período da mora ( ... ) 9 - Todas as despesas inerentes ao presente Contrato, incluindo o Imposto de Selo e demais encargos legais, serão suportados pela Mutuária: A Mutuária compromete-se a indemnizar a BB das referidas despesas e encargos legais e fiscais, no prazo máximo de 15 ( ... ) dias, a contar da data da comunicação que a BB dirigir à Mutuária nesse sentido, acompanhada dos respetivos documentos comprovativos "</font></i><font>;</font>
</p><p><font>9) A subscritora JJ, Lda, e os avalistas DD, Lda, EE, AA, HH, II, FF e GG, subscreveram ainda a convenção de preenchimento constante do documento de fls. 26 a 28, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, aí se consignando, para além do mais </font><i><font>"... livrança esta cujo montante, data de emissão e data de vencimento se encontram em branco, para que a BB os fixe, podendo completar o preenchimento do título, compreendendo o saldo que for devido, comissões, juros remuneratórios e de mora e de imposto de selo devido, e descontando-o quando o considerar oportuno, o que, desde já, e por esta, se autoriza, no caso de a sociedade JJ, LIMITADA, não regularizar as obrigações provenientes do referido empréstimo"</font></i><font>;</font>
</p><p><font>10) No âmbito dos referidos contratos, a mutuária JJ, Lda, procedeu ao pagamento das prestações (rendas) vencidas até 02/09/2006, deixando por liquidar a totalidade das que se venceram posteriormente (cfr. extratos de fls. 84 a 103, cujo conteúdo aqui se dá por int | [0 0 0 ... 0 0 0] |
xDJvu4YBgYBz1XKvAAck | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>Revista nº 13607/14.0T8LSB.L1.S1</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p>
</p><p><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>AA </font></b><font>intentou ação declarativa comum contra </font><b><font>Condomínio da Rua…… , Lisboa </font></b><font>e </font><b><font>Schindler - Ascensores Escadas Rolantes. S.A., </font></b><font>pedindo a condenação dos réus no pagamento da quantia total de € 48.458,12, sendo:</font>
</p><p><u><font>a) € 3.458,12</font></u><font> a título de danos patrimoniais com o que despendeu em despesas médicas e medicamentosas;</font>
</p><p><font>b) </font><u><font>€ 45.000,00</font></u><font> a título de danos não patrimoniais pelo sofrimento causado;</font>
</p><p><font>c) devendo às quantias referidas acrescerem os juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação até efetivo e integral pagamento, e ainda,</font>
</p><p><font>d) o valor que vier a ser liquidado em execução de sentença, pelas despesas com tratamentos, cirurgia, fisioterapia e transportes por si despendidos após a data de entrada da ação em juízo.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegou para tanto e em resumo que no dia 18 de Julho de 2012, quando descia no elevador do prédio do réu Condomínio para o piso zero, o elevador ao passar o patamar do primeiro piso entrou em queda livre até embater no poço do elevador, onde ficou encarcerado até ser dali retirado pelos Bombeiros, e que em resultado disso sofreu diversos ferimentos, tendo sido transportado para o Hospital de ……. em Lisboa para assistência e tratamento das lesões físicas que sofreu em razão da queda, sendo os réus responsáveis pelo ressarcimento dos respetivos danos patrimoniais e não patrimoniais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Citados, ambos os réus contestaram, pugnando ambos pela improcedência da ação.</font>
</p><p><font>O réu Condomínio requereu a intervenção principal da administradora do condomínio, a sociedade </font><u><font>Urbilumiar – Sociedade Urbana de Mediação Imobiliária, Lda.</font></u><font>, a quem cabia ordenar a reparação dos elevadores e solicitar a realização de inspeções periódicas à Câmara Municipal de Lisboa – chamamento esse que veio a ser deferido.</font>
</p><p><font>A ré Schindler, para além de invocar a sua ilegitimidade, alegou que já havia proposto ao réu Condomínio a realização de diversas reparações no elevador que poderiam ter evitado o evento, as quais não foram adjudicadas, invocando ainda o excesso de lotação do elevador aquando da sua queda/deslizamento.</font>
</p><p><font>E requereu a intervenção principal da </font><u><font>Zurich - Companhia de Seguros. S.A</font></u><font>. para quem alegou haver transferido, mediante contrato de seguro, a sua responsabilidade profissional – o que foi igualmente deferido.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A interveniente </font><u><font>Zurich</font></u><font> aceitou a existência do contrato de seguro invocado pela Ré Schindler, a que é aplicável uma franquia de € 5.000,00, tendo no mais corroborado a defesa já apresentada pela ré sua segurada.</font>
</p><p><font>E a interveniente Urbilumiar veio apresentar articulado no qual alegou desconhecer o acidente em causa e que as manutenções realizadas pela Ré Schindler decorreram dentro do programado, cabendo-lhe efetuar uma mera gestão diária do condomínio e não tomar decisões quanto à reparação dos ascensores, razão pela qual declina qualquer responsabilidade.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi designada e teve lugar a audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a exceção dilatória deduzida pela ré Schindler.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Prosseguindo s autos veio a ter lugar a audiência de julgamento, após o que veio a ser proferida </font><b><u><font>sentença</font></u></b><font>, na qual, julgando-se parcialmente procedente a ação </font><u><font>se decidiu</font></u><font>:</font>
</p><p><i><font>- Absolver a Ré Urbilumiar do pedido;</font></i>
</p><p><i><font>- Condenar o Réu Schindler, o Réu Condomínio, e a Ré Zurich, a pagarem ao Autor, solidariamente, a quantia de € 1.903,44, a título de danos patrimoniais, e a quantia de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais - num total de € 26. 903,44, descontando-se no que concerne à Ré Zurich a quantia de € 5.000,00 correspondente ao valor da franquia contratualmente prevista para a Ré Schindler, </font></i>
</p><p><i><font>- tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação, quanto aos danos patrimoniais, e desde a data da sentença, quanto aos danos não patrimoniais, até integral pagamento, absolvendo-os do demais peticionado.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de recursos de apelação da ré Schindler (recurso principal) e do autor (recurso subordinado), </font><b><u><font>a Relação de Lisboa</font></u></b><font>, jugando improcedente o recurso deste e parcialmente procedente o recurso daquela:</font>
</p><p><font>- </font><i><font>reduziu para € 15.000,00 o valor dos danos não patrimoniais devido pela ré Schindler,</font></i>
</p><p><i><font>- no mais mantendo o decidido na 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Inconformado, </font><b><u><font>interpôs o autor o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes c</font><u><font>onclusões:</font></u>
</p><p><font>1ª - O recorrente recorre para o Venerando Tribunal com base na desvalorização e interpretação superficial dos artigos 494.° e n.º 3 do 496.°, ambos do C. Civil, que face à matéria assente / provada, suporta no seu entender uma quantia indemnizatória a título de danos não patrimoniais mais elevada da que as RR. foram condenadas. </font>
</p><p><font>2ª - É assim interposto recurso do segmento decisório respeitante ao valor de 45.000,00 euros requerido pelo recorrente na petição inicial a título de danos não patrimoniais, ao que a 1ª instância fixou no valor de 25.000,00 euros, montante que a 2.ª instância entendeu como sendo exagerado face ao dano não patrimonial sofrido, tendo reduzido a quantia indemnizatória para 15.000,00 euros.</font>
</p><p><font>3ª - Decorre dos artigos 494.° e n.º 3 do 496.° do C. Civil, que o montante para o ressarcimento dos danos não patrimoniais é sempre calculado segundo critérios de equidade, atendendo-se designadamente ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado, e ao grau de proporção entre a gravidade do evento e o dano, não esquecendo as regras da boa prudência, do bom senso e da justa e criteriosa medida e ponderação das realidades da vida.</font>
</p><p><font>4ª - Para além do que antecede, deverá também relevar que para além do cariz ressarcitório, o cálculo indemnizatório deve assumir um cariz punitivo, podendo assumir-se como uma pena aplicada ao lesante com vista ao interesse do lesado por forma a uma efetiva compensação, que deverá ser significativa, de molde a reparar de algum modo os danos sofridos presentes e futuros e por outro lado, reprovar e castigar a conduta do agente. </font>
</p><p><font>5ª - De acordo com a matéria provada, as RR. agiram em franca irresponsabilidade e desconformidade com lei, agravado pelo facto de tal não lhe ser desconhecido em virtude i) R. Shindler ser uma entidade conservadora de elevadores e classificada como EMA; ii) R. Condomínio detentora das funções próprias da administração do condomínio, conhecedora das práticas associadas aos elevadores, sendo que pelo menos desde o ano de 2009, ambas sabiam das anomalias do ascensor e nada fizeram para o reparar o que agrava a sua conduta omissiva.</font>
</p><p><font>6ª - Discorda-se do douto tribunal ad quem, por i) não ter classificado o acidente como grave; ii) das justificações apresentadas para desagravar o acidente, iii) da redução da quantia indemnizatória a que as RR. foram condenadas. </font>
</p><p><font>7ª - Considera o recorrente que a redução de 10.000,00 euros face ao valor de condenação da l.ª instância foi manifestamente excessivo, sendo que o valor de 25.000,00 euros (relativamente ao qual também se inclui o âmbito do recurso) já por si era francamente diminuto face às lesões sofridas pelo autor em face do evento e que serão permanentes até ao fim da sua vida. </font>
</p><p><font>8ª - Existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em 1.ª instância e a efetuada em tribunal de recurso, esta reapreciação apenas baseada nas transcrições dos depoimentos. </font>
</p><p><font>9ª - Ora, a sensibilidade do julgador de l.ª instância à forma como a prova testemunhal e depoimento de parte se produz em audiência de julgamento e que se fundamenta num conhecimento direto das reações humanas e análise cuidada dos comportamentos físicos e psicológicos que traçam o perfil, ao caso do autor, só logra obter a concretização através do princípio da imediação. </font>
</p><p><font>10ª - Ainda que o recorrente discorde e tenha igualmente recorrido do valor indemnizatório aplicado pela 1.ª instância que quantificou os danos não patrimoniais em 25.000,00 euros, não se pode olvidar que foi este mesmo tribunal que de forma próxima lidou e apreciou diretamente os comportamentos do lesado, nomeadamente a sua oralidade, o seu manifesto desconforto físico e emocional ao longo das extensas sessões de julgamento, e que não são evidentemente visíveis ou sequer percetíveis de analisar pela transcrição do seu depoimento e no qual se baseou a 2.ª </font>
</p><p><font>instância. </font>
</p><p><font>11ª - Ainda que o tribunal de recurso não tenha alterado os factos assentes / provados que justificam a condenação das RR., o recorrente não se conforma que a 2.ª instância tenha desagravado o acidente, quando para mais manteve como matéria provada que em consequência direta do evento o autor: i) não pode realizar esforços por recomendação médica, designadamente carregar pesos, ii) tem um mal-estar permanente na zona cervical que lhe afeta o poder de concentração e bem-estar psicológico; iii) tem dores na coluna pela trepidação provocada pelo exercício da condução, o que lhe tem limitado as viagens, ou pela marcha em piso irregular; iv) tem dificuldade na execução das tarefas domésticas, como seja, lavar a loiça, aspirar, e fazer a cama; v) sofre de tristeza e abalo pela necessidade de parar para descansar, o que o impede de conviver socialmente, sentindo dificuldades até quando vai ao cinema, ou jantar fora, porque não consegue estar muito tempo na mesma posição; vi) tem dores na coluna se trabalhar ao computador; vii) vii) tem dificuldade em baixar-se, bem como, a fazer as simples tarefas do dia-a-dia, nomeadamente, vestir-se e calçar-se; viii) tem dificuldade em estar na mesma posição, seja de pé ou sentado; ix) tem dificuldade em adormecer por não arranjar uma posição confortável; x) sofre de formigueiros nas mãos e nos pés, que se agravam com esforços; xi) para além dos 14 dias de défice funcional temporário total (entre 18.07.2012 e 31.07.2012), sofreu um défice funcional temporário parcial (evolução das lesões em que passou a consentir algum grau de autonomia ainda que com limitações) de 494 dias, mais precisamente, entre 01.08.2012 e 07.12.2013; xii) entrou de baixa médica após o evento, como atestam o registo de remunerações do recorrente junto da segurança social, a fls. 538 a 540 e os certificados de incapacidade temporária a fls, 148 a 180. </font>
</p><p><font>12ª - Dizer ainda que no caso da culpabilidade do agente para cálculo da medida do quantitativo indemnizatório, até se poderia compreender a redução excessiva de 10.000,00 euros se às RR. fosse completamente desconhecida a necessidade urgente de reparação do elevador e se tivessem sido apanhadas de surpresa com as causas do acidente. </font>
</p><p><font>13ª - Todavia passou-se precisamente o contrário, por ter resultado provada a sua culpa por não terem realizado todas as providências e cautelas que lhes eram exigidas pela prevenção de um acidente que era premonitório, tendo a R. Shindler desconsiderado totalmente o Regulamento de Segurança de Elevadores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 513/70, de 30 de Outubro e alterado pelo Decreto Regulamentar n.º 13/80, de 16 de Maio. </font>
</p><p><font>14ª - A estas falhas acresce o facto de o elevador estar em atividade diária há 33 anos e nunca ter sido sujeito a inspeção periódica (que é obrigatória), sendo certo que pelo menos do ano de 1979 até ao ano 2012 deveriam ter sido realizadas 12 inspeções, vide alínea iv) do n.º I e n.º 3 do artigo 8.° do D.L n.º 320/2002, de 28 de Dezembro, o que não sucedeu, conforme consta do relatório da Câmara Municipal de Lisboa. </font>
</p><p><font>15ª - Por estes motivos, ao invés dos parcos 25.000,00 euros e como se não bastasse, da redução da indemnização, merecia uma condenação de "mão pesada", o facto de ter a R. Shindler, empresa aparentemente de excelência e alvo da confiança dos seus muitos clientes, ter desprezado com conhecimento de causa a necessidade urgente de manutenção e reparação do elevador, quando já havia detetado as anomalias e enviado ao R. Condomínio várias propostas que classificou como sendo de reparação urgente, sabendo os riscos que poderiam resultar para os utilizadores do elevador caso o mesmo não tosse reparado. </font>
</p><p><font>16ª - Nos quase 4 anos que mediaram o envio das propostas de reparação e o acidente, só não morreu ninguém por acaso. É que a falta de dispositivo de excesso de carga conjugado com a necessidade de uma intervenção na roda de gomes e afinação do freio para corrigir as paragens da cabine, é considerada uma falha de segurança como muito grave (como bem sustentou a 1.ª instância), assim como o facto de o R. Condomínio não ter dado a mínima importância às propostas de reparação enviadas em 2009, 2010 e 2011, razão pela qual a condenação das RR. deveria ser semelhante à gravidade da sua inércia e omissão, não se concordando porque motivo as RR. acabam por ser desresponsabilizadas e condenadas a pagar somente a quantia de 25.000,00 euros e posteriormente poupadas ao pagamento de 10.000,00 euros, o que não se enquadra no âmbito ressarcitório e compensatório que está consagrado nos artigos 494.° e 496.º n.º 3 do Código Civil. </font>
</p><p><font>17ª - Por outro lado, também de discorda da justificação apresentada pelo tribunal de 2.a instância para considerar o valor de 25.000,00 euros exagerado. </font>
</p><p><font>18ª - Salvo o devido respeito, o que deverá prevalecer não é o aparato do acidente (há acidentes com grande aparato cujos danos físicos são nenhuns), mas sim as lesões que o lesado sofreu em sua consequência, pois a este respeito, bem esclareceu o senhor perito BB que às vezes basta um mero tropeção num lancil do passeio ou um espirro mais violento, acompanhado de uma má posição da coluna, para provocar lesões como as descritas nos autos. Gravação áudio, duração 57'50 das 16: 10:45 às 17:08:36 (13 :38 às 14: 11). </font>
</p><p><font>19ª - Do mesmo modo, não faz qualquer sentido afirmar-se que a falta de gravidade do acidente justifica-se pelo facto de as pessoas que se encontravam no interior do elevador no momento do acidente não terem aparentemente sofrido mazelas. Acaso seguíssemos esta lógica, todas as pessoas que sofram acidentes em conjunto têm de ter o mesmo grau de lesões, pois caso contrário, não tendo a maioria dos sinistrados uma e/ou a mesma lesão, a pessoa que excecionalmente a sofrer ficará forçosamente prejudicada porque se parte do princípio que a sua lesão não pode ser grave. </font>
</p><p><font>20ª - Finalmente, o tribunal de 2.ª instância alega que as lesões sofridas pelo autor não são novidade porque já as sofria anteriormente e que as mesmas foram apenas agravadas. </font>
</p><p><font>21ª - Ora, conforme consta do relatório da perícia médico-legal não corresponde à verdade que as lesões do autor não são novidade, sendo na realidade novas lesões. </font>
</p><p><font>22. As lesões que resultaram do acidente ocorrido em 2010 situam-se no disco CS-6 e as que resultaram do acidente de 2012 situam-se no disco C4-S, ambas na coluna cervical, o que significa que a lesão foi sofrida em discos diferentes. </font>
</p><p><font>23ª - Por isso, para além de se tratar de lesões em discos diferentes, o facto de a nova lesão no disco C4-5 ter agravado os sintomas anteriores no disco C5-6, não pode ser razão válida para se considerar como exagerada a quantia indemnizatória de 25.000,00 euros e fundamento para ter-se como adequada ao caso uma redução de 10.000,00 euros.</font>
</p><p><font>24ª - A ser assim, todos os acidentes que à partida resultassem agravamentos de sintomas anteriores seriam por si só desvalorizados. </font>
</p><p><font>25ª - Também não se pode concordar com o entendimento de que as lesões que o autor sofre por força do acidente de Julho de 2012 possam ser classificadas como tendo "apenas" agravado as lesões anteriores, pois dos factos considerados provados é evidente que as mazelas são graves, permanentes e têm repercussões na sua vida profissional e pessoal, persistindo e se agravando com a idade por serem na cervical. </font>
</p><p><font>26ª - Não esquecer que pese embora o acidente de trabalho ocorrido em 2010, o autor levava uma vida pessoal, social e profissional absolutamente dentro dos parâmetros normais, estando inclusivamente dado como curado pelo médico /Dr. CC) que o acompanhou e operou em 2010, conforme bem refere o ponto 3 da página 3 do relatório da perícia médico-legal, sendo a i) nova lesão no disco C4-5 da coluna cervical e ii) o agravamento das lesões no disco C5-6, razões mais do que suficientes para justificar uma indemnização mais elevada que 25.000,00 euros. não sendo 15.000,00 euros uma verba razoável, justa e compensatória. </font>
</p><p><font>27ª - Por fim, julgamos pertinente reiterar que o ato de credibilização do tribunal de 1.ª instância terá sido sustentado pelos documentos clínicos, mas sobretudo pela apreciação mediata do estado de saúde do autor, que tendo estado presente em todas as sessões de julgamento e tendo prestado declarações de parte, pôde transmitir ao tribunal o grau das suas lesões sem estar amparado em documentos, até porque não se pode pretender que o estado de saúde físico e emocional de alguém seja única e tão só dependente de documentos e classificações tabelares, conforme fundamentou a 2.ª instância ao referir-se que o </font><i><font>quantum doloris</font></i><font> do recorrente. </font>
</p><p><font>28ª - Por conseguinte, sendo dano a diferença na vida quotidiana do autor no antes e depois do acidente, julgamos por um lado, não estar correto que os danos não patrimoniais sejam quantificados apenas em 25.000,00 euros e por outro, que o tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font> tenha manifestamente desvalorizado a livre apreciação da prova sustentada pelo tribunal </font><i><font>ad quo</font></i><font>, e depreciado que ao autor será doravante exigido suportar esforços suplementares para o resto da vida na sua atividade profissional que só por si requer esforços que já não poderá fazer, e que as sequelas provenientes do acidente irão prejudicar de forma permanente o seu dia-a-dia, matéria que ficou provada em sede de julgamento e que acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa manteve.</font>
</p><p><font>29ª - Sendo evidente que o autor nunca mais terá a mesma qualidade de vida (basta que nos imaginemos a sentir um mal-estar permanente, diário, do acordar ao deitar, na coluna), para se mostrar profundamente injusta, insuficiente e inadequada a indemnização de 25.000,00 euros e muito menos a de 15.000,00 euros, não sendo de forma alguma suficiente para que possa ser classificada como compensação prevista nos artigos 494.° e n.º 3 do 496.º, ambos do C. Civil que não foram aplicados em conformidade e coerência face ao factos provados. </font>
</p><p><font>Termos em que, se requer a pronúncia do Supremo Tribunal de Justiça sobre o presente recurso e a sua admissão, dando-lhe provimento e revogando-se o Acórdão Recorrido e substituindo-o por outro que reconheça ser </font>
</p><p><font>exequível e justa a fixação de uma indemnização por danos não patrimoniais não inferior a 45.000,00 euros, ordenando-se a condenação da Ré a pagar solidariamente com a Ré Condomínio e a Ré Zurich nos termos requeridos na Petição Inicial, assim se fazendo a costumada Justiça! </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><u><font>A ré Schindler contra-alegou</font></u><font>, pugnando pela improcedência da revista do autor.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>A ré Schindler interpôs revista excecional – a qual não foi admitida</font></u><font> pela Formação a que alude o nº 3 do artigo 672º do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>Perante o conteúdo das conclusões recursórias (do autor), enquanto delimitadoras do objeto da revista, a única questão de que cumpre conhecer tem a ver com a fixação do valor da indemnização relativa aos danos não patrimoniais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>É a seguinte a </font><b><font>factualidade dada como provada e não provada</font></b><font>:</font>
</p><p><u><font>Factos provados:</font></u>
</p><p><font>1. A Ré Schindler tem por objeto comercial a montagem de elevadores, reparações, conservação e assistência técnica, competindo-lhe proceder à assistência dos elevadores do Réu Condomínio através de um contrato de manutenção simples.</font>
</p><p><font>2. Em 18 de julho de 2012, a Ré Schindler, tinha a sua responsabilidade civil transferida para a Ré Zurich, emergente da respetiva atividade, na qualidade de entidade instaladora, conservadora e reparadora de elevadores, por contrato de seguro do ramo "Responsabilidade Civil Empresas", titulado pela Apólice n° ……, tendo sido contratado um capital seguro de €10.000.000,00 (dez milhões de euros).</font>
</p><p><font>3. Sendo aplicável uma franquia, a cargo da Ré Schindler no montante de €5.000,00 (cinco mil euros) por sinistro.</font>
</p><p><a></a><font>4. No âmbito da sua atividade profissional de empreiteiro, o Autor, AA, deslocou-se no dia 18 de Julho de 2012 ao …. andar do Edifício……, em Lisboa, pelas 21:20 horas, e, terminada a reunião com um cliente, entrou dentro de um dos elevadores aí existentes, o n° 1, instalado na morada mencionada e selecionou o piso zero (saída), entrando também, na mesma altura e no mesmo elevador, FF, GG e o marido Sr. HH.</font>
</p><p><font>5. O elevador admitia uma lotação máxima de quatro pessoas.</font>
</p><p><font>6. O ascensor desceu normalmente mas, em vez de parar no piso zero, ocorreu um deslizamento dos cabos sobre a roda de gomes da máquina de tração da instalação, vindo a embater sobre os amortecedores existentes no poço do elevador.</font>
</p><p><font>7. A velocidade nominal do elevador não foi ultrapassada, não tendo o paraquedas entrado em funcionamento, e o interior da cabine do elevador não ficou afectada, designadamente o espelho não se partiu.</font>
</p><p><font>8. Após o embate, as luzes da cabina do elevador apagaram-se, tendo o Autor e os restantes ocupantes ficado às escuras.</font>
</p><p><font>9. O Autor tentou acionar o alarme do elevador, mas a campainha não funcionou, pelo que telefonou ao seu filho que entrou em contacto com os Bombeiros Voluntários de ………… em ……, tendo sido chamada ao local a Polícia de Segurança Pública.</font>
</p><p><font>10. Os Bombeiros Voluntários …………… tiveram que abrir a porta do elevador para retirar o Autor e restantes ocupantes que se encontravam na cabine.</font>
</p><p><a></a><font>11. O elevador foi imobilizado por um funcionário da Ré Schindler no dia do evento, e foi solicitada uma inspeção à Câmara Municipal de …… pela Ré Schindler, tendo o ascensor sido selado pela edilidade que, no dia 25 de julho de 2012, realizou uma inspeção ao ascensor, tendo apurado as seguintes deficiências sintetizadas nas conclusões que se passam a transcrever: </font><br>
<i><font>“a) A instalação nunca foi objeto de inspeção periódica;</font></i><br>
<i><font>b) Verificou-se que o ascensor estava desligado e imobilizado, com a cabina apoiada sobre os amortecedores, no piso 0 (zero). A soleira da cabina estava a 420 mm abaixo da soleira do patamar; </font></i><br>
<i><font>c) Inexistência de chave de desencravamento das portas de patamar;</font></i><br>
<i><font>d) Na casa das máquinas/local das rodas não se encontram identificadas as máquinas relativamente aos elevadores;</font></i><br>
<i><font>e) Não existem instruções para o movimento manual da cabina afixadas na casa das máquinas;</font></i><br>
<i><font>f) Os cabos de suspensão não deslizam mais de 2 cm, com paragens no movimento de subida da cabina em vazio;</font></i><br>
<i><font>g) Verificou-se com uma carga de 320 kg na cabina, o deslizamento de cerca de 25 cm dos cabos sobre a roda de gomes;</font></i><br>
<i><font>h) Os amortecedores da cabina e do contrapeso, instalados no poço, encontravam-se inoperacionais, dada a inexistência de molas no conjunto;</font></i><br>
<i><font>i) O dispositivo de controlo de excesso de carga encontrava-se inoperacional, concluindo a inspeção que enquanto não fossem avaliadas as condições de segurança e instalação, através da realização de uma inspeção periódica, o ascensor não poderia voltar a funcionar e que a causa que originou a descida da cabina aos amortecedores foi devido a um excessivo deslizamento entre os cabos de suspensão e a roda de gomes da máquina de tração da instalação”</font></i><font>.</font><br>
<font>12. A Ré Schindler fez diversas propostas de reparação dos ascensores ao Réu Condomínio que este não lhe adjudicou até à data do evento, a saber:</font><br>
<font>a) em </font><u><font>3 de Setembro de 2009.</font></u><font> instalação de balança de carga;</font><br>
<font>b) em </font><u><font>17 de Marco de 2010.</font></u><font> instalação de dispositivo de paragem, instalação de relê para deteção de falha para proteção de máquina de tração, fornecimento e montagem de disjuntores no quadro de comando do elevador, de nova fechadura da casa das máquinas, beneficiação de iluminação elétrica;</font><br>
<font>c) em </font><u><font>22 de Novembro de 2010.</font></u><font> fornecimento e montagem de ferragens junto à roda de gomes para impedir que os cabos saltem, afinação do freio da máquina para corrigir paragem da cabine, de forma a que a diferença de nível entre a soleira da cabine e soleira da porta não exceda os 5cm , fornecimento e instalação de dispositivo de excesso de carga;</font><br>
<font>d) em </font><u><font>Fevereiro de 2011</font></u><font>. substituição do atual cabo elétrico de manobra do comando.</font><br>
<font>13. O Autor foi assistido no local pelo INEM que o encaminhou para o Hospital de …………, em …….., e ainda no local do acidente e no decorrer da assistência médica, foi colocada ao Autor uma proteção para a coluna vertebral.</font><br>
<font>14. O Autor deu entrada nas urgências do Hospital de ………., pelas 22.06 horas, queixando-se de dores na coluna e lombares (dorso lombalgia), ausência de sensibilidade dos membros inferiores (parestesias) e enjoos, tendo ficado internado em observação.</font><br>
<font>15. O Autor durante o período de internamento realizou diversos exames, nomeadamente RX ao tórax, tornozelo, calcanhar, coluna vertebral, bacia, TAC cervical e análises ao sangue.</font><br>
<font>16. O Autor teve alta hospitalar no dia seguinte, tendo-lhe sido prescrito Metamizol magnésio, 575 mg, cápsula, que aviou no dia seguinte, mas, algumas horas depois, o Autor começou a sentir um formigueiro e perda de movimentos nos membros inferiores, tendo recorrido à urgência do Hospital dos ………, no dia 20.07.2012, onde foi assistido pelo médico Neurologista Dr. DD, tendo-lhe sido diagnosticado um traumatismo vértebra medular.</font><br>
<font>17. O Autor voltou a fazer novos exames, nomeadamente Ressonância Magnética Cervical, tendo-lhe sido prescritos diversos medicamentos e tratamentos.</font><br>
<font>18. O Autor padecia de dano na coluna cervical prévio ao evento cm apreço, resultante de acidente de trabalho ocorrido em 2010, tendo o evento descrito agravado os sintomas anteriores.</font><br>
<font>19. A data da consolidação médico-legal das lesões decorrentes do evento em apreço foi fixada em 07.12.2013.</font><br>
<font>20. O Autor sofreu um défice funcional temporário total (período de repouso e/ou internamento absoluto) de 14 dias entre 18.07.2012 e 31.07.2012.</font><br>
<font>21. O Autor sofreu um défice funcional temporário parcial (evolução das lesões em que passou a consentir algum grau de autonomia ainda que com limitações) de 494 dias entre 01.08.2012 e 07.12.2013.</font><br>
<font>22. Os danos sofridos tiveram repercussão na sua atividade profissional, tendo o Autor ficado incapacitado para a sua profissão de forma total no período situado entre 18.07.2012 e 18.01.2013, num período total de 185 dias, tendo a partir desta data passado a consentir algum grau de autonomia, ainda que com limitações, entre 19.01.2013 e 07.12.2013, num período total de 323 dias.</font><br>
<font>23. Foi-lhe fixado um </font><i><font>quantum doloris</font></i><font>, sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo Autor entre a data do evento e a consolidação das lesões, no grau 3/7, atendendo aos fenómenos álgicos das lesões em fase aguda, sem necessidade de tratamento cirúrgico.</font><br>
<font>24. Foi-lhe fixado um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, referente à afetação definitiva da integridade física e psíquica do Autor, com repercussão nas atividades da via diária, incluindo as familiares e sociais, independentes das atividades profissionais, em 3 pontos num total de 100.</font><br>
<font>25. As sequelas do Autor são compatíveis com o exercício da sua atividade habitual, mas implicam esforços suplementares.</font><br>
<font>26. Foi-lhe fixado um dano estético permanente no grau 1/7, tendo em conta as cicatrizes a nível cervical, visíveis apenas a uma distância de contacto íntimo.</font><br>
<font>27. Como consequência direta do evento, o Autor despendeu as seguintes quantias em consultas, despesas médicas e medicamentosas:</font><br>
<font>- Despesa hospitalar Hospital de ……. - 19-07-2012: € 50,00;</font><br>
<font>- Despesa hospitalar Hospital dos ………- 20-07-2012: € 520,85;</font><br>
<font>- Despesa farmácia - 20-07-2012: € 13,40;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……- 02-08-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….- 27-09-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ………- 03-10-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….-15-10-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Prof. Dra. EE - 17-10-2012: € 14,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……- 31-10-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….-19-11-2012: € 5,00;</font><br>
<font>- Ressonância Magnética Hospital dos …….- 21-11-2012: € 350,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….-14-12-2012: € 5,00; </font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de …………-16-01-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Hospital dos ………../ tratamentos - 23-01-2013: € 104,03;</font><br>
<font>- Despesa farmácia - 23-01-2013: € 20,49;</font><br>
<font>- Despesa farmácia - 26-01-2013: € 6,45;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ………..- 11-03-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Despesa farmácia- 22-03-2013: € 20,83;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….- 06-05-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de S. …….- 10-05-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……- 17-06-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Despesa farmácia - 20-06-2013: € 38,93;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de …….. - 08-07-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Despesa farmácia- 08-07-2013: € 37,10;</font><br>
<font>- Consulta Hospital dos ……… - 23-07-2013: € 90,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ……….- 07-08-2013: € 5,00; </font><br>
<font>- Despesa farmácia- 14-08-2013: € 30,11;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de …….. - 12-09-2013: € 5,00;</font><br>
<font>- Consulta Centro de Saúde de ………- 17-09-20 | [0 0 0 ... 0 0 0] |
FDJsu4YBgYBz1XKvmAbC | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<p><b><font>AA</font></b><font> instaurou ação declarativa comum contra </font><b><font>“Associação</font></b><font> </font><b><font>Conceição</font></b><font> </font><b><font>e Manuel</font></b><font> </font><b><font>Soares</font></b><font>”, </font><b><font>BB</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>CC</font></b><font>, pedindo:</font><br>
</p><p><font>a) A declaração de falsidade da procuração de … .03.2014, no seu conjunto, porquanto é falso o termo de autenticação lavrado pela 3ª ré/solicitadora CC, por nada do que dele consta se ter verificado ou corresponder à verdade.</font><br>
</p><p><font>b) A declaração da invalidade e ineficácia da procuração.</font><br>
</p><p><font>c) A declaração, consequentemente, de invalidade e de ineficácia da doação lavrada com base numa procuração falsa, o que nos termos do art. 268º C. Civil consubstancia representação sem poderes, o que implica a ineficácia do contrato de doação em relação ao A., por configurar uma doação de bens alheios.</font>
</p><p><font>d) A restituição da ré Associação ao autor dos bens imóveis identificados no art. 7º da p. i., nos termos do art. 289º C. Civil, ou, se a restituição em espécie não for possível por a ré ter alienado entretanto os bens, o pagamento ao autor do valor correspondente.</font>
</p><p><font>e) O cancelamento dos registos de aquisição a favor da ré/Associação em sequência do contrato de doação inválido e ineficaz.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Alegou para o efeito e em resumo que, pretendendo ceder gratuitamente os seus imóveis para as pessoas carenciadas.…. (através de comodato, usufruto) e doar dinheiro para a construção de um lar, por si controlado, o réu BB e os membros da direção da Associação deturparam o seu projeto, forjaram uma procuração falsa, constituíram a Associação e procederam à ilícita e dolosa doação dos seus imóveis em favor da 1ª ré (sem uma cláusula de reversão no contrato de doação dos imóveis) e ainda lhe exigiram 600.000 US Dólares, mesmo depois de descobertos os atos ilícitos e dolosos praticados.</font>
</p><p><font>Alegou que a procuração outorgada por si, datada de … de março de 2014, é falsa, por ser falso o termo de autenticação da mesma, porquanto declara terem-se passado na presença da 3ª ré factos que não se verificaram ou não foram praticados ou não ocorreram, que a falsidade do “</font><i><font>termo</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>autenticação</font></i><font>” lavrado pela solicitadora/3ª ré invalida o texto da declaração negocial denominada “</font><i><font>procuração</font></i><font>” e, consequentemente, a mesma enquanto procuração, porquanto não foi cumprida a forma legal (formalidade “</font><i><font>ad</font></i><font> </font><i><font>substanciam</font></i><font>”), exigida para a validade do negócio jurídico, nos termos dos arts. 262º/2, </font><i><font>ex</font></i><font> </font><i><font>vi</font></i><font> do art. 220º C. Civil, ferindo-a de nulidade, e sendo nula a procuração em que se atribuem ao BB poderes de representação para a celebração do contrato de doação dos imóveis a favor da Associação/ré, aplica-se consequentemente ao ato de doação o regime estabelecido no art. 268º C. Civil para a representação sem poderes, implicando a ineficácia/nulidade do negócio (contrato de doação) em relação ao autor, que nunca quis o mesmo e consequentemente nunca o ratificou e que a doação operada consubstancia uma doação de bem alheio.</font>
</p><p><font>Mais alega que, sendo o contrato de doação nulo e ineficaz, deve ser restituído, nos termos do art. 289º C. Civil, tudo o que tiver sido prestado, ordenando-se assim a restituição pela 1ª ré dos imóveis ao património do autor e o cancelamento dos registos a favor da Associação/ré.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na contestação que apresentaram, a ré Associação e o réu BB, invocaram a caducidade do direito invocado pelo autor, o abuso de direito e defenderam-se por impugnação.</font>
</p><p><font>A ré CC apresentou contestação na qual se defendeu por impugnação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Prosseguindo os autos e realizada a audiência de julgamento, foi proferida </font><b><font>sentença</font></b><font>, na qual se decidiu </font><i><font>julgar a ação improcedente, sendo os réus absolvidos dos pedidos.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de apelação do autor, </font><b><font>a Relação …</font></b><font>, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, </font><i><font>confirmou a decisão da 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Inconformado, </font><b><u><font>interpôs o autor/apelante recurso de revista excecional</font></u></b><font> (que veio a ser admitido pela Formação a que alude o nº 3 do artigo 672º do CPC), no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>- O presente recurso de Revista vem do Acórdão da Relação …., que confirmou a Sentença da primeira instância, a qual julgou improcedente a ação por ter julgado procedente a exceção de abuso de direito.</font><br>
</p><p><font>Pedia o A.:</font><br>
</p><p><font>a) A declaração de falsidade da procuração de … .03.2014, no seu conjunto, porquanto é falso o termo de autenticação lavrado pela terceira Ré/Solicitadora CC, por nada do que dele consta se ter verificado ou corresponder à verdade, conforme arts. 69 a 84 da p.i.;</font><br>
</p><p><font>b) A declaração da invalidade e ineficácia da procuração em relação ao A.;</font><br>
</p><p><font>c) A declaração da invalidade e ineficácia da doação lavrada com base na procuração falsa, o que nos termos do art. 268º do Código Civil, consubstancia representação sem poderes, o que implica a ineficácia do contrato de doação em relação ao A., por configurar uma doação de bens alheios;</font><br>
</p><p><font>d) A restituição ao A. dos bens imóveis identificados no art. 7 da p.i., nos termos do art. 289º do Código Civil, ou, se a restituição em espécie não for possível por a Ré/Associação ter alienado entretanto os bens, o pagamento ao A. do valor correspondente;</font><br>
</p><p><font>e) O cancelamento dos registos de aquisição a favor da Ré/Associação, em consequência do contrato de doação inválido e ineficaz.</font><br>
</p><p><font>Entendeu o Acórdão recorrido:</font><br>
</p><p><i><font>“considerar ilegítima a arguição pelo A. da invalidade da procuração para doação (por falsidade do seu termo de autenticação) e da ineficácia do acto de doação, por violação dos limites da boa-fé, nas modalidades de venire contra factum proprium e de lesão das expectativas de confiança, criada na contraparte e na comunidade de freguesias …… em geral ….” </font></i><font>uma vez que </font><i><font>“... é manifestamente ilegítimo o direito do A. arguir e obter o reconhecimento: da invalidade da procuração, por a mesma não ser autenticada, por falsidade do termo de autenticação, quando a mesma foi por si efectivamente subscrita e teve consciência que a falta de autenticação geraria a invalidade; da ineficácia da doação dos imóveis, com a subsequente restituição dos bens doados no acto de doação, por falta de poderes válidos do procurador, por si efectivamente mandatado em procuração nula por falta de forma, quando pretendeu doar os imóveis, gerou a constituição da donatária/contraparte, a actividade consumada desta de terceiros, a aceitação da doação em acto público e autenticado e a tomada de posse dos prédios.”</font></i><font> (sic).</font><br>
</p><p><font>Concluiu assim pela improcedência da apelação, mantendo a Sentença recorrida.</font><br>
</p><p><font>I. O Recorrente não se pode conformar que a falsidade de uma procuração contendo um termo de autenticação falso, aliás reconhecida pelo Acórdão recorrido, a fls. 38 (2º parágrafo) do mesmo, considerando que os factos provados (1.31 a 1.37) “são suficientes para a integração da falsidade do termo de autenticação, nos termos do art. 372º do C. Civil, ex-vi do art. 376º/1 do C. Civil, por terem sido atestados pela solicitadora Ré factos por si não observados nem verificados”; e ainda a fls. 43 (ponto 2.2.2.) a fls. 44 (2º parágrafo) do mesmo - possa ser afastada pela figura do abuso de direito, residual/subsidiária, mera válvula de segurança do ordenamento jurídico.</font><br>
</p><p><font>II. A ação deveria ter sido julgada procedente, declarando-se a falsidade da procuração no seu conjunto (fls.15, 33 e 113) por ser falso o termo de autenticação lavrado pela 3ª Ré/Solicitadora, CC (“pois nada do que dele consta se passou na realidade”), uma vez que foram dados por provados pela Relação os factos fixados sob os números 1.31 a 1.37 da Sentença. Não tendo estado o A. presente no ato de autenticação da procuração, ao contrário do que refere o “termo”, não teve direta intervenção no mesmo. </font><br>
</p><p><font>Entendeu porém a Relação que o abuso de direito sanava tal falsidade.</font><br>
</p><p><font>III. A falsidade da procuração (art.372º/2 CC) determina a sua nulidade, pois que o termo de autenticação não é uma mera formalidade </font><i><font>ad probationem,</font></i><font> mas antes uma formalidade </font><i><font>ad substantiam</font></i><font>, não podendo o regime das nulidades que dela decorre ser afastado por um eventual abuso de direito (cfr. cit. BMJ nº 482).</font><br>
</p><p><font>IV. Os factos transcritos no corpo da presente alegação, nos pontos 3. (factos provados), 4. (não provados) e 5. (aditados), que aqui se dão por integralmente reproduzidos, salvo o devido respeito, não configuram abuso de direito, e muito menos têm a virtualidade de afastar uma nulidade resultante de um vício (falsificação) que se destina a proteger valores de interesse e ordem pública que visam defender a certeza e a segurança do comércio em geral e do tráfego jurídico, mormente o imobiliário, pelo que nunca aquele instituto poderia excluir uma nulidade decorrente da falsificação verificada nestes autos.</font><br>
</p><p><font>V. Está assente pelas Instâncias a matéria de facto indicada no anterior IV. sobre a qual se vai discorrer, penitenciando-se o Recorrente por transcrever o que está no corpo das alegações, uma vez que já ali se trata de uma síntese. Podia ter-se optado por remeter V. Exas para 6. das alegações, onde se procura demonstrar que o alegado </font><i><font>factum proprium</font></i><font> não foi de molde a criar nos Recorridos uma situação objetiva de confiança.</font><br>
</p><p><font>Refira-se então que:</font><br>
</p><p><font>O A. nasceu na casa de família, .… (……), em 1950; nessa casa de seus antepassados (pais, avós e bisavós) viveu até emigrar para os …. em 1971 (com a idade de 20 anos), ali se radicando definitivamente, obtendo a cidadania, trabalhando até se reformar e casando. Veio a Portugal pela última vez em 1998, aquando da morte de sua mãe.</font><br>
</p><p><font>Em … .05.2014 era proprietário da casa .…. e terreno que herdou, prédios identificados em 1.7 (cfr. 1.1 a 1.7 da matéria de facto provada).</font><br>
</p><p><font>“O A. a determinada altura teve a ideia de dar um destino social à casa de família, pretendendo acolher gratuitamente pessoas necessitadas, “o que inicialmente pensou fazer em favor das pessoas ……, ideia que depois foi adaptando para a construção de um lar de idosos, com possibilidade de beneficiar população de outras freguesias, ….” (cfr. 1.8 e seu aditamento).</font><br>
</p><p><font>Tinha ainda a intenção de dispor de 600 mil dólares para as necessárias obras a realizar na sua casa, em ordem ao referido objetivo.</font><br>
</p><p><font>Em 2013, o A. manifestou essa vontade à sua amiga de infância (DD), a qual por sua vez sugeriu contactar outra pessoa da freguesia, muito ativa e indicada para o efeito (BB) (cfr. 1.9 e 1.10). Sucede que o A. até 2015 teve como único interlocutor o BB; tendo sido este que passou palavra aos demais autarcas e ao jornal “…..”, assim se tornando público, não o projeto que o A. lhe transmitira para a sua casa …., mas aquilo que o BB (…… da CM…) engendrou e pôs em marcha, para um projeto megalómano, envolvendo seis freguesias, fora da sua casa. </font><br>
</p><p><font>Cfr. 7ª página da Motivação da Sentença, onde expressamente refere que o EE: “falou duas vezes com o A. ao telefone quando o BB deixou de falar com o A.”</font><br>
</p><p><font>E a 4ª página daquela Motivação, onde refere que o FF </font><i><font>“referiu que não conhece o A., apenas tendo falado com o mesmo uma vez por telefone, talvez em 2016. Soube pelo co-réu BB da doação da casa e do dinheiro por parte do A. ….”.</font></i><br>
</p><p><font>Não obstante assim ser e terem sido ambos ouvidos em depoimento de parte, a Sentença chama-lhes testemunhas e valoriza como tais os depoimentos.</font><br>
</p><p><font>E é assim que a Sentença e o Acórdão dão como provados o excerto que segue em itálico:</font><br>
</p><p><font>“O A.: manifestou desde as primeiras conversas com a DD e o R. BB a vontade de ser consultado em todas as operações atinentes ao fim em vista, “o mesmo tendo dito ao ….. Junta de Freguesia na altura (EE), entre outros; quis conhecer o projeto de edificação do Lar de Idosos que conheceu; em determinada altura não apurada manifestou à sua irmã que queria que a doação do dinheiro referida em 1.9 fosse feita através de pagamentos da obra de construção do Lar, à medida que esta fosse feita, e fosse sendo por si aprovada, após autorização sua e mediante transferência de dinheiro que depositara na conta bancária da referida irmã.”, tinha preocupação quanto às questões do caminho de acesso à propriedade, por ser estreito (e não passar nele, por exemplo, uma ambulância) e a do saneamento e salubridade da mesma, entendendo que tais obras deveriam ficar a cargo de entidades externas, nomeadamente o Município e a Junta de Freguesia, pontos de que fazia questão, pelo menos após o final de 2015” (cfr.1.11 e seu aditamento).</font><br>
</p><p><font>Diga-se a título de comentário que estas exigências do Recorrente, prévias ao início da obra (inexistente) não foram cumpridas até à presente data, encontrando-se pelo contrário, os prédios (casa e terreno) cobertos de mato, por outras palavras, nenhuma obra foi feita (1.44 e 1.45), como se pode verificar no local.</font><br>
</p><p><font>Da mesma forma se diga que o projeto mostrado pela Associação ao Recorrente não era um projeto para a sua casa, razão pela qual não consentiu nem autorizou o mesmo - cfr. nos Docs. de fls.159/243, o email de … .12.2014 – reproduzido em letra quase ilegível - com a epígrafe “……”, documento este que começa por dizer, em palavras do BB: “Finalmente consegui um bocado de tempo para te mandar as imagens da casa”, e anexa fotografias em miniatura de uma maquete que nada tem a ver com a casa.</font><br>
</p><p><font>Como dito, foi no Verão de 2013 que o Recorrente contactou a DD e de seguida o BB, com vista a pôr em prática a ideia que tinha para a sua casa.</font><br>
</p><p><font>Em Outubro e Novembro de 2013, o BB começou a fazer diligências supostamente para concretizar a vontade do Recte quanto à sua casa …. - (cfr. Docs.de fls159/243), respetivamente de 31.10.2013 (Anexo 2), 7.11.2013 (Anexo 3) e 8.11.2013 (Anexo 5), juntos no instante final da audiência de julgamento, depois de concluída a produção de prova, num conjunto desordenado e sem critério - que nada tinham a ver com o projeto para a casa do A., assim desvirtuando a vontade deste.</font><br>
</p><p><font>Antes visava a Associação a construção de um Lar de raiz com 45 quartos e depois 200 (cfr.1.17), sem qualquer cabimento, na relativamente exígua casa do Recte. (com 230 m2), sem qualquer capacidade para tal (cfr.Doc.fls.23, com data de 15.1.2016). Foram assim anexados diversos terrenos ao do Recte, sem seu conhecimento, perfazendo uma área de 26.745,00 m2, para o Lar que contaria com: “salas, refeitórios, cozinha, copas, lavandaria, etc., contaria ainda com ginásio, com tanque hidroterapêutico, com balneários masculinos e femininos, salas de banho geriátrico, macas banheiros, gabinete de enfermagem, casa das máquinas, lavandaria, biblioteca, duas capelas, pátios ajardinados, entre outras coisas mais”(1.18).</font><br>
</p><p><font>O Recte só falou com a DD que o endossou para o BB, desligando-se de imediato. Passou a falar exclusivamente com o BB (…… CM…. – cfr. ata nº 20/2014, de fls.172) e, já em final de 2015, quando já não falavam os dois, falou ainda com o EE (uma vez) e com o FF (uma vez), quando estes, sem que o conhecessem, lhe telefonaram.</font><br>
</p><p><font>Permita-se ainda o desabafo que, apesar de provado que o Recte falou de início também com o EE (….. Junta Freguesia …), a verdade é que, do depoimento de parte do mesmo, confessado, gravado e transcrito, resulta que só falaram depois do BB sair de cena, em finais de 2015 (cfr.Doc.de fls.27/Vº e 28, transcritos em 1.24).</font><br>
</p><p><font>Notem-se no documento as referências à data de 14.09.2015, no início, e ao EE (EE), no final.</font><br>
</p><p><font>A mesma situação se passa com o FF, que no depoimento de parte, gravado e transcrito, confessou só ter falado com o A. em finais de 2015 ou mesmo em 2016.</font><br>
</p><p><font>A entrada em cena do EE e do FF ocorre assim só após a comunicação constante da fotomontagem do BB (fls.27/Vº e 28) no qual diz: “da última vez que o contactei 14/09/2015 ….”</font><br>
</p><p><font>Foi também após essa data que o Dr. GG foi a …., confirmando as desconfianças do A. de que fora desapossado dos imóveis, o que aconteceu através da doação.</font><br>
</p><p><font>O EE e o FF apenas sabiam o que o BB lhes dizia, isto até finais de 2015, pelo que sendo até então o BB o único interlocutor, como podia o Recte, nos …, formar uma opinião pública em …….? Só podia ter sido o BB a formar a opinião pública.</font><br>
</p><p><font>Opinião pública que resultou “publicada” nos artigos do jornal local “.…..”, como ainda em 23.06.2020 uma vez mais aconteceu, com a notícia acompanhada da fotografia do BB, não certamente pela voz do Recorrente (cfr.Doc. 1, ora junto, e Docs. de fls. 28/vº a 31/vº).</font><br>
</p><p><font>VI. Nada podia assim levar os RR a criarem uma expectativa segura e idónea que lhes permitisse levar a cabo um projeto numa área de 26.745,00 m2 (cfr.cit.Doc. fls.23 a fls 24/vº), muito superior à área da casa do Recte com 230 m2 (cfr.Docs.fls.12 e 13/vº), investindo numa confiança que, objetivamente, lhes não foi por ele criada.</font><br>
</p><p><font>Como nunca houve entendimento entre as partes, nunca se criou uma situação objetiva de confiança como a descrita em 1.16, 1.17 e 1.18. Pelo contrário: definitivamente incompatibilizados o Recorrente e o BB, em 14.9.2015 (cfr.1.20, 1.21,1.23 e Doc.fls.27/vº e 28), o que levou os Recorridos a investir nessa suposta confiança, a ponto de levarem por diante um projeto fora da casa do Recte?</font><br>
</p><p><font>Só podem ter atuado, uma vez mais, de má-fé, tentando pôr aquele perante um facto consumado. Quando muito podia enquadrar a norma do art. 227º CC.</font><br>
</p><p><font>Resulta do exposto que não se verificaram no caso dos autos os pressupostos do abuso de direito, pelo que deverão V.Exas julgar improcedente a exceção, revogando o acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font>Afastada a exceção, e retomando o que se disse em 1. e 2.:</font><br>
</p><p><font>VII. Forçoso é concluir que a procuração falsificada dos autos (art.372º/2 CC) tem de ser havida por inexistente/inválida, uma vez que lhe falta o termo de autenticação (formalidade essencial ad substanciam) (1.31 a 1.37), vício genético que a atinge e paralisa os efeitos, precisamente porque a lei não quer que do negócio nulo resultem efeitos (Ac. STJ, de 15.12.98, BMJ Nº 482, págs. 27 e segs., na pág. 234 e Ac. STJ, de 17.01.02, CJ, X, T.1, págs. 48 e segs.). Encontrando-se consequentemente o Réu BB desprovido de poderes de representação, contaminando tal vício a validade e eficácia da doação subsequente, deverá esta considerar-se ineficaz em relação ao Recorrente.</font><br>
</p><p><font>A figura do abuso de direito, residual/subsidiária (válvula de segurança do ordenamento jurídico) não pode validar uma nulidade decorrente de uma procuração falsa, por evidente perturbação e alarme social, impedindo a segurança do comércio em geral e do tráfico jurídico, nomeadamente no tocante à certeza da propriedade imobiliária, face à reconhecida falibilidade da prova testemunhal, abrindo-se uma autêntica “caixa de Pandora”.</font><br>
</p><p><font>VIII. A presente Revista tem por fundamento a violação, pelas instâncias, da norma do artigo 334º do Código Civil, por erro de interpretação e de aplicação, ao entenderem que o abuso de direito sana a nulidade decorrente da falsidade contida na procuração dos autos, e aplicando ainda, indevidamente, ao caso concreto o próprio abuso de direito; foram assim desprezadas as normas imperativas dos artigos 220º, 262º/2, 268º/1, 286º, 294º, 363º/3, 364º/1, 372º/2 e 289º/1, todos do CC.</font><br>
</p><p><font>Nestes termos e nos mais de direito, deverão V. Exas conceder provimento ao presente recurso de Revista e, em consequência, revogar o Acórdão recorrido, julgando procedente a ação e condenando-se os Recorridos nos pedidos formulados na p.i. e reproduzidos no início das presentes alegações.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Os réus/recorridos contra-alegaram, pugnando pela improcedência da revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Ema face do teor das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, a questão de que cumpre conhecer consiste em saber se existe abuso de direito na invocação, pelo autor ora recorrente, da invalidade da procuração e da doação.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>É a seguinte a </font><b><font>factualidade dada como provada e como não provada</font></b><font> pelas instâncias:</font>
</p><p><u><font>Factos provados:</font></u>
</p><p><font>1. O A. nasceu em ……1950, na casa da família, no lugar …, freguesia ….., concelho …...</font>
</p><p><font>2. Na casa de seus pais, avós e bisavós, viveu com os pais e irmãos, frequentou a escola primária da freguesia, a catequese na Igreja da localidade, ali passou a sua infância e juventude, fazendo as suas amizades.</font><br>
</p><p><font>3. Em 1971, com 20 anos de idade, menor naquele tempo, autorizado por seus pais, emigrou para os …., onde se fixou em definitivo até ao tempo presente, adquirindo a nacionalidade americana em 1977, vivendo atualmente em ….., …...</font>
</p><p><font>4. Radicou-se nos …., aí tendo organizado a sua vida doméstica, social e profissional, ali trabalhou, casou e reformou-se.</font>
</p><p><font>5. Desde então veio a Portugal e a …. apenas em 1980, 1981, 1986 ou 1987, 1989 ou 1990 e em 1998, pela última vez, aquando da morte da sua mãe.</font>
</p><p><font>6. Em ….. e no lugar ….., na mencionada casa de família que veio a herdar, viveram e morreram seus pais, avós e bisavós, encontrando-se sepultados na freguesia de …….</font>
</p><p><font>7. O A. era, em … de Maio de 2014, proprietário de dois imóveis em Portugal – que constituíam a mencionada casa de família – em ….., herdados de seus referidos pais, a saber:</font>
</p><p><font>a) prédio urbano composto de casa de habitação, dependência, quinteiro e rossio inculto, situado no lugar …., freguesia….., concelho…., com a área d 1.430 metros quadrados, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de ….. sob o nº ….., aí registado a favor do A., pela inscrição/apresentação nº 3 de 30 de Maio de 1989 – a mencionada casa de família (Docs. 1 e 2, de que se juntam cópias, protestando-se juntar certidões);</font>
</p><p><font>b) Prédio rústico composto de terreno de pinhal, situado no lugar …., freguesia ….., concelho …., com a área de 14.369 metros quadrados, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo … (correspondente ao artigo … da antiga matriz), descrito na Conservatória do registo Predial …., sob o nº .., registado a favor do A. pela inscrição/apresentação nº …, de 30 de Maio de 1989 – docs. de fls. 12 a 14 vº.. 1.8. O A. a determinada altura teve a ideia de dar um destino social à casa de família, pretendendo acolher gratuitamente pessoas necessitadas.</font>
</p><p><font>8. O A. a determinada altura teve a ideia de dar um destino social à casa de família, pretendendo acolher gratuitamente pessoas necessitadas,</font><i><font> o que inicialmente pensou fazer em favor das pessoas…., ideia que depois se foi adaptando para a construção de um lar de idosos, com possibilidade de beneficiar população de outras freguesias…. </font></i><font>(salientado a itálico adicionado pela Relação).</font>
</p><p><font>9. O A. tinha ainda a intenção de dispor da quantia de 600.000 US Dólares (Seiscentos mil dólares americanos), para as necessárias obras a realizar nos prédios em ordem ao referido objetivo.</font><br>
</p><p><font>10. Em 2013, o A. manifestou essa sua vontade a uma pessoa amiga da freguesia ….. (D. DD), sua conhecida de infância, a qual, por sua vez, sugeriu contactar outra pessoa da freguesia (BB, o 2º R.), por ser uma pessoa muita ativa e indicada para o efeito, ao que o A. anuiu.</font>
</p><p><font>11. O A. manifestou desde as primeiras conversas com a DD e o R./BB, a vontade de ser consultado em todas as operações atinentes ao fim em vista, o mesmo tendo dito ao ….. Junta de Freguesia na altura (EE), entre outros; </font><i><font>quis conhecer o projeto de edificação do Lar de idosos, que conheceu; em determinada altura não apurada manifestou à sua irmã que queria que a doação do dinheiro referida em 1.9. fosse feita através de pagamentos da obra de construção do Lar, à medida que esta fosse feita e fosse sendo por si aprovada, após autorização sua e mediante transferência de dinheiro que depositara na conta bancária da referida irmã: tinha preocupação quanto às questões do caminho de acesso à propriedade, por ser estreito (e não passar nele, por exemplo, uma ambulância) e a do saneamento e salubridade da mesma, entendendo que tais obras deveriam ficar a cargo de entidades externas, nomeadamente Município e a Junta de Freguesia, pontos de que fazia questão, pelo menos após o final de 2015 </font></i><font>(salientado a itálico adicionado pela Relação). </font>
</p><p><font>12. O R. BB enviou ao A., no início de 2014, um documento denominado “</font><i><font>Procuração”</font></i><font>, pedindo a assinatura do A. e que o devolvesse, como fez (Doc.5 junto com a p.i. a fls. 15), e conforme lhe foi pedido, à Solicitadora CC/3ª Ré, em …., pessoa que o A. não conhecia.</font>
</p><p><font>13. O A. assinou tal documento – Procuração - e devolveu-o nos termos descritos em 1.12. 1.14. Simultaneamente, no início de 2014, o R. BB, juntamente com EE e FF puseram em marcha diligências para a constituição de uma Associação, designadamente obtendo o número de pessoa coletiva, redigindo os estatutos, escolhendo o local da sede na casa do A., etc.</font>
</p><p><font>15. O BB contratou para o efeito a referida Solicitadora CC/3ª Ré, tendo constituído a Associação, no Cartório Notarial…, em 28 de Março de 2014, com a denominação de “</font><i><font>Associação</font></i><font> </font><i><font>Conceição</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>Manuel</font></i><font> </font><i><font>Soares</font></i><font>, sendo membros fundadores da mesma BB, EE e FF (cf. doc.7 de fls. 15 vº a 22).</font>
</p><p><font>16. A Associação, tendo como Presidente da Direção o R. BB, avançou com um pedido de licenciamento de obras na CM ….., em 2015 (Processo nº 28/15), para construção de uma Estrutura Residencial para Pessoas Idosas, para uma capacidade de 64 utentes, no terreno do A. e outros (documentos 8 e 9 juntos com a p.i., fls. 22 vº a 26), tendo sido apresentado na CM projeto de arquitetura e de especialidades e contratado para o efeito um arquiteto.</font>
</p><p><font>17. Também foram desenvolvidas diligências junto do Instituto de Segurança Social ….., com vista à aprovação e legalização do projeto de um lar de raiz, e bem assim junto da Unidade de Saúde Pública …., com o mesmo propósito (doc. 10 junto com a p.i., fls. 26 vº e ss) a fim de construir um lar de raiz, começando com 45 quartos (para 64 pessoas), a implantar numa área de 26.745 m2, prevendo mesmo aumentar o projeto para 100, e depois 200 quartos, supostamente com recurso a fundos europeus.</font>
</p><p><font>18. Lar esse que, para além dos iniciais 45 quartos, salas, refeitórios, cozinha, copas, lavandaria, etc., contaria ainda com ginásio com tanque hidroterapêutico com balneários masculinos e femininos, salas de banho geriátrico, macas banheiros, gabinete de enfermagem, casa das máquinas, lavandaria, biblioteca, duas capelas, pátios ajardinados, entre outras coisas mais.</font>
</p><p><font>19. O A. é sócio fundador da Associação/Ré – cf. fls. 193 e ss.</font>
</p><p><font>20. O A., desavindo com o BB, pretendeu o seu afastamento do projeto, e contratou um advogado….., Dr. GG, para se deslocar a …., o que aconteceu em finais de 2015.</font><br>
</p><p><font>21. Em …., o Advogado contactou a Câmara Municipal e as Finanças e deslocou-se ao escritório da 3ª Ré Solicitadora CC, em ….., por haver constatado ter sido esta quem lavrou o contrato de doação, solicitando-lhe cópias do mesmo, e bem assim da procuração com base na qual fizera a doação.</font><br>
</p><p><font>22. A assembleia geral da 1ª Ré, agendada para 17 de Março de 2018, inclui na ordem dos trabalhos a alteração da designação social e respetivo logotipo da Associação/Ré – doc. de fls. 32.</font><br>
</p><p><font>23. O A. pretendeu o BB afastado do projeto ….., o que transmitiu entre outros, à DD durante o Verão de 2015.</font><br>
</p><p><font>24. Na sequência, o co-réu BB, Presidente da Direção da 1ª Ré, dirigiu ao A. as comunicações constantes de fls. 27 vº e 28, de 14/9/2015 e 2/2/2016, cujo teor se dá aqui por reproduzido.</font><br>
</p><p><font>25. A CM aprovou o projeto o que comunicou à ré por ofício de 26.01.2016.</font><br>
</p><p><font>26. O A. não avançou com qualquer parcela do dinheiro.</font><br>
</p><p><font>27. Em data que não consegue precisar, do início de 2014, o A. recebeu, com data de 18 de Março de 2014, do R. BB, com quem já então mantinha contactos acerca do projeto social do A., um documento dactilografado, expedido pelo correio postal, intitulado de “PROCURAÇÃO” a favor dele BB, conferindo-lhe:</font>
</p><p><font>- “</font><i><font>poderes</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>me</font></i><font> </font><i><font>representar</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>escritura</font></i><font> </font><i><font>pública</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>doação,</font></i><font> </font><i><font>Casa</font></i><font> </font><i><font>Pronta,</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>documentos</font></i><font> </font><i><font>particulares</font></i><font> </font><i><font>autenticados,</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>Associação</font></i><font> </font><i><font>Conceição</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>Manuel</font></i><font> </font><i><font>Soares, NIPC</font></i><font> </font><i><font>51…65,</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>sede</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>lugar</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>…,</font></i><font> </font><i><font>freguesia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>…,</font></i><font> </font><i><font>concelho</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>….,</font></i><font> </font><i><font>referentes</font></i><font> </font><i><font>aos</font></i><font> </font><i><font>bens</font></i><font> </font><i><font>imóveis</font></i><font> </font><i><font>sitos</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>freguesia</font></i><font> </font><i><font>…..,</font></i><font> </font><i><font>concelho</font></i><font> </font><i><font>…..,</font></i><font> </font><i><font>inscritos</font></i><font> </font>< | [0 0 0 ... 0 0 0] |
CjJtu4YBgYBz1XKv4gcU | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>AA </font></b><font>intentou ação declarativa ordinária contra </font><b><font>BB e esposa CC </font></b><font>e</font><b><font> DD</font></b><font>, pedindo: </font><br>
</p><p><font>- </font><i><font>A condenação dos primeiros réus no pagamento da quantia de € 459.942,63, acrescida de juros vincendos, até efetivo pagamento, sobre o montante de € 365.936,16; </font></i><br>
</p><p><i><font>- A condenação do 2º réu no pagamento da quantia de € 53.424,94, acrescida de juros vincendos até efetivo pagamento, sobre o montante de € 44.675,91; </font></i><br>
</p><p><i><font>- A condenação solidária dos réus no pagamento da quantia de € 67.661,02, acrescida de juros vincendos até efetivo pagamento, sobre o montante de € 54.492, 88;</font></i><br>
</p><p><i><font>- A condenação solidária dos réus no pagamento de indemnização em montante a liquidar, correspondente aos lucros cessantes em consequência da não celebração dos contratos correspondentes aos acordos estabelecidos e da falta de realização das atividades comerciais acordadas entre as partes; </font></i><br>
</p><p><i><font>- E a condenação solidária dos réus no pagamento de indemnização, a liquidar posteriormente, para ressarcimento de danos patrimoniais. </font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Alegou para o efeito e em resumo:</font><br>
</p><p><font>Em finais de Agosto de 2000 celebrou com os réus um acordo nos termos do qual ficaria comproprietário, na proporção de metade, de determinado terreno para construção civil, pelo preço de € 354.146,51 e de uma “quinta, na proporção de 1/3, pelo preço de € 265.293,98, prédio esse de que os réus se arrogavam titulares, e se associaria à atividade imobiliária e agrícola a desenvolver pelos réus;</font><br>
</p><p><font>Foi ainda acordada a constituição de uma sociedade comercial que teria por objeto a promoção imobiliária, indústria de construção civil, compra e venda de imóveis e gestão e administração de imóveis próprios. </font><br>
</p><p><font> Por conta do preço acordado pela aquisição daqueles direitos de propriedade, por conta de despesas que suportou com licenciamentos, exploração da quinta e constituição da referida sociedade, o autor desembolsou a quantia de € 465.104,95 e que apesar dos compromissos por si assumidos, os réus nunca se dispuseram a celebrar os respetivos contratos-promessa de compra e venda ou escrituras de venda, tendo pelo contrário começado a projetar a venda dos prédios a terceiros, evidenciando o propósito de não cumprir o acordado com o autor. </font><br>
</p><p><font> Os réus contestaram, invocando o abuso de direito do autor em solicitar a restituição das quantias que entregou e defendendo-se por impugnação, e </font><u><font>deduziram reconvenção</font></u><font>, pedindo para além da improcedência da ação que, na procedência da reconvenção:</font><br>
</p><p><font> </font><i><u><font>A título principal</font></u></i><i><font>:</font></i><br>
</p><p><i><font> Que seja reconhecido, como válido, o contrato promessa relativo a 1/2 indivisa do terreno de construção civil, e em consequência ser o autor/reconvindo condenado a pagar ao 1º réu o restante preço no valor de € 129.687,45;</font></i><br>
</p><p><i><font>Que seja igualmente reconhecido como válido o contrato promessa de compra e venda relativo a 1/3 da quinta que incluía as parcelas do Sr. EE, celebrado com os 1º e 2º réus, e o autor reconvindo condenado a pagar-lhes o preço ainda em falta no valor de € 80.500,00; </font></i><br>
</p><p><i><font>E que o autor reconvindo seja condenado a pagar-lhes, a título de indemnização pelos danos causados, em montante não inferior a € 30.000,00, na proporção de 1/3 desse montante para cada um, bem como indemnização por danos não patrimoniais em montante a liquidar; </font></i><br>
</p><p><i><font> E ainda a pagar ao 2º réu a indemnização que se vier a liquidar, a título de lucros cessantes;</font></i><br>
</p><p><font> </font><i><u><font>A título subsidiário</font></u></i><i><font>: </font></i><br>
</p><p><i><font> Que seja reconhecido ao 1º réu o direito a fazer suas a quantia de € 225.000,00, bem como ao 1º e 2º réu, o direito de fazerem suas a quantia de € 187.000,00. E o autor reconvindo condenado a pagar aos réus, a título de indemnização pelos danos causados, montante não inferior a € 30.000,00, na proporção de 1/3 desse montante para cada um,</font></i><br>
</p><p><i><font>Bem como indemnização por danos não patrimoniais em montante a liquidar;</font></i><br>
</p><p><i><u><font>Ou, subsidiariamente</font></u></i><i><font>: </font></i><br>
</p><p><i><font>Que o autor reconvindo seja condenado a </font></i><b><i><font>pagar ao 1º réu,</font></i></b><i><font> a título de responsabilidade pré-contratual:</font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 200.000,00 resultante da desvalorização do terreno; </font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 55.000,00s, de rendimentos que perdeu durante os últimos 3 anos; </font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 10.000,00, correspondentes a 1/3 da desvalorização dos terrenos do Sr. EE, verificada em 2001; </font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 2.500,00, resultantes dos encargos financeiros com a obtenção de financiamento bancário para o pagamento ao Sr. EE da última prestação de € 25. 000,00; </font></i><br>
</p><p><i><font>E a pagar </font></i><b><i><font>ao 2º réu</font></i></b><i><font>:</font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 150.000,00, correspondente à desvalorização da parte da quinta que lhe pertencia, verificada em 2001; </font></i><br>
</p><p><i><font>- quantia não inferior a € 70.000,00 de rendimentos que perdeu durante os últimos 3 anos, e que teria obtido se tivesse vendido a sua quinta em 2001; </font></i><br>
</p><p><i><font>A pagar aos reconvintes, a título de indemnização pelos danos causados, montante não inferior a € 30.000,00, na proporção de 1/3 desse montante para cada um, bem como indemnização por danos não patrimoniais em montante a liquidar; </font></i><br>
</p><p><i><font>A ver os seus créditos sobre os reconvindos compensados com os correspondentes créditos que estes têm contra si até esse valor, devendo pagar-lhes o remanescente do crédito compensado. </font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Alegaram para o efeito e em resumo, que foi o autor que, no âmbito dos acordos negociais efetuados com os réus, acabou por incumprir com aquilo com que se havia comprometido, ao recursar-se a prosseguir com o projeto de construção e ao não efetuar determinados pagamentos a que se obrigara.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>O Autor replicou, mantendo a sua posição e concluindo no sentido da improcedência da reconvenção </font><br>
</p><p><font> Foi proferido despacho saneador e foi fixada a factualidade assente e a base instrutória (houve reclamações, parcialmente atendidas), tendo vindo a ter lugar a audiência de julgamento. </font><br>
</p><p><font> No decorrer da audiência, </font><u><font>os réus interpuseram recurso de agravo (admitido com subida diferida)</font></u><font> da decisão que indeferiu parcialmente a reclamação daqueles, relativamente à assentada dos depoimentos de parte do autor e do 1º réu e que indeferiu a requerida alteração e aditamento ao rol de testemunhas. </font><br>
</p><p><font> Realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><b><u><font>sentença</font></u></b><font>, nos termos da qual a</font><u><font> ação foi julgada parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente:</font></u><br>
</p><p><i><font>- Condenando-se os 1ºs réus BB e CC, no pagamento ao autor AA da quantia de € 415.175,69, a que acrescem juros de mora, desde a citação até integral pagamento; </font></i><br>
</p><p><i><font>- Condenando-se o 2º réu, DD, no pagamento ao autor AA da quantia de € 172.774,75; </font></i><br>
</p><p><i><font>- E absolvendo-se os réus do demais contra eles peticionado; </font></i><br>
</p><p><i><font>- E absolvendo-se do pedido reconvencional o autor/reconvindo.</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>Na sequência de </font><u><font>recursos de apelação, interpostos por ambas as partes</font></u><font>, </font><u><font>a </font></u><b><u><font>Relação …</font></u></b><font>: </font><br>
</p><p><i><font>Concedeu </font></i><i><u><font>parcial provimento ao agravo</font></u></i><i><font> interposto pelos Réus, nos termos constantes (em conclusão) de fls. 75 e 81do acórdão (fls. 3132 e fls. 3138 dos autos);</font></i><br>
</p><p><i><font>E, </font></i><i><u><font>julgando parcialmente procedentes as apelações, revogou parcialmente a sentença</font></u></i><i><font>:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Condenando os Réus BB e esposa, CC a pagarem ao Autor a quantia de </font></i><i><u><font>€ 365.936,16</font></u></i><i><font>, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação.</font></i><br>
</p><p><i><font>- E condenando o Réu DD a pagar ao Autor a quantia de </font></i><i><u><font>€ 44.675,91</font></u></i><i><font>, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação. </font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>Inconformados, </font><b><u><font>interpuseram os RR. BB e DD recurso de revista</font></u></b><font>, no âmbito do qual o STJ decidiu</font><b><font> </font></b><i><u><font>anular o acórdão recorrido na parte (e apenas) em que nele se conheceu das apelações (que não do agravo) e determinou que a Relação procedesse à reapreciação da impugnação da matéria de facto no tocante às respostas relativas a determinados factos constantes da base instrutória</font></u></i><u><font>.</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>Baixados os autos à Relação, os Réus BB e DD vieram declarar que desistiam do segmento do pedido reconvencional em que pediam, a título principal, a condenação do Autor “A ver reconhecido como válido o contrato promessa de compra e venda relativo a 1/3 da quinta que incluía as parcelas do Sr. EE, celebrado com os 1º e 2º réus, e a pagar-lhes o preço ainda em falta no valor de 80.500,00 Euros, sendo 25.000.000,00 euros para o 1º R. reconvinte e 55.000.000,00 para o 2º R. reconvinte” – desistência essa que foi admitida. </font><br>
</p><p><font>E, no âmbito de </font><u><font>novo acórdão</font></u><font>, </font><b><font>a Relação …</font></b><font>, após reapreciar a impugnação da matéria de facto relativamente aos pontos da matéria de facto em falta, nos termos ordenados pelo STJ, </font><u><font>decidiu:</font></u><br>
</p><p><i><font>1. Condenar os Réus BB e esposa, CC a pagarem ao Autor a quantia de €386.711,13 (trezentos e oitenta e seis mil setecentos e onze euros e treze cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Condenar o Réu DD a pagar ao Autor a quantia de €44.675,91</font></i><b><i><font> </font></i></b><i><font>(quarenta e quatro mil seiscentos e setenta e cinco euros e noventa e um cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação. </font></i><font> </font><br>
</p><p><font>Inconformados, </font><b><u><font>interpuseram os réus BB e DD o presente recurso de revista</font></u></b><font> no qual formularam as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
</p><p><font>1ª - O douto acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia e fez errada interpretação e aplicação da lei, sendo, assim uma decisão incorreta, ilegal e injusta que este sábio Tribunal irá reparar.</font><br>
</p><p><font>2ª - Dada a função das conclusões de alegação no recurso, pode o recorrente, por via do seu âmbito, restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso e, se o recorrente restringir o objeto do recurso por via do âmbito das conclusões de alegação a alguma ou a algumas das questões julgadas no tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font>, o tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font> só pode conhecer daquelas que ele tenha formulado, e não das outras, porque não impugnadas e que, por isso, devem considerar-se definitivamente decididas e transitadas. (artigos 635º, n.º 2, e 639º, n.º 1, do CPC).</font><br>
</p><p><font>3ª - Conhecendo o tribunal </font><i><font>ad quem</font></i><font> de questões que não tenham sido objeto de conclusão de alegação, ocorre a situação de excesso de pronúncia, geradora de nulidade do acórdão - artigos 608º, n.º 2, 615º, n.º 1, alínea d), 663º, n.º 2, e 666º, n.º 1, do CPC. Neste sentido decidiram, entre outros, os Ac. do STJ de 14.12.88, de 30.4.96, 29.01.2004, disponíveis em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>.</font><br>
</p><p><font>4ª - A parte dispositiva da sentença da 1ª instância contém decisões distintas sobre vários objetos; entre esses julgados conta-se a questão do abuso de direito, sobre a qual a Mmª Juiz de 1.ª instância se pronunciou nos termos que, parcialmente, se transcrevem:</font><br>
</p><p><font>“Compulsados os autos, constata-se que o autor invocou a nulidade desses acordos, por falta de forma, invocação que, na perspetivados réus, consubstancia o exercício abusivo de um direito (…)“…. a invocação da nulidade, por vício de forma, desses contratos, constituí o exercício abusivo de um direito, na modalidade de "venire contra factum proprium", concluindo-se pela ilicitude do exercício desse direito.” (...) “…impõe-se concluir pela sua validade e eficácia dos três negócios celebrados entre as partes. Sendo, assim, formalmente válidos todos esses contratos-promessa celebrados entre as partes, igualmente se não lobrigam motivos que determinem a invalidade substancial dos aludidos contrato-promessa. Nada obsta, portanto, à sua eficácia.”.</font><br>
</p><p><font>5ª - Quer nas alegações quer nas conclusões do recurso de apelação interposto para a Relação do Porto, constata-se que o A. não dedicou uma única palavra à questão do abuso de direito decidida na 1ª instância, pelo que não impugnou esse segmento decisório que julgou verificado o abuso de direito, pelo que, nessa parte, a sentença transitou em julgado - artº 628º do CPC.</font><br>
</p><p><font>6ª – Só por evidente e manifesto lapso se compreende que a Relação tenha consignado no texto do acórdão recorrido (pág. 40), que “Na sua apelação o Autor sustenta a inaplicabilidade no caso do instituto do abuso de direito.”, pois, por mais que se escrutine todo o texto da apelação do A., não se vislumbra qualquer abordagem ou alusão, por mínima que seja, à questão do abuso de direito decidida na 1ª instância, restringindo o A., o âmbito da sua apelação unicamente às questões da condenação para além do pedido e da não condenação do 2º R. no pagamento de juros a contar da citação, nada mais, de resto, como a Relação reconhece no final da pág. 44 do acórdão.</font><br>
</p><p><font>7ª - Na parte em que a sentença da 1 ª instância julgou procedente a exceção do abuso de direito alegada pelos RR., porque não impugnada, ocorreu trânsito em julgado, e por força dele, passou a ter força obrigatória dentro do processo, não podendo mais ser alterada; ou seja, formou-se caso julgado formal que obsta a que essa questão possa ser reapreciada em recurso. (cfr., Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, pág. 303; Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 1984, pg. 685).</font><br>
</p><p><font>8ª - Ficou, assim, definitivamente fixada e declarada nos autos a verificação do abuso de direito por parte do A. ao invocar a nulidade, por vício de forma, dos contratos</font><br>
</p><p><font>celebrados com os RR., o que, implicava que sobre essa concreta questão a Relação não podia pronunciar-se e muito menos podia, por sua iniciativa, decidir em contrário, como decorre da salvaguarda da incolumidade da parte favorável da decisão, por força do princípio da proibição da </font><i><font>reformatio in pejus</font></i><font> (artº. 635.º n.º 5 CPC), pelo que, ao fazê-lo, a Relação violou o caso julgado formal e incorreu na situação de excesso de pronúncia, provocando a nulidade do acórdão recorrido, - artigos 608º, n.º 2, 615º, n.º 1, alínea d), 663º, n.º 2, e 666º, n.º 1, 674º nº 1 al. c) do CPC.</font><br>
</p><p><font>9ª - Sem prescindir da invocada nulidade, ainda que ela não se verificasse como de facto se verifica e a Relação pudesse pronunciar-se sobre a questão do abuso de direito do A., que já não pode, o certo é que ao decidir, ao contrário da 1ª instância, que o A. não atuou com abuso de direito ao invocar a nulidade dos contratos promessa de compra e venda que celebrou com os RR., errou na interpretação e na aplicação dos artºs 334°, 406º nº 1, 441º, 442º nº 2 e 3 , 777º nº 1 e 2, 804º nº 2 e 830 nº 1 e 2, todos do Cód. Civil, violando-os.</font><br>
</p><p><font>10ª - Para chegar a tal conclusão (pág. 40 e 41 do acórdão), a Relação estriba-se em três argumentos, a saber: 1ª- As deficientes contas da quinta (não apresentação pelos RR. ao A. de comprovativos de despesas realizadas nas quinta e com documentos fiscalmente válidos); 2ª- O arrendamento de espaço de estufas e venda das mesmas sem apresentação dessas contas ao A.; 3ª – A não apresentação pelos RR. ao A. de um documento assinado por eles que desse forma escrita aos acordos e que confirmasse os pagamentos feitos por este.</font><br>
</p><p><font>11ª - A Relação tirou errada conclusão porquanto, quanto à primeira das razões, não analisou as diversas provas indicadas nas conclusões 70 a 95 da apelação dos RR. quando alude aos “poucos documentos justificativos quer das receitas quer das despesas”, juntos a fls. 706 a 721, esquecendo-se dos demais documentos juntos relativos às contas da quinta a fls. 480 a 690 e fls. 797 a 814., num total de mais de 200 documentos, deles resultando que, enquanto o A. quis comungar com os R. da exploração conjunta da quinta e das respetivas despesas e receitas, até Julho de 2002, o 2º R. apresentou contas ao A., que este considerou boas em Set/2004, (factos provados nº 135 e 136 – respostas aos pontos nº 183 e 185 da BI), não o fazendo depois dessa data, por o A. não mais ter querido, (factos provados nº 137 e 138 – respostas aos pontos nº 186 e 188 da BI).</font><br>
</p><p><font>12ª - A Relação devia ainda ter levado em conta que, como provado, o negócio tripartido da exploração conjunta da quinta foi um acordo informal baseado na confiança entre os três “sócios”, sem que tivesse sido prevista ou sequer desejada pelas partes a formalização de uma sociedade validamente constituída, nem da criação de uma contabilidade organizada, a exigir intervenção de contabilista, e da correspondente exigência de que todos os documentos de despesa e receita dessa exploração conjunta fossem fiscalmente válidos, em nome dessa “tríade societária” que, nem sequer tinha existência fiscal nem o correspondente número de contribuinte fiscal.</font><br>
</p><p><font>13ª - É do conhecimento geral que nas pequenas explorações agrícolas de cariz familiar e informal, que regra geral são deficitárias, algumas despesas como o pagamento de “jornas” são ou eram (2001 a 2002), em regra, informais e sem suporte de documentos fiscalmente válidos, sabendo disso o A., como sabia que os “três” não tinham contratado um TOC para tratar as contas da exploração e que os RR. não eram contabilistas, pelo que, nessas circunstâncias, a atitude do A., ao vir a juízo queixar-se da falta de contabilidade e documentação fiscalmente válida, é mera desculpa de “mau pagador” para tentar justificar o incumprimento contratual acordado com os RR., que as instâncias não deviam ter acolhido.</font><br>
</p><p><font>14ª - A Relação errou também quanto à segunda das razões, pois diversamente do afirmado, quer a receita do arrendamento quer da venda das estufas a FF constam nas contas nos autos, concretamente nos itens 154 e 155 do documento de fls. 484, no documento de fls. 595, doc. de fls. 716, e nos itens 165 e 166 de fls. 809, como não teve em conta que a venda das estufas e o consequente arrendamento do espaço por elas ocupados ocorreram em Janeiro de 2003, numa altura em que (como provado – facto nº 137) o A. já tinha dito aos RR. que não aceitava mais fazer parte da exploração conjunta e nas contas da quinta, em que só participou até 22.7.2002.</font><br>
</p><p><font>15ª - A atitude do A. de vir a juízo reclamar da falta de prestação das contas de exploração da quinta para além de 22.7.2002, incluindo das estufas, quando tinha recusado continuar a participar das contas e da exploração conjunta da quinta a partir dessa data, ademais, depois de em 20.9.2004 ter assinado com boas as contas até Julho de 2002, (doc. de fls. 310), bem ilustra a sua falta de lisura e má-fé, contrários às regras éticas aceites pelas pessoas honestas, corretas e de boa-fé, que a Relação devia ter repudiado.</font><br>
</p><p><font>16ª - A Relação errou ainda quanto à terceira das razões, pois neste aspeto, baseia-se apenas no que foi dado como provado no facto nº 73, mas não atendeu e extrapolou indevidamente o que, em rigor e em substância, a 1ª instância consignou nesse facto nº 73 em resposta aos pontos 32º, 33º e 35º da BI, pois, o facto é que a resposta foi que: “O A., a partir do mês de Junho de 2004, solicitou junto do 2º R., que se elaborasse um documento que desse forma escrita aos acordos estabelecidos e que confirmasse os pagamentos já por si efetuados, documento esse que, assinado pelos RR., nunca chegou a ter na sua posse.”. Nada mais se disse.</font><br>
</p><p><font>17ª - Daí que, ao contrário do que sugeriu e disse a Relação, não se provou que havia obrigação dos RR. de fazerem ao A. a “apresentação" de documento algum, nem que este lhes exigiu tal “apresentação” documental, nem que houvesse algum documento já elaborado que os RR. devessem assinar e fazer a sua “apresentação” ao A., antes, e só, foi provado que o A. solicitou ao 2º R, nunca ao 1º R., que “se” “elaborasse” “um documento” que desse forma escrita aos acordos estabelecidos e que confirmasse os pagamentos já por si efetuados.</font><br>
</p><p><font>18ª - O propósito dos RR. quanto a formalizar por escrito os acordos verbais ficou ainda evidenciado dos factos provados nº 54 e 55, em que, a pedido dos RR., em Out/2004, estes reuniram-se com o A. e um advogado parente deles, que ficou incumbido de elaborar “documentos para melhor formalizarem os acordos iniciais, relativamente à quinta e ao terreno de construção, bem como às subsequentes alterações desses acordos iniciais, como seja a definição e regulamentação das diversas hipótese de venda a terceiros, valores mínimos, divisão das “coisas comuns”, das iniciativas de cada comproprietário para venda e divisão, etc.”, que a Relação não teve em conta, como sucedeu ainda com os factos provados nº 141 – respostas aos pontos nº 195 a 199, 209 e 210 da BI, de os RR., em contrapartida aos contratos datados de 27.1.2004, sugeridos pelo A. de fls. 302 a 327, terem enviado ao A. os contratos de fls.328 a 338 datados de 2.12.2004, que o A. não assinou.</font><br>
</p><p><font>19ª - Por conseguinte, não têm base factual nem sustentação os três argumentos aduzidos pela Relação para defender que o A. não agiu com abuso de direito ao alegar a nulidade dos acordos por falta de forma e exigir aos RR. “as verbas que despendeu” e que “não excede de modo manifesto os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito que exercita”.</font><br>
</p><p><font>20ª - Pelo contrário, como bem se decidiu na 1ª instância, nesta questão, é manifesto que o A. agiu com evidente abuso do direito na medida em que, claramente, depois de tudo o que se passou e, contraditoriamente com o que fez e disse durante anos a fio e dando o dito por não dito, rompeu os acordos e alegou a sua nulidade para exigir de volta aos RR. tudo quanto gastou e lhes pagou por conta desses acordos, assim excedendo, manifestamente, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito a invocar a nulidade formal de contratos promessa de compra e venda de imóveis.</font><br>
</p><p><font>21ª - De facto, como se decidiu na 1ª instância, o A. sempre atuou de molde a fazer crer aos RR. que não lançaria mão do direito de invocar a nulidade formal dos contratos promessadecompraevendade½ do terreno e de 1/3 da quinta, criando neles a convicção séria de que o negócio definitivo se realizaria, pois, ficou provado que, no dia 31 de Agosto de 2000, o A. e o 1º R. começaram a dar execução aos acordos verbais estabelecidos, que, por conta do preço devido pela aquisição das quotas-partes do imóveis pertencentes ao 1º e 2° réus, em execução dos referidos acordos verbais, o A. fez a entrega aos RR. de avultadas quantias, assumindo ainda várias despesas inerentes à execução desses acordos, designadamente, com o custo do projeto de construção no prédio pertencente aos 1ºs RR., que emitiu e entregou ao 1º R. marido cheques com vista ao pagamento da quota-parte da "Quinta" que prometeu adquirir ao 2º réu, quinta essa que incluía os terrenos a adquirir ao Sr. EE, que o A. fez diversos contactos com potenciais interessados na compra da "quinta", chegando a reunir-se com um desses interessados na companhia do 2º R., que o A. suportou ainda despesas com a constituição e manutenção de uma sociedade comercial que tinha por objetivo promover a construção e venda dos edifícios cuja construção estava prevista para o prédio dos 1ºs RR., que essas quantias adiantadas e essas despesas suportadas pelo A., ocorreram na expectativa de que se iriam concretizar os negócios relativos ao prédio dos 1ºs réus.</font><br>
</p><p><font>22ª - Nestas circunstâncias e com tais comportamentos, ao longo de quatro anos, não pode deixar de se considerar que o A. criou nos RR., promitentes vendedores, a convicção séria de que os negócios definitivos relativos aos contratos-promessa verbais celebrados se realizariam e fê-los crer que não lançaria mão do direito de invocar a nulidade formal desses contratos, pelo que, ao fazê-lo, exerceu de forma abusivo tal direito, na modalidade de "venire contra factum proprium", e excedeu, manifestamente, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes, pois que quem atua com lealdade, lisura, verticalidade, honestidade, correção e boa-fé, não procede dessa maneira, nem invoca motivos fúteis e inconsistentes, (como o da apresentação a pagamento em Maio/2004 pelo 1º R. de um cheque sacado pelo A. datado para esse mês e ano), para, depois de fazer crer que cumpriria, furtar-se ao cumprimento de contratos de “milhões”, donde resulta, inequivocamente, a ilicitude do exercício desse direito. (artº 334º do C. Civil).</font><br>
</p><p><font>23ª - Dessa ilicitude resulta a conclusão da validade formal e eficácia dos contratos promessa de compra e venda celebrados entre o A. e os RR. e, consequentemente, importa extrair as consequências legalmente previstas para essa ilícita pretensão do A., qual seja, nos termos do artº 334° do C. Civil, a de julgar improcedente a ação e , ao contrário do que erradamente se fez na Relação, recusar-lhe o pedido e objetivo pretendido com base nessa ilícita pretensão de conseguir dos RR. a restituição de tudo quanto lhes prestou e gastou em diversas outras serviços que solicitou.</font><br>
</p><p><font>24ª - Assim, afastada a invocada nulidade formal dos contratos promessa, seja por estar já assente, como está, a procedência da exceção do abuso de direito do A., seja pela verificação desse abuso de direito decorrente da errada interpretação e aplicação que a Relação fez do artº 334º do C. Civil, importa concluir que, pelo menos o contrato promessa relativo a ½ indiviso do terreno de Antas, pode ainda ser cumprido, nos termos do artº 406º nº 1 do Cód. Civil, ainda que haja mora de uma das partes, (artº 804º nº 2 e 777º nº 1 e 2 do Cód. Civil), a menos que se considere que foi definitiva e irremediavelmente incumprido por qualquer das partes, caso em que pode sempre ser objeto de execução específica pela/s parte/s não faltosa/s contra aquela/s que esteja/m em mora prevista no artº 442º nº 3 do Cód. Civil e, nos termos do artº 830 nº 1 do C. Civil, obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do autor promitente comprador faltoso, caso não se disponha a cumprir a promessa contratada, sendo que, ao invés, os primeiros RR. BB e mulher estão, como sempre, disponíveis para o cumprir e outorgar a escritura de venda respetiva de ½ do terreno de construção.</font><br>
</p><p><font>25ª - Como consta dos autos os RR., entretanto, desistiram do segmento do pedido reconvencional em que pediam, a título principal, a condenação do A. a ver reconhecido como válido e em vigor o acordo e promessa de compra e venda, relativo a 1/3 da quinta que incluía as parcelas do Sr. EE celebrado com o 2º e 1º RR e a pagar-lhes o preço ainda em falta no valor de 80.500,00 Euros, sendo 25.000,00 Euros para o 1º R e 55.500,00 para o 2º R. e mantendo todos os demais pedidos, desistência parcial essa que já foi admitida no acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font>26ª - Por outro lado, nos termos do disposto no artº 441º do Cód. Civil, nos contratos promessa de compra e venda, presume-se que tem carácter de sinal todas as quantias entregues pelo promitente comprador aos promitentes vendedores, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço, e o artº 442º nº 2 do Cód. Civil estatui que, se quem constitui sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue.</font><br>
</p><p><font>27ª - Por isso, se não se entender possível o cumprimento do contrato, relativo a ½ do terreno de construção celebrado com o 1º R., ainda que em execução específica, então, como no caso dos autos estamos perante dois contratos promessa já julgados válidos e eficazes e que foi o A. quem, comprovadamente, decidiu não cumprir a obrigação de compra e pagamento do preço ainda em falta, mantendo essa recusa, como resulta quer da posição assumida na PI, alegando nulidade formal dos mesmos e declarando-se indisponível para os cumprir, quer ainda nas suas declarações em julgamento em que declarou ter decidido a total rutura com os RR. e ter desistido de tudo o que com eles combinara em meados de 2004, cabe aos RR. a faculdade de fazer suas as quantias que dele receberam a título de sinal. Nesse sentido decidiram, entre outros, os Ac. do STJ de 03-05-2000 e de 20-06-2000 in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>.</font><br>
</p><p><font>28ª - A Relação, errou ainda ao decidir a condenação dos 1ºs RR. na “devolução” ao A. de 20.774,97€ correspondente a metade do custo do projeto de construção (pág. 98 do acórdão), pois baseia-se em supostos factos que não foram dados como provados nos autos, resultando apenas de mero erro de escrita cometido na 1ª instância, como se vê do confronto entre a resposta da 1ª instância ao artº 19º da BI a fls. 2.252, em que se diz que os pagamentos ” …foram efetuados pelo autor nos termos acordados com o 1º réu e o 2º réu.”, com o que depois, por mero erro de escrita, consta no texto da sentença, a fls. 2.417, no ponto 6.65 dos factos provados, em que se escreveu, muito diversamente, que os pagamentos a F… Lda “ foram efetuados pelo Autor nos termos acordados com os 1ºs Réus – Resposta ao ponto 19º da B.I..”.</font><br>
</p><p><font>29ª - Assim, os pagamentos “efetuados pelo autor nos termos acordados com o 1º réu e o 2º réu.”, por evidente e manifesto erro de escrita da 1ª instância, retificável a todo o tempo, passaram a ser pagamentos “efetuados pelo Autor nos termos acordados com os 1ºs Réus”, com o 2º R. a ser excluído da equação desse a | [0 0 0 ... 0 0 0] |
DjJtu4YBgYBz1XKv6Ac7 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></b><font>:</font><b><font> </font></b></div><br>
<br>
<br>
<p><font>No âmbito dos autos de ação de consignação em depósito movida pela requerente</font><b><font> Triplus</font></b><font> </font><b><font>Investimentos</font></b><font> </font><b><font>–</font></b><font> </font><b><font>Gestão</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>Consultoria,</font></b><font> </font><b><font>SA</font></b><font> e </font><b><font>Erskine</font></b><font> </font><b><font>Control</font></b><font> </font><b><font>–</font></b><font> </font><b><font>Investimentos</font></b><font> </font><b><font>e</font></b><font> </font><b><font>Participações,</font></b><font> </font><b><font>SA</font></b><font> aos requeridos </font><b><font>AA</font></b><font>, </font><b><font>BB</font></b><font>, </font><b><font>CC</font></b><font>, e </font><b><font>DD</font></b><font>, pedindo que se ordene o depósito judicial das prestações nos montantes de €3.285.000,00 e €715.000,00 a vencer em 30.12.2017, mais se declarando cumpridas e extintas as respetivas obrigações nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 916º do CPC: </font><br>
</p><p><font>Alegaram em síntese que tendo a 1ª requerente adquiriu a EE determinado número de ações de que este era titular na sociedade Leacock Investimentos, SGPS, SA, pelo preço de €5.721.000,00, a pagar em 120 prestações mensais numa conta bancária identificada no contrato, titulada pelo referido EE, todos os pagamentos foram feitos até 30.11.2017 na referida conta bancária, e que a 1ª Requerida, após a morte de EE em 9.5.2010, exigiu que o pagamento das prestações vincendas fossem feito numa conta pessoal sua, alegando a qualidade de única herdeira-legatária dos bens do falecido – sendo que no dia 30.12.2017 se venceria a última prestação do preço, no montante de €3.285.000,00.</font><br>
</p><p><font>Por sua vez, a 2ª requerente adquiriu ao mesmo EE outras preferenciais que este tinha da mesma sociedade pelo preço de €3.151.000,00, a pagar em 120 prestações mensais, na mesma conta bancária identificada no contrato e titulada pelo referido EE, prestações essas que foram pagas na referida conta bancária – sendo que, após a morte do EE, a 1ª requerida exigiu o pagamento das prestações vincendas numa conta pessoal sua, alegando a qualidade de única herdeira-legatária dos bens do falecido, respondendo a 2ª Requerente que manteria os pagamentos na conta bancária identificada no contrato.</font>
</p><p><font>Porém, a prestação vencida em Setembro de 2010 foi estornada com a indicação de a conta destino ter sido encerrada por ordem da cabeça de casal (a 1ª Requerida), passando a 2ª Requerente a efetuar a transferência das prestações para a conta bancária pessoal daquela, primeiro junto do Barclays Bank e, depois, junto do Bankinter, salientando que tais pagamentos não podiam ser entendidos como qualquer alegado reconhecimento da alegada qualidade de “única herdeira-legatária”.</font>
</p><p><font>Todos os pagamentos feitos até 30.11.2017 foram-no, primeiro, para a conta bancária identificada no contrato, depois para as contas bancárias tituladas pela 1ª Requerida junto do Barclays Bank, e depois junto do Bankinter.</font><br>
</p><p><font>No dia 30.12.2017 vencer-se-á a última prestação do preço, no montante de €715.000,00.</font><br>
</p><p><font>As Requerentes são sociedades do mesmo grupo, sendo a 2ª parcialmente detida por DD, filha do falecido e interessada no inventário.</font><br>
</p><p><font>As Requerentes receberam um fax enviado por BB, filha do falecido e interessada no inventário, a solicitar que o pagamento das prestações que se vencerão no próximo dia 30.12.2017 não sejam pagas à cabeça de casal em razão do litígio pendente.</font><br>
</p><p><font>A 1ª Requerida arroga-se única herdeira-legatária do falecido, o que foi impugnado pelas 2ª, 3ª e 4ª Requeridas, estando pendente decisão sobre a questão junto do STJ, pelo que não sabem as requerentes quem é o atual credor das prestações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi ordenado o depósito das quantias referidas à ordem do tribunal, e dado conhecimento nos autos do mesmo, foi ordenada a citação das requeridas. </font><br>
</p><p><font>A 1ª Requerida </font><b><font>contestou</font></b><font>, impugnando o depósito por inexistência de fundamentos subjacentes à consignação em depósito e a 3ª Requerida apresentou requerimento aderindo ao alegado pelas Requerentes, não se opondo ao pedido de consignação em depósito formulado.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Após as partes terem sido convidadas a tomar posição sobre a suspensão da instância até que fosse decidido o processo de inventário a decorrer - </font><u><font>e sendo que apenas a requerida AA veio tomar posição</font></u><font> (e no sentido de a mesma se não justificar), veio a ser proferido </font><b><u><font>despacho,</font></u></b><u><font> em 22.4.2019</font></u><font>, nos seguintes termos: </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>“</font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>consignação</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>depósito</font></i><font> </font><i><font>é</font></i><font> </font><i><font>um</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>modos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>extinção</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>obrigações</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>consiste</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>depósito</font></i><font> </font><i><font>judicial</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>coisa</font></i><font> </font><i><font>devida,</font></i><font> </font><i><font>feito</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>ordem</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>credor,</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>fim</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>liberar</font></i><font> </font><i><font>definitivamente</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>devedor</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>vínculo</font></i><font> </font><i><font>obrigacional</font></i><font> </font><i><font>(artigo</font></i><font> </font><i><font>841º</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>C.C.).</font></i><font> </font><i><font>Nos</font></i><font> </font><i><font>termos</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>disposto</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>art.</font></i><font> </font><i><font>922.º,</font></i><font> </font><i><font>n.º</font></i><font> </font><i><font>1</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Cód.Proc.Civil,</font></i><font> </font><i><font>“Quando</font></i><font> </font><i><font>sejam</font></i><font> </font><i><font>conhecidos,</font></i><font> </font><i><font>mas</font></i><font> </font><i><font>duvidoso</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>seu</font></i><font> </font><i><font>direito,</font></i><font> </font><i><font>são</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>diversos</font></i><font> </font><i><font>credores</font></i><font> </font><i><font>citados</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>contestar</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>fazer</font></i><font> </font><i><font>certo</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>seu</font></i><font> </font><i><font>direito.”.</font></i><font> </font><i><font>Ora,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>requerida</font></i><font> </font><i><font>AA</font></i><font> </font><i><font>entende</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>“Os</font></i><font> </font><i><font>presentes</font></i><font> </font><i><font>autos</font></i><font> </font><i><font>estão</font></i><font> </font><i><font>marcados</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>duas</font></i><font> </font><i><font>situações</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>(1)</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>elevada</font></i><font> </font><i><font>quantia</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>causa</font></i><font> </font><i><font>nos</font></i><font> </font><i><font>pagamentos</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>pretendem</font></i><font> </font><i><font>consignar</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>(2)</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>facto</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>Cabeça</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Casal</font></i><font> </font><i><font>ter</font></i><font> </font><i><font>declarado</font></i><font> </font><i><font>que,</font></i><font> </font><i><font>conforme</font></i><font> </font><i><font>Testamento,</font></i><font> </font><i><font>é</font></i><font> </font><i><font>legatária</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>herança</font></i><font> </font><i><font>remanescente</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>cujus.</font></i><font> </font><i><font>“.</font></i><font> </font><i><font>Compulsado</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>autos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>inventário</font></i><font> </font><i><font>2341/13……</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>juízo</font></i><font> </font><i><font>local</font></i><font> </font><i><font>cível</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>…..</font></i><font> </font><i><font>verifico</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>questão</font></i><font> </font><i><font>alegada</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>requerida,</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>ser</font></i><font> </font><i><font>“legatária</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>herança</font></i><font> </font><i><font>remanescente</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>cujus”,</font></i><font> </font><i><font>ainda</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>foi</font></i><font> </font><i><font>decidida,</font></i><font> </font><i><font>sendo</font></i><font> </font><i><font>que,</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>consta,</font></i><font> </font><i><font>igualmente,</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>processo</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>causa</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>remissão</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>meios</font></i><font> </font><i><font>comuns</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>decisão</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>mesma.</font></i><font> </font><i><font>Pretendendo</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>requerida</font></i><font> </font><i><font>ver</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>requerente,</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>mais,</font></i><font> </font><i><font>“condenada</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>depositar</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>sua</font></i><font> </font><i><font>conta</font></i><font> </font><i><font>bancária”</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>quantia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>€</font></i><font> </font><i><font>715.000,00</font></i><font> </font><i><font>(setecentos</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>quinze</font></i><font> </font><i><font>mil</font></i><font> </font><i><font>euros)”,</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>tratando</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>impugnação</font></i><font> </font><i><font>efectuada</font></i><font> </font><i><font>ao</font></i><font> </font><i><font>abrigo</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>disposto</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>al.</font></i><font> </font><i><font>b) do</font></i><font> </font><i><font>art.</font></i><font> </font><i><font>919.º,</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>CPC,</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>é</font></i><font> </font><i><font>possível</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>cumulação</font></i><font> </font><i><font>referida</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>art.</font></i><font> </font><i><font>922.º,</font></i><font> </font><i><font>n.º</font></i><font> </font><i><font>5</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>mesmo</font></i><font> </font><i><font>diploma,</font></i><font> </font><i><font>sendo</font></i><font> </font><i><font>necessário</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>qualidade</font></i><font> </font><i><font>alegada</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>requerida</font></i><font> </font><i><font>seja</font></i><font> </font><i><font>declarada</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>sede</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>inventário,</font></i><font> </font><i><font>tornando</font></i><font> </font><i><font>assim</font></i><font> </font><i><font>certo</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>direito</font></i><font> </font><i><font>que,</font></i><font> </font><i><font>neste</font></i><font> </font><i><font>momento,</font></i><font> </font><i><font>é</font></i><font> </font><i><font>duvidoso.</font></i><font> </font><i><font>Dessarte,</font></i><font> </font><i><font>entende</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>tribunal</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>presente</font></i><font> </font><i><font>acção</font></i><font> </font><i><font>está</font></i><font> </font><i><font>dependente</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>decisão</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>sobre</font></i><font> </font><i><font>tal</font></i><font> </font><i><font>matéria</font></i><font> </font><i><font>vier</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>ser</font></i><font> </font><i><font>proferida</font></i><font> </font><i><font>nos</font></i><font> </font><i><font>autos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>inventário</font></i><font> </font><i><font>n.º</font></i><font> </font><i><font>2341/13……do</font></i><font> </font><i><font>juízo</font></i><font> </font><i><font>local</font></i><font> </font><i><font>cível</font></i><font> </font><i><font>…..,</font></i><font> </font><i><font>motivo</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>consubstancia</font></i><font> </font><i><font>causa</font></i><font> </font><i><font>prejudicial</font></i><font> </font><i><font>devendo</font></i><font> </font><i><font>ser</font></i><font> </font><i><font>ordenada</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>suspensão</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>presentes</font></i><font> </font><i><font>autos,</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>declara</font></i><font> </font><i><font>(cfr.</font></i><font> </font><i><font>art.</font></i><font> </font><i><font>272.º,</font></i><font> </font><i><font>1</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>CPC).</font></i><font> </font><i><font>Notifique</font></i><font>”.</font>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de </font><u><font>apelação da requerida AA</font></u><font>, </font><u><font>e sem que as outras partes tivessem contra-alegado</font></u><font>, a </font><b><font>Relação …</font></b><font>, julgando a apelação procedente, </font><i><font>revogou aquela decisão da 1ª instância</font></i><b><i><font> e condenou as recorridas nas custas </font></i></b><font>(naturalmente, da apelação)</font><b><i><font>.</font></i></b><br>
</p><p><font> Isto (quanto às custas), com a seguinte fundamentação: </font><i><font>“As custas, na modalidade de custas de parte ficam a cargo das apeladas, por terem ficado vencidas – art. 527º, nºs 1 e 2 do CPC.”</font></i><font> </font><br>
</p><p><font> Inconformadas, as recorridas, Erskine Control - Investimentos e Participações, S.A., Triplus Investimentos - Gestão e Consultoria, S.A., CC e DD</font><b><font> pediram a reforma do acórdão recorrido quanto a custas. </font></b><br>
</p><p><u><font> Por novo acórdão, proferido em conferência</font></u><font>, </font><b><font>a Relação</font></b><font> </font><u><font>indeferiu a peticionada reforma do acórdão</font></u><font>, condenando as apeladas nas respetivas custas. </font><br>
</p><p><font> Inconformadas com este </font><u><font>acórdão da conferência</font></u><font>, dele vieram as supra mencionadas recorridas/requerentes </font><b><font>Erskine Control - Investimentos e Participações, S.A.</font></b><font>, </font><b><font>Triplus Investimentos - Gestão e Consultoria, S.A.</font></b><font>, </font><b><font>CC </font></b><font>e </font><b><font>DD,</font></b><font> </font><u><font>interpor recurso de revista excecional</font></u><font>, “ao abrigo do disposto no s artigos 629.º, n.º 2, al. d), 631.º, n.º 1, 637º, 638.º, n.º 1, 639.º, 671.º, n.º 1 e n.º 3, 672.º, n.º 1, alíneas a) a c) e 674.º, n.º 1, alíneas a) e b), todos do Código de Processo Civil”, formulando as seguintes</font><u><font> conclusões:</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>1ª - Em 07.01.2019, sem que o mesmo tenha sido requerido por alguma das partes, foi proferido o despacho de suspensão dos autos de consignação em depósito até prolação de decisão nos autos de inventário n.º 2341/13...., que correm termos no Juízo Local Cível … .</font><br>
</p><p><font>2ª - Em 14.05.2019, a Requerida AA interpôs recurso do referido despacho de suspensão do presente processo, não tendo as Recorrentes apresentado contra-alegações de recurso.</font><br>
</p><p><font>3ª - Por acórdão datado de 21.01.2020, foram as Recorridas condenadas no pagamento de custas.</font><br>
</p><p><font>4ª - Em 06.02.2020, as aqui Recorrentes requereram a reforma do douto acórdão quanto a custas, peticionando a fixação de custas a final, de acordo com o vencimento da causa.</font><br>
</p><p><font>5ª - Por acórdão datado de 05.05.2020, a Relação decidiu indeferir a reforma do acórdão quanto a custas e condenar as Recorridas nas mesmas, com base no critério da causalidade, previsto no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.</font><br>
</p><p><font>6ª - A decisão do Tribunal da Relação …, que foi mantida em conferência, ao não ter em consideração a especificidade do regime da responsabilidade tributária, veio subverter a própria natureza das custas processuais, prevista nos artigos 527.º e 529.º do Código de Processo Civil.</font><br>
</p><p><font>7ª - A questão, objeto do presente recurso, extravasa, assim, a mera inconformidade das oras Recorrentes com a solução sufragada pelo Tribunal da Relação …, impondo uma melhor aplicação do direito do que aquela que foi feita pelo Tribunal da Relação, tanto na situação em apreço, como em situações idênticas futuras.</font><br>
</p><p><font>8ª - Esta questão assume um interesse de particular relevância social porquanto, ao entender diferentemente, a decisão do Tribunal Recorrido veio pôr em causa as normas que disciplinam o regime da responsabilidade tributária, pelo que se torna fundamental alcançar uma solução cujo interesse jurídico extravasa os limites do processo e aumenta a segurança no sistema jurídico e nos valores sócio-económicos, tendo um significativo papel na sociedade, pela sua grande relevância prática quer na área da ciência jurídica, quer na área da ciência económica.</font><br>
</p><p><font>9ª - A decisão do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em conferência, encontra-se em contradição direta com o acórdão do mesmo Tribunal, proferido em 06.02.2020, no Processo n.º 2775/19.4T8FNC-A.L1-215, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito. </font><br>
</p><p><font>10ª - Com efeito, ambos os acórdãos têm por objeto a mesma questão de direito, a qual incide sobre o momento da imputação das responsabilidades tributárias das partes.</font><br>
</p><p><font>11ª - Questão essa que assenta nos mesmos pressupostos de facto, pois quer no acórdão em crise, quer no acórdão-fundamento, a Apelante (Ré/Apelante naquele e Autora/Apelante neste) obteve “ganho de causa”, relativamente à pretensão recursória que trouxe a juízo, ou seja, logrou obter a revogação do despacho de suspensão dos autos, e em ambos os casos, as Recorrentes não deram causa ao recurso. Do mesmo modo, em ambos os acórdãos, os Recorridos (Autoras no acórdão em crise e Réus no acórdão-fundamento) não tiveram qualquer intervenção no recurso, não tendo tido qualquer impulso processual, e não foram por ele negativamente afectados, porquanto, à data da prolação das decisões interlocutórias, ainda não eram conhecidos os vencedores da causa.</font><br>
</p><p><font>12ª - Contudo, as decisões dos acórdãos em apreço são completamente opostas.</font><br>
</p><p><font>13ª - Com efeito, enquanto que o acórdão em crise, bem sabendo que as Apeladas não tiveram qualquer impulso no recurso, não lhe deram causa e não foram por ele negativamente afetadas (porquanto lhes é totalmente indiferente se a causa prossegue ou fica suspensa até prolação de decisão nos autos de inventário), considera que são devidas custas pelas Apeladas, com base no princípio da causalidade.</font><br>
</p><p><font>14ª - Distintamente, o acórdão-fundamento entendeu, e bem, que, não se encontrando verificados nem o critério da causalidade, nem o critério do proveito, a responsabilidade tributária inerente ao recurso deveria ser relegada para a parte que ficasse vencida a final, mantendo o decidido no acórdão do Tribunal recorrido, o qual fixou “Custas pela parte vencida a final”.</font><br>
</p><p><font>15. Em face do exposto, verifica-se que estamos perante situações enquadráveis nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, devendo por isso, ser admitida a presente revista excecional.</font><br>
</p><p><font>16ª - Por outro, também se encontram preenchidos os pressupostos gerais da admissão do recurso de revista, artigos 629.º, n.º 1 e 671.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.</font><br>
</p><p><font>17ª - Efetivamente, </font><i><font>in casu</font></i><font>, tanto o valor da causa é superior à alçada do Tribunal da Relação, como a decisão recorrida é desfavorável às Recorrentes em valor superior a metade da alçada do Tribunal da Relação, pelo que se encontram verificados os pressupostos gerais de admissão do recurso de revista.</font><br>
</p><p><font>18ª - Salvo o devido respeito, o acórdão recorrido peca por proceder a uma errada aplicação da lei processual civil, em concreto das normas relativas à responsabilidade tributária das partes, constantes nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 529.º do Código de Processo Civil.</font><br>
</p><p><font>19ª - Da conjugação do artigo 527.°, n.ºs 1 e 2, com o artigo 607.º, n.º 6 e o artigo 663.°, n.° 2 do CPC, resulta que a responsabilidade pelo pagamento das custas de parte assenta no critério da causalidade, ou seja, do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, subsidiariamente, no critério do proveito.</font><br>
</p><p><font>20ª - Defende Salvador da Costa, o artigo 527.º, n.º 1 do CPC “é motivado pelo princípio da causalidade a título principal, em virtude do qual deve pagar as custas o vencido na respetiva proporção, e pelo princípio do proveito ou vantagem processual, caso em que deve pagar as custas quem dela aproveitou” (Cfr. Salvador da Costa, in “As Custas Processuais - Análise e Comentário”, 6.ª edição, 2017, Almedina).</font><br>
</p><p><font>21ª - No caso </font><i><font>sub judice</font></i><font>, a Ré AA obteve “ganho de causa” no recurso, tendo sido revogado o despacho de suspensão dos autos de consignação em depósito, e não deu causa ao recurso (porquanto foi o Tribunal de 1.ª Instância, que decidiu proferir o despacho de suspensão dos autos, sem que nenhuma das partes o tivesse requerido).</font><br>
</p><p><font>22ª - Por outro, as Autoras não tiveram qualquer intervenção no recurso, não tendo tido qualquer impulso processual, e não deram causa ao recurso. Pelo que, também não lhes pode ser oposto o critério da causalidade.</font><br>
</p><p><font>23ª - Pelo que, o critério da causalidade, previsto no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, não pode valer no presente caso.</font><br>
</p><p><font>24ª - De seguida, verifica-se que o critério do proveito também não tem aplicação em juízo. Efetivamente, não faria sentido que a parte vencedora do recurso ficasse responsável pelo pagamento das custas, por ter tirado proveito do recurso.</font><br>
</p><p><font>25ª - Por outro, o proveito do recurso também não tem lugar na esfera jurídica das Autoras, porquanto, no momento em que foi proferido o acórdão, não era possível – tal como, ainda não o é – afirmar que o desfecho do recurso se reflete negativamente na esfera das Autoras.</font><br>
</p><p><font>26ª - Deste modo, tendo em conta que se está perante uma decisão interlocutória, e que é prematuro e injusto responsabilizar as Autoras ou a Ré pelas custas, afigura-se que a decisão sobre a responsabilidade tributária inerente ao presente recurso deverá ser</font><br>
</p><p><font>relegada para aquela que decida sobre a responsabilidade tributária da decisão final.</font><br>
</p><p><font>27ª - Neste sentido, vide parte do sumário do Acórdão-Fundamento (do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06.02.2020, no Processo n.º 2775/19.4T8FNC-A.L1-2, disponível em: </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>.):</font><br>
</p><p><i><font>“IV - Porque se está perante uma decisão interlocutória, cumpre relegar a decisão</font></i><br>
</p><p><i><font>sobre a responsabilidade tributária inerente à instância do presente recurso para aquela que decida sobre a responsabilidade tributária da decisão final.</font></i><br>
</p><p><i><font>V - O critério da causalidade (tal como enunciado na previsão contida no n.º 2 do artigo 527.º do CPC) adquirirá, relativamente a esta instância interlocutória, plena operatividade quando for conhecida a parte vencida da causa principal, a parte vencida da decisão nuclear e final do processo, podendo encontrar-se, nesse momento, aquele a quem deva ser imposta a obrigação de custas - no sentido de que se enquadra no iter processual que conduzirá a uma decisão final sobre o mérito do litígio (da acção e, eventualmente, da reconvenção) – e que permite patentear, ainda que em ulterior momento, a quem é imputável a instância recursória julgada”.</font></i><br>
</p><p><font>28ª - E, ainda, no mesmo sentido, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11.01.201118 (Processo n.º 277/08.3TBSRQ-F.L1-7, disponível em: </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>.):</font><br>
</p><p><i><font>“Ora, do nosso ponto de vista, faz sentido que, na falta de uma outra referência juridicamente atendível, seja a esta derradeira distribuição que venha a aderir toda a restante responsabilidade a que, entretanto, não houvera oportunidade, ou possibilidade, de encontrar ajustado devedor. A autonomia tributária, que porventura houvesse, cede na parte da repartição de responsabilidade; e a quem seja onerado pelo custo global e final da ação acrescerá, na mesma proporção, por se entender que a essa principal responsabilidade devem ter adesão aquelas outras conexas ou meramente instrumentais, a dívida de custas gerada pelo ato ou termo a que antes se não conseguiu conhecer responsável.</font></i><br>
</p><p><i><font>A dívida interlocutória de custas adere, nesta ótica, à dívida final, referente à contrapartida global do “pacote” de serviço de justiça prestado; nascendo a respetiva obrigação na esfera daquele que, a final, venha a ser reconhecido como o devedor das principais custas da ação. É o que comummente se chama de dívida de custas pela parte que seja vencida a final”.</font></i><br>
</p><p><font>29ª - Pelo que, em face do exposto, deverá a responsabilidade tributária inerente ao presente recurso ser relegada para a parte que seja vencida a final, fixando-se, consequentemente, “custas pela parte vencida a final”.</font><br>
</p><p><font>Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser admitido e concedido provimento ao presente Recurso de Revista Excecional, e em conformidade, revogar-se o acórdão recorrido, substituindo-o por outro que fixe as custas pela parte vencida a final, porquanto só assim se fará a acostumada justiça. </font><br>
</p><p><font>A recorrida AA apresentou requerimento no qual se manifestou no sentido da inadmissibilidade do recurso. </font><br>
</p><p><font>Por despacho do Relator, </font><u><font>a revista foi admitida e como revista normal</font></u><font>, à luz do disposto na al. d) do do nº 2 do artigo 629º do CPC, por se considerar verificada a invocada contradição entre o acórdão recorrido e o invocado acórdão fundamento.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir: </font></b><br>
</p><p><font>Decidida que se mostra a admissibilidade da revista, nos termos supra referidos (questão essa colocada nas primeiras conclusões recursórias), a única questão de que cumpre conhecer consiste em saber se, tendo a apelação da ora recorrida AA sido julgada procedente (sendo revogada a decisão da 1ª instância que determinou a suspensão da instância), as custas deviam ficar a cargo das ali recorridas e ora recorrentes, nos termos decididos ou se as mesmas deviam ficar a cargo da parte vencida a final e se, em consequência, o acórdão recorrido (que negou a requerida, neste sentido, reforma quanto a custas) deve ser revogado, nos termos ora peticionados. </font><br>
</p><p><font>Para o efeito haverá que atender aos elementos factuais, resultantes dos autos, mencionados no relatório supra, de onde e </font><u><font>em resumo resulta o seguinte</font></u><font>:</font><br>
</p><p><font>i. As sociedades autoras, ora co-recorrentes, intentaram a ação de consignação em depósito, com vista ao pagamento, por cada uma delas da última prestação relativa ao pagamento da aquisição de ações feita a determinada pessoa entretanto falecida e, perante as posições das requeridas, face à incerteza sobre a titularidade do direito;</font><br>
</p><p><font>ii. Na sequência de despacho nesse sentido, as autoras procederam ao depósito das ditas prestações – o que significa que, a partir daí, deixaram de ter qualquer interesse ou proveito no resultado final da ação;</font><br>
</p><p><font>iii. Foi por sua iniciativa que a 1ª instância decidiu ordenar a suspensão da instância até que viesse a ser proferida decisão final nos autos de inventário n.º 234 | [0 0 0 ... 0 0 0] |
DTJtu4YBgYBz1XKv5gfC | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b><div><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>O Banco Comercial Português</font></b><font> intentou, em 23 de Fevereiro de 2017, ação declarativa comum contra </font><b><font>AA, Massa Insolvente de AA</font></b><font>, representada em juízo pela Senhora Administradora de Insolvência Dra. BB, </font><b><font>CC, DD, EE</font></b><font>, pedindo que sejam julgadas improcedentes doações feitas pela primeira ré aos demais declarando-se que o Banco autor tem direito à restituição da nua propriedade ou do usufruto dos bens doados, no que se mostrar necessário à satisfação integral do crédito que identifica. </font><br>
</p><p><font>Comprovado nos autos, a …. de Dezembro de 2018, o falecimento da ré AA, em 22 de Janeiro de 2019, foi proferido o seguinte despacho:</font><br>
</p><p><i><font>“Atento o falecimento da R., documentalmente nos autos, declara-se suspensa a instância, cfr. art. 270º do C.P.C..</font></i><br>
</p><p><i><font>Notifique.”</font></i><font> </font><br>
</p><p><font>Tal despacho foi notificado às partes em 23 de Janeiro de 2019.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Em 12 de Setembro de 2019, foi proferido </font><b><font>despacho</font></b><font> nos seguintes termos: </font><br>
</p><p><i><font>“(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Volvidos que são mais de seis meses sem que as partes promovam o andamento dos autos, estando, portanto, parado o processo, declara-se deserta a instância nos termos do disposto no art. 281º do C.P.C.. </font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelo A.</font></i><br>
</p><p><i><font>Registe, notifique e oportunamente arquive. ….., 12.09.2019</font></i><br>
</p><p><i><font>A Juíza de Direito”.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de </font><u><font>recurso de apelação do autor</font></u><font>, </font><b><u><font>a Relação ...</font></u></b><font>, com um voto de vencido, julgando procedente o recurso, </font><u><font>anulou o despacho recorrido e ordenou o prosseguindo dos autos com a notificação das partes para se pronunciarem sobre os pressupostos da deserção da instância.</font></u><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Inconformados </font><b><font>interpuseram os réus</font></b><font> CC, DD, EE</font><b><font> recurso de revista</font></b><font>, no qual formularam as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
</p><p><font>1º - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão de fls.___, datado de 7 de Maio de 2020, o qual é de Revista, nos termos dos artigos 627º, 629º nº 1 e nº 2, alínea d), 631º nº 1, 637º, 638º, nº 1, 639º, nºs 1 e 2, 671º, nº 2, alíneas a) e b), 674º, nº 1, alíneas a) e b), e nº 2, 675º, nº 1, 676º, nº 1 (à contrário), e 677º, todos do C.P.C., versando sobre a parte decisória constante do mesmo.</font><br>
</p><p><font>2º - Com relevância factual para a decisão do caso em apreço, devem ser considerados os </font><br>
</p><p><font>pontos 1 a 3, constantes da decisão recorrida e que foram reproduzidos nas alegações supra.</font><br>
</p><p><font>3º - A decisão recorrida não promoveu por uma correta aplicação da lei processual, mormente dos artigos 281°, 195° e 199°, todos do C.P.C., o que fundamenta a presente Revista, tal qual permite o artigo 674º, nº 1, alíneas a) e b), do C.P.C..</font><br>
</p><p><font>4º - Com o artigo 629º, nº 2, alínea d), do C.P.C., “ampliaram-se as possibilidades de serem dirimidas pelo Supremo Tribunal de Justiça contradições jurisprudenciais que, de outro modo, poderiam persistir, pelo facto de, em regra, surgirem em ações em que, apesar de apresentarem valor processual superior à alçada da Relação, não se admite recurso de revista nos termos gerais” (Abrantes Geraldes, em “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, páginas 50 e 51).</font><br>
</p><p><font>5º - A questão discutida entre o Acórdão recorrido e os dois Acórdãos fundamento é idêntica, atual e foi decisiva nos resultados obtidos em qualquer uma dessas decisões judiciais. Por </font><br>
</p><p><font>outro lado, em qualquer uma destas decisões estamos perante os mesmos elementos de facto que levaram à subsunção jurídica - interpretação e aplicação - total e efetivamente contraditórias, tendo por base a mesma norma jurídica.</font><br>
</p><p><font>6º - O presente recurso preenche, de igual forma, os requisitos do valor e da sucumbência, incidindo o mesmo sobre um Acórdão que proferiu uma decisão interlocutória quanto à relação processual constituída nos autos, que tem efeitos de caso julgado formal.</font><br>
</p><p><font>7º - Ademais, sobre a situação em apreço não se verifica dupla conforme, nem sequer existe Acórdão de uniformização de jurisprudência sobre a mesma questão fundamental de Direito e ao abrigo da mesma legislação.</font><br>
</p><p><font>8º - Determina, o n° 2 do referido artigo 671° do C.P.C. que os Acórdãos que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista (b) quando estejam em contradição com outro já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, ou (a) nos casos em que o recurso é sempre admissível. Ora, o recurso apresentado pelos Recorrentes, segue precisamente este iter processual, ou seja, primeiramente o recurso terá por fundamento a situação prevista na alínea b) do referido normativo, e, seguidamente, caso se entenda não ser admissível por esta via, o que se admite por mera cautela de patrocínio, então o recurso é igualmente submetido tendo por base o previsto na alínea a) da citada norma legal, por referência ao artigo 629º, nº 2, alínea d), do C.P.C..</font><br>
</p><p><font>9º - A admissibilidade do presente recurso está expressamente reconhecida no douto Acórdão do S.T.J., datado de 08-03-2018, processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1, acessível em </font><font>www.dgsi.pt</font><font>, o qual é um dos Acórdãos fundamento mencionados nos presentes autos e que incide sobre uma decisão interlocutória tomada quanto à relação processual, tendo sido igualmente proferida pelo Tribunal de primeira instância numa situação factual em tudo idêntica à que se discute nos presentes autos.</font><br>
</p><p><font>10º - Relativamente a esta admissibilidade invoca-se, como Acórdão fundamento o proferido pelo S.T.J. datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1, o qual se junta com o presente recurso, tendo o mesmo transitado em julgado, bem como assim como segundo Acórdão fundamento o proferido pelo S.T.J., datado de 08-03-2018, processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1, também transitado em julgado, cuja cópia se junta, ambos acessíveis em </font><a><u><font>www.dgsi.pt.</font></u></a><br>
</p><p><font>11º - No que toca às situações da alínea a), caso o entendimento perfilhado seja de que tem de ser obrigatoriamente um Acórdão proferido por uma Relação, contrariamente ao fundamentado supra, então desde já se indica o Acórdão fundamento proferido pelo T.R.L., datado de 24-10-2019, processo nº 2165/17.3T8CSC.L1.L1-2, tendo o mesmo transitado em julgado, bem como assim com o segundo Acórdão fundamento proferido pelo T.R.P., datado de 11-04-2019, processo n° 10135/05.8TBMAI.P1, também transitado em julgado, ambos acessíveis em </font><font>www.dgsi.pt.</font><font>, desde já se requerendo o prazo de 10 (dez) dias para efeitos da sua junção, contados após a prolação do despacho em que figure entendimento distinto.</font><br>
</p><p><font>12º - A deserção da instância depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:</font><br>
</p><p><font>a) A inércia de qualquer das partes em promover o andamento do processo, imputável a título de negligência (requisito subjetivo); </font><br>
</p><p><font>e b) A paragem do processo por tempo superior a seis meses, a contar do momento em que a parte devia ter promovido esse andamento (requisito objetivo).</font><br>
</p><p><font>13º - “A conduta negligente conducente à deserção da instância consubstancia-se numa situação de inércia imputável à parte, ou seja, em que esteja em causa um ato ou atººlividade unicamente dependente da sua iniciativa, sendo o caso mais flagrante o da suspensão da instância por óbito de alguma das partes, a aguardar a habilitação dos sucessores.” (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, em “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, Almedina, 2018, páginas 328 e 329) (cfr., no mesmo sentido, Acórdão do S.T.J., datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1, disponível em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>).</font><br>
</p><p><font>14º - Era à Autora que cabia promover o competente incidente de habilitação de herdeiros, tal como resulta das disposições conjugadas dos artigos 269º, nº 1, alínea a), 270º, 275º, 276º, nº 1, alínea a), e 351º, nºs 1 e 2, do C.P.C.. </font><br>
</p><p><font>15º - Com o despacho de 21 de Janeiro de 2019 a Autora ficou bem consciente de que estava onerada com a iniciativa de dinamizar a instância e que a sua inércia processual por mais de 6 meses conduziria à deserção da instância, tendo sido por via deste despacho que as partes ficaram cientes que tinham de se pronunciar e requerer o que tivessem por conveniente </font><br>
</p><p><font>16º - A decisão recorrida, que extingue os autos, é proferida não seis meses após este despacho de suspensão da instância, mas nada menos do que após cerca de sete meses e meio, o que se verificou por negligência da Autora.</font><br>
</p><p><font>17º - O Tribunal de primeira instância, perante a situação em concreto, não estava obrigado a praticar mais qualquer diligência prévia à decisão de extinção da instância (cfr., no mesmo sentido, os doutos Acórdãos do S.T.J., datado de 18-09-2018, processo nº 2096/14.9T8LOU-D.P1.S1, o datado de 05-07-2018, processo nº 5314/05.0TVLSB.L1.S2, o datado de 14-12-2016,processo nº 105/14.0TVLSB.G1.S1, e o datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.TBBNV-H.E1.S1; e o douto Acórdão do T.R.P., datado de 20-11-2017, processo nº 708/11.5TTMTS-A.P1, todos acessíveis em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>).</font><br>
</p><p><font>18º - Destarte, ainda que o artigo 3º do C.P.C. consagre o princípio do contraditório e o artigo 7° do C.P.C. estabeleça o dever de cooperação mútua entre os diversos intervenientes processuais, não podem estes preceitos serem usados como mecanismo de subversão da dinâmica de forças que é o processo civil ou impedir a aplicação, no domínio do processo, da máxima constante do artigo 6° do Código Civil. Mesmo no domínio processual civil, a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas. </font><br>
</p><p><font>19º - Face ao exposto, não podem os Recorrentes concordar com o entendimento que vai no sentido do Acórdão recorrido, em que não foi observado o dever comunicar às partes que o processo aguardava o seu impulso e para exercer o contraditório. Salvo devido respeito por opinião contrária, os autos documentam já ter sido emitido despacho de suspensão da instância e do mesmo decorre um “aviso” à necessidade de impulso processual, pelo que outro entendimento violaria o princípio do dispositivo e da igualdade de partes. </font><br>
</p><p><font>20º - No presente recurso importa clarificar as seguintes questões processuais, a saber: (i) não obrigação da audição das partes; (ii) ónus de impulso processual a cargo da Autora; e (iii) regime de reacção processual à declaração da deserção da instância.</font><br>
</p><p><font>21º - No douto Acórdão recorrido é expresso o entendimento que existe dever do Juiz determinar a audição das partes, antes de proferir despacho a decretar a deserção da instância, por forma a que seja, antes daquela decisão, apreciada e valorada a conduta da Autora, permitindo a avaliação jurisdicional para decidir se ocorreu negligência sua em promover o andamento do processo.</font><br>
</p><p><font>22º - No primeiro Acórdão fundamento - o Acórdão do S.T.J., datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1 -, ficou claramente afirmado posição totalmente oposta à dos presentes autos, designadamente que a falta de impulso processual é automaticamente considerado como conduta negligente da parte, inexistindo uma obrigação/vinculação do Tribunal, em face desta postura e não havendo qualquer sinal em sentido oposto, para se proceder à audição prévia das partes, tendo precisamente como propósito averiguar da negligência sobre o sujeito processual que tem o ónus de precisamente impulsionar os autos, sobretudo quando existe prévio despacho que determinou a suspensão da instância.</font><br>
</p><p><font>23º - Já no segundo Acórdão fundamento - o Acórdão do S.T.J., datado de 08-03-2018, processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1 -, vem corroborar a posição defendida pelo primeiro Acórdão fundamento, indo mais longe ao sustentar que não tem o Tribunal qualquer dever de advertir a parte que a inércia da Autora, por mais de 6 meses, determinaria a deserção da instância.</font><br>
</p><p><font>24º - Pelo que, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, o Acórdão recorrido contraria não só a corrente jurisprudencial dominante nos Tribunais Superiores, mas está em manifesta oposição com os dois indicados Acórdãos fundamento.</font><br>
</p><p><font>25º - Existe abundante jurisprudência, que são unânimes em afirmar que não sendo automática a deserção da instância pelo decurso do prazo de seis meses, o julgador, antes de proferir o despacho a que alude o n° 4 do artigo 281° do C.P.C., não tem qualquer obrigação legal de ouvir previamente as partes, designadamente: </font><br>
</p><p><font>a) Acórdão do S.T.J., datado de 18-09-2018, processo nº 2096/14.9T8LOU-D.P1.S1; b) Acórdão do S.T.J., datado de 05-07-2018, processo nº 5314/05.0TVLSB.L1.S2; c) Acórdão do S.T.J., datado de 08-03-2018, processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1; d) Acórdão do S.T.J., datado de 22-02-2018, processo nº 473/14.4T8SCR.L1.S2;e) Acórdão do S.T.J., datado de 19-09-2017, revista nº 1572/07.4TBCTX.E1.S1; f) Acórdão do S.T.J., datado de 04-05-2017, revista nº 728/08.7.TBSSB.E1.S1;g) Acórdão do S.T.J., datado de 14-12-2016, processo nº 105/14.0TVLSB.G1.S1;h) Acórdão do S.T.J., datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1;i) Acórdão do S.T.J., datado de 01-03-2016, processo nº 106/03; j) Acórdão do T.R.L., datado de 20-02-2020, processo nº 268/16.0/8OER-A.L1-2;k) Acórdão do T.R.L., datado de 24-10-2019, processo nº 2165/17.3T8CSC.L1.L1-2; l) Acórdão do T.R.L. datado de 22-01-2019, processo nº 17312/16.4T8SNT.L1-7; m) Acórdão do T.R.L. datado de 12-07-2018, processo nº 563/14.3YXLSB.L1-7; n) Acórdão do T.R.L. datado de 07-06-2018, processo nº 1807/12.1TVLSB.L1; o) Acórdão do T.R.L. datado de 220-12-2016, processo nº 3422/15.9T8LSB.L1; p) Acórdão do T.R.P. datado de 11-04-2019, processo nº 10135/05.8TBMAI.P1; q) Acórdão do T.R.P. datado de 06-02-2018, processo nº 17954/16.8T8PRT.P1; r) Acórdão do T.R.P. datado de 2º-11-2017, processo nº 708/11.5TTMTS-A.P1; s) Acórdão do T.R.E. datado de 30-05-2019, processo nº 170/17.9T8SRP.E1; t) Acórdão do T.R.G. datado de 212-09-2019, processo nº 6748/17.3T8VNF.G1; u) Acórdão do T.R.G. datado de 09-11-2017, processo nº 275/05.9TBMTR.G1; v) Acórdão do T.R.G. datado de 15-01-2015, processo nº 990/14.6T8BRG.G1.</font><br>
</p><p><font>26º - E a situação fáctica decorrente da relação processual é, em tudo, idêntica entre o que ocorre nos autos e os Acórdãos fundamento, a saber: (i) em todos os processos foi proferida decisão judicial que decretou deserta a instância e extinto o processo; sendo que (ii) o que esteve na base de tais despachos foi a ausência de intervenção processual das partes, no processo, por mais de seis meses; (iii) no Acórdão recorrido e no primeiro Acórdão fundamento a falta de impulso processual deriva do falecimento do Réu, não se tendo requerido o respetivo incidente de habilitação; (iv) os despachos que declararam extintas as instâncias não foram precedidos de qualquer convite prévio à pronúncia sobre a negligência processual; (v) que a falta desse convite ou do alerta à cominação constante do artigo 281° do C.P.C. constitui nulidade processual.</font><br>
</p><p><font>27º - No processo n° 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1 (primeiro Acórdão fundamento), pronunciou-se este Supremo Tribunal de Justiça no sentido de, tratando-se na declaração de deserção simplesmente de fazer actuar um efeito processual que, associado a certo comportamento omissivo da parte, está diretamente estabelecido na lei e que em nada se resolve numa questão de facto, numa questão de prova nem numa questão de direito material suscitada pela contraparte, nem tão-pouco numa decisão-surpresa, nada há a contraditar. Isto só não seria assim se acaso a lei determinasse que nenhum despacho relativo aos termos do processo poderia ser proferido sem uma prévia audição das partes. Mas não determina, estando ela própria recheada de hipóteses em que ao silêncio ou inação das partes se segue imediatamente (isto é, sem prévia audição das partes) a declaração judicial do efeito processual cominatório que lhe está associado.</font><br>
</p><p><font>28º - Neste mesmo sentido, o processo n° 225/15.4T8VNG.P1-A.S1 (segundo Acórdão fundamento), pronunciou-se, novamente, este Digníssimo Tribunal a propósito da verificação dos pressupostos de deserção da instância, determinando, sem prejuízo do mais, que o aludido preceito não prescreve que a decisão a considerar deserta a instância seja proferida, notificando-se previamente as partes para se pronunciarem sobre se estão efetivamente verificados os pressupostos que a determinam.</font><br>
</p><p><font>29º - Quer no Acórdão recorrido quer nestes dois Acórdãos fundamento a instância foi avaliada à luz do atual artigo 281° do C.P.C., pelo que a manifesta contração e oposição existente entre aquele o Acórdão recorrido e aqueles dois outros Acórdãos constitui a génese e fundamento do presente recurso, tendo em vista a manutenção do decidido pelo Tribunal de primeira instância, pois que a mesma configura - tal como nos Acórdãos fundamento – uma correta aplicação daquele normativo.</font><br>
</p><p><font>30º - Quando a doutrina e a jurisprudência se referem à natureza não automática da deserção, o que, de facto, pretendem sublinhar é que, hodiernamente, a mesma carece de ser afirmada por despacho - tal qual o foi presentemente, por via do despacho que determinou a deserção da instância, o qual se destina tão só a concluir o que naturalmente decorre dos pressupostos da deserção.</font><br>
</p><p><font>31º - A deserção da instância a que se refere o presente recurso ocorreu em 2 de Setembro de 2019, sendo que a Autora apenas impulsiona os autos em 1 de Outubro de 2019, ou seja, após a prolação do despacho que determinou a extinção dos autos (datado de 12 de Setembro de 2019 e notificado às partes em 16 do mesmo mês).</font><br>
</p><p><font>32º - O comportamento negligente que opera para efeitos do artigo 281° do C.P.C., é, como a própria norma o indica, o comportamento processual, sem necessidade de qualquer interpretação corretiva deste preceito legal.</font><br>
</p><p><font>33º - Os artigos 4° e 6º, ambos do C.P.C., proíbem que se elimine o ónus de impulso processual imposto por lei às partes.</font><br>
</p><p><font>34º - Os Acórdãos que vêm citados na decisão sob recurso estão, no essencial, de acordo com a tese defendida pelos Recorrentes, com exceção de apenas dois Acórdãos, em que os elementos de facto em discussão são totalmente distintos do que ocorre no caso em apreço. </font><br>
</p><p><font>35º - Defendeu-se também no douto Acórdão do S.T.J., datado de 14-12-2016, processo nº 105/14.0TVLSB.G1.S1, que: “se a lei aqui não cuidou de impor a prévia audição das partes foi porque considerou que a fixação perentória da deserção da instância nos termos assinalados a impor, no caso de inércia, a prolação de decisão leva a que esta não possa considerar-se inesperada ou surpreendente”.</font><br>
</p><p><font>36º - Mas a este propósito, e em clara oposição ao Acórdão recorrido, sustenta-se no primeiro Acórdão fundamento que: “se a parte não promove o andamento do processo e nenhuma justificação apresenta, e se nada existe no processo que inculque a ideia de que a inação se deve a causas estranhas à vontade da parte, está apoditicamente constituída uma situação de desinteresse, logo de negligência”.</font><br>
</p><p><font>37º - O Acórdão recorrido está, de igual modo, em oposição com a doutrina mais relevante nesta matéria, designadamente com a posição do ilustre professor Miguel Teixeira de Sousa, em comentário ao douto Acórdão do T.R.G., datado de 12-10-2017, processo nº 329/13.8TJVNF.G1, no blog do IPCC (no sítio </font><a><u><font>https://blogippc.blogspot.com/</font></u></a><font>).</font><br>
</p><p><font>38º - Entende-se que o dever de audição prévia não se impõe como regra geral e muito menos nos casos em que tenha sido cumprido o dever de prevenção (através do despacho a suspender a instância, para que a consequência da sua inação é a da deserção da instância findo o prazo de 6 meses). E é aqui que também a decisão recorrida não colheu bem o que decorre do regime legal do artigo 281º do C.P.C., nem da interpretação largamente maioritária da jurisprudência, na medida em que não só o Tribunal de primeira instância tinha suspendido a instância, o que por si só leva a uma concreta advertência para o passo processual seguinte que não poderia ter sido ignorado pela Autora, como também essa advertência é legal, não existindo qualquer necessidade de a repisar, nem o artigo 3º, nº 3, do C.P.C, a impõe. </font><br>
</p><p><font>39º - E a Autora, como grande litigante que é (tendo pago taxa de justiça em conformidade) simplesmente não pode invocar, como o fez, o desconhecimento do regime legal da deserção.</font><br>
</p><p><font>A Autora tem a especial e acrescida obrigação de o conhecer, assim como deveria ter atentado que o Tribunal de primeira instância suspendeu os autos, logo após ter obtido conhecimento do falecimento da Ré. Porém, a nada disto a Autora deu a necessária relevância ou créditos, optando por uma postura de total inoperância e desligamento dos presentes autos, que forçosamente terá de ter as consequências já decretadas da deserção da instância.</font><br>
</p><p><font>40º - Donde não se vislumbra fundamento bastante, designadamente à luz do princípio do </font><br>
</p><p><font>contraditório ou de qualquer outro, para a prévia audição da Autora antes de proferido o despacho recorrido, com vista a conferir da sua negligência na deserção da instância.</font><br>
</p><p><font>41º - Em suma, é inevitável que só a Autora pode ser responsabilizada pela paragem do processo o que não pode deixar de ser sancionado, nos termos do referido nº 1 do artigo 281º do C.P.C., com a deserção da instância, conforme se decidiu em sede de Tribunal de primeira instância. </font><br>
</p><p><font>42º - É doutrina pacífica caber à aqui Autora o impulso processual, nomeadamente incumbe-lhe o ónus de requerer a habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa da parte (artigo 351º do C.P.C.).</font><br>
</p><p><font>43º - O douto Acórdão recorrido, se bem o entendemos, justificou a falta de impulso processual por banda da Autora com o desconhecimento da mesma do dever para tal.</font><br>
</p><p><font>44º - Ao invés e em oposição, no Acórdão fundamento - o Acórdão do S.T.J., datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1 - que retrata uma situação factual idêntica à que ocorre nos presentes autos, impõe não só esse impulso à Autora, como ainda retrata a sua conduta processual como verdadeiramente omissiva, classificando-a como incumprimento de um dever que tem como natural consequência a determinada deserção da instância.</font><br>
</p><p><font>45º - Existe abundante jurisprudência, que são unânimes em afirmar que incumbe à Autora o ónus processual de impulsionar a instância, sob pena de ser determinada a sua deserção, designadamente:</font><br>
</p><p><font>a) Acórdão do S.T.J., datado de 05-07-2018, processo nº 105415/12.2YIPRT.P1.S1; b) Acórdão do S.T.J., datado de 22-02-2018, processo nº 473/14.4T8SCR.L1.S2; c) Acórdão do T.R.L., datado de 20-02-2020, processo nº 268/16.0T8OER-A.L1-2; d) Acórdão do T.R.L., datado de 07-06-2018, processo nº 1807/12.1TVLSB.L1; e e) Acórdão do T.R.G., datado de 12-09-2019, processo n° 6748/17.3T8VNF.G1.</font><br>
</p><p><font>46º - Nos casos em que a suspensão da instância é motivada pelo falecimento de alguma das partes (artigo 269º, nº 1, alínea a), do C.P.C.), resulta clarividente que a partir de então passa a recair sobre a parte (no caso a Autora) o ónus de promover a habilitação dos sucessores, como o revelam os artigos 276º, nº 1, alínea a) e 351º, ambos do C.P.C.. A não ser que a parte revele dificuldades na identificação daqueles ou na obtenção da necessária documentação dentro do referido prazo de 6 meses ou de outro prazo que resulte de alguma prorrogação, o que não se verificou no caso em apreço e assim o vem reconhecido no Acórdão recorrido, verificar-se-á uma situação de inércia imputável à parte, nos termos do nº 3, com efeitos na deserção da instância, como se decidiu no primeiro Acórdão fundamento invocado.</font><br>
</p><p><font>47º - No caso dos autos, decorre do despacho proferido em 22 de Janeiro de 2019 que o ónus de averiguar os dados relativamente às partes falecidas não incumbe ao Tribunal, mas sim à parte de quem depende o impulso processual, o que resulta claramente do disposto no artigo 270º do C.P.C., que vem citado nesse mesmo despacho. Destarte, não podia o Tribunal lançar mão do poder-dever de gestão processual para se substituir à parte, a quem incumbia o ónus de impulso processual subsequente, tal como decorre do nº 2 do citado artigo 6º do C.P.C..</font><br>
</p><p><font>48º - Sem conceder, se violação houvesse dos referidos deveres, tal não podia ser conhecido pelo Tribunal a quo na medida em que esta não é uma nulidade de conhecimento oficioso e não foi, atempadamente, arguida junto daquele Tribunal de primeira instância, tal qual, aliás, foi sufragado no Acórdão fundamento proferido pelo S.T.J., datado de 08-03-2018, processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1, acessível em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>. </font><br>
</p><p><font>49º - Nos termos do artigo 195° do C.P.C., “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreva constituem uma nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”, sendo que a declaração de nulidade do ato, ao abrigo do n° 1 do artigo 195° do C.P.C., determina a nulidade dos termos subsequentes que dele dependam absolutamente, tendo, esta nulidade secundária, de ser expressamente arguida pelas partes e no prazo de 10 dias a contar do seu conhecimento.</font><br>
</p><p><font>50º - Ainda que se entendesse que o Tribunal de primeira instância omitiu, indevidamente, o dever de cooperação ou desrespeitou o princípio do contraditório, não poderia, tal omissão ser sindicada nos moldes pretendidos pela Autora e que mereceram acolhimento junto do Tribunal a quo.</font><br>
</p><p><font>51º - Isto porque, nesse enquadramento, o que se ataca não é, afinal, o despacho recorrido, mas a omissão de um ato processual que lhe deveria ter antecedido.</font><br>
</p><p><font>52º - Ora, as normas constantes da Secção VII, do Capítulo I, do Título I do Código de Processo Civil são passíveis de aplicação aos atos do Tribunal.</font><br>
</p><p><font>53º - No caso sob julgamento, a Autora recorreu de um despacho quando a instância já se encontrava finda desde 26 de Setembro de 2019. Quisera a Autora atacar os efeitos da deserção por força da omissão de um dever, deveria ter sindicado pela omissão de um ato processual - o pretenso dever do Tribunal em ouvir as partes -, em momento oportuno e local próprio, nos termos do artigo 195° do C.P.C., o que, assim, lhe permitiria lançar mão do efeito ablativo da nulidade que apagaria a deserção, entretanto, alegada.</font><br>
</p><p><font>54º - Todavia, na medida em que, quando confrontado com o despacho de deserção da instância, a Autora se limitou a recorrer, deixou de arguir a nulidade de omissão do ato processual por parte do Tribunal e, assim, de a poder invocar, nesta sede, como fundamente o de recurso, a referida omissão e de permitir à douta Relação sobre ela sindicar.</font><br>
</p><p><font>55º - Dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se. Daqui resulta que, não tendo a Autora reclamado da nulidade emergente da falta de audição prévia das partes, não pode a Autora recorrer com tal fundamento. </font><br>
</p><p><font>56º - Por último, no que toca ao recurso interposto por via do previsto na alínea a) do artigo 671º, nº 1, do C.P.C., para efeitos do indicado Acórdão fundamento o proferido pelo T.R.L., datado de 24-10-2019, processo nº 2165/17.3T8CSC.L1.L1-2, tendo o mesmo transitado em julgado, bem como assim com do segundo Acórdão fundamento o proferido pelo T.R.P., datado de 11-04-2019, processo n° 10135/05.8TBMAI.P1, também transitado em julgado, reitera-se a este propósito tudo o que oportunamente se alegou supra nos pontos III.6, III.7, III.8 e III.9, na medida em que também todos os requisitos legais previstos e invocados encontram-se igualmente preenchidos quanto a estas decisões judiciais, nos precisos termos supra alegados e que não se repetirá por desnecessário e inútil.</font><br>
</p><p><font>57º - Em face de tudo o que vem exposto, a decisão recorrida em apreço cometeu um erro de julgamento que vicia materialmente a decisão sob recurso, por violação do disposto nos artigos 195°, 199° e 281°, todos do C.P.C., devendo a mesma ser integralmente revogada conforme consta das presentes alegações.</font><br>
</p><p><font>Termos em que, deverá ter provimento o presente recurso, revogando-se o douto Acórdão recorrido, na sua parte dispositiva de que ora se recorre, a fim de se fazer a tão costumada JUSTIÇA.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Não foram apesentadas contra-alegações.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Os recorrentes vieram a juntar aos autos certidões dos acórdãos invocados como acórdãos fundamento.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Subidos os autos ao STJ, na sequência de convite do Relator aos recorrentes para especificarem qual dos acórdãos indicados escolhiam como acórdão fundamento, os mesmos vieram indicar como acórdão fundamento o acórdão do STJ de 08.03.2018, proferido no processo nº 225/15.4T8VNG.P1-A.S1.</font><br>
</p><p><font>E por despacho do Relator, </font><u><font>foi proferida decisão no sentido da admissão da revista,</font></u><font> ao abrigo do disposto na al. b) do nº 2 do artigo 671º do CPC, por se considerar verificada a invocada contradição, a que se alude naquele preceito, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b><font> </font><br>
</p><p><font> Atento o teor das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, e decidida que a admissibilidade da revista, a questão de que cumpre conhecer consiste em saber se a deserção da instância devia ser declarada, nos termos em que o foi, na 1ª instância, sem necessidade da prévia audição das partes sobre a verificação dos pressupostos da deserção da instância.</font><br>
</p><p><font> Para o efeito, haverá que ter em consideração os elementos factuais emergentes dos autos e referidos no relatório supra. </font><br>
</p><p><font> Conforme supra referido, tendo decorrido mais de seis meses após a notificação às partes do despacho que determinou a suspensão da instância fundada no falecimento da ré AA, sem que tivesse sido requerida a respetiva habilitação de herdeiros, </font><b><font>a 1ª instância</font></b><font> declarou, de imediato e sem a prévia audição das partes, a deserção da instância, ao abrigo do disposto no artigo 281º do CPC, em cujo nº 1 se estabelece que </font><i><font>“sem prejuízo do disposto no nº 5 </font></i><font>(ora sem interesse) </font><i><font>considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”. </font></i><br>
</p><p><font>Por sua vez, </font><b><font>a Relação </font></b><font>(muito embora reconhecendo ser divers | [0 0 0 ... 0 0 0] |
MzJru4YBgYBz1XKvVQU0 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font> </font><div><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<font> </font>
<p><font> </font><br>
</p><p><b><font>AA</font></b><font>, que também usa profissionalmente o nome de AA, advogado, intentou ação declarativa comum contra </font><b><font>BB, </font></b><font>pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe a quantia global de € 86.228,62 acrescida do montante de €103,94 de juros de mora vencidos, bem como nos vincendos, à taxa legal de 4% ao ano.</font><br>
</p><p><font>Alegou para o efeito e em resumo que aquele valor peticionado corresponde a € 70.000,00 de honorários, €104,57 de despesas, ambos acrescidos de IVA à taxa legal de 23%, este no valor total de €16.124,05, sendo tais valores referentes a serviços de advocacia prestados pelo autor ao réu, mediante prévia solicitação deste, tendo patrocinado o réu em processos de que os presentes autos são apenso, sendo que o réu, ao longo dos 8 anos que durou a prestação de serviços, jamais deixou importância alguma por conta dos mesmos ou de despesas, estando tais serviços e despesas devidamente discriminados na nota de honorários e despesas que foi enviada ao réu por carta datada de 15-09-2017 e por este recebida a 20-09-2017 mas que este não pagou.</font><br>
</p><p><font>O réu, na sua contestação, defendeu-se por impugnação discordando do montante peticionado a título de honorários.</font><br>
</p><p><font>Foi solicitado ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados laudo sobre os honorários peticionados e discriminados nos autos, o qual veio a ser junto ao processo sem reclamação.</font>
</p><p><font>Findos os articulados, foi designada a audiência prévia, na qual, além do mais, foi fixado à causa o valor de € 86.332,56.</font>
</p><p><font>Realizada a audiência final, foi proferida </font><b><u><font>sentença</font></u></b><font>, na qual sendo a ação julgada parcialmente procedente, se decidiu </font><i><font>condenar</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>réu</font></i><font> </font><i><font>BB</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>pagar</font></i><font> </font><i><font>ao</font></i><font> </font><i><font>A.</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>quantia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>€40.104,57</font></i><font> </font><i><font>(quarenta</font></i><font> </font><i><font>mil,</font></i><font> </font><i><font>cento</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>quatro</font></i><font> </font><i><font>euros</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>cinquenta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>sete</font></i><font> </font><i><font>cêntimos),</font></i><font> </font><i><font>acrescidos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>IVA</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>taxa</font></i><font> </font><i><font>legal,</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>juros</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>mora</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>taxa</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>4%</font></i><font> </font><i><font>desde</font></i><font> </font><i><font>20/9/2017</font></i><font> </font><i><font>até</font></i><font> </font><i><font>integral</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>efetivo</font></i><font> </font><i><font>pagamento.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e </font><u><font>no âmbito de recurso de apelação do réu</font></u><font>, </font><b><font>a Relação de ........ </font></b><font>(após julgar improcedentes as nulidades invocadas e rejeitar a impugnação da matéria de facto com fundamento no incumprimento dos ónus do artigo 640.º, n.ºs 1, al. b), e 2, al. a), do CPC) </font><u><font>confirmou a sentença recorrida.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Inconformado, </font><b><u><font>interpôs o réu apelante o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font>Da admissibilidade do recurso:</font><br>
</p><p><font>1. O recorrente visa no presente recurso contestar o acórdão recorrido na parte em que, considerando incumprido o ónus da alínea b) do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do 640</font><br>
</p><p><font>C.PCivil, que rejeitou a impugnação da matéria de facto suscitada na apelação, não existindo qualquer obstáculo à reapreciação da mesma.</font><br>
</p><p><font>2. A rejeição pelo Tribunal da Relação do ..... do recurso em matéria de facto, constitui uma ilegalidade cometida no próprio Tribunal da Relação, de acordo com o que tem sido entendimento unânime da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que entende que nunca se pode considerar nestes casos, que haja dupla conforme, sendo muitos os acórdãos neste sentido: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc.:152/18.3T8GRD.C1.S1 de 18-06-2019 in www.dgsi.pt onde se refere:“ “I-Tendo o recurso de revista por fundamento a acusação de que a Relação agiu de forma indevida ao ter rejeitado recurso em matéria de facto, a censura dirige-se a uma ilegalidade cometida ex novo na própria Relação. Nesta hipótese nunca se pode formar, por natureza, uma situação de dupla conformidade decisório das instâncias.”, no mesmo sentido prescreve o Acórdão deste Supremo de 27.10.2016(proc.nº 3176/11.8TBBCL.G1.S1, em www.dgsi.pt), “em caso de rejeição do recurso em matéria de facto estamos perante uma decisão criada ex novo no próprio tribunal da Relação, sem qualquer paralelo, afinidade ou contiguidade com a decisão produzida na 1ª instância, pelo que nunca se poderá formar, por natureza, uma dupla conformidade decisória. Nestas circunstâncias pode deve o Supremo Tribunal de Justiça verificar em sede de revista ordinária se a Relação exerceu de forma conveniente os seus poderes processuais (v. a propósito a alínea b) do nº 1 do art. 674º do C.P.Civil)”; e ainda 13-10-2016 - Revista n.º 3257/13.3TBGMR.G1.S1 - 2.ª Secção - Tavares de Paiva (Relator) - Abrantes Geraldes - Tomé Gomes : “I - Existindo apenas a decisão da Relação sobre a concreta questão do incumprimento pelos apelantes, no recurso sobre a impugnação da matéria de facto, do ónus fixado no art. 640.º, n.º 1, do CPC, não se perfila a dupla conformidade que pressupõe duas apreciações sucessivas da mesma questão de direito em que a última é confirmativa, sendo, portanto, admissível a revista.”; consolidando-se este entendimento também pela doutrina como refere Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª ed., p. 255), citando a propósito jurisprudência vária, “(…) o Supremo reiteradamente vem assumindo o entendimento de que, embora não possa censurar o uso feito pela Relação dos poderes conferidos pelo art. 662º, nºs 1 e 2, já pode verificar se a Relação, ao usar tais poderes, agiu dentro dos limites traçados pela lei para os exercer”.</font><br>
</p><p><font>3. A competência para apurar a matéria de facto relevante para a solução do litígio radica nas instâncias, cabendo ao Supremo Tribunal de Justiça, salvo situações de exceção legalmente previstas, conhecer apenas da matéria de direito (cfr. artigo 46.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário - Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto – e artigos 662º, n.º 4, 674º, n.ºs 1 a 3, e 682º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil). É, neste âmbito que, inequivocamente, se insere, como decorre do artigo 674.º, n.º 1, alínea b), do Cód. De Proc. Civil, ou seja, a violação e errada aplicação da lei de processo, pelo acórdão recorrido, mais propriamente o disposto no artigo 640.º, n.º 1 do C. P. Civil, que fixa o ónus do recorrente no caso de impugnação da decisão relativa à matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>4. A simples leitura das alegações de Recurso para o Tribunal da Relação permite concluir pelo integral cumprimento do ónus referido no artigo 640.º, n.º 1 e 2 do C. P. Civil, tendo o ora recorrente quer no corpo do recurso, quer nas conclusões, identificado concretamente os pontos de facto tidos por mal julgados, indicado os meios de prova que na sua opinião impunham decisão diversa, sobre os pontos de facto impugnados, e mencionado também o sentido da decisão que deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo indicado também os depoimentos que, na sua perspetiva, justificam a pretendida alteração da matéria de facto, transcrevendo fielmente as passagens das gravações tidas por relevantes relativamente às partes que interessava analisar e conferir, tendo indicado o início das gravações de cada uma delas, sendo que, as transcrições dos depoimentos das testemunhas e dos restantes intervenientes processuais ouvidos na audiência de julgamento, são totalmente fiéis, correspondendo na integra ao que as mesmas disseram, traduzindo-se numa transcrição absolutamente idónea, sendo que, imediatamente antes à mencionada transcrição está colocado o nome de quem falou seguido e um — e de aspas, (de acordo com as regras gramaticais portuguesas) dentro das quais se transcreve as passagens dos depoimentos de forma absolutamente fiel (ipis verbis) , inserindo-se as palavras exatas que o interveniente processual proferiu, pelo que não se entende a decisão de rejeição da matéria de facto, pelo que, tudo mais não são juízos de valores, mas sim alegações, baseadas no decorrer da audiência e nessas gravações que influenciaram a decisão da causa e na matéria de facto provada e não provada, sendo que se tais alegações estão a seguir a uma transcrição ou no artigo em separado, é apenas por uma questão de ser mais percetível o ponto de vista da alegação.</font><br>
</p><p><font>5. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que a indicação com exatidão das passagens da gravação pode ser colmatada ou substituída pela transcrição dos excertos que o recorrente entenda serem relevantes.</font><br>
</p><p><font>6. Sobre tal matéria já se pronunciou este inúmeras vezes o Supremo Tribunal de Justiça.: Acórdão de 10.12.2015 (processo n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www.stj/jurisprudência/sumários) “já houve oportunidade de se deixar dito que a alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do Código de Processo Civil deve ser interpretada no sentido de que a impugnação da matéria de facto com base em prova gravada tanto se pode fazer mediante a indicação dos concretos segmentos da gravação como mediante a transcrição dele.”; 06-12-2016 - Revista n.º 2373/11.0TBFAR.E1.S1 - 1.ª Secção - Helder Roque (Relator) * - Gabriel Catarino - Roque Nogueira –: (...)IV - A nova filosofia enformadora do processo civil, iniciada com a Reforma de 1995/96 e prosseguida, posteriormente, com as sucessivas alterações processuais nesta matéria, enfatiza a acentuada quebra do princípio do dispositivo de parte, vindo a recentrar no juiz, não só a condução, como, também, a iniciativa processual, sendo, não só, o terceiro independente e imparcial que decide o conflito que lhe é colocado pelas partes, mas, igualmente, o prossecutor, no âmbito do princípio do inquisitório, de todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer, atento o estipulado pelos arts. 411.º e 6.º, n.os 1 e 2, ambos do CPC. V - Tendo a autora identificado os pontos da matéria de facto que considerava, incorretamente, julgados, por referência aos quesitos da base instrutória, indicado o teor dos documentos e dos depoimentos das testemunhas que entendeu mal valorados, apresentado a respetiva transcrição, da qual consta, relativamente a cada depoimento, a sua localização no instrumento técnico que incorporou a gravação da audiência, avançando o sentido probatório que, na sua perspetiva, deveria ter tido lugar, relativamente a cada quesito e meio de prova, se os mesmos tivessem sido, devidamente, valorados, cumpriu, no essencial, o comando legal, a que alude o art. 640.º, n.os 1, al. b) e n.º 2, al. a), do CPC, pelo que deveria o tribunal da Relação ter procedido à reapreciação da matéria de facto; 18-10-2016- Revista n.º 2545/11.8TVLSB.L1.S2 - 1.ª Secção - Garcia Calejo (Relator) * - Helder Roque - Gabriel Catarino: “ Tendo a interessada (recorrida) indicado as passagens da gravação em que fundava a sua pretensão de alteração do dito ponto da matéria de facto, o tribunal recorrido não podia, com esse fundamento, recusar a correspondente reapreciação”; 22-02-2017-RevistaSTJ n.º 638/13.6TBLRA.C1.S1 - 7.ª Secção- Silva Gonçalves (Relator) *-António Joaquim Piçarra - Fernanda Isabel Pereira: “Porque se não mostram verificados revelados escolhos capazes de obstar a que a Relação prossiga na apreciação do erro sobre o julgamento da matéria de facto – tem ao seu dispor o suporte escrito que transcreve a parte dos depoimentos atinentes a essa projetada modificação de julgamento – não pode persistir a determinação do acórdão recorrido que decidiu não ter sido cumprido o ónus legal previsto no art. 640.º, n.º 1, als. a), b) e c), e n.º 2, al. a), do CPC, e que, por isso, rejeitou o recurso interposto sobre a impugnação do julgamento da matéria de facto.”;</font><br>
</p><p><font>7. O mesmo entendimento tem o Acórdão de 10.12.2015 (proc. n.º 724/09.7TBAMT.P1.S1, cujo sumário pode ser acedido em www.stj/jurisprudência/sumários): “(...) já houve oportunidade de se deixar dito que a alínea a) do n.º 2 do art. 640.º do Código de Processo Civil deve ser interpretada no sentido de que a impugnação da matéria de facto com base em prova gravada tanto se pode fazer mediante a indicação dos concretos segmentos da gravação como mediante a transcrição deles; sendo que no mesmo sentido no Ácórdão de 29 de outubro de 2015 (processo n º 233/09.4TBVNC.G1.S1, relator Lopes do Rego, disponível em www.dgsi.pt) afirma-se que “o ónus de indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exata e precisa - não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento, como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da cata, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso”.</font><br>
</p><p><font>8. O recorrente foi mais longe transcreveu com exatidão as passagens da gravação em que fundava a sua impugnação da matéria de exemplifica- se aqui algumas das transcrições efetuadas nas alegações para Tribunal da Relação do ..... as constantes alguns artigos como 131; 132; 133; 134; 135; 45; 146; 147 ; 168; 169; 170; 172; 173; 173; 175; das alegações de recurso para o Tribunal da Relação que aqui se transcrevem (falaremos de outras transcrições mais abaixo): “ 129. Testemunha- A advogada não devia estar aqui? 130. Juíza- “ Não tem legitimidade para fazer essa pergunta.” 131. Testemunha- “Passou-se que lhe contei... fui chamada ao escritório do Dr. AA numa tarde, cheguei lá sentei-me , quando ele me disse a soma que tinha de receber, dizendo -“ Você teve mesmo azar- As lágrimas corriam-me pela cara abaixo... “133. O banco já estava fechado. Ele chegou lá e tocou à companhia a que ele queria não estava lá , era outra... ele disse assim você vai ter 40.300,00 euros na sua conta, e eu disse eu vou ficar com mais 300 euros que o sr. Dr. e eu é que sou a aleijada”. 134. Juíza –“ mas dona CC você foi recebendo...” 135. Testemunha –“mas eu só fiquei 18 meses de baixa”(...); Artigo 167-Muito pelo contrário a CC, que prestou o seu depoimento conforme gravações (a partir 00h:59:50 do início da audiência), refere: 168.Testemunha- “ Sei tudo, sempre falamos. O dele saiu 2 meses depois, eu já lhe tinha falado do que se tinha passado...posso lhe contar”. 169.Juíza- A senhora sabe quantas vezes a senhora se deslocava? Testemunha-“ Poucas vezes, tanto eu como ele” 170.Juíza –“ Da senhora não quero saber quero saber do Sr. BB” Testemunha- Não fomos lá muitas vezes”171.Juiz- “Quantas reunião teve com o Sr. D.r para entregar documentação? Testemunha- “ Só era a DD, nem subíamos, não víamos o sr. dr., era raro ver o SR Dr. íamos levar os papeis e buscar o cheque.”172.Juíza –“Quantas vezes o Sr. BB foi durante esse tempo todo?” Testemunha- A maioria das vezes só víamos a DD ...íamos la levar os papeis, íamos buscar o cheque uma vez por mês...” 173.Juiz :”Ao Sr. Dr. lá em cima?”\Testemunha- À DD é que tínhamos que ir buscar o cheque, entregava-nos os cheques e íamos embora. O cheque ia ter ao escritório do Sr. Dr..... Íamos lá porque tínhamos que ir , não é?... De vez em quando entregávamos a documentação, quando íamos levar os papeis... 174.Juíza- E eram recebidos pela funcionaria DD, é isso? 175.Testemunha- “Unicamente . Nós chegávamos lá entregávamos o cheque e íamos embora. Foram para lá os cheques dos nossos ordenados, mais nada. Estávamos lá 5 minutos e íamos embora .” 189. Dizendo o de CC, que prestou o seu depoimento conforme gravações (a partir 00h:59:50 do início da audiência), refere Juiz – E o Sr. BB o que que se passou Testemunha- Sei que ele foi com ele ao Banco, não podia mete-lo naquela altura, era impossível, o banco não era o mesmo... sei que o Sr. Dr. pediu 80000 177.Testemunha- “Era chegar la dentro entregar os papéis a DD, deixava-os já la a capa, já levávamos tudo preparado, contas feitas e tudo, ia tudo prontinho de casa , papeizinhos todos em ordem, levávamos numa capinha... fotocópias tiradas fora de lá ao lado. Eu respondo a verdade Dra., eu hoje lembro-me Graças a Deus lembro-me”.</font><br>
</p><p><font>9. Assim foram provados os factos constantes nos 1.9; 23; 35 ; 36; 37; 42; 59; 60; 61; 63; 91; 105; 108; 122;128;130; 150; 151; 162; 175; 189 dizendo respeito a alegadas reuniões ocorridas no escritório do réu entre ele e o autor em certos dias, nomeadamente a10.09.2009;(09.9.2010;13.09.2010;17.9.2010;21.9.2010;22.9.2010);(02.10.200;06.10.2010;08.10.2010);23.02.2010;3.12.2012;3.12.2012;17.12.2012;18.12.2012;3.01.2013;16.05.2013;11.06.2012;5.72013;16.12.2016;21.05.2014;30.05.2017;4.05.2017; 2.06.2017), sendo que na realidade nenhuma prova testemunhal em audiência de julgamento se fez prova acerca destas reuniões que foram dadas como provadas, muito pelo contrário, pelo depoimento transcrito da ex-mulher do recorrente, CC, comprova-se que tais factos deveriam ter sido dados como não provados.</font><br>
</p><p><font>10. Na sentença de primeira instância foram dados como provados muitos factos</font><br>
</p><p><font>deveriam ter sidos dados como não provados, tais como: 1.9; 1.12; 1.15; 1.16; 1.35; 23; 35; 36; 37; 42; 59; 60; 61; 63; 82; 86; 91; 99; 104; 105; 108; 122;127; 130; 150; 151; 162; 175; 189., nomeadamente consultas e reuniões com o autor em muitas datas concretas, sendo que, porém, esta testemunha fez prova em contrária ao número de consultas, fotocópias tempo despendido, conforme depoimento direto atrás transcrito a que o Tribunal recorrido não quis atender, e onde absolutamente nenhuma prova foi produzida em julgamento sobre tais reuniões, não tendo sido confirmada ou mencionada uma única da reunião das que foram dadas como provadas nos pontos acima mencionados da matéria de facto provada.</font><br>
</p><p><font>11. O depoimento DD, administrativa do autor, gravado a partir 2:36:34, está repleto contradições, transcrevendo-se os seguintes artigos das alegações de recurso para Relação onde está transcrito parte de seu depoimento: 179. DD, depoimento gravado a partir 2:36:34 ; Testemunha- Sou secretaria do Dr. AA desde junho de 2012 Autor- “Quantas vezes é que o Sr. BB esteve no escritório?” Testemunha- Precisar o no de vez não sei ao certo...sei que havia alturas em que ele ia 4/5 vezes a reuniões por semana no escritório, deslocações ao escritório. Autor Autor- E no mês quantas vezes passaria lá o Sr. BB nestes oito anos? Testemunha- “Atenderia o Sr. BB 15, 20 vezes...”. E depois emenda a mesma testemunha:“Uma media de 16, 17 vezes num mês, ....16, 15 vezes para aí....” E depois acrescenta mentindo: “Numa fase inicial havia alturas que eram mais as vezes que outras, 16vezes, 15 para aí”.</font><br>
</p><p><font>12. Carece de credibilidade depoimento desta testemunha pois fala em das vezes em que esteve com o recorrente “inicialmente” quando ao mesmo tempo confessa que só começou a trabalhar com o autor três anos após seu acidente que originou a nota de honorários e o mandato ligava o autor ou réu, sendo que, esta testemunha pecou por não ser minimamente credível em todo o seu depoimento, sempre com constantes e grosseiras contradições ao longo do mesmo, pelo que a reuniões que ficaram provados, mais não são do que forma para justificar os honorários exagerados que o autor pretende.</font><br>
</p><p><font>13. Também no depoimento da testemunha do autor, Dr. EE, advogado de profissão, partir 1:36:30 eta refere que: “a prática da comarca é o valor de 75euros/hora”, sendo que este pratica advocacia na mesma comarca que o recorrido, em............., sendo a prática da Comarca segundo esta testemunha que é do recorrente €75 a hora, o que razoável até em cidade maiores nos dias de hoje, para quem pratica advocacia em nome individual.</font><br>
</p><p><font>14. Pelo que se multiplicarmos as 300 horas de trabalho do autor, estipuladas pelo laudo da Ordem dos Advogados no qual a sentença de primeira instância se baseou, pelo valor hora praticado na comarca de ............... que é de €75, tendo em conta o depoimento da testemunha do próprio recorrido que exerce advocacia na mesma comarca que este , o autor teria direito ao pagamento de honorários 22 500,00, ou seja quase metade do valor em que foi o recorrente condenado.</font><br>
</p><p><font>15. Tudo isto seria a apreciar com análise da matéria de facto pelo Tribunal da Relação do .......</font><br>
</p><p><font>16. Nesse mesmo sentido e prescreve o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. 1295/11.0TBMCN.P1.S2 de 18-10-2018 (PRINCÍPIO INQUISITÓRIO /PODERES DO TRIBUNAL /RENOVAÇÃO DA PROVA /NOVOS MEIOS DE PROVA /PODERES DA RELAÇÃO /MATÉRIA DE FACTO /PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL) in www.dgsi.pt: I – O princípio do inquisitório adquire plena eficácia na fase da instrução do processo, constituindo um poder-dever que se impõe ao juiz com vista ao apuramento da verdade material e à justa composição do litígio. II – Este poder-dever cabe com particular acuidade ao juiz de 1ª instância, mas estende-se igualmente às Relações, tribunais que, como os de 1ª instância, conhecem da matéria de facto em recurso que para eles seja interposto contra a decisão proferida neste campo.</font><br>
</p><p><font>17. Acerca da inconstitucionalidade, importa dizer que os direitos recorrente têm sido gravemente violados em termos constitucionais, primeiramente pela não apreciação da matéria de facto pelo Tribunal da Relação, depois porque foi julgado pelo Tribunal de primeira instância na ausência da sua mandatária a quem foi indeferido o justo impedimento, e finalmente porque tal julgamento ultrapassou em muito a hora de expediente do tribunal pelo que foi vedada qualquer hipótese de uma segunda data onde pudesse exercer o mínimo de contraditório, relativamente às testemunhas que ficassem provir-nos no final do expediente habitual do tribunal.</font><br>
</p><p><font>18. A questão da inconstitucionalidade foi levantada no Tribunal da Relação sendo que relativamente a mesma não houve qualquer pronuncia.</font><br>
</p><p><font>19. Quanto é justo impedimento na primeira data de julgamento a mandatária do Recorrente, e remetido ao Tribunal, nos dias 19/09/2019 e 20/09/2019 a invocar justo impedimento sendo que no requerimento remetido ao Tribunal "a quo" no dia 20-09-2019 pelas 12h22, também antes da audiência do julgamento marcado para as 14h00, foi reiterado o impedimento sendo alegado com todos os pormenores possíveis toda a situação , como a identificação do familiar, o acontecimento, a lesão, as suas circunstancias de vida e a as concretas razões da impossibilidade de ter outra pessoa a assisti-la, referindo novamente que tal assistência era na cidade de ............., tendo acrescentou para que não existam dúvidas quanto à seriedade do motivo invocado que a mesma familiar foi vítima de uma queda grave no dia 17-09-2019 que motivou a intervenção do INEM e o posterior transporte para o Hospital ........... a fim de receber assistencia médica, tendo ficado imobilizada durante alguns dias, tendo a mandatária do Recorrente tentado pelo telefone obter o comprovativo da situação alegada pelo hospital, o que não foi possível no imediato dado que tal teria de ser requerido e demoraria algum, tempo conforme informação transmitida pelo hospital, que também referiu solicitar o documento comprovativo através do Tribunal a quo dado que a obtenção seria mais célere. </font><br>
</p><p><font>20. Foi evidente a preocupação da mandatária do Recorrente para que chegasse ao conhecimento da Meritíssima Juíza, o impedimento da comparência à audiência de julgamento da mandatária do Réu, antes de realizado a mesma, impedindo, assim, que o julgamento se realizasse, à revelia da defesa do Réu, para esse efeito, foi feita a comunicação do motivo inesperado e imprevisível da mandatária do Recorrente antes da audiência de julgamento com a aposição da nota “URGENTE” no requerimento enviado no dia 19-09-2019, dois dias após o ocorrido a 17-09-2019, sendo que no primeiro dia, a sua principal prioridade foi tratar de FF, tendo o Tribunal proferido um despacho no dia 20/09/2019, onde refere que se mantém a realização do julgamento na data designada, uma vez que não foi junta a prova do alegado como exigido pelo artigo 140o, no2 CPC, sendo que a fim de precisamente reiterar e comprovar o manifesto justo impedimento alegado no dia 20/09/2019, cerca de duas horas depois da notificação do despacho proferido a 20/09/2019, juntou aos autos através de novo requerimento onde detalhava com pormenor toda a situação alguns documento referentes a receita médica passada no hospital, à familiar em causa onde se lê muito bem a data da mesma, demostrando-se a veracidade do alegado no dia 19/09/2019 e reiterado no dia 20/09/2019 que a impossibilitava de estar presente no julgamento, tendo sido ambos os requerimentos apresentados antes do inicio da audiência de julgamento.</font><br>
</p><p><font>21. Perante o circunstancialismo descrito, não era exigível que a advogada, fizesse mais do que fez, pois, fez chegar ao Tribunal a informação, antes do início do julgamento, do seu impedimento (por dois requerimentos dirigidos ao tribunal e por telefone) e ter junto a prova possível naquela ocasião, protestando juntar outra não sendo o motivo invocado nem era vago nem indeterminado, conforme explanado nos requerimentos enviados ao Tribunal "a quo" nos dias 19-09-2019 e 20- 09-2019 , sendo que no último incluía uma extensa exposição e detalhado relato das circunstancias referentes ao motivo invocado transmitidas ao Tribunal recorrido, não havendo qualquer razão para duvidar da seriedade do motivo invocado e/ou da genuinidade do documento apresentado.</font><br>
</p><p><font>22. Face às circunstancias que motivaram o impedimento, a mandatária do Recorrente juntou a única prova disponível num curto espaço de tempo e preocupou-se em requerer as necessárias diligencias probatórias ao Tribunal a quo, na sequencia da informação transmitida pelo Hospital de ..........., e pelo INEM, assim como se prontificou a juntar assento de nascimento da assistida, assento de óbito dos pais e provas internamentos constantes e da prolongada e penosa do marido que o coloca acamado(obesidade mórbida associada a uma serie de problemas de saúde com origem na mesma) sendo que, o Tribunal de primeiro instância simplesmente não se pronunciou sobre os documentos que a mandatária do recorrente protestou juntar em dois dias tendo inclusive pedido oficiosamente para ser notificado Hospital .............. caso dúvidas subsistissem, não tendo vindo havido qualquer circunstância para duvidar da seriedade do motivo apresentado pela mandatário do recorrido.</font><br>
</p><p><font>23. Os presentes autos têm valor superior ao Tribunal da Relação pelo era obrigatória a representação por mandatário judicial em todos os atos deste processo, todavia, entendeu-se proceder a julgamento sem que o Réu estivesse representado.</font><br>
</p><p><font>24. Ora, nem sempre é possível reunir a prova necessária do impedimento, pelo que a mesma não deve ser exigível prontamente conforme entendimento unanime da jurisprudência, como por exemplo do Tribunal da Relação de Évora no Acórdão do datado de 05-05-2016 no processo no 1117/12.4TBVNO.E1 e disponível em <a>http://www.dgsi.pt</a>. Referindo o Douto Tribunal que “apesar do art.º 140.º, n.º 2 do CPC impor que a parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova, deve entender-se que, sendo necessário que a comunicação seja logo efetuada, até à abertura da audiência, não é exigível que prontamente seja exibido atestado médico, pois, se o advogado comunicar prontamente ao tribunal as circunstancias impeditivas do seu comparecimento e não estiver ainda munido de documento comprovativo do impedimento legítimo, deve convencer o juiz da seriedade do motivo invocado, sem prejuízo de, posteriormente e no mais curto prazo, remeter o documento justificativo da sua ausência”.</font><br>
</p><p><font>25. O Tribunal primeira instância não teve, o mesmo tratamento em relação ao adiamento da audiência prévia requerida pelo Autor, que não teve dificuldade em adiar a referida diligencia sem a confirmação da veracidade da concordância do relatado e sem saber a posição do Réu que nunca deu a sua anuência.</font><br>
</p><p><font>26. É manifestamente difícil de entender face à praxis judiciária conhecida que todas as testemunhas tenham sido inquiridas numa única tarde, a que ainda se seguiu a prolação de alegacões orais do Autor.</font><br>
</p><p><font>27. O resultado do acórdão recorrido vem de um julgamento rápido, numa só tarde com a audição de oito testemunhas e depoimento de parte, e até alegacões, sendo que a pratica diz-nos que é muito difícil a audição de tantas testemunhas (mesmo com violação do princípio do contraditório), alegacões e depoimento de parte,</font><br>
</p><p><font>28. Pareceu que o julgamento se quis assim, começar e acabar rapidamente, só com um mandatário, com violação do Princípio Constitucional do Contraditório e da Igualdade das Partes, (tratando-se da primeira data designada para audiência e discussão de julgamento).</font><br>
</p><p><font>29. Deveria Tribunal da Relação ter em atenção as circunstâncias estas circunstâncias quando decidiu rejeitar impugnação da matéria de facto. Nesse sentido pronunciou-se o Douto Tribunal da Relação de Guimarães no Acórdão proferido no processo n.º 405/11.1TBVVD-I.G1, de 26-09-2013 que se passa a citar: “Tratando-se de uma primeira marcação e não tendo havido acordo prévio com os mandatários com vista à designação da data da audiência, a falta de qualquer deles é motivo suficiente para provocar o adiamento, nos termos da al. c) do nº 1 do art.º 651o do Código de Processo Civil” (atual 603º do CPC), como é o caso dos presentes autos que deveria ter tido pelo Tribunal a quo uma decisão completamente diferente”.</font><br>
</p><p><font>30. Destarte, não foi assegurado o direito de defesa nem o direito ao contraditório do ora recorrente que se viu confrontado com a ausência da sua mandatária, sendo que com a realização do julgamento, a prova produzida não foi contraditada pelo Réu, dado que foram inquiridas as testemunhas arroladas pelo Autor com sem possibilidade do exercício ao contraditório, enviesando desta forma a produção de prova em sede de julgamento, sendo que, para além do depoimento de parte do Autor, foram ainda ouvidas cinco testemunhas por si arroladas e mais três testemunhas da parte do Réu, tendo do lado do Réu, o Tribunal primeira instância determinado a inquirição das três testemunhas do Réu que se encontravam presentes sem que as mesmas tenham tido a oportunidade de se pronunciarem acerca das questões pertinentes que seriam colocadas pela parte que as arr | [0 0 0 ... 0 0 1] |
dzJxu4YBgYBz1XKvewmF | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<br>
<b><font>Revista nº 1319/14.9T8CBR-B.C1.S1</font></b><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<font> </font><br>
<b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b><br>
<br>
<font>Notificado do acórdão da Relação que julgou improcedente o seu recurso de apelação e confirmou a decisão (saneador sentença) da 1ª instância - na qual foi julgada improcedente a oposição por embargos que deduziu à execução que lhe foi movida pela </font><b><font>exequente/embargada AA</font></b><font>(entretanto falecida, tendo sido habilitados os respetivos herdeiros), e </font><u><font>na qual foi fixado à causa o valor de € 5.001,00</font></u><font>, </font><u><font>veio o executado/embargante</font></u><font> </font><b><font>BB </font></b><u><font>interpor recurso de revista</font></u><font> , como recurso de “revista extraordinário nos termos do artigo 672º, nº 1 al. c) do CPC”</font><br>
<font> E foi no âmbito de acórdão da conferência (onde se indeferiu a pretendida reforma do acórdão que conheceu da apelação) que, e apenas com referência ao nº 3 do artigo 672º do CPC, se ordenou a subida dos autos.</font><br>
<br>
<font> Subidos os autos ao STJ, por despacho do respetivo Relator foram as partes notificadas para, querendo, se pronunciarem sobre a questão da inadmissibilidade da revista, à luz do disposto no nº 1 do artigo 629º do CPC, uma vez que o valor da causa (€ 5.001,00) é inferior ao valor da alçada da Relação,.</font><br>
<font> O recorrente veio pugnar pela admissão do recurso, dizendo para o efeito e em resumo que está em causa o facto de a sua esposa, com quem é casado no regime de comunhão geral de bens, não ter sido chamada ao processo, e que nas ações em que está em causa o estado das pessoas, o processo pode ser levado ao STJ.</font><br>
<br>
<font> Por despacho do Relator de 25.06.2020, foi decidido </font><b><font>não admitir a revista.</font></b><br>
<br>
<b><font> </font></b><font>Inconformado, veio o recorrente </font><b><u><font>reclamar para a conferência</font></u></b><font>, pugnando pela admissão da revista.</font><br>
<br>
<font> </font><u><font>Como questão prévia</font></u><font>, veio requerer a notificação de todos os herdeiros da falecida (exequente/embargada/ recorrida) AA para ratificar o processado dos atos praticados e notificações recebidas pelo Ilustre Mandatário relativamente a este processo no período compreendido do dia 22/10/2018 até ao dia 07/05/2019.</font><br>
<font> E isto porque, segundo o mesmo, tendo a AA falecido no dia 22/10/2018, tendo sido outorgada a escritura de habilitação de herdeiros no dia 26/10/2018, cessaram os poderes conferidos por nomeação de Patrono ao Ilustre Mandatário da finada AA, tendo também cessado naquela data o benefício de apoio judiciário que beneficiava a finada AA.</font><br>
<font> </font><br>
<font> E, </font><u><font>relativamente ao despacho reclamado</font></u><font>, veio dizer que, não obstante o valor da causa ser inferior ao valor da alçada da Relação, a revista deve ser admitida, uma vez que a mesma foi interposta como revista extraordinária, nos termos do artigo 672º, nº 1, al. c) do CPC e foi mandada subir ao STJ nos termos do nº 3 do artigo 672º do CPC.</font><br>
<p><font> Não houve resposta.</font>
</p><p><b><font>Cumpre decidir:</font></b>
</p></font><p><font><br>
<font> </font><u><font>Relativamente à pretensão de notificação dos herdeiros da embargada para efeitos de ratificação do processado,</font></u><font> para além de não deixar de ser estranho que só agora o recorrente venha suscitar tal questão, o mesmo não indica quais os atos praticados nos autos que devam ser objeto de ratificação.</font><br>
<font> E compulsados os autos, verifica-se que:</font><br>
<font>- Já após a subida dos autos à Relação, para efeitos de ali se conhecer da apelação do ora reclamante, na sequência da informação deste sobre o falecimento da recorrida AA(em 22.10.2018 e já depois de o recurso ter sido admitido na 1ª instância), a instância foi suspensa com esse fundamento (por despacho do Relator da Relação de 04.06.2019);</font><br>
<font>- E foi a requerimento da herdeira </font><u><font>CC</font></u><font> que, por decisão do mesmo Relator, de 28.01.2020, esta foi julgada habilitada, juntamente com outros herdeiros:</font><br>
<font>- Esta CC juntou então procuração por si emitida a favor do anterior advogado da falecida;</font><br>
<font>- E só esta CC é que veio a ter intervenção nos autos, estando assim devidamente patrocinada.</font><br>
<font>Desta forma e porque os demais herdeiros não tiveram intervenção nos autos, nem tinham que ter, carece inteiramente de razão a pretensão do recorrente ora reclamante – razão pela qual se impõe indeferir o requerido no sentido da ratificação do processado.</font><br>
<br>
<u><font>Quanto à questão da admissibilidade da revista</font></u><font>, a mesma foi rejeitada pelo Relator no âmbito do despacho reclamado, nos seguintes termos:</font><br>
<i><font> “Conforme supra referido o valor da causa foi fixado na 1ª instância em € 5.001,00 – valor este claramente inferior ao valor da alçada da Relação (€ 30.000,00 – art. 44º, nº 1 da LOSJ).</font></i><br>
<i><font> Assim, atento o disposto no nº 1 do artigo 629º do CPC e não estando em causa qualquer das situações em que o recurso é sempre admissível nos termos do disposto no nº 2 deste mesmo artigo, </font></i><i><u><font>o recurso não é admissível</font></u></i><i><font>. </font></i><br>
<i><font> Diz o recorrente, sem um mínimo de fundamentação adequada, que está em causa o estado das pessoas – de onde parece poder retirar-se que o recorrente considera que o valor da causa deveria ter sido fixado em € 30.000,01 nos termos do nº 1 do artigo 303º do CPC (valor da alçada da Relação mais € 0,01) – sendo que nesse caso já não se verificaria o obstáculo resultante do facto de o valor da causa ser inferior ao valor da alçada do tribunal (Relação) de que se recorre.</font></i><br>
<i><font> Todavia, sem um mínimo de razão.</font></i><br>
<i><font> Com efeito, para além de não estar em causa na revista o valor da causa, que foi fixado na 1ª instância (o que nem sequer foi objeto do recurso para a Relação - e daí que a fixação do valor da causa se tenha tornado definitiva), não está em causa nos autos, nem nunca esteve, o estado das pessoas.</font></i><br>
<i><font> Com efeito, as únicas questões que foram suscitadas pelo ora recorrente na sua apelação perante a Relação (a qual delas conheceu e no sentido da sua improcedência) apenas tinham a ver com a necessidade de intervenção do cônjuge do ora recorrente na ação declarativa cuja sentença foi dada à execução e com a falta de intervenção do mesmo cônjuge na execução – questões essas que nada têm a ver com o estado das pessoas.</font></i><br>
<i><font> Em face do exposto, impõe-se a não admissão da revista.</font></i><br>
<i><font> Termos em que se decide não admitir a revista.</font></i><br>
<b><i><font> </font></i></b><i><font>Custas pelo recorrente.”</font></i><br>
<br>
<font> Vem agora o reclamante argumentar que a revista deve ser admitida porque foi interposta como revista “extraordinária” (leia-se “excecional”), ao abrigo do disposto no al. c) do nº 2 do artigo 672º do CPC e que a mesma foi mandada subir nos termos do nº 3 deste artigo.</font><br>
<font> Todavia sem razão.</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font><u><font>A admissibilidade da revista excecional</font></u><font> (tendo por base a existência da dupla conforme a que alude o nº 3 do artigo 671º do CPC – o que, </font><i><font>in casu, </font></i><font> até se verifica), </font><u><font>pressupõe que se mostrem verificados os requisitos gerais da amissibilidade do recurso</font></u><font>, como sejam a tempestividade, a legitimidade e a circunstância de o valor da causa ser superior ao valor da alçada da Relação (nos termos do nº 1 do artigo 629º do CPC).</font><br>
<font> Isto, a menos que em causa esteja uma situação em que o recurso é sempre admissível – o que não é o caso.</font><br>
<br>
<font> Em suma, verificados que se mostrem os requisitos gerais de admissibilidade dos recursos, havendo dupla conforme a revista só pode ser admitida como revista excecional nos termos do artigo 672º do CPC.</font><br>
<br>
<font> Ora, no caso em apreço, conforme bem se expendeu no despacho reclamado, é manifesta a existência de um impedimento de caráter geral de admissibilidade, estabelecido no nº 1 do artigo 629º do CPC, resultante do facto de o valor da causa ser inferior ao valor da alçada da Relação (aspeto este do qual, por certo, a Relação se não terá apercebido).</font><br>
<br>
<font> Desta forma, a revista (fosse como revista normal, fosse como revista excecional) não podia ser admitida, razão pela qual se impõe indeferir a reclamação.</font><br>
<br>
<font> </font><b><font>Termos em que se acorda:</font></b><br>
<b><font> a) Em indeferir a pretensão do recorrente/reclamante relativa à notificação dos herdeiros da falecida (exequente/embargada/ recorrida) AA para efeitos de ratificação do processado;</font></b><br>
<b><font> b) E em indeferir a reclamação, mantendo-se assim o despacho reclamado.</font></b><br>
<br>
<b><font> </font></b><font>Custas pelo reclamante com taxa de justiça que se fica em três UCs.</font><br>
<br>
<font> Lx., 13.10.2020</font><br>
<font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font><br>
<br>
<font>Acácio das Neves (Relator) </font><br>
<font>Fernando Samões (1º Adjunto)</font><br>
<font>Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
xTJvu4YBgYBz1XKvAQdA | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b>
<p><b><font>Revista nº 19870/19.2T8LSB.L1.S1</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>AA, BB, CC Importação de Artigos de Decoração Lda e DD</font></b><font> intentaram </font><u><font>procedimento cautelar não especificado</font></u><font> contra </font><b><font>OPTITRADE - </font></b><a></a><b><font>Importação de Artigos de Decoração Lda</font></b><font>., requerendo:</font>
</p><p><font>- que a recorrida fosse condenada a abster-se de utilizar, por si ou através de terceiro, a fração «A» do prédio urbano sito na Rua ……., n.° 152a 156, …….., para atividade diversa da comercial - nomeadamente, restauração;</font>
</p><p><font>- e a não realizar na referida fração quaisquer atos preparatórios e tendentes ao exercício dessa atividade (como utilização de gás, armazenamento de produtos alimentares, colocação de infra-estruturas, equipamentos e mobiliário, etc );</font>
</p><p><font>- e que a decisão a proferir seja notificada à Requerida e aos seus representantes legais, com a expressa advertência de que, não cumprindo a determinação judicial, incorrem no crime de desobediência qualificada, conforme previsto nos artigos 375.° do CPC e 348.° do Código Penal.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegaram para o efeito e em resumo o seguinte:</font>
</p><p><font>Os requerentes são os donos das frações que integram o prédio sito na Rua ……….., n°s 152-156, em …….., composto de rés-do-chão e cinco andares, sendo a requerida uma sociedade que tem por objeto o comércio e serviços, importação e exportação de vestuário e acessórios, produtos de cosmética e uso pessoal;</font>
</p><p><font>A lª e o 2ª requerentes deram de arrendamento à requerida a fração designada com a letra «A» daquele prédio tendo o arrendamento por objeto a atividade comercial;</font>
</p><p><font>A requerida prepara-se (existindo já diversos trabalhos a decorrer para o efeito) para iniciar, a breve trecho, a exploração no locado de uma atividade de restaurante, casa de pasto, snack-bar, ... ou estrutura afim;</font>
</p><p><font>A requerida nunca comunicou ou solicitou aos requerentes autorização para proceder à realização de obras - que de resto são ilegais, porque não devidamente licenciadas - no locado para o adaptar à exploração da atividade comercial de restaurante e, apesar de já terem manifestado junto da requerida o seu desagrado e discordância em relação à projetada instalação de um restaurante na fração autónoma «A», certo é que a requerida não pôs termo aos trabalhos de adaptação do espaço nem sequer se demoveu do seu intento de aí desenvolver a atividade de restauração;</font>
</p><p><font>Os requerentes receiam ter de “incluir” e suportar no condomínio um restaurante e, considerando os riscos que por regra lhe estão associados, temem pela segurança do prédio e seus habitantes, e antecipam já os incómodos e prejuízos (ruído, fumos, cheiros, vibração, afluência de clientes) que advirão do funcionamento do restaurante (ou similar) no rés-do-chão do Prédio – o que justifica a propositura do presente procedimento cautelar de forma a impedir que a requerida desenvolva no locado a atividade de restauração ou atividades similares, as quais não se subsumem ao conceito de «comércio».</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Citada, a requerida deduziu oposição, alegando em resumo que o contrato de locação não prevê apenas o comércio em sentido estrito e que o destino a dar às frações autónomas que integram o prédio onde se localiza a fração locada pode ser alterado por outros meios que não necessariamente por unanimidade dos condóminos.</font>
</p><p><font>Em resposta, os requerentes apresentaram novo articulado - que não foi objeto de expressa apreciação pela 1ª instância - no âmbito do qual responderam à alegação da requerida e exerceram o contraditório sobre a prova documental junta pela requerida na mesma peça e pediram inversão do contencioso, solicitando que sejam dispensados de propor a ação principal e, ato contínuo e a título definitivo, seja:</font>
</p><p><font>- declarado que a fração A do prédio me causa se destina a comércio, o que não compreende a atividade de restauração e afins, sendo a requerida condenada a reconhecer tal declaração e condenada a abster-se de desenvolver, na fração A, por si ou por terceiro, atividades alheias ao fim declarado, nomeadamente a exploração de restaurante ou afim;</font>
</p><p><font>- e a requerida condenada a repor a fração A no estado em que se encontrava antes dos trabalhos a que se alude genericamente no artigo 31.° do requerimento inicial e se concretiza nos artigos 33.° a 43.° seguintes, incluindo os trabalhos que hajam sido entretanto realizados, por contrários à finalidade comercial da fração em apreço.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Sem que se procedesse à produção da prova indicada pelas partes, e por se considerar que tal se mostrava desnecessário, foi proferida </font><u><font>decisão</font></u><font>, nos termos da qual </font><u><font>a providência cautelar foi julgada improcedente.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de recurso de apelação dos requerentes, </font><b><font>a Relação de Lisboa</font></b><font>, ainda que com um voto de vencido, </font><u><font>manteve aquela decisão</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Inconformados, </font><b><font>interpuseram os requerentes o presente recurso de revista</font></b><font> – que foi </font><u><font>admitido por despacho do ora Relator com fundamento na verificação da invocada oposição de acórdãos, nos termos da al. d) do nº 2 do artigo 629º do CPC</font></u><font> - no qual formularam as seguintes </font><u><font>conclusões</font></u><font>:</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>1ª- Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão que antecede, na medida em que, declarando embora nula a Sentença de 1.º grau e tendo sido adotado por maioria, não concedeu provimento ao recurso de apelação dos Requerentes, mantendo, em consequência, a decisão impugnada.</font><br>
<font>2ª - A presente revista colhe fundamento no artigo 629.º/2, al. d) por remissão da parte final do artigo 370.º/2 – o que se declara para os efeitos do artigo 637.º/2, todos do CPC.</font><br>
<font>3ª - O Acórdão sindicado perfilha doutrina oposta à aplicada no aresto da mesma Veneranda Relação datado de 4.3.2004; agravo n.º 10334/2003 quanto à mesma questão fundamental de Direito (cfr. certidão junta nos termos dos artigos 637.º/2, 2.ª parte e 651.º/1 do CPC).</font><br>
<font>4ª - A questão fundamental de Direito julgada nos acórdãos revidendo e fundamento formula-se nos seguintes termos:</font><br>
<i><font>“Pretendendo os condóminos obstar ao uso ilícito (restauração), por contrário ao título constitutivo da propriedade horizontal, dado a uma fração autónoma (destinada a comércio) através de providência cautelar, ficam aqueles onerados com a alegação e prova de «periculum in mora» concretizado no impacto ambiental negativo causado por aquele uso (v.g. fumos, ruídos e cheiros)?”.</font></i><br>
<font>5. O aresto recorrido respondeu afirmativamente; o fundamento negativamente.</font><br>
<font>6. Segundo o acórdão revidendo: </font><i><font>“(…) bastará a prova que em determinado Rés-do chão será explorado um estabelecimento de restauração para, sem mais, se dar como assente (…) substrato subjacente ao requisito processual do periculum in mora da providência? (…) tudo visto e ponderado temos para nós que não basta a referida factualidade provada para, por si só, se enveredar de imediato por um juízo afirmativo em sede de verificação do requisito processual do periculum in mora da providência”.</font></i>
</p><p><font>7. Já o Acórdão oponente sumaria: </font><i><font>A utilização de uma fração para fim diverso do constante do título constitutivo da propriedade horizontal constitui violação grave do direito dos condóminos, legitimando o recurso à tutela cautelar independentemente da verificação de ruídos, fumos e cheiros proveniente do estabelecimento de restaurante.</font></i>
</p><p><font>8ª - A resposta conferida pelo Acórdão fundamento à questão fundamental de Direito afigura-se acertada(comdetrimento,s.d.r.,paraa vereda trilhada pela deliberação recorrida).</font>
</p><p><font>9ª - Com efeito, é a interpretação que honra o disposto conjugadamente nos artigos 1305.º, 1420.º/1 e 1422.º/1 e 2, al. c) do CC.</font>
</p><p><font>10ª - O processo civil rege-se pelo princípio da instrumentalidade, pelo que há que adequar a tutela cautelar ao direito (material) acautelando e não subjugá-lo a exigências de alegação e prova exuberantes face ao regime de Direito substantivo.</font>
</p><p><font>11ª - O direito de propriedade horizontal tem natureza real e é absoluto. O teor do título constitutivo da propriedade horizontal impõe-se </font><i><font>erga omnes</font></i><font> e integra o conteúdo dos direitos dos condóminos.</font>
</p><p><font>12ª - O uso de uma fração autónoma desviante do regime estabelecido naquele título constitui uma violação grave e séria do referido direito absoluto.</font>
</p><p><font>13ª - Os condóminos não têm de tolerar no prédio que a todos pertence um uso ilegal – só porque é menos ou mais incomodativo ou lesivo.</font>
</p><p><font>14ª – Há sempre ablação, compressão e afetação séria de um domínio exclusivo e privativo dos condóminos.</font>
</p><p><font>15ª - Como escrevem Paula Costa e Silva e outros, “a modificação do tipo de destinação dada ao imóvel implica a exposição de todos a riscos lesivos qualitativamente diversos daqueles que foram aceites aquando da aquisição de cada uma das frações por cada um dos condóminos.”</font>
</p><p><font>16ª - “a nossa lei, ao invés de remeter a harmonização entre as posições dos diferentes proprietários para o momento do conflito ou da ameaça do conflito – aquele em que o uso da fração pelo respetivo titular provoca uma perturbação do uso, por outro condómino, da sua fração ou da parte comum –, o legislador preferiu uma regulação de tipo preventivo, limitando positivamente os aproveitamentos permitidos àqueles que se enquadrem num conjunto de destinações constantes do título constitutivo da propriedade horizontal”.</font>
</p><p><font>17ª - Se a tutela da propriedade horizontal é ex ante e preventiva, toda a utilização “desviante”, por menor que seja, deve ser cessada de imediato.</font>
</p><p><font>18ª - Na verdade, como bem se exarou no acórdão-fundamento, “No que respeita ao art. 1422 nº2 c) CC, a violação apenas cessa quando se verifica a conformidade do uso com o fim, não sendo pois suficiente qualquer outra conduta, como seja a de cessar a emissão de fumos e ruídos”.</font>
</p><p><font>19ª - Não faz, pois, qualquer sentido que se exija um impacto ambiental negativo para que seja determinada a cessação imediata do uso ilícito de uma fração autónoma.</font>
</p><p><font>20ª - Aliás, o acórdão recorrido chega a afirmar, não sendo consequente, que:</font>
</p><p><font>20.1. “tudo aponta para que aos requerentes da providência, como condóminos, assista o Direito de se oporem à pretensão da requerida de utilizar a fração autónoma locada para nela exercer a atividade económica de restauração, e isto independentemente de o exercício de uma tal atividade provocar necessariamente, ou não, qualquer dos factos a que alude o artº 1346º, do CC”.</font>
</p><p><font>20.2. o “Direito que assiste aos proprietários das frações de prédio constituído em propriedade horizontal de se oporem a que uma das frações seja destinada a um fim que é diverso daquele que consta do respetivo título constitutivo [e independentemente de tal utilização diversa desencadear necessariamente quaisquer prejuízos subsumíveis v.g. à previsão do artº 1346º, do CC, ou outros] (…)”.</font>
</p><p><font>21ª - O Acórdão revidendo não provou qualquer facto atinente ao funcionamento do restaurante, limitando-se a referir que estava instalado. Tal bastou, e bem, para a concessão da medida cautelar.</font>
</p><p><font>22ª - Harmonizando-se jurisprudência no sentido do Acórdão-fundamento, deve ser concedida a revista ora ajuizada com base nos factos provados 3.1 a 3.8 e 3.13. a 3.17, 3.21 e 3.23.</font>
</p><p><font>23ª - Mesmo que se adote a doutrina oposta – abeirando-se do Acórdão sob recurso – mesmo assim deve ser concedida a revista, posto que os agora Recorrentes efetivamente provaram factos integrantes do perigo na de mora, cfr. 9,11,16 a 22 (sendo que o «ainda» é conclusivo e especulativo, devendo ser suprimido de ofício) e 23. Assim concluiu o Sr. Desembargador que votou vencido.</font>
</p><p><font>24ª - Em última análise, deve ser sufragado o douto voto de vencido.</font>
</p><p><font>25ª - A medida cautelar deve ser decretada, como oportunamente impetrado pelos Recorrentes. Só assim se fazendo a almejada Justiça!</font>
</p><p><font>Termos em que deve ser concedida a revista e, revogando-se o acórdão recorrido, deve ser decretada a medida cautelar impetrada pelos Recorrentes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Não foram apresentadas contra-alegações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>Em face do teor das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista (e decidida que foi, pelo Relator, a questão da admissibilidade da revista com base na verificação da invocada oposição de acórdãos) a questão de que cumpre conhecer consiste em saber se, em face da factualidade dada como provada (pela Relação) deve ser decretada a providência cautelar requerida pelos requerentes, ora recorrentes.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Conforme se alcança do acórdão recorrido, uma vez que na decisão da 1ª instância não foram elencados os factos provados, a Relação considerou verificada, com base nessa omissão, a invocada nulidade da decisão recorrida e, suprindo tal nulidade, deu como provada (porque não impugnada ou provada documentalmente) a factualidade infra mencionada – factualidade essa em que os recorrentes se estribam para fundamentar o pretendido deferimento da providência,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> É a seguinte a </font><u><font>factualidade dada como provada pela Relação</font></u><font>:</font>
</p><p><font>3.1. - O prédio sito na Rua de ……….., n.ºs 152-156, em (………..) ………… encontra-se descrito junto da Conservatória do Registo Predial com o n.° ……… da freguesia de ……….., concelho de ……….. e está inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……. da freguesia de ……….., concelho de ……….;</font>
</p><p><font>3.2. - O Prédio referido em 1. consiste num edifício de rés-do-chão e cinco andares e foi constituído em propriedade horizontal, nos termos da escritura pública, outorgada em 7.12.1999, tendo a constituição da propriedade horizontal sido levada a registo por apresentação de 23.12.1999;</font>
</p><p><font>3.3. - O Prédio referido em 1. compõe-se de seis frações autónomas, designadas pelas letras «A» a «F», localizando-se a fração «A» no rés-do-chão e as restantes («B» a «F») nos andares, destinando-se todas as frações Ç a F , a habitação;</font>
</p><p><font>3.4. - Os Requerentes são donos e possuidores das referidas frações autónomas , sendo a l.ª e o 2.° Requerentes co-titulares das frações autónomas «A», «B» e «D» a «F» e, a 3.a e o 4.° Requerentes titulares da fração autónoma «C», nela habitando;</font>
</p><p><font>3.5. - A 1.ª e o 2.° Requerentes, irmãos germanos, constam como titulares inscritos na Conservatória do Registo Predial das frações «A», «B» e «D» a «F», conforme apresentação n.° 9 dc 23.1.1989, por terem sucedido, conjuntamente com EE (pai da l.a e 2.° Requerentes), no direito de propriedade de FF e GG ;</font>
</p><p><font>3.6. - Tendo-se registado, recentemente, o decesso do nomeado EE, sucederam-lhe a l.ª e o 2.° Requerentes, nos termos consignados em escritura de habilitação de herdeiros junta aos autos;</font>
</p><p><font>3.7. - A l.ª e o 2.° Requerentes comportam-se, com a convicção de o ser e há mais de vinte anos, como proprietários exclusivos das frações em causa, nomeadamente pagando os impostos imobiliários e celebrando e gerindo a execução dos contratos de locação das frações ( o que os seus antecessores já faziam);</font>
</p><p><font>3.8. - A 3.ª e o 4.° Requerentes são os proprietários inscritos da fração «C», tendo-a adquirido à l.ª e ao 2.° Requerentes, tal como decorre das apresentações n.ºs 21, de 12.7.2006 e 44, de 20.9.2006;</font>
</p><p><font>3.9. - A Requerida é uma sociedade por quotas, constituída em 1999, que tem por objeto: </font><i><font>“Comércio e serviços, importação e exportação de vestuário e acessórios, produtos de cosmética e uso pessoal. Decoração, arte e mobiliário, iluminação, equipamentos para o lar, eletrodomésticos, ménage, brinquedos, cozinhas, utensílios, materiais de construção, jardinagem, desporto e lazer, equipamentos de hotelaria, restauração, produtos alimentares e de limpeza. Ferramentas e utensílios bricolage, papelaria, produtos e componentes eletrónicos de telecomunicações, informática e multimédia, livros, discos, marketing, publicidade e comunicação”.</font></i>
</p><p><font>3.10. - Entre a l.ª e o 2.° Requerentes, por um lado, e a Requerida, por outro, foi outorgado um contrato de arrendamento não habitacional, nos termos do qual os primeiros, enquanto senhorios, cedem e a última, na qualidade de inquilina, toma de locação, a fração autónoma destinada à atividade comercial e designada com a letra «A» do Prédio identificado em 3.1.;</font>
</p><p><font>3.11. - Antes do ingresso da Requerida na fração locada, a mesma sempre esteve afeta à atividade de comércio, sendo que, em arrendamento celebrado em 25.2.1964, convencionou-se expressamente que </font><i><font>“ A loja arrendada destina-se ao comércio de bombas, motores ,e seus acessórios ,ou a qualquer outro ramo que, convenha à firma inquilina, com exceção de taberna, agência funerária, drogaria e artigos explosivos”.</font></i>
</p><p><font>3.12. - Do contrato referido em 3.11 ficou ainda a constar , sob a respetiva cláusula quarta que </font><i><font>“ A firma inquilina fica desde já autorizada a fazer obras de adaptação na loja, a realizar agora ou quando o entender, tais como modificação da fachada respetiva, incluindo a retirada do membro existente entre as atuais portas, dando outra disposição à entrada, com montra ou montras, e desaparição de uma parede interna, anexa à atual divisão de escritório e ainda a efetuar outros benefícios, tais como substituirão do chão de soalho por mosaicos, pedra ou material similar, instalação de água corrente e de iluminação elétrica, que presentemente não existem, entendendo-se que todos os trabalhos serão feitos de conta da firma inquilina, sob sua Responsabilidade, e não darão direito a retenção ou indemnização pois uma vez feitas ficarão a pertencer ao prédio”.</font></i>
</p><p><font>3.13. - Da escritura de constituição da propriedade horizontal, e no tocante à fração «A» do prédio identificado em 3.1., ficou a constar tratar-se de um “RÉS DO CHÃO - LOJA PARA COMÉRCIO, com entrada pelo n.° 154 da Rua ……. .</font>
</p><p><font>3.14. - Ao outorgar a escritura de constituição da propriedade horizontal referida em 3.13, a l.ª e o 2.° Requerentes, conjuntamente com EE, quiseram efetivamente destinar a fração «A» a comércio e não a qualquer outro fim, sendo que, na prática, na fração em apreço, jamais se desenvolveu atividade distinta do comércio;</font>
</p><p><font>3.15. - A Requerida pretende explorar, a título lucrativo e na fração autónoma «A», um restaurante, casa de pasto, snack-bar, ... ou estrutura afim, sendo sua intenção utilizar a fração autónoma em apreço para confeção de refeições (incluindo ...), preparação de snacks e venda de bebidas (incluindo alcoólicas);</font>
</p><p><font>3.16. - Com vista a concretizar o desiderato referido em 3.15, e sem prévia informação e/ou consulta dos requerentes, a Requerida realizou já trabalhos de transformação da fração em apreço num estabelecimento de restauração;</font>
</p><p><font>3.17. - No âmbito dos trabalhos referidos em 3.16, a Requerida procedeu já à instalação de uma infra-estrutura de abastecimento de gás na fração em apreço e substituiu as redes de canalização de água;</font>
</p><p><font>3.18. - A l.ª e o 2.° Requerentes apresentaram queixa junto da Câmara Municipal de Lisboa, originando o proc. n.° ………… e, mais tarde, renovaram a queixa, dando origem, desta feita, ao processo ………….;</font>
</p><p><font>3.19. - Em relatório de vistoria elaborado pela Polícia Municipal e em face das queixas referidas em 3.18, ficou a constar que as obras realizadas pela Requerida na fração não estão devidamente licenciadas, estando as mesmas sujeitas a Licença Administrativa, a qual não deu entrada nos serviços da Edilidade (...)”.</font>
</p><p><font>3.20. - Os Requerentes reagiram contra o intuito da Requerida de operar um estabelecimento de restauração ou ... no rés-do-chão do Prédio, tendo a 8 de agosto de 2019, a filha da l.ª Requerente enviado um e-mail a HH, mulher do gerente da Requerida, II, a manifestar a sua oposição à realização de obras sem autorização, e a comunicar a oposição à alteração da atividade da loja sem o seu consentimento, designadamente para um restaurante de ...;</font>
</p><p><font>3.21.- Não obstante o referido em 3.20, a Requerida não pôs termo aos trabalhos de adaptação do espaço nem se demoveu do seu intento de aí desenvolver a atividade de restauração, não tendo interrompido os trabalhos de transformação da fração num restaurante;</font>
</p><p><font>3.22 - A requerida não dispõe ainda de licenciamento Administrativo que lhe permita explorar e proceder à abertura de um restaurante dentro da fração «A»;</font>
</p><p><font>3.23. - O Prédio identificado em 3.1. é eminentemente habitacional, nele habitando a 3.ª e o 4.° Requerentes, temendo ambos pelo seu descanso e tranquilidade caso venha a requerida a nele proceder à abertura do restaurante.</font>
</p><p><b><u><font>Apreciando:</font></u></b>
</p><p><font>Atento o disposto no nº 1 do artigo 362º do CPC, o deferimento das providências cautelares não especificadas, (caso dos autos), para além da prova indiciária do direito (que o acórdão recorrido deu como assente e que, por isso, não está ora em causa) depende da prova, por parte do requerente da providência, do </font><i><font>“</font></i><b><i><font>fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito</font></i></b><i><font>”.</font></i>
</p><p><font>Foi este o requisito, relativo ao </font><i><font>periculum in mora,</font></i><font> que o acórdão recorrido deu como não verificado – e daí que, com esse fundamento, tenha mantido a decisão da 1ª instância, no sentido do indeferimento da providência requerida.</font><i><font> </font></i>
</p><p><font>É contra tal entendimento que se manifestam os requerentes da providência, ora recorrentes, segundo os quais se deve seguir o entendimento sufragado no acórdão da Relação de Lisboa de 04.03.2004, proferido no agravo n.º 10334/2003 - cuja certidão juntaram e se mostra disponível in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>, que invocaram como acórdão fundamento para justificar a admissibilidade da revista ao abrigo do disposto na al. d) do nº 2 do artigo 629º do CPC.</font>
</p><p><font>Em tal acórdão, (em manifesta oposição com o entendimento seguido no acórdão recorrido – e daí a admissão da revista, pelo Relator) seguiu-se, em súmula, o seguinte entendimento:</font>
</p><p><i><font>“Constando do título constitutivo da propriedade horizontal que uma determinada fração autónoma se destina a “comércio”, não é legítimo, sem autorização dos condóminos, o exercício de atividade da “restauração” a qual se não adequa com o sentido económico da “atividade comercial”.</font></i>
</p><p><b><i><font>A utilização de uma fração para fim diverso do constante do título constitutivo da propriedade horizontal constitui violação grave do direito dos condóminos, legitimando o recurso à tutela cautelar independentemente da verificação de ruídos, fumos e cheiros proveniente do estabelecimento”.</font></i></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por sua vez, o acórdão recorrido seguiu o entendimento de que a situação fáctica dada como indiciariamente assente nos autos, idêntica àquela, não permite dar como verificado o requisito, necessário ao decretamento da providência, relativo ao</font><i><font> periculum in mora.</font></i>
</p><p><font>Ora desde já se diga que </font><u><font>o entendimento seguido pela Relação de Lisboa naquele acórdão de 04.03.2004</font></u><font>, nos termos supra referidos, </font><u><font>se mostra, a nosso ver, de todo infundado</font></u><font>, na medida em que para o decretamento da providência se bastou com a mera prova da violação do direito - esquecendo por completo o requisito relativo ao </font><i><font>periculum in mora.</font></i>
</p><p><font>E </font><i><font>in casu</font></i><font>, na esteira do entendimento do acórdão recorrido, </font><b><font>afigura-se-nos que a factualidade dada como provada</font></b><font> (baseada naquela que foi alegada pelos requerentes) </font><b><font>se mostra de todo insuficiente para se poder concluir no sentido da verificação do requisito em análise.</font></b>
</p><p><font>Com efeito, com relevância para a questão, </font><u><font>apenas de se provou</font></u><font> (nºs 3.15 e seguintes) que:</font>
</p><p><font> - A requerida pretende explorar na fração em questão um restaurante, casa de pasto, snack-bar, ... ou estrutura afim, sendo sua intenção utilizar a fração autónoma em apreço para confeção de refeições (incluindo ...), preparação de snacks e venda de bebidas (incluindo alcoólicas);</font>
</p><p><font> - Para o efeito, e sem prévia informação e/ou consulta dos requerentes, já realizou trabalhos de transformação da fração num estabelecimento de restauração, tendo já procedido à instalação de uma infra-estrutura de abastecimento de gás na fração em apreço e substituiu as redes de canalização de água;</font>
</p><p><font>- Os requerentes manifestaram a sua oposição à realização de obras mas a requerida não pôs termo aos trabalhos de adaptação do espaço nem se demoveu do seu intento de aí desenvolver a atividade de restauração, não tendo interrompido os trabalhos de transformação da fração num restaurante;</font>
</p><p><b><i><font>- O Prédio identificado em 3.1. é eminentemente habitacional, nele habitando a 3.ª e o 4.° Requerentes, temendo ambos pelo seu descanso e tranquilidade caso venha a requerida a nele proceder à abertura do restaurante.</font></i></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Destes, </font><u><font>apenas o último facto poderia ter eventual relevância para a questão do requisito do </font></u><i><u><font>periculum in mora</font></u></i><font>. </font>
</p><p><font>Todavia, o mesmo </font><u><font>tem que ser considerado como de todo insuficiente</font></u><font>, na medida em que para o efeito não basta o simples facto de os requerentes, numa perspetiva meramente subjetivista, temeram pelo seu descanso e tranquilidade.</font>
</p><p><font> Conforme resulta do supra mencionado nº 1 do artigo 362º do CPC, o legislador não se bastou com a mera existência de um receio de lesão grave e de difícil reparação do direito, por parte dos requerentes da providência, exigindo ainda que tal receio se mostre “fundado”, ou seja, </font><u><font>tal receio tem que ser analisado objetivamente</font></u><font> em face de factos que justifiquem tal receio.</font>
</p><p><font>Conforme refere António Abrantes Geraldes (Temas da Reforma do Processo Civil, III vol. 4ª edição, pag. 108), nos termos citados no acórdão recorrido, o receio dever ser apoiado em factos que permitam afirmar, com segurança, objetividade e distanciamento a seriedade e a atualidade da ameaça e a necessidade de serem adotadas medidas tendentes a evitar o prejuízo</font><font>.</font>
</p><p><font>Ora, </font><u><font>o simples facto de a fração arrendada à requerida deixar de ser utilizada por esta para o exercício de uma atividade comercial para passar a nela exercer uma atividade do ramo da restauração, não pode ser, sem mais, considerado como suficiente par justificar que os requerentes receiem pelo seu descanso e tranquilidade</font></u><font>.</font>
</p><p><font>Isto, tendo-se ainda em conta que a fração arrendada à requerida se situa no rés-do-chão de uma rua situada em plena cidade de ………, naturalmente a par de vários outros estabelecimentos comerciais de natureza diversa (sendo que nada foi alegado em contrário).</font>
</p><p><font>Para além disso, nada resulta dos factos provados de onde se possa concluir que, no caso dos autos, o pretendido exercício da atividade de restauração possa vir a causar maior ruído ou outros efeitos mais nefastos ao descanso e tranquilidade dos requerentes para além daqueles que resultavam da atividade comercial anteriormente exercida.</font>
</p><p><font>Acresce que, ainda que a nova atividade pudesse vir a perturbar o descanso e a tranquilidade dos requerentes, nos termos por eles receados, não saberíamos qual o respetivo grau e se era possível ou não obstar a tal com medidas simples e práticas.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Acompanhamos assim por inteiro o que, nesse sentido, se expendeu no acórdão recorrido:</font>
</p><p><i><font>“… os estabelecimentos de restauração não reúnem todos as mesmas características e as mesmas dimensões, não têm todos a mesma capacidade de lugares e mesas, não dispõem todos dos mesmos aparelhos de sistema de ventilação e de exaustão, sempre ruidosos e incomodativos, não se mostram todos eles inseridos em prédios com semelhantes características estruturais, e , ademais, os meios ambientais em que inserem não são também sempre os mesmos [ daí que o impacto causado e sentido varie vg consoante o estabelecimento se mostre instalado, ou não, em zona sensível - área definida em plano municipal de ordenamento do território como vocacionada para uso habitacional, ou para escolas, hospitais ou similares, ou espaços de lazer - ou em zona na qual proliferam unidades de comércio e outras como cafés e outros estabelecimentos de restauração e junto de vias de trânsito automóvel ], em suma, nem todos provocam necessário</font></i><font> , </font><i><font>forçoso</font></i><font> e </font><i><font>inevitável </font></i><a><i><font>impacto ambiental negativo </font></i></a><i><font> e , provocando-o, tal impacto não é também obrigatoriamente sempre o mesmo, ou seja, de igual </font></i><i><u><font>forma e medida</font></u></i><i><font> relevante e inadmissível em termos de violação dos direitos dos condóminos residentes no prédio e/ou na vizinhança.</font></i>
</p><p><i><font>Tudo o acabado de dizer obriga assim a concluir, o que se nos afigura compreensível, adequado e sustentável, que não basta a prova de que a requerida vai instalar um restaurante no prédio dos requerentes, e em piso situado imediatamente em patamar/nível inferior àquele em que se mostra instalada a habitação dos 3</font></i><i><sup><font>o</font></sup></i><i><font> e 4°s requentes para, por si só, se considerar ser FUNDADO o receio dos apelantes em virem a padecer, logo após o mesmo - o restaurante - ser aberto ao público, de lesões </font></i><i><u><font>GRAVES</font></u></i><i><font> e outrossim </font></i><i><u><font>DIFICILMENTE REPARÁVEIS</font></u></i><i><font>.”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em suma, em total concordância com o entendimento da Relação, </font><b><font>haveremos de concluir no sentido de se não mostrar verificado o requisito da providência requerida relativo ao </font></b><b><i><font>periculum in mora</font></i></b><i><font> </font></i><font>- razão pela qual não nos pode merecer censura a decisão da Relação de manter o | [0 0 0 ... 0 0 0] |
xTJxu4YBgYBz1XKv4QnY | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font> </font></b>
<p><b><font>Revista nº 7092/17.1T8LRS.L1.S1</font></b>
</p><p>
</p><p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> AA</font></b><font> intentou, na qualidade de condómina do ..., ... e …, ..., acção especial para apresentação de coisas ou documentos, contra </font><b><font>Luvimg Imobiliária Unipessoal Lda., BB</font></b><font> e </font><b><font>CC</font></b><font>, enquanto administradores do referido condomínio e porque quando a isso instados o não fizeram ou fizeram de forma incompleta, pedindo que os mesmos fossem condenados a facultar-lhe os seguintes documentos:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>A.</font></b><font> </font><u><font>Documentos necessários para a interpelação de todos os devedores do Condomínio</font></u><i><u><font>,</font></u></i><u><font> diligencias de cobrança extrajudicial ou interposição de acção judicial de cobrança de créditos do Condomínio</font></u><i><u><font>:</font></u></i>
</p><p><font>I. </font><b><i><font>“Dossier” individual </font></i></b><b><font>de </font></b><b><i><font>cada devedor ao Condomínio</font></i></b><i><font>, que contenha os seguintes elementos e documentos, nomeadamente relativo às fracções "A", "N", ''O", "P", "S", "Y" e "Z", se os Réus não indicarem outros:</font></i>
</p><p><b><font>a.</font></b><font> Informação escrita documentada do valor devido por cada um dos devedores ao Condomínio, com indicação do valor em dívida, especificando a origem do crédito (quotas ordinárias, extraordinárias, de fundo de reserva, de obras, pela falta de apólice de seguro obrigatório que o Condomínio celebrou em nome do devedor, ou qualquer outra origem);</font>
</p><p><b><font>b.</font></b><font> Informação escrita documentada especificando, individualmente,</font>
</p><p><b><font>i.</font></b><font> A data do início do incumprimento, mesmo que seja em data anterior ao início da prestação de serviços da Ri;</font>
</p><p><b><font>ii.</font></b><font> O valor de capital,</font>
</p><p><b><font>iii.</font></b><font> O valor de juro de mora, até à data da apresentação de toda a documentação;</font>
</p><p><b><font>iv.</font></b><font> Valor das sanções regulamentares aplicáveis;</font>
</p><p><b><font>v.</font></b><font> Valor de despesas feitas para a cobrança dessas dívidas, incluindo honorários de Advogado e de Agente de Execução e custas;</font>
</p><p><b><font>c.</font></b><font> As convocatórias para as Assembleias de Condomínio, acompanhadas do respetivo comprovativo de envio e receção postal e documentos que a elas/oram anexas, em conformidade com o que foi remetido ao devedor;</font>
</p><p><b><font>d.</font></b><font> As atas assinadas que obrigam o devedor ao pagamento dos valores que ora se encontram em dívida, completas, acompanhadas de todos os documentos a elas juntos, em conformidade com o que foi enviado ao devedor, e comprovativos de envio e receção postal da sua comunicação;</font>
</p><p><b><font>e. </font></b><font>As interpelações aos condôminos devedores para pagamento de dívidas, completas e acompanhadas dos seus respetivos documentos anexos, em conformidade com as enviadas a cada um dos devedores, com os respetivos comprovativos de envio e receção postal;</font>
</p><p><b><font>f. </font></b><font>Sendo devido, pelo condômino devedor, valor referente à apólice de seguro obrigatório, não apresentada, tendo sido necessária a celebração de apólice, pelo Condomínio, em nome do condômino, será, igualmente junto ao “dossier” do devedor:</font>
</p><p><b><font>i.</font></b><font> Convocatória para Assembleia de Condôminos que determinou a celebração de apólice de seguro pelo Condomínio em nome do condômino, acompanhado dos documentos anexos à mesma, em conformidade com o que foi remetido ao condômino, com comprovativo de envio e receção postal;</font>
</p><p><b><font>ii. </font></b><font>A ata assinada onde foi exarada a deliberação para celebração do contrato de seguro pelo Condomínio, acompanhado de toda a documentação a ela junta, em conformidade com o que/oi comunicado ao devedor, com comprovativo de envio e receção postal da sua comunicação;</font>
</p><p><b><font>iv. </font></b><font>A interpelação que informe o devedor da celebração de contrato de seguro, em seu nome, por parte do Condomínio, acompanhada de toda a documentação anexa, em conformidade com o que foi enviado ao devedor, assim como o seu comprovativo de envio e receção postal;</font>
</p><p><b><font>v. </font></b><font>A interpelação para pagamento da dívida referente à apólice de seguro, acompanhada de toda a documentação anexa, em conformidade com o que foi enviado ao devedor, assim como o seu comprovativo de envio e receção postal;</font>
</p><p><b><font>g. </font></b><font>Cópias dos Acordos extrajudiciais ou judiciais de pagamento, com todo os seus documentos, incluindo Petição Inicial, procuração forense, contestações, oposições ou qualquer requerimento, celebrados com cada um dos devedores, com menção da data do início do incumprimento do mesmo pelo devedor;</font>
</p><p><b><font>h.</font></b><font> Cópia das peças processuais remetidas a julgados de Paz ou a Tribunal no âmbito de processo judicial destinado à cobrança da dívida, interpostos contra o devedor, acompanhado de todos os documentos juntos aos autos incluindo Petição Inicial, procuração forense, contestações, oposições ou qualquer requerimento;</font>
</p><p><b><font>i. </font></b><font>Cópia das Procurações forenses conferidas aos Mandatários intervenientes nas diligências extrajudiciais e judiciais de cobrança das dívidas, de cada devedor;</font>
</p><p><b><font>j. </font></b><font>Lista completa, atualizada e correta dos dados de faturação dos condóminos devedores, com menção do Número de Identificação Fiscal ou de Pessoa Coletiva, morada atualizada da residência, ou de sede, número de telefone ou de telemóvel, endereço de correio eletrónico, domicílio profissional, identificação do cônjuge do condômino, conforme conste no Registo Predial;</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>B. </font></b><u><font>Documentos para comprovação da legalidade da situação do capital seguro: </font></u>
</p><p><b><font>a. </font></b><font>Cópias das apólices de seguros apresentadas por todos os condôminos e respetivos comprovativos de pagamento;</font>
</p><p><b><font>b. </font></b><font>Indicação dos riscos assegurados por cada uma das apólices;</font>
</p><p><b><font>c. </font></b><font>Comprovativos de pagamento, pelos condôminos jàltosos, das apólices subscritas pelo Condomínio, em nome daqueles.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>C. </font></b><u><font>Documentos necessários para a elaboração de Regulamento de Condomínio</font></u><font>: </font>
</p><p><b><font>a. </font></b><font>A convocatória para a Assembleia de Condôminos onde foi aprovado o Regulamento de Condomínio, acompanhado de todos os documentos, em conformidade com o que foi comunicado aos condôminos, com comprovativos de envio e receção postal;</font>
</p><p><b><font>b. </font></b><font>Regulamento do Condomínio, acompanhado de ata número 29 (vinte e nove), assinada, legível, com identificação dos condôminos ou procuradores que a aprovaram, acompanhada de todos os documentos juntos, nomeadamente procurações, e comprovativos de envio e receção postal para comunicação das mesmas;</font>
</p><p><b><font>c. </font></b><font>Havendo, as alterações ao Regulamento do Condomínio, antes descrito, acompanhado das atas assinadas com identificação dos condôminos que a aprovaram, acompanhadas por todos os documentos juntos, em conformidade com 0 que foi comunicado aos condôminos e comprovativos de envio e receção postal dessas comunicações;</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>D. </font></b><u><font>Documentos relativos aos créditos do Condomínio sobre a Insolvência da Sociedade Cozinhas Machado & Sacramento. Lda.: </font></u>
</p><p><b><font>a. </font></b><font>Mapa das dívidas da sociedade insolvente Cozinhas Machado & Sacramento, Lda., para com o Condomínio, vencidas antes da declaração de insolvência, onde conste:</font>
</p><p><b><font>i. </font></b><font>O valor total da dívida da insolvente, com especificação da origem do crédito (quotas ordinárias, extraordinárias, de fundo de reserva, de obras, de pela falta de apólice de seguro obrigatório que o Condomínio celebrou em nome do devedor, ou qualquer outra origem),</font>
</p><p><b><font>ii. </font></b><font>O montante de capital,</font>
</p><p><b><font>iii.</font></b><font> O Valor de juros moratórios,</font>
</p><p><b><font>iv.</font></b><font> O valor de sanções regulamentares aplicáveis e despesas feitas para cobrança da dívida, incluindo honorários de Advogado e Agente de Execução;</font>
</p><p><b><font>b. </font></b><font>Cópia da Reclamação de crédito, apresentada ao Administrador da lnsolvência da sociedade Cozinhas Machado & Sacramento, Lda, com menção do valor em dívida, reclamado, especificado em:</font>
</p><p><b><font>i. </font></b><font>Montante de capital vencido,</font>
</p><p><b><font>ii. </font></b><font>Montante de juros moratórios,</font>
</p><p><b><font>iii.</font></b><font> Montante de sanções regulamentares aplicadas e demais despesas de cobrança, incluindo honorários de Advogados, com respetivo comprovativo de envio e receção;</font>
</p><p><b><font>c. </font></b><font>Mapa dos valores das dívidas vencidas após a declaração de insolvência até à venda judicial das fracções "B", “C", "D" e "F", com especificação:</font>
</p><p><b><font>i. </font></b><font>Da origem do crédito (quotas ordinárias, extraordinárias, de fundo de reserva, de obras, de pela falta de apólice de seguro obrigatório que o Condomínio celebrou em nome do devedor, ou qualquer outra origem),</font>
</p><p><b><font>ii.</font></b><font> Do montante de capital,</font>
</p><p><b><font>iii.</font></b><font> De juros moratórios, de sanções regulamentares aplicáveis;</font>
</p><p><b><font>d.</font></b><font> Mapa dos valores pagos pelo Administrador de Insolvência, pelas dívidas da Massa Insolvente (desde a declaração de insolvência até à venda judicial das frações) e, pelo rateio dos valores provenientes da liquidação do patrimônio da insolvente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>E. </font></b><u><font>Documentos relativos às dívidas do Condomínio e despesas das lojas:</font></u>
</p><p><b><font>I. </font></b><font>Dívidas do Condomínio, é necessário que seja facultada a informação escrita e documentação justificativa seguinte:</font>
</p><p><b><font>a. </font></b><font>Indicação escrita com a identificação de cada um dos credores do Condomínio;</font>
</p><p><b><font>b.</font></b><font> Faturas, passadas em nome do Condomínio, que comprove tal dívida;</font>
</p><p><b><font>c.</font></b><font> Documento de onde se extraia a informação relativa à data de início do incumprimento da obrigação do Condomínio, valores, especificados de capital, juros e outras despesas;</font>
</p><p><b><font>II. </font></b><font>Das Despesas das Lojas, é necessária a seguinte informação escrita e documentação:</font>
</p><p><b><font>a.</font></b><font> Mapa de despesas, descriminadas, do Condomínio,</font>
</p><p><b><font>b. </font></b><font>Identificação, especificada, da medida, em percentagem, do valor da despesa preconizada com as lojas, em referência às demais frações destinadas à habitação, </font>
</p><p><b><font>c.</font></b><font> Documento de onde se extraia a reflexão dessa percentagem de despesas com as lojas, no valor da respetiva quota ordinária de Condomínio;</font>
</p><p><b><font>III. </font></b><font>Das contas parcelares do Exercício da Administração</font>
</p><p><b><font>a. </font></b><font>Mapa de despesas e receitas relativas ao período referente ao exercício de Administração respeitante ao período compreendido entre 5 de Abril de 2016 e 27 de Outubro de 2016 e documentos comprovativos das despesas e receitas;</font>
</p><p><b><font>b.</font></b><font> Mapa de despesas e receitas relativas ao período referente ao exercício de Administração respeitante ao período compreendido entre 27 de Outubro de 2016 e 5 de Abril de 2017 e documentos comprovativos das despesas e receitas;</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>F. </font></b><u><font>Outra Documentação solicitada aos Réus:</font></u>
</p><p><b><font>a.</font></b><font> Informação escrita e documentada sobre as diligências encetadas para o cumprimento do deliberado em Assembleia de Condomínio sobre a estrutura metálica construída no terraço da fração "E", correspondente ao 1- Andar Direito, sua intervenção de recuperação ou demolição;</font>
</p><p><b><font>b. </font></b><font>Documento onde se informe do estado da execução das deliberações aprovadas em Assembleia de Condomínio, constantes nas atas 50 a 53;</font>
</p><p><b><font>c. </font></b><font>Cópia do contrato de prestação de serviços, celebrado entre o Condomínio e a R1;</font>
</p><p><b><font>d. </font></b><font>Informação escrita documentada sobre os valores que a Autora tem como crédito sobre 0 Condomínio, por adiantamentos para pagamento das apólices de seguro obrigatório dos condôminos que não apresentaram tal documentação e para vistoria dos elevadores do Condomínio;</font>
</p><p><b><font>e. </font></b><font>Informação escrita documentada dos motivos que levaram a R1 a não diligenciar no sentido de se ter, entre os dias 22 e 26 de Maio do presente ano, à limpeza da área de parqueamento do Condomínio e da instalação de ponto de fornecimento de água para uso próprio do Condomínio e para não colaborar na colocação das fitas de isolamento;</font>
</p><p><b><font>d. </font></b><font>Documento escrito das soluções para a situação da permanência dos pombos nos beirais do telhado e correspondentes orçamentos para a instalação/aplicação de tais medidas persuasivas.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>G. </font><u><font>Ata Numero 54 (cinquenta e quatro):</font></u>
</p><p><font>a. Comunicação do conteúdo da acta número 54 (cinquenta e quatro), assinada e nos termos em que foi comunicada aos demais condôminos, acompanhada de todos os documentos anexos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A sociedade Ré contestou excecionando a ineptidão da petição inicial e o abuso de direito (por se visar formular juízo de avaliação do desempenho da administração e a obtenção de documentação a expensas do condomínio) e alegando não se verificarem os requisitos para a procedência da ação.</font>
</p><p><font>Os Réus 2 e 3 contestaram alegando ser o Réu 1, enquanto empresa a quem está confiada a administração do condomínio, quem detém toda a documentação e conhecimento sobre a atividade do condomínio.</font>
</p><p><font> </font><b><font>*</font></b>
</p><p><font>Foi proferido </font><b><u><font>despacho saneador- sentença,</font></u></b><b><font> </font></b><font>no qual, para além de se julgar</font><u><font> improcedente a exceção de ineptidão da petição inicial,</font></u><font> se decidiu </font><u><font>indeferir os pedidos de informação e absolver os réus dos pedidos de apresentação de documentos</font></u><font>;</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>*</font></b>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de apelação da autora, a </font><b><u><font>Relação de Lisboa</font></u></b><font>, julgando parcialmente procedente o recurso, </font><u><font>revogou a sentença recorrida e decidiu:</font></u>
</p><p><i><font>1. Admitir a cumulação dos pedidos de informação com os pedidos de apresentação de documentos;</font></i>
</p><p><i><font>2. E, conhecendo de tais pedidos:</font></i>
</p><p><i><font>a) Condenar a Ré 1ª fornecer, em 20 dias e uma vez assegurados os custos incorridos, à autora apelante:</font></i>
</p><p><i><font>i. - cópia da versão do regulamento do condomínio vigente;</font></i>
</p><p><i><font>ii. - informação sobre o montante e natureza da dívida da sociedade insolvente, se tal dívida foi ou não reclamada na insolvência, bem como do resultado dessa eventual reclamação e do eventual pagamento e cópia das correspondentes peças processuais;</font></i>
</p><p><i><font>iii. - informação sobre a existência de eventuais dívidas do condomínio, e em caso afirmativo a indicação do montante, do credor, do tempo da mora e das consequências desta;</font></i>
</p><p><i><font>iv. - informação sobre a execução do deliberado nas assembleias de condôminos a que se reportam as atas 50 a 53 bem como relativamente à estrutura metálica construída no terraço da fração E;</font></i>
</p><p><i><font>v. - cópia do contrato de prestação de serviços celebrado entre o condomínio e a Ré1;</font></i>
</p><p><i><font>vi. - informação sobre créditos da Apelante decorrentes de adiantamentos para pagamento de seguro obrigatório não apresentado pelos condôminos e vistoria dos elevadores do condomínio, com a concomitante apresentação da documentação pertinente de que eventualmente tenha a posse;</font></i>
</p><p><i><font>vii. - cópia da ata n° 54 que eventualmente tenha sido elaborada.</font></i>
</p><p><i><font>b) Absolver os Réus do demais pedido.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> *</font>
</p><p><font>Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a autora o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A – O fundamento do recurso assenta na previsão do artigo 671.º n.º 3, do CPC, em que a decisão de 1.ª instância recorrida tem fundamentação diferente do acórdão em crise, as alegações deste recurso consideram-se aqui como causa, das presentes conclusões e em consequência, as informações e documentos requeridos pela recorrente perante a sua PI, são preexistentes e na disponibilidade das Rés e são necessários para que a recorrente tenha conhecimento da realidade de facto e jurídica da sua co-propriedade incindível da sua propriedade em regime de propriedade horizontal,</font>
</p><p><font>B – Sem aquelas informações, documentos, não é possível à recorrente, saber, decidir se pode avançar com as obras urgentes e requerer direitos de regresso, nem tão pouco, mesmo quanto à sua quota parte de responsabilidade, saber quanto terá que despender para a realização das obras no edifício, nem saberá o valor das contas de fundo de reserva que deviam existir, nem qual o valor dos créditos a haver e pagar vencidos, nomeadamente de condóminos faltosos ou de dividas do condomínio que a Ré empresa de administração do condomínio se alega credora,</font>
</p><p><font>C – Sem aquelas informações, documentos, a recorrente não sabe se está seguro o seu património, porquanto a haver condóminos sem seguro de responsabilidade civil obrigatória contra riscos de incendio, havendo nomeadamente incendio numa fração que afete alguma das propriedades da recorrente fica esta com sérias dificuldades de ser ressarcida pela eventualidade,</font>
</p><p><font>D – Sem que a ata n.º 54 seja comunicada aos condóminos pela entidade responsável por a comunicar (administração) e não sendo a mesma arquivada na documentação, atas do condomínio, a mesma ficará desconhecida aos condóminos e não poderá produzir efeitos.</font>
</p><p><font>E – Sem as informações e documentos requeridos, a utilidade instrumentária desta ação ora em recurso fica destituída face aos processos ulteriormente instaurados pela recorrente contra as Rés, pelos quais ficou a recorrente impedida de com liberdade nomeadamente deliberar, votar em assembleias do mesmo condomínio por não lhe serem apresentadas as informações, documentos requeridos nesta ação sob recurso.</font>
</p><p><font>F – Pela decisão que se recorre, foram violadas todas as normas jurídicas e princípios invocados desde a PI até ao recurso que se apresentou perante a 2.ª Instância, nomeadamente, artigos 362.º, 573 a 575.º, 1420.º, n,º 1, 1429.º-A, n.º 1, 1154.º, 1156.º ex vi 1161, al. a) a c) 1427, 1436.º, 1432.º n.º 9, 1435.º n.º 4, 1437.º n.º 2 do CC, art.º 1.º, n.º 3, 2.º n.º 2, 6.º e 9.º do Decreto -Lei 268/94, de 25 de Outubro e art.º 1045.º a 1047.º do CPC, assim como o artigo 2.º n.º 2 do CPC e 2.º, 13.º, 20.º n.º 1, 2 e 5 da Constituição da Republica Portuguesa, </font>
</p><p><font>G – Face ao direito antes descrito, a decisão recorrida deveria ter declarado que a recorrente tinha o direito a ser informada e documentada sobre as questões apresentadas, requeridas, porquanto a mesma tem direito à tutela efetiva para o acesso ao direito e aa um processo atendível que realize os seus direitos, para que a informação lhe seja acessível como é a informação sobre a realidade de facto e jurídica da sua propriedade que não deve ser ocultada por outros coproprietários ou terceiros, e que lhe permita ainda, nomeadamente de forma instrumental realizar o seu direito.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Não foram apresentadas contra-alegações</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>*</font></b>
</p><p><font>Entretanto, posteriormente, </font><b><u><font>por requerimento dirigido simultaneamente à Relação e a este STJ</font></u></b><font> (fls. 793), já depois da interposição do recurso e antes de ser proferido despacho (na Relação) a admitir o recurso, baseando-se em determinados documentos que juntou (Doc. 1 - Email de 10 de Julho de 2019; Doc. 2 - Requerimento de 5 de Setembro de 2019, sobre custas de parte; Doc. 3 - Convocatória para Assembleia Geral de Condóminos de 23SET2019; Doc. 4 - Resumo das Deliberações da Ata n.º 53.º da Assembleia de Condóminos, documento junto à Ata n.º 54; Doc. 5 - Atas n.ºs 55 a 57 das Assembleias de condomínio de 6 e 7 de Setembro e suas convocatórias e avisos, e Ata de 20 de Setembro de 2017. Doc. 6 - Convocatória para Assembleia Geral de Condóminos de 16 de Novembro de 2017, e documento anexo à ata n.º 58, Doc. 7 - Convocatória para Assembleia Geral de Condomínios para dia 17 de Janeiro de 2018, e documento junto à ata n.º 59) </font><u><font>a autora recorrente veio requerer</font></u><font>:</font>
</p><p><i><font>I. Que o presente requerimento, atentas, todas, as razões e documentos, aqui, juntos e requeridos juntar, suba ao Supremo Tribunal de Justiça, com a decisão desse Venerando Tribunal, que sobre o mesmo recair. </font></i>
</p><p><i><font>II. Que além dos documentos, supervenientes, ao tempo de interposição, desta ação e recurso, que aqui se juntam, em anexo, que seja, a Ré 1, notificada, para apresentar, nestes autos de recurso, os documentos condenados a apresentar pelo acórdão sob recurso, (acompanhados da ata n.º 53 e seus documentos juntos, porque a ata n.º 54 faz referências de remissão para a ata n.º 53) que com o conjunto de documentos aqui anexos, se pode facilmente extrair, provar, com pormenor, a motivação, legitimidade e interesse em agir da Autora, recorrente, quer neste incidente, quer conexamente face ao recurso, apresentado, para o Supremo Tribunal de Justiça, assim como dos direitos que lhe emergem, documentos que com o salvo respeito que é muito, nem o Tribunal da Relação de Lisboa nem o Supremo Tribunal de Justiça, pelo princípio da oficiosidade e de Iure Novit Curia, para o dever de julgar, não devem ser alheios nem se absterem de conhecer. </font></i>
</p><p><i><font>III. Que fique assente que não só em ação judicial, mas também antes da mesma de forma extrajudicial, diretamente perante a Administração do condomínio, como perante Assembleia de Condomínios, foi sucessivamente e continuamente requerido pela Autora, recorrente obter as informações e documentos solicitados na ação judicial, assim como foi a Assembleia de Condóminos convocada reunir para apresentação dos documentos requeridos nesta ação, sem que a Assembleia de Condóminos, informasse ou documentasse a Autora, recorrente daqueles, documentos/informações. </font></i>
</p><p><i><font>IV. Que seja prolatada decisão, na qual esclareça, determine, que os documentos e informações, que a Ré 1, seja condenada a prestar, devem ser colocados na Secretaria do Tribunal, de 1.ª instância, para exame e após, exame, poderem ser devolvidos, levantados, pela Ré 1, permitindo, à Autora, requerer certidões, pagando, essas certidões e quanto a esses documentos e informações, apresentados para exame, pela Ré 1, não seja exigido, à Autora, recorrente, as pagar, porquanto são documentos e informações que, nomeadamente, em Assembleias de Condomínio e em convocatórias ou em comunicação de atas, a Administração do condomínio, devia as ter prestado e não prestou e porque, esses documentos e informações, devem constar na documentação, do condomínio ou porque, esses documentos e informações, face aos documentos juntos e ata n.º 54, terão deliberações para serem, apresentados aos condóminos e não foram. </font></i>
</p><p><i><font>V. Que seja melhor apreciada a condenação em custas, e não aplicação à Autora, recorrente a tabela I-C, que seja a Ré 1, condenada nas custas. </font></i>
</p><p><i><font>VI. Que seja prolatada decisão, na qual esclareça, que a decisão, destes autos, ainda não transitou em julgado e que o efeito é devolutivo, sendo, atualmente, inexequível, a nota de custas de parte, apresentada pela Ré 1, em anexo. </font></i>
</p><p><i><font>VII. Que em consequência, junto do recurso de revista apresentado sobre o acórdão recorrido, seja realizada justiça! Que desde já com o devido respeito e melhor opinião, só na mera hipótese de abuso de direito poderia decair a pretensão da Autora, recorrente em ter acesso a informações e documentos para o livre exercício dos seus direitos de proprietária e comproprietária, assim como para poder realizar a sua efetiva tutela judiciária. </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>*</font></b>
</p><p><font>No despacho de admissão da revista, na Relação, </font><u><font>o Exmo. Desembargador Relator tomou posição sobre tal requerimento nos seguintes termos</font></u><font>:</font>
</p><p><i><font>“Quanto ao requerimento de fls. 793 do processo em papel (tanto quanto dele se compreende):</font></i>
</p><p><i><font>- o recurso destina-se apenas a reapreciar a decisão já tomada não cabendo nele a apreciação da execução do julgado ou de factos supervenientes;</font></i>
</p><p><i><font>- a forma adequada de reagir quanto à condenação em custas é o pedido de reforma quanto a custas ou o recurso (que a recorrente não usou) e não o requerimento avulso depois de esgotados os prazos para a dedução daqueles meios;</font></i>
</p><p><i><font>- não há que ordenar a apresentação de documentos na secretaria do tribuna! uma vez que na sentença recorrida já se decidiu que esses documentos são a entregar à recorrente assegurados que sejam por esta os custos incorridos;</font></i>
</p><p><i><font>- a apreciação da pretendida junção de documentos compete ao STJ;</font></i>
</p><p><i><font>- as questões relacionadas com as custas de parte são da competência da 1</font></i>
</p><p><i><font>instância.”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>*</font></b>
</p><p><font>Subidos os autos ao STJ, </font><b><u><font>pelo Relator foi proferido despacho</font></u></b><font> no qual, para além de se formular </font><b><font>convite às partes para querendo se pronunciarem sobre a questão da existência de dupla conforme</font></b><font> a que alude o nº 3 do artigo 671º do CPC, </font><u><font>relativamente ao decidido no acórdão recorrido no sentido do indeferimento parcial da apresentação de documentos</font></u><font>, foi proferida </font><b><u><font>decisão sobre o requerimento de fls. 793</font></u></b><u><font>, nos seguintes termos:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>“</font><i><font>Proferido o acórdão recorrido, esgotado ficou o poder jurisdicional da Relação.</font></i>
</p><p><i><font>Esta limitou-se a conhecer, e era apenas isso que lhe competia, do recurso interposto da sentença (saneador-sentença) proferida na 1ª instância (com a qual, da mesma forma se esgotou o poder jurisdicional de tal instância).</font></i>
</p><p><i><font>E, conforme é sabido, </font></i><i><u><font>os recursos apenas visam a impugnação das decisões objeto dos mesmos e, concomitantemente, a reapreciação das questões neles suscitadas, que ali foram ou deveriam ter sido apreciadas.</font></u></i>
</p><p><i><font>Não competia assim à Relação e, da mesma forma a este Tribunal, apreciar novas questões e proferir novas decisões – conforme pretende a autora ora requerente com o requerimento em análise.</font></i>
</p><p><i><font>Aliás, </font></i><i><u><font>tal requerimento foi apresentado pela autora depois da interposição do recurso de revista e muito para além do prazo legal de interposição do recurso</font></u></i><i><font> – sendo aliás alheio às questões suscitadas na revista.</font></i>
</p><p><i><font>Conforme, na Relação, bem salientou o Exmo. Relator (no despacho que admitiu o recurso de revista da autora) “o recurso destina-se apenas a reapreciar a decisão já tomada não cabendo nele a apreciação da execução do julgado ou de factos supervenientes; </font></i>
</p><p><i><font>Para além disso, relativamente à condenação nas custas, conforme bem se salienta naquele despacho “a forma adequada de reagir quanto à condenação em custas é o pedido de reforma quanto a custas ou o recurso (que a recorrente não usou) e não o requerimento avulso depois de esgotados os prazos para a dedução daqueles meios e “as questões relacionadas com as custas de parte são da competência da 1ª instância”.</font></i>
</p><p><i><u><font>Quanto aos documentos</font></u></i><i><font>, os mesmos teriam de ser juntos com a alegações e apenas no caso de a sua apresentação não ter sido possível em data anterior (artigos 651º e 425º do CPC) e não em momento posterior, como é o caso.< | [0 0 0 ... 0 0 0] |
3jJqu4YBgYBz1XKvzQQP | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Notificada do nosso acórdão da conferência de 09.02.2021 que - indeferindo a por si invocada nulidade do nosso anterior acórdão da conferência que manteve a decisão do Relator de não admissão do recurso de revista excecional por si interposto – a </font><u><font>condenou na taxa de justiça sancionatória excecional de seis UCs</font></u><font>, </font><b><font>veio a autora recorrente AA</font></b><font>, </font><u><font>requerer a sua reforma quanto a custas, no sentido de a taxa sancionatória excecional ser fixada no mínimo legal, de duas UCs</font></u><font>.</font><br>
</p><p><font>E juntou declaração do Centro Nacional de Pensões, onde se declara que a autora recorrente recebeu em 2019 a quantia global de € 6.170,91 de pensão de invalidez ou velhice e de pensão de sobrevivência.</font><br>
</p><p><font>Alegou para o efeito e em resumo o seguinte:</font><br>
</p><p><font>- A desvalorização, no acórdão recorrido, da invocada insuficiência económica para justificar a sua condenação na taxa sancionatória excecional contraria o disposto no nº4 do artigo 27º do RCP;</font><br>
</p><p><font>- O argumento ali invocado sobre a falta de pronúncia sobre uma pretensa decisão (de o tribunal se não deslocar à residência da autora para a ouvir) pelo facto de sobre a mesma não incidir o recurso em causa é manifestamente improcedente e imprudente, na medida em que no recurso alegou que a audiência é nula, por não ter sido praticado ato essencial à boa e justa decisão da causa, em infração ao disposto no art.º 195.º/1 do CPC, estando documentada a impossibilidade justificada da presença da recorrente na audiência, mas capaz de depor, pelo que, podia e devia ser utilizado meio adequado para lhe tomar as declarações. </font><br>
</p><p><font>A parte contrária não respondeu.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><u><font>Cumpre decidir:</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>Não estando (nem podendo estar) em causa a condenação nas custas (face ao decidido no acórdão reformando, no sentido de indeferimento da invocada nulidade do anterior acórdão da conferência), com aplicação de taxa sancionatória excecional, nos termos ali decididos – o que a autora requerente questiona é o montante da taxa sancionatória.</font><br>
</p><p><font>Tendo sido condenada em seis UCs de taxa de justiça, pretende que esse valor seja reduzido para duas UCs, correspondente ao limite mínimo legal previsto no artigo 10º do RCP (que estipula de 2 a 15 os limites da taxa sancionatória excecional).</font><br>
</p><p><font>Isto, segundo a mesma, tendo em conta a sua “indigência” e o disposto no nº 4 do artigo 27º do RCP. </font><br>
</p><p><font>Proferida a sentença (ou acórdão) fica, em princípio, esgotado o poder jurisdicional, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 613º do CPC.</font><br>
</p><p><font>Isto sem prejuízo de, nos termos do disposto no nº 2 do mesmo artigo, o tribunal poder retificar erros materiais suprir nulidades ou “</font><i><u><font>reformar a sentença</font></u></i><i><font> nos termos dos artigos seguintes”</font></i><font>, </font><u><font>designadamente quanto a custas</font></u><font>, nos termos do disposto no artigo 616º do CPC, desde que se verifique existir </font><i><font>“manifesto lapso”</font></i><font> do juiz. </font><br>
</p><p><font>Conforme bem referem A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, pag. 738) </font><i><font>“a regra sobre o esgotamento do poder jurisdicional encontra um desvio nos casos em que exista erro decisório em matéria de custas e de multa e ainda…”</font></i><font> </font><br>
</p><p><font>O acórdão reformando, na determinação do valor da taxa sancionatória excecional </font><b><font>teve em consideração os respetivos limites (2 a 15 UCs) e</font></b><font> </font><b><font>bem assim a gravidade da violação dos deveres de prudência</font></b><font>, por parte da autora recorrente/reclamante, ao invocar sucessivamente e indevidamente a pretensa omissão de apreciação de uma nulidade processual alheia à decisão da 1ª instância que motivou a subida dos autos (o que aliás mesmo agora ainda traz à colação) e ao invocar a violação do princípio do contraditório sobre uma questão relativamente à qual havia sido ouvida expressamente (tendo-se mesmo pronunciado sobre a mesma). </font><br>
</p><p><font>Relativamente ao argumento da desvalorização, no acórdão reformando, da invocada insuficiência económica, importa dizer que o que ali se disse foi que a mesma, porque invocada nesse sentido, era irrelevante, ou seja, no sentido de que a situação da invocada insuficiência económica da autora não obstava à aplicação da taxa sancionatória excecional.</font><br>
</p><p><font>De resto, se assim não fosse, as partes com insuficiência económica, sempre poderiam requerer, recorrer ou reclamar de forma “manifestamente improcedente” e “prudência ou diligência devida” sem serem sancionadas nos termos do artigo 531º do CPC – o que não faria qualquer sentido. </font><br>
</p><p><font> É certo que o invocado nº 4 do artigo 27º do RCP estabelece que </font><i><font>“O montante da multa ou penalidade é sempre fixado pelo juiz, tendo em consideração os reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo e na correcta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste”.</font></i><br>
</p><p><font>Todavia, tal disposição só é aplicável, nos termos do nº 1 do mesmo artigo, às multas e penalidades “sem que se indique o respetivo montante” (que, nos termos do preceito podem ser fixadas entre 05, UC e 5 UCs) – o que não é o caso da taxa sancionatória excecional, relativamente à qual, conforme supra referido, a lei estabelece os respetivos limites mínimo e máximo.</font><br>
</p><p><font>Assim, na fixação da medida concreta da taxa, dentro se tais limites (2 a 15 UCs) o que importa atender é à gravidade da conduta da parte.</font><br>
</p><p><font>E ainda que assim não fosse, sempre haveria que atender, conforme se atendeu, aos “</font><i><font>reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo”.</font></i><font> </font><br>
</p><p><font>A insuficiência económica apenas relevará para efeitos de eventual não pagamento coercivo das custas (em que se inclui a taxa aplicada, nos termos dos artigos 529º, nº 1 do CPC e 3º do RCP).</font><br>
</p><p><font>E mesmo que assim se não entenda o certo é que o documento ora apresentado, para além de extemporâneo (artigo 425º do CPC) apenas nos diz que segundo o Centro Nacional de Pensões a autora recebe determinadas quantias a título de pensão de alimentos e de pensão de sobrevivência, não fazendo prova da inexistência de bens e/ou outros rendimentos. </font><br>
</p><p><font>E quanto ao valor da taxa sancionatória fixada no acórdão reformando, importa dizer que, a mesma até foi fixada (em seis UCs) abaixo do limite médio (8,5 UCs), pelo que, em face da gravidade da reiterada e indevida conduta da autora recorrente e ora requerente, a mesma não poder ser tida como excessiva.</font><br>
</p><p><font>Aliás, a aplicar-se a pretendida taxa de duas Ucs, porque situada dentro dos limites normais da taxa de justiça prevista na Tabela II anexa ao RCP (05, a 5 Ucs), sem sentido ficaria a aplicação da taxa sancionatória excecional. </font><br>
</p><p><font>Em face do exposto, impõe-se indeferir a pretendida reforma do acórdão.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em indeferir a requerida reforma do acórdão quanto a custas. </font></b><br>
</p><p><font>Custas pela autora recorrente/reclamante, ora requerente, com taxa de justiça que se fixa em uma UC, dada a simplicidade.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lx. 23.03.2021</font><br>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font><br>
</p><p><font>Acácio das Neves (Relator)</font><br>
</p><p><font>Fernando Samões (1º Adjunto)</font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
IDJsu4YBgYBz1XKvpAaq | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<b><font>Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça.</font></b></div><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<p><b><font> </font></b><u><font>Notificada do acórdão da conferência, de 29.09.2020</font></u><font> que indeferindo a sua reclamação (para a conferência) do despacho do Relator que não admitiu a revista por ela interposta (como revista excecional), veio a autora recorrente, </font><b><font>AA </font></b><u><font>arguir a nulidade de tal acórdão</font></u><font>.</font><br>
</p><p><font>Diz para o efeito e em resumo que a crítica ao acórdão recorrido não é ter ocorrido dupla conforme acerca da correção da data em que foi elaborada a ata da Audiência, </font><u><font>mas, sim, visou impugnar a decisão judicial, ferida, afinal de contas, de nulidade, por motivo de o Tribunal não se ter deslocado a ……</font></u><font>, onde residia e reside (estando a mesma impossibilitada de comparecer na …., por delebilidade física), quando a lei exigia, para regularidade da lide verdadeira e leal, que a mesma prestasse declarações na morada e que o acórdão da conferência nada diz sobre esse tema, o que consubstancia nulidade que impõe a anulação do acórdão.</font><br>
</p><p><font>Mais diz que </font><u><font>o acórdão ora sob censura corrigiu o enquadramento legal da solução do caso sem antes ter dado a palavra à recorrente para se pronunciar</font></u><font>, o que mercê de uma “interpretação/aplicação absolutista infringe do art.º 3.º/3 do CPC, infringe o disposto no art.º 20.º/4 da CRP”, vendo-se confrontada com uma decisão surpresa e que </font><i><font>“terminou o pedido de acórdão a alegar a inconstitucionalidade do artigo de lei reitor, convocado pelo Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Relator, como fundamento da decisão reclamada”.</font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>A parte contrária não se pronunciou. </font><br>
</p><p><font>Convidada recorrente reclamante a pronunciar-se sobre a possibilidade da sua condenação na taxa sancionatória a que alude o artigo 531º do CPC (quando uma vez mais faz referência a uma pretensa decisão do tribunal de se não deslocar à sua residência quando, conforme referido no acórdão da conferência, tal decisão não constitui o objeto do recurso e quando diz que o acórdão da conferência alterou a norma aplicável, sem que lhe fosse dada a possibilidade de se pronunciar, quando o acórdão da conferência se limitou a corrigir um manifesto lapso na indicação da norma, e sendo que a recorrente ora reclamante já havia sido ouvida sobre a norma objeto da correção), a mesma veio tomar posição no sentido na não aplicação da tal taxa, por não ter havido imprudência ou diligência grave no lapso da sua parte e face à sua situação de pobreza. </font><br>
</p><p><font> </font><b><font>Cumpre decidir: </font></b><br>
</p><p><br>
</p><p><font>1) </font><u><font>Quanto à eventual decisão (que nem sequer é identificada pela requerente) de o tribunal não se ter deslocado à residência da autora</font></u><font>, trata-se de </font><b><font>matéria de todo estranha à decisão da 1ª instância e ao objeto da apelação de que a Relação conheceu.</font></b><br>
</p><p><font>Com efeito, conforme resulta dos autos e se refere no despacho do Relator (confirmado pelo acórdão da conferência, ora sob censura) que não admitiu a revista, por considerar estar em causa uma decisão meramente interlocutória (e não com fundamento na existência de dupla conforme), da qual não é admissível recurso para o STJ:</font><br>
</p><p><b><font>A decisão da 1ª instância </font></b><font>(proferida em simultâneo com a prolação da sentença, na qual a ação foi julgada improcedente, sendo o réu absolvido do pedido)</font><b><font> incidiu apenas sobre um requerimentos dos autores</font></b><font> (sendo que o autor marido veio entretanto a falecer) </font><b><font> de 7 de fevereiro de 2019</font></b><font>, a </font><u><font>requerer que, tendo a ata da audiência de 24.01.2019 sido colocada no Citius só a 06 de fevereiro de 2019</font></u><font>, e não lhe tendo sido certificada qualquer cota “que referisse o anacronismo, pois a ata figura no cititus como tendo sido descarregada no próprio dia, requer, </font><u><font>que lhe seja aditada uma quota no sentido acima referido</font></u><font>” (apresentado na sequência de um outro de </font><b><font>28 de janeiro</font></b><font> a re</font><u><font>querer que se elaborasse imediatamente ata da audiência final</font></u><font> para “poder responder com toda a serenidade à suspeita e labéu de litigância de má-fé que lhes foi lançada pelo tribunal”). </font><br>
</p><p><font>É o que resulta claramente da decisão da 1ª instância proferida nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“Requer ainda a A. que lhe seja “aditada uma cota” no sentido de um alegado anacronismo da ata que só foi colocada a 6/02/2019 mas aparece com a data do julgamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com todo o respeito, não se entende o que pretende a A. e para que finalidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>A ata de julgamento tem a data da realização do mesmo, independentemente da data em que a Sra Funcionária a pôde elaborar e da que foi analisada e assinada pela Magistrada, o que nem sempre é possível, como não foi, no próprio dia, devido ao demais serviço do tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>De todo o modo, qualquer prazo para impugnar as decisões proferidas na audiência contam-se da mesma, onde a A. estava representada, e não da data em que a mesma ficou disponível. </font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, é irrelevante a pretensão deduzida para os interesses da A.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, indefere-se o requerido.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas do incidente pela A. que se fixa em 2 Ucs, sem prejuízo do apoio judiciário - art.º 7º do RCP”.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>E é o que resulta ainda das próprias conclusões da apelação da autora, ora requerente, formuladas nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“I. As apelações pendentes, no desígnio da recorrente, prosseguirão para acórdão.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. A cota que falta no processado a assinalar a data exata em que foi descarregada no "citius" a ata da Audiência, é elemento essencial, visto nomeadamente o disposto no art.º 253.° do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>III. A Audiência é nula, por não ter sido praticado ato essencial à boa e justa decisão da causa, em infração ao disposto no art.º 195.°/1 do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>IV. Com efeito, estando documentada a impossibilidade justificada da presença da recorrente na Audiência, mas capaz de depor, podia e devia ser utilizado meio adequado para lhe tomar as declarações (deslocação do Tribunal ou via telefone).</font></i><br>
</p><p><i><font>V. Isso mesmo prescrevem os art.°s 457.°/1/2 e 520.°/1/2 do CPC, que foram . infringidos.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI. Enquanto é contrário à regra de terceiro imparcial do juiz pressupor que um "depoimento" não prestado seja irrelevante para o julgamento da matéria de facto.</font></i><br>
</p><p><i><font>VII. Nula a Audiência, nula a sentença recorrida, condicionada in totum pelo vício assinalado.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII. Assim, a sentença recorrida deve ser revogada, para que a Audiência de Discussão e Julgamento venha a ser repetida.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><u><font>A Relação, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, confirmou a decisão recorrida</font></u><font> (a Relação considerou inexistir qualquer nulidade e que, ainda que integrasse uma nulidade processual, a apreciação de tal questão em sede de recurso, sempre se encontraria dependente da sua arguição prévia junto do tribunal recorrido, uma vez o âmbito de ação do tribunal de recurso se circunscreve à reapreciação de questões julgadas na 1ª instância). </font><br>
</p><p><font>Assim, interposto que foi recurso de revista excecional pela autora apelante</font><b><font>, o que o Relator (e posteriormente a conferência</font></b><font>, perante a reclamação para a mesma apresentada</font><b><font>) tinha que verificar era se a decisão que foi objeto do acórdão recorrido</font></b><font> (que, por sua vez, teve por objeto a decisão da 1ª instância supra transcrita, de indeferimento da pretensão de ser elaborada uma cota relativa à ata da audiência) </font><b><font>era passível de recurso para o STJ.</font></b><br>
</p><p><font>Foi o que foi feito.</font><br>
</p><p><font>Por isso não tinham o Relator e a Conferência que se pronunciar sobre a eventual decisão da não deslocação do tribunal à residência da autora – razão pela qual se não verifica quanto esta matéria qualquer nulidade resultante de omissão de pronúncia.</font><br>
</p><p><font>De resto, tal eventual decisão sempre seria da mesma forma enquadrável na previsão do nº 2 do artigo 671º do CPC. </font><br>
</p><p><font>2) Quanto à violação do contraditório, é manifesta a falta de razão da autora ora requerente.</font><br>
</p><p><font>Conforme se alcança dos autos, antes de ser proferida a decisão de não admissão da revista – objeto de reclamação para a conferência que foi conhecida no acórdão ora sob censura – mediante despacho Relator, </font><b><font>as partes foram convidadas a tomar posição sobre a questão da inadmissibilidade da revista</font></b><font> </font><u><font>à luz do disposto no nº 2 do artigo </font></u><b><u><font>671º</font></u></b><u><font> do CPC.</font></u><br>
</p><p><u><font>E a autora recorrente (apenas ela) até se veio pronunciar sobre tal questão</font></u><font>, tomando posição no sentido de as decisões interlocutórias sobre declaração ou não de nulidades ocorridas antes da decisão final não caberem na proibição do nº 2 do artigo 671º do CPC. </font><br>
</p><p><font>É certo que no despacho do Relator, para justificar a inadmissibilidade do recurso, em vez deste nº 2 do artigo 671º do CPC se fez referência, por manifesto lapso, ao “corpo do nº 2 do artigo 672º” (672º em vez de 671º) – lapso esse que era por demais evidente e que foi objeto de correção nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><font>“Antes de mais, cumpre explicitar e corrigir o que no despacho do Relator objeto da presente reclamação se consignou, no sentido de que “</font><i><font>é manifesto estarmos perante uma situação enquadrável na previsão do corpo do nº 2 do artigo 672º do CPC.”</font></i><br>
</p><p><font>É manifesto que a referência ao “corpo do nº 2 do </font><b><font>artigo </font></b><b><u><font>672º</font></u></b><font> do CPC” não passou de um mero lapso, já que o que se pretendia era fazer referência ao “corpo do nº 2 do artigo </font><b><u><font>671</font></u></b><font>º do CPC” – no qual se estabelece que </font><i><font>“os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias sobre a relação processual só podem ser objeto de revista”</font></i><font> nas situações elencadas nas alíneas a) e b) –alíneas estas referentes a situações que não estão minimamente em causa nos autos (nem sequer foram invocadas).</font><br>
</p><p><font>Com efeito, e após se fazer referência ao nº 1 deste artigo 671º, explicitou-se no despacho reclamado que “</font><i><font>Tal acórdão incidiu assim, não sobre decisão que conhecesse do mérito da causa ou que tenha posto termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos</font></i><b><i><font>, mas sim sobre uma mera decisão interlocutória, de cariz meramente processual”.</font></i></b><font> </font><br>
</p><p><font>Verifica-se assim que, contrariamente ao que diz a autora ora requerente, no acórdão da conferência ora sob censura, </font><u><font>não só não houve alteração da norma aplicável</font></u><font> (671º, nº 2 do CPC), mas apenas correção de lapso manifestamente evidente) </font><u><font>como não houve violação do contraditório</font></u><font> uma vez que a questão da inadmissibilidade do recurso com base naquela disposição até foi suscitada, tendo as partes sido convidadas a pronunciar-se sobre tal questão. </font><br>
</p><p><font>E daí que a violação constitucional invocada pela requerente, na perspetiva de não ter havido lugar ao contraditório, se mostre de todo infundada.</font><br>
</p><p><font>Impõe-se assim indeferir a invocada nulidade do acórdão da conferência. </font><br>
</p><p><font>Nos termos do disposto no artigo 531º do CPC deve ser aplicada uma taxa sancionatória excecional quando </font><i><font>“a ação, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente </font></i><b><i><font>seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida”.</font></i></b><br>
</p><p><font>A invocação da nulidade do acórdão da conferência, atentas as razões supra mencionadas para o seu indeferimento, enquadra-se de todo nessa previsão (na fronteira da litigância de má fé), sendo de todo irrelevantes as razões invocadas (pretenso lapso desculpável e insuficiência económica), impõe-se a condenação da autora requerente nessa conformidade e tendo-se ainda em conta o disposto no artigo 531º do RCP (taxa de 1 a 15 UCs).</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em indeferir a invocada nulidade do acórdão da conferência. </font></b><br>
</p><p><font>Custas pela requerente com taxa de justiça (sancionatória excecional) que se fixa em seis UCs.</font><br>
</p><p><b><font> </font></b><br>
</p><p><font>Lx. 09.02.2021</font><br>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font><br>
</p><p><font>Acácio das Neves (Relator)</font><br>
</p><p><font>Fernando Samões (1º Adjunto)</font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
HjJxu4YBgYBz1XKvBwlT | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font>Revista nº 1920/16.6T8ALM-B.L1.S1</font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p>
</p><p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>Transportes Beira Rio S.A.</font></b><font>, </font><b><font>Zafil Comércio e Reparação de Automóveis Lda</font></b><font>, e </font><b><font>AA, BB e CC</font></b><font>(estes na qualidade de herdeiros do avalista singular DD), por apenso à execução que lhes foi movida pela exequente </font><b><font>Caixa Geral de Depósitos, S.S.</font></b><font>, deduziram (em separado) oposição à execução, suscitando a questão da inexigibilidade do pagamento da quantia exequenda e pugnando, a final, pela procedência da oposição e consequente extinção da execução. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegaram para tanto e em resumo que os títulos executivos não são oponíveis aos embargantes, sendo que o aval caducou com o registo da hipoteca sobre o imóvel sito em …, e que a livrança foi objeto de preenchimento abusivo face ao teor do pacto de preenchimento. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Prosseguindo os autos, após contestação da exequente/embargada, veio a ser proferida </font><b><font>sentença</font></b><font>, nos termos da qual </font><u><font>a oposição foi julgada improcedente.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Na sequência e no âmbito de recursos de apelação dos embargantes </font><b><font>AA</font></b><font>, </font><b><font>BB</font></b><font> e </font><b><font>CC</font></b><font>(na qualidade de herdeiros do avalista singular DD)</font><b><font> </font></b><font>e da embargante </font><b><font>Transportes</font></b><font> </font><b><font>Beira</font></b><font> </font><b><font>Rio,</font></b><font> </font><b><font>S.A., </font></b><b><u><font>a Relação de Lisboa</font></u></b><font>, julgando improcedente a apelação desta e procedente a apelação daqueles, </font><u><font>julgou extinta a execução relativamente aos embargantes herdeiros do avalista singular, prosseguindo contra as sociedades embargantes.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a exequente/embargada Caixa Geral de Depósitos o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> A) Com o devido respeito, o Douto Acórdão da Relação julgou procedente o a apelação dos recorrentes herdeiros, algo que não carece entendimento por parte do ora Recorrida. Vejamos,</font>
</p><p><font>B) O tribunal de Primeira Instância julgou e bem os Embargos de Executado totalmente </font>
</p><p><font>improcedentes.</font>
</p><p><font>C) A ora Recorrida, salvo melhor opinião, entende que muito bem esteve o douto Tribunal a quo, ao julgar totalmente improcedente os presentes Embargos.</font>
</p><p><font>D) Aliás, entende a mesma até que outra decisão não poderia ter sido tomada, atendendo à prova produzida nos presentes autos. Senão vejamos:</font>
</p><p><font>E) O contrato inicial preveria que existisse uma alteração contratual com reforço de hipoteca mais à frente com libertação dos respetivos avais, contudo e como foi possível verificar em sede de julgamento e através de prova testemunhal, o que ficou patente no contrato foram as dificuldades financeiras por parte da empresa, e como tal o que foi feito foi um reforço da garantia, com manutenção das respetivas garantias (hipotecas sobre duas frações e os avais).</font>
</p><p><font>F) Vem referido no próprio contrato que a alteração é feita devido a dificuldades financeiras, e por isso é que se optava por alterar a natureza do reforço da hipoteca, deixava de ser uma hipoteca para libertar ou substituir as garantias anteriores, mas passava a ser uma garantia para reforçar a garantia existente. </font>
</p><p><font>G) E como tal veio reforçar uma garantia já existente e não constituir uma nova divida, não havendo novação da divida.</font>
</p><p><font>H) Como se pode constatar a Clausula 19º do contrato inicial existe e a mesma encontra-se nos autos e faz parte da prova documental.</font>
</p><p><font>I) O que ficou provado aquando da audiência de discussão e julgamento foi que a supra indicada Cláusula foi revogada, aquando da prestação do reforço da hipoteca, uma vez que, conforme indicado pelas duas testemunhas da Recorrida, a alteração contratual não foi celebrada nas condições previstas do contrato inicial.</font>
</p><p><font>J) Aliás estas alterações contratuais só foram feitas devido às dificuldades sentidas pela </font>
</p><p><font>empresa, a mesma solicitou à CGD um período de deferimento de capital, com base nisso houve um reforço da hipoteca constituída no contrato inicial.</font>
</p><p><font>K) O que em nada fez alterar a garantia de aval já prestada no contrato anterior. Sendo que todas as partes que assinaram este contrato, inclusivamente os herdeiros tinham conhecimento e aceitaram expressamente.</font>
</p><p><font>L) Ora, portanto, ficou esclarecido que a natureza do reforço de capital se alterou, face às dificuldades financeiras da mutuária, pelo que não houve lugar a substituição das garantias existentes.</font>
</p><p><font>M) E consta não só da prova testemunhal, mas igualmente da prova documental, de que os garantes pessoais mantiveram e confirmaram a aval anteriormente prestado.</font>
</p><p><font>N) Razão pela qual bem a ora recorrida não pode concordar com a decisão do Tribunal da Relação apenas e tão só no que respeita à procedência da apelação dos recorrentes herdeiros.</font>
</p><p><font>O) Aliás, entende ainda a ora recorrida, ao contrario do que o Tribunal de Relação entendeu, o aval prestado, não foi dispensado nem caducou.</font>
</p><p><font>P) Mais, como se pode verificar no documento 2, junto no requerimento executivo, no documento complementar consta que mantem-se todas as cláusulas e condições do contrato referido em um que não foram alterados pela presente alteração contratual, pois a mesma não constitui novação da divida, mantendo-se as garantias constituídas. </font>
</p><p><font>Q) Não foi prestado novo aval, mas mantido o anterior, assim se revogando o n.º 3 da cláusula 19.ª do contrato inicial.</font>
</p><p><font>R) A livrança executada foi entregue à Recorrida para titular e garantir um empréstimo concedido à sociedade Beira Rio, Comércio e Indústria de Automóveis, SA.</font>
</p><p><font>S) Nos termos do pacto de preenchimento, a Recorrida foi autorizada a preencher a livrança, “quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Caixa, tendo em conta nomeadamente o seguinte: </font>
</p><p><font>T) A data de vencimento será fixada pela Caixa quando, em caso de incumprimento pela Cliente das obrigações assumidas , a Caixa decida preencher a livrança;</font>
</p><p><font>U) A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança”, cfr. cláusula 19ª do Doc. 1)</font>
</p><p><font>V) Deste modo, tinha a Recorrida mandato para preencher a referida livrança, o que o fez nos termos do mesmo. </font>
</p><p><font>W) A invocação do preenchimento da livrança contrariamente ao acordado é uma mera </font>
</p><p><font>afirmação de princípio, não ancorada em quaisquer factos que a Recorrida possa contrariar.</font>
</p><p><font>X) “Para que se coloque uma questão de preenchimento abusivo, enquanto exceção pessoal do obrigado cambiário, é necessário que se demonstre a existência de um acordo, em cuja formação tenham intervindo o avalista e o tomador-portador do título, acordo que este último, ao completar o respetivo preenchimento tenha efetivamente desrespeitado. Se, em substituição do pacto inválido e excluído nenhum outro se invoca, como obrigação desrespeitada no ato de preenchimento da livrança, então não há objeto sobre o qual possa ser alegado e discutido preenchimento abusivo, carecendo o avalista de fundamento para discutir uma eventual exceção, por isso que nenhuma violação de convenção consigo celebrada imputa aos demais signatários do título cambiário, por via da qual se mantivesse nas relações imediatas. Assim sendo, sobra a posição jurídica de avalista, assumindo o aval a sua plena autonomia, mantendo-se aquele obrigado nos precisos termos resultantes da obrigação cambiária inerente ao aval dado.” In </font><font>www.dgsi.pt</font><font>, Douto Acórdão do STJ de 22/10/2013, proc. 4720/10.3T2AGD-A.C1.</font>
</p><p><font>Y) Os avalistas respondem perante o titular do título, independentemente da obrigação subjacente. </font>
</p><p><font>Z) Esta era já a posição jurisprudencial largamente dominante, sendo que o Ac. De Uniformização, do STJ n.º 4/2013, de 11/12/2012, publicado no DR n.º14,de21/1/2013,veio resolver tal questão. </font>
</p><p><font>AA) Tal decisão vem fundamentada essencialmente na natureza do aval, pelo que em muito releva para estes autos: </font>
</p><p><font>BB) “Trata-se, outrossim, de uma garantia objetiva para pagamento do título sem vinculação com a obrigação avalizada, exceto quanto à existência desta. Elimina-se, pois, o carácter subjetivo (este é a vinculação com a obrigação de uma determinada pessoa) do aval para se tornar objetivo (quer dizer uma obrigação abstrata, conforme a literalidade do documento). Trata- se de uma garantia cambiária típica, dado que a obrigação do avalista se encontra desligada do avalizado; a obrigação deste torna-se abstrata e literal como direito autónomo para o portador do documento, se bem que existindo uma obrigação formal com o ato avalizado se considere como um nexo de posição, sem que se requeira uma substancial posição entre ambas as obrigações cambiárias. Em virtude disso, o avalista assume uma obrigação direta e pessoal, não com o do seu avalizado, e portanto responde, direta e pessoalmente, perante o credor cambiário, pelo pagamento do título e não pelo cumprimento deste. O avalista não assegura que o avalizado pagará, mas sim que o título será pago; não participa da obrigação de outros, mas, ao invés, fá-la própria (non alienae obligationi accedit sed alienam facit propriam); a designação da pessoa a favor a quem se presta o aval tem tão só a finalidade de fazer assumir ao avalista uma responsabilidade cambiária de igual grau que a do avalizado”(com realces aditados).</font>
</p><p><font>CC) Voltando a citar-se o Douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência já referido: “o avalista não se obriga perante o avalizado mas sim perante o titular da letra ou da livrança, constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo, como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança. A circunstância de não ocorrerem vicissitudes na relação subjacente não captam a virtualidade de se transmitirem à obrigação cambiária pelo que esta se mantém inalterada e plenamente eficaz, podendo o beneficiário do aval agir, mediante ação cambiária, perante o avalista para obter a satisfação da quantia titulada na letra. A circunstância de a relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação não induz ou faz seguir que esses efeitos se repercutam ou obtenham incidência jurídica na relação cambiária. A relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem na relação subjacente, não acompanhando as eventuais transformações temporais e/ou de qualidade da obrigação causal.”.</font>
</p><p><font>DD) Como resulta da LULL, “O dador de aval é responsável da mesma maneira que a </font>
</p><p><font>pessoa por ele afiançada e mantém-se a sua obrigação, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma” (arts. 30.°, 32.°, ex vi art. 76.º).</font>
</p><p><font>EE) Seguindo Oliveira Ascensão, “(o)avalista responde ainda que a obrigação que garantiu seja nula por razão que não seja um vício de forma (art.32º/2º§). A exclusão do vício de forma é óbvia, pois nesse caso não funciona já a aparência emergente da letra. Mas em todos os outros casos o avalista responde. Não se pode defender invocando vícios que atingiriam a obrigação do avalizado. E parece que devemos ir mais longe. Ele responde, mesmo que o avalizado não deva responder. A garantia dada pode funcionar separadamente da obrigação deste.(...) A ser assim, o avalista não esta só em posição paralela à do avalizado; está numa posição de todo autónoma em relação a este.” (Direito Comercial — Títulos de Crédito, III, Lisboa, 1992, p. 170-171).</font>
</p><p><font>FF) A mesma regra – autonomia das diversas obrigações cambiárias – resulta ainda do art. 7.º da LULL, aplicável ex vi do art. 77.º. </font>
</p><p><font>GG) À livrança em causa não falta quaisquer dos requisitos exigidos pelo art. 75º da LULL, tratando-se de livrança emitida em branco, preenchida de acordo com o respetivo pacto de preenchimento.</font>
</p><p><font>Face a todo o exposto, deverão V. Exas. negar provimento ao Douto Acórdão do Tribunal da Relação, mantendo a Douta Decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, com as demais consequências legais.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A embargante AA </font><u><font>contra-alegou</font></u><font>, pugnando pela improcedência da revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Colhidos os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Atento o teor das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, a questão de que cumpre conhecer consiste em saber se o aval prestado pelo, entretanto falecido, avalista singular DD se mostra extinto.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> É a seguinte a </font><b><font>factualidade dada como provada pelas instâncias</font></b><font>:</font>
</p><p><font> </font><br>
<font>1 - Por escritura lavrada no Notariado Privativo da Exequente, em 22/06/2011, esta concedeu a Beira Rio - Comércio e Indústria de Automóveis, Lda. um mútuo no valor de € 2.000.000,00 (DOC 1, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido).</font><br>
<font>2 - Para garantia do capital mutuado, respetivos juros e despesas foram constituídas hipotecas sobre:</font><br>
<font>a) fração "A", correspondente ao rés-do-chão esquerdo para comércio, logradouro com 61,80m2 do prédio urbano sito na EN …, n.º …, freguesia de …, inscrito na matriz sob o art. …, descrito na 2ª Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º … (DOC. 3).</font><br>
<font>b) fração "B", correspondente ao rés-do-chão direito para comércio do prédio urbano sito na EN …., n.º 1, freguesia de ..., inscrito na matriz sob o art. 888, descrito na 2ª Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º ... (DOC. 4).</font><br>
<font>c) prédio urbano sito em ..., freguesia de ..., inscrito na respetiva matriz sob o art. 825 e descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.º ... [constituída ulteriormente, na alteração ao contrato celebrada por escritura de 28/09/2012] .</font><br>
<font>3 - Para titulação das responsabilidades do referido mútuo foi entregue livrança, sendo os executados avalistas da subscritora Beira Rio - Comércio e Indústria de Automóveis, Lda. (DOC. 6).</font><br>
<font>4 - Nos termos do pacto de preenchimento, a Embargada foi autorizada a preencher a livrança, “quando tal se mostre necessário, a juízo da própria Caixa, tendo em conta nomeadamente o seguinte: A data de vencimento será fixada pela Caixa quando, em caso de incumprimento pela Cliente das obrigações assumidas, a Caixa decida preencher a livrança; A importância da livrança corresponderá ao total das responsabilidades decorrentes do presente empréstimo, nomeadamente em capital, juros remuneratórios e moratórios, comissões, despesas e encargos fiscais, incluindo os da própria livrança”, cfr. cláusula 19ª do Doc. 1).</font><br>
<font>5 - A cláusula 19.ª do documento complementar à escritura de mútuo, celebrada em 22/06/2011, e que dela faz parte integrante, tem o seguinte teor:</font><br>
<font>«</font><i><font>Cláusula</font></i><font> </font><i><font>19.ª</font></i><font> </font><i><font>(LIVRANÇA</font></i><font> </font><i><font>EM</font></i><font> </font><i><font>BRANCO)</font></i><br>
<i><font>1.</font></i><font> </font><i><font>Para</font></i><font> </font><i><font>titular</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>assegurar</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>pagamento</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>todas</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>responsabilidades</font></i><font> </font><i><font>decorrentes</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>empréstimo,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>parte</font></i><font> </font><i><font>devedora</font></i><font> </font><i><font>entrega</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>CAIXA,</font></i><font> </font><i><font>neste</font></i><font> </font><i><font>ato,</font></i><font> </font><i><font>uma</font></i><font> </font><i><font>livrança</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>montante</font></i><font> </font><i><font>e vencimento</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>branco,</font></i><font> </font><i><font>devidamente</font></i><font> </font><i><font>datada,</font></i><font> </font><i><font>subscrita</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>parte</font></i><font> </font><i><font>devedora</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>avalizada</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>TRANSPORTES</font></i><font> </font><i><font>BEIRA-RIO</font></i><font> </font><i><font>S.A.</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>ZAFIL</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>COMÉRCIO</font></i><font> </font><i><font>E</font></i><font> </font><i><font>REPARAÇÃO</font></i><font> </font><i><font>DE</font></i><font> </font><i><font>AUTOMÓVEIS,</font></i><font> </font><i><font>LDA</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>pessoalmente</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>DD,</font></i><font> </font><i><font>autorizando,</font></i><font> </font><i><font>desde</font></i><font> </font><i><font>já</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>parte</font></i><font> </font><i><font>devedora</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>avalistas</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>CAIXA</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>preencher</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>sobredita</font></i><font> </font><i><font>livrança,</font></i><font> </font><i><font>quando</font></i><font> </font><i><font>tal</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>mostre</font></i><font> </font><i><font>necessário,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>juízo</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>própria</font></i><font> </font><i><font>CAIXA,</font></i><font> </font><i><font>tendo</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>conta,</font></i><font> </font><i><font>nomeadamente,</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>seguinte:</font></i><br>
<i><font>a)</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>data</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>vencimento</font></i><font> </font><i><font>será</font></i><font> </font><i><font>fixada</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>CAIXA</font></i><font> </font><i><font>quando,</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>caso</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>incumprimento</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>parte</font></i><font> </font><i><font>devedora</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>obrigações</font></i><font> </font><i><font>assumidas,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>CAIXA</font></i><font> </font><i><font>decida</font></i><font> </font><i><font>preencher</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>livrança;</font></i><br>
<i><font>b)</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>importância</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>livrança</font></i><font> </font><i><font>corresponderá</font></i><font> </font><i><font>ao</font></i><font> </font><i><font>total</font></i><font> </font><i><font>das</font></i><font> </font><i><font>responsabilidades</font></i><font> </font><i><font>decorrentes</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>presente</font></i><font> </font><i><font>empréstimo,</font></i><font> </font><i><font>nomeadamente</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>capital,</font></i><font> </font><i><font>juros</font></i><font> </font><i><font>remuneratórios</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>moratórios,</font></i><font> </font><i><font>comissões,</font></i><font> </font><i><font>despesas</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>encargos</font></i><font> </font><i><font>fiscais,</font></i><font> </font><i><font>incluindo</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>própria</font></i><font> </font><i><font>livrança;</font></i><br>
<i><font>c)</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>CAIXA</font></i><font> </font><i><font>poderá</font></i><font> </font><i><font>inserir</font></i><font> </font><i><font>cláusula</font></i><font> </font><i><font>“sem</font></i><font> </font><i><font>protesto”</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>definir</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>local</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>pagamento.</font></i><br>
<i><font>2.</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>livrança</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>constitui</font></i><font> </font><i><font>novação</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>crédito,</font></i><font> </font><i><font>pelo</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>mantêm</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>condições</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>empréstimo,</font></i><font> </font><i><font>incluindo</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>garantias.</font></i><br>
<i><font>3.</font></i><font> </font><i><font>O</font></i><font> </font><i><font>referido</font></i><font> </font><i><font>aval</font></i><font> </font><i><font>será</font></i><font> </font><i><font>dispensado</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>Caixa</font></i><font> </font><i><font>assim</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>seja</font></i><font> </font><i><font>feito</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>reforço</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>garantia,</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>constituição</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>hipoteca</font></i><font> </font><i><font>sobre</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>imóvel</font></i><font> </font><i><font>descrito</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>Conservatória</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Registo</font></i><font> </font><i><font>Predial</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>...</font></i><font> </font><i><font>sob</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>número</font></i><font> </font><i><font>mil</font></i><font> </font><i><font>cento</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>cinquenta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>seis</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>freguesia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>….,</font></i><font> </font><i><font>imóvel</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>vai</font></i><font> </font><i><font>ser</font></i><font> </font><i><font>adquirido</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>hipotecante</font></i><font>.» (</font><b><font>facto este aditado pela Relação).</font></b><br>
<font>6 - DD faleceu em …./2012 (</font><b><font>facto este aditado pela Relação).</font></b><br>
<font>7 - Por escritura lavrada no Notariado Privativo da Exequente, em 28/09/2012, o referido contrato foi objeto de alteração, nomeadamente quanto ao prazo e com reforço da garantia hipotecária (DOC 2, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido).</font><br>
<font>8 - Conforme consta do documento complementar da escritura celebrada em 28/09/2012 (cfr. doc. 2 junto com o requerimento executivo), foi declarado que: </font><i><font>“5. No mais mantêm-se todas as cláusulas e condições do contrato referido em um que não foram alteradas pela presente alteração contratual, pois a mesma não constitui novação da dívida, mantendo-se as garantias constituídas”</font></i><font>.</font><br>
<font>9 - E foi também declarado expressamente pelos segundos outorgantes (CC e EE), em representação da Embargante, que: “a sua representada Transportes Beira Rio, SA mantém e confirma o aval anteriormente prestado”.</font><br>
<font>10 - Assim como foi declarado pela sociedade Beira Rio Comércio e Indústria de Automóveis, Lda. e Transportes Beira Rio, SA, únicas sócias da sociedade Zafil, Lda “que na invocada qualidade de únicas sócias da referida sociedade Zafil - Comércio e Reparação de Automóvel, Lda deliberam por unanimidade manter e confirmar o aval prestado por Zafil Comércio e Reparação de Automóveis, Lda”.</font><br>
<font>11 - A Transportes Beira-Rio, S.A. e a Zafil – Comércio e Reparação de Automóveis, Lda. mantiveram o aval anteriormente prestado, ao contrário do inicialmente previsto no n.º 3 da cláusula 19 do contrato inicial. A livrança executada foi entregue à Embargada para titular e garantir um empréstimo concedido à sociedade Beira Rio, Comércio e Indústria de Automóveis, SA. </font><b><font>(facto este alterado pela Relação).</font></b><br>
<font>12 - A sociedade Beira Rio - Comércio e Indústria de Automóveis, Lda. foi declarada insolvente no âmbito do proc. 1601/14.5T8LSB, Comarca de Lisboa - Instância Central – 1ª Secção de Comércio – J4.</font><br>
<font>13 - À data do vencimento da livrança encontrava-se em dívida no mútuo em causa, o valor de € 2.582.620,01, sendo € 2.000.000,00 de capital, € 214.032,88 de juros, € 303.214,28 de juros de mora, € 30.547,93 de comissões, € 21.911,82 de imposto de selo sobre juros e comissões e € 12.913,10 de imposto de selo da livrança.</font><br>
<font>14 - O prédio urbano sito na Quinta …, …., freguesia de …, concelho de ..., inscrito na matriz predial sob o artigo n.º …. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sines sob o n.º …. foi vendido na execução fiscal realizada a 28/07/2013, no âmbito da execução fiscal n.º ... e Aps., que correu termos no Serviço de Finanças de ... 2.</font><br>
<font>15 - Do produto da venda, a Embargada recebeu o valor de € 814.962,39, encontrando-se esse valor já refletido no valor reclamado.</font><br>
<i><font> </font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><u><font>Apreciando:</font></u></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> 1) Conforme referido no relatório supra </font><b><font>a 1ª instância</font></b><font> </font><u><font>julgou improcedentes</font></u><i><u><font>, in totum</font></u></i><u><font>, as oposições à execução deduzidas pelos avalistas da subscritora da livrança</font></u><font> (a mutuária “Beira Rio - Comércio e Indústria de Automóveis Lda), ou seja, pelas sociedades “Transportes Beira Rio S.A.” e “Zafil Comércio e Reparação de Automóveis Lda”, e ainda por AA, BB e CC, todos estes na qualidade de herdeiros do avalista singular DD.</font>
</p><p><font> E dos três avalistas </font><u><font>apenas recorreram de apelação, e em separado, aquela 1ª sociedade (Transportes Beira Rio) e estes herdeiros do falecido avalista singular DD.</font></u>
</p><p><font> </font><br>
<font> 2) </font><b><font>A Relação</font></b><font> </font><u><font>julgou improcedente a apelação da sociedade recorrente Transportes Beira Rio, SA</font></u><font> (mantendo assim, quanto à mesma, o decidido na 1ª instância, no sentido da improcedência da respetiva oposição à execução) e, tendo procedido a algumas alterações/aditamentos à matéria de facto (nos termos supra assinalados) </font><b><u><font>veio a julgar procedente a apelação dos herdeiros do avalista singular</font></u></b><font>, </font><u><font>por considerar extinto o aval prestado por este</font></u><font> (DD), determinando por isso o prosseguimento da execução apenas quanto às embargantes sociedades.</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font><u><font>É contra esta decisão, relativa à extinção do aval do avalista singular, que se manifesta a recorrente (exequente/embargada) Caixa Geral de Depósitos, S.A</font></u><font>. nos termos das conclusões recursórias supra transcritas.</font><br>
<font> É este, e apenas este, o segmento decisório que constitui o objeto da presente revista.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Conforme se alcança do acórdão recorrido, conhecendo da questão da extinção do aval prestado pelo avalista singular (em substituição do tribunal recorrido, após ter considerada verificada a invocada nulidade relativa à omissão de pronúncia quanto a tal questão), </font><u><font>a Relação fundamentou aquela decisão, no sentido da extinção do aval do avalista singular</font></u><font>, nos seguintes termos:</font><br>
<i><font>“</font></i><i><u><font>C.CESSAÇÃO DO AVAL PRESTADO PELO AVALISTA SINGULAR</font></u></i><br>
<b><i><font>O avalista singular apenas interveio no acordo inicial de 2011, no qual ficou expresso na cl. 19.ª</font></i></b><i><font> </font></i><b><i><font>do documento complementar </font></i></b><i><font>que faz parte integrante da escritura de mútuo, que a livrança não constitui novação do crédito e que o aval será dispensado pela Caixa assim que seja feito o reforço de garantia, com constituição de hipoteca sobre o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o número mil cento e cinquenta e seis da freguesia de Alfonsoeiro, imóvel que vai ser adquirido pela hipotecante.</font></i><br>
<b><i><font>O dito aval ficou sujeito a uma condição resolutiva: a constituição da hipoteca sobre um terceiro imóvel, ali identificado (art. 270).</font></i></b><br>
<b><i><font>Verificada a condição, poderá discutir-se se o aval caducou ou se nasceu apenas para o banco o dever de o dispensar</font></i></b><i><font>. No caso, porque ainda estamos no âmbito das relações imediatas, a quest | [0 0 0 ... 0 0 0] |
sDJsu4YBgYBz1XKvDgXI | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<br>
<b><font> </font></b><br>
<p><b><font>CCE - Controlo de Calçado para Exportação, Ldª</font></b><font> intentou ação especial de prestação de contas contra </font><b><font>Monteiro Ribas - Indústrias, S.A.</font></b><font> pedindo que esta fosse condenada:</font><br>
</p><p><font>a) A prestar contas dos fornecimentos efetuados às fábricas de calçado, entre 19/5/1997 e agosto de 1998, nomeadamente através das guias de remessa assinadas por estas e das encomendas carimbadas e rubricadas pelo gerente da A., dos recebimentos quer das fábricas de calçado, quer das seguradoras de crédito, quer da reclamação e recuperação dos créditos junto dos Tribunais, quer da cessão de créditos entre 19/5/1997 e a presente data;</font><br>
</p><p><font>b) A devolver à A. todas as garantias e a parte excedente do crédito da ex-URSS, que se vier a apurar;</font><br>
</p><p><font>c) E que, caso já tenha recebido em excesso o valor em dívida, seja condenada à devolução do excedente.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Alegou para o efeito o seguinte:</font><br>
</p><p><font>A R., desde 1992 até 1998, forneceu couros artificiais do seu fabrico para a confeção de calçado referente a encomendas colocadas pela firma inglesa denominada Atlantic Sail In Trend Limited (ATS), representada em Portugal por BB, legal representante da A., em diversas fábricas de calçado nacionais, sendo creditada à A. uma comissão incidente sobre a totalidade das encomendas que à R. eram feitas para fornecimento daqueles produtos; </font><br>
</p><p><font>Como, em Abril de 1997, as dívidas à R. por parte das fábricas de calçado haviam atingido o valor de 300.000.000$00 (€ 1.496.408,60), a R. decidiu apenas efetuar os fornecimentos caso a A. ou a ATS ficassem fiadoras dos futuros fornecimentos e garantissem os pagamentos dos valores em dívida, pelo que, em 28 de Abril de 1997, para garantia daquele valor em dívida e a continuação dos fornecimentos às fábricas de calçado, foi dado pela ATS à firma “Peixoto & Nunes-Empreendimentos Imobiliários, S.A.”, firma associada da R., uma garantia real, através da cedência da posição contratual da compra e venda de um prédio urbano já pago, livre de ónus e encargos e pertença da AST; </font><br>
</p><p><font>Em 19/5/1997, face ao aumento dos valores dos fornecimentos, que passaram de 300.000.000$00 para 378.384.346$00 (€ 1.887.373,10), foi essa garantia substituída por outra de valor superior, através de um “contrato de assunção de dívida e cessão de créditos”, celebrado entre A. e R., nos termos do qual a A. se comprometia a efetuar o pagamento dos fornecimentos feitos pela R. às fábricas de calçado que executavam encomendas para a AST até 15 de Maio de 1997, no referido valor de 378.384.346$00, com o esquema de datas referido na cláusula quarta desse acordo, tendo para esse efeito sido passados à R. cheques pré-datados, cujas datas neles mencionadas foram respeitadas, tendo sido liquidado todo o valor, acordo que funcionava como garantia e não como pagamento; </font><br>
</p><p><font>Ainda de acordo com esse contrato - cláusula segunda -, a A. garantiu igualmente o pagamento de novos fornecimentos a partir de 15 de Maio de 1997, desde que, caso a caso, na respetiva encomenda colocasse o seu carimbo e rubrica do respetivo gerente; </font><br>
</p><p><font>Ficou igualmente acordado que a R. forneceria à A. a relação de todas as faturas em débito e emitidas à quinzena, referentes à execução das encomendas mencionadas, bem como dava nota de quaisquer pagamentos efetuados;</font><br>
</p><p><font>Para além do valor mencionado na cláusula sétima do acordo, foram ainda pagos € 623.503,50 relacionados com os novos fornecimentos efetuados a partir de 15 de Maio de 1997; </font><br>
</p><p><font>Em Agosto de 1998 foram concluídas as encomendas da AST e também os fornecimentos feitos pela R. às fábricas de calçado; </font><br>
</p><p><font>A R., que se comprometeu a devolver a parte excedente do crédito que não fosse necessária ao pagamento integral da dívida da A. para com ela, tem estado a receber avultadas quantias, cujo montante desconhece, designadamente na sequência da notificação da cessão de créditos que efetuou, em 3/12/1998, à Direção Geral dos Assuntos Europeus e Relações Internacionais e da reclamação de créditos que fez junto dos processos de insolvência de algumas fábricas, sem informar a A., apesar das insistências nesse sentido. </font><br>
</p><p><font>Na contestação que apresentou, a R., defendeu-se por impugnação, pugnando pela inexistência da obrigação de prestar contas, com a consequente improcedência da ação, alegando em resumo que nem o seu crédito se encontra totalmente pago, nem a Federação … acabou de pagar o crédito que foi objeto de cessão, que apenas terminará em 20.8.2016, não sendo a A. titular desse crédito por o ter transmitido à R. por cessão, por ter sido acordado uma dação pro solvendo. </font><br>
</p><p><font>A A. respondeu, reiterando que a R. se obrigou contratualmente a prestar contas e que é dela credora pelo não pagamento das comissões, alegando que a R. litiga de má-fé na notificação que fez à Direção Geral do Tesouro em 16/9/1998, concluindo como na petição inicial, tendo a R. apresentado articulado de tréplica em que reitera que não tem obrigação de prestar contas, suscitando também a litigância de má-fé da A., cuja condenação no pagamento de multa peticiona. </font><br>
</p><p><font>Proferido despacho a determinar que os autos seguissem os termos subsequentes relativos ao processo ordinário, por se ter entendido que a questão da existência ou não da obrigação de prestação de contas não podia ser sumariamente decidida, foi, em sede de audiência preliminar, proferido despacho saneador que, afirmando a validade e regularidade da instância, </font><u><font>declarou</font></u><font> os factos assentes e elaborou base instrutória, que se fixaram com desatendimento das reclamações deduzidas. </font><br>
</p><p><font>Tendo sido entretanto instaurado procedimento cautelar, que correu termos por apenso, nele as partes celebraram transação, homologada por sentença, após o que foi proferido despacho nos autos principais - fls. 535 -, a ordenar a tramitação desta ação, em consonância com a aludida transação, a dar sem efeito o despacho saneador proferido nos autos e a audiência de julgamento designada e ordenando que a R. prestasse contas, sob a cominação do disposto na parte final do nº 5 do art. 1014º-A do CPC, seguindo-se a tramitação prevista nos arts. 1015º a 1017º do CPC. </font><br>
</p><p><font> Veio, então, a R. prestar contas sob a forma de duas contas correntes, nos termos da transação efetuada no procedimento cautelar apenso, a primeira das quais considera o lançamento a crédito no montante de 130.000.000$00 (valor atribuído ao prédio objeto do contrato que constitui o doc. 1 da p.i. e de acordo com o contrato promessa junto a fls. 526 e 527) e a segunda conta-corrente que não releva nas contas o lançamento desse crédito, conforme fls. 538 a 980. </font><br>
</p><p><font>A. contestou as contas apresentadas, impugnando quer o valor da dívida, quer o das receitas, peticionando que sejam havidas como não prestadas as contas pela R., que se tenham como prestadas as contas nos termos por si apresentados e que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia de 352,672.768$00, correspondente a € 1.759.141,90, e ainda no reconhecimento do direito de fazer seu tudo quanto se encontra depositado no Ministério das Finanças e da Administração Pública - Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, proveniente dos créditos pagos pela República Russa no âmbito do denominado “C…..”. </font><br>
</p><p><font>A R. replicou, sustentando a correção das contas por si apresentadas e a improcedência das contas apresentadas pela A. e os pedidos da sua condenação no pagamento da quantia peticionada e de reconhecimento do direito peticionado pela A. </font><br>
</p><p><font>Foi realizada audiência preliminar, com declaração dos factos assentes e elaboração de base instrutória - fls. 1982 a 1992 -, que foram objeto de reclamações parcialmente atendidas por despacho proferido a fls. 2063 e 2064. </font><br>
</p><p><font>Em sede de instrução da causa, teve lugar prova pericial colegial, cujo relatório se mostra junto a fls. 2232 a 2319, objeto de pedidos de esclarecimentos escritos, prestados nos termos constantes de fls. 2425 a 3520, que incluiu a realização de exame à letra de BB. </font><br>
</p><p><font>Seguidamente teve lugar a audiência de julgamento, com gravação da prova, em que os peritos prestaram esclarecimentos orais. </font><br>
</p><p><font>Seguidamente doi proferida </font><u><font>sentença</font></u><font>, na qual, declarando-se a factualidade provada e não provada, se decidiu:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, considero prestadas as contas nos termos expostos na presente decisão e, consequentemente:</font></i><br>
</p><p><i><font>I) Condeno a Ré a pagar à Autora o saldo das contas, no valor de 358.473.906S00 (€ 1.788.060,30);</font></i><br>
</p><p><i><font>II) Condeno a Ré a reconhecer o direito da Autora de fazer seu tudo quanto se encontra depositado no Ministério das Finanças e da Administração Pública - Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, proveniente dos créditos pagos pela República Russa, no âmbito do denominado “C….”;</font></i><br>
</p><p><i><font>III) Julgo improcedente o pedido de condenação da Ré a devolver à Autora todas as garantias que tem em seu poder resultantes quer do contrato de cessão de posição contratual, quer do contrato de assunção de dívida e cessão de créditos, dele absolvendo a Ré;</font></i><br>
</p><p><i><font>IV) Julgo totalmente improcedentes os pedidos de condenação quer da Autora, quer da Ré, como litigantes de má-fé».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de recursos de apelação de ambas as partes,</font><b><font> a Relação …., </font></b><u><font>por acórdão de 21.02.2018</font></u><font>,</font><b><font> decidiu:</font></b><br>
</p><p><i><font>“I - Julgar parcialmente procedente a apelação da Ré, anulando-se a sentença recorrida, com a repetição da audiência de julgamentos em relação aos factos constantes dos pontos enunciados nos pontos III e IV da presente decisão:</font></i><br>
</p><p><i><font>II - Alterando-se a decisão do facto 2 e 4 nos termos seguintes:</font></i><br>
</p><p><i><font>2) À autora era creditada uma comissão incidente sobre a totalidade das encomendas que à ré eram feitas para fornecimento dos produtos atrás citados.</font></i><br>
</p><p><i><font>4) Em Abril de 1997 a dívida à ré pelos fornecimentos por si feitos atingia o valor de 300.000.000300 (€ 1.496.408,60).</font></i><br>
</p><p><i><font>III - Aditando-se à base instrutória os seguintes quesitos:</font></i><br>
</p><p><i><font>Iº A: A comissão referida em B) era devida à A. Pela Ré, sem dependência do efetivo recebimento do preço dos produtos por ela fornecidos?</font></i><br>
</p><p><i><font>Iº B: A Autora, a sociedade ATS In Trend Ltd e o Sr. BB responsabilizaram-se pessoalmente pelo pagamento da quantia referida em D)? </font></i><br>
</p><p><i><font>Iº C: A partir da data referida em D) - Abril de 1997 -, a Ré decidiu que só continuaria a efetuar fornecimentos às fábricas se tivesse, por parte da autora ou da Atlantic Sail in Trend Limited, garantias do pagamento dos valores em dívida pelas fábricas?</font></i><br>
</p><p><i><font>IV - Mais se determinando a produção dos meios de prova que vierem a incidir sobre os quesitos anteriores, também sobre o facto seguinte (quesito 13°), com a seguinte redação:</font></i><br>
</p><p><i><font>A autora nunca exigiu que das encomendas constasse o seu carimbo e assinatura do seu sócio-gerente, como condição do pagamento das facturas em dívida pelas fábricas à ré?</font></i><br>
</p><p><i><font>V - Mais se julgando provados os seguintes factos:</font></i><br>
</p><p><i><font>A Ré deu nota à Autora dos pagamentos efectuados (resp. quesito 11°). </font></i><br>
</p><p><i><font>Todas as relações quinzenais eram conferidas pela autora (resp. quesito 12°). </font></i><br>
</p><p><i><font>Sem prejuízo dos meios de prova produzidos nos autos, cuja validade se mantém, as partes deverão ser notificadas para, querendo, apresentarem novos meios de prova com relação aos novos quesitos, podendo também nesse âmbito requerer a reapreciação dos meios de prova já produzidos nos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI - Mais se decidindo não conhecer da apelação da Autora, que fica prejudicada ante a decisão que impendeu sobre a apelação da Ré».</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>A ré requereu a reforma do acórdão relativamente ao facto provado sob o nº 22 – reforma essa que foi indeferida pela Relação, </font><b><font>por acórdão de 30.05.2018</font></b><font> e, não tendo sido admitido o recurso de revista por ela interposto, </font><u><font>foram os autos remetidos à 1ª Instância, sendo que, após oferecimento das provas pelas partes, teve lugar a audiência de julgamento.</font></u><font> </font><br>
</p><p><font>Seguidamente foi proferida </font><b><u><font>sentença</font></u></b><font>, (retificada a requerimento da A.) na qual declarando-se os factos provados e os não provados, se decidiu:</font><br>
</p><p><b><i><font>“Pelo exposto, considero prestadas as contas nos termos expostos na presente decisão e, consequentemente:</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font>I) Condeno a Ré a pagar à Autora o saldo das contas, no valor de € 1.818.201,62 (364.516.697$18);</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font>II) Condeno a Ré a reconhecer o direito da Autora de fazer seu tudo quanto se encontra depositado no Ministério das Finanças e da Administração Pública - Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, proveniente dos créditos pagos pela República Russa, no âmbito do denominado “C…….”;</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font>III) Julgo improcedente o pedido de condenação da Ré a devolver à Autora todas as garantias que tem em seu poder resultantes quer do contrato de cessão de posição contratual, quer do contrato de assunção de dívida e cessão de créditos, dele absolvendo a Ré;</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font>IV) Julgo totalmente improcedentes os pedidos de condenação quer da Autora, quer da Ré, como litigantes de má-fé”.</font></i></b><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de apelações de ambas as partes, </font><b><u><font>a Relação ….</font></u></b><font>, </font><u><font>por acórdão de 24.09.2020</font></u><font>,</font><i><font> </font></i><i><u><font>julgou improcedentes ambas as apelações e confirmou a sentença recorrida.</font></u></i><font> </font><br>
</p><p><font> Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a Ré o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
</p><p><font>1ª - Decidiu o acórdão proferido em 30.05.2018 ora recorrido pela improcedência do pedido de reforma do ponto 22. da matéria de facto (atual ponto 26), mantendo a decisão proferida em 21.02.2018, a saber, "A Ré forneceu os produtos referidos nas faturas constantes da conta corrente, que se encontram documentados pelo valor de 233.089.634$00, às empresas aí indicadas".</font><br>
</p><p><font>2ª - A decisão de improcedência foi sustentada na previsão do art. 616º, nº 2, al. c) do CPC por a mesma ter entendido que os elementos probatórios invocados pela ora recorrente não tinham força probatória plena, estando antes sujeitos à livre apreciação do julgador e, ainda que tivessem tal força probatória, o acórdão reformando já se teria debruçado sobre os elementos de prova invocados, pelo que, contrariamente à pretensão de reforma formulada, o que existiria seria um erro de julgamento.</font><br>
</p><p><font>3ª - Com todo o respeito que nos merece a decisão proferida, a ora recorrente discorda de tal entendimento.</font><br>
</p><p><font>4ª - A recorrente requereu a reforma da decisão proferida quanto ao ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto, ao abrigo da referida previsão do art. 616º, nº 2, al. b) do CPC, defendendo que o mesmo deveria ter ficado provado nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><font>"A Ré forneceu os produtos referidos em cada fatura constantes da conta-corrente de fls. 542 a 554, pelos valores aí indicados, às empresas também indicadas".</font><br>
</p><p><font>5ª - Sustentou o seu pedido de reforma na prova produzida sobre essa precisa factualidade, designadamente nas declarações de parte do legal representante da autora, no depoimento prestado em audiência pela testemunha DD, técnica oficial de contas da autora, em determinadas faturas aí identificadas, na perícia realizada e nos esclarecimentos prestados em audiência pelos Srs. Peritos.</font><br>
</p><p><font>6ª -Na verdade, no ponto 21. da matéria de facto (atual ponto 23.) ficou provado que “A ré forneceu à autora as relações quinzenais das faturas em débito, referentes à execução das encomendas efetuadas depois do acordo de 19/05/1997 (resp. quesito 10º)”;</font><br>
</p><p><font>7ª - Por seu turno, na resposta dada ao quesito 12º, alterada em sede de apelação pelo acórdão de proferido em 21.02.2018 (cfr. fls. 3937 e ss.), ficou provado que “Todas as relações quinzenais eram conferidas pela autora” (atual ponto 25. dos factos provados).</font><br>
</p><p><font>8ª - As respostas supra referidas foram sustentadas em prova documental junta aos autos (31 relações quinzenais juntas a fls. 595 a 895, conta corrente de fls. 1300 e 1301, listagem de fls. 581 a 584 e conta corrente de fls. 493 e 494 da providência cautelar), em prova pericial (relatório de fls. 2501 e 2502) e nas declarações de parte do legal representante da autora prestadas em audiência de julgamento.</font><br>
</p><p><font>9ª - Tais declarações de parte prestadas em audiência de julgamento pelo legal representante da autora sobre as relações quinzenais de faturação (registadas no dia 02.12.2016, no sistema H@bilus Média Studio, ficheiro audio ….., de 00:37:45 até 00:40:02 e de 00:45:11 a 00:57:52) constituem, à luz das regras do ónus da prova e face à matéria de facto dada como provada nos pontos 21. (atual ponto 23.) da matéria de facto e na resposta dada pelo Tribunal da Relação ao quesito 12º (atual ponto 25. dos factos provados), a necessária prova plena que sustenta a pretensão da ora recorrente quanto ao ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>10ª - A este propósito, leia-se o que expressamente se refere a fls. 3979 e 3980 do douto acórdão proferido em 21.02.2018 transcrito no corpo da presente alegação de recurso, que aqui se dá por integralmente reproduzido.</font><br>
</p><p><font>11ª - As relações quinzenais de faturação de fls. 595 a 895, devidamente apreciadas à luz das regras do ónus da prova, designadamente as previsões dos arts. 352º, 358º, nº 2 e 376º, nº 2 do Código Civil, e face à matéria de facto dada como provada nos pontos 21. (atual ponto 23.) e na resposta dada ao quesito 12º (atual ponto 25. dos factos provados), conjugados com as declarações sobre os mesmos prestadas pelo legal representante da autora, permitem, no entender da ora recorrente, obter a prova plena necessária à reforma do ponto 22. (atual ponto 26) da matéria de facto pretendida.</font><br>
</p><p><font>12ª - Tais relações quinzenais referem de forma expressa “Vimos com o presente informar V. Exas. quais as faturas em débito da (…) ª quinzena (…) a liquidar por V. Exas.:” (sublinhados nossos), anexando de seguida as referidas faturas – veja-se, a título de exemplo, a relação quinzenal de fls. 761 e as faturas anexas de fls. 762 a 765 (esta em nome da A.). Ou seja, não só informavam a A. das faturas da respetiva quinzena em débito anexas, como ainda solicitavam à A. o respetivo pagamento (“a liquidar por V. Exas.”).</font><br>
</p><p><font>13ª - O depoimento do legal representante da autora sobre tais documentos (com os quais foi confrontado), ao confirmar que conferia de forma exaustiva “(…) todas as relações quinzenais de faturação, resultantes dos mais diversos negócios que a Ré ia realizando com as diversas fábricas, enviando à Autora tais relações quinzenais, de que a A., quer através do seu legal representante Sr. BB (“conhecia as relações quinzenais e conferia-as fatura a fatura”), quer através da D. EE, seu braço direito, sempre tinha conhecimento e conferia com o detalhe que os documentos, o próprio legal representante e as testemunhas FF e GG descreveram” (cfr. fls. 3979 do acórdão de 21.02.2018) e ao reconhecer os valores constantes daquelas relações e faturas “(…) reconheço esses valores todos, constam das relações quinzenais” (cfr. fls. 3978 do acórdão de 21.02.2018), constitui prova plena no que respeita aos fornecimentos efetuados pela ora recorrente dos “produtos referidos em cada fatura constantes da conta-corrente de fls. 542 a 554, pelos valores ai indicados, às empresas também indicadas” em causa nos presentes autos.</font><br>
</p><p><font>14ª - Pelo que, com todo o respeito pela decisão recorrida, a pretendida reforma do ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto deveria ter sido deferida, já que existem nos autos documentos e outros meios de prova plena que, por si, implicavam decisão diversa da proferida, conforme previsto pelo art. 616º, nº 2, al. b) do CPC invocado pela aqui recorrente.</font><br>
</p><p><font>15ª - As declarações de parte do legal representante da autora constituem a prova plena a que alude o citado art. 616º do CPC e contrariam o julgado no ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto, como invocado pela ora recorrente.</font><br>
</p><p><font>16ª - Sendo a resposta restritiva dada pelo Tribunal a quo ao quesito 14º (atual ponto 26. dos factos provados) contraditória com o julgado nos pontos 21. da matéria de facto (atual ponto 23.) e com a resposta dada ao quesito 12º da base instrutória (atual ponto 25.), alterada em sede de apelação, de acordo com a respetiva fundamentação da decisão sobre tal matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>17ª - E, nessa medida, o ponto 22. da matéria de facto (atual ponto 26.) encontra-se ferido de nulidade, que expressamente se invoca, nos termos e para os efeitos previstos pelos arts. 615º, nº 1, al. c) e 684º do CPC.</font><br>
</p><p><font>18ª - Assim, reitera-se nesta sede a existência nos autos de documentos e outros meios de prova plena que, por si e analisados no seu conjunto, de acordo com as regras do ónus da prova (v.g. os arts. 352º, 358º, nº 2 e 376º, nº 2 do CC), implicam decisão diversa da proferida quanto a este ponto da matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>19ª - No sentido ora defendido pela recorrente quanto à atribuição de força probatória plena a documentos particulares por referência a declarações prestadas, vejam-se os acórdãos proferidos pelo STJ em 30.01.2001, no processo 00A3948, em 05.02.2002, no processo 02B3970, em 11.02.2004, no processo 03S742 e em 03.12.2003, no processo 03S2469, citados e transcritos parcialmente no corpo da presente alegação.</font><br>
</p><p><font>20ª - Por seu turno, a aqui recorrente fundamentou a pretendida reforma da resposta restritiva ao quesito 14º (facto provado sob o nº 22 e atual ponto 26.) quer no depoimento prestado pela técnica oficial de contas da autora, testemunha por esta arrolada e nos documentos juntos aos presentes autos, designadamente de fls. 167 e as faturas anexas às respetivas relações quinzenais de fls. 765, 772, 782, 790, 799, 814, 824, 836, 853, 862, 872, 887, 895 e 904, quer no relatório pericial junto aos autos, designadamente os esclarecimentos dos senhores peritos a fls. 2455, 2457 e 2460, que reforçam o depoimento prestado por aquela testemunha quanto a 27 faturas emitidas em nome da autora CCE e lançadas na contabilidade desta.</font><br>
</p><p><font>21ª - Assim, reitera-se a questão, já suscitada em sede de apelação, de saber que sentido faz a autora receber tais faturas, conferi-las (constam das relações quinzenais que lhe eram remetidas e pela mesma conferidas, como expressamente reconhece e confessa o seu legal representante), lançar tais faturas na sua contabilidade (extrato de fls. 167) e até reconhecer em Tribunal a obrigação de as pagar (apesar de “errático”, a verdade é que, nesta matéria, o legal representante da autora reconheceu que tinha de pagar as faturas emitidas em nome da CCE - “…porque a CCE as faturas dela tem de as pagar…”) e desconsiderarem-se os fornecimentos que lhes estão subjacentes e que as titulam?</font><br>
</p><p><font>22ª - Tais faturas correspondem aos fornecimentos efetuados pela Ré, ora recorrente, a que se refere o ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>23ª - O legal representante da autora conhece essas faturas que constam das relações quinzenais de faturação juntas aos autos e reconhece que as conferiu “fatura a fatura”.</font><br>
</p><p><font>24ª - Reconhece ainda todos os valores constantes das relações quinzenais, ou seja, os valores de cada uma das faturas já que “conhecia as relações quinzenais e conferia-as fatura a fatura”, “(…) reconheço esses valores todos, constam das relações quinzenais” (cfr. fls. 3978 e 3979 do acórdão de 21.02.2018, sombreados nossos).</font><br>
</p><p><font>25ª - Reiterando-se, assim, que tais documentos, conjugados com as declarações de parte prestadas pelo legal representante da autora, constituem prova plena relativamente ao fornecimento pela ora recorrente dos produtos referidos em cada uma das faturas que constam da conta corrente de fls. 542 a 554, pelo que a reforma à resposta restritiva ao ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto deveria ter sido deferida, nos termos da previsão do art. 616º, nº 2, al. b) do CPC.</font><br>
</p><p><font>26ª - O que acima se expõe determina ainda que a resposta dada ao ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto é contraditória com a factualidade dada como provada nos pontos 21. (atual ponto 23.) e na resposta dada ao quesito 12º, alterada em sede de apelação (ponto 25. dos factos provados).</font><br>
</p><p><font>27ª - No entender da ora recorrente, a fundamentação do acórdão que sustentou a alteração à resposta dada ao aludido quesito 12º (ponto 25. dos factos provados) implicaria uma decisão distinta relativamente ao ponto 22. (atual ponto 26.) da matéria de facto, na medida em que tais factos estão intrinsecamente relacionados, pois respeitam aos mesmos fornecimentos, às mesmas faturas, aos mesmos valores conhecidos e conferidos pela autora.</font><br>
</p><p><font>28ª - Pelo que, com todo o respeito pela decisão recorrida, é entendimento da ora recorrente que a mesma se encontra ferida de nulidade quanto ao ponto 22 (atual ponto 26.) dos factos provados, na medida em que existe contradição entre a fundamentação e a respetiva decisão e existem meios de prova plena nos autos que determinam o deferimento do pedido de reforma formulado, com a consequente alteração da resposta ao ponto 22. da matéria de facto.</font><br>
</p><p><font>29ª - Face ao exposto, a presente revista deverá ser admitida e julgada procedente quanto a este concreto ponto da matéria de facto, no sentido defendido pela ora recorrente quanto ao ponto 22. (atual ponto 26.) dos factos provados, a saber:</font><br>
</p><p><font>30</font><i><font>.“(26.) 22. A Ré forneceu os produtos referidos em cada fatura constantes da conta-corrente de fls. 542 a 554, pelos valores aí indicados, às empresas também indicadas”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>31ª - Por seu turno, discorda ainda a ora Recorrente do acórdão recorrido no que respeita ao abuso de direito invocado.</font><br>
</p><p><font>32ª - Na verdade, a circunstância invocada de se terem mantido como não provados “os factos de 4 (resposta negativa ao quesito 13º) e provados que se encontram os factos de 17. e 22., não vemos fundamento para considerar que a A. age em abuso do direito em qualquer das duas referidas modalidades(..)” não preclude a configuração da conduta da A. como agindo em abuso de direito nas modalidades de </font><i><font>venire contra factum proprium </font></i><font>e de </font><i><font>supressio</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>33ª - O </font><i><font>venire contra factum proprium</font></i><font> «postula duas condutas da mesma pessoa, lícitas em si, mas diferidas no tempo. Só que a primeira – o </font><i><font>factum proprium</font></i><font> – é contraditada pela segunda – o </font><i><font>venire</font></i><font>. O óbice que justificaria a intervenção do sistema residiria na relação de oposição que, entre ambas, se possa verificar» (autor e ob. citados. P. 106).</font><br>
</p><p><font>34ª - Esta modalidade de abuso de direito radica no princípio da confiança: a confiança legítima daquele que, perante a primeira conduta de outrem, confia num certo estado de coisas e determina o seu agir em conformidade com o mesmo e depois se vê defraudado com a atuação de sentido contrário. É esta confiança gerada pela conduta de outrem que justifica a proteção dada pela figura do abuso de direito, na modalidade do </font><i><font>venire</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>35ª - Ora, é inquestionável que, no caso concreto, a Autora incorre em </font><i><font>venire contra factum proprium</font></i><font> e que o </font><i><font>factum propium</font></i><font> levou a Recorrente a agir de um determinado modo, ao longo do tempo e de boa fé.</font><br>
</p><p><font>36ª - Ao longo dos anos de 1997 e 1998, após a celebração do acordo de Maio de 1997, a Recorrente foi recebendo, chegadas por fax do número da Autora, diversas notas de encomenda nas quais se encontrava aposto um carimbo da ATS e uma assinatura do legal representante da Autora e da ATS; ou, noutros casos, menos frequentes, a indicação “pagamento conforme contrato”, ou similar, com a subscrição “BB/EE” e/ou carimbo “BB”, à semelhança do acontecia desde o início das relações comerciais com a Autora.</font><br>
</p><p><font>37ª - Ora, recebidas aquelas notas de encomenda com tais menções, como poderia a Recorrente interpretá-las como sendo algo que não a anuência prevista no contrato? É certo que o carimbo não era o da Autora; mas por que razão iria a ATS, que tinha o mesmo legal representante e a mesma funcionária, remeter à Recorrente notas de encomenda com menções da sua anuência? Se não existia qualquer contrato entre a Recorrente e a ATS?</font><br>
</p><p><font>38ª - Desde sempre se verificou uma confundibilidade de papéis e sobreposição de intervenções adotada por BB e que deve ser enquadrada na estrutura e prática da própria organização criada pelo mesmo para colocação de calçado português no mercado russo: controlava toda a cadeia do negócio, desde a matéria-prima até ao destino final das botas na ......, através de um conjunto de sociedades, que só formalmente se apresentavam como personalidades distintas.</font><br>
</p><p><font>39ª - Mas essa confundibilidade sempre foi promovida e levada a cabo pelo próprio legal representante da autora.: quer perante a ora recorrente, quer perante as fábricas (cfr. docs. de fls. 1309, 1310, 1311, 1312, 1315, 1374, 1376, 1377, 1378 e 1379), quer perante entidades terceiras, como foi o caso do BPN e da constituição da sociedade Eurostep (cfr. fls. 1787). Como atestam ainda as suas próprias declarações prestadas em julgamento no dia 02.12.2016: “Tanto vale ser CCE, como ser Atlantic Sail” (00:39:25); “Eu quando sou representante de uma empresa, eu refiro-me à nossa empresa. Agora qual delas?...” (01:08:08).</font><br>
</p><p><font>40 - A forma de aprovação das encomendas das fábricas foi sempre a mesma desde o início da relação comercial. A autora e o seu legal representante mantiveram essa prática após a celebração do contrato de 19.05.1997, beneficiaram dos fornecimentos efetuados às fábricas, que conheciam por fábrica, artigo, datas e quantidades fornecidas e vêm invocá-la anos depois para eximir a A. do pagamento dos “seus” débitos e responsabilidades desde sempre assumidas. Mas nunca condicionaram a responsabilidade de pagamento da A. pelos fornecimentos a um específico carimbo e a assinatura do gerente da A.</font><br>
</p><p><font>41ª - Depois, tal como acordado, dada a anuência da Autora e realizados os fornecimentos, a Recorrente remetia à Autora as relações quinzenais, com faturas e recibos anexos, | [0 0 0 ... 0 0 0] |
sTJsu4YBgYBz1XKvDwXK | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b></div><br>
<br>
<font> </font>
<p><b><font>Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A</font></b><font>., mediante embargos de executada, deduziu oposição à execução que lhe foi movida pela exequente </font><b><font>AA</font></b><font>, invocando a prescrição da quantia exequenda e a extinção da execução.</font>
</p><p><font>Alegou para tanto e em resumo que nos termos da decisão judicial dada à execução como título executivo foi condenada a pagar à exequente/embargada o montante indemnizatório de € 750.000,00, acrescido de juros à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, descontando-se nesse montante as quantias pagas provisoriamente no âmbito da providência cautelar de arbitramento de reparação provisória, sendo que pagou a quantia de € 140.000,00, nesse âmbito, e ainda a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos na viatura sinistrada.</font>
</p><p><font>Mais alegou que, em cumprimento daquela decisão, pagou à embargada o montante global de € 750.180,82 – valor esse que corresponde ao capital de € 600.000,00 (€ 750.000,00 uma vez deduzido o que havia pago no montante de € 150.000,00) e os juros contados sobre aquele valor de € 600.000,00 calculados desde a citação em (10/09/2007) até à data do pagamento (10/12/2013), no montante de € 150.180,82.</font>
</p><p><font>Mais alega que sobre a importância de € 150.000,00 não são devidos juros, já que os respetivos valores parcelares foram pagos atempadamente e que ao aceitar receber a indemnização, no montante global de € 750.180,82, a embargada deu-se como integralmente ressarcida por todos os danos sofridos em virtude do sinistro em apreço.</font>
</p><p><font>E invocou a prescrição dos reclamados que se reportam-se à data de 30.12.2013, ou seja, anteriores aos últimos 5 anos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Recebidos liminarmente os embargos de executado, a embargada apresentou contestação, na pugnou pela improcedência da exceção da prescrição e da oposição à execução, e dizendo no entanto que deve ser deduzida à quantia exequenda o valor de €10.000,00, relativo à indemnização pelo veículo sinistrado que já foi pago e que por lapso não foi por si tido em consideração.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador </font><b><font>sentença</font></b><font> onde, após se tomar posição sobre a validade e regularidade dos pressupostos processuais, </font><i><font>se decidiu julgar procedentes os embargos de executado e, consequentemente, se determinou a extinção da instância executiva</font></i><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito de recurso de apelação da exequente/embargada, </font><b><font>a Relação ….</font></b><font>, </font><i><font>revogou a sentença recorrida e, julgando os embargos parcialmente procedentes, declarou prescritos (apenas) os juros moratórios vencidos até 01.10.2014.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> Inconformada, </font><b><u><font>interpôs a executada embargante o presente recurso de revista</font></u></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u><br>
</p><p><font>1ª - As presentes Alegações de Recurso visam impugnar a decisão proferida pelo Tribunal “a quo” no que à responsabilidade da recorrente diz respeito, atenta a matéria de facto dada como provada nos presentes autos.</font><br>
</p><p><font>2ª - Ora, do ponto 5 dos factos dados como provados e assentes, constante da douta sentença, considera o Meritíssimo Juiz a quo, que” A Lusitânia, no cumprimento da decisão judicial, proferida no processo 981/07….., pagou à embargada o montante global de € 750.180,82, que corresponde ao valor da condenação (€ 750.000,00), deduzida do montante de € 150.000,00 (que se refere ao montante de € 140.000,00 pago a titulo de rendas, no âmbito da providência cautelar, acrescido da indemnização de € 10.000,00, pela viatura danificada), o que perfaz € 600.000,00, sobre o qual foram calculados os respetivos juros, desde a citação (10/09/2007), até à data do pagamento (10/12/2013), os quais ascenderam a € 150.180,82…”</font><br>
</p><p><font>3ª Ou seja, entendeu-se em sede de 1ª instância, que a Executada procedeu ao pagamento integral do capital indemnizatório a que foi condenada, </font><i><font>in casu,</font></i><font> € 750,000,00, sendo que, destes, € 140.000,00 pagos a título de rendas no âmbito da providência cautelar, € 10.000,00 a título de indemnização pela viatura danificada e a quantia remanescente de € 600.000,00 em 10.12.2013, bem como regularizou na integra os juros de mora em dívida.</font><br>
</p><p><font>4ª - Considerou-se assim em 1ª Instância, que a Embargante regularizou integralmente o capital indemnizatório a que tinha sido condenada a pagar à Exequente.</font><br>
</p><p><font>5ª - Ora, esta matéria, dado como provada e assente, não mereceu recurso de apelação, qualquer pedido de alteração quanto à matéria de facto por parte da Exequente, pelo que, por esse motivo, e nesta parte da sentença, a mesma transitou em julgado.</font><br>
</p><p><font>6ª - Considerando provado e assente que o pagamento do capital se considera totalmente pago à Exequente, em 10.12. 2013, o valor reclamado pela Exequente, apenas é imputado a título de juros de mora vencidos em data anterior ao pagamento efetuado, ou seja, a 10.12.2013, como aliás, a própria reconhece nos seus pedidos.</font><br>
</p><p><font>7ª - De acordo com o alegado pela própria Exequente, esta quantia apenas diz respeito à diferença entre a quantia de juros de mora pagos em 10.12.2013 pela Executada e devidos desde a citação até essa mesma data do pagamento, e o valor alegadamente em divida no entender da Exequente a título de juros de mora, desde a data de citação, até à data em que foi efetuado o pagamento.</font><br>
</p><p><font>8ª - Assim, o valor de € 32.101,92 foi calculado diariamente, a título de juros de mora, entre a data da citação e 10.12. 2013, data em que a Executada efetuou o pagamento.</font><br>
</p><p><font>9ª - Nos presentes autos temos que a ação executiva foi intentada em 01.10.2019.</font><br>
</p><p><font>10ª - Ora, tendo a 1ª Instancia dado como provado que o capital foi integralmente pago em 10.12.2013, o valor alegadamente em dívida nos autos, será imputado apenas a título de juros de mora.</font><br>
</p><p><font>11ª - Os juros reclamados pela embargada reportam-se a data anterior a 10/12/2013, tendo sido calculados desde a data da citação para a ação declarativa e o pagamento (10.12.2013), ou seja, há mais de 5 anos, razão pela qual a eventual obrigação pelo seu pagamento está prescrita.</font><br>
</p><p><font>12ª - Nos termos da alínea d), do artigo 310º, do Código Civil. os juros legais prescrevem no prazo de cinco anos.</font><br>
</p><p><font>13ª - A prescrição é uma exceção perentória, constante do n.º 3 do artigo 576º do Código de Processo Civil, foi devidamente alegada em sede de embargos de executado.</font><br>
</p><p><font>14ª - Pelo que, nos termos dos artigos 576º, n.º 1 e 3, e 579.º, do Código de Processo Civil, deveria a exceção de prescrição ter sido considerada procedente por provada, com as legais consequências.</font><br>
</p><p><font>15ª - O douto Acórdão “a quo” efetuou uma errónea interpretação factual e de direito, pelos motivos que aqui a seguir se invocam:</font><br>
</p><p><font>- Desde logo porque o Douto acórdão não observou a matéria de facto dada como provada em 1ª instancia, e que aqui se reitera que a mesma não foi alvo de recurso, </font><i><font>in casu</font></i><font>, que a Executada que procedeu ao pagamento integral do capital em divida em 10.12.2013.</font><br>
</p><p><font>- Bem como não atendeu que o valor reclamado nos presentes autos pela Exequente e alegadamente em divida, se consideram inclusive pela própria embargada, devidos a título de juros de mora.</font><br>
</p><p><font>- Aliás, basta atentar às alegações e conclusões apresentadas pela Exequente que se centram essencialmente na qualificação e enquadramento jurídico de juros de mora, bem como na forma de cálculo para apurar esse valor, nomeadamente entre a diferença entre o valor de juros de mora pagos pela executada em 10.12.2013 e o valor que a Exequente entende que seriam devidos nessa data, ouse seja, em 10.12.2013.</font><br>
</p><p><font>16ª - Pelo que não poderia o Tribunal Recorrido “a quo” pronunciar-se da forma como o fez, entendendo que estaríamos perante capital em divida posterior a 10.12.2013, uma vez que esse, foi integralmente pago nessa data.</font><br>
</p><p><font>17ª - E como tal, a partir desse momento não seriam devidos mais juros, quanto muito seriam devidos juros até essa data.</font><br>
</p><p><font>18ª - Ora, admitindo-se por mera hipótese de raciocínio a quantia de € 32.101,92 a título de juros em 10.12.2013, e uma vez que sobre os juros não impedem novos juros, sendo aliás ilegal, teria ocorrido em 10.12.2018 a prescrição definitiva dos juros de mora. Sendo certo que os presentes autos apenas deram entrada em 01.10.2019.</font><br>
</p><p><font>19ª - O Tribunal Recorrido “a quo” julgou de forma errada a invocada prescrição, violando a alínea d) do artigo 310.º do Código Civil.</font><br>
</p><p><font>20ª - Pelo exposto, entendemos que o douto Acórdão fez uma incorreta apreciação da matéria de fato dada como provada e não provada, procedeu a uma deficiente interpretação e aplicação do direito, razão pela qual se entende que o mesmo deverá ser revogado, e em consequência a sua substituição, por uma decisão em conformidade com o supra alegado.</font><br>
</p><p><font>21.ª - Ao decidir como decidiu, o douto Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 301.º, 303.º, º 310.º alínea d).º do Código Civil e artigos 576º, n.º 1 e 3, e 579.º, do Código de Processo Civil.</font><br>
</p><p><font>Termos em que e nos demais de direito deverá conceder-se provimento ao presente recurso interposto e em consequência revogando-se o douto Acórdão recorrido, mantendo-se o decidido na douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, bem como considerar a prescrição invocada. </font><br>
</p><p><font>A embargada recorrida apresentou contra-alegações, nas quais pugnou pela improcedência da revista.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font> </font><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir: </font></b><br>
</p><p><b><font> </font></b><font>Em face do conteúdo das conclusões recursórias, enquanto delimitadora do objeto do recurso, a questão de que cumpre conhecer consiste em saber se, estando em causa apenas o pagamento de juros de mora, se verifica a invocada prescrição relativamente à totalidade dos mesmos.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi a seguinte a </font><b><u><font>factualidade dada como provada e como não provada</font></u></b><font> pelas instâncias:</font>
</p><p><u><font>Factos provados:</font></u>
</p><p><font>1) Por douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no passado dia 13 de outubro de 2013, a companhia de seguros executada/embargante foi condenada a pagar à exequente/embargada “</font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>montante</font></i><font> </font><i><font>indemnizatório</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>750.000,00</font></i><font> </font><i><font>euros</font></i><font> </font><i><font>acrescido</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>juros</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>taxa</font></i><font> </font><i><font>legal</font></i><font> </font><i><font>desde</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>data</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>citação</font></i><font> </font><i><font>até</font></i><font> </font><i><font>integral</font></i><font> </font><i><font>pagamento,</font></i><font> </font><i><font>montante</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>serão</font></i><font> </font><i><font>descontadas</font></i><font> </font><i><font>as</font></i><font> </font><i><font>quantias</font></i><font> </font><i><font>já</font></i><font> </font><i><font>arbitradas</font></i><font> </font><i><font>provisoriamente</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>âmbito</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>providência</font></i><font> </font><i><font>cautelar</font></i><font> </font><i><font>apensa</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>2) A Lusitânia, a título de indemnizações pagas no âmbito da providência cautelar, pagou à exequente, entre os dias 07-04-2008 e 04-10-2013 o montante total de € 140.000,00, conforme documento n.º 1 junto com a petição de embargos, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.</font>
</p><p><font>3) A Lusitânia pagou ainda no dia 17 de março de 2012 o valor de € 10.000,00, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos na viatura sinistrada, conforme documento n.º 2 junto com a petição de embargos, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.</font>
</p><p><font>4) Com efeito, no processo judicial 386/11…, que correu termos no extinto …º Juízo do Tribunal Judicial ….., instaurado pela proprietária do veículo sinistrado (S......, Lda.) contra a Real Seguros, S.A. (entretanto incorporada na Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A.), foi celebrada transação, homologada por sentença transitada em julgado, nos termos da qual foi acordado o valor de € 10.000,00, relativo aos prejuízos sofridos no veiculo sinistrado, valor esse que teria de ser deduzido na indemnização que viesse a ser fixada no âmbito do processo judicial 981/07…, instaurado pela embargada contra a Lusitânia, caso se esgotasse o limite do capital seguro, como foi o caso, conforme documento n.º 3 junto com a petição de embargos, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.</font>
</p><p><font>5) A Lusitânia, no cumprimento da decisão judicial, proferida no processo 981/07…., pagou à embargada o montante global de € 750.180,82, que corresponde ao valor da condenação (€ 750.000,00), deduzida do montante de € 150.000,00 (que se refere ao montante de € 140.000,00 pago a titulo de rendas, no âmbito da providência cautelar, acrescido da indemnização de € 10.000,00, pela viatura danificada), o que perfaz € 600.000,00, sobre o qual foram calculados os respetivos juros, desde a citação (10/09/2007), até à data do pagamento (10/12/2013), os quais ascenderam a € 150.180,82, conforme documentos n.ºs 4 e 5 juntos com a petição de embargos, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.</font>
</p><p><u><font>Facto não provado:</font></u>
</p><p><font>- A companhia de seguros executada foi condenada a pagar à exequente uma indemnização no montante de 782.282.74 €, acrescido de juros de mora.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><u><font>Apreciando:</font></u></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Conforme se alcança dos autos, designadamente da factualidade dada como provada, a execução foi movida pela embargada à embargante (seguradora), ora recorrente, tendo como título executivo o acórdão do STJ, de 13.10.2013 (proferido na ação, relativa a acidente de viação, com o nº 981/07…), nos termos do qual esta foi condenada a pagar àquela “</font><b><i><font>o</font></i></b><b><font> </font></b><b><i><font>montante</font></i></b><font> </font><i><font>indemnizatório</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><u><font>750.000,00</font></u></i><u><font> </font></u><i><u><font>euros</font></u></i><font> </font><i><font>acrescido</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>juros</font></i><i><font> à</font></i><font> </font><i><font>taxa</font></i><font> </font><i><font>legal</font></i><font> </font><i><font>desde</font></i><i><font> a</font></i><font> </font><i><font>data</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>citação</font></i><i><font> até</font></i><font> </font><i><font>integral</font></i><font> </font><i><font>pagamento,</font></i><b><i><font> montante</font></i></b><b><font> </font></b><b><i><font>a</font></i></b><b><font> </font></b><b><i><font>que</font></i></b><b><font> </font></b><b><i><font>serão</font></i></b><b><i><font> descontadas</font></i></b><i><font> as</font></i><font> </font><i><font>quantias</font></i><font> </font><i><font>já</font></i><font> </font><i><font>arbitradas</font></i><font> </font><i><font>provisoriamente</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>âmbito</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>providência </font></i><i><font>cautelar</font></i><font> </font><i><font>apensa</font></i><font>” – sendo que a citação teve lugar em 10.09.2007.</font>
</p><p><font>Uma vez que a embargante no âmbito da providência cautelar apensa, de reparação provisória, pagou à exequente, entre os dias 07.04.2008 e 04.10.2013 o montante total de </font><u><font>€ 140.000,00</font></u><font> e em 17.03.2012 também pagou a quantia de € 10.000,00 (nos termos da transação, homologada, no âmbito do processo nº 386/11…. i</font><u><font>ntentado pela proprietária do veículo sinistrado</font></u><font> “</font><i><font>valor esse que teria de ser deduzido na indemnização que viesse a ser fixada no âmbito do processo judicial 981/07….., instaurado pela embargada contra a Lusitânia, caso se esgotasse o limite do capital seguro, como foi o caso”</font></i><font>), sendo aquele valor de €750,00,00 correspondente ao limite do capital do seguro obrigatório então aplicável ao acidente de viação em causa, havia que descontar a este valor o valor daquelas quantias.</font>
</p><p><font>Na sequência disso, a recorrente, após descontar àquele montante de € 750.000,00, as ditas quantias de € 140.000,00 e de € 10.000,00, pagou à recorrida, em 10.12.2013, a quantia remanescente de € 600.000,00 acrescida dos respetivos juros legais contados desde a citação (em 10.09.2007), no valor de € 150.180,82, ou seja, pagou a quantia global de € 750.180,82.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A exequente embargada, tendo aceite o pagamento assim efetuado em 10.12.2013, veio todavia em 01.10.2019, ou seja, decorridos que foram mais de cinco anos, intentar a execução, argumentando que os juros de mora deviam ter sido calculados sobre o montante global da indemnização, de € 750.000,00 e desde a data da citação, razão pela qual entende que a executada embargante, ora recorrente, pagou menos do que aquilo que devia ter pago.</font>
</p><p><font>Assim, com a execução, a exequente embargada ora recorrida visou obter o pagamento da quantia de </font><b><font>€ 39.465,13</font></b><font> - </font><u><font>correspondente à diferença</font></u><font> entre o valor global de € 782.282,74, de capital e juros que entendia ser devido, </font><u><font>em 30.12.2013</font></u><font> (€ 750.000,00 de capital mais € 172.282,74 de juros de mora legais desde a citação) e o valor da quantia paga (€ 750.180,82) -, e da quantia da </font><b><font>€ 7.363, 21</font></b><font>, </font><u><font>calculada entre 310.12.2013 e 23.09.2019</font></u><font>. </font><br>
</p><p><font> Conforme se alcança da respetiva sentença, </font><b><font>a 1ª instância</font></b><font> considerou que o pagamento efetuado pela executada embargante foi feito em conformidade com a decisão proferida no acórdão STJ dado à execução – e daí ter decidido no sentido da total procedência dos embargos, o que fundamentou nos seguintes termos:</font>
</p><p><i><font>“Ora, dos dizeres do douto acórdão condenatório resulta o seguinte: “condena-se a ré seguradora a pagar à autora um </font></i><i><u><font>montante</font></u></i><i><font> </font></i><i><u><font>indemnizatório</font></u></i><i><font> de 750.000,00 euros acrescido de juros à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, </font></i><i><u><font>montante</font></u></i><i><font> a que serão descontadas as quantias já arbitradas provisoriamente no âmbito da providência cautelar apensa”.</font></i>
</p><p>
</p><p><i><font>Da literalidade do exposto, temos como indiscutível que aquando do pagamento do montante indemnizatório, a ora embargante tinha o direito de deduzir </font></i><i><u><font>ao montante indemnizatório</font></u></i><i><font> “as quantias já arbitradas provisoriamente no âmbito da providência cautelar apensa” - a saber: 140.000,00 euros.</font></i>
</p><p><i><font>Para além disso, também se nos afigura como pacífico, porque assim acordado entre as partes no âmbito do processo judicial n.º 386/11…, </font></i><i><u><font>ao montante indemnizatório</font></u></i><i><font> fixado pelo S.T.J., também seria abatida a parcela respeitante aos danos sofridos pela viatura – a saber: 10.000,00 euros.</font></i>
</p><p><i><font>Isto significa, no nosso humilde entender, que os juros a que a embargante foi condenada, por força do douto Ac. STJ e na sequência do acordado entre as partes, apenas podiam incidir sobre “</font></i><i><u><font>o montante indemnizatório</font></u></i><i><font>” do valor total ainda em dívida de 600.000, 00 euros, como aconteceu, e não sobre o valor total de 750.000,00 euros, como reclama a exequente.</font></i><font> </font><br>
</p><p><font> Na sequência de apelação da exequente embargada, </font><b><font>a Relação</font></b><font> veio a tomar posição no sentido de que:</font><br>
</p><p><font>- </font><u><font>à quantia de € 750,000,00 que foi fixada no acórdão deviam ser efetivamente deduzidos os montantes pagos pela executada embargante</font></u><font>; </font><br>
</p><p><font>- todavia, </font><u><font>inexiste fundamento para dispensar o pagamento dos juros de mora relativos aos pagamentos parcelares feitos no âmbito da providência cautelar e ao pagamento do valor da viatura sinistrada</font></u><font>, na medida em que tais pagamentos tiveram o seu início em data posterior à citação da ré na ação declarativa.</font><br>
</p><p><font>Isto, nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“Por conseguinte, não oferecendo dúvidas que à quantia fixada no acórdão do STJ se devem deduzir os montantes pagos pela recorrida no âmbito da providência cautelar de arbitramento de reparação provisória, não menos verdade é que, tendo efetivado pagamentos parcelares e mensais, os juros de mora deverão incidir apenas sobre o capital remanescente, já que quanto aos valores que foram pagos – e que eram devidos desde a citação – deixou de haver mora.</font></i>
</p><p><i><font>Com efeito, considerando os pagamentos das rendas mensais feitos em cumprimento da providência cautelar, os quais foram realizados de forma faseada e são imputados ou subtraídos no quantitativo indemnizatório apurado na ação principal, a liquidação dos juros de mora deverá ser feita em relação a cada pagamento parcial, levando em conta os sucessivos pagamentos parcelares, por forma a não prejudicar o executado como sucederia caso essa liquidação, mormente no que concerne aos juros, apenas fosse relegada para o pagamento que perfizesse a integralidade da quantia indemnizatória, mas de igual modo por forma a não prejudicar o exequente, como sucederia caso – como decidido na decisão recorrida –, no apuramento dos juros, apenas se tomasse em consideração o remanescente do montante indemnizatório já após a integral imputação das rendas mensais pagas, sem atender ao momento em que estas foram parcelarmente pagas. O que significa que, para cada período, os juros de mora deverão ser calculados sobre o capital sucessivamente diminuído.</font></i>
</p><p><i><font>Ora, os pagamentos parcelares feitos no âmbito da providência cautelar (bem como o ressarcimento do valor da viatura sinistrada) tiveram o seu início em data posterior à citação da ré na ação declarativa, pelo que inexiste qualquer fundamento para dispensar”. </font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><font>E, para além disso, </font><u><font>conhecendo da exceção da prescrição dos juros</font></u><font>, invocada pela embargante (da qual a 1ª instância não conheceu face à solução que deu ao litígio, nos termos supra referidos), </font><b><font>a Relação</font></b><font> </font><u><font>considerou e declarou prescritos os juros moratórios vencidos até 01.10.2014</font></u><font> ou seja, até cinco anos antes da insaturação da execução, nos termos do disposto no artigo 310º, al. d) do C. Civil.</font><br>
</p><p><font> Todavia, </font><b><font>por considerar que os demais juros peticionados na execução não estavam prescritos,</font></b><font> </font><u><font>não julgou extinta </font></u><i><u><font>in totum </font></u></i><u><font>a execução</font></u><font>. </font><br>
</p><p><b><font>É contra tal entendimento que se manifesta a executada embargante</font></b><font>, ora recorrente, segundo a qual, não podendo incidir sobre os juros de mora novos juros, a declaração de prescrição devia e deve abranger a totalidade dos juros de mora devidos, com a consequente extinção da execução.</font><br>
</p><p><font>E desde já se diga que </font><b><font>com inteira razão. </font></b><br>
</p><p><font>Conforme bem entendeu a Relação (entendimento esse que nem sequer está em causa), face aos termos da decisão constante do acórdão do STJ dado à execução, ao valor global da indemnização, de € 750.000,00 (limite máximo da cobertura legal do seguro), </font><u><font>havia que deduzir as quantias entretanto pagas, relativas aos adiantamentos feitos em sede de procedimento cautelar de reparação provisória (€ 140.000,00) e ao pagamento relativo à viatura (€ 10.000,00)</font></u><font> – sendo certo que a própria recorrida até veio a admitir na contestação aos embargos que este último valor até foi por si indevidamente tido em conta.</font><br>
</p><p><font>Todavia, e sendo certo que a recorrente apenas liquidou e pagou os juros de mora relativos à quantia remanescente, </font><u><font>sobre a mesma também recaía a obrigação de proceder ao pagamento dos juros demora incidentes sobre as referidas quantias que já haviam sido pagas em sede de reparação provisória, no total de € 140.000,00</font></u><font> – </font><b><font>que se venceram desde a citação </font></b><font>(nos termos definidos no acórdão do STJ dado à execução)</font><b><font> até ao respetivo pagamento, sendo que o último pagamento teve lugar em 04.10.2013.</font></b><font> </font><br>
</p><p><b><u><font>Mas nada mais do que tais juros</font></u></b><font> – que, porque devidos/vencidos há mais de cinco anos, tendo-se em conta as datas dos pagamentos (entre 07.04.2008 e 04.10.2013) e atenta a data da instauração da execução (01.10.2019), </font><b><font>se mostram inteiramente prescritos, nos termos do disposto na al. d) do artigo 310º do C. Civil.</font></b><font> </font><br>
</p><p><u><font>E, nada mais,</font></u><b><font> por um lado</font></b><font>, </font><u><font>porque sobre o valor de tais juros</font></u><font> (contrariamente à pretensão da recorrida – e o que parece não ter sido tido em consideração pela Relação) </font><u><font>não podem incidir novos juros de mora, em face do disposto no artigo 560º do C. Civil.</font></u><br>
</p><p><font>E, </font><b><font>por outro lado</font></b><font>, porque </font><u><font>a recorrida não pode reclamar o pagamento de juros de mora incidentes sobre a quantia de € 10.000,00, referente à indemnização do veículo interveniente no acidente.</font></u><br>
</p><p><font>Isto, </font><u><font>por manifesta</font></u><font> </font><u><font>falta de legitimidade substantiva</font></u><font>, na medida em que tal quantia era devida e foi paga pela recorrente, não à recorrida, mas sim à sociedade proprietária do veículo </font><u><font>e porque tal pagamento resultou de transação</font></u><font> (homologada) e daí que a obrigação do eventual e respetivo pagamento de juros de mora tivesse que resultar, o que não resulta, da dita transação.</font><br>
</p><p><font>Ademais, ainda que assim não fosse, uma vez que o pagamento de tal quantia teve lugar em 17.03.2012 (mais de cinco anos antes da instauração da execução) os respetivos juros de mora sempre estariam também prescritos. </font><br>
</p><p><font>Em face do exposto, haveremos de concluir no sentido de os juros mora devidos estarem prescritos na totalidade, impondo-se por isso conceder a revista e julgar extinta, na totalidade, a execução. </font><br>
</p><p><br>
</p><p><b><font>Termos em que, concedendo-se a revista, se acorda em revogar parcialmente o acórdão recorrido (na parte em que não julgou extinta a execução) e, julgando inteiramente procedentes os embargos, em julgar extinta a execução na totalidade. </font></b><br>
</p><p><font>Custas pela recorrida.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lx. 23.02.2021</font><br>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font><br>
</p><p><font>Acácio das Neves (Relator)</font><br>
</p><p><font>Fernando Samões (1º Adjunto)</font><br>
</p></font><p><font><font>Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta)</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
8zJzu4YBgYBz1XKvvwqu | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<br>
<b><font>Revista nº 193/16.5T8FND.C1.S1</font></b><br>
<br>
<br>
<b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b><br>
<br>
<font>Após os réus AA, BB e CC terem interposto recurso de revista do acórdão da Relação de Coimbra que lhes negou a apelação (confirmando a sentença da 1ª instância que havia julgado procedente a ação interposta contra eles e outros pelos autores DD e EE) – recurso esse que não foi admitido, vindo no entanto os mesmos a aderir ao recurso de revista da co-ré FF, recurso este que foi admitido, e após a subida dos autos a este Tribunal;</font><br>
<font> </font><u><font>Vieram os réus</font></u><font> </font><b><font>GG </font></b><font>e </font><b><font>HH</font></b><font> </font><u><font>arguir a falta da sua citação</font></u><font>, pedindo a “anulação de todo o processado por falta de legitimidade dos R.R.”</font><br>
<font>Juntaram procuração a favor do mandatário dos réus, </font><u><font>procuração essa outorgada, em sua representação, pelos pais, os réus AA e CC.</font></u><br>
<br>
<font>Os autores pronunciaram-se no sentido do indeferimento de tal pretensão.</font><br>
<br>
<b><font>Por despacho do Relator de 17.12.2019, foi indeferido tal requerimento</font></b><font>, </font><u><font>nos seguintes termos</font></u><font>:</font><br>
<i><u><font>“Conforme se alcança da petição inicial os réus requerentes, GG e HH, foram claramente indicados como réus na ação</font></u></i><i><font>, mas </font></i><b><i><font>na qualidade de menores e como tal representados pelos seus pais, os também réus AA e CC.</font></i></b><br>
<i><font>Ora sucede que no requerimento em análise não foi sequer colocada em causa a indicação de os réus requerentes serem menores e filhos destes réus, sendo estes o seus representantes legais. De resto, foi precisamente nesses termos que a procuração ora junta foi outorgada.</font></i><br>
<i><font>E assim sendo, os réus menores ora requerentes </font></i><i><u><font>tinham que ser citados, não pessoalmente (conforme ora invocam) ma sim na pessoa dos seus pais, também réus, na qualidade de seus representantes legais – citação esta que nem sequer é posta em causa.</font></u></i><br>
<i><font>De resto, independentemente dos exatos termos da citação, os réus pais dos ora requerentes, através do duplicado da petição inicial, que lhes foi entregue no ato da citação, ficaram a saber que a ação também foi interposta contra os seus filhos menores, ora requerentes, sendo estes eram por eles representados.</font></i><br>
<i><font>Carece assim de total fundamento a pretensão dos requerentes.</font></i><br>
<i><font>As custas do incidente, de todo anómalo, devem todavia ser suportadas pelos réus pais dos requerentes uma vez que foram eles a outorgar a procuração ora junta.</font></i><br>
<b><i><font>Termos em que se decide indeferir o requerido.</font></i></b><br>
<i><font>Custas do incidente a cargo dos pais dos requerentes, os réus AA e CC, com taxa de justiça que se fixa em três UCs.</font></i><br>
<i><font> Notifique.”</font></i><br>
<font> </font><br>
<font> Inconformados com tal despacho, </font><u><font>vieram os ditos réus requerentes,</font></u><font> GG e HH </font><b><u><font>reclamar para a conferência</font></u></b><font>, requerendo que “seja proferido acórdão que declare que os requerentes não são réus no presente processo, por nunca como tal terem sido configurados pelos autores”.</font><br>
<font> Alegam para o efeito que das disposições conjugadas da Portaria nº 280/2013, de 26 de agosto (em vigor à data da propositura da ação) e do artigo 144º, nº 1 do CPC, resulta qua a apresentação de peças processuais por transmissão eletrónica de dados pelos mandatários é efetuada através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, que a apresentação de peças processuais é efetuada através de formulários disponibilizados, que a informação inserida nos formulários é refletida num documento que juntamente com os restantes ficheiros, faz parte, para todos os feitos, da peça processual, que o documento contendo a informação inserida nos formulários é assinado digitalmente pelo mandatário subscritor, que quando existam campos no formulário para a inserção de informação especifica, essa informação deve ser indicada no campo respetivo, não podendo ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos, e que, em caso de desconformidade entre o conteúdo dos formulários e o conteúdo dos ficheiros anexos, prevalece a informação constante dos formulários, ainda que estes não se encontrem preenchidos. </font><br>
<font> Mais alegam que, no formulário que capeia a p.i., os autores indicam apenas 4 réus (FF, BB, AA e CC), que não os ora reclamantes, sendo que, aquando da citação dos progenitores dos requerentes nada é igualmente referido quanto às suas pessoas, nem às suas qualidades – de onde resulta que os requerentes não são, nem nunca foram réus neste processo.</font><br>
<br>
<font> </font><u><font>Em resposta</font></u><font>, os autores limitaram-se a considerar descabida a reclamação e a pugnar pela condenação em multa exemplar como impõe o artigo 27º do RCP,</font><br>
<br>
<font> A ré FF veio tomar posição no sentido de, verificando-se a nulidade invocada pelos menores, dever ser deferida a reclamação por estes apresentada.</font><br>
<br>
<b><u><font>Cumpre decidir</font></u></b><font>:</font><br>
<br>
<font> Analisados os autos verifica-se que, conforme se salienta no despacho reclamado</font><u><font>, na petição inicial, para além dos demais réus</font></u><font> (FF e marido, BB, e AA e mulher, CC) </font><u><font>os autores também indicaram como réus os ora reclamantes</font></u><font> </font><u><font>GG e HH.</font></u><br>
<font>E isto, na qualidade de menores e, como tal, representados pelos seus pais, os também réus AA e CC</font><b><i><font>.</font></i></b><br>
<br>
<font>É certo que no formulário eletrónico inicial, </font><u><font>os ora reclamantes,</font></u><font> </font><u><font>GG e HH, não foram indicados como réus</font></u><font>.</font><br>
<font>Todavia, tal omissão, face à identificação dos ora reclamantes como réus na petição inicial, não pode deixar de ser tida, em si mesma, como mera irregularidade sem influência no exame ou decisão da causa – razão pela qual </font><b><font>não pode ser considerada como nulidade processual, atento o disposto no nº 1 do artigo 195º do CPC.</font></b><br>
<b><font> </font></b><font>De resto, ainda que assim não fosse, há muito que decorreu o respetivo prazo de invocação, nos termos do artigo 199º do mesmo diploma. </font><br>
<br>
<font>E é certo igualmente que, conforme se alcança das respetivas certidões de citação, </font><u><font>os seus pais – co-réus e seus legais representantes</font></u><font>, AA e CC - </font><u><font>não foram expressamente citados na qualidade de legais representantes dos réus, seus filhos menores</font></u><font>, ora reclamantes GG e HH.</font><br>
<br>
<font>Todavia, o certo é que os referidos reclamantes - que nem sequer colocam em causa o que foi indicado na petição inicial, no sentido de serem menores e filhos dos réus AA e CC (sendo certo que a procuração que juntaram, por sinal ao mesmo mandatário judicial, até foi outorgada pelos seus referidos pais, precisamente nessa qualidade), tinham que ser citados na pessoa destes.</font><br>
<font>Para além disso, conforme bem se salienta no despacho reclamado, </font><i><font>“independentemente dos exatos termos da citação, os réus pais dos ora requerentes, através do duplicado da petição inicial, que lhes foi entregue no ato da citação, ficaram a saber que a ação também foi interposta contra os seus filhos menores, ora requerentes, sendo estes por eles representados”.</font></i><br>
<br>
<font> Assim, e sendo inquestionável que os réus requerentes/ ora reclamantes foram claramente identificados na p.i. como réus e a citar na pessoa dos seus pais, também eles réus, aos quais foram entregues cópias daquela peça processual – </font><u><font>estes, ademais representados nos autos por mandatário judicial, não podiam deixar de tomar conhecimento daquela configuração da ação, ou seja, de que os seus filhos menores ora reclamantes também eram réus e que os mesmos eram citados nas suas pessoas, enquanto seus legais representantes</font></u><font>.</font><br>
<br>
<font>Não estamos assim, perante uma situação de falta de citação </font><i><font>tout court,</font></i><font> mas sim perante uma mera irregularidade de citação – irregularidade essa que, claramente - atento o contexto supra enunciada – não pode ser considerada como suscetível de prejudicar a defesa dos réus menores, ora reclamantes.</font><br>
<font>Verifica-se assim a situação a que alude o nº 4 do artigo 191º do CPC, nos termos do qual a arguição da nulidade da citação </font><i><font>“só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado”.</font></i><br>
<br>
<font>Aliás, não poderemos deixar de salientar que, tendo os réus menores ora reclamantes sido identificados nos autos como réus (designadamente nas decisões recorridas) só agora, e perante a procedência da ação e respetiva confirmação pela Relação, a questão da falta de citação tenha vindo a ser suscitada.</font><br>
<br>
<font>Improcede assim, a reclamação.</font><br>
<br>
<u><font>Em síntese:</font></u><br>
<font>I. A falta de indicação dos nomes de alguns dos réus no formulário eletrónico inicial que acompanha e antecede a petição inicial constitui mera irregularidade, sem influência no exame ou decisão da causa, razão pela qual não pode ser considerada como nulidade processual, atento o disposto no nº 1 do artigo 195º do CPC, no caso de na petição inicial serem devidamente identificados todos os réus (irregularidade essa que, não obstante, nem sequer foi invocada atempadamente). </font><br>
<font>II. Tendo os réus reclamantes (que só vieram invocar a nulidade resultante da falta da sua citação após os autos terem subido ao STJ para apreciação de recurso de revista) sido identificados na p.i. (e nas decisões recorridas) como réus menores e a citar na pessoa dos seus pais, também eles réus, a circunstância de estes não terem sido advertidos dessa representação no ato da sua citação, não implica a verificação da nulidade invocada (falta de citação).</font><br>
<font>III. Estamos perante a situação a que alude o nº 4 do artigo 191º do CPC, nos termos do qual a arguição da nulidade da citação </font><i><font>“só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado”.</font></i><br>
<font>IV. Com efeito, pela leitura da p.i, cujas cópias lhes foram entregues e ademais porque representados nos autos por mandatário judicial (o mesmo dos reclamantes), os pais dos reclamantes não podiam deixar de tomar conhecimento de que os seus filhos menores ora reclamantes também eram réus e que os mesmos eram citados nas suas pessoas, enquanto seus legais representantes.</font><br>
<br>
<br>
<b><font>Termos em que se acorda em indeferir a reclamação e m confirmar o despacho reclamado.</font></b><br>
<font>Custas pelos reclamantes, com taxa de justiça que se fixa em duas UCs.</font><br>
<font>Notifique.</font><br>
<br>
<font> Lisboa, 05 de maio de 2020</font><br>
<br>
<br>
<br>
<font> Acácio das Neves (Relator)</font><br>
<br>
<br>
<br>
<font> Fernando Samões</font><br>
<br>
<br>
<br>
<font> Maria João Vaz Tomé</font><br>
<br>
<font>Revista nº 193/16.5T8FND.C1.S1</font><br>
<br>
<br>
<font> Declaração do Relator</font><br>
<br>
<font>Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020 de 1 de maio, declaro que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, Dr. Fernando Samões e Dra. Maria João Vaz Tomé, têm voto de conformidade e só não assinaram o acórdão pelo facto de a sessão, dadas as atuais circunstâncias epidémicas, ter sido realizada por videoconferência.</font><br>
<br>
<font> Lisboa, 05 de maio de 2020</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font><br>
<font> (Acácio das Neves) </font><br>
<font> </font></font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
QjJuu4YBgYBz1XKvSAe9 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font>Revista nº 9215/15.6T8PRT-E.P1.S1</font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>AA. </font></b><font> instaurou ação de prestação de contas, contra </font><b><font>BB. </font></b><font>, pedindo que o réu fosse condenado a prestar contas da administração que fez do património comum do casal constituído entre ambos e entretanto dissolvido por divórcio, desde 27.04.1998 e da utilização do capital que lhe foi mutuado pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo ….</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência de contestação do réu e após várias incidências processuais (ora sem interesse), foi proferida </font><u><font>sentença</font></u><font>, nos seguintes termos:</font>
</p><p><i><font>“Nestes termos, conhecendo das contas apresentadas pelo Réu, BB. , relativas à administração, no período compreendido entre 24 de janeiro de 2001 e 30 de janeiro de 2012, dos bens relacionados no processo de inventário sob as verbas números 8, 9,10, 34-A, 34-B, 88, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 108 e 110, decide-se:</font></i>
</p><p><i><font>Aprovar as verbas da receita discriminadas nos pontos 19., 24. e 30. da fundamentação de facto, num total de €60 478,40 (sessenta mil quatrocentos e setenta e oito euros e quarenta cêntimos);</font></i>
</p><p><i><font>Aprovar as verbas da despesa discriminadas nos pontos 9., 15., 20., 25., 26., 28., 29., 31.e 33. da fundamentação de facto, num total de €41 541,72 (quarenta e um mil quinhentos e quarenta e um euros e setenta e dois cêntimos);</font></i>
</p><p><i><font>Não aprovar as demais verbas da despesa apresentadas pelo Réu; </font></i>
</p><p><i><font>Em consequência,</font></i>
</p><p><i><font>Fixar o saldo final da administração do património comum do casal, feita pelo Réu, em €18 936,68 (dezoito mil novecentos e trinta e seis euros e sessenta e oito cêntimos);</font></i>
</p><p><i><font>Condenar o Réu a pagar à Autora, AA. , metade desse valor, num total de €9 468,34 (nove mil quatrocentos e sessenta e oito euros e trinta e quatro cêntimos). Custas da ação a cargo de Autora e Réu, na proporção dos respetivos decaimentos”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência e no âmbito da apreciação dos recursos de apelação do réu (recurso principal) e da autora (recurso subordinado), a </font><b><font>Relação .......</font></b><font>, julgando improcedente o recurso principal e procedente o recurso subordinado, e confirmando no mais o decidido em 1ª instância, </font><i><font>aprovou as despesas da administração do réu no montante apenas de 28.733,88 (vinte e oito mil, setecentos e trinta e três euros e oitenta e oito euros), fixando-se o saldo final da administração do património comum do casal, feita pelo réu, em 31.744,52€ (trinta e um mil, setecentos e quarenta e quatro euros e cinquenta e dois cêntimos) e, em conformidade, condenando-se o réu no pagamento da autora de metade deste valor, ou seja, 15.872,26€ (quinze mil, oitocentos e setenta e dois euros e vinte e seis cêntimos).</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Inconformado, </font><b><font>interpôs o réu o presente recurso de revista</font></b><font> no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões</font></u><font>:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1ª - Esta revista é interposta do douto acórdão proferido a fls. o qual julgou alterou a matéria de facto fixada em 1ª instância, mas também a parte dispositiva da referida sentença e fixou o saldo final da administração do património comum em valor diverso daquele fixado em 1ª instância;</font>
</p><p><font>2ª - O recorrente está inconformado pela falta dos efeitos legais a retirar da matéria de facto tida por provada no ponto 84-18 do acórdão recorrido, onde se diz:</font>
</p><p><font>“18 - No ano de 2005, o réu mandou realizar obras nas frações relacionadas sob as verbas 98 e 99, as quais incluíram, pelo menos, a reparação de uma fuga de água, a eliminação de pontos de humidade e a pintura de interiores.”, pois, que do sobredito facto resulta que o recorrente fez obras nas frações constantes das verbas 98 e 99, não se tendo apurado a concreta despesa que teve com as mesmas obras;</font>
</p><p><font>3ª - Em obediência ao disposto no nº 2 do artigo 609º do C.P.C., o tribunal deve condenar no que se liquidar em execução de sentença sempre que se encontrem reunidas dois pressupostos:</font>
</p><p><font>1º: que o recorrente tenha efetivamente feito obras e suportado as inerentes despesas, e </font>
</p><p><font>2º: que o montante dessas despesas não esteja determinado na ação por não ter sido concretamente apurado;</font>
</p><p><font>4ª - Esta faculdade de que o Tribunal dispõe – condenação em valor a liquidar – não consiste num mero poder discricionário, mas sim, e conforme é jurisprudência pacifica, no exercício de um poder-dever;</font>
</p><p><font>5ª - Porquanto consubstancia uma gritante injustiça consistente em ter como adquirido que o recorrente fez obras, mas privá-lo de ser ressarcido pela recorrida da quota parte da responsabilidade dela nessas obras, pela singela razão de o mesmo recorrente não ter logrado provar o montante do dispêndio correspondente;</font>
</p><p><font>6ª - A este respeito, atente-se no distinto aresto deste Venerando Supremo Tribunal proferido em 14-12-2004, disponível em </font><a><u><font>www.dgsi.pt </font></u></a><font>e processo 04A3883, o qual, na parte que aqui releva do seu sumário, diz:</font>
</p><p><i><font>“5 - Porque a norma do artº 661º, nº 2, do CPC, se aplica no âmbito da ação de prestação forçada de contas, nada obsta a que, julgadas as contas prestadas e verificada a existência de saldo a favor do autor, o tribunal relegue para liquidação de sentença o respetivo apuramento (quantificação).”;</font></i>
</p><p><font>7 ª- Destarte, impetra a este Colendo Tribunal, no exercício, que as instâncias erradamente omitiram, do poder-dever contido no nº2 do artigo 609º do C.P.C., determine que seja relegado para liquidação ulterior em execução de sentença a real extensão das obras realizadas e respetivo preço, pelo que verificada a existência de saldo, se relegue para liquidação de sentença a sua quantificação, e nestes termos, seja revogado o dispositivo em crise.</font>
</p><p><font>Foram, pois, violadas as indicadas normas no sentido acabado de expor.</font>
</p><p><font>Termos em que e naqueles que V.Ex.ªs hão-de suprir, este recurso deve merecer provimento, com as legais consequências, como é de sã justiça.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A autora contra-alegou, pugnando pela improcedência da revista, alegando em resumo que, o réu pretende indevidamente </font><font>uma segunda oportunidade para tentar fazer prova daquilo que não conseguiu provar no âmbito da ação de prestação de contas, o que vai contra o fim visado pela norma invocada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Atendo ao conteúdo das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, a única questão de que cumpre conhecer consiste em saber se a quantificação das despesas relacionadas com a factualidade constante do nº 18 dos factos provados deve ser relegada para liquidação de sentença, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2 do CPC..</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Estabelece-se nesta disposição, em que o recorrente se estriba, que </font><i><font>“se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida”</font></i>
</p><p><font>Por sua vez, o artigo 556º do mesmo diploma estabelece:</font>
</p><p><i><font>“1 - É permitido formular </font></i><b><i><font>pedidos genéricos</font></i></b><i><font> nos casos seguintes:</font></i>
</p><p><i><font>a) Quando o objeto mediato da ação seja uma universalidade, de facto ou de direito;</font></i>
</p><p><i><font>b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil;</font></i>
</p><p><i><font>c) Quando a fixação do quantitativo esteja dependente de prestação de contas ou de outro ato que deva ser praticado pelo réu.</font></i>
</p><p><i><font>2 - Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior, o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358.º, salvo, no caso da alínea a), quando o autor não tenha elementos que permitam a concretização, observando-se então o disposto no n.º 7 do artigo 716.º.”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Perante a conjugação de tais disposições, alguma jurisprudência seguiu o entendimento de que a remessa para o incidente de liquidação apenas tem lugar nos casos em que haja sido deduzido um pedido genérico, nos termos do citado artigo 556º, ou seja, no sentido de que, não sendo o caso, e tendo o autor (ou réu reconvinte) tido a oportunidade de alegar e provar o valor da obrigação, ou seja, da quantia objeto do pedido de condenação, apenas o pode fazer uma só vez, não sendo lícito que lhe seja concedida uma segunda oportunidade para tentar provar o que, na primeira oportunidade, não logrou fazer.</font>
</p><p><font>É esta a posição defendida pela autora ora recorrida nas sua contra-alegações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Todavia, </font><u><font>a jurisprudência atualmente dominante, que temos por mais acertada, tem vindo a seguir entendimento contrário, ou seja, no sentido de que, feita a prova dos factos e do direito daí emergente, que não o respetivo valor, o valor da obrigação/condenação deve ser apurado em incidente de liquidação.</font></u>
</p><p><font>Isto, sem prejuízo do recurso à equidade, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 566º do C. Civil, onde se estabelece que </font><i><font>“se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados”.</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Conforme bem salientam A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, pag. 729) </font><i><font>“esta é, aliás, uma posição que encontra na jurisprudência um larguíssimo consenso, rejeitando uma argumentação formal que valorize o facto de, assim, se conceder ao autor uma dupla oportunidade para o reconhecimento do mesmo direito. Tal não é verdade se considerarmos, como se impõe, que uma sentença de condenação ilíquida pressupõe a demonstração de que existe um direito que apenas carece de concretização suscetível de ser conseguida ainda através do subsequente incidente de liquidação.</font></i>
</p><p><font>E, conforme bem salientam ainda os mesmos autores (fazendo, a propósito, referência ao acórdão do STJ de 03.02.2009 – proc. nº 08A3942, acessível in www.dgsi.pt), </font><i><font>“a opção entre a fixação da indemnização com recurso à equidade e a liquidação subsequente deve dirimir-se a favor do meio que dê mais garantias de se ajustar à realidade. Por isso, se for previsível que o valor exato do dano será apurado com prova complementar, deverá preferir-se a condenação genérica; já de, apesar de provado o dano, não for previsível que possa determinar-se o seu montante exato com recurso a prova complementar, deve fixar-se logo a indemnização com recurso à equidade”.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>E, mau grado, haja quem entenda que atenta a especificidade do processo de prestação de contas, mormente o que se dispõe no nº 5 do artigo 945º do CPC (</font><i><font>“o juiz ordena a realização de todas as diligências indispensáveis, decidindo segundo o seu prudente arbítrio e as regas da experiência, podendo considerar justificadas sem documento as verbas de receita ou de despesa em que não é costume exigi-las”</font></i><font>), este tipo de ação não permite que o apuramento das receitas e das despesas seja feito em incidente de liquidação de sentença (neste sentido, vide acórdão da Relação de Coimbra de 16.12.2015 – proc. nº 423/08.7TBLMG.C1, in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>), </font><u><font>afigura-se-nos que nada impede que, provada a realização de determinadas despesas, sem que no entanto se tenha provado o respetivo valor, este possa vir a ser apurado em incidente de liquidação (ou com recurso à equidade).</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><i><font> </font></i><font>Neste sentido, para além do acórdão do STJ de 14.12.2004 (proc. nº 04A3883, disponível in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>), invocado pelo recorrente (“</font><i><font>Porque a norma do artº 661º, nº 2, do CPC, se aplica no âmbito da ação de prestação forçada de contas, nada obsta a que, julgadas as contas prestadas e verificada a existência de saldo a favor do autor, o tribunal relegue para liquidação de<br>
sentença o respetivo apuramento (quantificação)”</font></i><font>), acórdão de 31.01.2006 da Relação do Porto proferido no proc. nº 0620202, igualmente disponível in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font> </font><i><font>(“Não existe qualquer obstáculo que afaste ou proíba que, em ação de prestação de contas, se relegue para liquidação em execução de sentença o apuramento do saldo respetivo”</font></i><font>).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Todavia o certo é que, da factualidade dada como provada, e mais concretamente da factualidade dada como provada sob o nº 18, em que o recorrente se baseia (“</font><i><font>No ano de 2005, o réu mandou realizar obras nas frações relacionadas sob as verbas 98 e 99, as quais incluíram, pelo menos, a reparação de uma fuga de água, a eliminação de pontos de humidade e a pintura de interiores”</font></i><font>), não resulta que o recorrente tenha pago o que quer que seja, ou seja, </font><b><font>nem sequer resulta provado o pagamento de quaisquer despesas por parte do mesmo </font></b><font>com tais obras</font><b><font>.</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>A única coisa que se provou foi que ele mandou realizar determinadas obras</font></u><font> (que incluíram a reparação de uma fuga de água, a eliminação de pontos de humidade e a pintura de interiores), e não que, por essas obras tenha pago quaisquer quantias, ainda que de montante não apurado,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Assim, não se mostrando provado que o recorrente tenha tido despesas com as obras que, nos termos dados por provados, mandou realizar, </font><b><font>nada há que apurar, em sede de incidente de liquidação, conforme pretende o recorrente</font></b><font> (ou mesmo com recurso à equidade).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Improcedem assim, nesta conformidade, as conclusões recursórias, impondo-se negar a revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em negar a revista e em confirmar ao cordão recorrido.</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Custas pelo recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Lx. 17.12.2020</font>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Acácio das Neves (Relator)</font>
</p><p><font> Fernando Samões (1º Adjunto)</font>
</p></font><p><font><font> Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
PTJvu4YBgYBz1XKvxAgk | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><b><font>Revista nº 4093/18.6T8VCT.G1.S1</font></b>
<p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>AA</font></b><font> intentou ação declarativa comum contra </font><b><font>Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.</font></b><font> e </font><b><font>Caixa Geral de Depósitos, S.A.</font></b><font>, pedindo:</font>
</p><p><font>a) Que a primeira ré seja condenada a pagar à segunda ré o montante que o autor tiver em dívida, relativo ao crédito concedido e associado ao seguro contratado com a ré identificado no artigo 1º da p.i.;</font>
</p><p><font>b) Que a primeira ré seja condenada a pagar ao autor as quantias por este pagas à segunda ré a título de prestações, custos e outras, bem como as quantias que igualmente o autor pagou à segunda ré relativas a prémios de seguro, quantias contadas desde a data em que o autor ficou com a Incapacidade Permanente, Dezembro de 2015, até à data em que a primeira ré pague ao autor as referidas quantias, quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados desde as datas dos pagamentos até à data da restituição;</font>
</p><p><font>c) E que a segunda ré seja condenada a receber da primeira ré o montante referido em a), desobrigando o autor de o fazer.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Alegou para tanto e em síntese que, tendo contraído empréstimo bancário perante a segunda ré, esta lhe exigiu para o efeito a celebração de um contrato de seguro do ramo vida, no caso de morte ou invalidez absoluta e definitiva, que garantisse o capital em dívida à instituição mutuante à data da ocorrência, contrato esse ao qual se limitou a aderir, sem lhe haver sido prestada qualquer informação ou esclarecimento quanto ao seu conteúdo, e que a situação do autor se enquadra desde 16/5/2016 na previsão contratual do dito seguro, devido a sequelas de um acidente vascular cerebral saúde que desde então o impedem de exercer toda e qualquer profissão, sendo portador de uma incapacidade permanente de 70%.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> A ré Fidelidade contestou, impugnando os factos alegados pelo autor. </font>
</p><p><font>Prosseguindo os autos e realizada que foi a audiência de julgamento, veio a ser proferida </font><b><font>sentença</font></b><font>, na qual </font><u><font>a ação foi julgada </font></u><font>improcedente, sendo as rés absolvidas dos pedidos contra elas formulados-.</font>
</p><p><font> Na sequência e no âmbito de apelação do autor, a</font><b><font> Relação de Guimarães </font></b><font>(sem voto de vencido, mas com fundamentação essencialmente diferente) </font><u><font>confirmou a sentença recorrida. </font></u>
</p><p><font>Inconformado, </font><b><font>interpôs o autor o presente recurso de revista</font></b><font>, no qual formulou as seguintes </font><u><font>conclusões:</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1ª - Vem o presente recurso interposto da decisão que determina que “Para um normal declaratório, a invalidez absoluta e definitiva para o trabalho significa, em termos da razão de ser da celebração do contrato de seguro, que em função da doença ou acidente o segurado fique impossibilitado de trabalhar e consequentemente impossibilitado de auferir rendimentos que lhe permitam desde logo, fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária”. Sendo esta interpretação demasiado simplista e alheia à realidade.</font>
</p><p><font>2ª - O presente recurso, versa acerca de decisão que manteve o já decidido em sentença de primeira instância. No entanto, ambas as decisões trilharam fundamentações distintas e opostas, excluindo-se assim a dupla conforme.</font>
</p><p><font>3ª - O Tribunal da Relação em Guimarães, e ao contrário da sentença recorrida de primeira instância considera “excluída a cláusula relativa aos requisitos da incapacidade, por entender que o ónus da prova do cumprimento do dever de informação/comunicação adequada e efetiva das cláusulas do contrato de seguro reside nas rés, não lhe podendo [ao autor] ser imputada a omissão de tal dever de informação.” </font>
</p><p><img><font>4ª - Assim e a clara diferença entre a sentença e o acórdão recorridos é que que o </font><img><font>acórdão, admite que “não será oponível ao autor/apelante o art. 1º das condições </font><img><font>gerais do contrato de seguro - onde está definida invalidez absoluta e definitiva </font><img><font>como a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria </font><img><font>que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer atividade </font><img><font>remunerada, necessitando da assistência de uma terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida diária – por falta de cumprimento do dever de informação </font><img><font>por banda das rés.”</font>
</p><p><img><font>5ª - A discordância do recorrente residirá na consequência da aplicação do artigo 8º </font><img><font>do DL 446/85, e portanto, na consequência no caso concreto da exclusão das </font><img><font>referidas cláusulas.</font>
</p><p><img><font>6ª - Em causa não estará matéria de facto, mas matéria cognoscível pelo Supremo </font><img><font>como tribunal de revista conforme Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no </font><img><font>processo 075623 in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>. </font>
</p><p><img><font>7ª - Ora, no que toca à interpretação das declarações de vontade, prevê o 236º do </font><img><font>Código Civil que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário </font><img><font>normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do </font><img><font>comportamento do declarante. </font>
</p><p><img><font>8ª - Nesta conformidade, o sentido que um declaratário normal, colocado na posição </font><img><font>do Autor pode deduzir no comportamento do declarante (artigo 236° n° 1) é que </font><img><font>estaria abrangida na cobertura do contrato de seguro o seu estado de incapacidade </font><img><font>que lhe deu direito junto da segurança social a atribuição de invalidez relativa.</font>
</p><p><font>9ª - Foi dado por provado que “O A. iniciou processo junto da Segurança Social, tendo </font><img><font>em vista que lhe fosse certificada a sua incapacidade, tendo-lhe sido atribuída </font><img><font>Invalidez Relativa”;</font>
</p><p><font>10ª - Esclarece a segurança social no seu Guia prático da Pensão de Invalidez, página 5 o conceito de Invalidez relativa, definindo ser quando o beneficiário apresenta uma incapacidade definitiva e permanente para a profissão que estiver a exercer ou a última que tiver exercido. </font>
</p><p><font>11ª - Nos termos da apólice contratada é considerada “invalidez definitiva para a profissão, ou atividade compatível, a limitação funcional definitiva e sem possibilidade clínica de melhoria.”</font>
</p><p><font>12ª - Ora, o A. padece de limitação funcional definitiva e sem possibilidade clínica de melhoria.</font>
</p><p><img><font>13ª - Assim, pode o recorrente deduzir no comportamento do declarante (artigo 236° </font><img><font>n° 1) e que tem correspondência com o texto do respetivo documento (artigo </font><img><font>238° n° 1) que está abrangido na cobertura do contrato o seu estado de </font><img><font>incapacidade de 60% sem previsão de melhoria, e que lhe deu direito junto da </font><img><font>segurança social à atribuição de invalidez relativa.</font>
</p><p><font>14ª - Ora, a interpretação expressa pelo recorrente nos autos, reflete a interpretação do </font><img><font>“declaratário normal”.</font>
</p><p><img><font>15ª - Como é consabido, “a invalidez absoluta corresponde a uma incapacidade </font><img><font>permanente absoluta para todo e qualquer trabalho (IPA) e a invalidez relativa </font><img><font>corresponde a uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual”.</font>
</p><p><img><font>16ª - É assim natural a interpretação do recorrente, que não podendo exercer a sua </font><img><font>atividade, está protegido pelo contrato de seguro que determina precisamente que </font><img><font>“caso fosse portador de incapacidade que o impedisse de exercer a sua atividade </font><img><font>lhe pagaria as quantias que, à data da Incapacidade, estivessem em dívida na </font><img><font>Instituição bancária”.</font>
</p><p><font>17ª - Termos pelos quais, e com fundamento nos artigos 227º e 236º do Código Civil deverá ser o Acórdão recorrido revogado e substituído por outro que condene as recorridas conforme o peticionado na Petição inicial.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A ré Fidelidade contra-alegou, pugnando pela improcedência da revista.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir:</font></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Em face do teor das conclusões recursórias, enquanto delimitadoras do objeto da revista, a questão de que cumpre conhecer consiste em saber - num contrato de seguro de vida, associado a um crédito à habitação, destinado a cobrir o risco de morte e, complementarmente, o risco de </font><b><font>invalidez permanente da pessoa segura</font></b><font> - como se deve definir essa invalidez quando a cláusula que a definia se tenha considerado excluída do contrato ou inoponível ao segurado, por não lhe ter sido comunicada e explicada.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi a seguinte a </font><b><u><font>factualidade dada por provada pelas instâncias:</font></u></b>
</p><p><u><font>Factos Provados</font></u><font>:</font>
</p><p><font> 1. O Autor contratou com a Ré Fidelidade um contrato de seguro, válido e eficaz, denominado de Adesão Vida Grupo, com o n.º de Apólice de Grupo 5001202, e n.º de Apólice/Adesão 59666, com início a 09 de Junho de 2009 e renovação automática, até 01 de Janeiro de 2022, pelo qual a primeira Ré se obriga, em caso de Morte ou Invalidez Permanente da Pessoa Segura, o aqui Autor, a pagar à segunda Ré Caixa Geral de Depósitos, S.A. pelo valor que, à data da ocorrência das circunstâncias, estiver em dívida, e pelo eventual remanescente do capital seguro, à pessoa segura, ou seja, o aqui Autor, isto até ao montante máximo de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros).</font>
</p><p><font>2. O Autor sempre pagou o prémio de seguro contratado com a primeira Ré.</font>
</p><p><font>3. A contratação de tal seguro foi aconselhada ao Autor pela instituição bancária “Caixa Geral de Depósitos, S.A.”, para aquisição de moradia, tendo o A. sido informado que a apólice contratada era necessária e que em caso de incapacidade futura que o impedisse de exercer a sua atividade profissional, a seguradora lhe pagaria as quantias que, à data da Incapacidade ou Morte, estivessem em dívida na instituição bancária, e o remanescente ao próprio Autor.</font>
</p><p><font>4. O Autor, a partir de Dezembro de 2015, em consequência de acidente vascular cerebral ocorrido nesse mesmo ano, começou com alterações comportamentais de memória, e a partir de 30/5/2017 com sintomas reveladores de padecer de doença arterial obstrutiva crónica com claudicação mais de 400m.</font>
</p><p><font>5. O A. iniciou processo junto da Segurança Social, tendo em vista que lhe fosse certificada a sua incapacidade, tendo-lhe sido atribuída Invalidez Relativa, com efeitos a partir de 16-05-2016, e com direito a pensão, a qual era transferida para a conta aberta na segunda Ré Caixa Geral de Depósitos, S.A. – doc. de fls. 8 vº.</font>
</p><p><font>6. O A. é portador de atestado médico de incapacidade multiuso no qual lhe é conferida uma incapacidade permanente global de 60%.</font>
</p><p><font>7. O A. é portador das seguintes sequelas permanentes:</font>
</p><p><font>- alterações comportamentais de memórias, sem défices musculares, sendo sequelas de AVC, desde 5/12/2015;</font>
</p><p><font>- doença arterial obstrutiva crónica com claudicação mais de 400m: sequela de doença arterial periférica, com diagnóstico em 30/5/2017.</font>
</p><p><font>8. Tais sequelas provocam no A. uma Incapacidade Permanente Parcial de 43,3%.</font>
</p><p><font>9. Nos termos das condições particulares da apólice, a garantia complementar invalidez total e permanente por doença ou acidente, o pagamento do capital seguro em caso de invalidez total e permanente de grau de desvalorização igual ou superior a 2/3, ou seja, um grau de desvalorização igual ou superior a 66,66%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela pessoa segura, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias preexistentes”.</font>
</p><p><font>10. Nos termos das condições particulares da apólice é considerada “invalidez definitiva para a profissão ou atividade compatível a limitação funcional definitiva e sem possibilidade clínica de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos: a) A pessoa segura fique completa e irreversivelmente incapacitada de exercer a sua profissão ou qualquer outra atividade remunerada compatível com os seus conhecimentos e aptidões; b) Corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem definida na apólice de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela pessoa segura, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias preexistentes; c) Seja reconhecida previamente pela Instituição da Segurança Social pela qual a Pessoa Segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou Instituição de Segurança Social, por junta médica.</font>
</p><p><font>11. No "Boletim de adesão" o A. declarou que: "declaro que me foram prestadas as informações pré-contratuais legalmente previstas, tendo-me sido entregue, para o efeito, o documento respetivo, para delas tomar integralmente conhecimento, e bem assim, que me foram prestados os esclarecimentos de que necessitava para a compreensão do contrato, nomeadamente sobre as garantias e exclusões, sobre cujo âmbito e conteúdo fiquei esclarecido".”.</font>
</p><p><font>12. No art. 1º das condições gerais do contrato de seguro, está definida invalidez absoluta e definitiva como a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer atividade remunerada, necessitando da assistência de uma terceira pessoa para efetuar os normais da vida diária (</font><i><font>facto este aditado pela Relação com base em “documentação junta aos autos, nomeadamente pela ré Fidelidade”</font></i><font>)</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Factos não provados</font></u><font>: </font>
</p><p><font>1. O A., ao contratar o seguro em causa nos autos, foi informado que em caso de padecer de qualquer tipo de incapacidade que lhe limitasse o exercício da sua atividade profissional a seguradora lhe pagaria as quantias que à data da respetiva incapacidade limitativa estivessem em dívida na instituição bancária e o remanescente ao próprio Autor.</font>
</p><p><font>2. Devido às patologias descritas em 4. e 6. dos factos provados, o Autor deixou de poder exercer a sua atividade laboral.</font>
</p><p><font>3. O A. necessita devido a tais patologias da ajuda de terceira pessoa para o ajudar a levantar, transportar, tomar as refeições, fazer a higiene pessoal e as suas necessidades.</font>
</p><p><font>4. O Autor é portador de sequelas permanentes que o impedem de exercer toda e qualquer profissão.</font>
</p><p><font>5. Ao A. foram comunicadas e explicadas todas as condições que se aplicavam ao contrato de seguro titulado pela apólice referida, assim como a respetiva "nota informativa" e que lhe foi entregue.”.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Apreciando:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b><br>
<font>A ação a que respeitam os autos baseia-se num </font><b><font>contrato de seguro de vida associado a um mútuo bancário (crédito à habitação)</font></b><font>, através do qual ficou garantido o capital em dívida à data da ocorrência, em caso de morte ou de invalidez absoluta e definitiva, pretendendo o autor que a seguradora (1ª ré) pague à instituição bancária (2ª ré) o montante em dívida relativo ao crédito que lhe foi concedido, bem como que lhe pague as quantias que pagou e que venha a pagar à 2ª ré, a título de prestações e outros custos, desde Dezembro de 2015, data em que ficou com uma </font><b><font>incapacidade permanente</font></b><font> em virtude de ter tido um AVC e ainda que a 2ª ré receba o referido montante da 1ª ré e o desobrigue de fazer esse pagamento.</font><br>
<font>As instâncias convergiram na solução que deram ao caso, embora tenham seguido, para tanto, percursos jurídicos diversos.</font><br>
<font> </font><b><font>A 1ª instância</font></b><font> julgou a ação improcedente, absolvendo as rés dos pedidos por não ter ficado provado que a situação do autor se enquadre nas condições da apólice de seguro em causa nos autos, uma vez que o mesmo não logrou demonstrar que seja portador de invalidez absoluta e definitiva que o impeça de exercer toda e qualquer profissão, nem que tenha necessidade de acompanhamento por terceira pessoa, nos termos previstos naquelas condições.</font><br>
<font>Por seu turno, a </font><b><font>Relação</font></b><font> considerou que, não tendo ficado provado que as cláusulas do contrato de seguro tenham sido comunicadas e explicadas ao autor, o art. 1º das condições gerais – no qual vem expresso o que deve entender-se por invalidez absoluta e definitiva – não lhe é oponível. </font><br>
<font>Não obstante, não afetando essa exclusão a validade do contrato, aplicando ao caso as regras de interpretação e integração dos negócios jurídicos, considerou que, atendendo à razão de ser do seguro, que, tal como o entenderia um declaratário normal (art. 236.º do CC), a invalidez absoluta e definitiva coberta pelo contrato há-de corresponder à impossibilidade de trabalhar em virtude de doença ou acidente e, consequentemente, de auferir rendimentos que permitam ao segurado fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.</font><br>
<font>Em consequência e partindo deste pressuposto, não tendo ficado provado que o autor tenha deixado, por força da incapacidade parcial de que padece, de poder exercer a sua atividade laboral ou qualquer outra, a Relação concluiu que a sua situação não é enquadrável na referida definição de invalidez absoluta e definitiva - e daí a improcedência da ação.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Uma vez mais inconformado, vem o autor recorrer de revista desta decisão da Relação, </font><u><font>sustentando antes de mais a admissibilidade da revista</font></u><font> (interposta apenas como revista normal) com base na inexistência de dupla conforme – entendimento este seguido pelo Relator da Relação que, conforme se vê do despacho de 10.07.2020, admitiu a revista com fundamento, além do mais, no disposto no art. 671.º, n.º 3, do CPC </font><i><font>a contrario</font></i><font>.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Como é sabido, ressalvados os casos de admissibilidade irrestrita do recurso, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância (art. 671º, nº 3, do CPC).</font><br>
<i><font>In casu, </font></i><font>a sentença foi confirmada pela Relação sem voto de vencido, pelo que importa apenas apreciar se a fundamentação nele acolhida é, tal como defende o recorrente, essencialmente diferente da fundamentação de que se socorreu a 1ª instância, posto que apenas esta poderá afastar a dupla conforme impeditiva do recurso de revista normal.</font><br>
<font>Como o STJ tem afirmado, repetidamente, </font><i><font>só pode considerar-se existente uma fundamentação essencialmente diferente quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radical ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1.ª instância </font></i><font>(cf. neste sentido, a título exemplificativo, Acórdãos do STJ de 28-04-2014, Revista n.º 473/10.3TBVRL.P1-A.S1 – 2.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator Abrantes Geraldes; de 18-09-2014, Revista n.º 630/11.5TBCBR.C1.S1 – 7.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator Silva Gonçalves;</font><b><font> </font></b><font>de 19-02-2015, revista n.º 302913/11.6YIPRT.E1.S – 7.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator Lopes do Rego; de</font><b><font> </font></b><font>27-04-2017, Revista n.º 273/14.1TBSCR.L1.S1 – 2.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator Tomé Gomes; de</font><b><font> </font></b><font>29-06-2017, Revista n.º 398/12.8TVLSB.L1.S1 – 7.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator António Joaquim Piçarra; de 30-11-2017, Revista n.º 579/11.1TBVCD-E.P1.S1 – 7.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator António Joaquim Piçarra; de 15-02-2018, Revista n.º 28/16.9T8MGD.G1.S2 – 2.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relatora Rosa Ribeiro Coelho; de 12-04-2018, Revista n.º 1563/11.0TVLSB.L1.S2-A – 7.ª Secção,</font><b><font> </font></b><font>Relator Helder Almeida; todos disponíveis em </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>, sublinhados nossos).</font><br>
<font>São, portanto, de desconsiderar, para este efeito, as discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não revelam um enquadramento jurídico alternativo, os casos em que a diversidade de fundamentação se traduza apenas na não-aceitação, pela Relação, de uma das vias trilhadas para atingir o mesmo resultado ou, do lado inverso, no aditamento de outro fundamento jurídico que não tenha sido considerado ou que não tenha sido admitido ou ainda no reforço da decisão recorrida através do recurso a outros argumentos, sem pôr em causa a fundamentação usada pelo tribunal de 1.ª instância.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Tendo presentes estas considerações, dir-se-á que, no caso vertente, a questão essencial em discussão nos autos é a de saber se a situação de incapacidade em que o autor se encontra, em virtude de ter sofrido um AVC, é enquadrável nas coberturas do contrato de seguro e, em concreto, na definição de invalidez absoluta e definitiva que o contrato, além do mais, se destinava a garantir.</font><br>
<font>As instâncias convergiram na resposta negativa que deram a esta questão, julgando, por isso, improcedente a ação.</font><br>
<font>Sucede, porém, que, para concluir nesse sentido, a </font><u><font>1.ª instância</font></u><font> analisou a factualidade dada como provada à luz das condições do contrato de seguro que, portanto, considerou serem válidas e aplicáveis ao caso, ao passo que a </font><u><font>Relação</font></u><font>, depois de ter considerado, ao abrigo do RCCG, que a cláusula que definia a situação de invalidez absoluta e definitiva não era oponível ao autor por não lhe ter sido comunicada e explicada, analisou os factos dados como provados à luz das regras de interpretação da declaração negocial plasmadas nos arts. 236º a 238º do CC que considerou serem aplicáveis ao caso para definir a aludida situação de invalidez.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Desta forma, estando a fundamentação plasmada no acórdão alicerçada em argumentos jurídicos completamente diversos da sentença, tanto mais que foram considerados </font><i><font>ex novo</font></i><font> pela Relação, será de concluir que se está perante fundamentação essencialmente diferente que, afastando a dupla conformidade decisória, permite a revista normal (art. 671.º, n.º 3, do CPC).</font><br>
<font>Em consequência, </font><u><font>não se vislumbrando que existam outros obstáculos à admissibilidade da revista, o recurso é admissível</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><u><font>Quanto ao objeto do recurso</font></u></b><font>, nos termos supra delimitados, vem o recorrente discordar do entendimento seguido pela Relação, supra mencionado, ou seja, da interpretação do contrato pela mesma efetuada com recurso às regras de interpretação e integração dos negócios jurídicos previstas nos arts. 236 º a 238º do CC, em conformidade com o disposto nos arts. 8º e 9º do RCCG.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>A Relação</font></b><font>, considerou que, para um declaratário normal, a invalidez absoluta e definitiva para o trabalho significa, em termos de razão de ser da celebração do contrato de seguro, que, em função de doença ou acidente, o segurado fique impossibilitado de trabalhar e, consequentemente, de fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.</font>
</p><p><font>Isto, tendo em conta que, </font><i><font>in casu,</font></i><font> se não provou que o autor tenha deixado de poder exercer a sua atividade laboral, nem que esteja impedido de exercer outras atividades.</font>
</p><p><font>Isto, nos seguintes termos:</font><br>
<i><font>“Temos assim que a busca do significado daquilo que as partes terão querido, ao emitirem uma declaração negocial, deve nortear-se pela regra geral enunciada no dito nº 1 do art. 236º do Código Civil, valendo, decisivamente, o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, teria deduzido do comportamento do declarante, só assim não sendo se este último, em termos de razoabilidade, não puder contar com a atribuição de tal sentido à sua declaração.</font></i><br>
<i><font>E também assim não será – como decorre do nº 2 do mesmo preceito – se o declaratário conhecer o sentido que o declarante pretendeu exprimir através da declaração, caso em que o negócio valerá “de acordo com a vontade comum das partes (…), quer a declaração seja ambígua, quer o seu sentido (objetivo) seja inequivocamente contrário ao sentido que as partes lhe atribuíram.” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 4ª edição, vol. I, pág. 224).</font></i><br>
<i><font>Naturalmente, esta última regra excecional só poderá ter aplicação no caso de se conhecer, a par da declaração negocial em análise, aquela que teria sido a vontade real das partes.</font></i><br>
<i><font>Quando nada foi sequer alegado pelas partes acerca do sentido subjacente às declarações negociais emitidas, nunca poderá resultar demonstrada, por tal via, essa vontade real, pelo que o sentido da vontade negocial tem de ser aferido em função da acima enunciada regra geral que consagra uma doutrina objetivista da interpretação, ao fazer prevalecer o sentido que “seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante.”(Ibidem, pág. 223).</font></i><br>
<i><font>A cláusula em análise que define a situação de invalidez absoluta e definitiva pressupõe uma limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer atividade remunerada, e cumulativamente a necessidade da assistência de uma terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida diária.</font></i><br>
<b><i><font>Para um normal declaratário, a invalidez absoluta e definitiva para o trabalho significa, em termos da razão de ser da celebração do contrato de seguro, que em função da doença ou acidente o segurado fique impossibilitado de trabalhar e consequentemente impossibilitado de auferir rendimentos que lhe permitam desde logo, fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.</font></i></b><br>
<i><font>Ora, </font></i><b><i><font>o que se verifica no caso dos autos é que, pese embora se tenha provado que o autor é portador de atestado médico de incapacidade multiuso no qual lhe é conferida uma incapacidade permanente global de 60%, e que é portador de sequelas permanentes que lhe provocam Incapacidade Permanente Parcial de 43,3%, o facto é que resultou não provado que o autor deixou de poder exercer a sua actividade laboral; que o autor necessita devido a tais patologias da ajuda de terceira pessoa para o ajudar a levantar, transportar, tomar as refeições, fazer a higiene pessoal e as suas necessidades; e que o autor é portador de sequelas permanentes que o impedem de exercer toda e qualquer profissão.</font></i></b><br>
<i><font>Nesta medida, não pode o autor pretender que a sua situação se enquadre na definição de invalidez absoluta e definitiva para um normal declaratário.</font></i><br>
<i><font>É que, de acordo com tal factualidade, o autor não está impossibilitado de trabalhar e consequentemente impossibilitado de auferir rendimentos que lhe permitam desde logo, fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária.</font></i><br>
<i><font>Assim, sempre seria de improceder a acção, e em consequência, a apelação interposta pelo autor.”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><u><font>Discordando de tal interpretação</font></u><font> feita à luz do artigo 236º do C. Civil, diz o recorrente que um declaratário normal entenderia que o seu caso se enquadra na cobertura do contrato de seguro, já que ficou com uma incapacidade de 60% sem previsão de melhoria, lhe foi atribuída uma invalidez relativa pela Segurança Social e não pode exercer a sua atividade.</font>
</p><p><font>Todavia, a nosso ver, </font><b><font>de todo sem razão,</font></b><font> pelas razões invocadas pela Relação, nos termos supra transcritos, que subscrevemos inteiramente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Estando o contrato de seguro em causa associado a um crédito à habitação e destinando-se o mesmo a garantir (complementarmente) </font><u><font>a invalidez absoluta e definitiva do segurado, esta, à luz da interpretação feira por um declaratário normal, nos termos do artigo 236º do C. Civil, terá que ser entendida como correspondendo a uma situação em que, por doença ou acidente, o segurado fique impossibilitado de trabalhar e auferir rendimentos que lhe permitam obter meios de subsistência e de fazer face à obrigação que assumiu perante a entidade bancária</font></u><font> – situação esta cuja prova impendia sobre o autor, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 342º do C. Civil e que, </font><i><font>in casu, </font></i><font> se não verifica, atenta a factualidade dada como provada e como não provada, conforme adiante explicitaremos.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Tem sido este, de resto o entendimento seguido na jurisprudência deste Tribunal.</font>
</p><p><font>Neste sentido, vide os seguintes acórdãos do STJ: </font>
</p><p><font>- De 17.12.2019 (proc. nº 2978/15.0T8FAR.E1.S1, in Sumários):</font>
</p><p><font>“</font><i><font>II - Perante um contrato de seguro que cobre o risco da “invalidez absoluta e definitiva”, tal conceito deve ser interpretado no sentido de o risco coberto corresponder a uma situação em que a pessoa afetada ficou totalmente incapaz, para o resto da sua vida, de exercer a atividade que a esta é inerente, designadamente, qualquer atividade que lhe permitisse angariar proventos para a sua subsistência – o que se não restringe à incapacidade absoluta e definitiva para o exercício da sua profissão –, e porque os autores não demonstraram, como era seu ónus, uma situação de invalidez com esta particular natureza e extensão, julgou-se a sua pretensão improcedente, em absoluta coerência lógica entre os fundamentos de facto e de direito usados e o comando decisório emitido.</font></i><br>
<font>- De 10.12.2019 (proc. nº 634/13.3TVPRT.P1.S1, in ww.dgsi.pt):</font><br>
<i><font>“VIII - Ainda que assim não fosse, a pretensão dos recorrentes sempre estaria votada ao insucesso, porquanto, mesmo que se declarasse a nulidade da cláusula em questão, a solução passaria por determinar, por via interpretativa, qual | [0 0 0 ... 0 1 0] |
RTJuu4YBgYBz1XKvTAdj | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font> </font>
<p><b><font>Reclamação nº 7050/16.3T8CBR-C.C1-A.S1</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>No âmbito dos autos de execução para pagamento de quantia certa que </font><b><font>Alfa Credit Solutions 1 S.A.R.L</font></b><font>., moveu a </font><b><font>AA. e outros</font></b><font>, na sequência de reclamação dos executados, na qual vieram invocar a prescrição do crédito e de juros e questionar a liquidação feita pela exequente e após vários desenvolvimentos processuais, veio a ser proferido o seguinte despacho:</font>
</p><p><font> </font><i><font>“Quanto ao requerimento dos executados de 28.03.2019:</font></i>
</p><p><i><font> Alegam os executados que não foi feita interpelação para a resolução do contrato de mútuo, tendo a exequente optado pela sua execução imediata.</font></i>
</p><p><i><font> Por isso, os montantes reclamados a título de juros remuneratórios aquando da instauração da presente execução são ilegais e indevidos, por nem sequer serem exigíveis à luz da normas e princípios mencionados, caindo por terra os €60.704,46 peticionados a esse título.</font></i>
</p><p><i><font> Terminam pugnando, a final, pela iliquidez da dívida, por não ter sido dado cumprimento ao ordenado nos respetivos despachos tornando a quantia reclamada inexigível e admitem somente a existência de capital em dívida no valor de €46.710,60, considerando as normas citadas, os cálculos e documentos apresentados pelos Executados.</font></i>
</p><p><i><font> A exequente pronunciou-se, defendendo que a dívida exequenda é certa, líquida e exigível, devendo os valores peticionados no requerimento executivo manter-se nos seus exatos termos.</font></i>
</p><p><font> </font><i><font>Apreciando:</font></i>
</p><p><i><font> A defesa pelos executados, através do requerimento que ora se aprecia, de iliquidez e inexigibilidade da dívida versa matéria que deveria ter sido, em sede e tempo próprios, alvo de instauração de embargos de executado (nos termos previstos nos artigos 729.º a 731.º do Código de Processo Civil).</font></i>
</p><p><i><font> Não o tendo feito no momento temporal certo, preclude o direito dos executados de os executados embargarem atualmente.</font></i>
</p><p><i><font> Deste modo, as considerações atinentes à exigibilidade da dívida exequenda não podem ser acolhidas.</font></i>
</p><p><i><font> Aliás, essa mesma asserção poderá ser extraída do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação ……, a saber: “A executada já não pode discutir os termos da liquidação indicada na petição executiva, salvo mostrando que existiu um erro de cálculo sempre retificável, porque a Executada nada disse no prazo da oposição à execução, o que implica aceitação da liquidação”</font></i>
</p><p><i><font> Pelo exposto, tendo os executados tentado apresentar matéria de oposição à execução nesta execução sem respeitar a forma e o tempo próprios para o efeito, o seu requerimento de 28.02.2019 terá de ser indeferido por falta de fundamento legal.</font></i>
</p><p><i><font> Notifique e comunique”</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font> Na sequência e </font><u><font>no âmbito de apelação da executada AA.</font></u><font>, a </font><b><font>Relação …..</font></b><font>, sem voto de vencido,</font><b><font> </font></b><u><font>apenas revogou parcialmente a decisão recorrida, no sentido de determinar o abatimento à quantia exequenda do montante de 4.547,90 €, na sequência do pagamento extrajudicial efetuado a 18 de janeiro de 2018</font></u><i><font>.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font> </font></i><font>Inconformada, </font><u><font>interpôs a executada/apelante recurso de revista normal.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Todavia, na Relação, por despacho da respetiva Relatora, </font><u><font>a revista não foi admitida</font></u><font>, nos seguintes termos:</font>
</p><p><i><font>“A Executada/Apelante vem, por requerimento de 19.06.2020, interpor RECURSO DE REVISTA do Acórdão proferido por este tribunal em 18 de fevereiro de 2020, na parte em que não revogou a decisão recorrida, ou seja, na parte em que confirmou a decisão da primeira instância.</font></i>
</p><p><i><font>Tratando-se, nesta parte, de uma situação de dupla conforme – decisão que confirma, sem voto d evencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância – o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça só se encontra previsto nas situações excecionais das alíneas a) a c) do nº 1 do artigo 672º, do CPC (artigo 671º, nº 3, CPC).</font></i>
</p><p><i><font>Assim sendo, </font></i><i><u><font>não se admite</font></u></i><i><font> o recurso de revista interposto pela Executada/Apelante, por inadmissibilidade legal.</font></i>
</p><p><i><font>Custas a suportar pela recorrente (artigo 7º, nº 2, RCP)”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Mais uma vez inconformada, </font><u><font>interpôs a recorrente reclamação</font></u><font>, pugnando pela admissão da revista.</font>
</p><p><font> Alegou, para o efeito e em resumo, que inexiste dupla conforme uma vez que a apelação foi julgada parcialmente procedente, não havendo confirmação integral da decisão e uma vez que os fundamentos do acórdão da Relação “não são fundamentalmente idênticos ao do decidido pela primeira instância”</font>
</p><p><font> E, subsidiariamente, em caso de inadmissibilidade da revista normal, </font><u><font>veio requerer que o recurso seja admitido como revista excecional, </font></u><font>invocando para o efeito os requisitos a que aludem as alíneas a) e b) do artigo 672º do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Subidos os autos, </font><b><font>pelo Relator, foi proferida decisão</font></b><font>, na qual </font><u><font>se indeferiu a reclamação, sendo confirmado o despacho reclamado (do Relator da Relação) que não admitiu a revista.</font></u>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> *</font>
</p><p><font> De novo inconformada, </font><b><u><font>veio a reclamante apresentar reclamação para a conferência</font></u></b><b><font>, </font></b><font>pugnando uma vez mais pela admissão da revista, como revista normal ou como revista excecional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Para o efeito reafirma a inexistência de dupla conforme, pelo facto de a apelação ter sido julgada parcialmente procedente e pelo facto de os fundamentos invocados pelas instâncias não serem fundamentalmente idênticos. </font>
</p><p><font> E diz ainda que o facto de o recurso ter sido interposto como revista “normal”, não impede a sua admissão/convolação como revista excecional, cabendo a sua admissão à formação a que alude o n.º 3 do art. 672º do CPC, sendo que cumpriu os respetivos requisitos específicos, designadamente, para efeitos do cumprimento do artigo 672º n.º 2 a) e b) do C.P.C, indicando na reclamação as razões pelas quais considera que as questões suscitadas na apelação são necessárias para uma melhor aplicação do direito e assumem uma particular relevância social.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> A parte contrária veio tomar posição no sentido do indeferimento da reclamação.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><u><font>Cumpre decidir:</font></u></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><u><font>No despacho do Relator</font></u><font>, a reclamação contra a não admissão (na Relação) da revista foi indeferida nos seguintes termos: </font>
</p><p><font> </font><i><font>“1) Nos termos do disposto no nº 3 do artigo 671º do CPC, a menos que em causa esteja uma situação em que o recurso é sempre admissível (do nº 2 do artigo 629º do mesmo diploma) – o que não é o caso dos autos, nem sequer tal foi invocado - a revista apenas pode ser admitida como revista excecional, desde que sejam invocados e julgados verificados pela Formação a que alude o nº do artigo 672º do CPC, os requisitos a que aludem os nºs 1 e 2 deste artigo, quando a Relação confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão da 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font>2) Conforme supra referido, a Relação, com exceção de uma pequena parte, confirmou a decisão da 1ª instância, sem voto de vencido – sendo que a revista interposta pela ora reclamante (apenas como revista normal) incide precisamente sobre a parte do acórdão da Relação que confirmou o decidido pela 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font>Coloca a reclamante a questão da existência do obstáculo da dupla conforme à admissão da revista no que respeita à parte do acórdão recorrido que confirmou a improcedência das pretensões formuladas.</font></i>
</p><p><i><font>Todavia, sem razão, na medida em que, nessa parte, existe confirmação e é sobre ela que incide a revista – conforme tem sido entendido pacificamente na jurisprudência, designadamente na jurisprudência deste Tribunal.</font></i>
</p><p><i><font>Sobre esta questão da existência de dupla conforme quando o recorrente viu a sua situação “melhorada” vide Acórdãos do STJ (in Sumários dos Acórdãos do STJ): </font></i>
</p><p><i><font>De 17-10-2019, in Revista n.º 7223/12.8TBSXL-A.L1.S1:</font></i>
</p><p><i><font>“Porque o espírito da lei é o de restringir o acesso ao STJ quando as instâncias decidiram no mesmo sentido e sem fundamentação essencialmente diferente, à situação de absoluta conformidade das decisões é de equiparar aqueloutra em que a parte descontente vê a sua situação </font></i><a></a><i><font>melhorada com a decisão da 2.ª instância, caso em que igualmente se deve dar como existente a </font></i><a></a><i><font>dupla </font></i><a></a><i><font>conforme”;</font></i>
</p><p><i><font>De 21-02-2019, in Revista n.º 1589/13.0TVLSB-A.L1.S1:</font></i>
</p><p><i><font>“I - Consagra-se no art. 671.º, n.º 3, do CPC a regra da “dupla conforme”, a qual estatui a inadmissibilidade do recurso de acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância. (…) IV - Apresentando-se a decisão da Relação, no que toca à quantificação dos danos patrimoniais sofridos pelo autor como mais favorável do que a da 1.ª instância, dado que aquela os fixou em € 80 000,00 e a Relação em € 90 000,00, verifica-se, igualmente, nesta parte, uma situação de dupla conforme, impeditiva da admissibilidade do recurso de revista interposto pelo autor, porquanto se a improcedência total da apelação obstaria à interposição do recurso, então também a sua improcedência parcial não pode deixar de produzir, por idêntica razão, o mesmo efeito impeditivo.”;</font></i>
</p><p><i><font>- E de 27-09-2018, in Revista n.º 634/15.9T8AVV.G1-A.S1:</font></i>
</p><p><i><font>“I - Prevalece actualmente na jurisprudência do STJ a tese segundo a qual é de equiparar à dupla </font></i><a></a><i><font>conforme os casos em que o acórdão da Relação, não sendo inteiramente coincidente com a decisão da 1.ª instância, divirja dela em sentido mais favorável ao recorrente, tanto no aspeto quantitativo como no aspeto qualitativo. II - Não tendo os recorrentes no seu requerimento de interposição de recurso referido-se minimamente à revista excepcional nem ali indicado como fundamento específico a contradição jurisprudencial, é de rejeitar a pretendida convolação de um recurso de revista interposto em termos gerais num recurso de revista excepcional, ao abrigo do art. 672.º, n.º 1, al. c), do CPC.". </font></i>
</p><p><i><font>3) Quanto à identidade da fundamentação, </font></i><i><u><font>considera a reclamante que os fundamentos “não são fundamentalmente idênticos, ou seja, aceita que inexiste fundamentação essencialmente diferente.</font></u></i>
</p><p><i><font>Ora o certo é que aquilo que que o nº 3 do artigo 671º do CPC exige se para considerar verificada a dupla conforme (para além da confirmação sem voto de vencido) </font></i><b><i><font>não é que as fundamentações de ambas as instâncias</font></i></b><i><font> </font></i><b><i><font>sejam fundamentalmente idênticas,</font></i></b><i><font> </font></i><i><u><font>mas sim que</font></u></i><i><font> </font></i><b><i><font>não sejam essencialmente diferentes</font></i></b><i><font> – o que é bem diferente.</font></i>
</p><p><i><font>E de facto, analisadas ambas as decisões, verificamos que as instâncias se “moveram” no âmbito do mesmo instituto e que o iter prosseguido por cada uma não é suficiente para se poder considerar que existiu a este respeito fundamentação essencialmente diferente, pelo que se verifica o obstáculo da dupla conforme à admissão da revista, nos termos do art. 671.º, n.º 3, do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>Sobre a existência de dupla conforme e a interpretação do requisito da fundamentação essencialmente diferente, vide Acórdãos do STJ (igualmente in Sumários dos Acórdãos do STJ):</font></i>
</p><p><i><font>De 17-10-2019 in Revista n.º 7223/12.8TBSXL-A.L1.S1:</font></i>
</p><p><i><font>“II - Tem vindo a entender-se, de modo reiterado, neste STJ, que a “</font></i><a></a><i><font>fundamentação </font></i><a></a><i><font>essencialmente </font></i><a></a><i><font>diferente” que releva para efeito de admissibilidade da revista não se basta com uma qualquer dissemelhança entre uma e outra das fundamentações em confronto, antes se exigindo que essa diferença seja essencial, o que não é o caso se a Relação aplicou as mesmas regras jurídicas em que assentou a decisão emitida na sentença.”), de 28-02-2019 in Revista n.º 424/13.3T2AVR.P1.S1 (“II - Em princípio, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem </font></i><a></a><i><font>fundamentação </font></i><a></a><i><font>essencialmente </font></i><a></a><i><font>diferente, a decisão proferida na 1.ª instância. III - Somente deixa de actuar a dupla conforme, a verificação de uma situação, conquanto o acórdão da Relação, conclua pela confirmação da decisão da 1.ª instância, em que o âmago fundamental do respectivo enquadramento jurídico, seja diverso daqueloutro assumido e plasmado pela 1.ª instância, quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação seja inovatória, esteja ancorada em preceitos, interpretações normativas ou institutos jurídicos diversos e autónomos daqueloutros que fundamentaram a decisão proferida na sentença apelada, sendo irrelevantes discordâncias que não encerrem um enquadramento jurídico alternativo, ou, pura e simplesmente, seja o reforço argumentativo aduzido pela Relação para sustentar a solução alcançada.”;</font></i>
</p><p><b><i><font> -</font></i></b><i><font> De 24-01-2019, Revista n.º 614/15.4T8PVZ.P1.S1:</font></i>
</p><p><i><font>“- I - Sobre o alcance da locução </font></i><a></a><i><font>fundamentação </font></i><a></a><i><font>essencialmente </font></i><a></a><i><font>diferente, a que alude o art. 671.º, n.º 3, do CPC, tem vindo a ser entendimento constante do STJ não bastar que a decisão da 1.ª instância e o acórdão da Relação confirmativo daquela, sem vencimento, apresentem fundamentação diferente, exigindo-se que tal diferença se mostre essencial. II - Numa ação, como a presente, em que estava em causa saber se os réus tinham incorrido em incumprimento definitivo do contrato-promessa, não se verifica a existência de </font></i><a></a><i><font>fundamentação </font></i><a></a><i><font>essencialmente </font></i><a></a><i><font>diferente quando a Relação, ainda que com algum desenvolvimento analítico de reforço no sentido de rebater as razões da apelante, acabou por concluir, no essencial, como a 1.ª instância, no sentido de que ambas as partes contribuíram para a não celebração do contrato definitivo, com a consequente restituição, pelos réus, do sinal em singelo. III - Tal conclusão não é alterada pela circunstância de a Relação ter procedido à alteração de um facto respeitante à qualidade de comerciantes dos réus, dado que não extraiu daí solução jurídica diversa da que havia sido seguida, a esse propósito, pela 1.ª instância. IV - Verificando-se a dupla conforme, a revista é inadmissível (art. 671.º, n.º 3, do CPC)”). </font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>4) Em face do exposto</font></i><i><u><font>, haveremos de concluir no sentido da inadmissibilidade da revista como revista normal, ou seja, nos termos em que a mesma foi interposta, com fundamento na verificação do obstáculo da dupla conforme a que alude o nº 3 do artigo 671º do CPC.</font></u></i>
</p><p><i><font> 5) </font></i><i><u><font>Quanto à revista excecional, agora e só agora invocada, a mesma é de todo inadmissível por ser absolutamente extemporânea</font></u></i><i><font>, na medida em que a mesma teria de ser interposta, a título principal ou a título subsidiário, no prazo legal de 30 dias, estabelecido no artigo 638º do CPC.</font></i>
</p><p><i><font> Em face do exposto, por não merecer censura o despacho reclamado, que não admitiu a revista, impõe-se indeferir a reclamação.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i><b><i><font>Termos em que se decide indeferir a reclamação e confirmar o despacho reclamado, que não admitiu a revista. (…)”</font></i></b>
</p><p><font> *</font>
</p><p><font> Analisados os autos, desde já se diga que </font><u><font>estamos inteiramente de acordo com a decisão do Relator</font></u><font> objeto da presente reclamação para a conferência, cuja fundamentação subscrevemos por inteiro – </font><u><font>mostrando-se de todo insubsistentes os argumentos ora repetidamente invocados nesta sede de reclamação para a conferência</font></u><font>.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Q</font><u><font>uanto à questão da existência de dupla conforme</font></u><font> (a que se alude no nº 3 do artigo 671º do CPC) </font><b><font>é manifesta a sua verificação</font></b><font> – conforme já havia sido considerado na Relação, no despacho de não admissão da revista.</font>
</p><p><font> Com efeito, para além de o acórdão recorrido ter sido subscrito sem voto de vencido, a parte da decisão em que a ora reclamante não obteve vencimento (sendo essa a parte que releva para os efeitos em questão) e que, como tal, constitui o objeto da revista, assentou numa fundamentação não só não essencialmente diferente como até inteiramente concordante, ou seja, ambas as instâncias consideraram que as questões suscitadas no requerimento de 28.03.2019, objeto das decisões recorridas, o foram extemporaneamente, que não em sede e no prazo legal, de embargos de executado..</font>
</p><p><font> A Relação apenas revogou a decisão da 1ª instância no sentido de abater à quantia exequenda o montante de 4.547,90 €, relativo ao pagamento extrajudicial efetuado a 18 de janeiro de 2018 (parte essa que, conforme supra referido, não constitui objeto da revista) por considerar, e bem, que os pagamentos entretanto efetuados sempre teriam que ser tidos em consideração.</font>
</p><p><font> Aliás, a reclamante continua a defender, para os efeitos em questão, que os fundamentos invocados pelas instâncias não são fundamentalmente idênticos – o que significa que reconhece que não são essencialmente diferentes – sendo esta a não diferenciação que releva nos termos e para os efeitos do disposto no nº 3 do artigo 671º do CPC.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>E, </font><u><font>quanto à questão da revista excecional</font></u><font>, é manifesto que </font><b><font>a mesma não podia ser admitida,</font></b><font> uma vez que a mesma foi requerida extemporaneamente, para além do prazo legal (de 30 dias). </font>
</p><p><font>Isto, na medida em que a revista excecional apenas veio a ser pedida, subsidiariamente, em sede de reclamação do despacho (do Relator da Relação) de não admissão do recurso (de que se conheceu no despacho do ora Relator, objeto da presente reclamação para a conferência), onde, e apenas aí, invocou alguns dos requisitos da revista excecional.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Carece assim de fundamento a presente reclamação que, como tal, importa indeferir.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>Termos em que se acorda em indeferir a reclamação e em confirmar o despacho reclamado.</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><font>Custas pela reclamante.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Lx. 17.12.2020</font>
</p><p><font>(Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL nº 20/2020, de 1 de maio, o Relator, que assina eletronicamente, declara que os Exmos. Conselheiros Adjuntos, abaixo indicados, têm voto de conformidade e não assinam o presente acórdão por não o poderem fazer pelo facto de a sessão, dada a atual situação pandémica, ter sido realizada por videoconferência).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Acácio das Neves (Relator)</font>
</p><p><font> Fernando Samões (1º Adjunto)</font>
</p><p><font> Maria João Vaz Tomé (2ª Adjunta).</font>
</p></font><p><font><font> </font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
5zKmu4YBgYBz1XKvzieO | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font>
<p><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font><b><font>I- Relatório</font></b><font>:</font>
</p><p><font> 1-1- </font><b><font>AA</font></b><font> e mulher, </font><b><font>BB</font></b><font>, propuseram a presente acção com processo ordinário contra </font><b><font>CC</font></b><font> e mulher, </font><b><font>DD</font></b><font>, e </font><b><font>EE</font></b><i><font> pedindo</font></i><font> que:</font>
</p><p><font> A) Se declarasse que, não tendo os réus pago aos autores a quantia de 15.000,00€ nem expurgado, até à data, as hipotecas que oneram o apartamento que lhes venderam, são agora os autores seus credores, por via da respectiva sub-rogação legal, pelo montante global de 36.471,00€, a que acrescerá o valor dos juros legais vencidos e vincendos a partir da citação; </font>
</p><p><font> B) Se julgasse nula a escritura celebrada no Cartório Notarial de Lamego em 2004.09.06; </font>
</p><p><font> C) Se julgasse a mesma válida para efeitos de se fazer prevalecer o negócio dissimulado, declarando-se, assim, que, foram os 1ºs réus que compraram o prédio em causa aos ali vendedores, e não a 2ª ré, sendo, consequentemente, aqueles e não esta, os seus proprietários; </font>
</p><p><font> D) Consequentemente, se ordenasse à CRP o cancelamento da inscrição que ali consta a favor da 2</font><sup><font>a</font></sup><font> ré, sob cota 0-....de 2004/06/21. </font>
</p><p><font> Fundamentam estes pedidos, em síntese, dizendo que os 1ºs RR. prometeram vender-lhes, livre de quaisquer ónus ou encargos, um apartamento sito na cidade de Lamego e por não terem cumprido o acordado, no processo nº 724/08.4TBLMG, que correu termos pelo 2º Juízo daquele tribunal, foi proferida sentença que supriu a declaração negocial dos faltosos e os condenou a expurgarem o prédio em causa das hipotecas que o oneravam e ainda a pagar-lhes a quantia de 15.000,00€. Os RR. nem pagaram a referida quantia nem expurgaram os referidos ónus, sendo que o seu valor ascendia a 21.471,00 €. Entretanto os RR., com o produto do trabalho do R. marido e com o preço do apartamento que venderam aos AA., adquiriram uma vivenda sita em M..........., onde passaram a residir. Todavia, foi a filha de ambos, ora 2ª R., quem interveio na respectiva escritura como compradora, tendo a mesma inscrito, posteriormente, esse direito a seu favor na Conservatória do Registo Predial. O preço de aquisição da vivenda declarado foi de 125.000,00 €, mas foi também simulado, pois que na urbanização onde o prédio se situa, nenhuma vivenda foi vendida por menos de 220.000,00€. Sendo certo que os 1ºs RR., à data da escritura, já tinham pago ao respectivo construtor, pelo menos, cem mil euros. </font>
</p><p><font> Os RR. foram, pessoal e regularmente, citados mas não contestaram.</font>
</p><p><font> Em consequência, foi proferido despacho a considerar confessados os factos alegados pelos AA. na petição inicial.</font>
</p><p><font> Por fim, foi proferida decisão que julgou a acção parcialmente procedente, por provada e, consequentemente, decidiu julgar nula, por simulação, a escritura celebrada no Cartório Notarial de Lamego em 2004.09.06, e ordenar à CRP o cancelamento da inscrição que ali consta a favor da 2ª R., sob cota0-....de 2004/06/21. </font>
</p><p><font> 1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram os AA. de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo-se aí, por acórdão de 12-10-2010, julgado parcialmente procedente o recurso, revogando a decisão recorrida no que concerne à condenação em custas, ficando os AA. e RR. condenados nas custas totais do processo, na proporção de metade para cada parte. </font>
</p><p><font> No mais, confirmou-se a decisão recorrida.</font>
</p><p><font> 1-3- Irresignados com este acórdão, dele recorreram os AA. para este Supremo Tribunal.</font>
</p><p><font> Remetido o processo à Formação de Juízes a que alude o art. 721º A nº 3 do C.P.Civil, foi admitida a </font><u><font>revista excepcional</font></u><font> com o fundamento na relevância social da questão jurídica em debate.</font>
</p><p><font> Ao recurso foi dado o efeito devolutivo.</font>
</p><p><font> Os recorrentes alegaram, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> 1ª- No caso dos autos, a alegada e comprovada simulação não podia afectar a validade formal e material do real negócio que os RR quiseram celebrar apenas entre si, pois os direitos e deveres que assumiram na escritura para com vendedores e para com a CGD não deixaram de surtir o efeito ali previsto. </font>
</p><p><font> 2ª- Na verdade, enquanto que, para aqueles, fora e continua a ser indiferente que os reais compradores tenham sido os primeiros ou a segunda, pois já receberam o preço e os RR nada lhes devem, para a mutuante é indiferente, pois a quantia mutuada e a forma de pagamento manter-se-ão inalteráveis, mostrando-se assegurados por garantia real de hipoteca que onera o prédio que os 1ºs venderam aos AA..</font>
</p><p><font> 3ª- E a condenação anterior dos RR. não impede os AA. de formularem nesta acção um pedido que é mais abrangente e, portanto, diferente daquele, como pode ver-se dos arts 4°, 5°,6° e 7° da p.i.. onde se alegam factos posteriores à primeira sentença, no total de 36.471.00 €, a que acrescerá o valor dos juros legais vencidos e vincendos sobre a quantia de 15.000.00€, verba muito superior, portanto, àquela que anteriormente lhes fora reconhecida. </font>
</p><p><font> 4- Acresce que os credores hipotecários dos 1ºs RR podem fazer-se pagar, quando queiram, pelo valor do prédio que, em face da primitiva decisão judicial transitada, é hoje dos recorrentes, assistindo-lhes, portanto, nos termos do art. 592º-1, </font><i><font>in fine, </font></i><font>do C.Civil, o direito de se verem legalmente sub-rogados na posição daqueles, pois tudo se passa corno se já tivessem suportado o pagamento daquelas quantias. </font>
</p><p><font> 5- Na verdade, se os recorrentes, em relação aos 1ºs RR, eram meros credores, passaram a ser, após o trânsito daquela sentença, proferida em sede do 830º do CC, os </font><i><font>reais </font></i><font>devedores para com os credores daqueles, pois mostrando-se os seus créditos assegurados pelo valor do apartamento, como aqueles não pagaram, os credores far-se-ão pagar pelo valor da sua venda, desse apartamento, que já pertence aos AA. Não conhecendo dessa questão, incorreu a decisão recorrida na nulidade prevista no art. 668º -1 d) do CPC.</font>
</p><p><font> 6</font><sup><font>a</font></sup><font>- É que, uma coisa é declarar-se ali que os RR devem aos AA uma determinada importância e outra bem diferente, é ser-lhes reconhecida, aqui, a qualidade jurídica de subrogados na posição creditória daqueles, mostrando-se, ainda, o douto acórdão incurso em erro de julgamento e na nulidade prevista no art. 668º-1. c) do CPC, pois dão-se provados factos que apontam para decisão diversa, ou seja, para a procedência do pedido formulado na al. A), tudo com as consequências previstas no art. 646º - e 716º . </font>
</p><p><font> 7</font><sup><font>a</font></sup><font>- E se a validade do negócio dissimulado estivesse sempre dependente da sua validade formal - na acepção das decisões propaladas nas instâncias recorridas, nenhum negócio dissimulado seria válido, quando oculto por trás de um outro que fosse nulo apenas pelo facto de ter sido simulado. </font>
</p><p><font> 8ª- Ao contrário do decidido, notoriamente, a procedência do pedido da aI. A) sem o reconhecimento do segundo, nunca foi desejada nem pedida pelos recorrentes, já que, a manter-se a decisão incólume, ficariam em pior situação de possível cobrança do direito de crédito decorrente da sentença anterior. </font>
</p><p><font> 9ª- O Ac. STJ de 25.03.10 não se aplica tanto ao caso sub-judice, quanto o Ac. STJ de 26.11.2009, in www.dgsi.pt. na medida em que dirimiu uma questão muito idêntica à dos autos, como pode ver -se do respectivo sumário que vai transcrito no corpo das alegações, cujo teor aqui se reproduz, e no qual se louvam os recorrentes, designadamente no seu VI item, onde se considera que “</font><i><font>o art. 241º nº 2</font></i><font> </font><i><font>do </font></i><font>CC </font><i><font>implica a dispensa de que figure declaração de vontade relativa </font></i><font>ao </font><i><font>negócio dissimulado no instrumento que titula </font></i><font>o </font><i><font>negócio simulado" </font></i>
</p><p><font> 10ª- A presente revista deve ser admitida, e até em julgamento ampliado, dada a complexidade e a importância de que se reveste, tanto do ponto de vista social - quer em Lamego quer no país inteiro onde são frequentes as situações de burla idênticas à dos autos - como do ponto de vista jurídico, sobretudo neste complexo domínio da dissimulação e simulação dos contratos, onde tal desiderato não tem tido resposta pacífica nem na doutrina nem na jurisprudência. </font>
</p><p><font> 11ª - Resta acrescentar que também o douto aresto em mérito está em contradição com outros, já transitados, como sucede. v. g .. com o Ac. RE, de 22.01.87. in CJ. I. 285 e com o Ac. STJ de 26.11.2009. in </font><a><u><font>www.dgsi.pt</font></u></a><font>, não se conhecendo qualquer acórdão de uniformização de jurisprudência que dirima tal desiderato.</font>
</p><p><font> Nestes termos e nos melhores de direito por Vossas Excelências doutamente supríveis, deverá revogar-se a decisão recorrida e substituir-se por outra que julgue a acção procedente e condene os RR como se pediu na p.i. </font>
</p><p><font> Não houve contra-alegações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: </font>
</p><p><font> </font><b><font>II- Fundamentação:</font></b>
</p><p><b><font> </font></b><font>2-1- Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas (arts. 690º nº 1 e 684º nº 3 do C.P.Civil). </font>
</p><p><font> Nesta conformidade, serão as seguintes as questões a apreciar e decidir:</font>
</p><p><font> - Se ocorre a nulidade do acórdão recorrido.</font>
</p><p><font> - Se o negócio dissimulado é válido ou se é nulo.</font>
</p><p><font> 2-2- Vem fixada das instâncias a seguinte matéria de facto:</font>
</p><p><font> 1- Por sentença proferida na acção n.º 724/08.4TBLMG do 2.º juízo do Tribunal Judicial de Lamego, devidamente transitada em julgado, intentada pelos ora autores contra os ora 1ºs réus - CC e mulher DD, foi decretada a execução específica do contrato promessa de compra e venda celebrado em 21.05.2002, pelo qual estes prometeram vender aos primeiros, que lhes prometeram comprar, livre de ónus ou encargos e pela quantia de € 95.000,00, que já havia sido paga, a fracção autónoma designada pela Letra 00 do prédio urbano para habitação, constituído em propriedade horizontal, sito na Rua Dr. FF, 00, ....Esq. em Lamego, descrita na C.R.Predial de Lamego sob o n.º 000/00000000, e inscrita na respectiva matriz sob o art.º 1384 da freguesia da Sé, consequentemente, sido suprida a declaração de venda de tal imóvel por parte dos 1ºs réus.</font>
</p><p><font> 2- Pela mesma sentença, foram ainda os ora 1ºs réus condenados a, no prazo de 20 dias a contar da mesma, expurgarem todas as hipotecas que onerem a fracção autónoma referida.</font>
</p><p><font> 3- E ainda por via da mesma sentença foram os ora 1ºs réus condenados a devolverem/pagarem aos ora autores a quantia de € 15.000,00 que destes haviam recebido por contrato de mútuo também aí declarado nulo por vício de forma.</font>
</p><p><font> 4- A aquisição da supra referida fracção autónoma está inscrita no Registo Predial a favor dos autores pela inscrição Ap.000 de 2009.09.23. </font>
</p><p><font> 5- Os 1ºs réus não cumpriram o acima referido em 2. e 3. e, entretanto, contraíram novas dívidas junto de particulares, agravando os ónus que recaem sobre o apartamento, hoje, propriedade dos autores, somando o valor dos ónus ali certificados (por se tratar de créditos assegurados por garantia real), o montante global de € 21.471,00.</font>
</p><p><font> 6- Os 1ºs réus não dispõem, actualmente, de quaisquer bens, direitos ou rendimentos que lhes permitam suportar o pagamento das dívidas, designadamente as que beneficiam de garantia real sobre a fracção propriedade dos autores, por se terem colocado, conscientemente, nessa situação.</font>
</p><p><font> 7- Os 1ºs réus aplicaram o dinheiro que o réu marido auferia, antes de se afastar da função pública, na compra de uma vivenda de três pavimentos, sita na Quinta ...., em M---, com 310 m2 de superfície, inscrita, então, provisoriamente, na matriz de Almacave sob o art.º P-3301 e descrita na C.R.Predial sob o n.º0000, onde investiram o produto da venda do apartamento e dos empréstimos que os autores lhes haviam anteriormente feito.</font>
</p><p><font> 8- Os 1ºs réus como justificação para a venda da supra referida fracção autónoma, invariavelmente, apresentavam aos autores e a todos quantos, na altura, estavam a par do negócio, a necessidade de pagarem ao empreiteiro a sua vivenda sita em Medelo. </font>
</p><p><font> 9- Os 1ºs réus passaram a residir na referida vivenda, desde que venderam o apartamento aos autores, já que também estes mudaram para lá, uma vez que nem uns nem outros tinham ou têm qualquer outra casa onde viver.</font>
</p><p><font> 10- Desde então, em tudo têm procedido os 1°s réus como legítimos donos dessa vivenda, sendo como tal são considerados por quem os conhece. </font>
</p><p><font> 11- Mas, apesar de toda a gente saber que a referida vivenda era propriedade dos 1°s réus, foi a filha de ambos, ora 2ª ré, quem interveio na respectiva escritura como sua compradora, tendo-a feito inscrever a se favor na C.R.Predial sob cota0-....de 2004/06/21.</font>
</p><p><font> 12- A 2ª ré é pessoa jovem e por isso pode beneficiar do empréstimo bonificado e mais dilatado que a CGD lhe concedeu, no montante de € 125.000,00, o que os 1ºs réus não conseguiriam, quer pela idade quer por já serem devedores à mesma instituição por elevadas quantias.</font>
</p><p><font> 13- Os 1ºs réus, para se subtraírem ao pagamento coercivo das suas dívidas à Banca e aos autores, magicaram a melhor forma de se eximirem às suas responsabilidades, intervindo como meros fiadores, na escritura de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, relativa à referida vivenda, celebrada no Cartório Notarial de Lamego em 2004.09.06, onde declararam que se responsabilizavam como principais pagadores de tudo quanto viesse a ser devido à CGD em consequência do pedido de empréstimo de € 125.000,00 que esta concedera à 2ª ré, quando eram eles os verdadeiros compradores da casa e foram sempre eles que pagaram e continuarão a pagar as prestações mensais desse empréstimo. </font>
</p><p><font> 14- Tanto mais que aquela andava a estudar, não tinha emprego conhecido e não auferia qualquer salário, não dispondo, por isso, de qualquer rendimento que lhe permitisse sobreviver sozinha, designadamente, vestir-se, calçar-se, alimentar-se, custear as despesas da sua formação académica e, muito menos, suportar o pagamento das prestações mensais desse empréstimo.</font>
</p><p><font> 15- Também o preço de aquisição da vivenda foi simulado, pois toda a gente sabe que, naquela urbanização, nenhuma vivenda foi vendida por menos de duzentos e vinte mil euros (uma vez que o seu valor real, pela qualidade dos materiais, área e localização, não se quedava abaixo dessa importância) e que os 1ºs réus à data da escritura, já tinham pago, pelo menos, cem mil euros ao construtor GG, o que sucedeu antes e para que este lhes subscrevesse o respectivo pedido de registo provisório de hipoteca na C.R.Predial, como condição de aprovação do empréstimo atrás referido. </font>
</p><p><font> 16- Ao assim agirem foi intenção dos réus não pagarem à GGD o valor dos empréstimos garantidos pelas hipotecas que oneram o apartamento que os autores lhes compraram, nem a estes o valor dos empréstimos que, antes, lhes fizeram. </font>
</p><p><font> 17- Descapitalizaram-se, colocando-se, dolosamente, em situação de não poderem pagar as suas dívidas, como também pretenderam ludibriar os autores, provando, por um lado, que foi, mesmo, a filha quem comprou a casa, e, por outro, que esta não precisou do dinheiro deles, porque o fizera com recurso ao pedido do referido empréstimo bancário. --------- </font>
</p><p><font> 2-3- Os recorrentes defendem a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia em relação à questão da sub-rogação que invocam. Segundo afirmam, os credores hipotecários dos 1ºs RR podem fazer-se pagar, quando queiram, pelo valor do prédio que, em face da primitiva decisão judicial transitada, é hoje dos recorrentes, assistindo-lhes, portanto, nos termos do art. 592º-1, </font><i><font>in fine, </font></i><font>do C.Civil, o direito de se verem legalmente sub-rogados na posição daqueles, pois tudo se passa como se já tivessem suportado o pagamento daquelas quantias. Não conhecendo dessa questão, incorreu a decisão recorrida na nulidade prevista no art. 668º -1 d) do CPC.</font>
</p><p><font> A falta de razão dos recorrentes, parece-nos evidente pela simples razão que a questão não foi colocada ao tribunal recorrido, pelo menos de modo claro. Com efeito, compulsando-se as conclusões da apelação (que recorde-se, balizam o âmbito objectivo dos recursos - arts. 690º nº 1 e 684º nº 3 do C.P.Civil -), verifica-se que os recorrentes somente falam da sub-rogação na sua conclusão 13ª para dizer que a questão principal “</font><i><font>não é a de os AA. … se verem sub-rogados no direito de crédito subsequente ao incumprimento dos 1ºs RR., mas antes a de fazerem voltar à sua esfera patrimonial a titularidade do único bem de que dispõem, de modo a poderem avançar, só depois , com o processo prévio da expurgação</font></i><font>”. Ou seja, não colocam a questão do reconhecimento, a seu favor, da sub-rogação (legal) a que alude o art. 592º nº 1 do C.Civil, tema a que a sentença de 1ª instância havia respondido negativamente em razão de que, não resultando provado que os AA. tenham efectuado o pagamento do débito dos RR., não podem substituir-se a estes na reclamação desse crédito. Em relação a este fundamento, nada os RR. alegam ou aduzem em contrário, nas suas alegações e nas respectivas conclusões de recurso.</font>
</p><p><font> Por isso, não vemos que o acórdão recorrido tivesse que conhecer de tal assunto e, por consequência, seja nulo por omissão de pronúncia (arts. 668º nº 1 al. d) e 716º nº 1 do C.P.Civil). </font>
</p><p><font> É improcedente, pois, a posição dos recorrentes.</font>
</p><p><font> 2-4- Entrando na questão essencial levantada pela revista e que originou a decisão de revista excepcional, diremos, desde logo, que a posição assumidas pelas instâncias foi correcta.</font>
</p><p><font> No douto acórdão, confirmando a posição assumida pela 1ª instância, referiu-se que o tribunal recorrido considerou e, consequentemente, declarou nulo, por simulação, tal como os AA./apelantes peticionaram, o contrato de compra e venda de um bem imóvel, outorgado em 6.09.2004, por escritura pública celebrada no Cartório Notarial de Lamego, entre GG, como vendedor e a 2ª ré, EE, como compradora. É que resultou provado nos autos, as partes queriam efectivamente celebrar um contrato de compra e venda com o mesmo conteúdo e objecto, mas entre outras pessoas, mais precisamente no que respeita ao lado do comprador, pelo que se entendeu estar-se perante um caso de simulação relativa, por interposição fictícia de pessoas (do lado do comprador). Mais se entendeu que por detrás do negócio simulado nulo, existe um outro negócio, o negócio latente, oculto ou negócio dissimulado. Trata-se de duas realidades jurídicas diferentes, embora muito estreitamente ligadas entre si.</font>
</p><p><font> Acrescentou-se que a validade ou invalidade do negócio dissimulado, era a questão relevante neste recurso, sendo que nos termos do nº 1 do art. 241º do C.Civil, a validade do negócio dissimulado não é afectada, em princípio, pela nulidade do negócio. Porém, se o negócio dissimulado estiver sujeito à forma legal, há que observar o disposto no nº 2 do art.º 241º do C.Civil, segundo o qual </font><i><font>“se porém o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma exigida por lei”. </font></i><br>
<font> No caso dos autos, a compra e venda de imóvel, à data dos factos, só era válida se realizada por escritura pública (art.º 875º do C.Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 116/2008, de 4.07, em vigor na data da realização do contrato em causa e art. 220º do mesmo diploma). A forma observada na conclusão do negócio simulado corresponde tanto à forma exigida por lei para o negócio simulado, como para o negócio dissimulado (ambos são contratos de compra e venda de bem imóvel).</font>
</p><p><font> Pese embora esta circunstância, o certo é que, também o negócio dissimulado foi considerado nulo por vício de forma “</font><i><font>pois o encontro de vontades e correspondentes declarações negociais entre o vendedor GG e os 1.ºs réus, compradores, não constam da escritura pública outorgada em 6.04.2004, no Cartório Notarial de Lamego</font></i><font>”, tratando-se de nulidade de conhecimento oficioso, invocável e susceptível de ser conhecida a todo o tempo com efeito retroactivo (arts. 286º e 289º nº 1, sem prejuízo do disposto relativamente a terceiros de boa-fé nos arts. 243º, 291º nº 2 e 394º, todos do C.Civil).</font>
</p><p><font> Assim, confirmou-se a douta decisão de 1ª instância recorrida.</font>
</p><p><font> É sobre aquela posição de considerar o negócio dissimulado como nulo por vício de forma que os recorrentes mostram o seu inconformismo, no presente recurso.</font>
</p><p><font> Todavia, sem qualquer razão como iremos ver.</font>
</p><p><font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
5zKru4YBgYBz1XKv3SuN | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça</font></b><div><br>
</div><br>
<br>
<font>AA e sua mulher BB intentaram acção, com processo ordinário, contra CC e mulher DD.</font>
<p><font>Pediram a condenação dos Réus a:</font>
</p><p><font>- suprimirem os defeitos que referem na p.i. e outros que venham a ser detectados;</font>
</p><p><font>- pagarem-lhes a quantia de 10.325,16 euros, a título de cláusula penal pelo atraso na conclusão dos trabalhos;</font>
</p><p><font>- devolverem-lhes 1000,00 euros, a título de trabalhos previstos no contrato e não efectuados;</font>
</p><p><font>- pagarem-lhes uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, em montante não inferior a 3000,00 euros, acrescidos de juros à taxa legal, desde a citação.</font>
</p><p><font>Os Réus contestaram e, em reconvenção, pediram a condenação dos Autores a pagarem-lhes a quantia de 2630,25 euros, com juros, à taxa legal.</font>
</p><p><font>No 3.º Juízo Cível de Barcelos a acção foi julgada improcedente e os Réus absolvidos do pedido, mas a reconvenção foi julgada procedente e os Autores condenados a pagar ao Réu-marido a quantia de 2534,70 euros com juros moratórios à taxa da lei desde a citação.</font>
</p><p><font>Os Autores apelaram para a Relação de Guimarães.</font>
</p><p><font>Aí a apelação foi julgada parcialmente procedente e os Réus condenados a repararem os defeitos dos pontos 14 a 24 da sentença apelada, com excepção do ponto 22, absolvendo-os do mais pedido; declarado foi que os Autores têm o direito de reter 2534,70 euros, correspondentes ao remanescente do preço em falta, absolvendo-os em consequência, do pedido reconvencional.</font>
</p><p><font>Inconformados, os Réus pedem revista.</font>
</p><p><font>E concluem assim a sua alegação:</font><br>
<font>- A sentença da 1.ª instância não merece qualquer censura;</font><br>
<font>- Mostra-se correcta na apreciação do direito aos factos que foram provados na audiência de julgamento;</font><br>
<font>- Aos Autores, aqui recorridos, cabia o ónus da prova quanto à responsabilidade do Réu/marido pelos defeitos que a sua casa de habitação apresentava.</font><br>
<font>- Nenhuma prova foi feita pelos mesmos dessa responsabilidade. </font><br>
<font>- O contrato de empreitada é claro ao dizer que o réu marido foi contratado para conclusão da obra de pedreiro e trolha. </font><br>
<font>- Logo, os defeitos que a mesma possa apresentar não podem, sem mais, ser atribuídos a quem foi concluir uma obra já com construção de outrem. </font><br>
<font>- Os autores não fizeram a prova de que foi o réu marido quem provocou aqueles alegados defeitos. </font><br>
<font>- As tentativas de acordo nos autos não passaram disso mesmo e, porque não se logrou aquele intento não podem ser valoradas mais que isso, tentativa, o tal relatório dos Srs. Peritos nomeados pelas partes. </font><br>
<font>- Aliás o tribunal da Relação é bem expresso ao afirmar que não existe qualquer transacção nos autos. </font><br>
<font>- Pelo que também não pode usar na sentença as tentativas dessa transacção.</font><br>
<br>
<font>- Não tendo sido feita qualquer prova, que aos autores incumbia, de que os defeitos apresentados se devem ao trabalho realizado pelo réu. </font><br>
<font>- Além de que, sem prescindir, o Tribunal da Relação acaba por condenar o réu na realização de trabalhos que estão expressamente assentes que este não fez. </font><br>
<font>- Também as respostas aos quesitos 41.º 42°, 43°, e 44° não poderiam ter sido alteradas porque nenhuns elementos foram carreados para os autos que tal possibilitem. </font><br>
<font>- Trata-se de um erro grosseiro esta alteração.</font><br>
<font>- E assim, de conhecimento deste Supremo Tribunal. </font><br>
<font>- Devendo, como tal, manter-se as respostas dadas em primeira instância. </font><br>
<font>- E o Tribunal da Relação de Guimarães não poderia ter absolvido os autores do pedido reconvencional se, isto sem prescindir, lhes reconhece um direito de retenção da quantia peticionada. </font><br>
<font>- Ao decidir de forma contrária violou o douto acordo ora recorrido o disposto nos artigos 668° n° 1 alínea h) e 342° do Código Civil. </font>
</p><p><font>Contra alegaram os Autores em defesa do julgado, concluindo, desde logo, pela impossibilidade deste Supremo Tribunal sindicar a matéria de facto fixada pela 2.ª instância.</font>
</p><p><font>Mais disseram ainda que:</font><br>
<font>- Igual destituição de fundamento merece a afirmação de que “A prova trazida pelos autores ao processo é nula quanto à responsabilidade dos réus quanto àqueles defeitos”. </font><br>
<font>- Com efeito, atendendo aos critérios da distribuição do ónus da prova, resulta da lei precisamente o contrário, pois: IV- Como a existência do defeito é facto constitutivo dos direitos do dono da obra, compete-lhe a respectiva prova, nos termos do artigo 342.°, n.° 1, do Código Civil. V- Tendo o dono da obra provado a existência do defeito e que o mesmo era relevante, na medida em que afectava o uso normal da coisa, competia ao empreiteiro a prova dos factos impeditivos da sua responsabilidade ( artigo 342°, n.° 2 do Código Civil)». </font><br>
<font>- Como tal, in casu, era aos Recorrente que competia demonstrar que os defeitos, nomeadamente os elencados nos Pontos 15. a 34. dos Factos Provados não resultavam da sua responsabilidade. </font><br>
<font>- Ora, claro se torna que não consta dos Factos Provados nada que exclua a responsabilidade dos Recorrentes, a qual aliás se presume. </font><br>
<font>- Não tendo os Recorrentes demonstrado a verificação de facto impeditivo do direito invocado pelos Recorridos, estão aqueles obrigados a reparar e suprimir os defeitos dados como provados. </font><br>
<font>- Por fim, referem ainda os recorrentes que “não poderia o Tribunal da Relação de Guimarães absolver os autores do pedido reconvencional, julgando ao mesmo tempo que os autores têm direito de retenção do valor de 2.534,70 €“, parecendo que pretendem apontar uma nulidade do acórdão (oposição entre os fundamentos e a decisão). </font><br>
<font>- Todavia, também neste ponto não assiste qualquer razão aos Recorrentes. </font><br>
<font>- Com efeito, porque a excepção do não cumprimento é um meio de defesa dos Autores para obterem a execução do contrato de empreitada nos termos que foram acordados, estando coenvolto na arguição da excepção, embora indirectamente, o pedido reconvencional, improcede este pedido, pois com ele se pretende obter o mesmo resultado que se obtém com a excepção do não cumprimento. </font><br>
<font>- Desta forma, improcedem integralmente as conclusões alinhadas pelos recorrentes.</font>
</p><p><font>A Relação, após ter alterado a decisão da 1.ª instância, considerou definitivamente assentes os seguintes </font><b><font>factos</font></b><font>: </font><br>
<font>1. Encontra-se inscrita a aquisição, por doação, a favor do Autor/marido do prédio urbano sito no lugar da </font><font>Penide, da freguesia de Areias S. Vicente, esta Comarca, composto por edifício destinado a habitação com cave, rés do chão e andar, anexo, um viveiro e um lago e logradouro, inscrito na matriz predial urbana deste concelho sob o art° 425° e descrito na Conservatória respectiva sob o n.° 227/Areias S. Vicente. </font><br>
<font>2. Por si, antepossuidores e anteproprietários, há mais de 5, 10, 15, 20, 25, 30 anos, utilizam os autores o descrito bem imóvel, fazendo nele obras e melhoramentos, edificando construções nele, requerendo em seus nomes as licenças necessárias, pagando as contribuições e impostos, tudo à vista de toda a gente, sem a oposição de quem quer que seja, em tudo se comportando como donos, por todos sendo considerados como tal, na convicção de que exercem um direito próprio. </font><br>
<font>3. Em 8 de Dezembro de 2001, os autores acordaram mediante contrato escrito com o réu marido, pelo preço global de €46.787,24 (Esc.9.380.000$00), que o réu se obrigava a executar os trabalhos necessários para a conclusão da obra de pedreiro e trolha (incluindo mão de obra e todo o material para a obra de pedreiro e para as massas de trolha) que faltavam para concluir a construção de uma moradia, incluindo arranjos exteriores envolventes e respectivas estruturas (designadamente anexos, viveiros para aves, lago, etc.), de acordo com a discriminação constante do ANEXO A ao contrato de empreitada, obra essa sita no lugar da Penide, lote n° 4, freguesia de Areias S. Vicente, concelho de Barcelos, objecto do alvará de licença de construção nb240/99, de 05/03/99. </font><br>
<font>4. Nos termos da cláusula quinta, os trabalhos previstos no contrato deveriam estar concluídos até ao dia 30 de Julho de 2002, tendo ainda ficado estabelecida uma cláusula penal no caso de atraso na conclusão da obra no montante de €37,41 (Esc.7.500$00) por cada dia que ultrapassasse a data de conclusão da obra. </font><br>
<font>5. o réu deu por concluídos os trabalhos em 2 de Maio de 2003. </font><br>
<font>6. Os autores procederam ao pagamento do preço da empreitada aludida em 3.</font><br>
<font>7. Os autores enviaram ao réu uma carta registada com aviso de recepção, a 26 de Julho de 2003, na qual lhe comunicaram que: </font><br>
<font>- O chão do lago não tem pendente para o tubo de esgoto da água e como o chão foi colocado depois de o tubo estar lá, o erro deve-se a quem efectuou o trabalho por não ter deixado a inclinação suficiente para que ao abrir-se o passador para despejar o lago a água saia toda, o que não acontece devido à inclinação ter ficado ao contrário; </font><br>
<font>- Falta rematar cantos das paredes dos anexos à volta das torneiras da água; </font><br>
<font>- Falta rematar no canil/viveiro os locais onde saem tubos de electricidade; </font><br>
<font>- Nas banheiras WC do andar e WC privativa a massa junto à parede está a estalar (colocar silicone); </font><br>
<font>- Na varanda à volta da casa a tijoleira está levantada e com juntas abertas originando infiltrações de água para debaixo da tijoleira; </font><br>
<font>- A massa está a estalar nas juntas das janelas, floreiras, rodapés e portas (colocar silicone); </font><br>
<font>- Escorre água no espelho da varanda em frente à cozinha do rés-do-chão (solucionar como sugeriu com bica em inox?) </font><br>
<font>- Em certas zonas do beiral do telhado tem pedaços mal rematados (emendas) </font><br>
<font>- Tapar os buracos dos suportes dos caleiros em toda a casa; </font><br>
<font>- Limpar pedaços de cimento que existem nas pingadeiras da pedra e beirais dos anexos; </font><br>
<font>- Existe cimento nos caleiros e nos rufos da casa; </font><br>
<font>- Telha à volta das chaminés deixar cerca de 7 cm livres em toda a volta para impedir que o lixo se junte; </font><br>
<font>- Fazer caixas de visita conforme se falou (para recolher águas das chuvas) que fica no paralelo em frente às portas da cozinha da cave, dado que o nível do paralelo e da relva é o mesmo; </font><br>
<font>- Abertura (corte na floreira a desfazer-se) </font><br>
<font>- Trabalho de estanhador nas escadas e garagem mal executado; </font><br>
<font>- Floreiras em cima no andar não foram cerzitadas devidamente. </font><br>
<font>8. E, por carta registada com aviso de recepção, enviada em 4 de Março de 2004, os autores insistiram com o réu pela eliminação dos defeitos anteriormente comunicados, bem como denunciaram ao réu a existência de mais defeitos entretanto surgidos, nomeadamente: </font><br>
<font>- Cimento junto aos rufos: rachou e partiu, entra humidade nos Anexos, espalhando-se pelas várias divisões junto ao muro do vizinho; </font><br>
<font>- Humidade no tecto do Anexo das máquinas por debaixo da escada; </font><br>
<font>- Humidade no tecto da adega da entrada, da porta até ao fundo; </font><br>
<font>- Pedra a descolar no exterior junto à janela da cozinha no rodapé (sujeita a partir); </font><br>
<font>- Na entrada principal o tecto de madeira continua com humidade. A madeira está a ficar com bolor; </font><br>
<font>- Na entrada exterior da casa (rua) os tubos de água das floreiras juntam muita água, o que dá origem a verdete e sujidade que escorre pelo passeio e torna-se escorregadio e perigoso para quem passa no passeio ou entra no portão; </font><br>
<font>- Os tubos no passeio exterior (rua) estão à vista, O cimento desapareceu; </font><br>
<font>- Alguns azulejos estão a descolar no WC dos Anexos; </font><br>
<font>- Nas paredes dos Anexos a humidade está a subir pelas paredes; existe uma faixa de 10 a 15 cms com uma mancha branca devido possivelmente às massas do alicerce não terem sido hidrofugadas conforme previsto no caderno de encargos da obra; </font><br>
<font>- As paredes das casas de banho dos Anexos que estão revestidas a azulejo quando chove ou está tempo húmido aparecem cheias de humidade que até escorre pelos azulejos, possivelmente devido a existir muita humidade dentro das paredes. </font><br>
<font>9. Além de comunicarem a existência dos defeitos, por essa mesma carta os autores concederam ao réu marido um prazo de 15 dias para que este procedesse à eliminação dos defeitos existentes e que caso não o fizesse, recorreriam às vias judiciais. </font><br>
<font>10. Na sequência do contrato de empreitada referido em 3., os autores solicitaram ao réu marido a realização de obras extra, ou seja não previstas no contrato, como sejam: construção de um muro de vedação, com mão-de-obra e materiais; uma caixa de PVC e caleiros para o canil, obras essas que o réu levou a cabo e que custaram a quantia de </font><br>
<font>11. O réu marido é empresário em nome individual e dedica-se de forma habitual e com escopo lucrativo à indústria de construção civil, actividade esta de cujos proventos beneficia e depende o seu agregado familiar, designadamente o seu cônjuge mulher que se sustenta, veste e calça com os rendimentos que o réu marido aufere da sua actividade de construção civil; </font><br>
<font>12. O preço pago pelos autores pela empreitada ingressou no património do casal, beneficiando-o e aumentando-o, e reverteu em proveito comum; </font><br>
<font>13. Quando o réu deu por concluída a obra, ficaram por realizar os seguintes trabalhos: fazer churrasqueira de pedreiro e trolha, designadamente a montagem da churrasqueira, colocação de uma chaminé em aço inox, perfurando a cobertura para esse efeito e colocação de armários e material cerâmico na parede à volta da churrasqueira, trabalhos esses cuja execução não estava incluída no acordo a que se alude em 3.</font><br>
<font>14. Após o réu marido ter dado a obra por concluída, os autores verificaram que os trabalhos por aquele realizados apresentavam deficiências, designadamente que o chão do lago não tem pendente suficiente para o tubo de escoamento da água; </font><br>
<font>15. Na varanda à volta da casa há algumas juntas por fechar.</font><br>
<font>16. A massa está a estalar nas juntas das janelas, floreiras, rodapés e portas, sendo necessário colocar silicone; </font><br>
<font>17. Escorre água no espelho da varanda em frente à cozinha do rés-do-chão. </font><br>
<font>18. Os chumbadores dos suportes metálicos não estão rematados na sua ligação à parede; </font><br>
<font>19. Falta limpar pedaços de cimento que foram deixados pelo réu nas pingadeiras da pedra e nas beiras dos anexos; </font><br>
<font>20. O afastamento da telha junto à chaminé é inferior a 7 cm; </font><br>
<font>21. Falta fazer caixas de visita conforme acordado para recolher águas das chuvas que se acumula no paralelo em frente às portas da cozinha da cave, dado que o nível do paralelo e da relva; </font><br>
<font>22. A junta existente na floreira está a desfazer-se, sendo necessário recompô-la; </font><br>
<font>23. Trabalho de estanhador nas escadas e garagem encontra-se mal executado; </font><br>
<font>24. Existem algumas telhas partidas; </font><br>
<font>25. Existem manchas de humidade nos tectos, desconhecendo-se, porém, a sua origem; </font><br>
<font>26. Existe humidade no anexo das máquinas, bem como na face interior da parede exterior contígua da casa; </font><br>
<font>27. Pedra a descolar no exterior junto à janela da cozinha no rodapé (sujeita a partir); </font><br>
<font>28. Na entrada principal o tecto de madeira continua com humidade e está a ficar com bolor, tecto esse que não foi colocado pelo réu; </font><br>
<font>29. Na entrada exterior da casa (rua) existem manchas de bolores no passeio; </font><br>
<font>30. Os tubos no passeio exterior (rua) estão à vista, sendo que o cimento desapareceu; </font><br>
<font>31. No WC dos anexos existem dois azulejos descolados e um partido; </font><br>
<font>32. Existem manchas de humidade nas paredes dos anexos junto ao solo; </font><br>
<font>33. Há pequenos remates a corrigir nas floreiras; </font><br>
<font>34. O tubo de queda de da cobertura do canil não se encontra rematado; </font><br>
<font>35. Os autores têm sofrido aborrecimentos e arrelias; </font><br>
<font>36. Aquando da recepção da obra por parte dos autores, uma vistoria geral à obra realizada </font><br>
<font>37. A junta existente na floreira foi realizada de acordo com o que o autor marido pretendeu e contra a vontade do réu; </font><br>
<font>38. Os trabalhos aludidos em 10 foram facturados pelo réu em 6.10.2003. </font><br>
</p><p><font>Foram colhidos os vistos.</font>
</p><p><font>Conhecendo, </font><br>
<font>1. Alteração da matéria de facto.</font><br>
<font>2. Ónus da prova.</font><br>
<font>3. Nexo de causalidade.</font><br>
<font>4. Conclusões.</font>
</p><p><br>
<b><font>1. Alteração da matéria de facto</font></b>
</p><p><font>Em primeira linha, os recorrentes insurgem-se contra a alteração da matéria de facto pela Relação, quanto às respostas aos quesitos 41, 42, 43 e 44.</font>
</p><p><font>Sem razão, porém.</font>
</p><p><font>Cumpre às instâncias apurar a matéria de facto relevante para a solução do litígio, só a Relação podendo emitir um juízo de censura sobre o apurado pela 1.ª instância.</font>
</p><p><font>O Supremo Tribunal de Justiça, e salvo situações de excepção legalmente previstas, só conhece matéria de direito, sendo que, no âmbito do recurso de revista, o modo como a Relação fixou os factos materiais só é sindicável se foi aceite um facto sem produção do tipo de prova para tal legalmente imposto, ou se tiverem sido incumpridos os preceitos reguladores da força probatória certos meios de prova (artigo 722.º, n.º 2 do Código de Processo Civil) podendo, no limite, mandar ampliar a decisão sobre a matéria de facto (artigo 729.º, n.º 3).</font>
</p><p><font>À Relação cabe, assim, a última palavra, só a esta instância competindo censurar as respostas ao questionário ou anular a decisão proferida na 1.ª instância, através do exercício dos poderes conferidos pelos n.ºs 1 e 4 do artigo 712.º do diploma citado.</font>
</p><p><font>Em consequência, o tribunal de revista limita-se a aplicar os factos definitivamente fixados pelo tribunal recorrido, o regime jurídico adequado – cf. o artigo 26.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro e, entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março de 2005 – 05B2682, de 18 de Abril de 2006 – 06 A871, e de 18 de Maio de 2006 – 06 A1248.</font>
</p><p><font>A Relação fez uso da faculdade do n.º 1 do artigo 712.º do Código de Processo Civil, sendo a validade intrínseca do uso desse poder insindicável, como resulta do n.º 6 daquele preceito (na redacção do Decreto-Lei n.º 375-A/99, de 20 de Setembro).</font>
</p><p><font>O Supremo Tribunal nunca poderia, pois, sindicar a alteração em si mas apenas a legalidade da mesma, apurando se a Relação podia alterar as respostas sem subverter os princípios do direito probatório.</font>
</p><p><font>É que só essa averiguação, por se prender com a aplicação de normas jurídicas, é matéria de direito, tal como o é quando (e nos termos acima referidos) o STJ lança mão da faculdade do n.º 3 do artigo 729.º do Código de Processo Civil pois, então, apenas censura tacitamente o não uso pela Relação dos poderes de alteração da decisão de facto, ao entender que a mesma deve ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito ou que ocorrem contradições naquela decisão que inviabilizam o julgamento jurídico do pleito.</font>
</p><p><font>Mas tal não acontece “in casu” pelo que fica a valer a regra do n.º 2 do mesmo artigo 729.º, quedando intocada a factualidade provada, pois, e insiste-se, o eventual erro na apreciação das provas, isto é, a decisão da matéria de facto baseada nos meios de prova produzidos e de livre apreciação do julgador, não cabe no âmbito do recurso de revista.</font>
</p><p><font>Apenas e “ex abundantia” se dirá que a referência a uma eventual transacção “abortada” irreleva para afastar as conclusões ora alcançadas.</font>
</p><p><b><font>2- Ónus da prova</font></b>
</p><p><font>2.1 De seguida, os recorrentes defendem cumprir aos Autores a prova de que os defeitos encontrados na obra são imputáveis à actuação do Réu/marido.</font>
</p><p><font>Na sua contra alegação os recorridos insistem cumprir aos recorrentes a demonstração que os defeitos encontrados não eram da sua responsabilidade.</font>
</p><p><font>Conhecendo, </font>
</p><p><font>Estamos perante um contrato de empreitada nos precisos termos documentados a fls. 16 a 17/U, do qual faz parte integrante um caderno de encargos (“Anexo A”) resultando da cláusula terceira os trabalhos parcelares que o empreiteiro – ora recorrente – teria de efectuar (telhado; assentamento de pedra – granito; trabalhos de pedreiro; trabalhos de “trolha”; colocação de azulejos e tijoleiras; conclusão da obra).</font>
</p><p><font>Do elenco dos factos provados resulta terem sido verificadas as deficiências/defeitos dos n.ºs 14 a 24, sendo que o Acórdão recorrido condenou o Réu a proceder à respectiva reparação (à excepção do nº 22).</font>
</p><p><font>Certo é que, tratando-se de responsabilidade contratual, há presunção legal de culpa do contraente faltoso, nos termos do n.º 1 do artigo 799.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>Daí que o demandante, ao beneficiar dessa presunção ”juris tantum” não tenha que provar os factos conducentes à demonstração daquele nexo de imputação subjectiva, “ex vi” do n.º 1 do artigo 350.º do mesmo diploma, invertendo-se outrossim, o “ónus probandi” - n.º 1, 1.ª parte, do artigo 344.º (cf. Prof. Vaz Serra, “Provas”, BMJ, 112-128 e ss.).</font>
</p><p><font>Porém, tal não bastaria para concluir pela responsabilidade do empreiteiro.</font>
</p><p><font>É que, o demandante terá sempre de demonstrar os outros pressupostos daquele tipo de responsabilidade: violação contratual, dano (ou prejuízo) e nexo causal, assim e nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>Trata-se da aplicação do princípio “actor incumbit probatio; reus in exipiendo fit actor”.</font>
</p><p><font>O ónus da prova recai, assim, sobre ambos os litigantes, devendo o autor provar os factos constitutivos do direito que alega ter, sendo que o réu terá de provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que aquele invoca.</font>
</p><p><font>Não se trata de repartir o encargo da prova em atenção à qualidade do facto probando mas à posição na lide daquele que o invoca, sempre ressalvando (e no que ora releva) o citado disposto no n.º 1 do artigo 344.º da lei civil. (cf. Prof. Vaz Serra, “Provas”, BMJ 112-269/270).</font>
</p><p><font>2.2 Fora de dúvida que os Autores fizeram a prova do dano, e da violação contratual.</font>
</p><p><font>Restaria para completar o elenco dos pressupostos da responsabilidade contratual, a demonstração do nexo causal entre a culpa (como nexo de imputação subjectiva) e o dano obrigacional (contratual ou negocial), isto é, que o incumprimento do contratado constituiu causa do dano, o qual terá de se apresentar como resultado directo e actual daquele.</font>
</p><p><font>A Relação deu por assente essa causalidade e os termos em que o fez impedem a sua sindicabilidade por este Supremo Tribunal.</font>
</p><p><b><font>3- Nexo de causalidade</font></b>
</p><p><font>A causalidade é de apreciar em duas perspectivas.</font>
</p><p><font>A naturalística, ou seja, no averiguar se o processo sequencial foi, ou não, factor desencadeador, ou gerador do dano.</font>
</p><p><font>Trata-se de apurar uma mera relação de causa-efeito, ou seja, no percurso do “iter” causal-naturalistico verificar se a conduta do lesante foi desencadeadora do resultado lesivo.</font>
</p><p><font>Esta perspectiva naturalística insere-se num plano puramente factual (cf., v.g., os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Novembro de 1998, P.º 660/98-2.ª; de 11 de Junho de 2002 – P.º 1810/02, 2.ª; e, desta Conferência, os Acórdãos de 13 de Março de 2008 – 08 A369; e de 17 de Junho de 2008 – 08 A1700).</font>
</p><p><font>E a (causalidade) legal, resultando da pura aplicação dos princípios do artigo 563.º do Código Civil (cf. Prof. Pereira Coelho, “O nexo de causalidade na responsabilidade civil”, in “Revista de Direito e Estudos Sociais”, VI, 1, 2, 3, 113 e ss, e “A causalidade na responsabilidade civil em direito português”, cit., “R.D Estudos Sociais”, XII, 3, 39 e ss, e 4, 1 ss) que consagra a teoria da causalidade adequada afirmando “uma ligação positiva, em termos de juízo de probabilidade entre o facto jurídico e o dano.” (Prof. Pessoa Jorge, in “Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil”, 413 e nota 374 a citar o Prof. Vaz Serra – BMJ – 100-127, nota 269).</font>
</p><p><font>Ora o nexo de causalidade que a Relação deu por verificado implicou a formulação de um juízo naturalístico que, como acima se referiu, integra pura matéria de facto.</font>
</p><p><font>Por isso, o Supremo Tribunal de Justiça não o pode sindicar, de acordo com o conjugado nos artigos 29.º da LOFTJ e 729.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.</font>
</p><p><font>Restar-lhe-ia – por esta parte ser matéria de direito, já que respeita à interpretação e aplicação de norma jurídica – verificar da sua correcta inserção nos princípios do citado artigo 563.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>Isto é, só se a Relação considerou verificado o nexo factual é que cumpre ao Supremo Tribunal de Justiça apurar o nexo legal de adequação.</font>
</p><p><font>A propósito, disse-se no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Junho de 2006, deste Colectivo:</font><br>
<font>“Como já se insinuou, o artigo 563.° do Código Civil consagra o princípio da causalidade adequada na sua formulação negativa. </font><br>
<font>E este Supremo Tribunal vem entendendo que ‘o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo indiferente (gleichgultig) para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercedam no caso concreto.’ (cf. ainda os Acórdãos de 4 de Novembro de 2004 — P.° 2855/04-2.ª, de 13 de Janeiro de 2005 — P.° 4063/04-7°; Prof. A. Varela, in ‘Das Obrigações em Geral’, 10.ª ed, 1, 893, 899, 890/1 — ‘... do conceito de causalidade adequada pode extrair-se, desde logo, como corolário, que para que haja causa adequada, não é de modo nenhum necessário que o facto, só por si, sem a colaboração de outros, tenha produzido o dano. Essencial é que o facto seja condição do dano, mas nada obsta a que como frequentemente sucede, ele seja apenas uma das condições desse dano.’). </font><br>
<font>É a consagração do ensinado por Enneccerus-Lehman, que para o Dr. Ribeiro de Faria, conduz a que ‘a inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a produção dele, que, por isso mesmo, só ocorreu ‘pelas referidas circunstâncias excepcionais ou extraordinárias’. (apud ‘Direito das Obrigações’, 1, 502) e que o Prof. Almeida Costa diz dever interpretar-se no sentido de que ‘o facto que actua como condição só deixará de ser causa do dano desde que se mostre por sua natureza de todo inadequado e o haja produzido apenas em consequência de circunstâncias anómalas ou excepcionais sendo que a citada doutrina da causalidade adequada ‘não pressupõe a exclusividade da condição, no sentido de que esta tenha só por si determinado o dano.’ (in ‘Direito das Obrigações’, 632). </font><br>
<font>Parte-se, pois, de uma situação real, posterior ao facto, e até ao dano, e afirma-se que o segundo decorreria daquele perante um desenvolvimento normal, ou seja, o dever de indemnizar existe em relação aos danos que terão provavelmente resultado da lesão. </font><br>
<font>Ou como julgou este Supremo Tribunal ‘a inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a produção dele, que, por isso mesmo, só ocorreu por circunstâncias excepcionais ou extraordinárias’ (Acórdão de 20 de Outubro de 2005 — 05B2286). </font><br>
<font>O facto terá de ser, em concreto, ‘conditio sine qua non’ do dano mas também ser, em abstracto, causa normal, ou adequada da sua verificação. </font><br>
<font>E o que a doutrina que o direito Norte-Americano chama de “substantial factor formula.” </font><br>
<font>Também aí, dano só não se considera causado pelo facto se este apenas o produziu por circunstâncias anómalas e imprevisíveis. </font><br>
<font>Mas é-o ainda que causado indirecta, ou mediatamente, pelo facto. </font><br>
<font>Este entendimento resulta da conjugação dos artigos 562.° (‘...a situação que existiria...’) e 563.° (‘...danos que o lesado provavelmente não teria sofrido...’) do Código Civil. (cf Prof. Pessoa Jorge, ‘Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil’, 410-nota 373; Prof. Galvão Telles, ‘Direito das Obrigações’, 409 ss).” </font>
</p><p><font>“In casu”, tendo, e como se disse, a Relação considerado provado o nexo naturalístico e não podendo o Supremo Tribunal de Justiça sindicar essa verificação, restaria apurar a não verificação do nexo legal por não enquadramento nos princípios do artigo 563.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>Ora, não resulta que o apuramento daquele primeiro nexo tenha sido feito à revelia (ou contrariando) o imperativo legal.</font>
</p><p><font>Daí que se não censure o juízo de facto alcançado pelo Tribunal recorrido.</font>
</p><p><font>Improcedem, assim, as conclusões dos recorrentes valendo quanto ao, eventualmente, omisso – e quanto ao pedido reconvencional – as razões constantes do Acórdão em crise que, aqui, se acolhem.</font>
</p><p><b><font>4- Conclusões</font></b>
</p><p><font>Pode concluir-se que:</font>
</p><p><font>a) São as instâncias que procedem ao apuramento da matéria de facto relevante para a solução do litígio, só a Relação podendo emitir um juízo de censura sobre o apurado na 1.ª instância. </font>
</p><p><font>b) O Supremo Tribunal de Justiça, e salvo situações de excepção legalmente previstas, só conhece matéria de direito, sendo que, no âmbito do recurso de revista, o modo como a Relação fixou os factos materiais só é sindicável se foi aceite um facto sem produção do tipo de prova para tal legalmente imposto ou tiverem sido incumpridos os preceitos reguladores da força probatória de certos meios de prova. </font>
</p><p><font>c) De acordo com as regras do artigo 342.º do Código Civil o ónus da prova recai sobre ambos os litigantes, devendo o autor provar os factos constitutivos do direito que alega, sendo que o réu terá de provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que aquele invoca.</font>
</p><p><font>d) Mas beneficiando o autor de uma presunção legal, não tem que provar os factos que a ela conduzem, invertendo-se quanto a esses factos, se constitutivos do direito do demandante, o encargo da não prova para a contraparte “ex vi” do n.º 1 do artigo 344.º do Código Civil.</font>
</p><p><font>e) Na responsabilidade contratual há uma presunção legal “tantum juris” da culpa do contraente faltoso, mas é sobre o contraente cumpridor que recai o ónus da prova dos restantes pressupostos: violação contratual, dano e nexo causal.</font>
</p><p><font>f) O juízo de causalidade numa perspectiva meramente naturalística de apuramento da relação causa-efeito, insere-se no plano puramente factual insindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e com as ressalvas dos artigos 729.°, n.° 1 e 722.º , n.°2 do Código de Processo Civil. </font>
</p><p><font>g) Assente esse nexo naturalístico, pode o Supremo Tribunal de Justiça verificar da existência de nexo de causalidade, o que se prende com a interpretação e aplicação do artigo 563.° do Código Civil. </font>
</p><p><font>h) O artigo 563.º do Código Civil consagrou a doutrina da causalidade adequada, na formulaçã | [0 0 0 ... 0 1 0] |
5zKyu4YBgYBz1XKvgTHs | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<b><font> Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:</font></b><br>
<br>
<br>
<font> </font><b><font>I.</font></b><br>
<b><font> </font></b><font>AA intentou, no Tribunal Cível da Comarca de Vila do Conde, acção ordinária contra BB, com vista a obter a sua condenação na restituição da quantia de 57.387,80 € e juros, desde a citação, ou, subsidiariamente, a restituir a metade indivisa da fracção descrita no artigo 11º da petição.</font><br>
<font> Fundamentalmente, alegou que foi ele quem pagou integralmente o preço da dita fracção e de alguns melhoramentos nela introduzidos, fazendo-o com a intenção de não prejudicar a relação que o seu filho tinha com a R., com que, mais tarde, viria a casar. A dita fracção acabou por ser registada em nome do casal, certo que este, pouco tempo após o casamento, se separou, correndo em juízo acção de divórcio litigioso com vista à sua dissolução.</font><br>
<font> A R. contestou, pugnando pela total improcedência da acção já que, no seu entendimento, o que houve foi, da parte do A., uma pura liberalidade não só a seu favor como também no interesse do filho do A., seu ainda marido.</font><br>
<font> Após a apresentação dos demais articulados, a acção foi julgada improcedente, no saneador.</font><br>
<font> Em vão, apelou o A. para o Tribunal da Relação do Porto.</font><br>
<font> Continuando inconformado, pede, ora, revista, a coberto das seguintes conclusões com que fechou a sua minuta:</font><br>
<font>1 - Carece entendimento da Relação de que a presente acção não deva prosseguir para julgamento, simplesmente porque os factos que, logo na fase do saneamento, se puderam ter como assentes, justificam a conclusão a que se chegou na decisão recorrida de 1ª instância, como refere o acórdão em crise, no seu parágrafo final. </font><br>
<font>Como se essa fosse a única solução possível... </font><br>
<font>2 - A decisão recorrida viola o disposto no artigo 510º, nº 2 do Código de Processo Civil, nos termos do qual o juiz apenas pode proferir despacho a conhecer imediatamente o mérito da causa, sempre que o estado do processo o permitir, sem necessidade de mais provas. </font><br>
<font>3 - Tal só seria admissível se toda a matéria de facto estivesse provada (o que não é o caso), se todos os factos controvertidos carecessem de prova documental (o que também não é o caso), ou, finalmente, se a matéria controvertida fosse indiferente para qualquer das soluções jurídicas plausíveis. </font><br>
<font>4 - Como se demonstrou supra nas nossas alegações, a matéria de facto alegada pelo A. que permanece por provar não é indiferente, de todo, para qualquer das plausíveis e possíveis soluções de direito do presente pleito. </font><br>
<font>5 - Ainda que a Relação só tenha admitido como possível uma única hipótese, dispensando até mais prova, o certo é que muitas soluções jurídicas seriam aplicáveis à situação </font><i><font>sub judice, </font></i><font>dependendo da prova que viesse a ser feita da matéria controvertida. </font><br>
<font>6 - Acresce que a solução jurídica encontrada choca com o sentimento comum de justiça, chocando até com a solução que vem sendo dada pelos nossos tribunais, em situações em tudo idênticas, mas no âmbito do casamento (comunhão de adquiridos), em que, feita a prova de que o preço do imóvel foi pago por um progenitor e que este apenas quis doar o dinheiro ao filho, então o bem é considerado bem próprio do filho. </font><br>
<font>7 - Como decorre da simples leitura dos articulados existe matéria controvertida com interesse para a decisão da causa, susceptível de a influenciar num ou noutro sentido. </font><br>
<font>8 - O acórdão recorrido diz que o A. é que tinha o ónus de alegação e prova de que a razão que invoca como causa de transferência patrimonial operada não abrangeu a R., mas não lhe reconhece o direito a provar o que, para tanto, alegou. </font><br>
<font>9 - Está em causa, bem vistas as coisas, o próprio direito de acção do A., constitucionalmente garantido, donde a interpretação feita do artigo 510°, nº 2, do Código de Processo Civil, que permite conhecer do mérito da causa, mesmo quando ainda existe matéria controvertida relevante para diversas soluções de direito, é inconstitucional, por violação material do artigo 20° da Constituição da República Portuguesa, o que se invoca expressamente. </font><br>
<font>10 - O aresto em crise viola, ainda, o regime do enriquecimento sem causa, ao não considerar, sequer, a hipótese de que a matéria alegada e ainda controvertida poderia ser subsumível ao artigo 473º do Código Civil, na medida em que este regime tem na sua génese a ideia de que pessoa alguma deve locupletar-se injustificadamente à custa alheia. </font><br>
<font>11- Já está provado, por confissão, o enriquecimento e que esse enriquecimento da R. ocorreu à custa de outrem, o ora recorrente. </font><br>
<font>12 - Pretende o A. provar – se lhe for dada oportunidade – que não existe causa ou motivo que justifique o pagamento da quota-parte da R. no apartamento. </font><br>
<font>13 - Conforme foi alegado pelo A. na sua p.i. – e que só não provou porque tanto não lhe permitiram – foi sua intenção, </font><i><font>ab initio, </font></i><font>comprar aquele apartamento e colocá-lo em nome do filho que, à data, era solteiro. Fez o mesmo para outros filhos. </font><br>
<font>14 - Conforme alegou na petição, o A. não quis colocar entraves ao bom relacionamento do filho com a, então, namorada, sendo certo, porém, que nunca foi sua intenção dar o que quer que fosse à R., nem entre ele e a R. existia, sequer, uma grande relação de amizade e de proximidade, como a R. alega na sua contestação. </font><br>
<font>15 - Conforme alegou na petição, o A. tinha negociado aquele apartamento nos inícios de 2002 para o filho. Nas negociações que teve com o construtor exteriorizou, desde logo, essa sua vontade (por isso o contrato-promessa respectivo foi outorgado pelo seu filho, em Fevereiro de 2002, conforme documento que o A. pretendia juntar aos autos, oportunamente). </font><br>
<font>16 - Tudo isso releva para a determinação da real intenção do A., e infirma a conclusão extraída pelas instâncias de que a sua intenção foi de doar ao filho e à namorada do filho, ora R.. </font><br>
<font>17 - Toda essa factualidade, que o A. alegou na petição e que pretendia demonstrar – se lhe fosse permitida a prova – constituiria o </font><i><font>«comportamento correspondente à vontade» </font></i><font>referido no acórdão recorrido (p.18), como indispensável de existir para ser juridicamente relevante, e que o acórdão não vislumbrou na matéria assente (claro, estava na matéria impugnada). </font><br>
<font>18 - Fazendo apelo a critérios de normalidade e razoabilidade, a conclusão a que chegaram as instâncias, sem terem apreciado a totalidade da matéria controvertida, é desajustada ao critério do </font><i><font>bonus pater familias</font></i><font>. </font><br>
<font>19 - Sempre cumpriria indagar, em sede de prova, se realmente existia entre ele a R. algum relacionamento, nomeadamente de amizade, que justificasse essa liberalidade. </font><br>
<font>20 - Tal como bem refere o acórdão recorrido, citando jurisprudência pacífica dos nossos Tribunais Superiores, é na análise do que foi esse relacionamento directo ou imediato entre as partes que se poderá encontrar a existência ou ausência de uma causa justificativa de enriquecimento, já que, abstracta ou remotamente toda a deslocação patrimonial tem uma causa ou razão de ser.</font><br>
<font>21 - Se ao A. fosse dado poder fazer a prova da factualidade alegada, seria forçoso concluir que houve um enriquecimento da R. à custa do património do A. injusto, ilegítimo, e, como tal, ajurídico. </font><br>
<font>22 - Na prova do que alegou, a pretensão do A. deveria ser merecedora da tutela do direito, devendo a R. ser condenada a lhe restituir tudo aquilo com que injustamente se locupletou, à sua custa, nos termos do citado normativo. </font><br>
<font>23 - A obrigação de restituir fundada em locupletamento injusto permite corrigir, precisamente situações como esta, que ofendem os princípios fundamentais da justiça comutativa. </font><br>
<font>24 - Se ao A. fosse dado poder fazer a prova da factualidade alegada, a R. não ficar, com certeza liberta da obrigação de restituir ao A. aquilo com que injustificadamente se enriqueceu, sob pena de violação dos mais elementares princípios de Direito. </font><br>
<font>25 - Em face do exposto conclui-se ser evidente que existe matéria controvertida que pode não ser indiferente para a solução jurídica do pleito. </font><br>
<font>26 - Reconduzir toda a questão, de forma simplista e fazendo tábua rasa da matéria alegada pelo A. (melhor ou pior) à questão da doação, e concluir – contrariamente ao que o A. alegou na petição – que teve intenção de fazer uma liberalidade à R., uma estranha – choca a consciência jurídica geral. </font><br>
<font>27 - Não pode o acórdão em crise ser mantido. </font><br>
<font>A recorrida contra-alegou em defesa da manutenção do aresto impugnado. </font><br>
<font> </font><b><font>II.</font></b><br>
<font>As instâncias deram como provados os seguintes factos:</font><br>
<font>1. O A. é pai de CC. </font><br>
<font>2. O A. entregou à empresa DD, em 08/02/02, o montante de 49.880,00 €, a título de sinal e princípio de pagamento para aquisição da fracção designada pela letra “P”, descrita na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde, sob o número 000000000.</font><br>
<font>3. O A. dedica-se à actividade de carpintaria.</font><br>
<font>4. O A. executou na dita fracção obras de carpintaria, nomeadamente na cozinha, soalho flutuante dos 3 quartos e hall, corredor, os rodapés, as portadas e todos os armários e portas.</font><br>
<font>5. Uma vez pronta a fracção, foi marcada a escritura de compra e venda, para o dia 30/12/04, do apartamento que então se identificava como a fracção autónoma designada pela letra “P”, correspondente ao 1º andar direito, entrada C, destinado a habitação, com garagem individual (P1) na cave, do prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde, sob o nº 00000, da freguesia de Touguinha, inscrita na matriz urbana no artigo 748º P, sito na ........, bloco...., entrada........., em Touguinha, Vila do Conde.</font><br>
<font>6. Na sobredita escritura figuram como vendedores a sociedade comercial por quotas “DD, Limitada” e como compradores a R. e o filho do A..</font><br>
<font>7. Por via disso, o referido apartamento encontra-se inscrito, na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde, a favor da R. e do marido CC, em compropriedade, na proporção de metade a cada um, através da inscrição G.., encontrando-se, ainda, o artigo matricial respectivo – 748º P – averbado, nas Finanças, a favor de ambos.</font><br>
<font>8. A R. nunca pagou qualquer importância com referência à aquisição do dito apartamento.</font><br>
<font>9. Na data da escritura, em 30/12/04, o A. compareceu no Cartório e, por cheque visado do Atlântico – BCP, pagou o remanescente preço, de 47.624,00 € à firma vendedora.</font><br>
<font>10. O A. pagou o apartamento à construtora/vendedora, o que perfez o valor total de 97.275,59 €.</font><br>
<font>11. A R. e o filho do A. casaram em 17/06/06 e foram viver para o apartamento.</font><br>
<font>12. Passados 3 meses a R. e o filho do A. separaram-se: a R. foi viver para casa dos pais e nunca visitou ou conviveu com o marido e com o A., o filho do A. foi viver para casa dos pais.</font><br>
<font>13. Em 26/02/07, a R. intentou, contra o filho do A., uma acção de divórcio.</font><br>
<font>14. A acção de divórcio encontra-se pendente sob o nº 735/07.7 TBVCD a correr termos no 1º Juízo Cível deste Tribunal. </font><br>
<br>
<font> </font><b><font>III</font></b><font> – </font><br>
<font> </font><i><font>Quid iuris?</font></i><br>
<font> Da leitura das conclusões apresentadas pelo recorrente ressalta a ideia que o mesmo colocou à nossa consideração, para decisão, as seguintes questões:</font><br>
<font>1ª – A decisão recorrida viola o preceituado no artigo 510º, nº 2, do Código de Processo Civil?</font><br>
<font>2ª – A interpretação feita do artigo 510º, nº 2, supra citado, que permite conhecer do mérito da causa, mesmo quando ainda exista matéria controvertida relevante para diversas soluções de direito, é inconstitucional, por violação material do artigo 20º da Constituição?</font><br>
<font>3ª – A matéria de facto dada como provada permite concluir que houve enriquecimento sem causa por parte da R.-recorrida?</font><br>
<font> Analisemos, pois, cada uma destas questões, separadamente.</font><br>
<font> 1ª – Questão: da alegada violação do artigo 510º, nº 2, do Código de Processo Civil.</font><br>
<font> Este preceito legal regula o modo como o saneador deve ser exarado: se houver audiência preliminar, é logo ditado para a acta; porém, atenta a complexidade das questões a resolver, permite que o juiz o reduza a escrito, no prazo de 20 dias.</font><br>
<font> Não tendo o recorrente suscitado esta questão da feitura do saneador em sede de recurso de apelação, a mesma surge aqui como nova e, como tal, não merecedora de apreciação, atento o disposto no artigo 676, nº 1, do Código de Processo Civil.</font><br>
<font> Acontece, porém, que lendo o corpo de alegação, conjugando o mesmo com o que foi apresentado em sede de apelação e, sobretudo com o que acabou por pedir (prosseguimento dos autos para julgamento), nos leva à conclusão de que, certamente por lapso, se referiu a tal normativo, quando, na verdade, o seu objectivo era referir-se ao nº 1, alínea b) do citado artigo 510º (faz-se notar, no entanto, que o recorrente insistiu no erro na abordagem que fez à 2ª questão enunciada).</font><br>
<font> De modo algum, menos por razões puramente formais, pretendemos deixar de dar resposta ao recorrente, partindo da ideia de que o mesmo cometeu um erro de escrita.</font><br>
<font> O juiz da 1ª instância decidiu, em sede de saneador, a improcedência da acção.</font><br>
<font> A pergunta que se coloca é, pois, a seguinte: tinha ele os dados todos (de facto), ao seu alcance, para proferir, desde logo, a decisão </font><i><font>de meritis</font></i><font>?</font><br>
<font> É aqui que entra em discussão a aplicação do artigo 510º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Civil. Com efeito, ele obriga o juiz a, findos os articulados, proferir decisão de mérito, sempre que o estado do processo o permita, ou seja, quando não seja necessária a produção de mais provas.</font><br>
<font> Descendo ao caso concreto, com vista a tomar posição na querela suscitada, teremos, para tanto, de nos colocarmos na posição do juiz da 1ª instância e, averiguar se, na verdade, nada mais havia a fazer, em matéria de produção de prova, após a fase dos articulados, ou se, pelo contrário, havia elementos fácticos a merecer instrução, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito.</font><br>
<font> Ora bem.</font><br>
<font> Na perspectiva desenhada, interessa-nos saber se a R./recorrida enriqueceu, efectivamente, de forma injustificada, à custa do património do A./recorrente.</font><br>
<font> As instâncias disseram que não e justificaram a sua posição, dizendo que, no caso em análise, houve uma causa a determinar a deslocação de património do A. para a R., qual seja a de uma liberalidade traduzida no pagamento da casa e nos melhoramentos nela introduzidos, casa essa que, em termos de escritura e respectivo registo de aquisição, ficou a pertencer não só à R. como ao seu filho, em compropriedade.</font><br>
<font> Analisando com todo o pormenor os dados do problema, a Relação do Porto não teve qualquer tipo de dúvida sobre a bondade da decisão impugnada, acabando por dizer que “é inequívoco que o comportamento do autor, consubstanciado nos factos dados como assentes, e que decorrem do alegado pelo autor e aceite pela ré, ao assumir a obrigação do pagamento do preço do apartamento, bem como as despesas inerentes aos serviços de carpintaria efectuados no mesmo, revela a intenção de fazer uma liberalidade, à custa do seu próprio património, no valor correspondente às quantias despendidas. Em bom rigor a liberalidade só ocorre quando o A., tendo efectuado todos os pagamentos referidos, concorda que figurem como compradores do referido apartamento, o seu filho e a ré, ora recorrida, facto que revela igualmente a aceitação da doação. Até lá o que os factos alegados pelo autor revelam é que este foi efectuando pagamentos relativos a um compromisso que ele próprio assumiu, inexistindo qualquer disposição do seu património a favor de outrem que não a entidade vendedora do apartamento”.</font><br>
<font> Ponderando a boa argumentação exposta, não vislumbramos razão alguma para dela dissentir.</font><br>
<font> Sejamos claros. A única questão que o A., aqui recorrente, trouxe a juízo foi simplesmente esta: saber se houve enriquecimento injustificado por parte da R.?</font><br>
<font> É perante ela que temos de analisar se, na verdade, todos os dados estavam já lançados.</font><br>
<font> E, nesta perspectiva, não podemos deixar de manifestar a nossa concordância com a posição das instâncias.</font><br>
<font> Diremos, aliás, mais: lendo a petição, com olhos de ler, entendemos que a mesma, justifica, por si só, a improcedência da acção, o que, levaria, outrora, ao seu indeferimento liminar, por ser evidente que a pretensão do A. não podia proceder (artigo 474º, nº 1, alínea c), parte final, do Código de Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).</font><br>
<font> Em boa verdade, é o próprio A. que vem dizer que pagou a totalidade da casa e, ainda, as despesas com melhoramentos, que foi adquirida por seu filho e a ainda hoje sua nora.</font><br>
<font> Não tendo o A. invocado, como não invocou, qualquer vício de vontade na concretização de tais liberalidades, nem, por outro lado, alegado e demonstrado que a respectiva escritura foi realizada </font><i><font>sub conditio</font></i><font>, irrelevam todos os demais factos alegados pelo A., sejam eles relativos ao que se passou com a vendedora ao nível das negociações, seja através da feitura do próprio contrato-promessa, seja, ainda, da invocada falta de amizade pessoal entre ele e a R..</font><br>
<font> O que, em boa verdade, transparece é simplesmente o seguinte: por pressão do seu filho, o A. acabou por, encapotadamente, opacamente, doar ao casal constituinte e, posteriormente, constituído, o montante correspondente ao preço da fracção e dos melhoramentos nela introduzidos.</font><br>
<font> A tudo isto, acresce o facto de, como provado, a fracção estar inscrita no registo predial a favor da R. e do filho do A..</font><br>
<font> Presume-se, pois, por força do estatuído no artigo 7º do Código de registo Predial, que a dita fracção pertence, irmãmente, aos dois.</font><br>
<font> Não invocando o A., aqui recorrente, como não invocou, qualquer facto a ilidir aquela presunção, como justificar o enriquecimento sem causa?</font><br>
<font> Não nos alongaremos aqui sobre este preciso ponto, na medida em que teremos oportunidade de o desenvolver mais adiante, na vertente a que poderemos chamar substantiva.</font><br>
<font> Não deixaremos, no entanto, de deixar uma nota de estranheza em relação à mutação/alteração de visão do A. no que tange à possibilidade de o juiz da 1ª instância conhecer do mérito, logo no saneador: por um lado, no artigo 4º da réplica, defendeu, </font><i><font>expressis verbis</font></i><font>, a possibilidade de a questão ser decidida na fase referida; por outro, já em sede de recurso de apelação, não deixou de apregoar a precipitação do juiz por ter proferido a decisão que proferiu, dado que “os autos não forneciam </font><u><font>ainda</font></u><font> os elementos necessários a uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções possíveis e plausíveis. Havia – acrescentou, ainda – necessidade ainda da produção de prova para todas as possíveis soluções de direito, pelo que a sentença recorrida, precipitada e infundada, violou o citado normativo”.</font><br>
<font> Discurso este que tomou nova roupagem, com a convocação de argumentos de natureza constitucional (em relação aos quais teceremos, já, as considerações tidas por pertinentes) ou com citações enviesadas de obras jurídicas (caso do “Temas da Reforma do Processo Civil”, de um ilustre Juiz, ainda Desembargador e não Conselheiro, não menos ilustre por isso), como a fraseologia desgarrada e sem sentido algum, citando o Doutor Castanheira Neves, felizmente ainda vivo e, por isso mesmo, não saudoso, e bem pensante, como sempre foi). </font><br>
<font>Observadores atentos, como não poderemos deixar de ser, esta mudança de posição em relação ao momento do conhecimento do mérito da causa, leva-nos, naturalmente, a olhar, perplexos, para a argumentação do recorrente.</font><br>
<font> Como é possível mudar de posição, sem beliscar a regra de ouro do processo (e, no fundo, da vida), a boa fé?...</font><br>
<font> Daí que estranhemos a posição vertida pelo A. em sede de recurso: afinal, onde é que tem razão, na réplica ou aqui?</font><br>
<font> O que o recorrente poderia, com legitimidade, suscitar era, não a questão do </font><i><font>timing</font></i><font> da decisão, mas do seu acerto.</font><br>
<font> Este ponto constitui, porém, o verdadeiro cerne do recurso: a ele dedicaremos as notas atinentes, na parte final.</font><br>
<br>
<font>2ª Questão: da interpretação do artigo 510º, nº 2, do Código de Processo Civil e sua eventual inconstitucionalidade quando feita de molde a permitir o conhecimento do mérito havendo matéria controvertida.</font><br>
<br>
<font> Antes de mais, valem aqui, </font><i><font>mutatis mutandis</font></i><font>, o que se disse a respeito do lapso de escrita supra relatado: em causa, mais uma vez, está o preceituado na alínea b) do nº 1 do citado artigo.</font><br>
<font> É esta uma falsa questão.</font><br>
<font> Há que concatenar o que ali está estipulado com outros normativos. Desde logo, com o que estatui o artigo 474º, nº 1, alínea d) do mesmo Código, que impõe ao A. o ónus de alegar os factos que fundamentam a sua pretensão.</font><br>
<font> Os factos: não todos e quaisquer, mas apenas os que sejam integradores da </font><i><font>causa petendi</font></i><font>.</font><br>
<font> Mas não só: também com o determinado pelo nº 1 do artigo 511º, na medida em que determina o modo como o juiz deve elaborar a base instrutória: seleccionando os factos, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.</font><br>
<font> Postos perante esta realidade normativa, temos de assentar na seguinte ideia: o juiz </font><u><font>só</font></u><font> pode conhecer de mérito quando, em face das posições das partes, lançadas nos respectivos articulados, a </font><i><font>quaestio iuris</font></i><font> apenas tem uma única solução.</font><br>
<font> Se, perante os factos alegados houver a possibilidade de proceder à sua selecção e, em face desta, for possível congeminar outras soluções, do ponto de vista da </font><i><font>quaestio iuris</font></i><font>, não é permitido ao juiz sentenciar a causa.</font><br>
<font> Donde, convocar argumentos de natureza constitucional em favor de práticas absolutamente ilegais, se nos antolhe perfeitamente deslocado.</font><br>
<font> É que a lei não permite, como parece ser esse o entendimento vertido na 9ª conclusão, que se conheça do mérito da causa, havendo matéria (leia-se, relevante, nos termos assinalados) controvertida.</font><br>
<font> Está bom ver que nem todos os factos alegados importam à </font><i><font>solutio</font></i><font> da causa: de outra sorte, a fazer fé no defendido pelo recorrente, sempre teria o juiz de elaborar a base instrutória, atenta a possibilidade de factos controvertidos, mas irrelevantes. Pura perda de tempo!</font><br>
<font> Cai, assim, por terra qualquer veleidade argumentativa do ponto de vista de violação de norma constitucional, em apoio da pretensão do recorrente.</font><br>
<font> 3ª Questão: Da verificação do apregoado enriquecimento sem causa da R./recorrida.</font><br>
<font> As instâncias esforçaram-se, e bem, por demonstrar que a deslocação patrimonial que ocorreu, do A. para a R., teve uma causa: a liberalidade.</font><br>
<font> A base da controvérsia está, como é evidente, na interpretação a dar ao artigo 473º do Código Civil.</font><br>
<font> O nº 1 deste preceito legal textua que “aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem, é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou”.</font><br>
<font> Comentando-o, dizem Pires de Lima e Antunes Varela que “a obrigação de restituir pressupõe, …, que o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa”, certo que “o conceito de causa do enriquecimento é muito controvertido e o artigo 473º, intencionalmente, não o define, limitando-se cautelosamente a facultar ao intérprete algumas indicações capazes de, como meros subsídios, auxiliarem a sua formulação”.</font><br>
<font> E, acrescentam, ainda, que “é essa a finalidade do nº 2 do preceito, quando afirma que «a obrigação de restituir tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou»” (Código Civil Anotado, Volume I, 4ª edição, páginas 454 e 455).</font><br>
<font> De igual modo, Mário Júlio de Almeida Costa, referindo-se a este ponto deveras complicado da “falta de causa”, destaca que o artigo 473º do Código Civil “enuncia um simples princípio geral que, pela amplitude e elasticidade dos seus termos, permite à jurisprudência contemplar adequadamente, sob o instituto do enriquecimento injustificado, muitos casos práticos que o legislador não podia prever de modo expresso”.</font><br>
<font> Antes, ponderando a delimitação do causa aqui relevante, não deixa de explicitar que para que se possa, fundadamente, falar em enriquecimento ilegítimo é necessário que haja uma ausência de causa jurídica justificativa da deslocação patrimonial (“ou porque nunca a houve ou porque desapareceu”), sendo determinante, para o efeito, “distinguir, entre as vantagens patrimoniais que uma pessoa pode obter na vida de relação, aquelas que –, … – determinam, todavia, uma obrigação de restituição, visto não se encontrarem dotadas de justificação suficiente em face do direito”, vale por dizer que “reputa-se que o enriquecimento carece de causa, quando o direito o não aprova ou consente, porque não existe uma relação ou um facto que, de acordo com os princípios do sistema jurídico, justifique a deslocação patrimonial; sempre que aproveite, em suma, a pessoa diversa daquela a quem, segundo a lei, deveria beneficiar”, certo que “ele não é apenas ajurídico, no sentido de substancialmente ilegítimo ou injusto, e não formalmente antijurídico” (Direito das Obrigações, 9ª edição, página 457).</font><br>
<font> Para L. P. Moitinho de Almeida, “a inexistência de causa é a condição mais propriamente caracterizadora da acção de locupletamento, uma vez que pressupõe ter havido um enriquecimento injusto do réu, enriquecimento esse que, se não fosse injusto, não seria sem causa (</font><i><font>enrichissement sans cause</font></i><font>!)”.</font><br>
<font> E, citando Josserand (Cours, II n. 572), Cunha Gonçalves (Tratado, IV, p. 473), Carvalho Santos (Repertório, II, pp.30 e ss., n 8), e Jaime Gouveia (Responsabilidade Civil, pp.252 e 253), dá-nos conta do sentido a dar à palavra “causa” – “deve ter a significação de motivo jurídico, justo título ou título justificativo: contrato, sucessão, doação, prescrição, lei, sentença, etc.” (Enriquecimento Sem Causa, 2ª edição, Jurisprudência Actualizada, páginas 66 a 70).</font><br>
<font>António Menezes Cordeiro repete esta mesma: “a ausência de causa traduz-se, aqui, pela inexistência de uma norma permissiva ou de obrigação, que, incidindo sobre a deslocação, a torne elemento estatuído e não previsivo da obrigação de restituir” (Direito das Obrigações, 2º Volume, página 46).</font><br>
<font> No mesmo sentido, Jacinto Fernandes Rodrigues Bastos entende que o enriquecimento se verifica com causa justificativa “quando ele é o resultado de um acto jurídico válido, ou da aplicação de uma regra legal” (Das Obrigações em Geral – Segundo o Código Civil de 1966 – II, página 14).</font><br>
<font> Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, por seu lado, depois de nos dar conta do por nós sentido, “que a ausência de causa justificativa é seguramente o conceito mais indeterminado no âmbito do enriquecimento sem causa”, acaba por mencionar que “o conceito de ausência de causa justificava não pode ser entendido de forma idêntica no âmbito do enriquecimento por prestação e nas outras categorias de enriquecimento sem causa”.</font><br>
<font> E, pertinentemente, observa, ainda, que no enriquecimento por prestação está em causa um incremento consciente e finalisticamente orientado do património alheio, sendo a não realização do fim visado com o incremento que determina a restituição (a não realização desse fim é tipificada no artigo 473º, nº 2, por referência a uma relação obrigacional, cuja execução se visou, mas que por qualquer razão não existe subjacente a essa prestação, podendo essa inexistência respeitar ao próprio momento da realização da prestação – </font><i><font>condictio indebiti</font></i><font> –, ou vir a obrigação a desaparecer posteriormente – condictio </font><i><font>ob causam finitam</font></i><font> – ou não se verificar futuramente – </font><i><font>condictio ob rem</font></i><font>).</font><br>
<font> Já nas outras categorias de enriquecimento sem causa não é possível configurar a ausência de causa justificativa a partir da frustração do fim da prestação, por referência a uma relação obrigacional inexistente, desaparecida ou posteriormente não constituída, tendo, em consequência, que ser utilizados critérios para a sua determinação. Assim, terá de acontecer no enriquecimento por intervenção e no enriquecimento por despesas efectuadas.</font><br>
<font> Por fim, o mesmo consagrado A. considera que “no enriquecimento por desconsideração de património a ausência de causa justificativa é um elemento que acresce meramente aos outros pressupostos desta categoria, adquirindo um sentido técnico muito específico, uma vez que se reconduz à verificação de uma </font><i><font>causa minor</font></i><font> da aquisição em relação a terceiro, como o são o negócio gratuito e o negócio paulianamente impugnado” (Direito das Obrigações, volume I, 4ª edição, páginas 431 a 433).</font><br>
<font> Propositadamente, fizemos todo este excurso doutrinal.</font><br>
<font> Resulta do artigo 473º, nº 1, do Código Civil que a obrigação de restituir, fundada do locupletamento alheio, pressupõe a verificação de três requisitos: que haja um enriquecimento de alguém, que o enriquecimento careça de causa justificativa e que ele tenha sido obtido à custa de quem requer a restituição.</font><br>
<font> É inquestionável que o A./recorrente dispôs do seu dinheiro para a aquisição da fracção e para pagamento dos melhoramentos nela introduzidos e que, como consequência directa e necessária disso mesmo, a R./recorrida viu o seu património aumentar; na verdade, ela é, neste momento, comproprietária de metade da dita fracção, por obra e graça daqueles pagamentos efectuados pelo que é, ainda hoje, seu sogro.</font><br>
<font> Mas o âmago do “nosso” problema está precisamente em saber se a deslocação de património do A. para a R. teve uma causa justificativa ou não.</font><br>
<font> A causa (ou falta de causa) é razão do problema.</font><br>
<font> Compreende-se, agora, o apoio doutrinal que procuramos em relação a este ponto concreto, difícil e complexo, da causa justificativa do enriquecimento.</font><br>
<font> E, explicitando a nossa ideia, não podemos deixar de claramente dar a nota de concordância ao julgado nas instâncias.</font><br>
<font> É que, como salienta Antunes Varela, “a falta de causa de atribuição patrimonial terá de ser não só alegada como provada, de harmonia com o princípio geral estabelecido no artigo 342º, por quem pede a restituição do indevido”, não bastando “para esse efeito, segundo as regras gerais do </font><i><font>onus probandi</font></i><font>, que não se prove a existência de uma causa da atribuição”, “sendo necessário convencer o tribunal da falta de causa” (Das Obrigações em geral, Vol. I, 8ª edição, página 492).</font><br>
<font> Em consonância, cumpria ao A./recorrente a alegação e prova de falta de causa do enriquecimento da | [0 0 0 ... 0 0 0] |
SjLAu4YBgYBz1XKvADy1 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça </font><br>
<br>
<br>
<font>AA, BB e CC demandaram DD, EE e a Companhia de Seguros FF </font><i><font>(agora FF, Companhia de Seguros, SA)</font></i><font>, pretendendo ser indemnizados dos prejuízos que alegaram ter sofrido e terem sido causados por um incêndio que teve origem num lançamento de foguetes no decurso dumas festividades na freguesia de Quintas de ...., no concelho do Sabugal, em 24 de Agosto de 1999. </font><br>
<font>Alegaram que os dois primeiros réus agiram na qualidade de representantes da respectiva comissão de festas e que a ré seguradora assumira o dever de indemnizar os danos que resultassem das actividades dessa comissão.</font><br>
<font>Os autores vieram mais tarde a desistir do pedido formulado contra os réus DD e EE, o que foi homologado por sentença, mantendo-o todavia contra a ré Seguradora, que contestou. </font><br>
<font> Houve réplica. </font><br>
<font>Saneado, condensado, instruído e julgado o processo, foi após a resposta aos quesitos apresentada pelos autores uma reclamação por escrito sobre o modo como se respondeu a certos pontos da matéria quesitada, tendo tal requerimento sido indeferido, do que os AA agravaram diferidamente.</font><br>
<font>A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.</font><br>
<font>Apelaram os autores para a Relação de Coimbra, com esse recurso tendo subido o anterior agravo.</font><br>
<font>A Relação de Coimbra, alterando para positivas as respostas negativas aos quesitos 1º, 2º, 3º e 4º, revogou a sentença, condenando a ré seguradora a pagar:</font><br>
<font>- ao autor BB a quanta de € 26.336,35 e o que se apurar em execução de sentença quanto aos danos na carrinha automóvel, dois motores de rega e alfaias agrícolas;</font><br>
<font>- à autora AA o que se apurar em execução de sentença quanto aos danos causados na vinha e nos castanheiros;</font><br>
<font>- ao autor CC o que se apurar em execução de sentença quanto aos danos causados nos castanheiros e carvalhos e na vinha.</font><br>
<font>Tendo revogado a sentença, não conheceu a Relação do recurso de agravo, em cuja minuta os AA defenderam que a reclamação contra a decisão da matéria de facto foi tempestiva e esta devia ter sido dada por provada no sentido proposto, uma vez que, no entender dos agravantes, a prova produzida assim o impunha. </font><br>
<font>Inconformada com a decisão da apelação, recorre agora a ré seguradora de revista, concluindo: </font><br>
<font>1º- No artº 16º da contestação impugnou, entre outros artigos, por falsidade, o artº 6º da P.I., que é o único artigo que imputa o incêndio ao lançamento dos foguetes, pelo que esta imputação deve ser considerada expressamente impugnada na contestação; </font><br>
<font>2º- Tendo o acórdão considerado que a recorrente não impugnou esta imputação do incêndio ao lançamento dos foguetes, considerando, ao invés, que esta teria aceite e, consequentemente, confessado que a Comissão de Festas teria causado o incêndio, VIOLOU UMA DISPOSIÇÃO EXPRESSA DA LEI QUE EXIGE CERTA ESPÉCIE DE PROVA PARA A EXISTÊNCIA DO FACTO, OU SEJA O DISPOSTO NOS ARTS. 341º, 352º, 354º A), 355º, Nº2, 356º Nºl E 357º, DO CÓDIGO CIVIL, E 490º DO C. P. CIVIL; </font><br>
<font>3º- NÃO TENDO HAVIDO RECLAMAÇÕES POR PARTE DOS RECORRIDOS O DESPACHO SANEADOR QUANTO Á SELECÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO TRANSITOU EM JULGADO, PELO QUE HÁ OFENSA DE CASO JULGADO FORMAL, NOS TERMOS DOS ARTS. 510º E 511º DO C. P. Civil; </font><br>
<font>Por mera cautela e sem conceder, </font><br>
<font>4º- Tendo o acórdão dado como assente que a recorrente confessou que o lançamento dos explosivos originou o incêndio causador dos danos, devia, em vez de, de imediato, revogar a sentença recorrida, considerando procedente a acção interposta, ter-se pronunciado quanto à elisão de culpa por parte da Comissão de Festas que procedeu ao lançamento dos foguetes, isto é, se esta teria ou não provado nos autos que usou de todas as providências exigidas pelas circunstâncias de modo a evitar os danos, nos termos do art. 493º, nº2 do C. Civil;</font><br>
<font>5º- Não se tendo pronunciado sobre esta questão, sobre a qual se devia ter pronunciado, é o acórdão nulo, nos termos do art. 668º, al. d) do C. P. Civil;</font><br>
<font>6º- Considerando-se que o lançamento de foguetes consubstancia o exercício de uma actividade perigosa, deve considerar-se que a segurada da recorrente ilidiu a presunção de culpa que sobre ela impendia, nos termos do artº 493º do C. Civil, porquanto se deve considerar provado que a comissão de festas usou de todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos causados;</font><br>
<font>7º- O ACÓRDÃO RECORRIDO VIOLOU O DISPOSTO NOS ARTS. 341º, 352º, 354º A), 355º, Nº2 , 356º Nºl E 357º DO CÓDIGO CIVIL E 490º DO C. P. CIVIL ; </font><br>
<font>Subsidiariamente, </font><br>
<font>8º- Violou o disposto no art. 668º, al. d) do C.P.Civil, pelo que é nulo, bem como o disposto no artºs. 483º e 493º nº2 do Código Civil, </font><br>
<font>DEVENDO SER REVOGADO, MANTENDO-SE A SENTENÇA, OU, SUBSIDIARIAMENTE, DECLARAR-SE NULO O ACÓRDÃO RECORRIDO E, CASO O MESMO MANTENHA, JULGAR-SE IMPROCEDENTE A ACÇÃO, EMBORA COM OUTROS FUNDAMENTOS.</font><br>
<font>Contra-alegaram os autores, pugnando pela manutenção do decidido.</font><br>
<font>Com os vistos, cabe agora decidir.</font><br>
<font>A Relação considerou provado o seguinte quadro factual já tido como assente na sentença apelada:</font><br>
<i><font>Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 2-1-91-049884/10, a Comissão de Festas de São Bartolomeu transferiu para a ré a responsabilidade civil por danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes de lesões corporais e/ou materiais causados a terceiros em consequência do lançamento de foguetes e/ou fogo de artifício nas festas da Quinta de São Bartolomeu, a partir do dia 21 de Agosto de 1999 e durante seis dias (A));</font></i><br>
<i><font> No dia 24 de Agosto de 1999 ocorreu um incêndio nas Quintas de São Bartolomeu, que se estendeu às freguesias de Baraçal, Vila de Touro, Rapoula do Côa e Valongo (B));</font></i><br>
<i><font>Como consequência do incêndio referido em B), ardeu um tractor marca Ursus, novo no valor de 3.500.000$00, um reboque de tractor, no valor de 350.000$00, um barracão armazém, no valor de 1.000.000$00, forragens no valor de 280.000$00 e quatro carradas de cavacos de carvalho para venda, no valor de 150.000$00, tudo propriedade de BB, aqui autor (C));</font></i><br>
<i><font>Os bombeiros não acompanharam os fogueteiros no lançamento dos foguetes nas festas realizadas nas Quintas de São Bartolomeu em Agosto de 1999 (D));</font></i><br>
<i><font>A G.N.R. não acompanhou os fogueteiros (5º);</font></i><br>
<i><font>Como consequência do incêndio, ardeu uma carrinha automóvel, 2 motores de rega e alfaias agrícolas, propriedade de BB, de valor não apurado (6º);</font></i><br>
<i><font>Ardeu, ainda, parte de uma vinha e vários castanheiros, propriedade de AA, de valor não apurado (7º);</font></i><br>
<i><font>Ardeu, ainda, uma vinha e vários castanheiros e carvalhos, propriedade de CC, de valor não apurado (8º);</font></i><br>
<i><font>O lançamento dos foguetes foi efectuado por FG (9º);</font></i><br>
<i><font> O qual tem carta de estanqueiro nº 3038, desde 93.05.05 (10º);</font></i><br>
<i><font>A G.N.R. concedeu à Comissão de Festas de São Bartolomeu autorização para o lançamento de foguetes entre 21 e 26 de Agosto de 1999 (11º);</font></i><br>
<i><font>O lançamento dos foguetes foi efectuado no local indicado pela G.N.R. (12º);</font></i><br>
<i><font>Os explosivos encontravam-se conservados em lugar seguro (13º);</font></i><br>
<i><font>Encontravam-se em bom estado de conservação (15º);</font></i><br>
<i><font>A propagação do incêndio foi facilitada pelo vento e pela existência de pasto seco (16º).</font></i><br>
<font>A estes factos acrescentou a Relação, como provada, a seguinte factualidade que constava dos quatro primeiros quesitos, a que a 1ª instância havia respondido negativamente:</font><br>
<i><font>O incêndio referido em B) foi consequência de foguetes lançados no sítio do Calvário, nas festas das Quintas de São Bartolomeu (1º);</font></i><br>
<i><font>Após o lançamento, os foguetes caíram sobre as reservas de foguetes empilhados ao lado, no mesmo local (2º);</font></i><br>
<i><font>E pegaram fogo às reservas e ao palhiço e desperdícios secos ali existentes (3º);</font></i><br>
<i><font>O fogo propagou-se ao mato circundante progredindo para nascente, incontrolado (4º).</font></i><br>
<font> A Relação deu como provada a factualidade a que se acaba de aludir por considerar que foi articulada pelos AA e não foi impugnada pela ré Seguradora.</font><br>
<font>Expendeu, a este propósito, o seguinte:</font><br>
<i><font>«… sobre o facto de o incêndio ter sido provocado pelo lançamento e rebentamento dos foguetes, nem uma palavra é dita na contestação, sendo claro que não toma posição sobre o facto de o incêndio ter sido causado pelos foguetes e os danos resultarem do incêndio.</font></i><br>
<i><font>Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos articulados na petição – diz o nº 1 do artº 490º do Código de Processo Civil – sob pena de, não o fazendo, se considerarem admitidos por acordo, se não estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto e for admissível a confissão, como é o caso.</font></i><br>
<i><font>Logo, essa factualidade está provada, podendo até já ter sido dada como assente na condensação. Logo, portanto, devem ser considerados provados os referidos pontos 1º, 2º, 3º e 4º da Base Instrutória…».</font></i><br>
<font>Sustenta porém a Seguradora/recorrente que impugnou que o incêndio tenha sido causado pelo lançamento dos foguetes.</font><br>
<font>Com razão o faz.</font><br>
<font>Vejamos porquê.</font><br>
<font>Tendo a acção sido proposta em 31.10.2001, é aplicável a lei adjectiva resultante da reforma introduzida pelos DL 329-A/95, de 12/12 e 180/96, de 25/9.</font><br>
<font>Assim, e nos termos do artº 490º do CPC revisto, ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos articulados na petição (nº 1), considerando-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só poderem ser provados por documento escrito (nº 2).</font><br>
<font> Resulta porém do nº 3 do mesmo artigo que se o réu declarar que não sabe se determinado facto é real, a declaração equivale a impugnação se não se tratar de facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento.</font><br>
<font>Ora, os AA articularam no item 6º da petição inicial que os foguetes foram mal lançados, caindo sobre as reservas de foguetes empilhados ao lado e mal condicionados, pegando fogo às mesmas e ao palhiço e desperdícios secos contíguos, e a ré Seguradora no item 16º da contestação disse impugnar por falsidade a matéria arguida naquele artº 6º (e noutros artigos da mesma peça, que também indicou).</font><br>
<font>E tendo os AA sido convidados a corrigir o articulado inicial, apresentaram um novo articulado em cujo artigo 14º alegaram que o fogo resultou directamente do mau manuseamento dos foguetes deitados…, tendo a ré Seguradora, no item 26º da sua nova contestação dito impugnar por falsidade o arguido naquele artigo 14º, acrescentando, nos três itens seguintes da mesma peça, que além da exigência da prática de um acto ilícito é necessária a culpa imputável ao agente e o nexo de causalidade adequada entre tal pretenso acto ilícito e os danos invocados pelos AA, nenhum destes requisitos se verificando na acção.</font><br>
<font>Não se pode por conseguinte aceitar que a ré Seguradora deixou sem impugnação a matéria de facto que foi levada aos primeiros quatro quesitos, formulados justamente porque se entendeu – e bem – tratar-se de matéria de facto articulada, controvertida e pertinente para a solução do litígio. </font><br>
<font>A ré Seguradora a mais não estava obrigada, pois, como é consabido, e, v.g., Miguel Teixeira de Sousa confirma (Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 290 e seg.), só é exigível que o réu tome posição sobre os factos que conhece ou deva conhecer segundo as regras da experiência comum ou em cumprimento de um dever de informação (como sucede, por exemplo, quanto à actividade de um seu empregado ou à deliberação de um dos seus órgãos).</font><br>
<font> Sempre que o réu não conhece nem tem o dever de conhecer os factos (é o caso da ré Seguradora/recorrente relativamente ao incêndio e suas causas e efeitos) justifica-se a possibilidade de uma declaração evasiva.</font><br>
<font>Bastava inclusive, para a factualidade em causa se considerar impugnada – </font><i><font>ut </font></i><font>referido nº 3 do artº 490º do CPC – a ré ter dito que ignorava se houve ou não o articulado incêndio, pondo em dúvida a veracidade da tese factual dos AA, porque lhe não era exigível o conhecimento de condutas alheias. Os factos foram imputados a terceiros, que não à própria ré, não sendo factos pessoais dela nem de que ela devesse ter conhecimento.</font><br>
<font>Ora a ré não se limitou a dizer que ignorava os factos alegados, o que já de per si consubstanciaria impugnação, indo mais longe, afirmando contundentemente ser falso o alegado pelos AA.</font><br>
<font>E nem se diga que é vedado ao Supremo sindicar a alteração da decisão da matéria de fato operada na Relação, repristinando as respostas negativas dadas na 1ª instância as quatro primeiros quesitos.</font><br>
<font>O nº 6 do artº 712º do CPC, já em vigor à data da instauração da acção, determina que das decisões da Relação previstas nos números anteriores não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
<font>Todavia, isso tem de ser entendido </font><i><font>cum grano salis</font></i><font>, pois o Supremo, como uniformemente tem decidido, pode censurar o mau uso pela Relação dos poderes que em exclusivo lhe são conferidos pelo artº 712º do CPC, podendo sindicar o desrespeito, pela Relação, dos pressupostos exigidos para a mexida na matéria de facto, referidos no artº 712º do CPC, e, de uma maneira geral, a alteração da matéria de facto que tiver sido feita com violação da lei.</font><br>
<font>Assim, por exemplo, se a Relação, por presunção judicial, dá como provado um facto que não foi alegado nem quesitado, facto esse em oposição com um facto dado como provado por acordo das partes, em violação do disposto nos artºs 664º, 490º, nº 2, 659º, nº 3 e 712º </font><i><font>(acórdão do STJ, de 27.9.2005, tirado na revista 1891/05-1, sumariado no Boletim de Circulação Interna nº 93, pág. 70) </font></i><font>.</font><br>
<font> Já Alberto dos Reis dizia (Anotado, V, pág. 474) que uma coisa é a apreciação das provas por parte da Relação, outra a questão de saber se esta fez uso legal do artº 712º, acrescentando que a primeira questão é de facto, com a qual nada tem o Supremo, sendo a segunda questão de direito, em relação à qual é legítima a censura por parte do tribunal de revista.</font><br>
<font> Não se sufraga portanto a alteração das respostas aos quatro primeiros quesitos, de negativa para positiva, com o fundamento de que a ré/recorrente não impugnou a factualidade vazada nesses pontos da base instrutória.</font><br>
<font> Não sendo permitido à Relação proceder à alteração da aludida matéria de facto com fundamento em confissão ou acordo da ré/recorrente quanto a ela, caberia ao STJ pronunciar-se sobre a bondade das conclusões recursórias da apelação, se fosse caso disso, nos termos do artº 715º, nº 2, </font><i><font>ex vi </font></i><font>artº 726º do CPC.</font><br>
<font> Não o fará, contudo, pois o que os AA pretendem </font><i><font>(com base numa vaga referência a documentos e testemunhos)</font></i><font>, em primeira mão, nas conclusões da apelação, é que se proceda à alteração da já aludida matéria de facto, e se inverifica, desde logo, qualquer das excepções referidas no segmento final do nº 2 do artº 722º do CPC, que fixa o </font><i><font>numerus clausus </font></i><font>dos casos em que o STJ tem competência para decidir de facto.</font><br>
<font> Termos em que se </font><b><font>concede a revista</font></b><font>, revogando-se o acórdão recorrido e ordenando-se a </font><b><font>baixa dos autos à 2ª instância, para,</font></b><font> se possível pelos mesmos Ex.mos Desembargadores,</font><b><font> se conhecer do agravo </font></b><i><font>– não</font></i><b><i><font> </font></i></b><i><font> julgado ainda, com fundamento no nº 1 do artº 710º do CPC</font></i><font> – decidindo se a sobredita reclamação dos AA por escrito foi bem ou mal indeferida por extemporaneidade, pelo Mmº Juiz, o qual, na segunda hipótese, se deverá pronunciar sobre o mérito substancial de tal reclamação. Custas pelos recorridos. </font><br>
<br>
<font>Lisbos, 25 de Setembro de 2007</font><br>
<br>
<font>Faria Antunes (relator)</font><br>
<font>Moreira Alves</font><br>
<font>Alves Velho </font></font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
aTJ0u4YBgYBz1XKvkQv5 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<b><font>Processo n.º 590/17.9T8EVR.E1.S2</font></b>
<p><b><font>1.ª Secção</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,</font></b>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
<b><font>1. AA</font></b><font>, na qualidade de herdeiro de CC, intentou, a 28 de março de 2017, ação declarativa comum, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Évora (Juízo Central Cível e Criminal de Évora – J1), com fundamento na responsabilidade civil emergente de acidente de viação ocorrido a 6 de janeiro de 2011, contra </font><b><font>BB – Companhia de seguros, S. A.</font></b><font>, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 138 278,06, acrescida de juros de mora.</font><br>
<b><font>2. </font></b><font>Alega que CC (entretanto falecido a 9 de novembro de 2011, vítima de assassínio) era transportado num veículo segurado na Ré, conduzido por DD, veículo este que se despistou devido à velocidade a que seguia e à imperícia e imprevidência do condutor. Como consequência do despiste, CC sofreu politraumatismos (craniano, facial, dos membros e coluna vertebral), tendo ficado incapacitado durante muito tempo e havendo sido sujeito a intervenções cirúrgicas e padecido de dores.</font><br>
<b><font>3. </font></b><font>Está, pois, em causa uma acção movida pelo pai e alegado herdeiro de uma vítima de um acidente de viação contra a seguradora do veículo onde este era transportado, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por este sofridos decorrentes do sinistro.</font><br>
<b><font>4. </font></b><font>O Autor/Recorrente - AA - alegou que o filho - CC - faleceu após o acidente de viação por si sofrido, por causas distintas deste: por parricídio perpetrado pelo seu único filho - DD. Assiste-lhe, assim, legitimidade ativa para a presente acção, já que na altura do falecimento do sinistrado este era divorciado, sendo os seus herdeiros o pai (ora Autor/Recorrente), a mãe (entretanto falecida) e o seu único filho que, em acção de indignidade contra si proposta, confessou não ter capacidade sucessória, tendo a transação aí alcançada sido homologada por sentença judicial.</font><br>
<b><font>5. </font></b><font>A Ré/Recorrida – seguradora -, na contestação, para além de ter impugnado os factos, deduziu a exceção perentória de prescrição do direito do autor, com fundamento no decurso do prazo tanto de 3 anos como de 5 anos – art. 498.º, n.</font><sup><font>os</font></sup><font> 1 e 2, do CC -, no momento em que foi citada – 26 de abril de 2017 -, pronunciando-se, igualmente, sobre as causas de interrupção da prescrição invocadas antecipadamente na petição inicial.</font><br>
<b><font>6. </font></b><font>Por saneador-sentença, o Tribunal de 1.ª Instância julgou procedente a exceção da prescrição do direito do Autor e, por conseguinte, absolveu a Ré do pedido.</font><br>
<b><font>7. </font></b><font>Por seu turno, o Tribunal da Relação de Évora, na sequência do recurso de apelação interposto pelo Autor, por acórdão proferido sem qualquer voto de vencido, confirmou a sentença recorrida:</font><br>
<font>“Pelo exposto, nos termos supra referidos, decide-se julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.</font><br>
<font> Custas pelo Apelante”.</font><br>
<b><font>8. </font></b><font>Inconformado, o Autor interpôs recurso de revista excecional, apresentando as seguintes </font><b><font>Conclusões</font></b><font>:</font><br>
<font>“I. O entendimento vertido no acórdão recorrido, segundo o qual ocorre a prescrição do direito de recorrente de demandar a seguradora no pagamento de indemnização por danos decorrentes de acidente de viação (seguradora essa que havia reconhecido a sua obrigação de indemnizar) com o fundamento de que, entre a data do acidente (ou reconhecimento da obrigação de indemnizar) passaram já mais de 5 anos, não considerando que, durante esses anos esteve pendente o processo crime que condenou o filho do lesado no acidente pelo crime de homicídio doloso na pessoa de seu pai e a acção de declaração de indignidade, contende com valores da nossa ordem jurídica, que em muito extravasam os interesses particulares dos litigantes.</font><br>
<font>II. A solução preconizada pelo recorrente para evitar semelhante injustiça – e determinar de forma definitiva o que acontece aos prazos prescricionais no hiato de tempo entre a prática do crime e a declaração de indignidade - é complexa, relevante juridicamente e totalmente nova, com repercussão não só nos presentes autos, mas interesse na sociedade e na aplicação do direito.</font><br>
<font>III. Por outro lado, a equiparação do regime da incapacidade do exercício de direitos ou incapacidade de agir à incapacidade sucessória é uma questão de enorme relevo social e cultural.</font><br>
<font>IV. Aferir que deveres e direitos nascem na esfera daquele cuja actuação determinará a indignidade, que prazos se suspendem e que direitos precludem, entre a data da condenação do crime e a data da declaração da indignidade, mais do que ser questão do interesse pontual deste ou daquele cidadão, é do interesse geral, de toda a sociedade.</font><br>
<font>V. Assim sendo, o carácter inusitado e insólito do decido no Acórdão recorrido a tal propósito, aliado ao dos valores em causa, justificam se admita excepcionalmente o presente recurso de Revista.</font><br>
<font>VI. Entende o recorrente que a excepção de prescrição não deveria ser considerada procedente.</font><br>
<font>VII. O recorrente só pôde exercer o seu direito a partir do momento em que foi habilitado herdeiro do seu filho (18 de Janeiro de 2017) e só nessa altura pode ser habilitado depois de lavrada a sentença da acção de declaração de indignidade do dia 7 de Dezembro de 2016.</font><br>
<font>VIII. A condição para a declaração de indignidade era a condenação do seu neto DD (definitiva e transitada) pelo crime de homicídio qualificado do seu filho, condenação crime que apenas se tornou definitiva em Janeiro de 2014.</font><br>
<font>IX. O recorrente não pode representar (sem culpa sua e sem que nada pudesse fazer) o seu filho até à formalização da habilitação de herdeiros. Até essa altura teve de aguardar o desfecho do processo crime e da acção de declaração de indignidade.</font><br>
<font>X. A lei qualifica a indignidade como incapacidade sucessória e essa incapacidade terá de ser entendida no igual sentido da capacidade para o exercício de direitos ou capacidade de agir.</font><br>
<font>XI. Aquando da abertura da sucessão do filho do recorrente, aquele que seria o seu legal herdeiro estava incapaz de lhe suceder por indignidade. Ao cometer o crime de homicídio sobre o seu pai, o referido DD torna-se incapaz para suceder.</font><br>
<font>XII. O recorrente para poder exercer os seus direitos, para ter capacidade de agir, necessita de obter uma declaração de indignidade do autor do crime. Ainda que a indignidade opere automaticamente, só a sua declaração a torna eficaz e oponível na ordem jurídica, e tal declaração só se tornou possível depois do trânsito em julgado da sentença penal, a qual só veio a tornar-se definitiva em Janeiro de 2014.</font><br>
<font>XIII. A declaração de indignidade apenas foi declarada a 07 de Dezembro de 2017. Até essa data, o recorrente estava impedido de agir em juízo como representante do seu filho. Até essa data, o recorrente não tinha capacidade de agir.</font><br>
<font>XIV. Determinando o artigo 2037º do Código Civil que declarada a indignidade, a devolução da sucessão ao indigno é havida como inexistente, temos forçosamente de considerar que o prazo que decorreu desde a data da abertura da sucessão até à da declaração de indignidade é também inexistente.</font><br>
<font>XV. Operando a inexistência é como se o prazo não tivesse corrido. Como se o prazo prescricional decorrido desde a data do óbito até a declaração de indignidade nunca tivesse acontecido, sendo que, se assim se entender, então o direito do recorrente não se encontra ainda prescrito.</font><br>
<font>XVI. Considerando-se que a indignidade opera aquando do acto ilícito significa que, a partir dessa data, apesar de ainda não declarada judicialmente, essa incapacidade já existe.</font><br>
<font>XVII. Empregando por analogia o regime prescricional aplicável aos incapazes, previsto no artigo 320º do Código Civil, dir-se-á que a prescrição não deve começar nem correr enquanto não for habilitado quem represente o autor da sucessão e, portanto, o direito do recorrente não se encontra ainda prescrito.</font><br>
<font>XVIII. Existe uma lacuna jurídica (caso omisso) quando uma determinada situação, merecedora de tutela jurídica, não se encontra prevista na Lei. A questão de saber-se se os prazos prescricionais correm enquanto se determina e declara a incapacidade sucessória do indigno não tem qualquer previsão legal, o que legitima o recurso à analogia.</font><br>
<font>XIX. Decidir que a pretensão indemnizatória devia ter sido exercida pelo autor do crime, que, quando finalmente adquire a capacidade de suceder nos direitos do seu filho o recorrente não pode mais peticionar a indemnização pelos danos sofridos por esse seu filho por prescrição desse direito (recordando-se que o tempo decorrido foi o necessário à resolução do processo crime e acção de declaração de indignidade), que o prazo prescricional corre e não se interrompe enquanto o recorrente não tem legitimidade ou capacidade para o exercício do direito é intolerável, inaceitável para uma consciência ética e de valores e afronta de uma forma clamorosa aquilo que a moralidade e os bons costumes exigem.</font><br>
<font>XX. O direito tem limites internos cuja ultrapassagem é a entrada no não direito. É o abuso do direito tal como o define o art.334º do Código Civil</font><br>
<font>XXI. A douta decisão recorrida violou, s.m.o, o disposto nos artigos 9º, 10º, 320º, 334º, 2036º e 2037º do Código Civil, que deveriam ter sido interpretados de acordo com o alegado nas presentes conclusões de recurso.</font><br>
<font>Assim sendo, revogando V.as Ex.as o Acórdão recorrido e substituindo-o</font><br>
<font>por decisão que julgue improcedente a excepção de prescrição invocada pela Ré, estarão fazendo inteira justiça”.</font><br>
<b><font>9. </font></b><font>A Ré apresentou contra-alegações com as seguintes Conclusões:</font><br>
<font>“Da não admissibilidade da Revista Excepcional</font><br>
<font>1. Contrariamente ao defendido pelo Recorrente, a questão objecto dos presentes autos não se afigura de manifesta dificuldade ou complexidade, não se suscitando quaisquer dúvidas na aplicação do instituto da prescrição.</font><br>
<font>2. O regime jurídico da prescrição já contempla a possibilidade de transmissão do direito de indemnização para novo titular, e prevê expressamente a continuidade da contagem do prazo de prescrição nesses casos (art, 308° do C.C), rejeitando propositadamente a suspensão ou interrupção, por serem manifestamente contrárias ao espírito da prescrição.</font><br>
<font>3. É desprovida de fundamento a arguição que o prazo prescricional não podia correr enquanto não houvesse legitimidade do Recorrente, pois, ainda que este não tivesse legitimidade para exercer a pretensão em causa, tinha-a, em primeiro lugar, o próprio sinistrado a partir da data do acidente de viação e, após a sua morte, o neto do Recorrente, único herdeiro do sinistrado até à data da declaração de indignidade,</font><br>
<font>4. Acresce que, nos tempos do próprio Recorrente, a aludida acção de declaração de indignidade sucessória movida pelo Recorrente apenas foi proposta mais de um ano depois do trânsito em julgado da condenação por homicídio e terminou por transação homologada em 07/12/2016, tendo o Recorrente formalizado o "Procedimento simplificado de Habilitação de Herdeiros e Registos" em 18/01/2017.</font><br>
<font>5. Igualmente se entende infundada a aplicação analógica do regime disposto no artigo 320°, n.02, do Código Civil, não fazendo tal analogia qualquer sentido jurídico, desde logo porque não existe lacuna, não estamos perante uma prescrição presuntiva e ainda porque esta suspensão se refere a menores, interditos e inabilitados que, pelos motivos óbvios, necessitam de alguém que os represente e administre os seus bens, o que não era, naturalmente, o caso do seu neto.</font><br>
<font>6. Também não nos parece que estejam em causa quaisquer interesses de particular relevância social, não figurando a presente como uma situação que põe em causa a eficácia do direito ou põe em dúvida a sua credibilidade, sendo que, a contrario, uma decisão como a pretendida pela Recorrente colocaria certamente em causa a segurança jurídica.</font><br>
<font>7. Tudo a concluir que é manifesto não se encontrar preenchido nenhum dos fundamentos para o recurso de revista excepcional constantes do artigo 672°, n.° 1, do CPC, pelo que, havendo dupla conforme, ao abrigo do preceituado no artigo 671°, n.° 3, do CPC, não deverá ser admitida revista do acórdão da Relação sub Júdice.</font><br>
<font>Caso assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio se acautela, também não assiste razão ou fundamento ao Recorrente, pelo que o presente recurso não pode proceder, impondo-se a manutenção integral do douto Acórdão.</font><br>
<font>8. Da matéria de facto dada como provada e de ambas as decisões proferidas (primeira Instância e Relação de Évora) não resulta qualquer reconhecimento de obrigação de indemnizar feita pela Recorrida à Recorrente (nem no nosso modesto entender ao sinistrado), nem que o prazo de prescrição aplicável seja taxativamente o prazo de 5 anos.</font><br>
<font>9. Sem prescindir, pese embora o Recorrente alegue ter "ganho legitimidade em 2017", certo é que a legitimidade para a alegada pretensão que pretende exercer nos presentes autos já existia antes dessa data, mais concretamente existia a partir do momento em que ocorre o acidente de viação (06/01/2011) na esfera do próprio lesado, sendo que depois de iniciada a prescrição continua a correr, ainda que o direito passe para novo titular (cfr. artigo 308.º do Código Civil).</font><br>
<font>10. A legitimidade para a alegada pretensão indemnizatória com a morte do seu titular passou a ser titulada peio neto do Recorrente, DD,</font><br>
<font>11. Tal legitimidade manteve-se na esfera do seu neto após o trânsito em julgado da condenação por homicídio do lesado (23.01.2014), sendo que apenas mais de um ano depois dessa data foi proposta, pelo Recorrente, a acção de indignidade sucessória, cujo desfecho, como se sabe, resultou ainda de transação entre o Recorrente e o seu neto.</font><br>
<font>12. Caso o seu neto tivesse exercido a pretensão indemnizatória com sucesso, sempre a posição do Recorrente ficaria salvaguardada quanto ao eventual direito aos montantes indemnizatórios, por força do disposto no art. 2037° do Código Civil.</font><br>
<font>13. No disposto no art, 2037° do Código Civil não se encontra, nem em letra nem espírito, qualquer enquadramento que legitime que se deva entender como Inexistente o prazo de prescrição que tenha corrido até à declaração de indignidade.</font><br>
<font>14. Apenas com a declaração judicial de indignidade sucessória o respectivo sujeito passa a carecer de capacidade sucessória,</font><br>
<font>15. A pretensão indemnizatória a que se reportam os presentes autos podia ter sido exercida a todo tempo, desde a data do acidente de viação, não existindo qualquer Impedimento para tal exercido.</font><br>
<font>16. Acresce que, igualmente o Recorrente poderia ter promovido a notificação judicial avulsa da Recorrida aquando do trânsito em julgado da condenação no processo crime ou da proposição da acção declarativa de indignidade sucessória, dando a conhecer à Recorrida que no pressuposto da procedência daquela acção pretendia habilitar-se como herdeiro de CC e nessa qualidade reclamar o pretenso direito à indemnização, ou até, eventualmente, demandar a Recorrida requerendo a suspensão da causa face àquela pendência, nos termos do art. 272° do CPC.</font><br>
<font>17. Ou, conforme referido na douta sentença proferida em primeira instância; o ora autor, poderia o, deveria, ter diligenciado junto do seu neto, para obter tai dectaraçêo de indignidade ou repúdio da herança" ou ainda, acrescentamos nós, poderia ter diligenciado para que o seu neto (então herdeiro) demandasse a Recorrida pela alegada pretensão indemnizatória que agora pretende exercer.</font><br>
<font>18. Isto porque a interrupção da prescrição ocorre com a citação ou notificação judicial, nos termos do art. 323° do Código Civil,</font><br>
<font>19. O neto não era menor, Interdito ou inabilitado, não existindo qualquer lacuna susceptível de ser aplicada analogicamente com o artigo 320°,</font><br>
<font>20. Não se achando qualquer fundamento jurídico ou princípio moral/ético que legitime que o prazo de prescrição não comece a correr enquanto não for habilitado o autor da sucessão.</font><br>
<font>21. Não só não estamos perante uma lacuna legal (estando previsto no art. 308° do C.C. que a prescrição continua correr ainda que se transmita para outro titular) como jamais estariam em causa as mesmas razões justificativas da regulamentação a que alude o art. 320° do Código Civil e que permitissem a sua aplicação analógica (cfr. Art. 10° do C.C.).</font><br>
<font>22. Até porque a incapacidade sucessória do indigno apenas resulta em incapacidade processual após a declaração judicial de indignidade (que podia nem ter sido requerida),</font><br>
<font>23. O que se afigura absolutamente inaceitável e contrário ao direito e à lei é a interpretação que o Recorrente pretende fazer dos artigos em questão e do doutamente decidido, não merecendo qualquer censura a procedência da excepção de prescrição, sendo certo que qualquer outro entendimento ofenderia, esse sim, a lei e as concepções ético-jurldicas dominantes.</font><br>
<font>24. Atento o exposto, nem a pendência do aludido processo criminal nem a pendência da</font><br>
<font>acção de indignidade sucessória constituem causas de interrupção ou suspensão do</font><br>
<font>prazo de prescrição, não se enquadrando em qualquer das causas previstas na lei.</font><br>
<font>25, Tal hipótese criaria uma Incomportável incerteza jurídica, aplicável a qualquer tipo de pretensão e prazo de prescrição, que sempre prejudicaria o equilíbrio de Interesses e os princípios jurídicos subjacentes aquele instituto.</font><br>
<font>26. Termos em que, atento todo o exposto, apenas se pode concluir pela prescrição do direito do Recorrente, devendo o douto Acórdão recorrido ser mantido na íntegra, não havendo qualquer violação do direito, nem, em especial, dos artigos 9°, 10°, 320°, 334°, 2036°e 2037° do Código Civil</font><br>
<font> </font><br>
<font>Ampliação do âmbito do recurso</font><br>
<font>27. Por mero dever de patrocínio e à cautela, ao abrigo do disposto no art, 636°, n.° 1 do CPC, caso no presente recurso se viesse a conceder razão ao Recorrente, sempre se impunha conhecer do prazo em questão, e do que se afigura uma errónea interpretação a aplicação dada no Acórdão ao art, 498°, ns.° 1 e 3 do Código Civil.</font><br>
<font>28. Ora, salvo melhor entendimento, e porque a dúvida se suscita até nas alegações da Recorrente, não se pode concordar com o douto Acórdão recorrido na parte em que considera que os factos alegados pelo Recorrente podem resultar num ilícito que consubstancie crime de ofensa à Integridade física por negligência,</font><br>
<font>29. Com efeito, para que seja aplicável o prazo alargado de 5 anos, não basta alegar que o facto ilícito constitui crime, sendo necessário demonstrar que se encontram preenchidos todos os elementos essenciais do tipo legal de crime em causa.</font><br>
<font>30, Ora, tal como bem decidido na primeira instância, o Recorrente limita-se a invocar genericamente a "gravidade dos danos corporais", não fazendo em momento algum prova do preenchimento dos pressupostos do tipo de crime, nem alegando sequer factos que demonstrem a existência de tal Ilícito.</font><br>
<font>31. Aliás, o Recorrente nem sequer faz corresponder os factos que efectivamente alega a qualquer tipo de crime.</font><br>
<font>32. Ou seja, ainda que não fosse necessário processo-crime, sempre seria exigível que o Recorrente alegasse e demonstrasse factos susceptíveis de constituir determinado crime, o que não logrou (nem logra) fazer.</font><br>
<font>33. Não tendo tal sido feito, nem havendo qualquer registo nos autos que o acidente de viação em causa tenha dado origem a processo-crime, salvo melhor entendimento, é manifesto que não existe fundamento para a aplicação do prazo alargado de 5 anos, pelo que o prazo de prescrição a aplicável é de 3 anos, não existindo fundamento para o alargamento do mesmo.</font><br>
<font>34. A não se entender assim e no limiar, sempre se impunha que tal questão fosse levada a discussão no saneador e objecto de prova em audiência de julgamento, jamais se podendo concluir, sem mais, pelo aplicação do prazo de 5 anos.</font><br>
<font>35. Termos em que, havendo procedência do presente recurso, sempre se impunha determinar que o prazo de prescrição aplicável era o prazo de três anos, previsto no art. 498°, n.° 1 do Código Civil.</font><br>
<font> </font><br>
<font>Nestes termos, nos mais de direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas. deve ser negado provimento ao recurso apresentado pela Recorrente em conformidade com as presentes alegações, assim se fazendo como sempre</font><br>
<font>JUSTIÇA”.</font><br>
<b><font>10. </font></b><font>A Formação, ao abrigo do art. 672.º, n.º 1, al. a), do CPC, proferiu acórdão a admitir o recurso. A questão dotada de relevância jurídica consiste em saber se “a prescrição do direito (…) de demandar a seguradora no pagamento de uma indemnização por danos decorrentes de acidente de viação (…) com fundamento que, entre a data do acidente (…) passaram já mais de cinco anos, não considerando que, durante esses anos esteve pendente processo-crime que condenou o filho do lesado no acidente pelo crime de homicídio doloso na pessoa de seu pai e a acção de declaração de indignidade”.</font><br>
<b><font>11. </font></b><font>Tendo sido já proferido acórdão pela Formação a admitir o recurso de revista excecional, e não se descortinando qualquer outro obstáculo à admissibilidade do recurso, encontram-se os autos em condições de prosseguir para a prolação de acórdão pela conferência.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>II – Objeto do recurso</font></b>
</p><p><font> Segundo os preceitos dos arts. 635.º, n.</font><sup><font>os</font></sup><font> 3-5, e 639.º, n.º 1, do CPC, o objeto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelos Recorrentes. Salvo em situações excecionais de conhecimento oficioso – que </font><i><font>in casu</font></i><font> não relevam -, o Supremo Tribunal de Justiça não pode conhecer de questões que não hajam sido referidas nas conclusões formuladas pelos Recorrentes. </font>
</p><p><font>Apreciam-se questões e não razões ou meros argumentos. </font>
</p><p><font>Atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelos Recorrentes, que delimitam o objeto do recurso, está em causa a questão de se saber se o direito invocado pelo Autor/Recorrente se encontra prescrito ou se ocorreu alguma causa de suspensão ou de interrupção da prescrição que permita considerar o mesmo tempestivamente exercido.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>III – Fundamentação</font></b><br>
<b><font>A) De facto</font></b><br>
<font>Foram considerados como provados os seguintes factos:</font><br>
<font>“a) CC, faleceu no dia 9 de Novembro de 2011, na condição de divorciado, sem deixar testamento ou disposição de última vontade.</font>
</p><p><font>b) Sucedeu-lhe, como herdeiro o seu único filho DD.</font>
</p><p><font>c) CC foi assassinado pelo filho DD.</font><br>
<font>d) Nessa sequência, correu termos pelo Juízo Criminal da Comarca de Vila do Conde o Proc.º n.º 2032/11.4JAPRT, tendo como arguido DD.</font><br>
<font>e) Por acórdão transitado em julgado no dia 23 de Janeiro de 2014, o arguido DD foi condenado pela prática, nomeadamente, do crime de homicídio qualificado do CC, tendo-lhe sido aplicada uma pena única do concurso de crimes de 17 (dezassete) anos de prisão.</font><br>
<font>f) O ora A. AA, pai do sinistrado CC moveu uma ação declarativa contra o DD (Proc.º n.º 989/15.5T8PVZ.P1), na qual requereu que o Réu DD fosse declarado carecido de capacidade sucessória, por indignidade, na herança de seu Pai CC.</font><br>
<font>g) Por transação de 5 de Dezembro de 2016, homologada por sentença de 7 de Dezembro de 2016, Autor e Réu puseram fim à contenda, nos seguintes termos:</font><br>
<font>“</font><i><font>A. O Réu DD, confessa o pedido formulado, ou seja, ser declarado carecido de capacidade sucessória, por indignidade, na herança de seu pai CC.</font></i><br>
<i><font>B. Por força da confissão do pedido o Réu DD declara nada ter a reclamar ou receber relativamente aos bens da herança do seu pai CC.</font></i><br>
<i><font>C. O Autor AA aceita a confissão do Réu, reconhece como sincero o pedido de perdão do Réu DD, expressa que as relações com a família paterna do Réu se encontram apaziguadas, e que contribuirá para a ressocialização do Réu</font></i><font>”.</font><br>
<font>h) Deste modo, ao sinistrado CC sucedeu o seu pai AA, como único herdeiro com capacidade sucessória.</font><br>
<font>i) Isso mesmo foi declarado, formalizado e certificado no “Procedimento simplificado de Habilitação de Herdeiros e Registos”, elaborado no passado dia 18 de Janeiro de 2017, na Conservatória do Registo Civil da Póvoa de Varzim.</font><br>
<font>j) A herança de CC já havia demandado a Ré com base no sinistro “sub judice”, mas, no despacho saneador foi decidido que a mesma era destituída de personalidade judiciária, sendo a Ré “BB” absolvida da instância em 20-01-2015.</font>
</p><p><font>l) A Ré “BB” foi citada para os termos da referida ação em Novembro de 2012.</font><br>
<font>m) No dia 6 de Janeiro de 2011, pelas 11 horas e 30 minutos ocorreu um acidente de viação na Estrada …, …, …, que consistiu no despiste do veículo ligeiro de passageiros de matrícula 00-IU-00, um …, conduzido por DD.</font><br>
<font>n) O CC, no indicado dia e hora, era transportado como passageiro no referido veículo, ao lado do condutor.</font><br>
<font>o) O autor alega que CC, em consequência do acidente de viação referido sofreu danos patrimoniais e morais e que o acidente ocorreu por culpa do neto (filho da vítima) e, condutor, DD”.</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>B) De Direito</font></b><br>
<font>1. A indignidade sucessória baseia-se numa circunstância de raiz puramente subjetiva, traduzida numa atitude de repúdio da lei pelos factos graves cometidos – antes ou depois da abertura da sucessão, conforme o art. 2034.º, al. d), do Cód. Civil - por alguém contra o autor da herança, o seu cônjuge ou familiares mais próximos</font><a><u><sup><font>[1]</font></sup></u></a><font>.</font><br>
<font>2. Não é possível a prova do crime em ação cível, nem se prevê a condenação do réu como indigno de suceder na ação penal contra ele instaurada (art. 2036.º, do Cód. Civil)</font><a><u><sup><font>[2]</font></sup></u></a><font>.</font><br>
<font>3. Segundo o art. 2037.º, do Cód. Civil, como fruto da reação da lei perante os factos delituosos praticados pelo chamado contra o autor da herança ou alguns dos seus familiares mais próximos, a indignidade torna a devolução inexistente, retroagindo, assim, os seus efeitos até ao momento da vocação. A inexistência retroativa da devolução faz que as ações possessórias e o poder de administração relativos aos bens em princípio pertencentes ao indigno passem logo para as pessoas a quem, na falta dele, compete a devolução da sucessão. Isto significa que a declaração de indignidade apaga a vocação sucessória</font><a><u><sup><font>[3]</font></sup></u></a><font>.</font><br>
<font>4. Por isso, a posição jurídico-sucessória do Autor/Recorrente – </font><b><font>AA</font></b><font> - apenas se consolida com a declaração judicial de indignidade (</font><i><font>vide</font></i><font> art. 2036, n.</font><sup><font>os</font></sup><font> 2 e 3, do Cód. Civi) do filho - </font><b><font>DD</font></b><font> - do autor da sucessão, falecido a 9 de novembro de 2011 -</font><b><font> CC</font></b><font>.</font><br>
<font>5. É que a indignidade sucessória não opera automaticamente. O afastamento efetivo de </font><b><font>DD</font></b><font> da sucessão de </font><b><font>CC</font></b><font> dependia da propositura da ação de indignidade e da respetiva declaração.</font><br>
<font>6. De resto,</font><i><font> in casu</font></i><font>, impunha-se o recurso à ação de declaração de indignidade, pois o indigno - </font><b><font>DD</font></b><font> - havia-se feito previamente – a 25 de novembro de 2011 - habilitar notarialmente como sucessor. </font><br>
<font>7. </font><b><font>DD</font></b><font> agiu como herdeiro de </font><b><font>CC</font></b><font> até à declaração da sua indignidade.</font><br>
<font>8. Conforme o art. 2037.º, n.º 1, do Cód. Civil, “Declarada a indignidade, a devolução da sucessão é havida como inexistente…”.</font><br>
<font>9. Retira-se, pois, do art. 2037.º, do Cód. Civil, que o efeito fundamental da declaração de indignidade é impedir que o indigno venha, de facto, a tornar-se sucessor: fazer com que a vocação que operou a seu favor seja havida como inexistente. </font><br>
<font>10. A declaração de indignidade torna inexistente a eventual vocação sucessória do indigno (arts. 2032.º, n.º 1, e 67.º, do Cód. Civil). Quanto ao ulterior destino dos bens a que seria chamado o indigno, no caso de sucessão legal e de o indigno não ter descendentes, há que chamar os outros herdeiros legais do </font><i><font>de cujus</font></i><font>.</font><br>
<font>11. Da retroatividade da inexistência da devolução da sucessão ao indigno decorre que </font><b><font>DD</font></b><font> nunca foi chamado à titularidade das relações jurídicas do falecido, que chamado a essa titularidade foi </font><b><font>AA</font></b><font>.</font><br>
<font>12. Segundo o art. 322.º, do Cód. Civil, “A prescrição de direitos da herança ou contra ela não se completa antes de decorridos seis meses depois de haver pessoa por quem ou contra quem os direitos possam ser invocados”.</font><br>
<font>13. A prescrição dos direitos da herança apenas se preenche depois de decorrido um período de tempo razoável entre a determinação do sucessível e a imputação desses direitos a determinada pessoa. Assim, apesar de iniciar o seu curso e correr continuamente, a prescrição não se completa antes de decorridos seis meses contados a partir do momento em que seja determinada a pessoa por quem o direito poderá ser exercido. Com efeito, enquanto não houver um representante da herança, a herança não pode fazer valer o seu crédito contra terceiro</font><a><u><sup><font>[4]</font></sup></u></a><font>. </font><br>
<font>14. A mor | [0 0 0 ... 0 0 0] |
azJ0u4YBgYBz1XKvlQuN | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<font> </font>
<p><font> </font>
</p><p><font>Processo n.° 4630/17.3T8FNC-A.L1.S1</font>
</p><p><font>1.ª Secção</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>I – Relatório</font></b><br>
<b><font>1. AA</font></b><font>, por apenso a ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge identificado </font><i><font>supra</font></i><font> e nos termos do art. 990.°, do C.P.C, e do art. 1105.°, do C.C., intentou, no Tribunal de Família e Menores do Funchal, a presente ação para atribuição da casa de morada de família contra </font><b><font>BB</font></b><font>, peticionando que lhe seja atribuída a casa de morada de família onde o requerido hoje reside no "Conjunto Habitacional de …", …, bloco "…", apartamento 1D, 0000 - 000 …l.</font><br>
<b><font>2. </font></b><font>Para o efeito, alegou que a fração habitada pelo casal é propriedade do "Instituto da Habitação da …", sendo o arrendamento atribuído à Requerente, que é quem suporta todas as despesas relativas a consumos domésticos, mesmo após haver saído dessa casa, em virtude da conduta do Requerido, e ter passado a residir com a sua irmã, em habitação que não reúne as condições necessárias.</font><br>
<b><font>3. </font></b><font>Realizada a conferência prevista no art. 990.º, n.º 2, do C.P.C., não foi possível a obtenção de acordo, tendo o Requerido sido notificado para deduzir oposição.</font><br>
<b><font>4. </font></b><font>O Requerido pugnou pela improcedência do pedido e requereu lhe seja atribuída a si a casa de morada da família, alegando não dispor de meios económicos para comprar ou tomar de arrendamento outra casa. Invocou que muito diferentemente de si, que não tem nem apoio familiar e nem outro qualquer na Região Autónoma …, a Requerente dispõe de mais possibilidades habitacionais, inclusivamente daquela de residir com a sua irmã. Sustentou ainda não existir qualquer obstáculo ao regresso da Requerente à casa de morada de família.</font><br>
<b><font>5. </font></b><font>Foram juntos documentos pela Requerente e pelo Requerido e solicitadas informações pelo Tribunal a respeito da situação socioeconómica de cada um deles. Cumpriu-se o contraditório devido.</font><br>
<b><font>6. </font></b><font>Finda a instrução do processo, foi proferida sentença que julgou o incidente e a oposição improcedentes por não provados:</font><br>
<font>“Perante estes factos apurados forçoso é de concluir que a necessidade ou premência da necessidade da casa de morada da família pela Requerente não é superior à do Requerido, nem a deste superior à daquela.</font><br>
<font>Efectivamente, e pese embora a circunstância de a Requerida custear as despesas da casa poderá deixar de fazê-lo, as partes não têm residência alternativa, e as condições económicas de ambos são frágeis não sendo a diferença remuneratória entre ambos suficientemente assinalável em moldes que permitam concluir que um deles esteja em melhores condições de providenciar por uma nova habitação com os inerentes custos.</font><br>
<font>Pelo exposto, impõe-se concluir pela improcedência do peticionado por ambos”.</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>7. </font></b><font>A Requerente interpôs recurso de apelação dessas sentença e o Requerido interpôs recurso subordinado.</font><br>
<b><font>8. </font></b><font>O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu o seguinte acórdão:</font><br>
<font>“Pelo exposto, acorda-se em julgar nos seguintes termos:</font><br>
<font>a) Improcede a apelação principal da Recorrente no sentido de ser proferida sentença que atribua a casa de morada de família à Requerente;</font><br>
<font>b) Procede o recurso subordinado do Recorrido no sentido de ser proferida sentença que julgue procedente o pedido de atribuição da casa de morada de família ao Requerido;</font><br>
<font>c) Em conformidade, revogamos a sentença recorrida e substituímos a mesma pela decisão de manter apenas a absolvição do Requerido do pedido formulado na petição inicial e julgando procedente do pedido formulado na oposição, decide-se assim atribuir a casa de morada de família ao Requerido, no qual se concentrará o direito ao arrendamento, nos termos do Art. 1105.° n.° 2 do C.C.,devendo oportunamente ser cumprido o disposto no n.° 3 do mesmo preceito.</font><br>
<font>- Custas pela Apelante (Art. 527° n.° 1 do C.P.C), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que lhe tenha sido concedido.”</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>9. </font></b><font>Irresignada, a Requerente interpôs recurso de revista, apresentando as seguintes </font><b><font>Conclusões</font></b><font>:</font><br>
<font>A) “No douto acórdão </font><i><font>a quo </font></i><font>os fundamentos invocados para atribuição da casa de morada de família ao recorrido são, no mínimo, inconsistentes e sem qualquer base factual.</font><br>
<font>B) Com efeito, não é verdade que "«</font><i><font>Requerente ganha uma vez e meia mais do que o seu marido", </font></i><font>pois na verdade aquela apenas ganha mais </font><i><font>£ </font></i><font>218,16 por mês que este.</font><br>
<font>C) Sendo certo que, como se verá adiante, não é esse diferencial que </font><i><font>in<br>
casu </font></i><font>justifica uma maior premência da necessidade da casa de morada de<br>
família para o requerido e ora recorrido. Antes pelo contrário.</font><br>
<font>D) E, nesta parte, nem poderá valer o argumento de que o rendimento da<br>
requerente é </font><i><font>"certo e seguro, ao contrário do que parece suceder com o<br>
Apelado", </font></i><font>pois o que releva é a situação actual dos litigantes e não<br>
hipotéticas situações futuras, de cariz claramente especulativo e<br>
inconsistente.</font><br>
<font>E) Aliás, a entender-se o contrário, também se poderia concluir que o recorrido, tendo 61 anos e estando no activo, sempre poderá ver a sua situação financeira melhorada, quer arranjado outro trabalho mais bem remunerado, quer cumulando outro trabalho com o seu actual, quer até evoluindo cm termos remuneratórios dentro do seu actual trabalho e sem esquecer o rendimento extra que sempre poderá retirar por prestação de trabalho suplementar.</font><br>
<font>F) O que no caso da recorrente, com 67 anos de idade e estando reformada, muito dificilmente ocorrerá.</font><br>
<font>G) Por outro lado e relativamente ao argumento de que </font><i><font>"o Requerido não tem qualquer possibilidade de recorrer a auxílio familiar na Região Autónoma …”' </font></i><font>para satisfazer as suas necessidades habitacionais, a sua inconsistência ainda é maior, pois, conforme referido no próprio acórdão </font><i><font>a quo </font></i><font>e provado nos autos, a. recorrente, em Junho último, passou a residir na casa de sua irmã, temporariamente, uma vez que o imóvel consubstancia-se num apartamento tipologia T2, onde, além da requerente e sua irmã, reside um neto destas. Tendo a requerente que partilhar o quarto e até a cama com a sua irmã sem quaisquer condições de privacidade </font><i><font>(vide </font></i><font>pontos </font><i><font>5</font></i><i><sup><font>a</font></sup></i><i><font> </font></i><font>a 8</font><sup><font>o</font></sup><font> dos factos provados)</font><br>
<font>H) Mais, conforme também provado nos autos o citado apartamento é propriedade dos …, … e o agregado familiar ocupante autorizado é</font><i><font> </font></i><font>constituído apenas pela irmã da requerente e pelo seu neto </font><i><font>(vide </font></i><font>ponto I I</font><sup><font>o</font></sup><font> dos factos provados).</font><br>
<font>I) Assim, não é só o recorrido que não dispõe de apoio familiar para fazer face às suas necessidades habitacionais, pois o único apoio familiar de que a recorrente dispõe e acima referido é precário e temporário. Estando, pois e nessa parte, os litigantes em situação idêntica.</font><br>
<font>J) Por sua vez, o argumento da proximidade ao local de trabalho apenas será atendível quando a perda da casa de morada de família possa implicar um agravamento da situação de um dos litigantes, quer seja através de acréscimos de despesas de transporte, quer seja através de dificuldades de deslocação.</font><br>
<font>K) Ora, no caso </font><i><font>sub judice </font></i><font>e conforme provado nos autos, a casa de morada de família não se localiza próximo do local de trabalho do recorrido e o recorrido, apesar de dispor de veículo próprio, desloca-se diariamente para o seu local de trabalho utilizando transportes públicos.</font><br>
<font>L) Pelo que, quanto muito, a ser-lhe retirada a casa de morada de família, a sua situação manter-se-ia idêntica, pois teria de utilizar transportes públicos para se deslocar para o seu trabalho. Aliás, até poderia melhorar, caso conseguisse residência próxima do seu local de trabalho.</font><br>
<font>M) De resto, estando em causa um imóvel situado na cidade do … e atenta a pouca dimensão geográfica desta, sempre esse critério seria irrelevante.</font><br>
<font>N) É, pois, por demais evidente que o argumento da proximidade ao local de trabalho é </font><i><font>in casa </font></i><font>inócuo e completamente irrelevante.</font><br>
<font>O) Resta, pois, a diferença dos rendimentos entre os litigantes, designadamente € 218, 16 mensais, como argumento invocado para atribuição da casa de morada de família ao recorrido.</font><br>
<font>P) Aqui, importa atender que nos tempos que correm, uma pessoa normal, para fazer face às suas despesas do dia a dia, seja com alimentação, vestuário, transporte, despesas médicas e medicamentosas, bem como despesas inerentes à fruição de uma moradia (electricidade, água, luz, ele), nunca gastará menos de € 400 por mês, e, por outro lado» atento o mercado de arrendamento actual, na cidade do Funchal, ou até arredores, ainda que se trate de um imóvel tipologia TO, a respectiva renda muito dificilmente será inferior a </font><i><font>£ </font></i><font>400 mensais.</font><br>
<font>Q) Perante estes factos, que são notórios e públicos, é fácil de concluir que qualquer um dos ora litigantes, atentos os respectivos rendimentos, muito conseguirão arranjar outra residência com condições mínimas de habitabilidade e dignidade.</font><br>
<font>R) Ora, para efeitos do disposto no artigo 1.105°, n.° 2 do Código Civil, relativamente à transmissão do arrendamento da casa de morada de família, o que releva, em primeiro lugar, é a premência da necessidade da casa de morada de família de cada um e os interesses dos seus filhos.</font><br>
<font>S) Assim e ao contrário do que se retira do acórdão </font><i><font>a quo</font></i><i><sub><font>,</font></sub></i><i><font> </font></i><font>a diferença da premência da necessidade da casa de morada de família não se mede apenas pela diferencial, qualquer que seja o valor, dos rendimentos das partes, antes pela verificação de que a satisfação da necessidade de habitação poderá ser mais facilmente conseguida por uma das partes.</font><br>
<font>T) O que manifestamente não acontece </font><i><font>in casu, </font></i><font>pois atentos os rendimentos dos litigantes e os preços do mercado de arrendamento actualmente a serem praticados, é da mais elementar justiça concluir que quer a recorrente, quer o recorrido, muito dificilmente conseguirão, pelos seus próprios meios, satisfazer essa necessidade habitação.</font><br>
<font>U) Aliás, por muito estranho que pareça, a verdade é que à ora recorrente será mais difícil satisfazer essa necessidade, pois, sendo quase certo que a cada um dos litigantes restará, em caso de perda da casa de morada família </font><i><font>sub judice, </font></i><font>solicitar nova habitação junto do …, …, o recorrido mais facilmente verá satisfeito o seu pedido face ao seu rendimento inferior.</font><br>
<font>V) Assim, conforme doutrina e a jurisprudência dominantes, é</font><i><font> </font></i><font>patente que, </font><i><font>in casu, </font></i><font>atenta a ausência de critérios inerentes às necessidades de habitação de ambos os litigantes, ter-se-á de relevar outros factores, tidos por secundários, para atribuição da casa de morada de família, incluindo a culpa no divórcio.</font><br>
<font>W) Pelo exposto, face à similitude </font><i><font>in casu </font></i><font>das necessidades de ambos os litigantes numa habitação e relevando-se os tais factores secundários, designadamente a culpa do recorrido na ruptura na comunhão conjugal, deverá, atento o princípio da equidade, ser atribuída a casa de morada de família </font><i><font>sub judice </font></i><font>à ora recorrente.</font><br>
<font>X) Revogando-se, em consequência, o douto acórdão recorrido, porquanto violador do disposto no artigo 2</font><sup><font>o</font></sup><font>, n,° l, </font><i><font>ex vi </font></i><font>artigo 990º, ambos do CPC c artigo 1105° do Código Civil.” </font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>II – Questões a decidir</font></b><br>
<font>Nos termos dos arts. 635.°, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC, as conclusões delimitam o objeto do recurso. O Tribunal não pode conhecer de questões novas, que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões já proferidas.</font>
</p><p><b><font> </font></b>
</p><p><b><font>III - Fundamentação </font></b><br>
<b><font>A) De Facto</font></b>
</p><p><font>Foram considerados como provados os seguintes factos:</font><br>
<font>“1.º Na Conservatória do Registo Civil …, sob o assento n.° 002 de 1978, terem Requerente e Requerido contraído casamento entre si, no regime imperativo de separação de bens, no dia 8 de Julho de 1978, tendo a cônjuge mulher adotado os apelidos "…";</font><br>
<font>2.° Por sentença de 23 de Janeiro de 2018, não transitada em julgado, foi decretado o divórcio entre Requerente e Requerido;</font><br>
<font>3.° Algum tempo após o casamento, ambos os litigantes passaram a residir numa fração autónoma sita no "Conjunto Habitacional de …", …, bloco "…", apartamento ID, 0000 - 000 …, a qual passou a constituir a casa de morada de família até a presente data.</font><br>
<font>4.° A referida fração autónoma é propriedade do "Instituto da Habitação …" e encontra-se atribuída a Requerente e Requerido, pagando a primeira mensalmente uma renda de € 33,63.</font><br>
<font>5.° No início de Julho último, a Requerente teve de sair da casa de morada de família passando a residir na casa de uma sua irmã, CC, sita no …, Rua …, 0000 - 000 ….</font><br>
<font>6.° Fazendo-o temporariamente, uma vez que o imóvel consubstancia-se num apartamento tipologia T2.</font><br>
<font>7.° No mesmo, além da requerente e da sua irmã, reside ainda um neto desta última.</font><br>
<font>8.° Tendo a requerente que partilhar o quarto e até a cama com a sua irmã sem quaisquer condições de privacidade.</font><br>
<font>9.° Apesar de se encontrar a residir provisoriamente na casa da sua irmã, continua a ser a requerente a pagar, na íntegra e em exclusivo, todas as despesas inerentes à casa de morada de família, nomeadamente renda, luz, água, etc.</font><br>
<font>10.° O Requerido não tem aqui na R.A.M qualquer familiar que lhe possa dar guarida, nunca o poderia fazer, visto que é Continental, nascido no concelho de …, …, na região ….</font><br>
<font>11.° A fração descrita em 5.° é propriedade dos …, … e o agregado familiar ocupante autorizado é constituído apenas pela irmã da Requerente e pelo seu neto.</font><br>
<font>12.° A Requerente é beneficiária de pensão de reforma no montante mensal €639,47;</font><br>
<font>13.° O Requerido aufere o montante mensal de €421,31.”</font>
</p><p><font> </font><br>
<b><font>B) De Direito</font></b><br>
<b><font>1. </font></b><font>De acordo com o art. 990.º, do CPC, o processo de atribuição da casa de morada da família é um processo de jurisdição voluntária (arts. 986.º e ss, do CPC).</font><br>
<b><font>2. </font></b><font>Tratando-se de um processo de jurisdição voluntária, os critérios de conveniência e de oportunidade prevalecem sobre os de legalidade estrita. Segundo o art. 987.º, do CPC, “nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna”. </font><br>
<b><font>3. </font></b><font>Importa, pois, levar em linha de conta as normas dos arts. 986.º-988.º e 990.º, do CPC. Tratando‑se de um processo de jurisdição voluntária, o tribunal pode investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes, sendo apenas admitidas as provas que o juiz considere necessárias (art. 986.º, n.º 2, do CPC); o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita (art. 987.º, do CPC); as resoluções estão sujeitas à cláusula</font><i><font> rebus sic stantibus </font></i><font> (art. 988.º, n.º 1, do CPC); e não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade (art. 988.º, n.º 2, do CPC).</font><br>
<b><font>4. </font></b><font>O sentido e alcance da proibição legal de interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça têm vindo a ser esclarecidos em termos uniformes pela respetiva jurisprudência</font><a><u><font>[1]</font></u></a><font>. Segundo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de maio de 2017 (Tomé Gomes), proc. n.º 945/13.8T2AMD-A.L1.S1:</font><br>
<font>“Significa isto que, sendo as providências de jurisdição voluntária tomadas com a predominância de critérios de conveniência ou oportunidade sobre os critérios de estrita legalidade, delas não caberá também, em princípio, recurso de revista.</font><br>
<font>Com efeito, na esfera da tutela de jurisdição voluntária, em que se protegem interesses de raiz privada mas, além disso, com relevo social e alcance de interesse público, são, por isso, conferidos ao tribunal poderes amplos de investigação de factos e de provas (art.º 986.º, n.º 2, do CPC), bem como maior latitude na determinação da medida adequada ao caso (art.º 987.º do CPC), em derrogação das barreiras limitativas do ónus alegatório e da vinculação temática ao efeito jurídico especificamente formulado, estabelecidas no âmbito dos processos de natureza contenciosa nos termos dos artigos 5.º, n.º 1, 260.º (quanto ao pedido e causa de pedir) e 609.º, n.º 1, do CPC. </font><br>
<font>É, pois, tal predomínio de oficiosidade do juiz sobre a atividade dispositiva das partes, norteado por critérios de conveniência e oportunidade em função das especificidades de cada caso, sobrepondo-se aos critérios de legalidade estrita, que justifica a supressão de recurso para o tribunal de revista, vocacionado como é, essencialmente, para a sindicância da violação da lei substantiva ou processual, nos termos do artigo 674.º e 682.º, n.º 3, do CPC. </font><br>
<font>Foi nesse sentido que, no acórdão do STJ, de 20/01/2010, proferido no processo n.º 701/06.0TBETR.P1.S1[1], se observou o seguinte: </font><br>
<font>«Explica-se desta forma que o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal especialmente encarregado de controlar a aplicação da lei, substantiva (…) ou adjectiva (…), não possa, nos recursos interpostos em processos de jurisdição voluntária, apreciar medidas tomadas segundo critérios de conveniência e oportunidade, ao abrigo do disposto no artigo 1410.º [atual 987.º] do CPC. Com efeito, a escolha das soluções mais convenientes está intimamente ligada à apreciação da situação de facto em que os interessados se encontram; não tendo o Supremo Tribunal de Justiça o poder de controlar a decisão sobre tal situação (…), a lei restringe a admissibilidade de recurso até à Relação.» </font><br>
<font>No entanto, na interpretação daquela restrição de recorribilidade, importa ter em linha de conta que, em muitos casos, a impugnação por via recursória não se circunscreve aos juízos de oportunidade ou de conveniência adotados pelas instâncias, mas questiona a própria interpretação e aplicação dos critérios normativos em que se baliza tal decisão. </font><br>
<font>Assim, quando, no âmbito das próprias decisões proferidas em processos de jurisdição voluntária, estejam em causa a interpretação e aplicação de critérios de legalidade estrita, já a sua impugnação terá cabimento em sede de revista, circunscrita ao invocado erro de direito. </font><br>
<font>Como se ressalva no aresto do STJ de 20/01/2010 acima citado, a propósito da inadmissibilidade de revista nos referidos processos: </font><br>
<font>«A verdade, todavia, é que esta limitação não implica a total exclusão da intervenção do Supremo Tribunal de Justiça nestes recursos; apenas a confina à apreciação das decisões recorridas enquanto aplicam a lei estrita. É nomeadamente, o que se verifica, quer quanto à verificação dos pressupostos, processuais ou substantivos, do poder de escolher a medida a adoptar, quer quanto ao respeito do fim com que esse poder foi atribuído.</font><br>
<font>[…] </font><br>
<font>Tratando-se de pressupostos legais imperativamente fixados para que o juiz possa ponderar da conveniência e da oportunidade de decretar a medida que lhe foi requerida, cabe no âmbito dos poderes do Supremo Tribunal de Justiça (…) a apreciação da respectiva verificação.» </font><br>
<font>Em conformidade com tal entendimento, quanto ao essencial, na linha da jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal [2] haverá que ajuizar sobre o cabimento e âmbito do recurso de revista das decisões proferidas nos processos de jurisdição voluntária de forma casuística, em função dos respetivos fundamentos de impugnação, e não com base na mera qualificação abstrata de resolução tomada segundo critérios de conveniência ou de oportunidade.”</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>5. </font></b><font>Afigura-se que a questão em apreço no presente recurso se reporta à interpretação e aplicação de critérios normativos e não tanto a juízos de conveniência e de oportunidade. Por isso, deve ser conhecida pelo Supremo Tribunal de Justiça, que não está assim impedido de sindicar a decisão adotada no acórdão do Tribunal da Relação Lisboa.</font><br>
<b><font>6. </font></b><font>Com efeito, trata-se da questão de se saber se o Tribunal da Relação de Lisboa interpretou e aplicou (in)corretamente a norma do art. 1105.º, n.º 2, do Cód. Civil (“Na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir, tendo em conta a necessidade de cada um, os interesses dos filhos </font><b><u><font>e outros fatores relevantes</font></u></b><font>”), cuja redação se encontra atualmente muito próxima daquela do art. 1793.º, n.º 1, do mesmo corpo de normas (“Pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada da família, quer essa seja comum quer própria do outro, considerando, </font><b><u><font>nomeadamente</font></u></b><font>, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal”). </font><br>
<b><font>7. </font></b><font>O art. 1105.º, n.º 2, do Cód. Civil, procura, mediante uma enumeração meramente exemplificativa – e não taxativa -, indicar os critérios a ter em conta na transmissão ou na concentração a favor de um dos cônjuges do direito ao arrendamento da casa de morada de família. </font><br>
<b><font>8. </font></b><font>O preceito refere, pois, a título meramente exemplificativo, a necessidade de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos. </font><br>
<b><font>9. </font></b><font>Na apreciação da necessidade de cada um dos cônjuges, considera-se a situação patrimonial de cada um deles. </font><i><font>In casu</font></i><font>, a situação patrimonial do cônjuge marido e a situação patrimonial do cônjuge mulher revelam-se muito semelhantes. Pode, com efeito, dizer-se, no que respeita à necessidade, que a Recorrente e o Recorrido se encontram em circunstâncias semelhantes. A diferença de valor entre o rendimento mensal auferido por cada um dos cônjuges não é relevante para o efeito da atribuição da casa de morada da família, não permitindo, só por si, decidir sobre a respetiva atribuição a um ou a outro. De facto, ambos se deparam com grandes dificuldades para fazer face às suas necessidades de vida – designadamente as de natureza habitacional, mediante o arrendamento de imóvel para habitação segundo as rendas correntes - apenas com o rendimento que auferem. Note-se, nesta sede, que a circunstância de auferir um rendimento mensal um pouco inferior ao do cônjuge mulher seria suscetível de consentir ao cônjuge marido obter habitação social com mais facilidade do que àquele.</font><br>
<b><font>10. </font></b><font>Por outro lado, a nenhum dos cônjuges foram confiados filhos cujo interesse se deva, por este modo, acautelar. </font><br>
<b><font>11. </font></b><font>Assim, no caso de paridade da necessidade de cada um dos cônjuges – circunstâncias patrimoniais e económicas semelhantes - e na ausência de filhos cujo interesse haja assim que proteger, deve atender-se a “outros fatores relevantes”, conforme o art. 1105.º, n.º 2, do Cód. Civil.</font><br>
<b><font>12. </font></b><font>São, </font><i><font>inter alia</font></i><font>, atendíveis, a idade, a possibilidade de trabalho – estes fatores relevam ainda no âmbito da determinação da necessidade - e a (im)possibilidade de um dos cônjuges dispor de outra casa em que possa residir sem beneficiar da mera tolerância de terceiros. No caso </font><i><font>sub judice</font></i><font>, o Recorrido é seis anos mais novo do que a Recorrente e tem aptidão/possibilidade de trabalhar. A Recorrente, por seu turno, é pensionista de reforma. Acresce que a casa da irmã da Requerente, onde esta se tem abrigado, não reúne as condições nem “regulamentares” e nem materiais para que o cônjuge mulher lá se mantenha. Nem tão pouco a sua irmã se encontra obrigada a mantê-la em sua casa e companhia, pelo menos nas circunstâncias atuais. A Requerente tem apenas beneficiado da mera tolerância de sua irmã.</font><br>
<b><font>13. </font></b><font>No âmbito do art. 1105.º, n.º 2 (“outros factores relevantes”), deve também levar-se em consideração o comportamento pretérito de cada um dos cônjuges em relação ao outro, designadamente a conduta que se consubstancie na causa da rutura definitiva do casamento, que constitua fundamento do divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges</font><a><u><font>[2]</font></u></a><font>. A ponderação do elemento sistemático da interpretação da lei (contexto da lei: art. 2016.º, n.º 3, do Cód. Civil), nos termos do art. 9.º, n.º 1, do Cód. Civil, conduz a este resultado.</font><br>
<b><font>14. </font></b><font>De acordo com a sentença proferida no processo de divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges, identificado </font><i><font>supra</font></i><font>:</font><br>
<font>“Nos presentes autos ressalta à saciedade que a vida do R. durante pelo menos os últimos quinze anos do período de coabitação conjugal, se reconduzia ao consumo de bebidas alcoólicas com excesso, à errância (não exercia qualquer actividade laboral) e ao desmando, agredindo a Autora física (desferiu um murro no braço da Autora) e verbalmente (desmandando-a de “puta do caralho” e atribuindo-lhe relações extramatrimoniais.</font><br>
<font>Tal circunstancialismo é subsumível à violação do dever de respeito, sendo que é comprometedor da possibilidade da vida em comum e revelador de uma ruptura definitiva do casamento, tal como este deverá ser assumido por ambos os cônjuges durante toda a sua vigência”.</font>
</p><p><font> </font><br>
<b><font>15. </font></b><font>O Tribunal </font><i><font>a quo</font></i><font> não respeitou, pois, os critérios normativos plasmados no art. 1105.º, n.º 2, do Cód. Civil, adotando medidas concretas sindicáveis pelo Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
<b><font>16. </font></b><font>Assiste razão à Recorrente.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><b><font>IV- Decisão</font></b>
</p><p><font>Pelo exposto, julga-se o recurso procedente, revogando-se o acórdão recorrido e atribuindo-se à Recorrente a casa de morada da família.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Custas pelo Recorrido, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Lisboa, 17 de dezembro de 2019</font><br>
<font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Maria João Vaz Tomé - Relatora</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font><br>
<font>António Magalhães</font><br>
<font> </font><br>
<font> </font><br>
<font>Jorge Dias</font>
</p><p><font>_______________________________________________________</font><br>
<a><u><font>[1]</font></u></a><font> Cfr. acórdão de 27 de maio de 2008 (Maria dos Prazeres Beleza), proc. n.º 08B1203; acórdão de 20 de janeiro de 2010 (Lopes do Rego), proc. n.º 701/06.0TBETR.P1.S1; acórdão de 16 de março de 2017 (Maria dos Prazeres Beleza), proc. n.º 1203/12.0TMPRT-B.P1.S1; acórdão de 25 de maio de 2017 (Tomé Gomes), proc. n.º 945/13.8T2AMD-A.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2017 (Maria da Graça Trigo), proc. n.º 212/15.2T8BRG-A.G1.S2 - todos disponíveis para consulta in </font><font>www.dgsi.pt</font><font>.</font><br>
<a><u><font>[2]</font></u></a><font> Cfr. Nuno de Salter Cid, “Anotação ao art. 1793.º”, in</font><i><font> Código Civil Anotado, Livro IV – Direito da Família</font></i><font>, no prelo, Coimbra, Almedina. </font><font><br>
</font></p><hr></font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
PzJvu4YBgYBz1XKvxwj5 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<b><font> </font></b><br>
<b><font>Processo n.º 6471/17.9T8BRG.G1.S1</font></b><br>
<b><font> </font></b><div><b><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,</font></b></div><font> </font>
<p><b><font>I. Relatório</font></b><br>
<b><font>1. First Marine, S.A.</font></b><font> instaurou, no Juízo Central Cível de …. – Juiz 0 – do Tribunal Judicial da Comarca de …, ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra </font><b><font>DSV Road A/S</font></b><font>, peticionando, a final, a condenação da Ré no pagamento da quantia de 117.137,89 €, acrescida de juros de 5%, desde a data da citação e até integral pagamento.</font><br>
<b><font>2. </font></b><font>Alegou, para o efeito, ser titular de um direito de sub-rogação emergente do pagamento a terceiro, seu segurado, de indemnização decorrente da perda de mercadoria ocorrida em transporte contratado com a Ré, por culpa desta.</font><br>
<b><font>3. </font></b><font>Citada, a Ré não apresentou contestação.</font><br>
<b><font>4. </font></b><font>Por despacho de 27 de setembro de 2018, foram tidos como confessados os factos alegados pela Autora.</font><br>
<b><font>5. </font></b><font>No prazo previsto no art. 567.º, n.º 2, do CPC, a Autora alegou, dando por reproduzido o teor da petição inicial.</font><br>
<b><font>6. </font></b><font>Ulteriormente, a 11 de janeiro de 2019, o Tribunal de 1.ª Instância proferiu sentença (cfr. fls. 130 a 135), nos termos da qual decidiu julgar a ação totalmente procedente e, em consequência, condenou a Ré </font><b><font>DSV Road A/S</font></b><font> a pagar à Autora </font><b><font>First Marine, S.A</font></b><font>. a quantia de 117.137,89 €, acrescida de juros, à taxa de 5% ao ano, desde a data da citação e até integral pagamento.</font><br>
<b><font>7. </font></b><font>Inconformada com esta decisão, a Ré interpôs recurso de apelação.</font><br>
<b><font>8. </font></b><font>A Autora contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida.</font><br>
<b><font>9. </font></b><font>Conforme o acórdão do Tribunal da Relação de ……, de 14 de novembro de 2019:</font><br>
<i><font>“Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.</font></i><br>
<i><font>Custas da apelação a cargo da apelante”</font></i><font>.</font><br>
<font> </font><br>
<b><font>10. </font></b><font>De novo inconformada, a Ré </font><b><font>DSV Road A/S</font></b><font> interpôs recurso de revista, apresentando as seguintes </font><b><font>Conclusões</font></b><font>:</font><br>
<font>“</font><i><font>1ª – Vem a presente Revista para o Supremo Tribunal de Justiça interposta do douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães que julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença da 1ª Instância.</font></i><br>
<i><font>2ª O recurso (neste caso, a revista) é sempre admissível uma vez que tem por fundamento (de entre outras) a violação das regras de competência internacional, conforme conjugação do nº 3, 1ª parte, do artº 671º, e 629º, nº 2, ambos do CPC.</font></i><br>
<i><font>3ª A revista é ainda admissível porque a 1ª instância, embora em forma tabelar, haja considerado que “O Tribunal competente internacionalmente, em razão da matéria e da hierarquia” (Sic.), omitiu, por completo e absoluto, qualquer fundamentação.</font></i><br>
<i><font>4ª Mais do que “fundamentação essencialmente diferente”, na previsão e terminologia do nº 3 do artº 671º do CPC, a Relação fundamenta a decisão sobre uma questão que a 1ª instância não fez, pelo que não se trata de fundamentação diferente, mas antes de uma fundamentação única e em primeira apreciação!</font></i><br>
<i><font>5ª É contra-natura e o senso comum, constituindo “um indecifrável enigma e insólita bizarria” que a Recorrida tenha decidido vir abrigar-se debaixo do tecto da jurisdição dos tribunais portugueses.</font></i><br>
<i><font>6ª Os tribunais portugueses são incompetentes, em razão da competência internacional, para conhecer e julgar o caso em apreço, quer porque in casu se não verifica nenhum dos elementos de conexão previstos nos artºs 62º e 63º do CPC (nem as partes celebraram pacto atributivo de jurisdição), quer porque de acordo com as “Competências Especiais” previstas no artº 7º do Regulamento nº 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, a jurisdição internacionalmente competente é a Dinamarca.</font></i><br>
<i><font>7ª Também não é aplicável ao presente caso o artº 31º da Convenção CMR.</font></i><br>
<i><font>8ª O elemento de conexão do “local do carregamento” é absolutamente inócuo e irrelevante para a caso em apreço, sendo que o expedidor, ou seja, a vendedora Syrache Mode que está sediada no local onde se deu o carregamento, não é parte na acção, tendo apenas vendido as mercadorias à empresa dinamarquesa Masai e recebido o preço, pelo que nada mais tinha a reclamar, nem reclamou.</font></i><br>
<i><font>9ª O litígio assenta num alegado incumprimento contratual decorrente do facto de parte das mercadorias não ter sido entregue ao destinatário, a empresa dinamarquesa Masai, local de entrega, o que nada tem a ver com o carregamento das mercadorias em Portugal!</font></i><br>
<i><font>10ª Ante as circunstâncias concretas do caso sub judice, é inequívoco que a jurisdição portuguesa não é a mais bem colocada para dirimir este litígio, não se vislumbrando que possa ter sido propósito do legislador facilitar o acesso aos tribunais portugueses por parte de cidadãos estrangeiros sem que exista um mínimo de conexão relevante.</font></i><br>
<i><font>11ª A Relação julgou improcedente este fundamento da apelação (incompetência absoluta dos tribunais portugueses), com base quer no artº artº 7º, nº 1, al. b), segundo travessão, do citado Regulamento nº 1215/2012, quer no artº 31º da Convenção CMR.</font></i><br>
<i><font>12ª A Relação não teve em consideração quer os princípios do Direito Privado Internacional, quer as regras que enformam a atribuição da competência internacional.</font></i><br>
<i><font>13ª As regras da competência internacional, e afora os casos em que os tribunais portugueses ou de outro(s) Estado(s)-Membro(s) da União Europeia são exclusivamente competentes (cfr. artº 65º do CPC e artº 24º do Regulamento 1215/2012), têm sempre por substracto fáctico um conflito de jurisdição (para o que aqui releva, em matéria civil ou comercial) entre dois ou mais Países/Estados-Membros, que reclama uma ponderação sobre qual das jurisdições é a mais bem colocada para dirimir um dado litígio.</font></i><br>
<i><font>14ª Salvo os casos de competência exclusiva pode afirmar-se que para que uma questão de competência internacional se coloque é mister, é requisito fundamental, que estejamos ante um litígio a dirimir entre cidadãos de dois ou mais Países/Estados-Membros.</font></i><br>
<i><font>15ª Carece de lógica, de racionalidade e de fundamento que se atribua jurisdição e competência aos tribunais portugueses para conhecer e julgar um pleito entre duas empresas dinamarquesas por incumprimento da obrigação da entrega das mercadorias na Dinamarca, sabendo-se, ademais, que a execução de uma sentença condenatória sempre terá de ser executada na Dinamarca!</font></i><br>
<i><font>16ª A Relação fez errado julgamento no enquadramento da questão sub judice na artº 7º, nº 1, al. b), segundo travessão, do Regulamento nº 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial.</font></i><br>
<i><font>17ª Em rigor até, a decisão da Relação está em oposição com o fundamento, pois que, considerando aplicável o segundo travessão da alínea b) do nº 1 do artº 7º do Regulamento nº 1215/2012, acabou por decidir em sentido contrário, ou seja, manifestamente contrário ou em contradição com a previsão da norma.</font></i><br>
<i><font>18ª Nulidade de oposição entre os fundamentos e a decisão que expressamente se invoca, com as legais consequências (cfr. artsº 666º, nº 1, e 615º, nº 1, alínea c), do CPC).</font></i><br>
<i><font>19ª O que está em causa na presente demanda, tal como a relação material controvertida vem configurada pela Apelada, é um contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada, que é um contrato de resultado que se materializa e concluiu com a entrega das mercadorias ao seu destinatário, que, no caso, devia ocorrer, como ocorreu (embora sem os cartões furtados), na Masai, em Copenhaga/Dinamarca.</font></i><br>
<i><font>20ª A Relação, ao considerar aplicável in casu o artº 7º, nº 1, al. b), do Regulamento nº 1215/2102, deveria ter considerado internacionalmente incompetentes os tribunais portugueses, por ser competente a jurisdição da Dinamarca, lugar onde, nos termos do contrato, o transporte devia ser prestado e concluído.</font></i><br>
<i><font>21ª À mesma conclusão se chega por via da alínea c) do nº 1 do artº 7º do Regulamento nº 1215/2012, que estatui que: “Se não se aplicar a alínea b), será aplicável a alínea a)”.</font></i><br>
<i><font>22ª De conformidade com as competências especiais da secção 2 do artº 7º do Regulamento 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial os tribunais portugueses são incompetentes para conhecer e julgar o caso em apreço!</font></i><br>
<i><font>23ª E cumpre sublinhar que as disposições gerais do Regulamento nº 1215/2012 prescrevem que:</font></i><br>
<i><font>“1. Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas num Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado-Membro” (artº 4º), e que:</font></i><br>
<i><font>“1. As pessoas domiciliadas num Estado-Membro só podem ser demandadas nos tribunais de outro Estado-Membro nos termos das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo (artº 5º).</font></i><br>
<i><font>24ª A revista é admissível também quanto à questão da falta de citação da Ré, aqui Recorrente.</font></i><br>
<i><font>25ª Em primeiro lugar, porque embora a 1ª instância, em forma tabelar, haja considerado a Ré “Regularmente citada”, omitiu por completo e absoluto qualquer fundamentação.</font></i><br>
<i><font>26ª É o Tribunal da Relação que, conhecendo da arguição daquela nulidade, confirma a regularidade da citação, mas desta feita com extensa fundamentação.</font></i><br>
<i><font>27ª Mais do que “fundamentação essencialmente diferente”, na previsão e terminologia do nº 3 do artº 671º do CPC, a Relação fundamenta a decisão sobre uma questão que a 1ª instância não fez, ou seja, não se trata de fundamentação diferente, mas antes de uma fundamentação única e em primeira apreciação!</font></i><br>
<i><font>28ª A citação é, segura e inequivocamente, um dos actos processuais de maior relevância e susceptível de gerar gravíssimas consequências se ocorrer a sua falta ou, se efectuada, for irregular ou nula por preterição de formalidades prescritas na lei, podendo conduzir, no limite, a uma condenação judicial assente e fundada numa suposta revelia absoluta do réu, como ocorreu in casu!</font></i><br>
<i><font>29ª A regularidade, validade, certeza e segurança de uma citação ordenada por um Tribunal de um Estado-Membro noutro Estado-Membro da UE, no caso, tribunal português na Dinamarca, não só constitui uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, como tem subjacentes interesses de particular relevância social (cfr., alíneas a) e b) do nº 1 do artº 672º do CPC).</font></i><br>
<i><font>30ª A Relação, e também a 1ª Instância, ao contrário do que se prevê nos artºs artigos 230º, nº 1(aplicável ex vi artº246º) e 569º, nº 1,ambos do CPC, considerou a citação efectuada sem que o aviso de recepção tivesse sido devolvido e incorporado nos autos, e que se iniciou e correu o prazo para a Ré contestar.</font></i><br>
<i><font>31ª Perante um acórdão proferido por uma Relação que sufraga um entendimento que afronta e contraria o que está previsto em normas legais expressas, é inquestionável que a apreciação da questão em apreço, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.</font></i><br>
<i><font>32ª A Relação labora num outro erro de julgamento, pois que na subsunção que faz do caso em apreço ao artº 14º do Regulamento nº 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à citação e notificação de actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros, descontextualiza e desfoca, por completo, a previsão legal e o sentido e o alcance da norma.</font></i><br>
<i><font>33ª O caso em apreço, pura e simplesmente, não é subsumível na previsão do citado artº 14º do Regulamento nº 1393/2007, não se contém na fattispecie legal dessa norma.</font></i><br>
<i><font>34ª O próprio TJUE, no acórdão citadono acórdão recorrido, convém em que o aviso de recepção da carta registada constitui um elemento de prova da recepção do ato judicial citado ou notificado, embora sustentando, do mesmo passo, que uma citação ou notificação pelos serviços postais não tem necessariamente de ser efetuada por carta registada com aviso de recepção, podendo sê-lo por documento equivalente.</font></i><br>
<i><font>35ª O TJUE entende que o meio alternativo de transmissão do ato deve apresentar o mesmo nível de certeza e de fiabilidade que uma carta registada com aviso de recepção, no que respeita tanto à recepção do acto pelo seu destinatário como às circunstâncias desta.</font></i><br>
<i><font>36ª Resulta do entendimento do TJUE sobre o campo de previsão do artº 14º do Regulamento nº 1393/2007 que os Estados-Membros, ao procederem directamente pelos (seus) serviços postais à citação ou notificação de actos judiciais a pessoas que residam noutro Estado-Membro, devem, em princípio, optar pelo recurso a carta registada com aviso de recepção.</font></i><br>
<i><font>37ª De onde resulta que é no momento em que tem de fazer directamente uma citação ou uma notificação de actos judiciais a pessoas que residam noutro Estado-Membro que o Estado-Membro tem de optar por qual dos meios alternativos opta: fá-lo com recurso ao princípio-regra da carta registada com aviso de recepção? Ou recorre a outro meio alternativo ou substitutivo?</font></i><br>
<i><font>38ª Acontece que o Tribunal da 1ª Instância, para fazer a citação da Ré fez clara e inequívoca opção pela regra da carta registada com aviso de recepção, não tendo optado por meio “equivalente” e substitutivo ou alternativo.</font></i><br>
<i><font>39ª Se o Tribunal optou por esse meio, como optou, é manifesto e insofismável que apenas a devolução do aviso de recepção constitui elemento de prova certo e seguro de que a citação foi regularmente efectuada.</font></i><br>
<i><font>40ª Está vedado à Relação “juntar o melhor dos dois mundos” ou fazer uma espécie de “cocktail” dos procedimentos próprios e da soberania de cada um dos Estados-Membros, o de origem (Portugal) e o da citação (Dinamarca).</font></i><br>
<i><font>41ª Se o tribunal da 1ª Instância optou pela carta registada com aviso de recepção para citar a Ré, não podia tornar dispensável a devolução do mesmo, e, se este não foi devolvido, o que se impunha ao tribunal era que repetisse a citação, fosse novamente por carta registada com aviso de recepção ou com recurso a meio equivalente, podendo, ainda, pedir intervenção das autoridades competentes do Estado-Membro do local da citação, ou seja, a Dinamarca.</font></i><br>
<i><font>42ª Não tendo sido devolvido o aviso de recepção, e, por conseguinte e mais impressivamente, não se mostrando assinado o aviso de recepção que acompanhou a citação, não se inicia nem corre o prazo para o Réu contestar, como, inequívoca e inexoravelmente, flui do disposto nos artigos 230º, nº 1, aplicável ex vi artº 246º, e 569º, nº 1, ambos do CPC.</font></i><br>
<i><font>43ª Constitui uma realidade indiscutível e insofismável, à luz da Lei, da Doutrina e da Jurisprudência portuguesas, e já agora das regras da experiência, que nenhum tribunal português aceitaria como válida e regular uma citação mandada efectuar em Portugal por carta registada com aviso de recepção se este não for devolvido ao tribunal! Ainda que que o funcionário dos CTT pudesse vir dizer que entregou a carta.</font></i><br>
<i><font>44ª Não tendo sido devolvido o aviso de recepção, estava vedado ao tribunal presumir que a citação foi feita regularmente, pois que não há citação por carta registada com aviso de recepção sem que este seja devolvido ao tribunal citante.</font></i><br>
<i><font>45ª O facto de o aviso de recepção não ter sido devolvido não deixa perceber o que terá ocorrido com a carta de citação: foi recusada a assinatura do aviso de recepção? a carta foi entregue à citanda? ou a um terceiro? se foi a um terceiro, foi-lhe feita advertência de que a devia entregar prontamente à citanda e referida a respectiva cominação? quem assinou o documento interno dos correios dinamarqueses constante dos autos? em que qualidade terá assinado esse documento? Representava a Ré?</font></i><br>
<i><font>Nada resulta dos autos que permita tirar conclusões, nem dar como provados quaisquer factos a este respeito.</font></i><br>
<i><font>46ª Não pode deixar de concluir-se que o acto de citação da Ré foi completamente omitido, ocorrendo nulidade de tudo quanto se processou depois da petição inicial, por a Ré não ter sido citada.</font></i><br>
<i><font>47ª Prevê, ainda, o nº 2 do artº 682º do CPC que “A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no nº 3 do artigo 674º”.</font></i><br>
<i><font>48ª Decorre dos citados preceitos legais a admissibilidade da presente revista visando a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto.</font></i><br>
<i><font>49ª Tendo em conta as limitações/restrições legais para a interposição do recurso de revista, a Recorrente mantém, porque apenas só quanto a esses pode manter, este fundamento no que concerne aos factos constantes de 1, 2, 19 e 20 da Fundamentação de Facto.</font></i><br>
<i><font>50ª Os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida são os documentos (8) juntos com a PI.</font></i><br>
<i><font>51ª A decisão que, no entender da Recorrente, deve ser proferida sobre as questões de facto aqui impugnadas (factos constantes de 1, 2, 19 e 20 da Fundamentação de Facto) deve ser a de dar esses factos como não provados.</font></i><br>
<i><font>52ª A constituição de sociedades, o seu objecto social e a sua sede estão sujeitas por lei a documento escrito, legalmente denominado por “Contrato de Sociedade”, como estabelece o artº 7º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais (CSC).</font></i><br>
<i><font>53ª Uma sociedade não tem existência jurídica sem a celebração do respectivo contrato de sociedade, ou, noutra formulação, sem contrato de sociedade não há sociedade, sendo certo, ademais, que do Contrato de Sociedade devem constar obrigatoriamente, de entre outros elementos, o seu objecto e a sua sede, conforme artº 9º, nº 1, do CSC.</font></i><br>
<i><font>54ª Nos termos do artº 5º do CSC, as sociedades só gozam de personalidade jurídica e existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem. </font></i><br>
<i><font>55ª Nos termos do nº 1 do artº 3º do Código do Registo Comercial, a constituição das sociedades comerciais está sujeita a registo obrigatório.</font></i><br>
<i><font>56ª Não se aceita por absoluta falta de fundamento o entendimento que foi sufragado pela Relação no sentido de que a constituição e funcionamento da autora e ré se regem pela lei dinamarquesa e que para demonstração dos factos referentes à sede e ao objecto das sociedades autora e ré não exige a lei formalidade especial, nem pressupor que só possam ser provados por documento escrito.</font></i><br>
<i><font>57ª Invocar a Relação que as sociedades autora e ré se regem pela lei dinamarquesa só poderia ter algum efeito útil e procedente se ela, a Relação, conhecer essa lei e souber que a mesma, ao contrário da portuguesa, não exige a formalidade de documento escrito para a sua constituição, no caso o contrato de sociedade, e dispensa o registo definitivo do contrato pelo qual se constituem para gozarem de existência e personalidade jurídicas!</font></i><br>
<i><font>58ª A Relação nada refere sobre isso, nada refere sobre se conhece e domina ou não a lei dinamarquesa, pelo que não pode prevalecer um juízo que sempre será meramente opinativo, especulativo ou conjectural, sem qualquer relevância jurídica ou processual.</font></i><br>
<i><font>59ª O que não podiam as instâncias era dar como provados factos num processo judicial a correr termos em Portugal que, de acordo com a Lei Portuguesa, carecem de forma escrita, ou seja, factos para cuja prova se exige documento escrito, sem que essa prova haja sido feita.</font></i><br>
<i><font>60ª A falta de impugnação dos factos da P. I. é insusceptível de dar os factos 1 e 2 da Fundamentação de Facto como provados, sendo certo que nem sequer se trata de confissão judicial expressa e/ou escrita (cfr., a contrario, artº 364º, nº 2, do Código Civil)!</font></i><br>
<i><font>61ª A Relação, ao fazer o enquadramento desta questão, cita, acertada e correctamente, a alínea d) do artº 568º do CPC e o artº 364º do Código Civil, (“Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou particular, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior”) mas acaba por tomar decisão que está em oposição com esses fundamentos.</font></i><br>
<i><font>62ª Em rigor, o acórdão recorrido enferma de nulidade enquanto os fundamentos estão em oposição com a decisão, nos termos conjugados do nº 1 do artº 666º e da alínea c) do nº 1 do artº 615º ambos do CPC, que expressamente se invoca com as legais consequências!</font></i><br>
<i><font>63ª A Relação não podia dar como provados os factos 19 e 20 da Fundamentação da Facto, concretamente, que a Masai Clothing celebrou com a autora, como seguradora, um contrato de seguro para cobertura dos riscos de perdas e danos ou de extravio resultantes do transporte de mercadorias (facto 19) e que aquela seguradora pagou à Masai € 117.137,89 que a sub-rogou nos direitos, faculdades e créditos sobre a ré, aqui Recorrente (facto 20).</font></i><br>
<i><font>64ª Os documentos 5 e 6 juntos com a Petição Inicial foram juntos em língua dinamarquesa, o nº 5, e em língua inglesa, o nº 6, sendo certo que não foi apresentada a sua tradução (cfr. artºs 133º e 134º do CPC).</font></i><br>
<i><font>65ª Não podiam, nem deviam, as Instâncias considerar esses documentos escritos em inglês e dinamarquês para dar como assentes e provados os factos 19 e 20 da Fundamentação de Facto, que devem ser tidos como não provados!</font></i><br>
<i><font>66ª A Relação considera que a 1ª instância “bastou-se com os documentos juntos sem a respectiva tradução, o que tem implícito um juízo de desnecessidade da sua tradução” (Sic.).</font></i><br>
<i><font>67ª Constituiria o mais puro dos arbítrios, e não mero poder discricionário, que os tribunais, seja ele qual for, pudessem dispensar a tradução de documentos em língua estrangeira, seja inglês, japonês, mandarim, russo ou dinamarquês, sem expressamente consignar nos autos não só que o tribunal tem por dispensável ou desnecessária a sua tradução, como fundamentar um tal despacho ou decisão.</font></i><br>
<i><font>68ª Como princípio e regra, temos que nos actos judiciais se usa a língua portuguesa, conforme dispõe o nº 1 do artº 133º do CPC, pelo que os documentos oferecidos e língua estrangeira carecem de tradução, devendo o juiz, oficiosamente ou a requerimento de alguma parte, ordenar que o apresentante a junte, conforme dispõe o nº 1 do artº 134º do CPC.</font></i><br>
<i><font>69ª No caso de o juiz ter por dispensável ou desnecessária a tradução, deve dizê-lo de forma expressa e fazê-lo consignar fundamentadamente nos autos, assim possibilitando às partes exercer pronúncia e defesa sobre uma tal posição, o que não fez!</font></i><br>
<i><font>70ª Ter, agora, depois da sentença proferida, como implícito que, afinal, o tribunal teve por desnecessária a tradução, ofende os mais básicos princípios jurídicos, substantivos e processuais, para além de constituir um atropelo aos elementares direitos de defesa e de contraditório.</font></i><br>
<i><font>71ª Relembre-se que está em causa a celebração de um contrato de seguro (no ponto 5 da Fundamentação de facto) e uma sub-rogação (no ponto 6 da Fundamentação de facto).</font></i><br>
<i><font>72ª De acordo com o Decreto-Lei nº 72/2008, de 16.04, que aprova o Regime</font></i><br>
<i><font>Jurídico do Contrato de Seguro, o segurador é obrigado a formalizar o contrato de seguro num instrumento escrito, que se designa por apólice de seguro, e a entregá-lo ao tomador do seguro, devendo a mesma ser datada e assinada pelo segurador e a apólice conter os elementos discriminados no artº 37º do mesmo decreto-lei (cfr., artº 32º do citado diploma).</font></i><br>
<i><font>73ª As citadas normas são absolutamente imperativas, não admitindo convenção em sentido diverso, como decorre do artº 12º, nº 1, do mesmo diploma legal.</font></i><br>
<i><font>74ª O argumento da Relação de que se têm de considerar esses factos provados mercê a revelia operante da Recorrente constitui uma flagrante violação quer da alínea d) do artº 568º do CPC quer o artº 364º do Código Civil, que dispõe que “Quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento autêntico, autenticado ou particular, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior”.</font></i><br>
<i><font>75ª E não se obtempere com a circunstância de a Recorrida ter junto com a P.I. os docs. 5 e 6 para fazer prova desses factos, pois que os mesmos não foram traduzidos da língua dinamarquesa para a língua portuguesa, pelo que as instâncias não os tomaram, nem podiam ter tomado, em consideração, nem lhes deram, nem poderiam ter dado, qualquer crédito, sob pena de admissão e produção de prova nula!</font></i><br>
<i><font>76ª A Revista é ainda admissível com fundamento na contradição entre o acórdão proferido, e aqui recorrido, com, pelo menos, um outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, como nisso, aliás, convém e cita a própria Relação.</font></i><br>
<i><font>77ª Trata-se do Acórdão do STJ de 06.07.2006, in www.dgsi.pt , e que constitui o acórdão-fundamento, do qual aqui se junta cópia (cfr. Doc. 1).</font></i><br>
<i><font>78ª Os aspectos de identidade que determinam a contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento resultam evidenciados no próprio acórdão recorrido, como se transcreve:</font></i><br>
<i><font>“Resumidamente, sobre o tema podemos elencar duas posições distintas:</font></i><br>
<i><font>i) Uma primeira, tem recusado a aplicação do art. 29º do CMR, por considerar que se não for provada a prática de conduta dolosa, mas tão só negligente, as causas exonerativas e limitativas da responsabilidade não devem ser excluídas, estribando-se para o efeito no facto de o nosso ordenamento jurídico não permitir a equiparação entre dolo e negligência.</font></i><br>
<i><font>A esse propósito, segundo o Ac. do STJ de 06.07.2006 (relator Oliveira Barros), in www.dgsi.pt, na esteira do acórdão do STJ de 17.05.2001 (relator Nascimento Costa), in CJ, T. II, p. 91, no caso de desaparecimento da mercadoria transportada as regras dos arts. 17.º e 23.º da C.M.R. só seriam de excluír se fosse permitido “(…) concluir com segurança que esse desaparecimento da mercadoria transportada as regras dos arts. 17º e 23.º da C.M.R., só seriam de excluir se fosse permitido “…” concluir com segurança que esse desaparecimento (das mercadorias) tenha resultado de acto voluntário do pessoal ao serviço da transportadora, susceptível de justificar o afastamento desse regime-regra (…)”, pois só nos casos de dolo ou falta equivalente – como sucede em ordenamento jurídico que tal contemple, como o francês, no caso da denominada negligência grosseira (faute lourde) – por parte do transportador, seria de aplicar art. 29.º da C.M.R.; no direito português, a equiparação da negligência grosseira ao dolo apenas teria surgido, pontualmente, como novidade, com a reforma processual civil operada em 1995/96, para o restrito efeito de condenação por litigância de má fé (cfr. art. 456º CPC), pelo que, havendo mera culpa do transportador, responderia este dentro dos limites estabelecidos no n.º 3 do art.º 23 da CMR.</font></i><br>
<i><font>ii) Uma segunda posição, expressa por exemplo no acórdão do STJ de 14/06/2011 (relator Hélder Roque), in www.dgsi.pt, onde se entendeu que “uma falha que segundo a lei da jurisdição que julgar o caso seja considerada equivalente ao dolo, como acontece com a jurisdição nacional, não pode deixar de ser, manifestamente, face à legislação nacional, enquanto elemento do nexo de imputação do facto ao agente, a negligência ou mera culpa que, conjuntamente com o dolo, faz parte da culpa lato sensu”.</font></i><br>
<i><font>79ª O acórdão recorrido adere e sufraga a sua posição (que coincide e se identifica com a do Acórdão do STJ de 14.06.2011 que cita), nos seguintes termos:</font></i><br>
<i><font>“O fundamento em que se estriba esta segunda concepção enfatiza, assim, o princípio basilar erigido no nosso sistema jurídico de que também a mera culpa está abrangida pelo juízo de reprovavilidade que se erige como pressuposto da responsabilidade.</font></i><br>
<i><font>Propendemos para esta última corrente jurisprudencial porque julgamos ser a que melhor se coaduna com a letra e o espírito da Convenção.” (Sic.).</font></i><br>
<i><font>80ª A nossa discordância com este entendimento é total e absoluta, embora com todo o respeito pela jurisprudência quer do acórdão recorrido, quer da jurisprudência nele citada.</font></i><br>
<i><font>81ª Aliás, um dos arestos citados no acórdão recorrido (Ac. do STJ, de 30.04.2019, relatado pela Senhora Juíza-Conselheira Maria dos Prazeres Beleza), admite claramente a distinção entre dos dois conceitos e a relevância dessa distinção:</font></i><br>
<i><font>“…, de forma genérica e expressa – artigo 494º do Código Civil – , a lei portuguesa apenas prevê no âmbito da responsabilidade extra-contratual que o julgador possa fixar uma indemnização em montante inferior aos danos causados, segundo a equidade e atendendo a certos critérios que enumera – entre os quais se encontra o grau de culpabilidade do lesante –, quando a responsabilidade se fundar em mera culpa; mas não se pode ignorar que o mesmo Código Civil considera relevante a distinção entre dolo e negligência em outros casos de responsabilidade contratual, (…), sendo naturalmente de responsabilidade contratual que estamos a falar, no caso; nem que o Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado por diversas vezes que a possibilidade de redução da indemnização, prevista no artigo 494º do Código Civil, é também aplicável no domínio da responsabilidade contratual.” (Sic., com sublinhados nossos).</font></i><br>
<i><font>82ª Os arestos citados no acórdão recorrido que entendem que a ordem jurídica portuguesa faz equiparação entre dolo e a mera culpa também no âmbito da responsabilidade contratual fazem-no por referência à imputação da responsabilidade, no sentido que o devedor que falta ao culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, abrangendo aqui “culposamente” a dimensão quer da mera culpa quer do dolo (cfr. artºs 798º e 799, nº 2, do CC).</font></i><br>
<i><font>83ª Na ordem jurídica portuguesa há norma expressa que prevê a “limitação da responsabilidade no caso de mera culpa”, como decorre do artº 494º do Código Civil, e de que a Senhora Conselheira Maria dos Prazeres Beleza dá | [0 0 0 ... 0 0 0] |
9zFdu4YBgYBz1XKv2Ps3 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><br>
<font>ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA</font><br>
<p><font>(1ª SECÇÃO)</font><br>
</p><p><font> </font></p></div><br>
<br>
<font>I – RELATÓRIO</font><br>
<p><font> </font><br>
</p><p><font>Nos autos de expropriação por utilidade pública, em que é Expropriante Brisa – Concessão Rodoviária, S.A., e são Expropriados, AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK e LL, e expropriados habilitados, MM, NN, OO, PP, QQ e RR, vieram estes últimos e FF, por um lado, e GG, KK, JJ, II, HH, AA, DD, EE, BB e LL, por outro lado, interpor recurso da </font><i><font>decisão</font></i><font> </font><i><font>arbitral</font></i><font> de 19.04.2011, que fixou a indemnização devida àqueles em </font><b><font>€ 119.178,00</font></b><font>, pela expropriação da parcela </font><b><i><font>21</font></i></b><font>, com a área de 19.863 m2, a destacar do prédio rústico, denominado “</font><i><font>...</font></i><font>”, sito na freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...66 e inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo ...º, seção .. da referida freguesia - bem como invocar a </font><i><font>caducidade</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>declaração</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>utilidade</font></i><font> </font><i><font>pública</font></i><font> expropriativa.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foi também interposto recurso do despacho de adjudicação proferido em 18.08.2011. </font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por despacho nº ...09, de 27.07., do Exmo. Sr. Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República, II Série, nº 148, de </font><b><i><font>03</font></i></b><font>.</font><b><i><font>08</font></i></b><font>.</font><b><i><font>2009</font></i></b><font>, </font><b><i><font>foi declarada a utilidade pública</font></i></b><font>, com carácter de urgência, da expropriação da parcela acima identificada.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>No dia 10.03.2010 foi efectuada a vistoria “</font><i><font>ad</font></i><font> </font><i><font>perpetuam</font></i><font> </font><i><font>rei</font></i><font> </font><i><font>memoriam</font></i><font>”, cujo auto consta de fls. 138 e ss., tendo sido complementado a fls. 197 e ss. </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Procedeu-se à </font><i><font>arbitragem</font></i><font>, de que foi apresentado o relatório consta de fls. 310 e segs., tendo aí os Srs. Árbitros fixado o valor da indemnização pela expropriação da parcela em causa em </font><b><u><font>€ 119.178,00</font></u></b><font>, mediante a aplicação de um valor unitário médio ponderado </font><b><i><font>de € 6,00 por m2.</font></i></b><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Como </font><u><font>fundamento do recurso da decisão arbitral</font></u><font> foi alegado: </font><br>
</p><p><font>- Pelos Expropriados habilitados e pela Expropriada FF dever ser a parcela classificada como “</font><i><font>solo</font></i><font> </font><i><font>apto</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>construção</font></i><font>” e não como “</font><i><font>solo</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>outros</font></i><font> </font><i><font>fins</font></i><font>” como considerado pelos Srs. Árbitros, em virtude de antes da emissão da declaração de utilidade pública encontrar-se já aprovado o PDM actualmente em vigor, aprovado por Deliberação da Assembleia Municipal de 14.07.2009, publicado no D.R., 2ª Série, nº 224, em 18.11., e que enquadra a parcela em “</font><i><font>Solos</font></i><font> </font><i><font>cuja</font></i><font> </font><i><font>urbanização</font></i><font> </font><i><font>seja</font></i><font> </font><i><font>possível</font></i><font> </font><i><font>programar</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>Espaços</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>Multiusos</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>Unidade</font></i><font> </font><i><font>Operativa</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Planeamento</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>Gestão</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>U1</font></i><font> </font><i><font>Expansão</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>Plataforma</font></i><font> </font><i><font>Logística</font></i><font>”, devendo em consequência o valor real da parcela aferir-se em função dos índices urbanísticos constantes do actual PDM e dos quais resulta o valor indemnizatório de € 100,37 por m2, num total de € 1.993.805,30;</font><br>
</p><p><font>- Pelos demais Expropriados recorrentes foi defendida a aplicabilidade do PDM anteriormente referido (questão que suscitaram como prévia) e a classificação da parcela como “</font><i><font>solo</font></i><font> </font><i><font>apto</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>construção</font></i><font>” em virtude dessa aplicabilidade e do conjunto das infra-estruturas urbanísticas de que a parcela dispõe, bem como da zona envolvente, concluindo pela ponderação de critérios daí advenientes dos quais referem resultar o valor indemnizatório de € 120,00 por m2, num total de € 2.383.560,00, ao qual referiram dever ainda acrescer indemnização pela desvalorização da área sobrante do prédio de onde é destacada a parcela expropriada.</font><br>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A Expropriante respondeu a fls. 648 e segs. e 655 e segs., pugnando pela improcedência de </font><i><font>caducidade</font></i><font> suscitada caso não se conclua pela incompetência dos Tribunais comuns para a sua apreciação e pela manutenção da decisão arbitral.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por despacho de 28.12.2012 foi decidido dever ser aplicável no caso o PDM publicado no D.R., 2ª Série, nº 64, de 13.03.1993, e não o PDM publicado no D.R., 2ª Série, nº 224, em 18.11.2009, porquanto, apesar de este se encontrar já aprovado à data da declaração de utilidade pública, não se encontrava ainda em vigor.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Foram admitidos ambos os recursos da decisão arbitral e por despacho proferido em 14.10.2013 foi ordenada a realização da </font><i><font>avaliação</font></i><font> em conformidade com o disposto no artº 61º do Código das Expropriações.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Realizada a avaliação, foi o respectivo relatório junto aos autos a fls. 1015 e ss., tendo o perito indicado pelos Expropriados recorrentes discordado do parecer dos demais peritos nos termos constantes desse relatório.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>As partes foram notificadas para apresentarem alegações, vindo, no essencial, manter o por si alegado nos respectivos requerimentos de interposição de recurso da decisão arbitral e de resposta ao mesmo, </font><i><font>tendo os Expropriados habilitados e a Expropriada FF concluído agora por uma indemnização no valor de € 88,23 por m2, num total mínimo de € 1.752.662,18 (cfr. fls. 1153 e segs.)</font></i><font>; </font><i><font>os demais expropriados recorrentes por uma indemnização no valor de € 67,46 por m2, por ser o valor de mercado da parcela expropriada correspondendo ao valor pelo qual o prédio contíguo foi transaccionado em 2008; ou de € 60,00 dado ser esse o valor pelo qual acordaram com a Câmara Municipal a expropriação amigável de várias parcelas expropriadas para o mesmo projecto; ou ainda, caso assim se não entenda, de € 47,64 m2 nos termos calculados pelo perito por si indicado no relatório pericial (cfr. fls. 1177 e segs.).</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>A Expropriante pugnou pela manutenção do laudo pericial maioritário (cfr. fls. 1360 e segs.).</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por despacho de 25.10.2016 foi determinado que se oficiasse às Finanças nos termos e para os efeitos do disposto no artº 27º, nºs 1 e 2 do C.E., vindo a ser juntas pela Direcção de Serviços do IMT as listas de transacções fiscais de fls. 1631 e segs. e de fls. 1714 e segs.</font>
</p><p><font>Notificados de tais listas os Srs. Peritos vieram pronunciar-se nos termos constantes de fls. 1958 e segs. e 2018 e segs.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por ter sido requerido admitiram-se alegações complementares pelas partes o que as mesmas vieram fazer a fls. 2031 e segs. e 2034 e segs.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Por despacho de 18.03.2019 foi determinado que os Srs. Peritos viessem proceder nos termos do artº 29º, nº 1 do C.E. ou justificar circunstanciadamente a não avaliação da parte não expropriada mediante os respectivos pressupostos previstos no nº 4 do artº 29º do C.E.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Os Srs. Peritos justificaram a não avaliação da parte sobrante nos termos constantes de fls. 2068 e segs.</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Na sequência do determinado por despacho de 19.06.2019 vieram os Expropriados GG e outros juntar, a fls. 2077 e segs., </font><b><i><font>certidão da sentença proferida no processo nº 4584/11.... deste Juízo que versou sobre a indemnização pela expropriação das parcelas 15, 15.1 e 15.2 a destacar de prédio contíguo à parcela 21 objecto dos presentes autos, e do Acórdão da Relação ... entretanto aí proferido que a revogou parcialmente, com menção do respectivo trânsito em julgado.</font></i></b>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Saneado tabelarmente o processo foi proferida </font><b><i><font>sentença</font></i></b><font> com dispositivo do seguinte teor:</font>
</p><p><i><font>“V - Decisão</font></i>
</p><p><i><font>Pelo exposto, tudo visto e ponderado, julgo parcialmente procedente os recursos interpostos pelos recorrentes expropriados e fixo em € 1.350.684,00 (um milhão trezentos e cinquenta mil seiscentos e oitenta e quatro euros) a indemnização a atribuir pela expropriante aos expropriados, valor a ser atualizado nos termos do artº 24º, nºs 1 e 2 do C.E. até à data da notificação do despacho que autorizou o levantamento do montante depositado pela expropriante nos autos, incidindo a atualização, a partir de então e até à decisão final, sobre a diferença entre o montante atualizado até essa data e o montante depositado.”</font></i>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Inconformada, recorreu a Expropriante para a Relação, a qual, por acórdão de 05.11.2020, </font><i><font>julgou o recurso procedente e, em consequência revogou parcialmente a sentença decorrida e fixou em 186 712,20€ (cento e oitenta e seis mil setecentos e doze mil euros e vinte cêntimos) a indemnização a atribuir pela expropriante aos expropriados, valor a ser actualizado nos termos do artº 24º nºs 1 e 2 do CE até à data da notificação do despacho que autorizou o levantamento do montante depositado pela expropriante nos autos, incidindo a actualização, a partir de então e até à decisão final sobre a diferença entre o montante actualizado até essa data e o montante depositado.</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><font>Inconformados, os Expropriados FF e outros, interpuseram </font><b><i><font>recurso</font></i></b><font> </font><b><i><font>de</font></i></b><font> </font><b><i><font>revista</font></i></b><font> do aludido acórdão de 05/11/2020, invocando fazê-lo ao abrigo do art.º 629º nº 2 al. d) do CPC, indicando como acórdão fundamento o acórdão desta Relação de 09/03/2017, proferido no processo 4584/11…, junto e certificado nos autos.</font>
</p><p><font>No termo da respectiva alegação formulam as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>a) O presente recurso de revista tem vem interposto do Acórdão da Relação ..., de 6 de Novembro de 2020, no qual se decide revogar parcialmente a sentença então recorrida e fixar novo montante indemnizatório a atribuir aos ora Recorrentes/Expropriados pela ablação do seu direito de propriedade.</font>
</p><p><font>b) O Acórdão recorrido padece de várias insanáveis nulidades, conforme indicado pelos co-expropriados em requerimento 24/11/2020, junto ao autos, e que desde já se subscrevem integralmente, como, tão ou mais grave, e acima de tudo, o mesmo se encontra em profunda contradição com aresto do mesmo Tribunal da Relação ..., justificando, por isso, que se traga à colação o regime disposto no art.º 629, n.º 2, alínea d) do CPC, e se lance mão desta forma de recurso de revista.</font>
</p><p><font>c) Para além de outro aspecto, fundamenta o Acórdão recorrido a sua decisão de revogar parcialmente a sentença, e impor um novo valor indemnizatório, na impossibilidade de ter em consideração, para efeitos de determinação desse valor, qualquer outro aspecto que não seja a classificação urbanística do solo à data da emissão da DUP, que, no caso, seria a que decorria do PDM ..., que estava suspenso, e, nessa medida, sendo a parcela 27 em causa integrada em RAN, o regime jurídico que determina a forma de alcançar o valor da indemnização deve ser o que decorre da conjugação dos art.º 23 n.º 1, 24º n.º 1 e 27º n. 3, todos do CE, remetendo-se para os “rendimentos agrícolas” da referida parcela, dado não ser possível a aplicação do n.º 1 e 2 do art.º 27º.</font>
</p><p><font>d) Por sua vez, o Acórdão fundamento é um Acórdão da Relação ..., de 9 de Março de 2016, proferido no processo n.º 4584/11…, transitado em julgado em 18.4.2017, em que figuraram como recorridos e recorrentes as mesmas partes que aqui figuram no presente recurso, e a parcela a expropriar uma parcela a destacar do mesmo prédio de onde se destaca a parcela objecto desta expropriação.</font>
</p><p><font>e) O Acórdão ora recorrido, no ponto 2. da sua Fundamentação (matéria de facto fixada pela 1ª instância) e Ponto 3.1., dá por assente que a parcela 15.2 é contigua à parcela 21, a primeira uma das que estava em causa no Acórdão Fundamento, a segunda a que está em causa no Acórdão recorrido.</font>
</p><p><font>f) Do sumário do Acórdão fundamento, percebe-se com toda a clareza que a ratio que esteve presente na determinação do direito aplicável ao caso, ao contrário do aresto recorrido, foi uma e apenas, a saber: alcançar o valor real de mercado do bem e consubstanciar o conceito constitucional e legal de justa indemnização.</font>
</p><p><font>g) Ditou Acórdão fundamento que, sem prejuízo da classificação da parcela a expropriar como “solo apto para outros fins”, resultando evidentes, da realidade urbanística então existente e processo expropriatório, circunstâncias e factos que podem ter relevância a nível da determinação valor da mesma, é lícito, se não mesmo obrigatório, recorrer a tais circunstância e elemento se tal se mostrar imprescindível a determinar o valor real de mercado do bem a expropriar conforme decorre dos art.ºs 23º, n.º 1 e 5 do C.E, de forma que seja possível encontrar verdadeira e efectivamente uma ” justa indemnização”.</font>
</p><p><font>h) Se que tais “circunstâncias objectivas”, como diz a lei, que podem ser de vária ordem, passaram, no caso, por se considerarem as soluções urbanísticas desenhadas por um PDM já aprovado, mas ainda não publicado (PDM 2009), ao invés das que decorrem de um PDM (1993), em revisão e suspenso, por ser evidente que as primeiras já estavam a exercer influência no valor de mercado da dita parcela mesmo antes da publicação desse PDM, e muito antes da emissão da DUP, então é lícito trazê-las “para dentro do processo” de expropriação.</font>
</p><p><font>i) São, pois, três os vectores essenciais da decisão: o primeiro a reafirmação de que o critério a ter em conta na determinação da indemnização é sempre e necessariamente, por imposição legal, o que permita obter o valor real de mercado; o segundo, o de que mesmo estando em causa “solos aptos a outros fins” é perfeitamente lícito a aferição de outras circunstâncias objectivas que possam influir nesse valor, sem que tal altere essa classificação, conforme o legislador do art.º 27º, n.º 3 do C.E. impõe; o terceiro que o objectivo último é sempre o de encontrar a “justa indemnização”.</font>
</p><p><font>j) Confrontado esta decisão fundamento com a decisão recorrida há que reconhecer é difícil encontrar um caso em que seja tão evidente a existência de uma identidade da questão de direito; em que seja tão explicita a identidade quanto ao quadro normativo em que se move a questão; em que seja tão evidente a frontal contradição entre Acórdãos: há, pois, identidade de questão jurídica; há frontal oposição ou contrariedade; há igual quadro normativo.</font>
</p><p><font>k) O Acórdão fundamento, sem colocar em causa a classificação – formal – da parcela à data da DUP, e, nessa medida, não deixando de a classificar como “solo apto a outros fins”, socorre-se do disposto nos art.º 23 n.º 5, e parte final do artigo 27º, n.º 3, do Código das Expropriações, de forma a aplicar o único critério que deve estar sempre presente na determinação do valor indemnizatório e que decorre art.º 23º, n.º 1 e 5, e, dessa forma, fazer coincidir os conceito formal e material de “justa indemnização”, tal qual ele decorre do art.º 62º da Lei Fundamental.</font>
</p><p><font>l) O Acórdão recorrido, percorre-se uma parte deste caminho, aquele que vai até à classificação formal da parcela contigua à parcela objecto do Acórdão fundamento, mas, depois, ignorando todas circunstâncias objectivas referentes ao planeamento urbanístico que já determinava a realidade e os elementos fácticos existentes no processo, em tudo idênticos aos existentes no caso que deu origem ao Acórdão fundamento, abandona o critério que o legislador considera como sendo o único critério para aferição do valor do bem a expropriar, ou seja, o do valor real de mercado, conforme decorre do art.º 23º, n.º 1 e 5, do C.E., e desconsiderando-o e bem assim como a parte final da norma constante do art. 27º, n.º 3, do C.E, afastando-a de forma absolutamente incompreensível e insustentável.</font>
</p><p><font>m) Olvida por completo a decisão recorrida que, como refere o Acórdão fundamento, “ainda que à data da DUP o novo PDM não tivesse eficácia, porque ainda não publicado, o mesmo já fora aprovado, e, antes disso, tivera lugar, repete-se, todo o percurso conducente a que aquelas potencialidades fossem praticamente uma realidade” e por isso mesmo, “havia um expectativa firma e segura com laivos de certeza iminente de a parcela estar inserida em espaço classificado como “ Espaço para Multiusos”, deixando de estar afecta à RAN..”, e, nessa medida, o valor real de mercado (art.º 23º, n.º 1 e 5 do C.E.), aquilo que no mercado a parcela valeria para qualquer comum mortal, tinha necessária e obrigatoriamente a influência dessas “condicionantes objectivas”. </font>
</p><p><font>n) O Acórdão recorrido, ao contrário do Acórdão fundamento, desconsidera totalmente o critério do valor real do mercado, decidindo que não pode haver lugar a outra forma de determinação do valor indemnizatório que não seja a que remete para os “rendimentos agrícolas” da parcela expropriada dada a sua classificação como “solo apto a outros fins” à data da DUP.</font>
</p><p><font>o) Olvidam-se todas as demais condições objectivas e todos os elementos carreados para o processo, que obrigavam a decisão jurídica diversa, o mesmo é dizer, mutatis mutandis, a decisão idêntica à do Acórdão fundamento, mas agora a incidir na parcela </font>
</p><p><font>p) Salvo o devido respeito, o Acórdão recorrido chega a uma solução sem sequer aferir se a mesma colide ou não com o direito a uma “justa indemnização”, tal qual ele se encontra desenhado no art.º 23º, n.º 1 e 5 do C.E., e art.º 62º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, e se, do mesmo passo, se fere ou não o princípio da igualdade as legitimas expectativas dos expropriados e, portanto, o princípio da confiança.</font>
</p><p><font>q) Como bem demonstra o Acórdão fundamento, e devia ter acolhido o Acórdão recorrido, “o encadeamento das circunstâncias relativas à classificação das parcelas (…) oferece alguma singularidade”, e, por isso, era obrigatório, para quem quisesse encontrar o valor real do bem no mercado, tomá-las em consideração, dando assim cumprimento ao princípio da igualdade e ao da justa indemnização, que foi aliás, o que fez o Acórdão fundamento.</font>
</p><p><font>r) Arredar da discussão sobre a forma de determinação do valor indemnizatório de “solos aptos a outros fins” as circunstâncias objectivas que evidentemente bulem com o valor de mercado dos terrenos em causa, é, em primeiro lugar, desconsiderar o disposto no art.º 23º, n.º 1 e 5, do C.E., e, em segundo, e por arrasto, fazer tábua rasa do princípio da igualdade como princípio orientador de todo o processo expropriativo, uma leitura dessas normas que permita o repúdio dessas circunstâncias objectivas, a ser aceite, tem de se ter por inconstitucional, por violação dos art.º 62º e 13º, da Lei Fundamental, o que desde já se deixa arguido.</font>
</p><p><font>s) A circunstância de uma parcela, por inserida em REN ou RAN, ser classificada como “solo apto a outros fins” em nada bule com a obrigatoriedade de encontrar o valor real e de mercado da mesma no âmbito de um processo expropriatório.</font>
</p><p><font>t) Conforme o Acórdão fundamento se permitiu dizer, mas não foi seguido pelo Acórdão recorrido, “o valor dos bens deverá ser calculado de acordo com os critérios</font>
</p><p><font>referenciais constantes dos art.º 26º e seguintes do Código das Expropriações, devendo responder a valor real de corrente dos mesmos numa situação normal de mercado, podendo o tribunal atender a outros critérios na avaliação para alcançar o dito valor” (n.º 5 do art. 23).</font>
</p><p><font>u) A ideia chave que está no Acórdão fundamento e que é contrariada pelo Acórdão recorrido parece ser esta: a lei impõe que de forma a atribuir uma justa indemnização que se encontre o valor de mercado do bem; se para alcançar esse valor for necessário ter em conta outras circunstâncias objectivas para além das que resultam da natural classificação urbanística do solo, o legislador permite, e o princípio da igualdade e da justa indemnização impõem, 31 que se tenham em consideração tais circunstâncias, sem que isso altere a classificação urbanística do solo ou sem que esta obstaculize a tal desiderato.</font>
</p><p><font>v) E essencialmente neste peculiar aspecto que reside a discordância e a profunda contrariedade entre os arestos, ou seja, na circunstância de ambos, com base numa factualidade idêntica, para não dizer igual, e um mesmo quadro jus-normativo, serem frontalmente contraditórios quanto à norma/regime jurídico aplicável, chegando a resultados dialetalmente opostos quando à forma de determinar a justa indemnização.</font>
</p><p><font>w) Independentemente da óbvia ligação entre os valores de mercado praticados à data da DUP, e as directrizes urbanísticas decorrentes do PDM de 2009, e a obrigatoriedade legal das ter em consideração, por via do disposto nos art.ºs 23, n.º 1 e 5, e art.º 27º, n.º 3, in fine, todos do C.E., a verdade é que existindo no processo, como existiam, elementos mais que suficientes para determinar o valor de mercado da parcela expropriada, impunha-se dar cumprimento ao disposto no art.º 23, n.º 1 e 5 do C.E, como o fez o Tribunal da Relação ..., no douto Acórdão fundamento, pois, em última análise, é esse e sempre esse o parâmetro indemnizatório em caso de expropriações.</font>
</p><p><font>x) O Acórdão recorrido limita-se a fazer uma “colagem”, acrítica, a um relatório de avaliação, o qual se limita a fazer um raciocínio linear e puramente formal, desligado de toda a factualidade existente, e, portanto, o que se encontra é uma errada determinação do regime jurídico a aplicar para efeitos de aferição do justo valor indemnizatório.</font>
</p><p><font>y) O Acórdão recorrido limita-se a aplicar sem mais o PDM de 1993, – ainda que dê por provada a sua suspensão à data da DUP - remetendo para o art.º 27 n.º 3 do C.E., ao contrário do que se faz, e bem, no Acórdão fundamento, desconsiderar o único regime jurídico-urbanístico efectivamente capaz de fixar a justa indemnização nos termos do disposto no art.º 23º, n.º 1 e n.º 5, do Código das Expropriações.</font>
</p><p><font>z) Ao não ter em consideração todas as circunstâncias (de facto e de direito) que condicionavam a decisão final, o Acórdão recorrido incorreu, salvo o devido respeito, em flagrante erro, e em frontal oposição com o Acórdão fundamento, propondo uma solução jurídica contraditória com a solução por este avançada, que é, em rigor salvo o devido respeito, a única juridicamente possível e em consonância com a lei e a Constituição, nesta matéria.</font>
</p><p><font>aa) A solução encontrada pelo Acórdão recorrido, que é diametralmente oposta à que é preconizada pelo douto Acórdão recorrido, e que olvida por completo aquele que é o critério legal ao nível da determinação da justa indemnização, bule inaceitavelmente com o princípio da igualdade dos cidadãos perante encargos públicos e com o da confiança.</font>
</p><p><font>bb) Só há uma leitura jus-dogmática possível para um caso como este, a saber: aquela que é feita pelo Acórdão fundamento e que é frontalmente contraditória com a que é feita pelo Acórdão recorrido. </font>
</p><p><font>cc) A leitura feita pelo Acórdão recorrido do regime legal aplicável desemboca no num insustentável valor indemnizatório muito distante do que seria uma “justa indemnização”.</font>
</p><p><font>dd) Só o valor m2 encontrado pelo Acórdão fundamento, ou outro decorrente dos elementos juntos ao processo pelos Expropriados e pelo seu perito, através da metodologia por ele utilizada, pode valer como “justa indemnização”, e o Acórdão recorrido devia ter seguido “par e passo” essa mesma metodologia, de forma a chegar a um mesmo resultado jurídico, ou seja, a uma “justa indemnização” conforme é exigência legal e constitucional.</font>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font> </font>
<p><font>Igualmente inconformados, os Expropriados DD e outros, interpuseram </font><b><i><font>recurso</font></i></b><font> </font><b><i><font>de</font></i></b><font> </font><b><i><font>revista</font></i></b><font> do mesmo acórdão de 05/11/2020, ao abrigo do artº 629º nº 2, als. a) e d) do CPC, invocando violação de caso julgado e oposição de acórdão da mesma Relação, indicando como acórdão fundamento o já aludido acórdão desta Relação de 09/03/2016, proferido no mencionado processo 4584/11.....</font>
</p><p><font>Rematam a sua alegação com as seguintes conclusões:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1ª O Acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que conheceu questões que não foram invocadas pela Expropriante/Recorrente no seu recurso;</font>
</p><p><font>2ª O Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que, pretendendo fixar a indemnização de acordo com a metodologia/critérios adotados, ignorou todas as questões jurídicas que se discutiam no processo a propósito dessa metodologia e critério, bem como os factos assentes e os documentos juntos aos autos;</font>
</p><p><font>3ª O Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que ignorou a questão jurídica fundamental em discussão nos presentes autos: o valor de mercado da parcela expropriada demonstrado por várias escrituras públicas de compra e venda/expropriação amigável e por diferentes decisões judiciais;</font>
</p><p><font>4ª O Acórdão recorrido viola a autoridade de caso julgado do Acórdão do Tribunal da Relação ... de 09.03.2017, proferido sobre a mesma situação de facto e sobre as mesmas questões de direito que se discutem nos presentes autos, onde se decidiu que a justa indemnização deve ser fixada de acordo com o valor de mercado do terreno expropriado e fixou o valor de mercado deste tipo de terrenos nesta zona em € 68/m2 (art. 629º, nº 1, a., do CPC);</font>
</p><p><font>5ª O Acórdão recorrido viola o caso julgado formado na Sentença da 1ª Instância quanto à atendibilidade do valor unitário fixado para a parcela contígua e idêntica 15.2 (€ 68/m2) por força do princípio da igualdade e por ter suporte na avaliação pericial minoritária apresentada nos autos;</font>
</p><p><font>6ª O Acórdão recorrido está em oposição com o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação ... de 09.03.2017 quanto ao critério e metodologia indemnizatória a atender na expropriação por utilidade pública de solos – art. 629º, nº 2, d), do CPC; </font>
</p><p><font>7ª O Acórdão recorrido está em oposição com o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação ... de 09.03.2017 quanto às “circunstâncias objetivas suscetíveis de influir no respetivo cálculo” a que se deve atender nos termos e para os efeitos do art. 27º, nº 3, do Código das Expropriações – art. 629º, nº 2, d), do CPC.</font>
</p><p><font>8ª A interpretação do art. 23º do Código das Expropriações no sentido de não serem considerados como relevantes para efeitos indemnizatórios os efeitos económicos e materiais que as soluções urbanísticas de um plano diretor municipal já aprovado ao tempo da declaração de utilidade pública (embora ainda não publicado nessa data) produzia no valor de mercado dos solos expropriados, é inconstitucional por violação do princípio do Estado de Direito, do direito fundamental a uma justa indemnização e do princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos (arts. 62º e 13º da Constituição).</font>
</p><p><font> </font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>A Expropriante e recorrida BRISA AUTO ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., </font><i><font>respondeu, </font></i><font>pugnando pela inadmissibilidade das revistas; assim não se entendendo, pela inexistência de nulidades ou erro de julgamento no acórdão recorrido, o qual deve ser mantido.</font>
<p><font> </font></p><div><br>
<font>*</font>
<p></p></div><br>
<font>II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO</font>
<p><font>São os seguintes os factos que vêm fixados pelas instâncias:</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>1– Pelo despacho nº ...09, de 27.07., do Exmo. Sr. Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República, II Série, nº 148, de 03.08.2009, foi declarada a utilidade pública, com caráter de urgência, da expropriação da parcela nº 21, com a área de 19.863 m2, a destacar do prédio rústico, denominado “...”, sito na freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...66 e inscrito na respetiva matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...º, seção ...</font>
</p><p><font>2 – No dia 10.03.2010 foi efetuada a vistoria “ad perpetuam rei memoriam”, pelo perito permanente, conforme auto junto a fls. 138 e ss., complementado a fls. 197 e ss., cujo teor se dá aqui por reproduzido.</font>
</p><p><font>3 – Em 15.04.2010, a Brisa Auto Estradas de Portugal, S.A., entrou na posse administrativa da parcela em questão, conforme auto de fls. 203-205.</font>
</p><p><font>4 – Não tendo existido acordo das partes quanto à fixação da indemnização devida pela expropriação, foi realizada arbitragem, cujo relatório se encontra junto a fls. 310 e ss.</font>
</p><p><font>5 – Os árbitros deliberaram, por unanimidade, atribuir a título de indemnização aos expropriados a quantia de € 119.178,00 (cento e dezanove mil cento e setenta e oito euros).6 – A área da parcela nº 21 expropriada é de 19.863 m2 e o prédio de onde a mesma é destacada tem a área de 74.400 m2.</font>
</p><p><font>7 – A parcela nº 21 confronta a norte e sul com o restante do prédio, a nascente com P.…, S.A., e a Poente com a Estrada ....</font>
</p><p><font>8 – A parcela nº 21 tem um comprimento de cerca de 300 m e largura máxima de 90 m, desenvolvendo-se no sentido Nascente/Poente, com uma forma alongada, estando à data referida em 2) ocupada por herbáceos.</font>
</p><p><font>9 – A superfície do solo da parcela nº 21 é sensivelmente plana, sendo o solo de natureza aluvial.</font>
</p><p><font>10 – No extremo poente da parcela nº 21 existe arruamento asfaltado, rede de águas, rede elétrica, rede telefónica e rede de gás, existindo ainda redes de esgotos a cerca de 120m da extrema Norte da parcela.</font>
</p><p><font>11 – À data referida em 1) a parcela nº 21 estava enquadrada na “Área Agrícola ...”, estando inserida na RAN e na REN, de acordo com o PDM ... aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 16/93, publicada no DR n.º 64, I Série B, de 17.03 | [0 0 0 ... 0 0 0] |
azFdu4YBgYBz1XKvC_tm | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><br>
<font>ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA </font><br>
<p><font>(1ª SECÇÃO) </font></p></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><font>1 - RELATÓRIO</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>AA deduziu embargos à execução para pagamento de quantia certa que lhe move BB, alegando, em síntese:</font><br>
</p><p><font>O titulo executivo é uma sentença condenatória no pagamento de determinada quantia de 16 de Novembro de 1998; em 15 de Dezembro de 1998 foi intentada a respectiva execução; o Executado foi citado em 14 de Fevereiro de 2000; a instância foi declarada </font><i><font>deserta</font></i><font>, o que motivou o indeferimento do requerimento do Exequente para a </font><i><font>renovação</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>instância</font></i><font> </font><i><font>executiva</font></i><font>; desta forma, no dia 15 de Fevereiro de 2020 consumou-se a prescrição do crédito do Exequente, não podendo este requerer a execução da sentença; sem prescindir, os juros vencidos nos cinco anos anteriores à citação do executado encontram-se sempre </font><i><font>prescritos</font></i><font>; a factualidade descrita é do conhecimento do Exequente que, por isso deverá ser condenado como litigante de má-fé e responder pelos danos culposamente causados ao Embargante.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Recebidos os embargos e notificado o Exequente/Embargado para contestar, veio o mesmo aduzir que posteriormente à citação do Executado (14.02.2000) foram concretizados actos de penhora (descontos) do respectivo vencimento em 08 de Fevereiro de 2002, 05 de Abril de 2002, 12 de Junho de 2002, 7 de Agosto de 2002, 07 de Outubro de 2002, 10 de Outubro de 2002, 08 de Novembro de 2002, 13 de Novembro de 2002 e 16 de Dezembro de 2002; tal factualidade </font><i><font>interrompeu</font></i><font> o prazo da prescrição e é do conhecimento do Executado, que a omite, devendo por isso ser condenado como litigante de má-fé.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>O Embargante respondeu à matéria de exceção e pediu a condenação do Embargado como litigante de má-fé.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>O Exequente </font><b><i><font>reduziu</font></i></b><font> a </font><b><i><font>quantia</font></i></b><font> </font><b><i><font>exequenda</font></i></b><font> para € 15.275,00, nela englobando o montante de € 2.546,00 respeitante aos juros dos últimos 5 anos por reconhecer que estavam prescritos os que haviam sido reclamados no período precedente.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>A final proferida sentença na qual </font><b><i><font>se julgaram embargos de executado totalmente improcedentes, e, em consequência, se determinou o prosseguimento da execução para pagamento do capital de 12.729,00 euros, acrescido de juros vencidos até 22 de março de 2021 no montante de 2.546,00 euros e juros vincendos desde 23 de março de 2021 até integral pagamento à taxa de juros civis sucessivamente vigente, sem prejuízo dos juros à taxa de 5%/ ano, nos termos do artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil, desde 22 de março de 2016 até integral pagamento.</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font> </font></i></b><br>
</p><p><font>Interposto pelo Embargante recurso de apelação, </font><b><i><font>proferiu a Relação de Coimbra acórdão, pelo qual, revogando a decisão recorrida, julgou procedentes os embargos e, com fundamento na prescrição do crédito do Embargado, declarou extinta a execução para pagamento dos valores constantes do título executivo.</font></i></b><br>
</p><p><b><i><font> </font></i></b><br>
</p><p><font>Agora inconformado, vem o Embargado e Exequente pedir </font><b><i><font>revista</font></i></b><font> do acórdão da Relação, rematando a sua alegação recursiva com as seguintes conclusões: </font><br>
</p><p><font>1ª - Na decisão proferida pela 1ª Instância fez-se uma correcta interpretação e aplicação do Direito e da Lei, designadamente dos artigos 323º e 327º do CC.</font><br>
</p><p><font>2ª - Efectivamente um prazo prescricional pode ser interrompido múltiplas vezes, o que é desde logo reconhecido pela nossa Jurisprudência mais avisada, conforme adiante se verá. </font><br>
</p><p><font>3ª - Os actos de penhora concretizados nos autos de ação executiva podem ser equiparados à citação ou notificação conforme se retira expressa e inequívocamente do disposto no Art. 323º do CC.</font><br>
</p><p><font>4ª – A referência à intenção directa ou indirecta de vir a exercer o direito a que o citado art. 323º alude no seu nº 1 traduz a regra de que bastará uma diligência judicial que seja incompatível com o desinteresse pelo direito de cuja prescrição se trate (cfr. Menezes Cordeiro, ob. Cit., T IV, p. 197).</font><br>
</p><p><font>5ª - Dos Acórdãos favoráveis à tese do recorrente :</font><br>
</p><p><font><a>http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/504a22bfb229a47f802582730036142a?OpenDocument</a></font><br>
</p><p><font>• “ocorreram várias causas de interrupção da prescrição (...) nos termos das quais demonstraram os exequentes, inequivocamente, a sua intenção de exercer o seu direito de crédito”</font><br>
</p><p><font> </font><font><a>http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/2b1d41a152b699bd802583f500585bc9</a></font><br>
</p><p><font>• “confirmando-se o acórdão recorrido” (acórdão acima referido, em detrimento do Acórdão do STJ de 05.11.2013)</font><br>
</p><p><font> </font><font><a>http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d383</a></font><font> 2/9166eb55429093ad8025822d003ff48d?OpenDocument</font><br>
</p><p><font>As sucessivas penhoras do salário (de que sempre teria conhecimento através dos recibos de vencimento) evitariam a criação no devedor da segurança de que o credor não pretenderia mais exercer o seu direito.</font><br>
</p><p><font> </font><font><a>http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d383</a></font><font> 2/81d1884a17612fb8802586af00500c42?OpenDocument</font><br>
</p><p><font>6ª - A tese do Recorrido desconsidera em absoluto o disposto no Art. 323º do CC, que, não sendo aplicado, resultaria em grande injustiça, caso se entendesse como aquele pretende que os depósitos feitos pelo empregador são actos praticados por um terceiro, não promovidos directamente pelo titular do direito, ora, se aceitássemos este raciocínio como válido também a citação ou notificação judicial de qualquer acto, nunca poderiam interromper a prescrição, pois tratam-se de actos praticados pelo Tribunal que também é um terceiro na relação credor/devedor,</font><br>
</p><p><font>7ª - Os sucessivos actos de penhora ao interromperem o prazo prescricional, apagaram todo o tempo decorrido desde o acto de citação até à concretização da penhora, daí a sua importância.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Caso não se entendesse assim apenas a citação seria susceptível de interromper a prescrição e far-se-ia tábua rasa de todos os outros actos judiciais que decorrem da tramitação normal dum processo (in casu, executivo).</font><br>
</p><p><font>8ª - De acordo com o disposto no Art. 323º do CC o que releva é que o exercício do direito se faça através de acto com carácter judicial.</font><br>
</p><p><font>Conferir neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 290</font><br>
</p><p><font>Vide também Rita Canas da Silva, em Código Civil Anotado, Vol. I, 2ª Edição Revista e Actualizada, Coord. De Ana Prata, Almedina, pág. 428.</font><br>
</p><p><font>9ª - Os factos interruptivos provêm de acto do credor, por meio de notificação judicial de qualquer acto que exprima a intenção de exercício do direito, ainda que praticado por um representante, legal ou voluntária.</font><br>
</p><p><font>“O efeito interruptivo tem lugar quando o obrigado tem ou deve ter conhecimento (oficial) do exercício do direito “- AC Relação de Coimbra de 24 de Abril de 2012, em </font><font>www.dgsi.pt</font><font>.</font><br>
</p><p><font>10ª - A penhora é acto de carácter judicial.</font><br>
</p><p><font>Cada desconto de 1/3 do vencimento do executado expressa, não apenas uma intenção de exercer o direito, exterioriza o exercício do direito de crédito pelo exequente.</font><br>
</p><p><font>O executado tem conhecimento do exercício desse direito pelo acto judicial de penhora de 1/3 do seu vencimento.</font><br>
</p><p><font>11ª - O acto judicial de penhora de 1/3 do vencimento não se esgota num acto isolado pois renova-se por cada vencimento ou salário auferido pelo executado.</font><br>
</p><p><font>O último acto de penhora sobre o vencimento ocorreu em Outubro de 2002.</font><br>
</p><p><font>12ª - Quando a instância seja julgada deserta o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo – nº 2 do artigo 327º do CC.</font><br>
</p><p><font>Pelo que, o prazo de prescrição de 20 anos (artigos 309º e 311º do CC) começou a contar a partir de Outubro de 2002 e só se completaria em Outubro de 2022!</font><br>
</p><p><font>13ª - A execução a que os presentes autos estão apensos foi intentada em 22 de Março de 2021 e o executado foi citado em 5 de Julho de 2021 e portanto, muito antes de decorrido o referido prazo prescricional.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>É assim notório que o direito de crédito do Exequente não está prescrito. </font><br>
</p><p><font>NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, INVOCANDO O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXCIAS VENERANDOS CONSELHEIROS, DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO A ESTE RECURSO DE REVISTA, REVOGANDO-SE O ACÓRDÃO RECORRIDO E MANTENDO-SE INCÓMULE A DECISÃO DA PRIMEIRAINSTÂNCIA, EM CONFORMIDADE ÀS ANTECEDENTES CONCLUSÕES, COMO É DE DIREITO, E DE JUSTIÇA! </font><br>
</p><p><font>Respondeu o Embargante pugnando pela confirmação do acórdão recorrido. </font><br>
</p><p><font> * </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. </font><br>
</p><p><font>São os seguintes os factos que vêm fixados pelas instâncias: </font><br>
</p><p><font>a) O Exequente apresentou como título executivo a sentença proferida em 16 de Novembro de 1998, no âmbito da ação ordinária n.º 151/...8, que correu termos no ... Juízo do Tribunal do Circulo e Comarca ..., que condenou AA a restituir a BB a quantia de 2.552.000$00 (contravalor 12.279,32 euros), acrescido de juros.</font><br>
</p><p><font>b) Em 15 de Dezembro de 1998 BB intentou ação executiva contra AA, a qual correu termos sob o n.º 57-A/...9, do ... Juízo do Tribunal Judicial ....</font><br>
</p><p><font>c) AA foi citado no âmbito dessa ação executiva em 14 de Fevereiro de 2000.</font><br>
</p><p><font>d) Foi ordenada a penhora de 1/3 do vencimento de AA e foram efectuados descontos no vencimento em Novembro de 2001, Março de 2002, Maio de 2002, Junho de 2002, Julho de 2002, Setembro de 2002 e Outubro de 2002.</font><br>
</p><p><font>e) Em 26 de Fevereiro de 2003 o Exequente foi notificado, além do mais, para impulsionar a execução sem prejuízo do disposto no artigo 51.º, n.º 2, al. b) do CCJ. </font><br>
</p><p><font>f) A execução de que os presentes autos são apenso foi intentada em 22 de Março de 2021 e o Executado foi citado em 05 de Julho de 2021. </font><br>
</p><div><br>
<font> * </font><br>
<p></p></div><br>
<br>
<font>III – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. </font><br>
<p><font>São duas as </font><b><i><font>questões </font></i></b><font>que vêm colocadas pelo recorrente e Embargado nas conclusões com as quais encerra a alegação da presente revista (conclusões que, como é sabido, balizam o objecto do recurso, nos termos do art.º 635, nºs 3 e 4 do CPC).</font><br>
</p><p><font>A saber:</font><i><font> </font></i><br>
</p><p><i><font>1º - Se, apesar de a citação do Embargante/Executado operada na Execução nº 57-A/...9 do ... Juízo da ... em 14 de Fevereiro de 2000, ter interrompido o prazo de prescrição do crédito exequendo, este prazo podia voltar a ser objecto de novas e sucessivas interrupções;</font></i><br>
</p><p><i><font>2º - Se a penhora consumada no desconto do vencimento do executado operado em Outubro de 2002 na referida execução interrompeu o curso do aludido prazo, impedindo que ele estivesse esgotado ou decorrido quando em 5 de Julho de 2021 se verificou a citação para a Execução a que respeitam os presentes embargos de executado.</font></i><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Respondeu a Embargada/Exequente batendo-se pela integral manutenção do acórdão recorrido.</font><i><font> </font></i><br>
</p><p><i><font> </font></i><br>
</p><p><font>Apreciando agora as questões acima enunciadas. </font><br>
</p><p><i><u><font>Sobre a possibilidade de sucessão de várias causas de interrupção a partir da citação do Embargante como Executado na Execução nº 57-A/99… do ... Juízo da ....</font></u></i><font> </font><br>
</p><p><font>Deflui dos autos que o crédito objecto de execução pelo Embargado é um crédito de natureza pecuniária resultante da condenação do Embargante no pagamento da quantia de 2.552.000$00 (contravalor 12.279,32 euros), acrescida de juros, constituindo o título executivo a sentença de 16 de novembro de 1998 proferida no âmbito da acção ordinária n.º 151/98..., que correu termos no ... Juízo do Tribunal do Círculo e Comarca ....</font><br>
</p><p><font>Não é objecto de controvérsia pelo recorrente o postulado pelas instâncias de que o prazo de prescrição aplicável ao direito do Exequente é o prazo ordinário de 20 anos (art.º 309 do CC).</font><br>
</p><p><font>Como também não é alvo de qualquer objecção do recorrente o igualmente postulado pelas instâncias de que se deu </font><b><i><font>interrupção</font></i></b><font> desse prazo </font><b><i><font>com a citação do Embargante para a execução da aludida sentença – </font></i></b><font>a Execução nº n.º 57-A/99…, do ... Juízo do Tribunal Judicial ... – ocorrida em </font><b><i><font>14 de Fevereiro de 2000</font></i></b><font>. </font><br>
</p><p><font>Um e outro postulado traduzem uma aplicação da disciplina do instituto da prescrição que este tribunal de revista tem por correcta e adequada aos factos. </font><br>
</p><p><font>Onde as instâncias já divergiram foi na relevância conferida a certas ocorrências processuais no âmbito do aludido processo executivo, uma vez que a 1ª instância entendeu que elas funcionaram</font><i><font> </font></i><font>como novas e sucessivas </font><b><i><font>causas</font></i></b><i><font> </font></i><b><i><font>interruptivas</font></i></b><i><font> da prescrição, </font></i><font>enquanto o acórdão da Relação ora recorrido, além de negar a possibilidade de sucessão de causas interruptivas da prescrição, desqualificou as ditas ocorrências como tais, negando dessa forma sua influência no decurso do prazo prescricional interrompido e reiniciado na aludida data de 14 de Fevereiro de 2000.</font><br>
</p><p><font>Divergência que conduziu a 1ª instância a ter por </font><b><i><font>não</font></i></b><font> </font><b><i><font>decorrido </font></i></b><font>(porque </font><b><i><font>interrompido</font></i></b><font>) o mencionado prazo de prescrição de 20 anos quando em </font><b><i><font>05 de Julho de 2021</font></i></b><font> o Embargante e Executado foi citado para execução a que respeitam os presentes embargos de executado; e que levou a Relação a considerar o mesmo prazo </font><b><i><font>integralmente esgotado </font></i></b><font>nessa data por entender que os aludidos 20 anos se haviam então completado </font><b><i><font>sem qualquer interrupção.</font></i></b><font> </font><b><i><font> </font></i></b><font> </font><br>
</p><p><font>Como se vê, o recorrente procura agora fazer vingar a tese da 1ª instância. </font><br>
</p><p><font>Ela foi aí alicerçada na atribuição da natureza de causas interruptivas da prescrição aos sucessivos actos de penhora que se seguiram à citação do Executado em 14 de Fevereiro de 2000. Como se constata da seguinte passagem da sentença:</font><i><font> </font></i><br>
</p><p><i><font>“(…) A penhora é um ato de carácter judicial. Releva, para o caso, a penhora do vencimento ou salário, nos termos do artigo 824.º do CPC pretérito, fixada pelo Tribunal da execução em 1/3 do vencimento / salário do Executado.</font></i><br>
</p><p><i><font>A penhora de créditos concretiza-se através na notificação ao devedor de que o crédito fica à ordem do Tribunal da execução – artigo 856.º do CPC pretérito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deste modo, cada desconto de 1/3 do vencimento / salário do executado expressa, não apenas uma intenção de exercer o direito; exterioriza o exercício do direito de crédito pelo Exequente. </font></i><br>
</p><p><i><font>(…) o executado tem conhecimento do exercício desse direito pelo ato judicial de penhora de 1/3 do seu vencimento/salário. O ato judicial de penhora de 1/3 do vencimento ou salário não se esgota num ato isolado pois renova-se por cada vencimento ou salário auferido pelo Executado.</font></i><br>
</p><p><i><font>O último ato de penhora sobre o vencimento ocorreu em outubro de 2002.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sendo a penhora um meio judicial pelo qual se dá conhecimento do exercício do direito, consideramos que o último facto interruptivo da prescrição, nos termos conjugados dos artigos 323.º, n.º 1 e 4 do Código Civil, ocorreu em outubro de 2002. (…) o prazo de prescrição de 20 anos (artigos 309.º e 311.º do Código Civil) começou a contar a partir de outubro de 2002.</font></i><br>
</p><p><i><font>A execução de que os presentes autos são apenso foi intentada em 22 de março de 2021 e o Executado foi citado em 05 de julho de 2021.</font></i><br>
</p><p><i><font>É assim notório que o direito de crédito do Exequente não está prescrito”. </font></i><font> </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Por seu turno, a Relação rejeitou esta interpretação, optando pela contagem contínua do prazo prescricional em curso desde a citação do Embargante em </font><b><i><font>14 de Fevereiro de 2000.</font></i></b><br>
</p><p><font>Para o carácter ininterrupto do prazo prescricional desde a citação do Executado na referida data aduziu a seguinte argumentação: </font><br>
</p><p><i><font>“(…) Advogamos este entendimento, desde logo, por a prescrição assentar em razões de certeza e de segurança nas relações jurídicas impondo que a inércia prolongada do credor envolva consequências desfavoráveis para o exercício tardio do direito, nomeadamente em defesa da expectativa do devedor de se considerar libero de cumprir e até da dificuldade que ele poderia ter passado muito tempo, fazer prova de um cumprimento que, porventura, tivesse feito. Ora, permitir sucessivas interrupções da prescrição seria atentar contra todas aquelas razões que constituem o fundamento daquele instituto jurídico. Aqui chegados, podemos afirmar, que acompanhamos o entendimento do recorrente, quando afirma não ser possível haver sucessivas interrupções da prescrição, até por no caso em apreço, os autos estarem ainda a coberto pela interrupção da citação (cfr. art.º 323. n.º 1, do C.C.)”.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Contra este posicionamento se rebela o recorrente com a defesa da tese da sentença de que após a citação do Executado na Execução nº 57-A/99… (citação de 14 de Fevereiro de 2000) houve </font><i><font>sucessivas</font></i><font> </font><i><font>interrupções do prazo prescricional </font></i><font>então interrompido. </font><br>
</p><p><font>Vejamos se assim é. </font><br>
</p><p><font>Ensina Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, Almedina, 1972, V. II, pág.s 445-446) que </font><i><font>“ (…) o fundamento específico da</font></i><font> </font><i><font>prescrição reside na negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos, o torna (o titular) indigno da protecção jurídica (“dormientibus non succurrit ius)”. </font></i><font>Num plano que chama de </font><i><font>secundário, </font></i><font>refere ainda o mesmo Professor que são também invocadas como razões para justificar o instituto a</font><i><font> “certeza ou segurança jurídica”; a “protecção dos obrigados, especialmente os devedores, contra as dificuldades da prova”; e o exercício de uma “pressão ou estímulo educativo sobre os titulares dos direitos no sentido de não descurarem o seu exercício.”</font></i><br>
</p><p><font>Perante esta panóplia de fundamentos da prescrição não é difícil intuir que, provocando a interrupção da prescrição a </font><i><font>inutilização ou perda de todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo </font></i><font>(art.º 326, nº 1, do CC), as causas de interrupção tipificadas na lei, ou seja, no Código Civil, são efectivamente factos </font><b><i><font>excepcionais.</font></i></b><font> </font><br>
</p><p><font>Querendo com isto dizer-se que as causas de interrupção da prescrição não podem repetir-se ou suceder-se ao ponto de, na prática, desvirtuarem os próprios fundamentos da prescrição, designadamente negando a certeza ou segurança jurídicas e a estabilização das situações de facto entretanto criadas. Neste sentido pode ver-se o Ac. do STJ de 05.11.2013, p. no P. nº 7624/12.1TBMAI.S1, onde </font><u><font>a propósito da interrupção da prescrição por meio da notificação judicial avulsa promovida pelo titular do direito</font></u><font>, se exarou que </font><i><font>“ (…) não pode admitir-se sucessivas interrupções através de notificação judicial avulsa, sob pena de se criar enorme insegurança na ordem jurídica, e, sobretudo, sem se destruir a razão de ser do próprio instituto da prescrição.</font></i><br>
</p><p><i><font>A ser como quer o recorrente, estava descoberta a maneira de defraudar a lei, ignorando-se os prazos prescricionais, que, por via de sucessivas notificações judiciais avulsas, se renovariam periodicamente, à vontade do titular do direito, sem nunca se esgotarem.</font></i><br>
</p><p><i><font>Uma tal interpretação, além de violar o Art.º 300º do C.C., contrariaria o espírito da lei, sem encontrar qualquer apoio na sua letra.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)”. </font></i><font> </font><br>
</p><p><font>Também no acórdão recorrido, após se reproduzir fundamentação extraída do Acórdão da Rel. do Porto de 14.07.2003, p. no P. nº 0313320,</font><a><u><font>[1]</font></u></a><font> se perfilhou o entendimento de que </font><i><font>“(…) permitir sucessivas interrupções da prescrição seria atentar contra todas aquelas razões que constituem o fundamento daquele instituto jurídico (…)”.</font></i><br>
</p><p><font>E que, por conseguinte, nunca poderia ser </font><i><font>sucessiva</font></i><font> ou </font><i><font>consecutivamente</font></i><font> interrompido o prazo de prescrição já em curso com a citação do Executado. </font><br>
</p><p><font>Concordamos, em princípio. com o acórdão recorrido quando este afirma que admitir </font><i><font>sucessivas</font></i><font> (podem ser duas ou mais) </font><i><font>inutilizações</font></i><font> do prazo de prescrição, com a inerente superveniência de novos prazos (art.º 326, nº 1, do CC), redunda numa insegurança jurídica que o instituto da prescrição visa evitar ou prevenir. </font><br>
</p><p><font>Seria tornar incerto o que se pretendia certo.</font><br>
</p><p><font>O obrigado ou devedor nunca saberia quando findava o prazo de prescrição; e podia ser compelido a cumprir muito tempo após o transcurso do prazo imperativamente fixado na lei, inderrogável em conformidade com o art.º 300 do CC.</font><br>
</p><p><font>É, todavia, particularmente importante para a questão que nos ocupa a distinção entre causas interruptivas de </font><i><font>efeito instantâneo </font></i><font>e de efeito </font><i><font>permanente,</font></i><font> </font><i><font>duradouro</font></i><font> ou </font><i><font>continuado</font></i><font>: “</font><i><font>nas</font></i><font> </font><i><font>primeiras, no próprio momento em que se realiza o acto interrompe-se a prescrição, mas começa, de imediato, a correr um novo prazo prescricional, enquanto nestas últimas a prescrição interrompe-se durante um certo período de tempo.” </font></i><font>(cfr. Comentário ao Código Civil, Fac. De Direito, U. Católica Editora, 2014, Parte Geral, anot. ao art.º 326, p. 775).</font><br>
</p><p><font>Serão de </font><i><font>efeito</font></i><font> </font><i><font>instantâneo</font></i><font> a </font><i><font>notificação judicial avulsa </font></i><font>em que o direito é exercido pelo respectivo titular ou este exprime a intenção de o exercer (aparentemente enquadrável no art.º 323, nº 4, do CC), e o </font><i><font>reconhecimento</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>direito</font></i><font> previsto no art.º 325 do CC.</font><br>
</p><p><font>Serão de efeito </font><i><font>permanente, duradouro ou continuado </font></i><font>a citação, notificação ou acto equiparado em processo pendente e o </font><i><font>compromisso</font></i><font> </font><i><font>arbitral</font></i><font>, causas interruptivas a que alude o nº 1 do art.º 327 do CC.</font><br>
</p><p><font>O efeito é </font><i><font>permanente</font></i><font>, </font><i><font>duradouro ou continuado</font></i><font> porque o novo prazo prescricional não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que </font><b><i><font>puser</font></i></b><font> </font><b><i><font>termo</font></i></b><font> ao processo onde se dá o facto interruptivo.</font><br>
</p><p><font>No seu estudo sobre </font><i><font>Prescrição extintiva e caducidade</font></i><font>, publicado no BMJ 106, fornece Vaz Serra (págs. 248-249) a explicação para a eficácia </font><i><font>permanente</font></i><font> de algumas causas de interrupção: </font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Eficácia permanente têm os actos interruptivos judiciais, dado que dão início a um processo, durante o qual pode admitir-se que o titular não está inactivo (…) A prescrição só recomeçará correr a partir do momento em que transite em julgado a sentença que põe termo ao processo (…). É evidente que, se a sentença julgar improcedente o pedido não há que falar em prescrição, visto que se decidiu não existir o direito. Se, pelo contrário, o julgar procedente, começa, a partir dela novo prazo prescricional.” </font></i><br>
</p><p><font>Estas causas interruptivas de </font><i><font>efeito</font></i><font> </font><i><font>duradouro ou continuado</font></i><font> integram-se em processos nos quais, de alguma maneira, o titular do direito visa termo à sua inércia, pela declaração do direito ou pela sua exigência ao obrigado. Por este motivo, as causas interruptivas com esse efeito, ainda que sucessivas, não podem – como é evidente – ter-se por contraditórias com o já apontado fundamento da prescrição ligado à ideia de certeza ou segurança jurídicas.</font><br>
</p><p><font>Aceita-se, no entanto, que as causas de interrupção de efeito instantâneo não possam suceder-se ou repetir-se, sob pena de com isso se prolongar ou modificar o prazo fixado pela lei para além do que seria razoável. </font><br>
</p><p><font>Todavia, sempre que a nova interrupção pertença a um processo em que o titular do direito quer exercê-lo de algum modo, seja por via de acção declarativa seja por via de uma acção executiva, processo em que a citação tem o efeito de interrupção </font><i><font>permanente</font></i><font> ou </font><i><font>continuada</font></i><font> do nº 1 do art.º 327 do CC, não há justificação para se negar a sucessão de interrupções. É que o legítimo exercício do direito pelo titular supõe necessariamente uma nova interrupção proveniente da citação do demandado. E até correrá novo prazo de prescrição a partir da decisão final transitada para desencorajar nova inércia do titular do direito, salvo se essa decisão for no sentido da não existência do direito discutido em acção declarativa (sentença de absolvição do pedido) ou implicar a sua extinção (satisfação do direito do credor em acção executiva).</font><br>
</p><p><font>Isto é: a citação do Embargante para a Execução nº 55-A/99 não era por si só, em abstracto, e no enquadramento aludido, obstáculo à intervenção de novas causas interruptivas. </font><br>
</p><p><font>Ponto é que os factos pretensamente interruptivos do prazo da prescrição fossem subsumíveis ao conceito de causas interruptivas. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><i><u><font>A subsunção da penhora ao conceito de causa de interrupção do nº 1 do art.º 323 do CC.</font></u></i><font> </font><br>
</p><p><font>Escreveu-se no acórdão recorrido: </font><br>
</p><p><i><font>“(…) o facto gerador de interrupção, nos presentes autos, foi a citação, já não os atos de penhora do vencimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Dito isto, voltemos ao caso em apreço.</font></i><br>
</p><p><i><font>Diga-se, desde já, que ao caso em apreço se aplica o n.º 2, do art.º 327.º, do diploma citado, o que nem é posto em causa, pelo recorrido, desde logo, por a instância ter sido julgada deserta, como o mesmo refere, que preceitua “Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo”.</font></i><br>
</p><p><i><font>Da matéria de facto provada resulta que o exequente em 15/12/98 intentou ação executiva contra o executado (AA), que correu termos no ... Juízo do Tribunal Judicial ..., com o n.º 57-A/99…, para a qual foi citado em 14/2/2000 (facto interruptivo da prescrição), em 26 de fevereiro de 2003 o Exequente foi notificado, para além do mais, impulsionar a execução sem prejuízo do disposto no artigo 51.º, n.º 2, al. b) do CCJ </font></i><br>
</p><p><i><font>e que a execução de que os presentes autos são apenso foi intentada em 22 de março de 2021 e o Executado foi citado em 05 de julho de 2021.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ora, tendo sido a execução n.º 57-A/99…, julgada deserta, como o próprio recorrido refere, e como resulta da matéria provada (cfr. facto e)) e defendendo nós, pelas razões supra explanadas, que ao caso não se aplica interrupções sucessivas, a data da interrupção a ter em conta é a da citação, desde logo, por força do n.º 2, do art.º 327.º, do C.C. (…)”.</font></i><br>
</p><p><b><i><font> </font></i></b><br>
</p><p><font>Contra isto se insurge o Embargado e ora recorrente clamando pelo acerto do decidido na 1ª instância no que concerne à consideração do último acto da penhora do vencimento do Embargante (de </font><b><i><font>Outubro</font></i></b><font> </font><b><i><font>de</font></i></b><font> </font><b><i><font>2002</font></i></b><font>), como um </font><i><font>acto</font></i><font> </font><i><font>judicial</font></i><font> que </font><i><font>exprimiu a intenção do Exequente de, como credor do Embargante, exercer o respectivo direito,</font></i><font> por isso se integrando na definição e conceito de causa interruptiva do art.º 323, nº 1, do C. Civil.</font><br>
</p><p><font>Mas não tem razão. </font><br>
</p><p><font>I | [0 0 0 ... 0 0 0] |
ozFbu4YBgYBz1XKv1_ow | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font> </font><div><br>
<font>ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA</font><br>
<p><font>(1ª SECÇÃO)</font></p></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><font>I - RELATÓRIO </font><br>
</p><p><font>CUTELARIA POLICARPO, LDª demandou em acção sob a forma de processo comum SEGURADORAS UNIDAS, S.A., pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 59.300,40 acrescida de juros de mora vincendos desde a citação até integral pagamento, à taxa supletiva legal.</font><br>
</p><p><font>Alegou para tanto, e em síntese, que em 1917 tomou de arrendamento um determinado espaço (</font><i><font>“loja”</font></i><font>) integrado num imóvel que a Ré adquiriu em 2003; em 2013 a Ré comunicou-lhe que pretendia a </font><i><font>denúncia</font></i><font> do contrato de arrendamento com fundamento na realização no locado de obras de demolição e de remodelação profundas tendentes à instalação no mesmo de uma unidade hoteleira; o que era incompatível com a manutenção do referido arrendamento; não tendo sido possível às partes chegar a acordo, a Ré propôs no Balcão Nacional de Arrendamento um </font><b><i><font>procedimento</font></i></b><font> </font><b><i><font>especial</font></i></b><font> </font><b><i><font>de</font></i></b><font> </font><b><i><font>despejo</font></i></b><font>, ao qual se opôs a A.; em sede de audiência e julgamento A. e Ré puseram termo ao litígio por </font><i><font>transacção</font></i><font> homologada por sentença; a Ré pagou a 1ª e a 2ª prestação da indemnização acordada; a A. entregou o locado em 2015, tendo liquidado a última renda no valor de € 494,17; sucede que a Ré veio a alienar o imóvel sem proceder às obras a que se comprometera; a transacção teve como pressuposto o de que a Ré ia efectivamente implementar as obras de demolição e reconstrução do edifício que implicavam a desocupação do locado; uma vez que não efectuou quaisquer obras, a Ré incumpriu o acordado e está obrigada a pagar à A. uma indemnização correspondente a 10 anos de renda.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><b><i><font>Contestou</font></i></b><font> a Ré contrapondo que a A. deduziu oposição ao procedimento especial de despejo porque o contrato era de duração indeterminada e, como tal, insusceptível de </font><i><font>denúncia</font></i><font>; mediante a transacção as partes acordaram simplesmente em pôr termo ao contrato mediante o pagamento de uma indemnização à A.; a transacção não ficou sujeita a qualquer condição, nomeadamente a relativa à continuação pela Ré do projecto que se havia proposto, visando apenas alcançar um acordo global com a A..</font><br>
</p><p><font>Para o caso de a acção ser julgada procedente, deduziu a Ré reconvenção, pedindo que lhe fosse reconhecido um crédito sobre a Autora no valor de € € 44.069,96, operando-se a competente </font><i><font>compensação</font></i><font> sobre o crédito que, eventualmente, a esta venha a ser reconhecido; e, bem assim, a condenação da Autora como litigante de má-fé no pagamento de multa e indemnização não inferior a € 10.000,00.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Em 14.04.2020, após dispensa de audiência prévia, declarando-se o Sr. Juiz habilitado a conhecer imediatamente do mérito da causa, proferiu-se </font><b><i><font>saneador</font></i></b><font>-</font><b><i><font>sentença</font></i></b><font> no qual se julgou a acção </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>provada</font></i><font> e </font><i><font>improcedente</font></i><font>, condenando-se ainda a A. como litigante de má-fé.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Porém, interposto recurso desta decisão, viria a Relação a </font><b><i><font>revogá</font></i></b><font>-</font><b><i><font>la</font></i></b><font> por acórdão 19.11.2020, sendo aí ordenado o </font><i><font>“prosseguimento dos ulteriores termos processuais, retomando a fase do saneamento do processo, com a elaboração do despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova”.</font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Após julgamento, foi em 06.06.2021 proferida sentença final na qual se julgou a acção </font><i><font>totalmente</font></i><font> </font><i><font>improcedente</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>provada</font></i><font> e, em consequência, se absolveu a Ré de tudo o peticionado e se julgou prejudicada a reconvenção deduzida pela Ré. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Para tanto, a sentença aduziu </font><b><i><font>essencialmente</font></i></b><font> a seguinte fundamentação:</font><br>
</p><p><i><font>“(…) Em primeiro lugar – embora sistematicamente apareça em segundo lugar -sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida - n.º 2 do art.º 236º do CC -, sendo que por vontade real deve entender-se o significado que as partes pretenderam atribuir ás suas declarações.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ou seja, o sentido querido realmente pelo declarante releva, mesmo quando a formulação seja ambígua ou inexacta, se o declaratário conhecer este sentido; a ambiguidade objectiva ou até a inexactidão da expressão externa não impedem a relevância da vontade real, se o destinatário a conheceu (Mota Pinto in ob. cit., pág. 449).</font></i><br>
</p><p><i><font>Se num contrato, o destinatário da proposta a aceita, conhecendo a vontade real do proponente, entende-se que está a aceitar o sentido real correspondente a essa vontade real, de acordo com o qual “vale a declaração emitida”, único sentido no qual podia legitimamente confiar (se não queria aceitar, deveria ter-se esclarecido junto do declarante).</font></i><br>
</p><p><i><font>No que aos autos respeita, o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que a alegação da A. de que a transação foi alcançada (…) no pressuposto que a aqui Ré ia efectivamente implementar as obras de demolição e reconstrução do edifício dos autos, que obrigavam à desocupação do locado e a alegação de que foi apenas nesse pressuposto que a A. ali aceitou transacionar nos temos em que o fez, traduzia a alegação da vontade real dos declarantes na referida «transacção», comum a ambos e que tem um mínimo de correspondência com a letra.</font></i><br>
</p><p><i><font>Produzida a prova, não só a referida factualidade resultou não provada – pontos 3.3.1. e 3.3.2. – como, além disso ficou provado que a vontade real da Ré era outra e bem oposta, como resulta do ponto 3.2.7. – a Ré jamais celebraria a Transação referida em 3.1.17. e concretamente jamais pagaria a indemnização ali referida, se tivesse de continuar vinculada às obrigações que resultavam das regras legais relativas á denúncia dos contratos de arrendamento para execução de obras de remodelação profunda, ou seja, para a Ré a transacção não traduz a denúncia do contrato, mas sim a sua revogação.</font></i><br>
</p><p><i><font>E não existem quaisquer outros elementos que permitam afirmar que a vontade real das partes – de ambas as partes – foi a de denunciar o contrato de arrendamento para a realização, pela Ré, de obras de demolição e reconstrução do edifício dos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Não foi invocado que subjacente á transação estava a vontade real das partes em resolver a controvérsia quanto à questão da validade e eficácia da denúncia (fosse em que sentido fosse).</font></i><br>
</p><p><i><font>Não foi invocado que a vontade real da aqui A., subjacente à transação, era a aceitação da denúncia do contrato de arrendamento e que a aqui Ré conhecia essa vontade.</font></i><br>
</p><p><i><font>Em segundo lugar, se a vontade real do declarante, não for conhecida do declaratário, a declaração valerá com o sentido que possa ser deduzido por um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (teoria da impressão do destinatário) - artº 236, nº1 do mesmo Código.</font></i><br>
</p><p><i><font>Em homenagem aos interesses do declaratário (protecção da confiança ) e do comércio jurídico e partindo da ideia, manifestamente razoável, de imposição ao declarante de um ónus de clareza na manifestação do seu pensamento, concede-se, pelo menos em tese geral, primazia ao ponto de vista do destinatário, a partir do qual a declaração deve ser focada.</font></i><br>
</p><p><i><font>A declaração deve ser analisada do ponto de vista do receptor.</font></i><br>
</p><p><i><font>De acordo com a lei, a interpretação não visa determinar a vontade do declarante ou um sentido que este tenha querido declarar, estando antes em causa o sentido objectivo que se pode depreender do seu comportamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>A lei não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário (entendimento subjectivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objectivo para o declaratário) – cfr. Ac. do STJ de 28.10.97, BMJ 470, 597.</font></i><br>
</p><p><i><font>A lei concede primazia a um declaratário normal colocado na posição real do declaratário. Há que imaginar uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-o na posição do real declaratário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este concretamente conheceu e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo.</font></i><br>
</p><p><i><font>A declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria; considera-se o real declaratário nas condições concretas em que se encontra e tomam-se em conta os elementos que ele conheceu efectivamente mais os que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido e figura-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável -V. Mota Pinto, ob. e loc. cit.,pág. 448. </font></i><br>
</p><p><i><font>(…) </font></i><br>
</p><p><i><font>a transacção foi celebrada em sede de processo judicial, pelo que há que atender ao que dispõe o art.º 290º do CPC e que é: n.º 1 - a transação pode fazer-se por documento autêntico ou particular, sem prejuízo das exigências de forma da lei substantiva, ou por termo no processo; n.º 4 – a transação pode também fazer-se em ata, quando resulte de conciliação obtida pelo juiz; em tal caso, limita-se este a homologá-la por sentença ditada para a ata, condenando nos respetivos termos. Daqui decorre que a transacção é um negócio formal, pelo que tem plena aplicação o disposto no art.º 238º n.º 1 do CC: nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.</font></i><br>
</p><p><i><font>No entanto e nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, esse sentido (correspondente à impressão do destinatário e sem correspondência no texto do documento) pode valer se corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se não opuserem. (…)”</font></i><br>
</p><p><i><font>Em face de tudo o exposto, não havendo quaisquer elementos que permitam afirmar que a vontade real das partes foi a denunciar o contrato de arrendamento para a realização de obras de demolição e remodelação do prédio dos autos, deve interpretar-se a transacção em causa como traduzindo uma revogação de tal contrato e, assim sendo, não se verifica o pressuposto base da indemnização a que se refere o n.º 9 do art.º 1103º e, nestes termos, a presente acção deve improceder.” </font></i><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Inconformada, recorreu a Autora para a Relação, tendo aí impugnado a decisão proferida em matéria de facto, e, bem assim, a fundamentação de direito da sentença.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Por acórdão de 13 de Janeiro de 2022, lavrado sem voto de vencido, a Relação desatendeu totalmente a impugnação da decisão de facto, julgou a apelação improcedente e confirmou integralmente a sentença recorrida.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Para tanto, alinhou a seguinte fundamentação de direito: </font><br>
</p><p><i><font>“(…) Em causa nos autos está o apuramento da vontade real das partes, ao celebrar a transacção de 23/9/2014. </font></i><br>
</p><p><i><font>(…) E o que basicamente se retira do referido artº 236º é que, em homenagem aos princípios da protecção da confiança e da segurança do tráfico jurídico dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (receptor).</font></i><br>
</p><p><i><font>A lei, no entanto, não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário (entendimento subjectivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objectivo para o declaratário) – cfr. Ac. do STJ de 28.10.97, BMJ 470, 597.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Há que imaginar – escreve Paulo Mota Pinto em Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico, 208 – uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este efectivamente conheceu (mesmo que um declaratário normal delas não tivesse sabido - por exemplo, devido ao facto de o real declaratário ser portador de uma cultura invulgarmente vasta e superior à média) e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ainda segundo este mesmo autor, “… a interpretação da declaração negocial não tem em vista apurar a vontade do declarante ou um sentido que este tenha querido declarar, estando antes em causa o sentido objectivo que se pode depreender do seu comportamento”.</font></i><br>
</p><p><i><font>Importa por fim acrescentar que estando-se no caso sub judice em presença dum contrato, e dum contrato tipicamente sinalagmático, há que atender, simultaneamente, às declarações de ambas as partes porque ambas são, também simultaneamente, declarante e declaratário (neste sentido, Oliveira Ascensão, Direito Civil, Teoria Geral, II, 2ª edição, pág. 435).</font></i><br>
</p><p><i><font>Tudo isto significa em termos práticos que o intérprete deve, relativamente a ambos os contraentes, tentar definir a posição em que se encontram perante a declaração da contraparte e colocar um declaratário ideal (normal) na posição de declaratário real.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…) A autora invocou a alegada vontade real dos declarantes na referida «transacção», comum a ambos e que tem um mínimo de correspondência com a letra.</font></i><br>
</p><p><i><font>Determinar se, com esse desiderato, as partes, quando celebraram a referida transacção, tiveram como pressuposto que a aqui Ré ia efectivamente implementar as obras de demolição e reconstrução do edifício dos autos, que obrigavam à desocupação do locado, e que foi apenas nesse pressuposto que a A. ali aceitou transacionar nos termos em que o fez, constituía ónus de prova da autora, enquanto facto constitutivo do direito de que se arroga – art. 342º, nº1 do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sucede que, como vimos na análise da impugnação da matéria de facto, a autora claudicou no cumprimento desse mesmo ónus de prova, não demonstrando o pressuposto invocado para a celebração da transacção, fundamento da sua pretensão indemnizatória.</font></i><br>
</p><p><i><font>Daí a natural improcedência da acção – como decidido na 1ª instância e, logicamente, do presente recurso.”</font></i><font> </font><br>
</p><div><br>
<font>* </font></div><br>
<br>
<font>De novo irresignada agora com o acórdão da Relação assim prolatado, dele interpôs a A. recurso de revista para este STJ nos seguintes termos: </font><br>
<p><font>i) </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>título</font></i><font> </font><i><font>principal</font></i><font> </font><br>
</p><p><font>RECURSO ORDINÁRIO DE REVISTA para o Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto nos arts. 627º, 629º nº1, 637º, 638º nº 1 1ª parte, 639º nº 1 e 2, 671º nº 1, 674º nº 1 a), 675º nº 1 e 676º nº 1 “a contrario sensu”, todos do Cod. Proc. Civil, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo; </font><br>
</p><p><font>ii) </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>título</font></i><font> </font><i><font>subsidiário</font></i><font> </font><br>
</p><p><font>RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do disposto no art. 672º nº 1 c) do referido Código. </font><br>
</p><div><br>
<font>* </font></div><br>
<br>
<font>Na Relação, o Ex.mo Sr. Desembargador Relator proferiu em 05.04.2022 despacho de </font><b><i><font>não</font></i></b><font> </font><b><i><font>admissão</font></i></b><font> da revista normal nos termos do nº 3 do art.º 671 do CPC, determinando a subida dos autos a este STJ para apreciação da revista </font><i><font>excepcional</font></i><font>. </font><br>
<div><br>
<font>* </font></div><br>
<br>
<font>Ao abrigo do art.º 643 do CPC,</font><b><i><font> reclamou</font></i></b><font> a A. para este Supremo Tribunal do despacho do Sr. Desembargador Relator que </font><b><i><font>não lhe admitiu</font></i></b><font> o recurso como </font><b><i><font>revista</font></i></b><font> </font><b><i><font>normal</font></i></b><font>. </font><br>
<p><font> </font><br>
</p><p><font>Observados os nºs 2 e 3 do art.º 643 do CPC, foi pelo respectivo Relator proferida decisão que </font><b><i><font>manteve</font></i></b><font> </font><b><i><font>o</font></i></b><font> </font><b><i><font>despacho</font></i></b><font> </font><b><i><font>reclamado</font></i></b><font>. </font><br>
</p><p><font>Em requerimento de 17.06.2022 veio a A. </font><i><font>“arguir a nulidade” </font></i><font>proveniente da circunstância de </font><b><i><font>não</font></i></b><font> </font><b><i><font>ter</font></i></b><font> </font><b><i><font>sido</font></i></b><font> </font><b><i><font>submetido</font></i></b><font> </font><b><i><font>à</font></i></b><font> </font><b><i><font>conferência</font></i></b><font> (nos termos do art.º 652, nº 3, do CPC) o despacho prolatado pelo ora Relator em 26.05.2022 no processo identificado como sendo a Revista nº 19526/19.6T8LSB.L2.S1, </font><i><font>“considerando que existia uma dupla decisão conforme impeditiva da interposição de recurso de revista normal, indeferiu semelhante reclamação”</font></i><font> (v. o ponto 4 do requerimento).</font><br>
</p><p><font>Sendo certo que a </font><b><i><font>única</font></i></b><font> </font><b><i><font>reclamação</font></i></b><font> da não admissão do recurso é a que está em apreciação </font><b><i><font>neste</font></i></b><font> </font><b><i><font>apenso</font></i></b><font> (sendo, por isso, óbvio que não existe a pretensa </font><i><font>duplicação, </font></i><font>e que aquele despacho de 26.05.2022 não foi devidamente interpretado), entendeu o aqui Relator que A. visava fundamentalmente a obtenção de um acórdão sobre a matéria da decisão singular por ele proferida neste mesmo apenso em 09.06.2022.</font><br>
</p><p><font>Daí a presente conferência. </font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Cumpre então decidir. </font><br>
</p><div><br>
<font>**</font><br>
<p><font> </font></p></div><br>
<br>
<font>II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO </font><br>
<p><font>3.1.1. O prédio urbano sito na Rua ..., tornejando para a Rua ..., ... em ..., encontrava-se inicialmente descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...6 da freguesia ... e inscrito na correspondente matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo matricial n.º ...44.</font><br>
</p><p><font>3.1.2. Pela Ap. ... de 2003/02/27 foi inscrita a aquisição do referido imóvel a favor da Companhia de Seguros Tranquilidade, SA por compra ao Fundo de Pensões do Grupo BCP.</font><br>
</p><p><font>3.1.3. A Companhia de Seguros Tranquilidade, SA unificou o prédio urbano sito na Rua ... e na Rua ..., ..., descrito na CRP sob o nº ...6 da freguesia ..., com o prédio urbano sito na Rua ... descrito na CRP sob o nº ...7, da mesma freguesia, o que originou a nova descrição predial nº 164/20... da referida freguesia, que se encontra inscrita na matriz predial urbana sob o artigo nº ...97 da freguesia de ....</font><br>
</p><p><font>3.1.4. A Ré está matriculada sob o NIPC ....</font><br>
</p><p><font>3.1.5. Pela Ap. ...30 foi inscrita a alteração da denominação da Ré de Companhia de Seguros Tranquilidade, SA para Seguradoras Unidas, SA.</font><br>
</p><p><font>3.1.6. A 01 de Julho de 1917, a Companhia de Seguros ..., na qualidade de senhorio e a A., na qualidade de inquilina, subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 30-31, denominado “ Titulo de arrendamento”, que “ contratam entre si o arrendamento da loja do prédio urbano sito em ..., na Rua ..., ...”, com inicio no dia 1 de Julho de 1917, pelo prazo de seis meses, sucessivamente renovável por igual prazo, mediante o pagamento da renda de 40$00 por mês.</font><br>
</p><p><font>3.1.7. Por despacho proferido pelo Vereador do pelouro do ... da Câmara Municipal ..., a 03/08/2012, no âmbito do processo n.º 720/..., foi aprovado o projecto de arquitectura referente à obra de alteração do prédio sito na Rua ... e Rua ..., ... em ...,, com mudança de uso para instalação de um hotel de 3 estrelas de cadeia “...”, a dotar de uma capacidade máxima de 140 camas distribuídas por 70 unidades de alojamento de quarto duplo, previamente requerido pela Ré, então denominada Companhia de Seguros Tranquilidade.</font><br>
</p><p><font>3.1.8. A Ré endereçou à A., que a recebeu, a carta junta por cópia a fls.32, datada de 27 de Maio de 2013, com o seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>“ Fazemos referência ao contrato de arrendamento que tem por objecto a fracção autónoma correspondente á loja com os números 27 a ...1 do prédio urbano sito na Rua ... e Rua ..., ..., em ..., da qual a Companhia de Seguros Tranquilidade, SA ( a “CST”) é a proprietária e senhoria, e V.Exas os respetivos inquilinos.</font><br>
</p><p><font>Atento o facto de o contrato de arrendamento referido no parágrafo anterior ter sido celebrado antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275/95, de 30 de Setembro, vimos, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 50º da ei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, doravante (…) NRAU, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, comunicar a V. Exas. o seguinte:</font><br>
</p><p><font>1 – Ser intenção da CST que o referido contrato transite para o regime do NRAU;</font><br>
</p><p><font>2 – Propor a V.Exas. que o mesmo contrato passe a ser de prazo certo com a duração de cinco anos;</font><br>
</p><p><font>3 – Propor a V.Exas que o valor da renda mensal actualmente de € 114,00 (…) passe a ser de € 494,17 (…)</font><br>
</p><p><font>Mais informamos que a presente comunicação não invalida, nem revoga, qualquer outra destinada á denúncia do contrato de arrendamento com o fundamento de realização de obras de demolição e de remodelação profundas.”</font><br>
</p><p><font>3.1.9. A Ré endereçou à A. a carta junta por cópia a fls. 48-51, datada de 03 de Junho de 2013, cujo integral teor se dá aqui integralmente por reproduzido, ali constando nomeadamente o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>“A Companhia de Seguros Tranquilidade, SA (…) é a proprietária dos seguintes prédios (…):</font></i><br>
</p><p><i><font>UM: prédio urbano sito em ..., na Rua ..., ..., que torneja para a Rua ... com os números 29-33 (…);</font></i><br>
</p><p><i><font>DOIS: Prédio urbano sito em ..., na Rua ..., ... (…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Por contrato de arrendamento, celebrado no dia 1 de Julho de 1917, assumiram V. Exas o arrendamento da loja com os números 27 a 31 da loja da Rua ... inserida no prédio identificado no ponto um do parágrafo anterior.</font></i><br>
</p><p><i><font>Os prédios encontram-se ligados funcionalmente no seu interior e encontram-se afectos o uso terciário – escritórios – com comércio ao nível do piso térreo, tendo sido objecto de um pedido de licenciamento de alteração (…) com a finalidade der neles instalar uma unidade hoteleira (…) aprovado por despacho de 3 de Agosto de 2012 (…).</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Desta forma, os prédios serão sujeitos a uma nova organização funcional e estrutural, ou seja, serão completamente reformulados, adaptados e afetos à instalação de uma unidade hoteleira.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>A operação urbanística em causa, que terá por objecto dos préidos, implicará a execução de obras de reconstrução com demolições, remodelação e restauros profundos, as quais obrigam a uma total desocupação de todos os espaços, divisões, fracções, andares e lojas que se encontram ou venham a encontrar ocupados e/ou arrendados nos prédios, onde se inclui o espaço arrendado a V.Exas.</font></i><br>
</p><p><i><font>Para além da futura funcionalidade ser incompatível com qualquer uso similar ao presente, a operação urbanística em causa determinará que os prédios em geral, e o espaço arrendado a V.exas em particular, passem a ter uma estrutura diferente a actual, com uma distinta distribuição do espaço, sem correspondência ou equivalência com a presente, o qua igualmente justifica e determina a total desocupação de todas as divisões, fracções, andares e lojas que se encontrem ocupadas e/ou arrendadas nos prédios.</font></i><br>
</p><p><i><font>Quanto ao espaço arrendado a V.Exas, para além do seu uso futuro como sala de reuniões não corresponder ao actual, será promovida uma demolição integral dos atuais revestimentos, tetos e de algumas paredes, serão removidos os pavimentos, será feito um reforço das correspondentes estruturas, será feito o assentamento de pavimentos, todas as infraestruturas existentes (…) serão totalmente removidas com vista à instalação de novas infraestruturas afetas ao serviço da futura unidade hoteleira, serão executadas novas compartimentações e correspondentes acabamentos…</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Deste modo, e pelos motivos atrás expostos, vem a CST, através da presente comunicação, ao abrigo do disposto nos artigos 1101º, alínea b), e 1103º, n.º 11 do Código Civil e do disposto nos artigos 1º, 6º, 7º e 8º do Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de Agosto, todos por aplicação do artigo 1110º n.º 1 do Código Civil, proceder à denúncia do contrato de arrendamento que tem por objecto a loja com os números 27 a 31 da Rua ..., inserida no prédio urbano sito em ..., na Rua ..., ..., que torneja para a Rua ... com os números 29-33…</font></i><br>
</p><p><i><font>A denúncia produzirá efeitos no dia 31 de Dezembro de 2013, data limite para a entrega do espaço arrendado livre e devoluto de pessoas e bens….</font></i><br>
</p><p><i><font>Os fundamentos da denúncia são a realização das obras de demolição e de remodelação profundas atrás referidas, as quais obrigam, conforme igualmente atrás referido, à desocupação do espaço arrendado a V.Exas.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…) Tendo em vista a obtenção de um acordo, o qual poderá traduzir-se no pagamento de uma indemnização correspondente a um ano de renda, ou no realojamento de V.Exas, solicitamos a presença de V.exas no escritório do nosso Advogado (…)”</font></i><br>
</p><p><font>3.1.10. A A. endereçou à Ré, que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 34, datada de 27 de Junho de 2013, com o seguinte teor:</font><br>
</p><p><i><font>“ 1 - Com reporte à v/carta datada de 27 de Maio p.p., que recepcionámos a 29 desse mês e tendo em consideração que a proposta de actualização da renda de € 114,00 para € 494,17 se contém nos limites mínimos previstos para o efeito nos art.ºs 35º n.º 2 a) e b), 51º n.º 4 a) e 54º n.º 1 do NRAU, somos pela presente e ao abrigo do disposto no art.º 51º n.º 3 alínea a) do invocado diploma legal, a aceitar a proposta nova renda, respeitante ao contrato em epígrafe que, assim, passará a ser devida a partir do próximo dia 1 de Agosto…</font></i><br>
</p><p><i><font>2 – No tocante à proposta transição do contrato de arrendamento em epigrafe para o NRAU e na medida em que V. Exas. se encontram dispostos a aceitar um prazo certo de 5 anos, que se contem dentro do limite mínimo de prazo de vigência previsto no art. 54º n.º 1 do invocado diploma legal, somos igualmente pela presente missiva e ao abrigo do disposto no art.º 51º c) do NRAU a manifestar o n/expresso acordo a essa vossa pretensão. (…)”</font></i><br>
</p><p><font>3.1.11. A Ré endereçou à A., que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 36, datada de 02 de Julho de 2013, com o seguinte teor:</font><br>
</p><p><i><font>“(…) Temos presente a carta de V.Exas de 27 de Junho de 2013, cumprindo-nos referir o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>O contrato de arrendamento passa a ter o prazo de cinco anos, com inicio no dia 1 de Agosto de 2013 e termo no dia 31 de Julho de 2016;</font></i><br>
</p><p><i><font>O valor da renda a partir de Agosto de 2013 (…) passa a ser de € 494,17 (…)”</font></i><br>
</p><p><i><font>Informamos uma vez mais, que a presente comunicação não invalida, nem revoga qualquer outra destinada á denúncia do contrato de arrendamento com o fundamento de realização de obras de demolição e de remodelação profundas.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)”.</font></i><br>
</p><p><font>3.1.12. A A. endereçou á Ré, que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 54-55, datada de 02 de Julho de 2013, cujo integra teor se dá aqui por reproduzido e onde consta, nomeadamente, o seguinte:</font><br>
</p><p><i><font>“Na sequência e em cumprimento do acordado na n/reunião conjunta de 25 do corrente (…) somos pela presente, na n/qualidade de inquilina da loja n.º ...1 da Rua ..., ..., a formular uma contraproposta referente à denúncia do contrato de arrendamento em epigrafe, que V.Exas nos comunicaram como Senhoria através da v/carta de 3 de Junho p.p..</font></i><br>
</p><p><i><font>(…).</font></i><br>
</p><p><i><font>É por demais evidente que a indemnização legalmente prevista de 1 ano de rendas é manifestamente insuficiente para nos compensar da rude perda e dos elevados prejuízos que não deixaremos de sofrer com a perda do locado em preço.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nesta conformidade e atento (…) o exposto, entendemos que só ficaremos devidamente compensados, embora parcialmente, de tais perdas com a atribuição de uma indemnização que se situa em € 180.000,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>Em alternativa, encaramos como viável o realojamento do nosso estabelecimento comercial numa das lojas de que V. Exas. são proprietários no imóvel situado na Rua ... e fronteiro à intersecção com a Rua ...…</font></i><br>
</p><p><i><font>Claro está que esta solução de realojamento apenas será viável se a renda a cobrar por V. Exas for razoável (…), nomeadamente a celebração de um arrendamento com um prazo de, pelo menos, 10 anos de vigência, suportando V.Exas os custos de adaptação do espaço ao (…) estabelecimento e da mudança a efectuar do actual para o novo locado (…).”</font></i><br>
</p><p><font>3.1.13. A Ré endereçou à A., que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 56, datada de 18 de Novembro de 2013, com o seguinte teor: </font><i><font>“(…) Temos presente a carta de V.Exas de 27 de Junho de 2013, cumprindo-nos referir o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>O contrato de arrendamento passa a ter o prazo de cinco anos, com inicio no dia 1 de Agosto de 2013 e termo no dia 31 de Julho de 2016;</font></i><br>
</p><p><i><font>O valor da renda a partir de Agosto de 2013 (…) passa a ser de € 494,17 (…)”</font></i><br>
</p><p><i><font>Informamos uma vez mais, que a presente comunicação não invalida, nem revoga qualquer outra destinada á denúncia do contrato de arrendamento com o fundamento de realização de obras de demolição e de remodelação profundas (…)”.</font></i><br>
</p><p><font>3.1.12. A A. endereçou á Ré, que a recebeu, | [0 0 0 ... 0 0 0] |
vDKyu4YBgYBz1XKvVjFJ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:</font>
<p>
</p></font><p><font><font>"H... C... - S... de R... e O... de C... C..., Ld.a", com sede no Beco dos ...., nº ..., Porta ..., em Lisboa, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra "D... - T... e D... do M..., Ld.a", com sede na Rua de C..., nº ..., B...., Vila Verde, pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €12.684,07, acrescida de juros, vencidos e vincendos, até integral e efectivo pagamento, alegando, para tanto, e, em síntese, que, no exercício da actividade a que se dedica, forneceu à ré, a pedido desta, vários materiais destinados à construção civil, no valor global de €12.684,07, ainda não pago, apesar de instada, várias vezes, para o efeito.</font><br>
<font>Adianta a autora que a ré se tem limitado a invocar que o material não apresenta as características técnicas adequadas para a instalação no exterior e que não se trata de produto certificado.</font><br>
<font>Porém, ao invés do invocado pela ré, está-se perante material de marca Luxalon, adequado ao exterior, tendo sido aplicado em outras obras, sem qualquer reclamação, encontrando-se, devidamente, certificado, de acordo com as normas TAIM.</font><br>
<font>Finalmente, sustenta a autora que as características do material fornecido e respectiva certificação são, necessariamente, do conhecimento da ré, uma vez que esta opera, neste ramo de actividade, sendo que o mesmo tem todas as características que foram asseguradas pela autora, no momento da venda.</font><br>
<font>Na contestação, a ré defende-se, por impugnação e por excepção, deduzindo, igualmente, pedido reconvencional, em que sustenta que, na sua procedência, a autora seja condenada a pagar-lhe a quantia de €18.420,30, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da denúncia dos danos em obra à autora, por parte da ré, que perfazem a quantia de €744,13, e, subsidiariamente, que se opere a compensação, reconhecendo-se que a autora e ré são credoras recíprocas de, pelo menos, idêntica importância, ou seja, €12.684,07, que corresponde ao valor das facturas, sem os juros.</font><br>
<font>Para tanto, e, em síntese, alega que, tendo recebido da autora a garantia de que o material fornecido resistiria a fortes pressões/sucções e que jamais se desengataria, efectuou, então, a encomenda de um tecto Luxalon C 300, iniciando a sua aplicação em obra, de acordo com os padrões técnicos exigíveis.</font><br>
<font>Acontece, porém, que o material fornecido pela autora - tectos metálicos para exterior - não tinha as qualidades e características asseguradas aquando do orçamento e da demonstração, acabando o mesmo, depois de aplicado e sujeito ao primeiro teste ocasional climático, desabado do local onde foi aplicado.</font><br>
<font>Entretanto, em 1 de Junho de 2006, o dono da obra denunciou à autora, por escrito, os vícios existentes no referido tecto exterior do F... C... e exigiu a sua reparação, o mais urgente possível, dada a necessidade de retomar a abertura ao público das suas lojas, na parte afectada, sob pena de a ré ter de indemnizar o dono da obra pelos atrasos na aludida reparação.</font><br>
<font>Adianta a ré que a autora enviou um representante ao F... C..., para avaliação dos danos, não tendo, porém, o mesmo procedido à sua reparação imediata, nem substituindo o tecto por outro que assegurasse o fim a que se destinava.</font><br>
<font>Dada a urgência, a ré procedeu à substituição do tecto metálico danificado, tendo dispendido a quantia global de €18.420,30, sendo €12.285,00 com a nova equipa encarregue de o substituir, €1.375,00 com despesas de alojamento e deslocação, e ainda €1.563,00 com a substituição de todo o material aplicado por outro de idêntica qualidade.</font><br>
<font>Contactada a autora para assumir estes prejuízos, negou qualquer tipo de responsabilidade, afirmando que o produto tinha as características técnicas adequadas.</font><br>
<font>Na réplica, a autora alega que as excepções e o pedido reconvencional deduzidos devem ser julgados improcedentes, por não provados, condenando-se a ré, nos precisos termos do pedido formulado no articulado inicial.</font><br>
<font>Para tanto, e, em síntese, alega a autora que o material fornecido à ré se tratava de produto certificado, de acordo com a norma ISO 9001, produzido em conformidade com os standarts de qualidade do TAIM, factos estes conhecidos, nacional e internacionalmente, o que a ré bem sabe, porque opera neste ramo de actividade.</font><br>
<font>Que o material era certificado, adequado para o exterior, possuindo as características asseguradas pela autora, como resulta, inclusive, do facto de, após o colapso do tecto Luxalon, o mesmo ter voltado a ser colocado e não substituído por outro.</font><br>
<font>Que a ré foi, perfeitamente, elucidada, não tendo levantado qualquer dúvida quanto aos requisitos apertados a que a montagem teria de respeitar para que a resistência fosse a máxima.</font><br>
<font>Adianta, também, que a montagem do referido tecto metálico exige a elaboração de cálculos e a observância de distâncias mínimas de montagem dos vários componentes, sendo certo que este trabalho de montagem estava a cargo da ré ou de quem esta contratasse, e não da autora que apenas celebrou o contrato de compra e venda.</font><br>
<font>Na sua perspectiva, o colapso de uma das partes do tecto só pode ter sido devido ao desrespeito dos padrões técnicos de montagem, até porque, segundo alega, se ficou a dever-se a uma adversidade climatérica que a autora desconhece, apesar de afirmado pela ré, tal traduzir-se-ia num facto anormal, imprevisível, incontrolável, não imputável a ninguém, nem a nenhuma das partes, pelo que os prejuízos teriam de ser suportados, por quem arca com o risco de perecimento da coisa, ou seja, por conta do dono da obra, em virtude de já se encontrarem aplicados.</font><br>
<font>Alega ainda que o último fornecimento foi recebido pela ré, em 24 de Abril de 2006, e que a reclamação foi efectuada, em 6 de Junho de 2006, pelo que, na sua óptica, o suposto direito de anulação do contrato, em virtude da alegada falta de características asseguradas pela autora, a existir, já teria caducado.</font><br>
<font>Sustenta, finalmente, que a quantidade de mão-de-obra, alegadamente, utilizada pela ré para a reposição do tecto, é absurda, o mesmo se passando com as despesas de alojamento e com as deslocações.</font><br>
<font>A sentença julgou a acção, totalmente, provada e procedente, e, em consequência, condenou a ré a pagar à autora a quantia de €13.053,37, acrescida de juros de mora, às taxas legais, entretanto, em vigor, desde a propositura da acção (27.09.2006) até integral pagamento, sobre a quantia de €12.684,07, e julgou a reconvenção, totalmente, improcedente, por não provada, absolvendo a autora do respectivo pedido reconvencional.</font><br>
<font>Desta sentença, a ré interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a apelação e, em consequência, confirmou a decisão impugnada.</font><br>
<font>Do acórdão da Relação de Lisboa, a ré interpôs recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões que se transcrevem:</font><br>
<font>1ª - Inconformada a ora recorrente com o acórdão recorrido, dele vem interpor recurso de revista com fundamento em duas questões a saber: Nulidade da Sentença nos termos do artigo 668° n° 1 alínea c) do CPC, e, erro na determinação das normas jurídicas aplicadas (Arts. 916° e 917° do CCivil) com consequente erro de julgamento, mormente a aplicabilidade do art° 799° n° 1 do Cód Civil.</font><br>
<font>2ª - Questões de direito que se pretendem ver apreciadas pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça, em pleno exercício dos poderes que lhe estão conferidos pela Lei.</font><br>
<font>3ª - Recaia sobre a recorrida uma presunção de culpa, na produção deste evento, cabendo a esta ilidir tal presunção mediante prova em contrário, isto é, a prova da sua ignorância, sem culpa, do vício ou da falta de qualidade da coisa, como facto impeditivo do direito invocado pelo comprador.- artigo 342° n°2 e artigo 799°, ambos do Cód Civil.</font><br>
<font>4ª - Face à matéria dada como provada constantes dos pontos 1 a 32, deveria o Tribunal da Relação alterar a decisão do Tribunal a quo, e ser declarada procedente a reconvenção e condenada a recorrida a pagar os custos da substituição do tecto, operando a figura jurídica da compensação.</font><br>
<font>5ª - Ao entender o Tribunal a quo que, dos factos provados - 1 a 32 - resulta que a autora cumpriu a sua obrigação principal de entrega desses bens - cuja propriedade, por mero efeito do contrato, se transferiu para a ré; não tendo, contudo, a ré cumprido com a sua obrigação principal de pagar o preço acordado entre as partes (cfr. artigo 879° do Código Civil), fez uma incorrecta subsunção dos factos nos normativos legais aplicáveis, situação que a Relação confirmou violando assim direito substantivo.</font><br>
<font>6ª - A interpretação feita pelo Tribunal a quo dos factos nos normativos legais aplicáveis deveria ser alterada pela da Relação.</font><br>
<font>7ª - Ao ter sufragado da mesma opinião do Tribunal a quo, o Tribunal da Relação violou normas substantivas.</font><br>
<font>8ª - Com efeito, teria necessariamente que operar a regra legal, de que o direito à reparação ou substituição da coisa repousa sobre a culpa presumida do vendedor, cabendo a este ilidir tal presunção mediante prova em contrário, isto é, a prova da sua ignorância, sem culpa, do vício ou da falta de qualidade da coisa, como facto impeditivo do direito invocado pelo comprador.</font><br>
<font>9ª - Ora, ao ignorar tal normativo e tal presunção, o Venerando Tribunal da Relação fez uma incorrecta subsunção dos factos nos normativos legais aplicáveis.</font><br>
<font>10ª - Na verdade, consta dos factos dados como provados, ponto 7, que a recorrida em fax enviado à ré em resposta ao solicitado, informou que: Este é um material devidamente certificado e testado para aplicações no exterior, o que é uma mais valia e uma segurança para o aplicador, porque dá garantias muito elevadas na obra em questão, como o tecto estará colocado numa posição muito elevada, será sujeito a pressões imensas de pressão/sucção e será necessário um tecto que resista a isso tudo (G);</font><br>
<font>11ª - Também consta dos factos dados como provados que, “Só com todas as garantias dadas pela autora de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria, é que a R. encomendou à autora o referido material” (6o) conforme consta do ponto 18° da matéria de facto dada como assente.</font><br>
<font>12ª - Também foi dado como provado que,</font><i><font> </font></i><font>na altura da encomenda de tais materiais foi assegurado pela autora que o produto era o ideal para o fim que a ré pretendia, tendo inclusivamente assegurado isso por escrito através do orçamento enviado à ré em 25 de Janeiro de 2006 (E), conforme consta do ponto 5 da matéria de facto assente.</font><br>
<font>13ª - Ora, tendo ficado provado que, em trinta e um de Maio de 2006, o tecto exterior do fórum Coimbra iniciou um processo de degradação após uma adversidade climatérica quando este já se encontrava aberto ao publico e em pleno funcionamento (70) - ponto 19 da matéria de facto assente - E depois de a ré/reconvinte ter comunicado à autora aqui recorrida tal circunstancia, por escrito e mesmo assim,- A autora não procedeu à reparação do tecto, não o substituiu por outro e negou ser de sua responsabilidade (9o).- ponto 21 dos factos provados, necessariamente, recaia sobre a autora uma presunção de culpa, na produção deste evento, cabendo a esta ilidir tal presunção mediante prova em contrário, isto é, a prova da sua ignorância, sem culpa, do vício ou da falta de qualidade da coisa, como facto impeditivo do direito invocado pelo comprador.</font><br>
<font>14ª </font><i><font>- </font></i><font>Dos factos provados, pontos 5, 18 e 19, resulta inequivocamente que a recorrida assegurou à recorrente um determinado resultado, de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria, é que a ré encomendou à autora o referido material (6o), pelo que, sobre ela vendedora, recaia a culpa da produção do evento, culpa essa que a mesma não ilidiu.</font><br>
<font>15ª</font><i><font> - </font></i><font>Aliás, provado ficou também que - ponto 21 - que a recorrida não procedeu à reparação do tecto, não o substituiu por outro e negou ser de sua responsabilidade. Facto que levou a ré a proceder à reparação do tecto, suportando o respectivo custo - ponto 22 dos factos provados.</font><br>
<font>16ª</font><i><font> - </font></i><font>Esta contradição determina a nulidade da sentença. Com efeito, o Tribunal a quo, deu como provado que: ponto 7 dos factos provados: A autora, em fax enviado à ré em resposta ao solicitado, informou que: Este é um material devidamente certificado e testado para aplicações no exterior, o que é uma mais valia e uma segurança para o aplicador, porque dá garantias muito elevadas na obra em questão, como o tecto estará colocado numa posição muito elevada, será sujeito a pressões imensas de pressão/sucção e será necessário um tecto que resista a isso tudo (G) - ponto 17 dos factos provados: No decorrer dessa demonstração/apresentação, pelo delegado comercial da autora foi referido ao responsável da ré que uma vez as lamelas engatadas nos portadores e accionadas as patilhas de segurança existentes nas portadoras, estas nunca mais se desengatariam (5o). Ponto 18° dos factos provados: Só com todas as garantias dadas pela autora de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria, é que a ré encomendou à autora o referido material (6o)., referentes aos quesitos G, 5o e 6o da base instrutória, respectivamente.</font><br>
<font>17ª</font><i><font> -</font></i><font> Em manifesta contradição, o Tribunal da Relação continuou a dar como não provado o quesito 16 da base instrutória, situação que determina a nulidade da sentença.</font><br>
<font>18ª</font><i><font> </font></i><font>- Dos factos dados como provados - ponto 1 a 32, devia recair sobre a autora/reconvinda a presunção de culpa no evento lesivo, cabendo a esta ilidir tal presunção mediante prova em contrário, isto é, a prova da sua ignorância, sem culpa, do vício ou da falta de qualidade da coisa, como facto impeditivo do direito invocado pelo comprador.</font><br>
<font>19ª - Não bastaria assim apenas e só, com a simples entrega dos bens, julgar que a autora cumpriu a sua obrigação, depois de incluir nos factos como provados os pontos 7o, 17° e 18°, configurando tal circunstancia uma incorrecta subsunção dos factos nos normativos legais aplicáveis.</font><br>
<font>20ª - Na verdade, consta dos factos dados como provados, ponto 7, que a recorrida em fax enviado à ré em resposta ao solicitado, informou que: Este é um material devidamente certificado e testado para aplicações no exterior, o que é uma mais valia e uma segurança para o aplicador, porque dá garantias muito elevadas na obra em questão, como o tecto estará colocado numa posição muito elevada, será sujeito a pressões imensas de pressão/sucção e será necessário um tecto que resista a isso tudo (G).</font><br>
<font>21ª - Também consta dos factos dados como provados que, “Só com todas as garantias dadas pela autora de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria, é que a R. encomendou à autora o referido matéria”l (6o) conforme consta do ponto 18° da matéria de facto dado como assente.</font><br>
<font>22ª - Também foi dado como provado que,</font><i><font> </font></i><font>na altura da encomenda de tais materiais foi assegurado pela autora que o produto era o ideal para o fim que a ré pretendia, tendo inclusivamente assegurado isso por escrito através do orçamento enviado à ré em 25 de Janeiro de 2006 (E), conforme consta do ponto 5 da matéria de facto assente.</font><br>
<font>23ª -</font><i><font> </font></i><font>Ora, tendo ficado provado que, “Em trinta e um de Maio de 2006, o tecto exterior do f... C... iniciou um processo de degradação após uma adversidade climatérica quando este já se encontrava aberto ao publico e em pleno funcionamento” (70) - ponto 19 da matéria de facto assente - e depois de a ré/reconvinte ter comunicado à autora aqui recorrida tal circunstancia, por escrito e mesmo assim a autora não procedeu à reparação do tecto, não o substituiu por outro e negou ser de sua responsabilidade (9o) - ponto 21 dos factos provados.</font><br>
<font>24ª - Ora necessariamente, recaia sobre a autora uma presunção de culpa, na produção deste evento, cabendo a esta ilidir tal presunção mediante prova em contrário, isto é, a prova da sua ignorância, sem culpa, do vício ou da falta de qualidade da coisa, como facto impeditivo do direito invocado pelo comprador.</font><br>
<i><font>25ª -</font></i><font> Escreve Calvão da Silva a este propósito in Compra e Venda de Coisas Defeituosas, 63, "o vendedor assegura por certo período um determinado resultado, a manutenção em bom estado ou bom funcionamento (idoneidade para o uso), da coisa, sendo responsável por todas as anomalias, avarias, falta ou deficiente funcionamento por causa inerente à coisa e dentro do uso normal da mesma. Este facto, o facto de o vendedor assumir a garantia de um resultado, tem importância no domínio do ónus probandi: ao comprador basta fazer a prova do mau funcionamento da coisa no período de duração da garantia, sem necessidade de identificar ou individualizar a causa concreta impeditiva do resultado prometido e assegurado nem de provar a sua existência no momento da entrega; ao vendedor que queira ilibar-se da responsabilidade é que cabe a prova de que a causa concreta do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa - assim ilidindo a presunção da anterioridade ou contemporaneidade do defeito (em relação à entrega) que caracteriza a garantia convencional de bom estado e bom funcionamento - e imputável ao comprador (v.g. má utilização) a terceiro, ou devida a caso fortuito". No mesmo sentido Romano Martinez in Direito das Obrigações, 141.</font><br>
<font>26ª </font><i><font>-</font></i><font> O ilícito contratual, pela conjugação dos elementos carreados para a Relação, existiu por banda da recorrida, e, como tal, recaía sobre esta uma presunção de culpa que não foi objectivamente apreciada, violando assim uma regra substantiva.</font><br>
<font>27ª - Mal andou o Tribunal da Relação ao não aplicar aqui o regime da inversão do ónus da prova, violando assim elementares regras do direito substantivo.</font><br>
<font>28ª - Existe uma clara contradição entre a matéria de facto dado como provada e as normas jurídicas aplicáveis. - art° 668° n° 1 alínea c) do C.P.C.</font><br>
<font>29ª - Os fundamentos invocados pelo Tribunal a quo conduziriam, logicamente, a um resultado diverso do expresso naquela decisão, levando isso sim a um resultado oposto, situação que a Relação não apreciou.</font><br>
<font>30ª - Se assim não fosse entendido pelo Tribunal da Relação, deveria ter sido apreciado o vicio de erro de julgamento subjacente á sentença do Tribunal a quo.</font><br>
<font>31ª - Foram preteridas normas substantivas essenciais para o desfecho diferente daquele acórdão, nomeadamente os artigos 342° n° 2 e 799° n° 1 do Código Civil.</font><br>
<font>Nas suas contra-alegações, a autora entende que deve ser negado provimento ao recurso, confirmando-se o acórdão recorrido.</font><br>
<font>O Tribunal da Relação entendeu que se devem considerar demonstrados os seguintes factos, que este Supremo Tribunal de Justiça aceita, nos termos das disposições combinadas dos artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC), mas reproduz:</font><br>
<font>1. A autora é uma sociedade comercial que tem como objecto social o comércio e a representação de materiais destinados à construção civil - A).</font><br>
<font>2. No exercício da sua actividade, a autora, por solicitação da ré, forneceu-lhe vários materiais – B).</font><br>
<font>3. A que corresponderam as seguintes facturas e respectivas notas de encomenda:</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 15.03.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 14.05.06, no valor de € 46,95, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 15.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 15.03.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 14.05.06, no valor de € 3.341,87, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 15.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 21.03.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 20.05.2006, no valor de € 2.031,76, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 21.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 22.03.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 21.05.06, no valor de € 432,12, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 22.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 04.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 03.06.06, no valor de € 226,75, tendo o material sido entregue recebido, no dia 04.04.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 04.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 03.06.06, no valor de € 706,54, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 04.04.2006;</font><br>
<font>Factura ..., emitida em 04.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 03.06.06, no valor de € 758,82, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 29.03.2006;</font><br>
<font>Factura ..., emitida em 04.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 03.06.06, no valor de € 1.097,71, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 29.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 05.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 04.06.06, no valor de € 823,28, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 31.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 05.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 04.06.06, no valor de € 548,86, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 04.04.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 11.04.2006, na sequência da vossa encomenda n.° ..., vencida em 10.06.06, no valor de € 768,37, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 10.04.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 11.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 10.06.06, no valor de €1.206,91, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 29.03.2006;</font><br>
<font>Factura n.°..., emitida em 12.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 11.06.06, no valor de € 158,27, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 12.04.2006;</font><br>
<font>Factura n.° ..., emitida em 24.04.2006, na sequência da nota de encomenda n.° ..., vencida em 23.06.06, no valor de € 535,86, tendo o material sido entregue e recebido, no dia 24.04.2006; perfazendo o valor global de €12.684,07 - C).</font><br>
<font>4. Tais materiais foram solicitados pela ré para uma obra que lhe havia sido adjudicada, em regime de sub-empreitada, no F... C..., em Coimbra - D).</font><br>
<font>5. Na altura da encomenda de tais materiais, foi assegurado pela autora que o produto era o ideal para o fim que a ré pretendia, tendo, inclusivamente, assegurado isso, por escrito, através do orçamento enviado à ré, em 25 de Janeiro de 2006 - E).</font><br>
<font>6. A representação em Portugal do referido produto cabia à autora, pelo que só esta poderia fornecer tal produto - F).</font><br>
<font>7. A autora, em fax enviado à ré, em resposta ao solicitado, informou que: Este é um material devidamente certificado e testado para aplicações no exterior, o que é uma mais valia e uma segurança para o aplicador, porque dá garantias muito elevadas na obra em questão, como o tecto estará colocado numa posição muito elevada, será sujeito a pressões imensas de pressão/sucção e será necessário um tecto que resista a isso tudo – G).</font><br>
<font>8. No seguimento do pedido da ré, a autora enviou um delegado comercial seu, à obra do F... C..., e facultou amostras, bem como procedeu à demonstração do material ao encarregado de obra da ré - H).</font><br>
<font>9. O dono da obra (S... S.A.), no dia 1 de Junho de 2006, denunciou, por escrito, à autora os vícios e danos existentes no referido tecto exterior do F... C... - I).</font><br>
<font>10. A ré comunicou, imediatamente, à autora toda a situação ocorrida - J).</font><br>
<font>11. Tendo a autora enviado, então, um representante ao F... C..., para avaliação dos referidos danos - K).</font><br>
<font>12. Contactada, novamente, a autora para assumir tais prejuízos, esta limitou-se, de novo, a negar qualquer tipo de responsabilidade e continuou a afirmar que o produto tinha as características técnicas adequadas - L).</font><br>
<font>13. A ré, na obra que andava a executar, em regime de sub empreitada, para a empresa S..., no F... C..., em Coimbra, foi confrontada, no articulado preconizado pelo projectista, com a aplicação de um tecto metálico, na parte exterior do dito F... - 1.°.</font><br>
<font>14. O referido tecto indicado, então, pelo dono de obra tratava-se de um tecto metálico, com características do Tecto Luxalon ® 300 - 2.°.</font><br>
<font>15. Antes da sua encomenda, a ré solicitou à autora referências do produto e a confirmação se o mesmo tinha as qualidades para o local onde o iriam aplicar e se permitia a realização do fim a que se destinava - 3.°.</font><br>
<font>16. Perante aquela garantia da autora, dizendo que o material era o adequado para aquela obra (tecto exterior do F... C...), a ré, ainda assim, solicitou uma amostra e apresentação do produto - 4.°.</font><br>
<font>17. No decorrer dessa demonstração/apresentação, pelo delegado comercial da autora foi referido ao responsável da ré que, uma vez as lamelas engatadas nos portadores e accionadas as patilhas de segurança existentes nas portadoras, estas nunca mais se desengatariam - 5.°.</font><br>
<font>18. Só com todas as garantias dadas pela autora de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria é que a ré encomendou à autora o referido material - 6.°.</font><br>
<font>19. Em 31 de Maio de 2006, o tecto exterior do F... C... iniciou um processo de degradação, após uma adversidade climatérica, quando este já se encontrava aberto ao público e em pleno funcionamento - 7.°. </font><br>
<font>20. O dono da obra (S... SA), no dia 1 de Junho de 2006, exigiu a reparação do tecto, o mais urgente possível, dada a necessidade inadiável de retomar a abertura ao publico das lojas do referido fórum, na parte afectada, sob pena de a ré ter de indemnizar o dono da obra pelos atrasos na sua reparação - 8.°.</font><br>
<font>21. A autora não procedeu à reparação do tecto, não o substituiu por outro e negou ser de sua responsabilidade - 9.°.</font><br>
<font>22. A ré, dada a necessidade e urgência na sua realização, procedeu à reparação do tecto, suportando o respectivo custo - 10.°.</font><br>
<font>23. O tecto Luxalon ® 300 é um produto produzido pela Hunter Douglas e é certificado, de acordo com a norma ISO 9001 – 20º.</font><br>
<font>24. E é produzido, de acordo com os standards de qualidade do TAIM - 21.°.</font><br>
<font>25. A Luxalon distingue na sua gama de produtos os que são adequados para a aplicação exterior - 23.°.</font><br>
<font>26. As instruções técnicas de montagem foram facultadas e explicadas à ré, não tendo esta colocado qualquer dúvida - 24.° e 25.°.</font><br>
<font>27. A montagem está sujeita a requisitos apertados, tendo, inclusivamente, dois gráficos que indicam as distâncias mínimas de montagem dos vários componentes, consoante a pressão a que o tecto irá estar sujeito - 26.°.</font><br>
<font>28. Cálculos esses que terão que ser, necessariamente, feitos por quem executa a montagem - 27.º.</font><br>
<font>29. A parte do tecto que caiu foi inferior a 12 % - 28º.</font><br>
<font>30. O último fornecimento foi recebido, em 24 de Abril de 2006 - 30.°.</font><br>
<font>31. A reclamação foi feita, em 6 de Junho de 2006 - 31.°.</font><br>
<font>32. Após o desabamento, a ré voltou a colocar o mesmo tecto Luxalon </font><i><font>® </font></i><font>que a autora lhe tinha fornecido, na obra do F... C... - 33.°.</font><br>
<font> </font><br>
<font> *</font><br>
<br>
<font>Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.</font><br>
<font>As questões a decidir, na presente revista, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3, 690º e 726º, todos do CPC, são as seguintes:</font><br>
<font>I - A questão da nulidade do acórdão.</font><br>
<font>II – A questão da presunção de culpa do vendedor.</font><br>
<br>
<font> I. DA NULIDADE DO ACÓRDÃO</font><br>
<br>
<font> Sustenta, desde logo, a ré que se verifica a causa de nulidade da sentença que consiste na oposição entre os fundamentos e a decisão, a que se reporta o artigo 668º, nº 1, c), aplicável aos acórdãos, por força do estipulado no artigo 716º, nº 1, ambos do CPC.</font><br>
<font> Dispõe, então, a alínea c), do nº 1, do artigo 668º, do CPC, que “é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão;”.</font><br>
<font> Esta nulidade consubstancia um vício, puramente, lógico do discurso judicial e não um erro de julgamento, consiste no facto de os fundamentos aduzidos pelo Juiz para neles basear a sua decisão, constituindo o seu respectivo antecedente lógico, estarem em oposição com a mesma</font><font> (1) </font><font>, conduzindo a um resultado oposto ao que vem expresso na sentença, por forma a que se possa afirmar que esse fundamento, logicamente, deveria conduzir a uma solução oposta à expressa na sentença.</font><br>
<font> A ré sustenta a sua argumentação com a alegada contradição na matéria de facto constante das alíneas E) [“Na altura da encomenda de tais materiais foi assegurado pela autora que o produto era o ideal para o fim que a ré pretendia, tendo inclusivamente assegurado isso por escrito através do orçamento enviado à ré, em 25 de Janeiro de 2006”] e G), [“A autora, em fax enviado à ré, em resposta ao solicitado, informou que: Este é um material devidamente certificado e testado para aplicações no exterior, o que é uma mais valia e uma segurança para o aplicador, porque dá garantias muito elevadas na obra em questão, como o tecto estará colocado numa posição muito elevada, será sujeito a pressões imensas de pressão/sucção e será necessário um tecto que resista a isso tudo”] dos “factos assentes”, e dos pontos nºs 5 [“No decorrer dessa demonstração/apresentação, pelo delegado comercial da autora foi referido ao responsável da ré que uma vez as lamelas engatadas nos portadores e accionadas as patilhas de segurança existentes nas portadoras, estas nunca mais se desengatariam”] e 6º [“Só com todas as garantias dadas pela autora de que aquele material resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria é que a ré encomendou à autora o referido material”], face à resposta restritiva e não negativa, conforme afirma, ao ponto nº 16, todos da base instrutória, onde se perguntava “A ré encomendou e adquiriu aquele material, por a autora lhe ter garantido e convencido que aquele produto resistiria a todo o tipo de pressões/fricções no exterior onde fosse aplicado?”, por apenas se ter dado como demonstrado que ”Antes da sua encomenda, a ré solicitou à autora referências do produto e a confirmação se o mesmo tinha as qualidades para o local onde o iriam aplicar e se permitia a realização do fim a que se destinava [resposta ao ponto nº 3] e “Perante aquela garantia da autora, dizendo que o material era o adequado para aquela obra (tecto exterior do F... C...), a ré, ainda assim, solicitou uma amostra e apresentação do produto” [resposta ao ponto nº 4].</font><br>
<font> Efectivamente, tendo-se provado que a ré só encomendou à autora o referido material, depois de todas as garantias dadas por esta de que o mesmo resistiria a forte pressões/sucções e que jamais se desengataria, tal não colide co | [0 0 0 ... 0 1 0] |
njKru4YBgYBz1XKvhSvd | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<br>
<br>
<font>ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA</font>
<p><font>AA, residente na Rua ..., ..., propôs a presente acção, com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB e esposa, CC,</font><b><font> </font></b><font>residentes em ..., freguesia de ..., ..., pedindo que, na sua procedência, estes sejam condenados a pagar-lhe a quantia de €25.059,80, acrescida de juros de mora, já vencidos, desde 28 de Fevereiro de 2003, no montante de €1.294,20, e dos vincendos, até integral liquidação daquele primeiro quantitativo, alegando, para o efeito, e, em síntese, que, no exercício da sua actividade de empresário da construção civil, aceitou uma proposta dos réus no sentido de se encarregar da construção de uma moradia que os últimos tinham já iniciado, podendo, para tanto, contratar os trabalhos das suas empresas ou de terceiros e adquirir os materiais no local que melhor entendesse, obrigando-se os réus a ir procedendo à entrega ao autor das quantias necessárias para custear a execução da dita moradia, à media da sua construção.</font>
</p></font><p><font><font>Adiantou que o preço a pagar pelos serviços por si prestados não havia sido, desde logo, acordado, mas que seria devido, no final da obra, e calculado em função do custo total da mesma, sendo que, tendo os seus serviços finalizado, no início de Fevereiro de 2003, apresentou aos réus um saldo, a seu favor, relativo às despesas tidas com a execução da mencionada obra, no valor de €15.059,80, o que os mesmos aceitaram, para além do preço dos seus serviços, que se fixava em €10.000,00, montantes esses que, até ao presente, os réus não pagaram.</font><br>
<font>Na parte da contestação que ainda interessa considerar, os réus impugnam a alegação inicial, acrescentando que os trabalhos de execução da obra apresentavam várias deficiências que, enquanto não corrigidas, justificavam o não pagamento do que, eventualmente, fosse devido ao autor.</font><br>
<font>Na réplica, o autor conclui, nos precisos termos da petição inicial.</font><br>
<font>A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente, e, em consequência, condenou os réus a pagar ao autor a quantia de €22.559,80, com a faculdade daqueles se recusarem a fazê-lo, enquanto o último não proceder à reparação dos defeitos existentes na obra e que lhe são imputáveis.</font><br>
<font>Desta sentença, o autor e os réus interpuseram recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a apelação interposta pelos réus, mas, parcialmente, procedente o recuso interposto pelo autor e, nessa medida, alterando o sentenciado, condenou os réus a pagarem ao autor a quantia de €22.559,80</font><b><font>, </font></b><font>acrescida de juros moratórios civis, desde a data da sentença até integral liquidação daquele primeiro quantitativo.</font><br>
<font>Do acórdão da Relação do Porto, interpuseram, de novo, o autor e os réus recurso de revista, terminando aquele as alegações com o pedido da sua alteração, de forma a que os réus sejam condenados a pagar juros de mora ao autor sobre a quantia em dívida de €22559,80, calculados à taxa legal, em conformidade com o disposto pelo artigo 559º, do Código Civil, a contar de Fevereiro de 2003 e até efectivo e integral pagamento, e os réus com o pedido da sua revogação, julgando-se a acção improcedente, ou, quando assim se não entenda, mantendo-se a decisão proferida, em 1a Instância, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem:</font><br>
<font> O AUTOR:</font><br>
<font>1ª - O crédito do recorrente não é ilíquido porque foi devidamente concretizado por este junto dos recorridos em Fevereiro de 2003 quando lhes apresentou a conta corrente dos custos da obra e das entregas efectuadas e bem assim a sua conta dos serviços prestados.</font><br>
<font>2ª - Os referidos custos eram então de 15.059,80€ e com esse montante foram reconhecidos na sentença proferida.</font><br>
<font>3ª - A conta dos serviços prestados que então se fixou em 10.000,00€ foi reduzida pela mesma sentença para 7.500,00€, mas essa circunstância não determina a iliquidez do respectivo crédito.</font><br>
<font>4ª - Dado que o recorrente apresentou aos réus as quantias em dívida em Fevereiro de 2003, e os interpelou para pagamento nessa data deve considerar-se que a partir daí se encontram em mora (art. 805° do C. Civil).</font><br>
<font>5ª - Aliás, sendo o crédito relativo ao preço duma empreitada e tendo os réus recebido a obra nessa mesma data, também por força do disposto no art. 1211º, n° 2 do Código Civil o preço deveria ser pago nesse momento, havendo mora a partir daí.</font><br>
<font>6ª - Decidindo de modo diferente o douto acórdão recorrido fez uma incorrecta interpretação e aplicação dos preceitos atrás citados.</font><br>
<font> OS RÉUS:</font><br>
<font>1ª – Do que ficou provado em audiência de discussão e julgamento extrai-se que a intervenção do recorrido, ao longo da execução das obras, não se pode qualificar como autónoma ou independente.</font><br>
<font>2ª - A presença quase diária do recorrente marido junto das obras para</font><br>
<font>verificar o seu andamento, e a constante realização de reuniões entre este e o recorrido, para a tomada de decisões quanto à execução da mesma, são manifestações evidentes disso.</font><br>
<font>3ª - A intervenção do recorrente marido ultrapassava a mera função</font><br>
<font>fiscalização da obra, a qual, num normal contrato de empreitada, é sempre permitida ao dono da obra, e que confere ao empreiteiro uma ampla autonomia na execução da mesma.</font><br>
<font>4ª - Aliás, foi dado como provado que a fiscalização da obra era efectuada unicamente pelo arquitecto.</font><br>
<font>5ª - O que só pode apontar no sentido de que a intervenção do recorrente marido extravasava, afinal de contas, essa mera função, já que esta fora delegada "exclusivamente” noutrem.</font><br>
<font>6ª - Tal circunstância, acrescida do facto de os recorrentes terem chegado a adquirir materiais para posterior aplicação na obra pelo recorrido, constitui factualidade bastante para demonstrar a falta de autonomia com que o recorrido exerceu a sua actividade no caso em apreço.</font><br>
<font>7ª - O negócio celebrado entre recorrentes e recorrido deverá, assim, reger-se pelas regras do mandato, e não, como entenderam as instâncias, segundo as regras da empreitada.</font><br>
<font>8ª - Configura-se, pois, como um contrato que se presume gratuito (art.</font><br>
<font>1158°, n°1 do CC), já que a presunção de onerosidade nunca poderia</font><br>
<font>verificar-se, no caso em apreço.</font><br>
<font>9ª - Na verdade, estabelece a segunda parte do n°1 do artigo 1158°, do C. Civ., que o mandato apenas se presumirá oneroso quando tiver por objecto actos que o mandatário pratique "por profissão".</font><br>
<font>10ª</font><i><font> - </font></i><font>Ora, não se provou que o recorrido seja, ou que alguma vez tenha sido, construtor civil.</font><br>
<font>11ª - Nem existe nos autos uma única factura emitida pelo recorrido que evidencie a prática de tal actividade.</font><br>
<font>12ª - Se praticasse essa actividade, seguramente que o recorrido teria de ter proveitos em IRS, e de estar inscrito no IVA, o que não veio a provar-se.</font><br>
<font>13ª - Em suma, o recorrido não era, nem é, nunca foi, comerciante, pois que nunca praticou, de forma habitual, profissional, ou em nome próprio, actos de comércio.</font><br>
<font>14ª - A actividade do recorrido resumia-se à de mero intermediário, que apenas orientava e fiscalizava a execução das obras, graciosamente, recorrendo a empresas por si geridas e a terceiros.</font><br>
<font>15ª - O que, aliás, justificava, além da ausência de facturação, a falta de retribuição pelo referido serviço, posto que os fornecimentos eram feitos, sob indicação e direcção do recorrido, através de sociedades geridas por este ou de outras empresas das suas relações, beneficiárias do lucro das respectivas transacções.</font><br>
<font>16ª - Cabia ao recorrido alegar e demonstrar que os actos recaem no âmbito da sua actividade profissional, o que este não fez.</font><br>
<font>17ª - Não existiu qualquer ajuste entre as partes quanto à retribuição (cfr. art. 1158°, n° 2 CC).</font><br>
<font>18ª - Foi o recorrido quem decidiu unilateralmente fixar um preço, sem que conste dos autos que o mesmo alguma vez tenha sido aceite pelos recorrentes.</font><br>
<font>19ª - Do que vem exposto resulta que a decisão que qualificou o contrato celebrado entre os recorrentes e o recorrido como um contrato de empreitada, não fez correcta interpretação e aplicação das normas legais acima citadas, por se reputarem aplicáveis a esse negócio as regras do mandato.</font><br>
<font>Sem prescindir:</font><br>
<font>20ª - É nos articulados, enquanto "peças em que as partes expõem os fundamentos da acção e da defesa e formulam os pedidos correspondentes" que as partes definem as suas pretensões jurisdicionais (art. 151°, n° 1, do CPC).</font><br>
<font>21ª - Para que o Tribunal possa dirimir um concreto litígio submetido à sua apreciação, necessário é que as partes fixem com precisão os termos exactos da lide, sendo esta a função dos articulados.</font><br>
<font>22ª - Das disposições constantes dos arts. 467°, n° 1, d), 664° e 264º, todos do CPC, resulta clara a necessidade de as partes alegaram os factos sobre os quais assenta a sua pretensão, sob pena de esta não poder ser atendida, nos termos dos arts. 511°, n° 1, e 513°, ambos do CPC.</font><br>
<font>23ª - A nossa lei processual civil acolheu a teoria da substanciação em detrimento da teoria da individualização, sendo necessário indicar o facto ou factos constitutivos do direito que se pretende fazer valer.</font><br>
<font>24ª - O (único) documento que suporta a sua petição, e que o recorrido denomina "conta corrente", mais não faz do que contabilizar uma série de movimentos a crédito e a débito - que subjazem a eventuais e sucessivos contratos de compra e venda e/ou de prestação de serviços.</font><br>
<font>25ª - Não constitui um contrato de conta-corrente mas unicamente uma mera técnica contabilística de escrituração.</font><br>
<font>26ª - Partilhando os ensinamentos do Supremo Tribunal de Justiça, vazados nos Acórdãos de 3.7.1985 e de 24.10.1995, entendem os recorrentes que, para além da alegação específica de cada contrato de compra e venda e/ou prestação de serviços e da alegação e prova da necessária incorporação dos materiais e serviços prestados na obra, se impõe a prova dos fornecimentos e da prestação de serviços, prova essa que passa pela sua documentação - emissão de facturas - até pela relevância fiscal em sede de IVA e de IRS.</font><br>
<font>27ª - Ora, conforme foi alegado na contestação (cfr. arts. 44, 45, 46, 47, 49, 50, 51, 56, 57, 58, 61 e 62), o recorrido não especifica na sua petição que materiais adquiriu, que trabalhos contratou, nem que despesas realizou, e nunca emitiu em nome dos recorrentes, nem lhes apresentou, uma só factura respeitante a materiais aplicados ou trabalhos prestados, na obra, nem qualquer conta relativa a serviços prestados.</font><br>
<font>28ª - É o próprio recorrido quem admite, expressamente, quando confrontado na fase de instrução com o requerimento feito pelos recorrentes ao abrigo do art. 528º, n° 1, do C P Civil, "que a conta dos serviços prestados ... foi apresentada verbalmente e dela não existe documento" (cfr. fls. 151).</font><br>
<font>29ª - Por outro lado, na dita "conta-corrente" não se encontra relacionada qualquer factura ou documento de suporte, sendo genéricas e vagas as descrições de quase todos, senão todos, os lançamentos das despesas aí mencionados, o que, obviamente, não permite o exercício do contraditório.</font><br>
<font>30ª - Ora, esta realidade jurídica invocada pelos recorrentes na sua contestação foi totalmente desconsiderada pelas instâncias, apesar de se afigurar relevante tendo em consideração as várias soluções plausíveis da questão de direito - art. 511°, n°1, do C. P. Civil - e que no caso em apreço passa também por saber se o recorrido deu cumprimento às disposições contidas nas normas processuais acima invocadas.</font><br>
<font>31ª - A questão que os recorrentes colocam reside, pois, em saber se não obstante não terem reclamado da elaboração da base instrutória, não deverão ser ainda instruídos esses factos alegados em sede de contestação e tidos como interessantes para a decisão da causa, sendo certo que o julgamento da chamada "questão-de-facto" não transita em julgado até à sua apreciação pelo Supremo Tribunal de Justiça - art. 729°, n°3, do C. P. Civil.</font><br>
<font>32ª - Ora, atenta a causa de pedir invocada, o pedido formulado e a defesa apresentada, a matéria ora reclamada para instrução, isto é, a matéria constante dos mencionados artigos da contestação, pode ter importância decisiva para apurar se ocorreu, ou não, violação de lei de processo.</font><br>
<font>33ª - Há, pois, que, nos termos dos arts. 729°, n°3, e 730°, n°1, do</font><br>
<font>C. P. Civil, ampliar a matéria de facto em ordem a apurar da realidade dos factos alegados naqueles artigos da contestação, a fim de ser novamente julgada a causa e reformada a decisão recorrida.</font><br>
<font>Ainda sem prescindir:</font><br>
<font>34ª - Para julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo autor o douto Acórdão recorrido considerou que constitui obstáculo ao funcionamento da excepção de não cumprimento do contrato, o facto de, na sua óptica, não se poder dar como demonstrado terem os réus manifestado previamente à presente acção ou mesmo nesta qual o direito que, perante os falados defeitos, pretendem exercer contra o autor, se a eliminação dos defeitos, a redução do preço ou qualquer outro pertinente face a um cumprimento defeituoso.</font><br>
<font>35ª - Não foi, assim, a ausência de prévia denúncia dos defeitos ao autor que inviabilizou o funcionamento daquela excepção - já que para tanto considerou suficiente a sua arguição pelos réus em sede da presente acção e no âmbito da sua defesa (aliás em conformidade com a fundamentação constante da douta sentença do Tribunal de 1a Instância) -, mas antes o facto de, alegadamente, não terem os réus "...deduzido, perante os falados vícios, algum dos correspondentes direitos que legalmente lhe assistiam".</font><br>
<font>36ª - Ora, lê-se no art. 104º da contestação que " Os RR. sempre estiveram na disposição de pagar o que se apurasse ser devido, mas só após se certificarem das despesas efectivamente realizadas, verem as anomalias reparadas e serem compensados do valor das despesas que tiveram de suportar com reparações.</font><br>
<font>37ª - Tal afirmação não constitui mais nem menos do que a expressão</font><br>
<font>inequívoca do direito dos réus exigirem do autor a eliminação dos defeitos, como condição sine qua non do pagamento do preço que se apurasse ser devido.</font><br>
<font>38ª - Foi claramente esse direito, e não outro (o da redução do preço ou</font><br>
<font>da resolução do contrato), aquele que os recorrentes manifestaram na sua contestação, pelo que, com o devido respeito, a tese do douto Acórdão recorrido é insustentável.</font><br>
<font>39ª - Como assim, tal como se decidiu em 1a Instância, inexistindo</font><br>
<font>obstáculo ao funcionamento da invocada excepção de não cumprimento do contrato, sempre estariam os réus, ora recorrentes, legitimados a recusar a sua prestação enquanto não fossem corrigidos, pelo autor/recorrido, os defeitos da obra por ele construída.</font><br>
<font>40ª - Por isso ao julgar não haver lugar ao funcionamento dessa excepção o douto Acórdão recorrido violou o disposto no art. 428° do CC.</font><br>
<font>Nas suas contra-alegações, o autor sustenta que não existe fundamento para a ampliação da matéria de facto [1], que o contrato celebrado pelas partes, tendo em conta os factos provados, deve qualificar-se como um contrato de empreitada [2] e que os réus não podem eximir-se ao pagamento do preço com base na excepção, apesar de terem invocado defeitos da obra, por não terem reclamado qualquer direito com base nesses defeitos, sendo certo que, pelos próprios fundamentos descritos nas alegações da apelação do ora recorrente, que, subsidiariamente, requer sejam apreciados, não há lugar à excepção do não cumprimento, devendo manter-se o acórdão recorrido, neste particular [3].</font><br>
<font> *</font><br>
<font>Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.</font><br>
<font>As questões a decidir, na presente revista, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3, 690º e 726º, todos do Código de Processo Civil (CPC), são as seguintes:</font><br>
<font>I – A questão da ampliação da matéria de facto. </font><br>
<font>II – A questão da qualificação jurídica do contrato celebrado entre as partes.</font><br>
<font>III – A questão da verificação da excepção do não cumprimento do contrato. </font><br>
<font>IV – A questão da liquidez do crédito do autor.</font><br>
<br>
<font> I. DA AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO</font><br>
<br>
<font>Defendem os réus que deve ser ampliada a matéria de facto, em ordem a apurar da realidade dos factos alegados, nos artigos 44, 45, 46, 47, 49, 50, 51, 56, 57, 58, 61 e 62 da contestação, a fim de ser, novamente, julgada a causa e reformada a decisão recorrida, nos termos dos artigos 729°, n°3, e 730°, n°1, do CPC, porquanto o autor não especifica, na sua petição, que materiais adquiriu, que trabalhos contratou, nem que despesas realizou, e nunca emitiu, em nome dos recorrentes, nem lhes apresentou uma só factura, respeitante a materiais aplicados ou trabalhos prestados na obra, nem qualquer conta relativa a serviços prestados e ainda que, na dita conta-corrente, não se encontra relacionada qualquer factura ou documento de suporte, sendo genéricas e vagas as descrições de quase todos os lançamentos das despesas aí mencionados, o que, obviamente, não permite o exercício do contraditório, sendo certo que a matéria constante dos mencionados artigos da contestação pode ter importância decisiva para apurar se ocorreu, ou não, violação de lei de processo.</font><br>
<font>Diga-se, desde já, que os réus incluíram as alegadas insuficiências, a que se reportam os artigos 44, 45, 46, 47, 49, 50, 51, 56, 57, 58, 61 e 62 da contestação, no âmbito do vício da ineptidão da petição inicial, por falta ou inintelegibilidade da causa de pedir.</font><br>
<font>Ora, conhecendo da invocada ineptidão da petição inicial, no despacho saneador, o Tribunal de 1ª instância decidiu “julgar improcedente a falta da causa de pedir arguida pelos réus, quer porque os mesmos compreenderam convenientemente a petição inicial, quer porque não se vislumbra, de modo algum, tal falta”, considerando que “o autor justificou plenamente a sua pretensão, afigurando-se possível determinar no futuro qual a situação jurídica concreta objecto de apreciação”, sendo certo que “os réus bem compreenderam o alegado quadro factológico, simplesmente não concordando com o mesmo, impugnando-o especificadamente na sua contestação, alegando até uma coloração distinta às relações entretecidas entre eles”.</font><br>
<font>Por outro lado, esta decisão não foi alvo de impugnação pelos réus, tendo, por isso, transitado em julgado, constituindo o denominado caso julgado formal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 666º, nºs 1 e 3, 672º e 677º, todos do CPC.</font><br>
<font>E o trânsito em julgado formal da decisão sobre esta questão impede a sua reapreciação posterior, na presente causa, ainda que no contexto da alegada necessidade de ampliação da matéria de facto, como é agora sustentado pelos réus.</font><br>
<font>A decisão proferida pelo tribunal recorrido, quanto à matéria de facto, não pode, em princípio, ser alterada, salvo no caso excepcional previsto no nº 3, do artigo 722º, que agora não interessa considerar, sendo certo que o processo só volta ao tribunal recorrido quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito, atento o estipulado pelo artigo 729º, nºs 2 e 3, ambos do CPC.</font><br>
<font>Porém, a pretendida ampliação da matéria de facto, sustentada pelos réus, como vem prevista no nº 3, do artigo 729º, do CPC, não significa, ao contrário do que aqueles entendem, que o STJ possa mandar averiguar factos que as partes não articularam, ou, por outra forma, trouxeram à apreciação do Tribunal.</font><br>
<font>Invocando os réus a ausência de articulação de determinados factos, por parte do autor, que, naturalmente, não foram investigados, porque não alegados, e, muito menos, provados, sofrerá a parte respectiva, ou seja, o autor as consequências do não cumprimento daquele ónus, pelo que esta situação fáctica não configura a hipótese a que o preceito alude.</font><br>
<font>Efectivamente, a faculdade da ampliação da matéria de facto contende com a situação em que as instâncias seleccionaram, imperfeitamente, a matéria da prova, amputando-a de elementos que consideraram dispensáveis, mas que se verifica tornarem-se imprescindíveis para que o STJ possa definir o Direito aplicável.</font><br>
<font>Ora, não é esta, manifestamente, a situação retratada nos autos.</font><br>
<font>Assim sendo, este Supremo Tribunal de Justiça aceita que se devem considerar demonstrados os seguintes factos consagrados pelo Tribunal da Relação, nos termos das disposições combinadas dos artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do CPC, mas que reproduz:</font><br>
<font>1. Os réus tinham em construção uma moradia, num terreno de que eram proprietários, sito no Lugar ..., freguesia de S. ..., concelho de ..., a qual se encontrava quase concluída da arte de pedreiro, em Abril de 2000.</font><br>
<i><font>2. </font></i><font>Os réus iam entregando ao autor as quantias necessárias para custear a execução da obra, à medida que esta fosse sendo construída.</font><br>
<font>3. A execução da moradia deveria ser feita, de acordo e com a colaboração do arquitecto responsável do projecto e da obra.</font><br>
<font>4. Com o decorrer das obras, o autor foi pedindo quantias por conta, por intermédio do arquitecto, que os réus iam entregando.</font><br>
<font>5. Em Dezembro de 2001, os réus entregaram ao autor a quantia de 1.000.000$00.</font><br>
<font>6. Depois disso, os réus entregaram ao autor as demais quantias indicadas no doc. 1 junto com a p.i, que somam 60.000,00 €.</font><br>
<font>7. Em Dezembro de 2002, o autor pediu aos réus um novo adiantamento de 15. 000,00 € e os réus apenas entregaram 5.000,00 €.</font><br>
<font>8. Em fins de Janeiro de 2003, o réu marido começou a queixar-se de que a obra estava a ficar muito cara.</font><br>
<font>9. Em princípios de Fevereiro de 2003, o autor deixou de prestar serviços aos réus.</font><br>
<font>10. O autor era e é sócio-gerente de várias sociedades, cujo objecto é a compra e venda de imóveis, construção, operações sobre imóveis, comércio e distribuição de materiais de construção e obras públicas, construção civil, empreitadas, reparações e conservação de imóveis e actividades conexas.</font><br>
<font>11. Em Maio de 2000, os réus acordaram com o autor a construção da sua moradia, com a execução dos trabalhos de trolha, pichelaria, electricidade e pedreiro, esta na parte ainda não concluída.</font><br>
<font>12. Para o efeito, o autor poderia contratar os trabalhos das suas empresas ou de outros construtores ou profissionais das diversas artes e adquirir os materiais nos locais que melhor entendesse.</font><br>
<font>13. Competia-lhe ainda fiscalizar o andamento dos trabalhos e fazer os</font><br>
<font>pagamentos dos materiais e serviços prestados.</font><br>
<font>14. Não ficou definido o preço a pagar ao autor pelos seus serviços.</font><br>
<font>15. O autor iniciou a execução dos trabalhos acordados, na moradia dos réus, em finais de Maio de 2000.</font><br>
<font>16. Satisfazendo o acordo efectuado, o autor foi dando andamento à</font><br>
<font>construção da moradia, adquirindo os materiais necessários, excepto as louças sanitárias, cerâmicas, cimento/cola e perfis em "inox" das cerâmicas, que foram por conta dos réus, e foi contratando os trabalhos das várias artes.</font><br>
<font>17. Quando foi celebrado o acordo acima referido, os réus entregaram ao autor 10.000.000$00 (49.879,79€), mas, como depois lhe pediram a devolução de 5.000.000$00, que o autor lhes restituiu, em 18 de Agosto de 2000, o autor ficou apenas com 5.000.000$00 (24.939,89€), como entrada inicial.</font><br>
<font>18. As despesas com compras de materiais e de serviços prestados na obra e bem assim as entregas efectuadas constam de um documento elaborado peio autor, sob forma de "conta corrente"- 8º.</font><br>
<font>19. Os réus podiam consultar esses documentos, quando quisessem, bem como os documentos justificativos dos diversos lançamentos.</font><br>
<font>20. Os réus iam acompanhando o andamento dos trabalhos e o réu marido comparecia quase, diariamente, na obra para verificar como ela estava a ser executada.</font><br>
<font>21. Ao longo da construção, realizaram-se inúmeras reuniões entre autor e réus, entre autor e o arquitecto ou entre todos em conjunto, para apreciar o seu andamento e tomar decisões sobre os vários pormenores da sua execução.</font><br>
<font>22. Em finais de Janeiro de 2003, quando o réu marido se começou a queixar de que a obra estava a ficar muito cara, o autor logo se disponibilizou para cessar os seus serviços e dar oportunidade aos réus de entregarem a sua conclusão a quem entendessem.</font><br>
<font>23. Nessa altura, a obra estava em fase de acabamento.</font><br>
<font>24. Quando deixou de prestar serviços aos réus, o autor apresentou-lhes a "conta-corrente", constante de fls. 48 a 51, a descriminação dos pagamentos dos materiais adquiridos, dos serviços contratados e dos demais custos relativos à execução da obra - 15°.</font><br>
<font>25. Havia, no referido documento exibido aos réus, um saldo, a favor do autor, de 13.071,47€, correspondente à diferença entre as despesas nele descriminadas e as entregas feitas pelos réus, apresentando a conta-corrente, constante de fls. 7 a 10, que substituiu a, anteriormente, mencionada, um saldo, a favor do autor, no valor de 15.059,80€ - 16°.</font><br>
<font>26. O réu marido e o seu arquitecto examinaram a conta constante de fls. 48 a 51.</font><br>
<font>27. Os preços dos materiais e dos serviços efectuados foram contabilizados ao preço que custaram ao autor e, relativamente aos materiais, são inferiores ao que é cobrado ao consumidor final, na ordem de 20% a 30% - 18.°.</font><br>
<font>28. O réu marido examinou a conta e os documentos, 2 ou 3 dias após a reunião com o arquitecto.</font><br>
<font>29. Nessa altura, o autor apresentou a sua conta dos serviços prestados relativos à execução e fiscalização da obra - 20°.</font><br>
<font>30. Tendo fixado, em 10.000,00€, o preço desses serviços, tomando como referência 20% do custo da mão-de-obra executada - 21°.</font><br>
<font>31. O custo da obra efectuada, sob a orientação e fiscalização do autor, foi de 104.987,67€, e só na parte de mão-de-obra foi de 48.768,10€ - 22°.</font><br>
<font>32. Os réus pediram orçamentos para as obras subsequentes das especialidades de trolha, electricista e picheleiro, tendo obtido o custo de 7.800.000$00, 850.000$00 e 940.000$00, respectivamente.</font><br>
<font>33. Competiu, exclusivamente, ao arquitecto a fiscalização técnica da obra.</font><br>
<font>34. Não foi ajustada qualquer retribuição para os serviços prestados pelo autor.</font><br>
<font>35. Quando, em finais de 2002, o autor pediu aos réus mais 15.000,00€, os réus entregaram-lhe, apenas, a quantia de 5.000,00€, pedindo ao autor a prestação de contas e exigindo-lhe um orçamento de tudo quanto faltasse para completar as obras.</font><br>
<font>36. O autor, alegando que não lhe interessava trabalhar nessas condições, desistiu de prosseguir com a execução da obra, o que os réus aceitaram.</font><br>
<font>37. Na altura em que o autor desistiu da obra, havia trabalhos por realizar de "trolharia", de "pladur", de vedações/impermeabilizações, de arranjos exteriores/muros de vedação e de meação, de carpintaria, de pintura, de pichelaria, de gás e de electricista.</font><br>
<font>38. Para reparar, substituir e concluir as obras da especialidade de trolha e pedreiro, com defeitos e em falta, os réus tiveram de despender, em materiais e serviços, a quantia de 3.500,00€.</font><br>
<font>39. Para reparar e concluir as obras das especialidades de electricista e picheleiro, com defeitos e em falta, os réus tiveram de gastar, em materiais e serviços, as quantias de 2.308,25 €, 2.202,37, 2.489,37 € e 2.594,97 €.</font><br>
<font>40. A obra registava e ainda regista o seguinte: paredes das duas chaminés fora de esquadria; acumulação de água nos patamares das escadas e noutras zonas do piso exterior; pavimentos exteriores e degraus com granitos de origem diversa; chapins de granito mal aplicados; execução de uma rampa de acesso à garagem, não prevista no projecto, que reduz o pé direito, inviabilizando a entrada de veículos altos, e pressão baixa nas torneiras da pia da cozinha e nos chuveiros das instalações sanitárias.</font><br>
<font>41. A reparação das deficiências descritas, no ponto 40, ascende a valor não, concretamente, apurado, mas superior a 12.000,00 €.</font><br>
<font>42. Dos trabalhos considerados em falta e descritos em 37, supra, os degraus da escada interior não estavam colocados, por motivo de atraso na definição da sua forma e implantação; a aplicação do pladur aguardava a colocação do recuperador; o carpinteiro já estava escolhido; a obra de electricista, no interior, estava, totalmente, enfiada, e nos jardins tinham sido colocados os terrenos, às cotas pretendidas.</font><br>
<br>
<font>II. DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO CONTRATO CELEBRADO ENTRE AS PARTES</font><br>
<br>
<font>Sustentam, igualmente, os réus que a decisão que qualificou o contrato celebrado como um contrato de empreitada, não fez correcta interpretação e aplicação das normas legais pertinentes, por se reputarem aplicáveis a esse negócio as regras do mandato.</font><br>
<font>Têm a empreitada e o mandato o denominador comum que decorre do artigo 1155º, do Código Civil (CC), de serem modalidades do contrato de prestação de serviço.</font><br>
<font>O artigo 1207º, do CC, qualifica o contrato de empreitada como aquele em que uma das partes se obriga, em relação à outra, a realizar certa obra, mediante um preço.</font><br>
<font>Desta definição legal resulta que são três os elementos do contrato de empreitada, ou seja, os sujeitos, a realização de uma obra e o pagamento do preço.</font><br>
<font>Por sua vez, o mandato, de que o artigo 1157º, do CC, dá a noção, é o “contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra”.</font><br>
<font>Voltando à matéria de facto que ficou demonstrada, importa reter, neste particular, que, em Maio de 2000, os réus acordaram com o autor a construção da sua moradia, com a execução dos trabalhos de trolha, pichelaria, electricidade e pedreiro, esta na parte ainda não concluída, podendo o mesmo contratar os trabalhos das suas empresas ou de outros construtores ou profissionais das diversas artes e adquirir os materiais, nos locais que melhor entendesse, e competindo-lhe ainda fiscalizar o andamento dos trabalhos e fazer os pagamentos dos materiais e serviços prestados, enquanto que ao arquitecto pertencia, exclusivamente, a fiscalização técnica da obra.</font><br>
<font>Os réus iam acompanhando o andamento dos trabalhos, sendo certo que o réu marido comparecia quase, diariamente, na obra para verificar como ocorria a sua execução.</font><br>
<font>Ao longo da construção, realizaram-se inúmeras reuniões entre o autor e os réus, entre o autor e o arquitecto ou entre todos em conjunto, para apreciar o seu andamento e tomar decisões sobre os vários pormenores da sua execução.</font><br>
<font>Embora não tenha sido ajustada qualquer retribuição para os serviços prestados pelo autor | [0 1 0 ... 0 0 0] |
xzKuu4YBgYBz1XKvHy3j | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><font>ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (1) :</font><br>
<br>
<font>No apenso dos autos de execução, para pagamento de quantia certa, que AA move contra BB, o Ministério Público, em representação do Estado Português - Fazenda Pública, veio reclamar o crédito de €166,60, acrescido de juros vencidos, no montante de €1,66, e dos vincendos, até integral cumprimento, referente à falta de pagamento do Imposto Municipal Sobre Imóveis, respeitante ao imóvel penhorado, inscrito para cobrança, no ano de 2007, e a Caixa Geral de Depósitos, SA, veio reclamar o crédito, no valor de €107.355,56, relativo ao capital mutuado ainda em dívida, acrescido de despesas, no valor de €20,72, e dos juros vencidos, no montante de €5.334,63, e dos vincendos, até integral pagamento.</font><br>
<font>Estas reclamações não foram impugnadas, quer pelo exequente, quer pela executada, atento o disposto no artigo 866º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC).</font><br>
<font>A sentença graduou os créditos em presença, por forma a ser dado pagamento pelo valor do imóvel, do seguinte modo:</font><br>
<font>1 - Em primeiro lugar, às custas em dívida;</font><br>
<font>2 – Em segundo lugar, ao crédito reclamado pelo Ministério Público, em representação do Estado Português - Fazenda Pública, no valor de €166,60, acrescido dos juros vencidos, no montante de €1,66, e dos vincendos, até integral pagamento;</font><br>
<font>3 – Em terceiro lugar, ao crédito do exequente AA, no montante de €43.371,00, acrescido dos juros vencidos, no valor de €4.228,67, e dos vincendos, até integral pagamento;</font><br>
<font>4 – E, em quarto e último lugar, ao crédito reclamado pela Caixa Geral de Depósitos, SA, no valor de €107.355,56, relativo ao capital mutuado ainda em dívida, acrescido das despesas, no valor de €20,72, e dos juros vencidos, no montante de €5.334,63, e dos vincendos, até efectivo e integral pagamento.</font><br>
<font>Desta sentença, a credora Caixa Geral de Depósitos, SA, interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado procedente a apelação, revogando a decisão impugnada, na parte em que graduou o crédito do exequente AA, à frente do da recorrente, ficando, antes, aquele graduado à frente deste. </font><br>
<font>Do acórdão da Relação do Porto, interpôs agora recurso de revista o exequente AA, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem:</font><br>
<font>1ª – Ao invés da posição assumida pelos Venerandos Desembargadores a quo,</font><i><font> </font></i><font>entende o recorrente ser justa, adequada e legalmente fundamentada a douta sentença proferida, nos autos do processo executivo, pelos Juízos de Execução do Porto, de reconhecimento do direito de retenção do aqui recorrente e a sua preferência sobre a titular da hipoteca, ora recorrida, e, consequentemente, a graduação do crédito do recorrente em terceiro lugar.</font><br>
<font>2ª - Na realidade, para que exista direito de retenção é necessário, em primeiro lugar, que o respectivo titular detenha licitamente uma coisa que deva entregar a outrem, em segundo lugar, que, simultaneamente, seja credor daquele a quem deva a restituição e por último, que entre os créditos haja uma relação de conexão (debitam cum re junctum).</font><br>
<font>3ª - Assim, o direito de retenção constitui um direito real de garantia das obrigações, conferindo ao seu titular preferência para ser pago pelo valor do bem retido antes dos demais credores do seu devedor que não beneficiem de privilégio imobiliário (art. 751° do C.C.), como resulta do disposto no nº 1 do art. 759° desse Código, que no seu n° 2 fixa mesmo a prevalência do direito de retenção sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente.</font><br>
<font>4ª - Face ao exposto, «(..) e de harmonia com o disposto na norma citada e quando recaia sobre coisa imóvel é o direito de retenção equiparável à hipoteca, mas prevalece sobre essa, mesmo que registada anteriormente.</font><br>
<font>5ª - Esta solução legal tem efectivamente suscitado reparos, mas não julgamos que a preferência atribuída ao "jus retentionis" seja equiparável ao regime dos privilégios imobiliários gerais que motivou a intervenção do Tribunal Constitucional através dos Acórdãos nºs 362/2002 e 363/2002, declarando a inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas que conferiam tais privilégios à Fazenda Nacional e à Segurança Social e na interpretação segundo a qual elas preferiram à hipoteca.</font><br>
<font>6ª - (...) Situação diferente ocorre com o direito de retenção.</font><br>
<font>7ª - (...) Com efeito, e resultando normalmente o crédito de despesas com a fabricação, conservação ou melhoramento da coisa alheia, será de concluir que se essas despesas não tivessem sido realizadas, a coisa poderia ter perecido e então nem o seu proprietário, nem o credor hipotecário, nem qualquer outro credor poderiam realizar o seu crédito.</font><br>
<font>8ª - É essa no fim de contas a razão da preferência que a lei entendeu atribuir-lhe pois (...), se não lhe fosse atribuída tal preferência, todos os demais credores se locupletariam à sua custa em função do valor da coisa para que concorrera o retentor com as despesas com ela feitas.», cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 3 de Junho de 2008.</font><br>
<font>9ª - Assim sendo, nenhuma inconstitucionalidade material enferma o dispositivo legal em questão que dá prevalência do direito de retenção sobre a hipoteca.</font><br>
<font>10ª - Com efeito, ficou demonstrado que, em virtude do contrato de empreitada celebrado entre o autor, aqui recorrente, e a ré BB - e mediante o qual o ora recorrente se comprometeu a efectuar determinados trabalhos de construção civil num imóvel, propriedade da ré, vinculando-se esta a pagar-lhe o preço respectivo - o recorrente se constituiu credor da ré em virtude do incumprimento do contrato de empreitada celebrado, designadamente, em virtude do não pagamento da totalidade do preço das obras efectuadas pelo recorrente.</font><br>
<font>11ª - Acresce que, o Tribunal a quo reconheceu também o direito de retenção do recorrente sobre o imóvel com vista a garantir o cumprimento do seu direito de crédito.</font><br>
<font>12ª - A doutrina e a jurisprudência têm entendido que, de facto, no âmbito do contrato de empreitada, o empreiteiro, face ao não pagamento do preço pela contraparte, goza do direito de retenção.</font><br>
<font>13ª - Sucede que, ao invés da posição adoptada pelo Tribunal de 1a Instância, entenderam os Venerandos Desembargadores a quo que, «a sentença que reconheceu o direito de retenção ao exequente não faz caso julgado contra a recorrente, credora hipotecária, porque, tendo esta uma posição incompatível com a daquele, não teve intervenção no processo, não teve assegurado o direito ao contraditório, o seu direito de defesa».</font><br>
<font>14ª - Todavia, a resposta passará pela análise da questão da extensão do caso julgado a terceiros.</font><br>
<font>15ª - Assim, de acordo com o Prof. Manuel de Andrade, a sentença, transitada em julgado, impõe-se àqueles que o autor designa de terceiros juridicamente indiferentes, mas já não se impõe aos terceiros juridicamente interessados, isto é, àqueles a quem a sentença pode causar um prejuízo jurídico, invalidando a própria existência ou reduzindo o conteúdo do seu direito, e não apenas destruindo ou abalando a sua utilidade prática ou económica.</font><br>
<font>16ª - Face ao exposto, será de concluir que a sentença do Tribunal a quo, que reconhece ao aqui recorrente o direito de retenção, é oponível ao credor hipotecário não interveniente na acção declarativa de condenação, no caso a recorrida, a qual deverá ser qualificada como terceiro juridicamente indiferente e não como terceiro juridicamente interessado.</font><br>
<font>17ª - Em suma, o reconhecimento do direito de retenção do ora recorrente e a correspondente baixa de lugar na graduação de créditos da recorrida não afecta juridicamente o direito desta, uma vez que este direito continua o mesmo, com o mesmo conteúdo e a mesma garantia hipotecária, verificando-se apenas um eventual prejuízo meramente fáctico e de natureza económica.</font><br>
<font>18ª - Não obstante, e ao contrário da posição defendida no acórdão recorrido, o que sucederá, na realidade, é que antes da satisfação do direito de crédito da recorrida, se colocará a satisfação do direito de crédito do recorrente, o que, no caso sub judice significará, inequivocamente, uma maior vulnerabilidade económica, que não jurídica, do direito de crédito da recorrida, uma vez que o produto da venda judicial do imóvel penhorado nos autos, no âmbito da acção executiva, poderá não satisfazer na íntegra ambos os créditos.</font><br>
<font>19ª - É assim de concluir que, «a sentença que reconhece a existência de direito de retenção sobre coisa hipotecada não causa prejuízo jurídico ao credor hipotecário, uma vez que não afecta a existência, a validade ou a consistência jurídica do seu direito, apesar de lhe causar prejuízo económico, e por isso, essa sentença faz caso julgado quanto ao credor hipotecário não interveniente na acção respectiva, pois este é de qualificar como terceiro juridicamente indiferente e não como terceiro juridicamente interessado», cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21 de Outubro de 2008.</font><br>
<font>20ª - Perante isto, o crédito do recorrente goza do direito de retenção, o qual deverá ser graduado com preferência sobre o crédito da recorrida garantido por hipoteca, nos termos do art. 759°, n° 2 do Código Civil.</font><br>
<font>21ª - Convém ainda salientar que, de acordo com o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 02/02/1999, «... a falta de intervenção do reclamante hipotecário na acção declarativa não lhe retira a possibilidade de impugnar o direito de retenção do Exequente, sobre o imóvel penhorado na acção executiva, devendo fazê-lo no próprio articulado em que deduz a reclamação de créditos, sem o que a sua defesa ficará precludida.» (sublinhado nosso).</font><br>
<font>22ª - Na realidade, o meio de defesa do credor hipotecário contra o exequente, titular do direito de retenção, é o previsto no art. 866°, n°s 3 e 4 do C.P.C.</font><br>
<font>23ª - Todavia, no caso concreto, a recorrida não impugnou o direito de retenção do exequente, ora recorrente, na reclamação de créditos, por si apresentada nos autos de acção executiva, limitando-se a reclamar o seu crédito, em singelo, requerendo a sua graduação «no lugar que por lei lhe competir»,</font><i><font> </font></i><font>tal como sucedeu.</font><br>
<font>24ª - Apenas, em sede de recurso de apelação, a recorrida impugnou o direito de retenção do exequente, ora recorrente, ao arrepio do disposto na Lei.</font><br>
<font>25ª - Nestes termos, o acórdão recorrido afronta a Lei, a jurisprudência maioritária dos Tribunais de 2a Instância e do Supremo Tribunal de Justiça, bem como a Doutrina.</font><br>
<font>26ª - O fundamento específico do presente recurso de revista é a violação da lei substantiva, consubstanciada, essencialmente, num erro de interpretação, nomeadamente, dos arts. 754° e 759°, n°s 1 e 2 do Código Civil e 866°, n°s 3 e 4 do C.P.C.</font><br>
<font>Nas suas contra-alegações, a credora Caixa Geral de Depósitos, SA, conclui no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, confirmando-se o douto acórdão recorrido.</font><br>
<font>O Tribunal da Relação entendeu que se devem considerar demonstrados os seguintes factos, que este Supremo Tribunal de Justiça aceita, nos termos das disposições combinadas dos artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do CPC, mas reproduz:</font><br>
<font>1. Encontra-se penhorado, na execução, o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de I..., sob o nº .../....</font><br>
<font>2. O Ministério Público, em representação do Estado Português - Fazenda Pública, reclamou o Imposto Municipal Sobre Imóveis, regulado pelo Código do Imposto Municipal Sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei nº 287/2003. </font><br>
<font>3. Ao crédito do exequente AA foi reconhecido o direito de retenção sobre o imóvel penhorado, pela sentença dada à execução.</font><br>
<font>4. A Caixa Geral de Depósitos, SA, reclamou um crédito que tem a seu favor as hipotecas registadas, em 7 de Junho de 2004 e 2 de Dezembro de 2004, sobre o imóvel penhorado nos autos. </font><br>
<br>
<font> *</font><br>
<br>
<font>Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir</font><br>
<font>As questões a decidir, na presente revista, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3, 690º e 726º, todos do CPC, são as seguintes:</font><br>
<font>I – A questão de saber se o direito de retenção reconhecido por sentença judicial prevalece sobre o credor hipotecário, já constituído, que naquela acção não interveio.</font><br>
<font>II – A questão de saber quais as consequências que derivam da falta de impugnação do direito de retenção, pelo credor hipotecário, na reclamação de créditos.</font><br>
<br>
<font>I. DA PREVALÊNCIA DO DIREITO DE RETENÇÃO RECONHECIDO POR SENTENÇA FACE AO CREDOR HIPOTECÁRIO ANTERIOR </font><br>
<br>
<font>Com base no estipulado pelo artigo 754º, do Código Civil (CC), foi reconhecido ao exequente AA, por sentença datada de 2006, o direito de retenção sobre o prédio que construiu, em regime de empreitada, para o dono da obra, a executada BB, como garantia do crédito que tem sobre esta, em virtude da mesma não ter procedido à satisfação integral do preço.</font><br>
<font>Porém, um dos credores reclamantes, ou seja, a Caixa Geral de Depósitos, SA, tem a seu favor as hipotecas registadas, em 7 de Junho de 2004 e 2 de Dezembro de 2004, sobre o imóvel penhorado nos autos.</font><br>
<font>Efectivamente, o cerne da impugnação deduzida pelo exequente reside na circunstância de a Caixa Geral de Depósitos, SA, não ser titular de crédito privilegiado, não obstante gozar do direito de hipoteca sobre o prédio objecto de penhora, porquanto o caso julgado formado na acção declarativa que lhe reconheceu a garantia real em que consiste o direito de retenção, é oponível ao reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, uma vez que este, apesar de não ter sido parte na mesma, deve ser considerado como um terceiro, juridicamente, indiferente, para efeitos de aquela sentença lhe vir a ser oponível.</font><br>
<font>Instaurada a execução, para pagamento de quantia certa, foi penhorado, pelo exequente, o imóvel da executada e, na sequência da observância do disposto pelo artigo 864º, nº 1, do CPC, os reclamantes, supra-identificados, incluindo a Caixa Geral de Depósitos, SA, deduziram os seus créditos, encontrando-se o crédito desta garantido por hipoteca registada.</font><br>
<font> Transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória, dentro e fora do processo, ou seja, forma o caso julgado material, nos termos do estipulado pelo artigo 671º, nº 1, no âmbito dos limites fixados pelos artigos 497º e seguintes, consistindo um deles na identidade de sujeitos, que se verifica quando as partes são as mesmas, sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, atento o preceituado pelo artigo 498º, nº 2, todos do CPC.</font><br>
<font> Efectivamente, constitui princípio fundamental na matéria, a regra da eficácia relativa do caso julgado, isto é, a de que a sentença só tem força de caso julgado entre as partes, só vinculando o Juiz, em novo processo, se estas forem as mesmas que no anterior (2) .</font><br>
<font> Porém, sendo certo que o caso julgado só produz, em princípio, efeitos entre as partes, é, por vezes, extensivo a terceiros, que não podem alhear-se dos efeitos de sentenças transitadas e proferidas em processos nos quais não são intervenientes, e da correspondente definição jurídica da relação material controvertida, desde que sobre eles possam repercutir-se esses efeitos, ou seja, quando a sentença não lhes cause qualquer prejuízo jurídico, porque deixa íntegra a consistência jurídica do seu direito, embora lhes cause um prejuízo de facto ou económico (3) .</font><br>
<font> Com efeito, quanto às pessoas que a doutrina qualifica como terceiros, juridicamente, indiferentes, como acontece com os credores, relativamente às sentenças proferidas nos pleitos em que seja parte o seu devedor, sujeitos de relações conexas, a sentença não causa qualquer prejuízo jurídico, na medida em que não afecta, nem a existência, nem a validade, nem o conteúdo ou efeitos do seu direito, embora lhes possa causar um prejuízo de facto ou económico. </font><br>
<font>Ora, sendo certo que, no caso em apreço, não ocorre o requisito da identidade de sujeitos, uma vez que a reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, não foi demandada naquela acção, importa apurar se, relativamente à sentença que reconheceu ao exequente o direito de retenção sobre o imóvel penhorado, aquela foi atingida por um prejuízo jurídico, ou, apenas, por um prejuízo de facto ou económico.</font><br>
<font>No caso «sub judice», em que a sentença que reconheceu ao exequente o direito de retenção sobre o prédio objecto de penhora, se não limita a esvaziar o direito de crédito da reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, afectada no seu direito hipotecário, na medida em que vê colocar-se-lhe à sua frente um outro crédito, que, assim, goza de prioridade de pagamento, tendo, igualmente, reduzido ou extinto o património da executada, os terceiros não têm que acatar a sentença, que, consequentemente, não lhes é oponível.</font><br>
<font>Muito embora a aludida sentença não ponha em causa a existência ou a validade do direito hipotecário da reclamante, não se limita a afectar a sua consistência pratica, face à restrição ou redução do património da executada, porquanto se confronta com o direito de um terceiro, juridicamente, interessado, de algum modo incompatível com o direito de retenção reconhecido ao exequente, afectando-lhe a sua consistência jurídica.</font><br>
<font>Com efeito, se não existisse o direito de retenção, a hipoteca conferia à reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, o direito de ser paga pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, atento o disposto pelo artigo 686º, nº 1, enquanto que o direito de retenção em análise prevalece sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada, anteriormente, como decorre do preceituado pelo artigo 759º, nº 2, ambos do CC.</font><br>
<font>É que a concorrência de um crédito hipotecário com um crédito garantido pelo direito de retenção não se situa no mesmo plano do crédito comum que vê reconhecido outro crédito comum, hipótese esta em que a concorrência entre ambos se efectua, em igualdade de circunstâncias, e em que o único prejuízo do primeiro se traduz em poder não ser, totalmente, pago, tendo de ratear com o outro crédito o produto da garantia patrimonial do devedor, ao passo que, naquela primeira situação, se verifica uma graduação entre tais créditos, com prevalência do segundo, podendo, inclusivamente, acontecer que, pago este crédito, nada reste já para satisfazer o crédito hipotecário.</font><br>
<font>Aliás, mesmo antes deste possível prejuízo económico, já existia um efectivo prejuízo jurídico, na medida em que o valor potencial da hipoteca foi, desde logo, diminuído, com a declaração da existência do direito de retenção, que ficou situado numa ordem de pagamento preferente, em relação ao crédito hipotecário (4) .</font><br>
<font>Assim sendo, se a sorte da revista terminasse aqui, ter-se-ia de concluir que a sentença que reconheceu ao exequente o direito de retenção sobre o imóvel penhorado não forma caso julgado quanto à reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, sendo-lhe, consequentemente, inoponível (5) porque isso equivaleria a criar um direito, em desfavor desse credor, sem que o mesmo tivesse a possibilidade de defender a prioridade do seu crédito, até contra os eventuais conluios existentes entre as partes naquela acção.</font><br>
<br>
<font>II. DA NÃO IMPUGNAÇÃO DO DIREITO DE RETENÇÃO PELO CREDOR HIPOTECÁRIO NA RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS. CONSEQUÊNCIAS.</font><br>
<br>
<font>Porém, independentemente da conclusão a que se chegou, no ponto anterior, importa ainda apreciar a outra questão suscitada pelo exequente, resultante dos efeitos da não contestação, por parte da reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, do direito de retenção daquele, na fase da impugnação de créditos.</font><br>
<font>Efectivamente, as reclamações podem ser impugnadas, pelo exequente e pelo executado, no prazo de 15 dias, a contar da respectiva notificação, e, em igual prazo, gozam os restantes credores da faculdade de impugnar os créditos garantidos por bens sobre os quais tenham invocado, também, qualquer direito real de garantia, incluindo o crédito exequendo, bem como as garantias reais invocadas, quer pelo exequente, quer pelos outros credores, com fundamento em qualquer das causas que extinguem ou modificam a obrigação ou que impedem a sua existência, com base no disposto pelo artigo 866º, nºs 2, 3 e 4, do CPC.</font><br>
<font>E, se o crédito estiver reconhecido por sentença provida de força de caso julgado em relação ao reclamante, estatui o respectivo nº 5, do artigo 866º, do CPC, acabado de citar, que “…a impugnação só pode basear-se em algum dos fundamentos mencionados nos artigos 814º e 815º, na parte em que forem aplicáveis”.</font><br>
<font>Quando o exequente se arrogue um direito real de garantia que deva prevalecer sobre o credor reclamante, é manifesto o interesse deste, na medida em que a existência da garantia depende da existência do próprio direito de crédito, em impugnar este direito.</font><br>
<font>Com efeito, já, anteriormente, à Reforma da Acção Executiva, com base no entendimento de que o artigo 866º, nº 3, do CPC, ao conceder aos restantes credores a faculdade de “…impugnar os créditos garantidos por bens sobre os quais tenham invocado também qualquer direito real de garantia”, sem referência expressa aos reclamantes ou ao exequente, com garantia sobre os bens em relação aos quais a sua incida, se defendia que ao credor reclamante era lícito impugnar o crédito do próprio exequente.(6)</font><br>
<font>De todo o modo, a actual redacção do artigo 866º, nº 3, do CPC, introduzida pelo DL nº 38/2003, de 8 de Março, nos termos já referidos, permitiu, inequivocamente, ao credor reclamante actuar em substituição processual do próprio executado.(7) </font><br>
<font>Por seu turno, antes da Reforma da Acção Executiva, era controvertida a questão de saber se quando o crédito estivesse reconhecido por sentença, o reclamante que na acção declarativa não tivesse sido parte poderia invocar fundamentos de impugnação não susceptíveis de sustentar os embargos de executado, entendendo-se, na ausência de qualquer restrição legal, que, quer o exequente, quer os outros credores reclamantes estavam limitados pelos pressupostos dos, então, artigos 813º e 814º, actualmente, os artigos 814º e 815º (8) mas, também, diversamente, que o alcance do artigo 866º, nº 4, todos do CPC, se confinava aquelas situações em que o reclamante fosse abrangido pelo caso julgado, pois que, quando assim não fosse, constituiria injustificada limitação do seu direito negar-lhe a faculdade de impugnar o crédito ou a garantia de quem, a existir um e outro, seria pago antes dele, sob pena de a situação do credor comum e a do credor com garantia real serem, a este respeito, radicalmente, diversas(9).</font><br>
<font>Porém, a Reforma da Acção Executiva optou por esta última solução, em que, apenas, o reclamante abrangido, directa ou indirectamente, pela eficácia do caso julgado, formado em anterior acção declarativa ou na própria oposição à execução, está impedido de invocar qualquer outro fundamento, para além dos constantes dos artigos 814º e 815º, facultando, assim, ao reclamante que não esteja abrangido pelo caso julgado, defender-se com a amplitude consentida pelos artigos 816º e 866º, nº 5, este, «a contrario sensu», todos do CPC (10).</font><br>
<font>Efectivamente, preceitua o artigo 759º, nos seus nºs 1 e 2, do CC, que o direito de retenção que recaia sobre coisa imóvel prevalece sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada, anteriormente.</font><br>
<font>Findo o prazo para a dedução de créditos, e notificados, pela secretaria judicial, o executado, o exequente, os credores reclamantes e o cônjuge do executado, caso se tenha oposto à execução ou à penhora, nos termos do preceituado pelo artigo 864º-A, nº 1, atento o disposto pelo artigo 866º, nº 1, ambos do CPC, deixando agora o Juiz de ter acesso à fase liminar do processo, na falta de impugnação da reclamação, conhecerá, no despacho saneador, da intempestividade da reclamação e da eventual inexistência de garantia real ou de título executivo pelo credor, considerando admitidos, por acordo, os factos que não foram objecto de impugnação especificada.</font><br>
<font>E, se nenhum dos créditos for impugnado ou a verificação dos impugnados não depender de prova a produzir, proferir-se-á logo sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, em conformidade com o estipulado pelo artigo 868º, nºs 1, 2 e 4, do CPC. </font><br>
<font>Porém, a falta de impugnação dos créditos reclamados, porque se trata de ausência da contestação ao pedido, na fase dos articulados, importa que devam ser declarados existentes e reconhecidos, de acordo com o princípio do cominatório pleno, nos termos do estipulado pelo artigo 868º, nºs 2 e 4, do CPC (11) . </font><br>
<font>Deste modo, na hipótese de falta de impugnação dos créditos reclamados, por parte do exequente, do executado ou dos restantes credores ou, em caso de falta de impugnação do crédito exequendo, pelos restantes credores, e não havendo lugar a produção de prova, que é a situação que agora interessa analisar, o concurso encerra-se e a sentença reconhece os créditos não impugnados, graduando-os, juntamente, com o crédito exequendo.</font><br>
<font>Assim sendo, não tendo a reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, não abrangia pela eficácia do caso julgado formado na acção declarativa anterior, impugnado o crédito do exequente garantido pelo direito real de retenção, como o deveria ter feito, e com base em qualquer outro fundamento, para além dos constantes dos artigos 814º e 815º, do CPC, dever-se-á ter como reconhecido este último crédito, nos termos do disposto pelo artigo 868º, nº 2 e 4, do CPC(12).</font><br>
<font>Colhem, assim, em parte, as conclusões constantes das alegações de revista do exequente.</font><br>
<br>
<font>CONCLUSÕES:</font><br>
<br>
<font>I – Produzindo o caso julgado, em princípio, apenas, efeitos entre as partes, é, por vezes, extensivo a terceiros, juridicamente, indiferentes, que são aqueles que não podem alhear-se dos efeitos de sentenças transitadas e proferidas em processos nos quais não são intervenientes, desde que estas não lhes causem qualquer prejuízo jurídico, embora lhes ocasionem um prejuízo de facto ou económico.</font><br>
<font>II – Reconhecendo a sentença o direito de retenção sobre um imóvel, não se limita a esvaziar o direito do credor hipotecário sobre esse bem, na medida em que vê colocar-se-lhe, à sua frente, um outro crédito, com prioridade de pagamento, reduzindo ou extinguindo, igualmente, o património do executado, não sendo, assim, a sentença oponível ao mesmo, terceiro, juridicamente, interessado, afectado na consistência jurídica do seu direito.</font><br>
<font>III - O terceiro, juridicamente, interessado, não condenado na sentença que se executa, não pode considerar-se vinculado à sua observância, em virtude da ineficácia subjectiva do caso julgado material formado por aquela sentença. </font><br>
<font>IV – A Reforma da Acção Executiva, aderindo a um dos entendimentos firmados na doutrina e na jurisprudência, optou pela solução de facultar ao reclamante que não esteja abrangido pelo caso julgado formado em anterior acção declarativa, a invocação de qualquer outro fundamento, para além dos constantes dos artigos 814º e 815º, do CPC, designadamente, aqueles que seria lícito deduzir em processo de declaração.</font><br>
<font>V - Não tendo o reclamante, não abrangido pela eficácia do caso julgado formado na acção declarativa anterior, impugnado o crédito do exequente garantido pelo direito real de retenção, dever-se-á este último ter como reconhecido, nos termos do disposto pelo artigo 868º, nº 2 e 4, do CPC.</font><br>
<font> </font><br>
<font>DECISÃO(13) :</font><br>
<br>
<font>Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que constituem a 1ª secção cível do Supremo Tribunal de Justiça, em conceder a revista, e, em consequência, revogam o acórdão recorrido, graduando-se os créditos em presença, por forma a ser dado pagamento, pelo valor do imóvel, do seguinte modo:</font><br>
<font>1 - Em primeiro lugar, às custas em dívida;</font><br>
<font>2 – Em segundo lugar, ao crédito reclamado pelo Ministério Público, em representação do Estado Português - Fazenda Pública, no valor de €166,60, acrescido dos juros vencidos, no montante de €1,66, e dos vincendos, até integral pagamento;</font><br>
<font>3 – Em terceiro lugar, ao crédito do exequente AA, no montante de €43.371,00, acrescido dos juros vencidos, no valor de €4.228,67, e dos vincendos, até integral pagamento;</font><br>
<font>4 – E, em quarto e último lugar, ao crédito reclamado pela Caixa Geral de Depósitos, SA, no valor de €107.355,56, relativo ao capital mutuado ainda em dívida, acrescido das despesas, no valor de €20,72, e dos juros vencidos, no montante de €5.334,63, e dos vincendos, até efectivo e integral pagamento.</font><br>
<br>
<font> *</font><br>
<br>
<font>Custas da apelação e da revista, a cargo da reclamante Caixa Geral de Depósitos, SA, sendo a taxa de justiça reduzida a metade - artigo 14º, nº 1, m), do CCJ -, na versão posterior à introduzida pelo DL nº 324/03, de 27 de Dezembro, aplicável.</font><br>
<br>
<font> *</font><br>
<font>Notifique.</font><br>
<font>Supremo Tribunal de Justiça, 20 de Maio de 2010.</font><br>
<font> *</font><br>
<br>
<font> Helder Roque (Relator) </font><br>
<br>
<font> Sebastião Póvoas</font><br>
<font>______________________</font><br>
<br>
<font>(1) Relator: Helder Roque; 1º Adjunto: Conselheiro Sebastião Póvoas; 2º Adjunto: Conselheiro Moreira Alves</font><br>
<font>(2)(3) Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1976, 308.</font><br>
<font>(4) STJ, de 1-2-95, CJ (STJ), Ano III, T1, 55; STJ, de 15-12-92, BMJ nº 422, 348; e STJ, de 10-10-89, BMJ nº 390, 363.</font><br>
<font>(5) STJ, de 12-9-2006, Pº nº 06A2136; STJ, de 11-7-2006, Pº nº 06B1855; STJ, de 16-12-2004, Pº nº 04B3313; STJ, de 8-7-2003, Pº nº 03A1808; STJ, de 10-11-1992, Pº nº 081297; STJ, de 10-10-1989, Pº nº 077867, </font><u><font>www.dgsi.pt</font></u><font>,</font><br>
<font>(6) - Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, 3ª edição, 510 a 513; STJ, de 6-2-1998, BMJ nº 414, 404; STJ, de 11-5-1995, CJ (STJ), Ano III, T2, 81; STJ, de 10-10-1989, BMJ nº 390, 363.</font><br>
<font>(7) - Denti, Distribuzione, 333: «Acção Subrogatória».</font><br>
<font>(8) Anselmo de Castro, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 2ª edição, 1973, 270; Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, 3ª edição, 513; STJ, de 10-10-1989, BMJ nº 390, 363;</font><br>
<font>(9) STJ, de 6-2-1998, BMJ nº 414, 404; STJ, de 11-5-1995, CJ (STJ), Ano III, T2, 81.</font><br>
<font>(10) Lebre de Freitas, A Acção Executiva depois da Reforma da Reforma, 5ª edição, 2009, 315 a 317; Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 10ª edição, 2007, 330 e 331; Rui Pinto, A Acção Executiva depois da Reforma, 2004, 185 e ss.</font><br>
<font>(11) Anselmo de Castro, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 2ª edição, 1973, 274; Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum À Face do Código Revisto, 2000, 371 e 372.</font><br>
<font>(12) STJ, de 14-9-2006, Revista nº 2468/06, 7ª secção; STJ, de 12-9-2006, Pº nº 06A2136, 1ª secção; STJ, de 30-10-2001, Revista nº 2601/01, 2ª sec | [0 0 0 ... 0 0 0] |
TDJ2u4YBgYBz1XKvNQza | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><u><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></u>
</p><p><b><font>1</font></b><font>-No processo supra identificado foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto – 5ª Secção, no qual foi deliberado:</font>
</p><p><font>- “Julgar parcialmente procedente a apelação, revogando o despacho recorrido e ordenando à AE que refaça as contas da execução, considerando que a data da cessação da obrigação de alimentos é 1.1.2015, extinguindo-se todas as penhoras caso o valor exequendo assim apurado se mostre já depositado e devolva ao executado qualquer valor que constitua excedente, caso exista, após liquidada a quantia exequenda e demais responsabilidades”.</font>
</p><p><b><font>2</font></b><font>-Inconformada com o decidido formula recurso de Revista para este STJ a recorrida/exequente AA, que formula as seguintes conclusões:</font>
</p><p><i><font>I - O acórdão agora recorrido ofende o caso julgado já constituído, relativamente a todas as sentenças devidamente transitadas em julgado, nos apensos C/D/F/G/H/I/J. </font></i>
</p><p><i><font>II - O caso julgado, visa assegurar a certeza do Direito e a segurança jurídica indispensáveis à vida em sociedade. Daí a vinculação ao que foi decidido, bem como a insusceptibilidade de o tribunal voltar a pronunciar-se sobre o objecto da decisão anteriormente proferida. </font></i>
</p><p><i><font>III - A noção de caso julgado pressupõe, de acordo com o disposto no artigo 580º nº 1 do CPC, a repetição de uma causa, depois de a primeira ter sido já decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, ou seja, transitada em julgado. </font></i>
</p><p><i><font>IV - A finalidade do caso julgado é a de evitar que, em novo processo, o juiz possa pronunciar-se, de modo diverso, sobre o direito, situação ou posição jurídicas concretas definidas por uma anterior decisão judicial, com desconhecimento dos bens jurídicos por ela reconhecidos e tutelados. </font></i>
</p><p><i><font>V - O caso julgado visa, pois, obstar a decisões concretamente incompatíveis entre si e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior - cf. art. 580º, nº 2 do CPC. </font></i>
</p><p><i><font>VI - Sendo a finalidade prosseguida pelo instituto do caso julgado uma finalidade de certeza, segurança, paz social, prevenção de litígios futuros, quanto mais for respeitado o caso julgado, tanto maior será a valia do processo em sede de certeza, segurança, etc ... incrementando o domínio da indiscutibilidade, e diminuindo a litigiosidade. </font></i>
</p><p><i><font>VII - O caso julgado, caracteriza-se por conferir força e total ao "desenho" anteriormente fixado pelo juiz à relação controvertida, impondo a todos os tribunais quando lhes seja submetida a mesma relação o dever de acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão e de modo absoluto, com vista não só à realização do direito objectivo ou ao exercício dos direitos subjectivos privados nela plasmados. </font></i>
</p><p><i><font>VIII - O «caso julgado material» torna indiscutível, nos termos do artigo 619º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, a situação fixada na sentença transitada (res judicata pro veritate habetur), ficando a decisão sobre a relação material controvertida a ter força obrigatória dentro e fora do processo, nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, isto sem prejuízo de revisão extraordinária, ao abrigo dos artigos 696º a 702º, todos do Cód. Proe. Civil. </font></i>
</p><p><i><font>IX - Não pode haver dois acórdãos incompatíveis, o recorrido, contra o exequente e as sentenças anteriores pelas quais foram julgados os Apensos D/F/G/H/I/J transitadas em julgado, contra o executado. </font></i>
</p><p><i><font>Concedendo-se provimento à revista e revogando-se o acórdão recorrido, farão VªS. Exªs. Senhores Conselheiros, a sempre correcta, nobre e Sã JUSTIÇA.</font></i><font> </font>
</p><p><b><font>3</font></b><font>-Notificado o recorrente/executado BB vem apresentar as suas contra-alegações, concluindo:</font>
</p><p><i><font>A) Com o presente recurso a Recorrente conclui que se verificou ofensa a caso julgado; </font></i>
</p><p><i><font>B) Mas, tratando o caso concreto de uma obrigação alimentícia entre ex-cônjuges e, sendo a obrigação alimentícia uma obrigação duradoura que depende da verificação de dois pressupostos - as necessidades económicas de quem recebe e as disponibilidades financeiras de quem paga - que podem alterar-se a todo o tempo, a lei contempla a alteração do quantitativo da prestação, face á evolução desses factores, ao longo do tempo conforme resulta, desde logo, do Art."2012 CC e dos Arts. 282, 619, n.º 2, 936 CPC; </font></i>
</p><p><i><font>C) Pelo que, atenta a especifica natureza desta obrigação, a decisão que a fixou é sempre susceptível de revisão, sem que se possa opor-lhe a autoridade do caso julgado; </font></i>
</p><p><i><font>D) Assim, muito bem assinala o douto Acórdão, no caso concreto, na sequência dos autos do pedido de cessação/alteração da pensão de alimentos ficaram provados que os pressupostos existentes no momento da constituição da obrigação alimentícia sofreram alterações com o decorrer do tempo pois; </font></i>
</p><p><i><font>E) De forma que, não se verifica qualquer ofensa de caso julgado, não se existindo qualquer incompatibilidade com decisões proferidas na pendência da acção de cessação da obrigação de alimentos. </font></i>
</p><p><i><font>Termos em que, V. Ex.as. recusando o provimento do recurso farão INTEIRA JUSTIÇA</font></i><font>.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font> O recurso foi admitido.</font>
<p><font> Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font> </font><b><font>4</font></b><font>-Enquadramento preliminar:</font>
<p><font>1-Os presentes autos de recurso, apenso “K” constituem um dos apensos do processo inicial, ação de divórcio.</font>
</p><p><font>2-O apenso “K” supra identificado teve origem no requerimento do executado, datado de 29.6.2018, do seguinte teor:</font>
</p><p><font> “BB, executado nos autos acima identificados, vem, respeitosamente, reiterar os seus requerimentos de 15/05/2018 e 12/06/2018, requerendo assim, a V.Exa., atento o aí exposto e aos documentos juntos, se digne ordenar que a Agente de Execução suspenda as diligências com vista à venda do imóvel penhorado, a entrega de quantias penhoradas à exequente e a penhora sobre a pensão do Executado, por os valores devidos à Exequente, há muito se encontrarem satisfeitos pelas penhoras e haver já grande excesso de penhora que deverá ser restituído ao Executado”.</font>
</p><p><font> 3-Tendo tal requerimento merecido o seguinte despacho, proferido com data de 5.7.2018:</font>
</p><p><font> “Tendo em consideração os esclarecimentos prestados, os valores descontados e a quantia ainda em dívida mostram-se suficiente para a acautelar os descontos ordenados na pensão do executado, devendo ser levantadas todas as demais penhoras”.</font>
</p><p><font> 4-Deste despacho interpôs o exequente recurso de apelação que foi decidido pelo acórdão ora recorrido.</font>
</p><p><font> 5-Nesse recurso o recorrente concluía que:</font>
</p><p><font>- Já havia sido proferida, num dos apensos, decisão a determinar a cessação da pensão;</font>
</p><p><font> - Que os efeitos dessa decisão se produziam a partir do momento da formulação do pedido de cessação da obrigação de alimentos e não apenas a partir da prolação da decisão;</font>
</p><p><font> - Que o despacho recorrido devia ser substituído por outro que determinasse “como liquidada a quantia exequenda, face às penhoras, e ordenar não só a suspensão da penhora sobre a pensão como a devolução do excesso de penhora”.</font>
</p><p><font> 6- Os apensos A, B e C constituem processos relativos à alteração da pensão de alimentos, tendo o apenso C sido autuado a 16.12.2014, iniciando-se com o requerimento do executado pedindo cessação da obrigação de alimentos, por desnecessidade da requerida, terminando com acórdão proferido a 22.3.2018 que confirmou a sentença recorrida, datada de 2.6.2017.</font>
</p><p><font> 7-Sentença que contem o seguinte dispositivo:</font>
</p><p><font> “Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente ação, determinando a cessação do pagamento da pensão de alimentos por parte do autor BB à requerida AA”.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font> </font><b><font>5</font></b><font>- CONHECENDO:</font>
<p><font>Alega a recorrente que o acórdão ora recorrido conheceu de matéria que não podia ter conhecido, dado que viola a exceção do caso julgado.</font>
</p><p><font> O recurso só foi admitido com esse alegado fundamento.</font>
</p><p><font> A questão a decidir prende-se com essa mesma matéria, da eventual violação do caso julgado e, só essa matéria justifica o alargamento da admissão do recurso de revista, nos termos da parte final, da al) a), do nº 2 do art. 629, ex vi art. 671, nº 2 al) a), do CPC.</font>
</p><p><font> Como refere o Cons. Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª ed. Pág. 51, “a norma que amplia a recorribilidade apenas pode servir para confrontar o Tribunal Superior com a discussão da alegada ofensa de caso julgado, excluindo-se </font><i><font>outras questões</font></i><font> cuja impugnação fica submetida às regras gerais”. Aí vem citada jurisprudência e doutrina, no mesmo sentido.</font>
</p><p><font> </font><u><font>Do caso julgado</font></u><font>:</font>
</p><p><font> A exceção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior – art- 580 do CPC.</font>
</p><p><font>O artigo 581 do mesmo diploma, no seguimento da anterior legislação nesta matéria, indica como requisitos para efeitos de verificação da exceção de caso julgado, dispondo: </font>
</p><p><font>1 – Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.</font>
</p><p><font>2 – Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica; </font>
</p><p><font>3 – Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende o mesmo efeito jurídico.</font>
</p><p><font>4 – Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico (…).</font>
</p><p><font>No que respeita à eficácia do caso julgado a doutrina, como a jurisprudência têm distinguido duas vertentes, como refere o Ac. deste STJ, de 22-06-2017, proferido no Proc. nº 2226/14.0TBSTB.E1.S1:</font>
</p><p><font>“a) – uma função negativa, reconduzida a exceção de caso julgado, consistente no impedimento de que as questões alcançadas pelo caso julgado se possam voltar a suscitar, entre as mesmas partes, em ação futura; </font>
</p><p><font>b) – uma função positiva, designada por autoridade do caso julgado, através da qual a solução neste compreendida se torna vinculativa no quadro de outros casos a ser decididos no mesmo ou em outros tribunais”.</font>
</p><p><font> O Prof. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, 3.ª ed., Almedina pág. 599 refere: “A excepção de caso julgado não se confunde com a autoridade do caso julgado; pela excepção visa-se o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, constituindo-se o caso julgado em obstáculo a nova decisão de mérito”, enquanto que “a autoridade do caso julgado tem antes o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível de segunda decisão de mérito. (...). Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objecto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida…”.</font>
</p><p><font> O Prof. Castro Mendes in Direito Processual Civil, ed. policopiada da AAFDL, 1978/79, vol. III, pág. 279 e segs. refere os limites objetivos e os subjetivos do caso julgado. Em relação aos limites objetivos realça que “o conteúdo do caso julgado é só a decisão final referente ao pedido, e não mais” e que, “o caso julgado está limitado pela causa de pedir” e em relação aos limites subjetivos indica que, “regra geral, o caso julgado tem uma eficácia restrita às partes processuais que o provocaram: é o princípio da eficácia «inter partes» do caso julgado”.</font>
</p><p><font> É função do caso julgado – conforme nº 2 do art. 580 do CPC- evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior, pelo que é sobre a decisão contida na sentença que se formará o caso julgado.</font>
</p><p><font> No caso concreto, a eventual ocorrência do caso julgado existiria entre a decisão no apenso onde se decidiu que: </font>
</p><p><font>- “Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente ação, determinando a cessação do pagamento da pensão de alimentos por parte do autor BB à requerida AA”;</font>
</p><p><font>E o decidido no acórdão recorrido:</font>
</p><p><font>- “Acordam em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando o despacho recorrido e ordenando à AE que refaça as contas da execução, considerando que a data da cessação da obrigação de alimentos é 1.1.2015, extinguindo-se todas as penhoras caso o valor exequendo assim apurado se mostre já depositado e devolva ao executado qualquer valor que constitua excedente, caso exista, após liquidada a quantia exequenda e demais responsabilidades”.</font>
</p><p><font>Entendemos que tem razão a recorrente ao alegar a incompatibilidade entre o decidido nos diversos apensos, mormente no apenso C) que julgou cessada a obrigação de prestar alimentos, e o decidido no apenso K) onde consta o acórdão sob recurso. </font>
</p><p><font>Porem, a recorrente em momento algum da sua alegação de recurso, mormente nas conclusões, concretiza a contradição ou incompatibilidade entre as decisões, pois embora dando a entender que a cessação da obrigação de prestar alimentos só se verifica com a sentença que a determinou, não justifica o seu entendimento. </font>
</p><p><font>A decisão que determinou a cessação da obrigação de prestar alimentos a ex-cônjuge, não referindo expressamente uma data, há-de produzir efeitos, ou a partir da interposição da respetiva ação, ou a partir da decisão transitada em julgado.</font>
</p><p><font>A sentença que determina “Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente ação, determinando a cessação do pagamento da pensão de alimentos por parte do autor BB à requerida AA” produz efeitos uma vez transitada em julgado.</font>
</p><p><font>O transito em julgado da sentença que fixa a prestação de alimentos não colide com o carater volúvel da pensão de alimentos. </font>
</p><p><font>Conforme salienta a Dª Maria João Tomé in URI:</font><font><a>http://hdl.handle.net/10316.2/38895</a></font><font>, Textos de Direito da família para Francisco Pereira Coelho, pág. 612, “De acordo com a sua natureza alimentar, a obrigação em apreço, encontra-se fatalmente sujeita a modificações. O princípio da solidariedade pós-conjugal, enquanto último reduto da vida vivida em comum, justifica uma certa permeabilidade entre as situações económicas dos ex-cônjuges. (…)</font>
</p><p><font>A pensão de alimentos é, pela sua própria natureza, essencialmente variável. Independentemente da forma da fixação do seu quantum – judicial ou convencional –, ela é sempre provisória. Baseando-se essa determinação na situação atual (ou previsível) das partes, ela é passível de modificação em virtude de alteração daquela situação”.</font>
</p><p><font>Resultando do espirito da lei, com as alterações ao CC em 2008, que o direito a alimentos entre ex-cônjuges tem natureza temporária, não deve perdurar para sempre e destina-se apenas a permitir uma reorganização da vida nos primeiros tempos subsequentes ao divórcio, prevalecendo a ideia de que cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio. Resulta expressamente do art. 2012 do CC.</font>
</p><p><font>E no mesmo sentido a jurisprudência.</font>
</p><p><font>Mas uma sentença que fixa alimentos produz efeitos e forma caso julgado, enquanto não for alterada, parcialmente com aumento ou diminuição da pensão, ou determinada a cessação da obrigação de prestar alimentos.</font>
</p><p><font>Não impede a produção de efeitos de caso julgado, o facto de a obrigação alimentícia ser uma obrigação duradoura, mas dependente da verificação dos pressupostos – necessidades económicas de quem recebe e disponibilidades financeiras de quem paga e que as circunstâncias podem alterar-se a todo o tempo e a lei permite que o quantitativo da prestação se adapte ao longo do tempo, face à evolução desses fatores, por isso e dada a natureza desta obrigação alimentícia é sempre possível de revisão. Por isso não concordamos com a conclusão que o recorrido daqui extrai de que por tal motivo não forma a autoridade do caso julgado.</font>
</p><p><font>O art. 2012 do CC permite a alteração dos alimentos fixados, se as circunstâncias determinantes da fixação se alterarem, indicando a lei processual o modus operandi, nomeadamente nos arts. 282, 619 nº 2 e 936, todos do CPC.</font>
</p><p><font>Mas enquanto se mantiverem as circunstâncias que determinaram uma prestação de alimentos, a decisão que a determinou mantem-se, vigora e impõe-se.</font>
</p><p><font>Mas entendemos que a questão em causa é diferente e tem a ver com a decisão da cessação da prestação de alimentos (no apenso C)) e a decisão que fixa a data da cessação (apenso k)).</font>
</p><p><font>A lei não determina ou fixa uma data a partir da qual uma decisão de cessação da prestação de alimentos a ex-cônjuge produz efeitos, como o faz em relação à decisão que fixa a obrigação de prestar alimentos, conforme art. 2006 do CC.</font>
</p><p><font>E os fundamentos que levaram o legislador a formular a norma do art. 2006 (desde quando são devidos alimentos), não se verificam em relação ao momento da cessação, porque em tal caso o legislador teria integrado na norma, ou feito outra semelhante onde indicasse desde quando são cessados os alimentos. É o que temos de entender face ao disposto no art. 9 do CC – Interpretação da lei. </font>
</p><p><font>Embora a jurisprudência e no caso de alteração dos alimentos fixados - art. 2012 do CC, se aumentados, faz retrotrair a alteração à data indicada no art. 2006, ou seja, à data da propositura da ação de alteração. </font>
</p><p><font>Veja-se o Ac. do TRL de 14/09/2017 – proc. 817/12.3TMLSB-A – Quer seja de fixação inicial da prestação alimentar, quer de aumento da prestação, a sentença retroage os seus efeitos ao momento da propositura da ação (art. 2006 do CC. </font>
</p><p><font>Mas não existe norma que determine o momento em que cessa a obrigação de prestar alimentos, por incapacidade do obrigado ou, por desnecessidade do beneficiário.</font>
</p><p><font>Não operando efeitos ope legis, verifica-se a necessidade de concretizar o momento a partir do qual produz efeitos a cessação da obrigação de prestar alimentos.</font>
</p><p><font>Concordamos com o explanado no acórdão recorrido:</font>
</p><p><i><font>“Trata-se, na verdade, do fundamento contemplado no art. 2013.º, n.º 1 al,. b), parte final: a obrigação de alimentos cessa quando aquele que os recebe deixe de precisar deles.</font></i>
</p><p><i><font>A lógica da norma é clara: fazer cessar o direito a alimentos quando deixar de haver fundamento para o efeito. O começo do fim coincide, então, com a melhor fortuna que o legislador considerou como razão para deixar de onerar alguém com a obrigação de prestar alimentos a outrem.(…)</font></i>
</p><p><i><font>Esse começo ou ponto a quo da cessação da obrigação de alimentos acontece antes de proposto o processo judicial para lograr ver a situação reconhecida. (…)</font></i>
</p><p><i><font>Temos, assim, por certo que a obrigação de alimentos cessa quando o credor deixe de precisar deles. (…)</font></i>
</p><p><i><font>A sentença proferida no apenso C não fixou de forma expressa o momento a partir do qual a ora exequente deixou de ter necessidade de alimentos prestados pelo aqui recorrente”. </font></i>
</p><p><font>Já não concordamos com o salto seguinte, que levou à decisão e fixação de uma data pelo acórdão recorrido, ao referir:</font>
</p><p><i><font>“Quer isto dizer que a sentença que considerou extinto o direito a alimentos laborou, entre o mais, com base nos rendimentos auferidos pela exequente em 2015, considerando-os suficientes para que esta pudesse prover ao seu sustento.</font></i>
</p><p><i><font>Quer isto dizer que, se não antes (como parece), pelo menos em 2015, já se verificava a circunstância de funcionamento automático prevista no art. 2013.º, n.º 1, al. b) parte final, CC.</font></i>
</p><p><i><font>Assim, cessou nessa altura a obrigação de alimentos, isto é, a 1.1.2015, data inicial a que se reporta a declaração de IRS desse ano”.</font></i>
</p><p><font>Entendemos que o requerente da cessação da prestação de alimentos, que tem o ónus de alegar e provar os factos demonstrativos de não poder continuar a prestá-los ou da desnecessidade de quem beneficia dessa prestação, deveria no pedido formulado indicar a data em que passou a verificar-se a impossibilidade de os prestar ou a desnecessidade de quem recebia os alimentos, porque e como salienta o acórdão recorrido </font><i><font>“Esse começo ou ponto a quo da cessação da obrigação de alimentos acontece antes de proposto o processo judicial para lograr ver a situação reconhecida” </font></i><font>(no acórdão recorrido fixou-se como data da cessação 1-01-2015, posterior à propositura da ação que foi em 2014 conforme ponto 16 dos factos provados no apenso em que se pede a cessação que indica a data de agosto de 2014 como a data da entrada da ação, embora a autuação tivesse ocorrido em 16-12-2014).</font>
</p><p><font>Não indicando o requerente a data em que se verificou que a requerida deixou de precisar de alimentos, nem formulando em concreto pedido nesse sentido, tem de se considerar que na procedência da ação os efeitos jurídicos por esta consagrados se concretizam com o transito em julgado da mesma. Regime normal da produção de efeitos das sentenças.</font>
</p><p><font>É o que resulta do art. 619 do CPC, que prevê a situação excecional relativa a ação de alimentos, situação a que o Prof. Alberto dos Reis chamava de “decisões instáveis”, “por a sentença poder “ser alterada, desde que se modifiquem as circunstâncias que determinaram a condenação”, in Código de Processo Civil anotado (anotação ao anterior CPC), vol. V, pág. 167, Coimbra Editora 1981:</font>
</p><p><font>“Valor da sentença transitada em julgado.</font>
</p><p><font>1 - Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º.</font>
</p><p><font>2 - Mas se o réu tiver sido condenado a prestar alimentos ou a satisfazer outras prestações dependentes de circunstâncias especiais quanto à sua medida ou à sua duração, pode a sentença ser alterada desde que se modifiquem as circunstâncias que determinaram a condenação”.</font>
</p><p><font> Assim, temos que estava decidido por sentença transitada em julgado a verificação da desnecessidade de a recorrente receber alimentos, cessando a obrigação do recorrido. É a data em que transitou em julgado a sentença que determinou a cessação de alimentos, proferida no apenso C), com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente ação, determinando a cessação do pagamento da pensão de alimentos por parte do autor BB à requerida AA”.</font>
</p><p><font>Estando fixada a data em que se verificou a cessação da obrigação da prestação alimentícia, tal implica a violação da exceção do caso julgado, ou da força vinculativa deste.</font>
</p><p><font>Entendemos que face ao teor das decisões se verifica contradição no decidido, violando a segunda a força e autoridade do caso julgado firmado pelo transito em julgado da primeira.</font>
</p><p><font> Verificando-se, por conseguinte, a ofensa do caso julgado, a revista há-de ser julgada procedente.</font>
</p><p><b><font>Decisão</font></b><font>:</font>
</p><p><font>Por tudo o exposto, acorda-se em julgar o recurso de revista procedente.</font>
</p><p><font>Custas pelo recorrido.</font>
</p><p><font>Lisboa, 24 de outubro de 2019</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Jorge Dias (Relator)</font>
</p><p><font> </font>
</p><p><font>Paulo Ferreira da Cunha</font>
</p><p><font> </font>
</p></font><p><font><font>Maria Clara Sottomayor</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
LDJxu4YBgYBz1XKvHQn4 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Processo nº 1779/18.9T8BRG.G1.S1</font><div><br>
<font>***</font></div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font>
<p><b><font>1</font></b><font>-Freguesia de Alheira e Igreja Nova, AA e mulher, BB e CC e mulher, DD, </font><b><font>propuseram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra</font></b><font> EE e mulher, FF e contra GG e mulher, HH, pedindo que:</font>
</p><p><font>-Fosse reconhecido que os 2.ºs co -Autores (AA e mulher, BB) são donos e legítimos possuidores de um prédio rústico (que identificaram), e que dele faz parte o muro de pedra sobreposta que o delimita a nascente, sendo os Réus condenados a reporem-no no estado original (recolocando-lhe as pedras subtraídas e retirando a coluna de sustentação lateral do portão que nele implantaram), e a pagarem-lhes a quantia de € 2.500,00 (a título de indemnização por danos não patrimoniais que lhes causaram, com a sua atuação violadora dos direitos que aqui pretendem ver reconhecidos);</font>
</p><p><font>-Fosse reconhecido que os 3.ºs co -Autores (CC e mulher, DD) são donos e legítimos possuidores de um prédio rústico (que identificaram), e que dele faz parte o muro de pedra sobreposta com cerca de 37 metros localizado a norte, sendo os Réus condenados a reporem-no no estado original (recolocando-lhe as pedras subtraídas e retirando os esteios e rede que nele colocaram), e a pagarem-lhes a quantia de € 5.000,00 (a título de indemnização por danos não patrimoniais que lhes causaram, com a sua atuação violadora dos direitos que aqui pretendem ver reconhecidos);</font>
</p><p><font>-Fosse reconhecido que o caminho que passa junto dos prédios dos 2.ºs coautores e dos 3.ºs coautores (que melhor identificaram) pertence ao domínio público, sendo os Réus condenados a desobstrui-lo (retirando todos os obstáculos que nele colocaram, nomeadamente os portões implantados nas suas extremidades, as redes e os esteios), e a absterem-se de futuramente o obstruírem, sob pena de pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00, por cada infração ou dia de infração.</font>
</p><p><b><font>2</font></b><font>-Alegaram para o efeito, em síntese, serem, quer os 2.ºs coautores (AA e mulher, BB), quer os 3.ºs coautores (CC e mulher, DD), proprietários de um prédio rústico, confinando qualquer deles com um mesmo caminho vicinal (sendo que o prédio dos 2.ºs coautores pelo seu lado nascente, e o prédio dos 3.ºs coautores pelo seu lado norte), pertencendo-lhes igualmente os muros divisórios, em pedra sobreposta, que aí se encontram.</font>
</p><p><font>Mais alegaram serem os 1.ºs co-réus (EE e mulher, FF) proprietários de um outro prédio rústico, de que os 2.ºs co -Réus (GG e mulher, HH) são usufrutuários, confinando o mesmo, a sul e a poente, com o caminho vicinal já referido.</font>
</p><p><font>Alegaram ainda os Autores que este, em terra batida, com cerca de 158 metros de extensão, implantado entre extremas de plúrimos prédios privados, mas cujo leito lhes é estranho, faz desde tempos imemoriais a ligação pedonal entre o Lugar … e o Lugar …, sendo usado pela população em geral, pela maior rapidez e comodidade que oferece, sem oposição de ninguém, e beneficiando já de um poste de iluminação pública; e, por isso, possuindo natureza pública.</font>
</p><p><font>Contudo (e sempre segundo a alegação dos Autores), entre finais de Julho e finais de Setembro, de 2017, os Réus vedaram o dito caminho (nomeadamente, por meio de portões colocados nas suas extremidades, esteios e rede de arame, tendo para o efeito retirado pedras dos muros divisórios dos prédios dos 2.ºs coautores e dos 3.ºs coautores); obstruíram a sua passagem (nomeadamente, com ferros e rede plástica); e retiraram a rede elétrica de alimentação do candeeiro público, e mesmo este.</font>
</p><p><font>Por fim, alegaram que, mercê da atuação dos Réus, os 2.ºs coautores (AA e mulher, BB) e os 3.ºs coautores (CC e mulher, DD) sofreram incómodo, mal-estar e nervosismo, sendo que estes últimos foram ainda acometidos de enorme ansiedade, desgosto e perturbação do sono, por várias noites.</font>
</p><p><b><font>3</font></b><font>- Regularmente citados, os Réus (EE e mulher, FF, e GG e mulher, HH) contestaram, pedindo que a ação fosse julgada improcedente, sendo eles próprios absolvidos de todos os pedidos deduzidos contra si.</font>
</p><p><font>Alegaram para o efeito, em síntese, reconhecerem os Autores como proprietários dos prédios invocados como sendo deles; mas impugnarem tudo o demais por eles alegado (nomeadamente, a propósito das confrontações dos respetivos prédios com caminho vicinal, da propriedade dos muros de pedra que marginam os ditos prédios, ou da natureza pública do dito caminho vicinal, defendendo constituir o mesmo mero atalho ou atravessadouro, abolido pelo art. 1383 do CC de 1966).</font>
</p><p><font>Mais alegaram terem, de facto, realizado obras de vedação do dito caminho; mas terem-no feito por o mesmo ser propriedade sua, impugnando ainda a verificação de quaisquer danos que assim tivessem causado aos Autores.</font>
</p><p><b><font>4</font></b><font>-</font><font> </font><font>Foi proferido despacho no qual foi dispensada a realização de audiência prévia; saneador (certificando tabelarmente a validade e a regularidade da instância); fixando o valor da ação em € 65.991,00; identificando o objeto do litígio e enunciando os temas da prova; apreciando os requerimentos probatórios das partes e agendando a realização da audiência final.</font>
</p><p><b><font>5</font></b><font>-Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando a ação parcialmente procedente, nos seguintes termos:</font>
</p><p><font>“</font><i><font>Pelo exposto, julgo a ação totalmente procedente e, em consequência:</font></i>
</p><p><i><font>a. Reconheço que os 2ºs Autores AA e BB são donos e legítimos possuidores do prédio inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo 1977º, descrito nos artigos 1- a 5-, dos factos provados;</font></i>
</p><p><i><font>b. Reconheço que faz parte daquele prédio, sendo os 2ºs Autores AA e BB os seus únicos donos e possuidores, o muro de pedra sobreposta que o delimita a nascente;</font></i>
</p><p><i><font>c. Condeno os Réus a repor tal muro ao estado original, recolocando-lhe as pedras subtraídas e retirando a coluna de sustentação lateral do portão que estes lá colocaram;</font></i>
</p><p><i><font>d. Condeno os Réus a pagar aos 2ºs Autores AA e BB a pagar-lhes a quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de danos não patrimoniais;</font></i>
</p><p><i><font>e. Reconheço que os 3.ºs Autores CC e DD são donos e legítimos possuidores do prédio inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo 1969, descrito nos artigos 6- a 10-, dos factos provados;</font></i>
</p><p><i><font>f. Reconheço que faz parte daquele prédio, sendo os 3.ºs Autores CC e DD os seus únicos donos e possuidores, o muro de pedra sobreposta com cerca de 37 metros, localizado a norte;</font></i>
</p><p><i><font>g. Condeno os Réus a repor tal muro ao estado original, recolocando-lhe as pedras subtraídas e retirando os esteios e redes que por estes aí foram colocados;</font></i>
</p><p><i><font>h. Condeno os Réus a retirar os esteios e redes que foram colocados na sua propriedade;</font></i>
</p><p><i><font>i. Condeno os Réus a pagar aos 3.ºs Autores CC e DD a quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de danos não patrimoniais;</font></i>
</p><p><i><font>j. Reconheço que o caminho descrito nos artigos 15- a 38-, dos factos provados, pertence ao domínio público;</font></i>
</p><p><i><font>k. Condeno os Réus a desobstruir o referido caminho, retirando todos os obstáculos que nele colocaram, designadamente, os portões implantados nas suas extremidades, as redes e esteios;</font></i>
</p><p><i><font>l. Condeno os Réus a, de futuro, absterem-se de obstruir o caminho, sob pena de pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 (cinquenta euros), por cada dia de infração.</font></i>
</p><p><i><font>As custas do processo são a cargo dos Réus, por força do seu decaimento (cfr. artigo 527º/1/2, do CPCiv).</font></i>
</p><p><i><font>Valor da ação: o fixado no despacho saneador a fls. 85.</font></i>
</p><p><i><font>Registe e notifique</font></i><font>”.</font>
</p><p><b><font>6</font></b><font>- Inconformados com esta decisão, os Réus (EE e mulher, FF, e GG e mulher, HH) interpuseram recurso de apelação, pedindo que fosse provido, substituindo-se a sentença recorrida por decisão julgando improcedentes todos os pedidos formulados, e deles os absolvendo.</font>
</p><p><b><font>Recurso de apelação</font></b><font> que mereceu a seguinte decisão:</font>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em:</font></i>
</p><p><i><font>- Rejeitar, por extemporâneo, o recurso de apelação pretendido interpor pelos Réus (EE e mulher, FF, e GG e mulher, HH).</font></i>
</p><p><i><font>Custas da apelação pelos Réus (art. 527.º, n.º 1 e n.º 2 do CPC)</font></i><font>”.</font>
</p><p><b><font>7</font></b><font>- De novo inconformados, vêm os réus apresentar </font><b><font>recurso de revista</font></b><font>, concluindo as alegações nos seguintes termos:</font>
</p><p><i><font>“A – O recurso apresentado no Tribunal da Relação de Guimarães cumpre todos os requisitos e obrigações constante do artigo 640º do Código de Processo Civil</font></i>
</p><p><i><font>B – O Tribunal da Relação de Guimarães não podia, assim, rejeitar o mesmo por extemporaneidade, tanto mais que compreendeu toda a matéria, ficou perfeitamente ciente da questão e tinha em mãos, transcritos e com apontamento do dia, hora, minuto e segundo em que foram gravados, os depoimentos que os aqui recorrentes entendem fundamentavam a sua discórdia na matéria de facto</font></i>
</p><p><i><font> C - Tanto mais que “acordou” em 68 páginas de acórdão e se pronunciou sobre o objeto do recurso: a classificação do atravessadouro como caminho publico</font></i>
</p><p><i><font>D - A interpretação pelo Tribunal quanto ao constante nos artigos 1383 e 1384 do Código Civil de que um carreiro, ou ligação pedonal entre lugares da freguesia, para encurtar caminho, com uma extensão de cerca de 158 metros e uma largura de cerca de 80 centímetros, que nem considerado foi na toponímia local, seja considerada caminho publico é inconstitucional porque viola o principio da legalidade e da boa fé constante dos artigo 3º nº 2, 202º e 203º da Constituição da Republica Portuguesa</font></i>
</p><p><i><font>E - Dos autos constam todos os elementos necessários para este Supremo Tribunal possa, com base na matéria de facto dada como provada e daquela que deveria ter sido alterada pela Relação, proferir decisão que considere a inexistência de qualquer caminho publico no local como o foi descrito pelos autores e, ao mesmo tempo, por vaga e falta de concretização e de elementos, absolva os réus dos pedidos peticionados pelos autores AA e mulher e CC e mulher</font></i>
</p><p><i><font>F - Conforme, aliás, consta das conclusões apresentadas na Apelação e supra transcritas e que por brevidade aqui se dão por integralmente reproduzidas.</font></i>
</p><p><i><font> G - Ao decidir conforme o decidiu, violou o acórdão aqui em recurso o disposto nos artigos 640º do Código de Processo Civil, 1383º e 1384º do Código Civil, bem como o disposto nos artigos 3º nº 2, 202º e 203º da Constituição da República Portuguesa.</font></i>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas, Excelentíssimos Conselheiros,</font></i>
</p><p><i><font>Deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência, ser o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães revogado e substituído por outro que decida em conformidade com o supra alegado resultando na improcedência total dos pedidos formulados pelos ora recorridos e autores em primeira instância</font></i><font>”.</font>
</p><p><b><font>Responde a autora Freguesia</font></b><font>, concluindo:</font>
</p><p><i><font>“- Deve o recurso quanto à questão de violação da lei processual sobre os poderes de reapreciação da matéria de facto ser julgado improcedente;</font></i>
</p><p><i><font>- Deve o recurso, quanto à matéria de direito, não ser admitido, por verificação da exceção da dupla conforme”</font></i><font>.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Não tendo o recurso de revista sido admitido no Tribunal recorrido, reclamaram os recorrentes do indeferimento, reclamação que foi deferida e admitido o recurso como de revista, a subir nos autos e com efeito devolutivo.</font>
<p><font>Dispensados os vistos, cumpre conhecer e decidir.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font>
<p><font>Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações – artigo 635 do Código de Processo Civil – as questões a decidir respeitam à:</font>
</p><p><font>-Rejeição do recurso de apelação pela Relação.</font>
</p><p><font>Embora do acórdão recorrido resulte que, no segmento respeitante à impugnação da matéria de facto, a rejeição da apelação resulta do incumprimento do ónus de impugnação, e no segmento respeitante à matéria de direito</font><font>, </font><font>por extemporaneidade, verifica-se que do dispositivo do mesmo acórdão apenas se diz: </font><i><font>“Rejeitar, por extemporâneo, o recurso de apelação pretendido interpor pelos Réus (EE e mulher, FF, e GG e mulher, HH)</font></i><font>.</font>
</p><p><font>Assim, mesmo verificando que foi analisado o recurso no que respeita à matéria de facto e se tenha concluído pelo incumprimento do ónus de impugnação por parte dos recorrentes, nada disso consta da decisão.</font>
</p><p><font>Deste modo, o objeto deste acórdão restringe-se a saber se se verificavam fundamentos para a apelação ser recebida e não rejeitada, ou seja, se se verificam os pressupostos para, ao prazo normal do recurso, acrescerem 10 dias, conforme estipula o nº 7 do art. 638, do CPC, isto é, saber se o recurso tem por objeto a reapreciação da prova gravada. </font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Não tendo interesse para a decisão do objeto deste recurso a reprodução da matéria de facto apurada, omite-se essa reprodução.</font><div><br>
<font>*</font></div><br>
<b><font>No acórdão recorrido são do seguinte teor os fundamentos para a rejeição do recurso</font></b><font>, neste segmento (impugnação da matéria de facto):</font>
<p><i><font>“Concretizando, considera-se que os Recorrentes (Réus) não cumpriram integralmente o ónus de impugnação que lhes estava cometido pelo art. 640, n.º 1 do CPC, nomeadamente por não terem indicado - devida e suficientemente - os «concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida».</font></i></p><div><br>
<i><font>*</font></i></div><br>
<i><font>Concluindo, e quanto ao cumprimento do ónus de conclusão, previsto no art. 639, n.º 1 do CPC, não tendo os Réus recorrentes (EE e mulher, FF, e GG e mulher, HH) indicado, nas conclusões do recurso de apelação que apresentaram, quais os concretos pontos de facto que consideravam incorrectamente julgados, limitaram o respectivo objecto à matéria de direito; e, em conformidade, foi o mesmo recurso apresentado de forma extemporânea, devendo por isso ser aqui rejeitado</font></i><font>”.</font><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>-</font><b><font>Rejeição do recurso de apelação, no segmento respeitante à impugnação da matéria de facto</font></b><font>:</font>
<p><font>- A rejeição do recurso de apelação resulta de que, no entender da Relação, os apelantes não indicavam as concretas provas que serviriam para impor uma decisão diferente da decisão da matéria de facto fixada pela 1ª Instância. </font>
</p><p><font>Dispõe o art. 640 do CPC, com a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”.</font>
</p><p><font>“</font><i><font>1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:</font></i>
</p><p><i><font>a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;</font></i>
</p><p><i><font>b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;</font></i>
</p><p><i><font>c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.</font></i>
</p><p><i><font>2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:</font></i>
</p><p><i><font>a) </font></i><i><u><font>Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados</font></u></i><i><font>, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;</font></i>
</p><p><i><font>(…)” </font></i><font>(sublinhado nosso).</font>
</p><p><font>No acórdão recorrido entendeu-se que os recorrentes apenas não tinham dado cumprimento ao ónus especificado na al. b) do nº 1 e a) do nº 2, do art. 640 do CPC (não especificaram os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida e consequentemente não indicaram as passagens da gravação em que se funda o recurso).</font>
</p><p><font>O que equivale por dizer que o acórdão recorrido entendeu terem sido especificados no recurso de apelação, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, bem como a decisão que deveria ser proferida sobre essa questão.</font>
</p><p><font>Vem sendo entendimento deste STJ que:</font>
</p><p><font> “1. Face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta atualmente do nº1 do art. 640 do CPC; e um ónus secundário – tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exata das passagens da gravação relevantes ( e que consta atualmente do art. 640, nº 2, al. a) do CPC) . 2. Este ónus de indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da ata, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objeto do recurso” - Ac. nº 233/09.4TBVNG.G1.S1, de 29-10-2015.</font>
</p><p><font>“V- O cumprimento dos diversos itens do art. 640 do CPC não constitui um fim em si, antes se perfila teleologicamente como um meio de delimitar a quaestio decidendi e respetiva solução. VI- Ao indagar da suficiência da alegação deverá tomar-se em linha de conta o princípio da proporcionalidade; trata-se de um princípio intrínseco e mesmo estruturante do Estado de direito, postulando o entendimento de que as medidas a adotar pelo juiz, nomeadamente restritivas, deverão conter-se na “justa medida” do necessário à prossecução dos fins a que vão intentadas".Ac. STJ de 6-11-2018, Proc. nº 349/14.5T8CLD-B.C1.S1.</font>
</p><p><font>Estando em causa um direito fundamental, como o é o direito ao recurso na vertente da impugnação da matéria de facto, só em casos de erro grosseiro ou omissão essencial, que dificulte a compreensão do objeto do recurso e das questões a decidir, é que o recurso pode ser rejeitado por incumprimento do ónus previsto no artigo 640 do CPC. Neste sentido, se pronunciou o Ac. do STJ de 14-02-2017, Proc. nº 1260/07.1TBLLE.E1.S1, segundo o qual apenas podem conduzir à rejeição liminar e imediata do recurso violações grosseiras, por exemplo, uma omissão absoluta e indesculpável do cumprimento do ónus contido no artigo 640 do CPC, que comprometa decisivamente a possibilidade do Tribunal da Relação proceder à reapreciação da matéria de facto.</font>
</p><p><font>No caso vertente não está em causa que os recorrentes identificaram (na motivação, mas não nas conclusões) os factos que consideram incorretamente julgados e a decisão que sobre os mesmos pretendem seja dada pelo Tribunal da Relação.</font>
</p><p><font>A questão incide sobre os concretos meios probatórios que no entender dos apelantes impõem decisão diversa da recorrida – art. 640 nº 2 do CPC (e a indicação das passagens da gravação).</font>
</p><p><font>Respigando as alegações do recurso para a Relação, relativamente à matéria de facto e concretamente no segmento respeitante ao ónus de impugnação relativo aos concretos meios probatórios, aí se diz:</font>
</p><p><font>-</font><font> </font><i><font>Entendem os réus que não deveriam ter sido dados como provados os factos constantes dos números 4, 5, 9, 10, 14, 18, 19, 20, 22, 23. 24, 25, 26, 41, 42, 43, 45 e 52 porquanto não têm apoio na sua resposta afirmativa quer no depoimento das testemunhas, quer em toda a documentação constante dos autos</font></i>
</p><p><i><font>-Tais factos deveriam antes constar dos não provados</font></i><font>.</font>
</p><p><font>Relativamente às pedras que os réus teriam retirado dos muros dos 2ºs e 3ºs autores, indicam como meio de prova:</font>
</p><p><font>-</font><font> </font><i><font>A todas as testemunhas questionadas sobre o assunto, veja-se, por exemplo a testemunha II, que depôs no dia 29 de Abril de 2019, estando o seu depoimento gravado no sistema áudio do Tribunal de 15:20:04 a 15:34:19 que, referindo-se aos muros, diz o seguinte</font></i><font>: (transcreve parte do depoimento).</font>
</p><p><font>Relativamente à existência do caminho/carreiro, indicam:</font>
</p><p><font>- </font><i><font>E a testemunha JJ, que prestou depoimento no dia 29 de Abril de 2019, estando mesmo gravado no sistema áudio do Tribunal de 15:56:23 a 16:25:23 e donde, questionado, quanto à existia e uso do caminho/carreiro, consta</font></i><font>: (seguindo-se transcrição parcial do depoimento).</font>
</p><p><font>Relativamente aos sinais de que o prédio dos réus confrontava com o caminho, indicam:</font>
</p><p><font>-</font><font> </font><i><font>E são estes mesmos autores que não definem qual, ou quais, os sinais dos prédios dos réus que confrontam ou fazem estrema com o tal caminho identificam, apenas, que é o leito do próprio caminho Sinal mais que evidente que o leito do próprio caminho faz parte do prédio dos réus.</font></i>
</p><p><i><font>O que, aliás, foi referido – e nunca contrariado por outros – pela testemunha KK, que prestou depoimento no dia 29 de Abril de 2019, depoimento este gravado no sistema áudio do Tribunal de 17:04:56 a 17:19:47, onde, a dado passo diz o seguinte</font></i><font>: (transcreve parte do depoimento).</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Por isso, entendemos que, no recurso de apelação, foram indicados os concretos meios probatórios que, no entender dos apelantes, impunham a reapreciação da prova gravada, acrescendo ao prazo normal do recurso dez dias, nos termos do art. 638, nº 7 do CPC.</font>
<p><font>Ainda que a indicação das passagens na gravação áudio não esteja exatamente correta, tal não se afigura como impeditiva de acrescer ao prazo normal 10 dias.</font>
</p><p><font>Estamos somente no âmbito da admissão do recurso de apelação. </font>
</p><p><font>No sentido do exposto vem a jurisprudência do STJ, que refere:</font>
</p><p><i><font>“II - Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso.</font></i>
</p><p><i><font>V - Independentemente da perfeição/imperfeição da impugnação da matéria de facto, não pode o Tribunal da Relação considerar que o prazo de recurso de 30 dias, fixado no art. 80.º n.º 3 do CPT, não é aplicável, reduzindo-o para o prazo de 20 dias, previsto no n.º 1 desse mesmo artigo, para depois concluir que o recurso é extemporâneo e decidir no sentido da sua rejeição” – Ac. de 03-03-2016, Revista n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1.</font></i>
</p><p><i><font>“III - A extensão do prazo de 10 dias previsto no art. 638.º, n.º 7, do NCPC, para apresentação do recurso de apelação quando tenha por objecto a reapreciação de prova gravada depende unicamente da apresentação de alegações em que a impugnação da decisão da matéria de facto seja sustentada, no todo ou em parte, em prova gravada, não ficando dependente da apreciação do modo como foi exercido o ónus de alegação. </font></i>
</p><p><i><font>IV - Tendo o recorrente demonstrado a vontade de impugnar a decisão da matéria de facto com base na reapreciação da prova gravada, a verificação da tempestividade do recurso de apelação não é prejudicada ainda que houvesse motivos para rejeitar a impugnação da decisão da matéria de facto com fundamento na insatisfação de algum dos ónus previstos no art. 640.º, n.º 1, do NCPC” – Ac. de 28-04-2016, Revista n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1 - 2.ª Secção .</font></i>
</p><p><i><font>“I - É admissível recurso de revista do acórdão da Relação que, não admitindo o recurso de apelação por intempestividade, pôs termo ao processo (art. 671.º, n.º 1, do CPC). </font></i>
</p><p><i><font>II - A apelante que sustenta a alteração da matéria de facto com base em depoimento testemunhal gravado beneficia da prorrogação do prazo de dez dias para recorrer, independentemente da regularidade da impugnação da matéria de facto e do respectivo mérito (art. 638.º, n.º 7, do CPC). </font></i>
</p><p><i><font>III - De acordo com a orientação reiterada do STJ, a verificação do cumprimento do ónus de alegação do art. 640.º do CPC tem de ser realizada com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal” – Ac. de 08-02-2018, Revista n.º 8440/14.1T8PRT.P1.S1 - 2.ª Secção.</font></i>
</p><p><i><font>“I - A extensão do prazo de 10 dias previsto no art. 638.º, n.º 7, do CPC, para apresentação do recurso de apelação quando tenha por objecto a reapreciação de prova gravada depende unicamente da apresentação de alegações em que a impugnação da decisão da matéria de facto seja sustentada, no todo ou em parte, em prova gravada, não ficando dependente da apreciação do modo como foi exercido o ónus de alegação. </font></i>
</p><p><i><font>II - Tendo a recorrente demonstrado a vontade de impugnar a decisão da matéria de facto com base na reapreciação da prova gravada, ainda que não tenha dado cumprimento ao ónus a que alude o disposto no art. 640.º, n.º 1, al. a), do referido diploma legal, terá que ser admitido o recurso interposto por tempestivo, devendo a Relação conhecer das demais questões suscitadas” Ac. de 05-02-2019, Revista n.º 1607/07.0RMLSB-F.L1.S1 - 1.ª Secção.</font></i>
</p><p><i><font>“I - Resultando das alegações do recurso de apelação que a recorrente pretendia a modificação do acervo factual com base, mormente, na reapreciação da prova testemunhal gravada, é de considerar que lhe aproveitava o prazo suplementar concedido pelo n.º 7 do art. 638.º do CPC, independentemente de, no julgamento do recurso, a Relação ter considerado que não haviam sido cumpridos os ónus de alegação vertidos no art. 640.º do CPC” – Ac. de 06-06-2019, Revista n.º 2215/12.0TMLSB-B.L1.S1 - 7.ª Secção. </font></i>
</p><p><font>Os recorrentes/apelantes justificaram a pretensa alteração de vários pontos da decisão da matéria de facto em depoimentos de testemunhas que foram gravados. Logo, ao prazo normal de interposição do recurso e da resposta, acrescem 10 dias, conforme art. 638, nº 7 do CPC.</font>
</p><p><font>Por isso, independentemente da apreciação do mérito de tal impugnação, era vedado à Relação extrair, a posteriori, um efeito que contende com a admissibilidade do próprio recurso.</font>
</p><p><font>Como se refere no Ac. do STJ de 28-04-2016, no Proc. n.º 1006/12.2TBPRD.P1.S1, “A tempestividade dos recursos constitui um pressuposto processual atinente à sua admissibilidade, pelo que de modo algum o resultado alcançado aquando da apreciação do seu mérito poderá interferir em tal pressuposto cuja satisfação se deve reportar ao momento da sua interposição”.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Face ao exposto há-de julgar-se procedente o recurso de revista.</font>
<p><font>Sumário elaborado nos termos do disposto no art. 663 nº 7 do CPC:</font>
</p><p><font>I-</font><font> </font><font>Os recorrentes/apelantes justificaram a pretensa alteração de vários pontos da decisão da matéria de facto em depoimentos de testemunhas que foram gravados. Logo, ao prazo normal de interposição do recurso e da resposta, acrescem 10 dias, conforme art. 638, nº 7 do CPC.</font>
</p><p><font>II- Por isso, independentemente da apreciação do mérito de tal impugnação, era vedado à Relação extrair, a posteriori, um efeito que contende com a admissibilidade do próprio recurso.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<b><font>Decisão</font></b><font>:</font>
<p><font>Acorda-se na 1ª Secção do STJ em julgar procedente a revista, revoga-se o acórdão recorrido e determina-se a remessa dos autos ao Tribunal da Relação para que:</font>
</p><p><font>a) Seja apreciada e decidida a impugnação da decisão da matéria de facto deduzida pelos RR. apelantes;</font>
</p><p><font>b) Sejam apreciadas as demais questões suscitadas pelos RR. recorrentes no recurso de apelação.</font>
</p><p><font>Custas da revista a cargo da parte vencida a final.</font>
</p><p><font>Lisboa, 21-10-2020</font>
</p><p><font>Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator</font>
</p><p><font>Nos termos do art. 15-A, do Dl. nº 10-A/2020 de 13-03, aditado pelo art. 3 do Dl. nº 20/2020 atesto o voto de conformidade dos srs. Juízes Conselheiros adjuntos.</font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor – Juíza Conselheira 1ª adjunta</font>
</p></font><p><font><font>António Alexandre Reis – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
fDJmu4YBgYBz1XKvJQFQ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<p><font>Mateus Sequeira, Douro, Lda intentou procedimento cautelar de arresto contra Sociedade Turística e Hoteleira Vale do Douro, SA, Columóveis - Gestão, Administração de Bens e Imóveis SA, Imobiliária Terras do Meão SA, Peixotas Enoturisvitisvinis - Imobiliária SA, Romarigo Vinhos, Internacional SA, Sociedade Turística e Hoteleira Quinta da Ameixieira, Lda, Residencial Columbano Lda..</font><br>
</p><p><font>Foi proferido em 10.3.2021 despacho com o seguinte teor: “</font><i><font>Requerimento do senhor Agentes de Execução com a referência ...:</font></i><br>
</p><p><i><font>Veio o senhor agente de execução fazer a exposição que consta do requerimento referido, que dou por reproduzida, dando conta da actuação dos requeridos, através do ilustre mandatário que os representa.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pois bem, antes de mais, diremos que o senhor agente de execução, como muito bem faz, não tem que dar cumprimento a quaisquer “ordens” das partes, mas apenas ao que legalmente entende ser de fazer, face à decisão do Tribunal, até porque as partes nada podem impor ao agente de execução.</font></i><br>
</p><p><i><font>Posto isto, é evidente que não assiste qualquer razão aos requeridos, já que a decisão proferida é clara, no sentido de que se mantém o arresto sobre todos os bens sobre os quais foi decretado, com excepção, no que diz respeito aos bens móveis, daqueles que não sejam viaturas automóveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>No que diz respeito às quotas, participações sociais e subsídios do IVDP, tal decisão manteve-se nos precisos termos em que foi decretada, como resulta da decisão proferida.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve, pois, o senhor agente de execução cumprir conforme indicação da decisão do Tribunal, não tendo que actuar de acordo com o, erradamente, pretendido pelos requeridos</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Inconformadas com este despacho, as requeridas vieram dele interpor recurso, que foi recebido como de apelação, sendo decidido a final: “</font><i><font>Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães decide julgar o recurso totalmente improcedente e confirma integralmente a decisão recorrida</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Inconformadas, as recorrentes vieram, por requerimento de 4.5.2021, ao abrigo do art. 666º CPC, arguir a nulidade do acórdão, a decidir em conferência.</font><br>
</p><p><font>Referiam em conclusões nesse requerimento, além do mais, que: “I- </font><i><font>Notificados do Acórdão proferido no dia 29.4.2021 pelo Tribunal da Relação de Guimarães, com a referência CITIUS nº ..., dele não se conformando, vêm ao abrigo do preceituado no art. 666º do CPC arguir a nulidade do Acórdão, a decidir em conferência</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>XIII- Nos termos do preceituado no artigo 615º,1,b,c,d do CPC, aplicável ex vi artigos 666º do mesmo diploma, é nulo o Acórdão quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível ou, ainda, quando o Tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Assim, o Acórdão proferido por esse douto Tribunal está ferido de nulidade, atento o preceituado nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do art. 615º do CPC. Nulidade que, para os devidos efeitos se invoca, nos termos do preceituado no nº 4 do art. 615º do CPC, por violação dos artigos 608º, 609º e 613º do CPC</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Vindo o Tribunal da Relação a proferir acórdão, no qual decidiu: “</font><i><font>Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães indefere à arguição de nulidades do Acórdão, e decide condenar as recorrentes, como litigantes de má-fé, na multa de 10 UC, absolvendo-as do pedido de condenação em indemnização a favor da recorrida</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Deste acórdão que decidiu a arguição de nulidades é interposto o presente recurso de revista, no qual as recorrentes alegam e concluem: </font><br>
</p><p><i><font>“I. O Tribunal Recorrido julgou improcedente as nulidades arguidas pelas Recorrentes.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. Em relação a “saber se a decisão recorrida entra em contradição com a decisão final sobre a providência”, decidiu o douto Tribunal da Relação que: “Foi isso que esta Relação apreciou, e decidiu. Não iremos repetir o que aqui dissemos no Acórdão.... Temos dificuldade em entender qual, no entender das requerentes, foi a questão que esta Relação deixou de conhecer.”</font></i><br>
</p><p><i><font>III. O pedido de intervenção a que se refere o douto Tribunal prendeu-se com o facto de ter sido proferida decisão final do Tribunal de Ia instância relativamente ao presente Arresto, depois de ouvidas as requeridas e de ter sido feito o devido contraditório.</font></i><br>
</p><p><i><font>IV. Decisão proferida no dia 8 de Fevereiro de 2021 em que se decidiu que: ““4- DECISÃO: Por tudo quanto exposto se deixou, procede a oposição, apenas parcialmente, mantendo-se a providência de arresto decretada, com exceção dos bens móveis das Requeridas, que não sejam veículos, cujo levantamento se ordena. </font></i><br>
</p><p><i><font>V. No dia 1.3.2021 as requeridas/recorrentes enviaram uma carta ao Agente de Execução, na qual elencam quais os bens sobre os quais deviam de imediato ser levantado o arresto, tanto mais que, o recurso da decisão não tinha efeitos suspensivos.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI. A 8.3.2021 o Agente de Execução veio juntar aos autos cópia da carta, dando a sua opinião sobre a mesma e sobre a pretensão nela contida, e requerendo ao Tribunal que se pronunciasse sobre a mesma.</font></i><br>
</p><p><i><font>VII. Em resposta, por despacho, proferido no dia , a Meritíssima Juiz refere que: “Posto isto, é evidente que não assiste qualquer razão aos requeridos, já que a decisão proferida é clara, no sentido de que se mantém o arresto sobre todos os bens sobre os quais foi decretado, com exceção, no que diz respeito aos bens móveis, daqueles que não sejam viaturas automóveis. No que diz respeito às quotas, participações sociais e subsídios do IVDP, tal decisão manteve-se nos precisos termos em que foi decretada, como resulta da decisão proferida. Deve, pois, o senhor agente de execução cumprir conforme indicação da decisão do Tribunal, não tendo que atuar de acordo com, o erradamente, pretendido pelos requeridos.”</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII. Este despacho, imediatamente acima transcrito no número anterior é que deu causa a esta questão tanto mais que, a decisão deste despacho entra em contradição com a sentença proferida a 8 de fevereiro de 2021. Resulta da transcrição completa da decisão proferida na sentença do dia 8 de fevereiro de 2021, que nenhuma discriminação se faz à manutenção do arresto sobre as quotas, participações sociais e subsídios do IVDP, sendo certo que, esta decisão abarca todas as anteriores, sem contraditório das requeridas.</font></i><br>
</p><p><i><font>IX. Sobre os bens móveis que não sejam veículos, deveria ser levantado o arresto. Inclusive, sobre as participações sociais, quotas e subsídios do IVDP.</font></i><br>
</p><p><i><font>X. Como resulta do artigo 205.° do CC, são móveis todas as coisas não compreendidas no “artigo anterior”. Ou seja, todos os bens que não sejam incluídos no artigo 204.°, são bens móveis, inclusive os direitos sobre coisas.</font></i><br>
</p><p><i><font>XI. É o caso das participações sociais, e do subsídio do IVDP, que se enquadram na definição de coisa, artigo 202.° do CC, pese embora não sejam corpóreas. Tanto mais que, sobre estes dois “direitos” podem recair direitos reais, veja-se o caso do presente arresto.</font></i><br>
</p><p><i><font>XII. Estes dois direitos não deixam de ser coisas, mesmo que mediatamente corpóreas, sendo que, pelo artigo 205.°, enquadram-se na definição de coisas móveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIII. Consideraram as Requeridas, recorrendo para o douto Tribunal da Relação que a decisão proferida no despacho acima transcrito entrou em contradição com a decisão do dia 8 de fevereiro, pois, deveria o douto Tribunal ter decidido pelo levantamento do arresto sobre as participações sociais e o benefício do IVDP. </font></i><br>
</p><p><i><font>XIV. O acórdão que apreciou esta questão, decidiu que: “... diremos que, para efeitos de penhora ou arresto, as referidas participações sociais e o subsídio do IVDP são direitos. Não são bens móveis. Como tal, toda a argumentação desenvolvida pelas recorrentes cai pela base, com fragor. E assiste total razão à recorrida, nas suas contra- alegações. A improcedência do recurso é total.”</font></i><br>
</p><p><i><font>XV. Decidiu pela congruência da decisão que ali se recorria, considerando as participações sociais e o subsídio do IVDP como direitos e não como bens móveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVI. Certo é que, as participações sociais e o subsídio do IVDP, vistas como um conjunto de direitos e vinculações resultantes do contrato de sociedade, pertencem ao núcleo dos bens móveis, sendo que, mal se compreenderia que ficassem subordinadas a regime diverso do que a lei traça, em geral, para o género a que pertencem. É o que decorre da análise conjugada do disposto nos artigos 204.° e 205.° do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVII. A sentença proferida em junho de 2020, que decretou o arresto, sem audição prévia das requeridas, ordenou tão só, o arresto sobre as participações sociais detidas por AA, BB e CC, nas sociedades requeridas.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVIII. A requerente não contente com a decisão recorreu para o douto Tribunal da Relação. Sendo que, foi proferida decisão, uma vez mais sem audição prévia das requeridas, em julho de 2020, onde consta o seguinte: «Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida, quanto à sua alínea b) e ordenando-se o arresto (para além do já decidido na alínea a) “participações sociais”) dos bens imóveis identificados no artigo 126.° do requerimento iniciai, bem como dos bens móveis das requeridas e do “benefício” pago pelo IVDP às sociedades requeridas».</font></i><br>
</p><p><i><font>XIX. As requeridas opuseram-se ao decretado pelo Tribunal da Relação de Guimarães, depois de citadas e notificadas dessa decisão, pese embora nem todas tenham sido citadas, em novembro de 2020, sendo que, a decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021 escrutinou as decisões anteriores, bem como, analisou os argumentos das requeridas. É a decisão definitiva, assim que transitar em julgado.</font></i><br>
</p><p><i><font>XX. Decidiu manter “a providência de arresto decretada, com exceção dos bens móveis das Requeridas, que não sejam veículos, cujo levantamento se ordena.”, não discriminou bens móveis que se mantivessem arrestados.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXI. Sobre todos os bens móveis, inclusive sobre os direitos arrestados, foi ordenado levantamento do arresto, como decorre da análise conjugada do disposto nos artigos 204.° e 205.° do Código Civil, tanto mais que o argumento de que não existe, “nem um direito real menor que possa acarretar a posse efectiva e exclusiva da coisa (corpórea) móvel ou imóvel” cai por terra, porquanto o subsídio e as participações sociais terem sido arrestadas e estarem na posse das requeridas há mais de 10 anos.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXII. Suscitada esta contradição entre a decisões, referiu o Acórdão que: “Ponto 1. Foi decretado o Arresto sobre as participações sociais; Ponto 2. Foi decretado o Arresto dos bens imóveis identificados no artigo 126° do requerimento inicial, bem como dos bens móveis (apenas veículos) das requeridas e do “benefício” pago pelo IVDP às sociedades requeridas.”</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIII. O Tribunal recorrido conheceu de questões que não poderia conhecer, isto quando, referiu que foi decretado o arresto sobre o “benefício” e as participações sociais, mesmo que, a decisão do dia 8 de fevereiro fosse cristalina e não o tivesse determinado, a decisão é a definitiva, ficando esgotado o poder jurisdicional do Juiz, nos termos do artigo 613.° do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIV. Esta decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021, do incidente de oposição é complemento e parte integrante das inicialmente proferidas (a que decretou o arresto, em maio de 2020, proferida pelo Tribunal a quo e a que o manteve, do Tribunal da Relação, de julho de 2020), devendo aquelas subsumir-se nesta, anulando-as.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXV. Assim, este excesso de pronuncia, quanto ao “benefício” e as participações sociais é nulo, pela interpretação extensiva do artigo 615.° do CPC. Sendo certo que, a reclamação do douto Acórdão incidiu, em parte, sobre esta questão.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVI. O Acórdão que ora se recorre, quanto a esta questão não se pronunciou, referindo que: “Não iremos aqui repetir o que dissemos no Acórdão. Registamos apenas a coragem das recorrentes em vir insistir numa questão que elas próprias deram causa, enviando uma carta enganadora ao Agente de Execução, forçando assim este a pedir a intervenção do Juiz do processo, e depois recorrendo da intervenção deste.” </font></i><br>
</p><p><i><font>XXVII. Um dos fundamentos do presente recurso prende-se com a contradição entre as decisões proferidas no dia 8 de fevereiro de 2021 e no douto Acórdão que se reclamou, sendo certo que, continuou o douto Tribunal da Relação a não se pronunciar quanto a esta contradição, mesmo depois de chamado a intervir.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVIII. Deve o Tribunal Superior julgar improcedente o douto acórdão quanto a esta questão, julgando para o efeito, haver contradição entre a decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021 e a decisão proferida no Acórdão que se reclamou.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIX. Quanto à questão que refere o Tribunal recorrido de que: “temos dificuldade em entender qual, no entender das requerentes, foi a questão que esta Relação deixou de conhecer”, sempre se dirá que, as recorridas se referem à falta de citação de 12 dos 19 intervenientes no arresto.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXX. O Tribunal recorrido não se pronunciou sobre essa questão. Ao invés, responde à questão suscitada com interrogações. «Será que porventura as requerentes se referem à sua conclusão de recurso n.° XV, sobre uma alegada falta de citação das “requeridas aditadas”? E se for isso, será que as requerentes se esqueceram do que se refere no ponto 2 do Acórdão reclamado, sobre o recurso interposto pela requerente da providência para esta Relação de Guimarães, no qual a questão que foi colocada se traduzia em saber se o tribunal deveria ter recorrido à figura da desconsideração da personalidade jurídica e ordenado o arresto dos imóveis identificados no requerimento inicial e dos demais bens detidos pelas sociedades requeridas, bem como da decisão sumária desta Relação de 15/07/2020, que julgou procedente a apelação? Ou será que se lembram dessa decisão da Relação mas optaram por ignorar a mesma?»</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXI. Deveria o douto Tribunal ter apreciado a questão que lhe foi dada ao conhecimento e na qual se pediu a sua intervenção. Tal omissão, mais uma vez, é geradora de nulidade do processado, artigo 615.° do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXII. Por outro lado, aquando do Acórdão proferido no dia 15.07.2020, as requeridas ainda não tinham sido citadas do arresto, nem sabiam da sua existência. O arresto foi requerido sem audição prévia das requeridas. Quando tiveram oportunidade de apresentar defesa, não o deixaram de fazer. Não só do decidido no douto Acórdão proferido no dia 15.07.2020 e, mencionado pela decisão que se recorre. Bem como, da decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIII. As requeridas, com argumentos de direito, levantaram incidente de Inutilidade Superveniente da Lide (insolvência dos devedores, obsta à propositura de acções declarativas com vista ao ressarcimento do alegado crédito), bem como, arguiram excepções dilatórias e peremptórias, nomeadamente, a Ilegitimidade activa da Requerente (não tem interesse em agir, apenas o Administrador de insolvência), a Inutilidade Superveniente da Lide, a Caducidade da Acção (extemporânea, crédito advém da massa insolvente da Romarigo Lda.), a Prescrição dos Créditos Reclamados (entre o incumprimento dos mútuos, 2003, e a resolução em 2015), a Falta de Interpelação do Devedor (os fiadores não foram interpelados para o pagamento, bem como, as requeridas), a não renúncia ao benefício de Lxcussão Prévia (a massa insolvente da devedora original, Romarigo Lda., é composta por dezenas de imóveis, não tendo sido excutidos todos os bens, nem renunciado ao benefício de excussão os fiadores), a Posse/Usucapião (posse de bens móveis superior a 10 anos, bem como de bens imóveis), a Simulação (não basta a simulação absoluta, sendo certo que só foram invocados factos atinentes à simulação relativa) e a Prova Ilegal (anterior advogado das requeridas, por mais de 20 anos, até 2020, testemunhou relativamente a factos que diziam respeito às requeridas, que conhecia e que estão abrangidas pelo sigilo profissional).</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIV. Ainda com factos concretos: a desconsideração da personalidade coletiva alegada pela requerente está enferma de pressupostos legais e teleológicos que a permitam decretar; as requeridas, sociedade comerciais, nada devem à Requerente ou deveram à CGD; o valor dos bens arrestados é substancialmente superior ao valor do crédito reclamado. Sendo também certo que, a Requerente já reclamou e viu serem graduados os seus créditos nos processos de insolvência da Romarigo Lda., como ainda dos 8o, 9o e 10° intervenientes do arresto, pese embora não tenham sido citados; e a “garantia” é muito superior ao valor do crédito. As requeridas não ignoraram qualquer decisão proferida até aos dias de hoje pelos doutos Tribunais.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXV. Certo é que, as citadas no arresto, 7 sociedades requeridas, não correspondem às 17 demandadas na acção dita principal, talvez por isso, não esteja apensada aquela a esta acção. Não existe a necessária identidade de partes como se exige no âmbito das providências cautelares, determinante para se dizer que existe entre o procedimento e a acção que a suporta uma relação de dependência e instrumentalidade, artigo 364.° e 373.° do CPC. Aliada à extemporaneidade da propositura da acção “principal”, pode-se dizer que o arresto está caduco, artigo 373.°, n.° 1. al a) do CPC. </font></i><br>
</p><p><i><font> XXXVI. Mais do que a “não concordância com o decidido no Acórdão de 29.04.2021”, não aceitam as requeridas que o douto Tribunal da Relação de Guimarães se deixasse de pronunciar sobre uma questão que já lhe tinha sido suscitada (esgotamento do poder jurisdicional do Juiz e da contradição de decisões) e não se pronunciasse sobre outra questão que lhe tinha sido sustida (falta de citação de 12 intervenientes), causas de nulidade do Acórdão proferido, nos termos dos artigos 608.°, 609.°, 613.° e 615.° do CPC. Violou a douta decisão recorrida as disposições legais previstas nos artigos 201.°. 204.°. 205.° do Código Civil e os artigos 608.° n.° 2, 609.° do n.° 1, 613.° n.° 1 e 615.° do n.° 1 as alíneas cl e d) do Código Processo Civil. Como ainda, o douto Acórdão violou o artigo 620.° do n.° 1 do Código Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXVII. O Tribunal recorrido decidiu “condenar as recorrentes, como litigantes de má-fé, na multa de 10 UC”</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXVIII. Se é certo que a decisão foi dirigida ao Agente de Execução, certo é que, tal decisão vincula as partes, sendo também certo que, tal decisão proferida entrava em contradição com a decisão final sobre o arresto, que ajustou as decisões anteriormente proferidas.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIX. O interesse jurídico em contestar “esta decisão” prendia-se com o facto dela, estar em contradição sobre os bens a arrestar, nomeadamente, com a decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021, sendo que, os bens arrestados eram das requeridas. O interesse jurídico está inerente ao conteúdo e alcance desta decisão. </font></i><br>
</p><p><i><font>XL. A ordem emanada com esse despacho, entrou em contradição com a sentença proferida no dia 8 de fevereiro de 2021, porquanto considerarem as requeridas que esta decisão ordenava o levantamento do arresto de todos os bens móveis que não veículos automóveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLI. A decisão influía nos bens arrestados das requeridas, sendo que, consideram estas que ordem ou diretiva emitida pelo douto Tribunal não corresponde ao determinado em sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIL Ademais, a única decisão que induziu o Agente de Execução em erro, foi a decisão proferida que lhe foi dirigida, pois, certo é que, a decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021 não deixou de ser cristalina. E os direitos não deixam de ser bens só pelo simples facto de estarem previstos na penhora. O que se pediu ao Sr. Agente de Execução, resulta da decisão de fevereiro de 2021, tanto mais que, tal decisão, mesmo recorrida, não suspende os seus efeitos.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIII. As participações sociais e o subsídio do IVDP são bens móveis, sendo que, incompreensível é a decisão de considerar que, os direitos, por serem direitos, não são bens. Isto, porque não deixam de ser direitos sobre coisas imóveis e móveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIV. “A referida confusão, ou erro crasso”, de considerar as participações sociais e o subsídio do IVDP como bens móveis adveio do facto da Jurisprudência considerar tais direitos como bens, nomeadamente, pelos artigos 204.° e 205.° do CC, bens móveis. O “erro crasso” abrange todas as decisões que se pronunciaram no sentido das requeridas e, que, compõe a maioria das decisões superiores. </font></i><br>
</p><p><i><font> XLV. O objectivo que se pretendia atingir as Requeridas com “a referida carta” é cristalino: era o levantamento do arresto das participações sociais, das Ia a 5a requerida as acções das 6a e 7a as quotas; do benefício entregue às requeridas”, quando sobre esses direitos tinha acabado de ser ordenado o seu levantamento, por não constar dos bens móveis que se mantivessem arrestados. E não como refere o douto Acórdão: “quando o arresto desses direitos tinha acabo de ser decretado pelo Tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVI. A “alteração da verdade dos factos” como refere o Tribunal recorrido, não ocorreu. O recurso apresentado pelas requeridas prendeu-se meramente com uma questão de interpretação da decisão proferida no dia 8 de fevereiro de 2021. Sendo certo que, consideram as requeridas que aquela decisão proferida ia no sentido de ordenar o levantamento do arresto sobre todos os bens móveis que não veículos automóveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVII. Não existiu qualquer objectivo dilatório, tanto mais que, se encontram em análise diversos recursos intentados pelas requeridas, à parte do que se discute nos presentes autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVIII. Por outro lado, como refere o Acórdão do TRL, processo 329/14.0TBFUN-B.L1-6 - “A condenação da parte por litigância de má fé não se basta com a dedução de pretensão ou oposição arredada de qualquer fundamento, exigindo-se que tenha a mesma actuado com dolo ou com negligência grave, ou seja, sabendo de antemão da falta de fundamento da sua pretensão ou oposição, ou encontrando- se em situação/posição que lhe permitia saber sem dificuldade que a pretensão deduzida estava votada ao fracasso.</font></i><br>
</p><p><i><font> XLIX. Nunca as requeridas, actuaram, sabendo de antemão da falta de fundamento da sua pretensão. Ao invés, consideram, ainda hoje que, a sua pretensão, face ao decidido em sentença no dia 8 de fevereiro de 2021 é fundamento para a pretensão deduzida.</font></i><br>
</p><p><i><font>L. Mesmo que se considere que não existe fundamento para a pretensão das requeridas, o que se faz por mero dever de cautela, sempre se dirá que, agiram sem qualquer tipo de dolo ou negligência grave.</font></i><br>
</p><p><i><font>LI. Após as considerações tecidas, resta descer agora ao facto adjectivo que se mostra subjacente à decisão apelada, aferindo que não se justifica ela integrar a litigância de má-fé. Entendem as requeridas que a sua actuação estava sustentada em fundamentos de facto e de direito, sendo certo que, não agiram dolosamente ou negligentemente de modo a fazer um uso reprovável do processo.</font></i><br>
</p><p><i><font>LII. Deve a douta decisão ser revogada quanto à condenação das requeridas como litigante de má-fé, devendo o Supremo Tribunal de Justiça absolver as mesmas de tal condenação. </font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE,</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve o presente recurso ser recebido, admitido por provado e, em consequência serem julgadas procedentes as nulidades arguidas pelas requeridas/recorrentes, bem como, devem ser absolvidas as mesmas da condenação em litigantes de má-fé”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Não houve contra-alegações.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><b><font>Da (in)admissibilidade do recurso de revista</font></b><font>:</font><br>
</p><p><font>Relativamente ao acórdão da Relação de 19-04-2021 é claro que o recurso ora interposto é manifestamente extemporâneo.</font><br>
</p><p><font>Assim, o acórdão recorrido só pode ser aquele que decidiu as nulidades arguidas.</font><br>
</p><p><font>No acórdão recorrido foi decidido: “</font><i><font>Por todo o exposto, este Tribunal da Relação de Guimarães indefere à arguição de nulidades do Acórdão, e decide condenar as recorrentes, como litigantes de má-fé, na multa de 10 UC, absolvendo-as do pedido de condenação em indemnização a favor da recorrida</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E o recurso de revista interposto incide sobre estas duas vertentes:</font><br>
</p><p><font>- Indeferimento da arguição de nulidades do acórdão;</font><br>
</p><p><font>- Condenação como litigantes de má-fé.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>- </font><b><font>Quanto à decisão das nulidades arguidas</font></b><font>:</font><br>
<p><font>Está em causa decisão proferida em processo de procedimento cautelar (arresto), sendo regulado o seu processualismo nos termos dos arts. 362 e seguintes do CPC.</font><br>
</p><p><font>E, sobre esta matéria refere textualmente o nº 2 do art. 370 do referido CPC que “Das decisões proferidas nos procedimentos cautelares, …, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível”.</font><br>
</p><p><font>Certamente por tal motivo, as ora recorrentes, e relativamente ao </font><a></a><font>acórdão da Relação de 19-04-2021, arguiram as nulidades, não em recurso, perante o tribunal que proferiu a decisão, como estipula o nº 4 do art. 615º, do CPC.</font><br>
</p><p><font>Decidida a arguição das nulidades, a descontento das reclamantes, vêm as mesmas interpor recurso de revista.</font><br>
</p><p><font>Porém, esquecem-se do estatuído no nº 6 do art. 617º do CPC, que determina que a decisão é definitiva sobre a questão suscitada, ou seja, não cabe recurso da decisão proferida sobre requerimento de arguição de nulidades.</font><br>
</p><p><font>Não há lugar a recurso de revista do acórdão da Relação que decidiu as nulidades arguidas.</font><br>
</p><p><font>Não sendo admissível recurso de revista normal, também não o pode ser por via da revista excecional, porque esta pressupõe os requisitos da revista normal e, apenas a dupla conforme é impeditiva da admissão do recurso.</font><br>
</p><p><font>Conforme Ac. do STJ de 08-07-2020, no proc. nº 1093/14.9TASTR.E1.S1, </font><i><font>“I - Sendo o acórdão proferido susceptível de recurso ordinário, ter-se-á sempre que suscitar as nulidades da decisão de que o mesmo padeça (mormente nulidade por omissão de pronúncia) em sede de alegações de recurso, como fundamento do recurso, juntamente com os demais fundamentos do mesmo recurso, de acordo com o disposto no art. 379.º, n.º 1, al. c), e n.º 2, do CPP, e igualmente nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d) e n.º 4, do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>II - Sempre que um acórdão não admite recurso ordinário, a reclamação do mesmo e/ou a arguição de nulidades faz-se em requerimento autónomo para o tribunal que o proferiu, conforme arts. 615.º, n.º 4 (1.ª parte) e 617.º, n.º 6, ambos do CPC, aplicáveis por força do disposto no art. 4.º, do CPP, sendo que o acórdão que decide da reclamação apresentada e/ou das nulidades suscitadas, indeferindo-as, é uma decisão definitiva. Ou seja, não é susceptível de recurso ordinário, conforme resulta do citado art. 617.º, n.º 6, do CPC”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Também, o acórdão que decide as nulidades arguidas não é decisão que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, e só estes, admitem recurso de revista normal, como dispõe o nº 1 do art. 671º do CPC.</font><br>
</p><p><font>O acórdão decisório do Tribunal da Relação foi o proferido em 29-04-2021 e não o proferido em 15-06-2021, recorrido e que, indeferiu o requerimento de arguição de nulidades e condenou as recorrentes como litigantes de má-fé.</font><br>
</p><p><font>Conforme Ac. deste STJ de 11-11-2020, no Proc. nº 6854/18.7T8PRT-F.P1.S1, </font><i><font>“I. A lei adjetiva não permite a cisão temporal entre o requerimento de arguição de nulidades da decisão e o requerimento de interposição de recurso; quando este seja admissível, a arguição de eventuais nulidades da decisão deve ser inserida nas alegações do recurso, nos termos do art. 615º, nº 4, do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. O prazo para interposição de recursos ordinários conta-se desde a data da notificação da decisão recorrida, sendo extemporâneo o requerimento de interposição de recurso apresentado para além do prazo previsto no art. 638º, nº 1, do CPC, depois de ter sido apreciado um incidente de arguição de nulidades”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>E se for arguida alguma nulidade perante o juiz que proferiu a sentença (acórdão), a decisão que vier a ser proferida é definitiva, conforme preceitua o nº 6 do art. 617º do CPC, já referido.</font><br>
</p><p><font>Assim, e face a todo o exposto, temos não ser admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, neste segmento respeitante à decisão sobre as nulidades arguidas, apesar de ter sido recebido na Relação, conforme art. 641 nº 5 do CPC.</font><br>
</p><p><font>Também não se trata de situação em que o recurso seja sempre admissível:</font><br>
</p><p><font>Embora as recorrentes invoquem a violação do caso julgado – art. 629º, nº 2 al. a), do CPC, verifica-se que um acórdão que indefere a arguição de nulidades, decide questão nova e não pode ser ofensivo de caso já julgado. Nem as recorrentes justificam, dado que vão reportar-se ao acórdão original, em relação ao qual, atenta a data da notificação desse acórdão e a data da interposição deste recurso, este é manifestamente extemporâneo e recorrido é o acórdão que decidiu as nulidades que haviam arguido.</font><br>
</p><p><font>Invocam também, as recorrentes, situação em que o recurso seja sempre admissível– art. 629º, nº 2 al. c), do CPC.</font><br>
</p><p><font>Porém, as recorrentes não indicam qual a jurisprudência uniformizadora do STJ violada pelo acórdão recorrido (que é o acórdão que decidiu as nulidades arguidas).</font><br>
</p><p><font>Não se encontrando preenchidos os requisitos do recurso de revista normal não pode haver lugar à revista excecional, porque esta pressupõe a verificação daqueles requisitos e, ainda, a verificação de dupla conforme.</font><br>
</p><p><font>Sendo certo que nos parece resultar das alegações que a referência a revista “excecional” se refere aos casos de recurso “sempre admissível” do nº 2, do art. 629º, que invocam e não revista excecional prevista no art. 672º do CPC, dado que não alegam os fundamentos desta, nem requerem a remessa dos autos à Formação.</font><br>
</p><p><font>Assim, que não se remetem os autos à Formação a que alude o nº 3 do art. 672º do CPC, nem se toma conhecimento do objeto do recurso, neste segmento.</font><br>
</p><div><br>
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KzFYu4YBgYBz1XKvi_gs | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font>
</p><p><b><font>Congregação...</font></b><font> intentou ação declarativa de condenação contra </font><b><font>Banco BIC Português, SA</font></b><font>, que corre termos Tribunal Judicial da Comarca ... (Juízo Central Cível ... – Juiz ...) alegando, essencialmente, o seguinte: </font>
</p><p><font>- Em 13 de Abril de 2006, apôs a sua assinatura no boletim de subscrição de uma obrigação subordinada, no valor de € 50.000,00, a 10 anos, que foi sugerida pelos funcionários da agência do BPN de ..., com os quais mantinha uma relação de grande confiança; </font>
</p><p><font>- Não investe em produtos de risco e pretendia aplicar os seus fundos com segurança e rentabilidade, o que era conhecido dos funcionários do réu; </font>
</p><p><font>- Investiu na obrigação porque os funcionários do réu lhe indicaram não existir risco nenhum, risco esse que seria assumido pelo banco;</font>
</p><p><font>- Caso tivesse sido informada que estava a adquirir dívida da SLN e que seria esta entidade e não o banco que assumiria o risco e que não podia mobilizar antecipadamente o capital, não teria subscrito a obrigação;</font>
</p><p><font>- A Superiora Provincial (Prioresa) deslocou-se ao balcão do réu de ... para requerer o pagamento do valor do título, tendo sido informada que o valor não seria restituído;</font>
</p><p><font>- À data da subscrição, a autora não possuía conhecimentos financeiros que lhe permitissem aperceber-se das características da aplicação, fazendo-o apenas por sugestão dos funcionários do réu.</font>
</p><p><font>Concluindo, pede que o réu seja condenado a pagar-lhes a quantia de € 50.000,00, de capital e € 863,00 de juros vencidos, acrescida de juros vincendos.</font>
</p><p><font>Citado, o réu veio contestar a ação declinando responsabilidade, excecionando a prescrição da responsabilidade do intermediário financeiro e impugnando parcialmente os factos, salientando designadamente, que à data da subscrição, o produto vendido era seguro, e que a autora foi suficientemente elucidada acerca do produto financeiro subscrito.</font>
</p><p><font>A autora respondeu à exceção salientando não estar prescrito o seu direito, por ter ocorrido a violação do dever de informação por parte do réu.</font>
</p><p><font>Realizada audiência final veio a ser proferida sentença pela qual se decidiu:</font>
</p><p><font>“</font><i><font>Nestes termos, julgo a ação procedente, por provada, e condeno o R. Banco BIC Português, S.A., a pagar à A. a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde 05.09.2019, até integral pagamento</font></i><font>.”</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Inconformado com a sentença veio o réu dela interpor recurso de apelação sendo, após deliberação, decidido:</font>
<p><i><font>“Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>Custas de parte pelo apelante (cfr. disposições combinadas dos artºs 663º n.º 2, 607º n.º 6, 527º n.º 1 e 2, 529º n.º 4 e 533º n.º 1 e 2 do CPC</font></i><font>)”.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Novamente inconformado com o decidido pela Relação, </font><b><font>interpõe recurso de Revista para este STJ o réu Banco BIC Português, S.A</font></b><font>., e formula as seguintes conclusões:</font>
<p><i><font>“1. O douto acórdão da Relação de Évora violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da DirecHva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.</font></i>
</p><p><i><font>2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido pelo banco, similar a um depósito a prazo, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, configura a prestação de uma informação falsa.</font></i>
</p><p><i><font>3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.</font></i>
</p><p><i><font>4. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado ao Autor, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verificado incumprimento do reembolso…</font></i>
</p><p><i><font>5. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.</font></i>
</p><p><i><font>6. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento!</font></i>
</p><p><i><font>7. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos!</font></i>
</p><p><i><font>8. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica no momento da subscrição!</font></i>
</p><p><i><font>9. A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.</font></i>
</p><p><i><font>10. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.</font></i>
</p><p><i><font>11. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco!</font></i>
</p><p><i><font>12. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.</font></i>
</p><p><i><font>13. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente!</font></i>
</p><p><i><font>14. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.</font></i>
</p><p><i><font>15. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.</font></i>
</p><p><i><font>16. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação…</font></i>
</p><p><i><font>17. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!</font></i>
</p><p><i><font>18. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.</font></i>
</p><p><i><font>19. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!</font></i>
</p><p><i><font>20. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo sua obrigaçção assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação.</font></i>
</p><p><i><font>21. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.</font></i>
</p><p><i><font>22. A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.</font></i>
</p><p><i><font>23. Acresce que a expressão garantido pelo Banco era também ela consentânea com a realidade na altura da subscrição!</font></i>
</p><p><i><font>24. Efectivamente o banco era parte integrante do património da emitente das obrigações e como tal garante do cumprimento das suas obrigações.</font></i>
</p><p><i><font>25. Também por isso não faz qualquer sentido afirmar, ou querer retirar dessa afirmação, uma garantia de cumprimento no sentido de uma fiança pelo facto da mesma ser em absoluto redundante. O banco como elemento do património da eminente já era, com todo o seu património, garantia geral do cumprimento das obrigações daquela.</font></i>
</p><p><i><font>26. O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exactas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais fiáveis possível pelo banco.</font></i>
</p><p><i><font>27. O grau de exactidão em relação às informações será variável, consoante o tipo de informação em causa.</font></i>
</p><p><i><font>28. No caso dos presentes autos, ficou demonstrado, e foi assumido pelo Autor, que era do seu interesse e vontade investir em produtos de com boa rentabilidade e de elevada segurança.</font></i>
</p><p><i><font>29. Apesar do autor não ser investidor com especiais conhecimentos técnicos na área financeira o risco do produto em causa nos presentes autos era, pelas razões já várias vezes repetidas, baixo uma vez que nada fazia antever qualquer dificuldade futura do emitente.</font></i>
</p><p><i><font>30. Assim, não pode o Banco Recorrente senão concluir que foram salvaguardados os legítimos interesses do cliente.</font></i>
</p><p><i><font>31. Resultou demonstrado que os funcionários, mais concretamente o funcionário que o colocou, sempre acreditaram - até praticamente ao momento do incumprimento - que se tratava de produto seguro e se preocupavam com os interesses dos clientes.</font></i>
</p><p><i><font>32. Dispunha sobre esta matéria o artigo 304° do CVM no sentido de que os intermediários financeiros estão obrigados a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, devendo conformar a sua actividade aos ditames da boa-fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.</font></i>
</p><p><i><font>33. E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312° n° 1 alínea a) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os "riscos especiais envolvidos nas operações a realizar".</font></i>
</p><p><i><font>34. Tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução.</font></i>
</p><p><i><font>35.Tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si!</font></i>
</p><p><i><font>36. A informação quanto ao risco dos instrumentos financeiros propriamente dito apenas veio a ser exigida prestar aos intermediários financeiros com o D.L. 357-A/2007 de 31/10, que aditou o art. 312°-E n° 1, passando a obrigar o intermediário financeiro a informar o cliente sobre os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa.</font></i>
</p><p><i><font>37. O legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do tipo do instrumento financeiro em causa nas quatro alíneas do n° 2 do art. 312°-E.</font></i>
</p><p><i><font>38. São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação, mesmo na actual redacção do CdVM.</font></i>
</p><p><i><font>39. A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento.</font></i>
</p><p><i><font>40. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.</font></i>
</p><p><i><font>41. O investimento em causa foi feito em Obrigações não estando sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de "capital garantido"), acrescido da respectiva rentabilidade.</font></i>
</p><p><i><font>42. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso, pois que nunca resultaria do mecanismo interno do instrumento em causa!</font></i>
</p><p><i><font>43. A informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito se, e só se, tais riscos de facto existirem!</font></i>
</p><p><i><font>44. E m lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na actividade de intermediação financeira de recepção e transmissão de ordens.</font></i>
</p><p><i><font>45. E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo!</font></i>
</p><p><i><font>46. Esse hipotético incumprimento tem que ver com as qualidades ou circunstâncias do emitente (ou obrigado) do instrumento financeiro e não com o tipo do instrumento financeiro, conforme referido no art. 312°-E n° 1 do CdVM, que é expressão que aponta claramente para uma objectivização do risco em função do próprio instrumento de investimento e não para uma subjectivação em função do emitente!</font></i>
</p><p><i><font>47. O artigo 312º, alínea e) do CdVM refere-se apenas aos riscos da actividade dos serviços de intermediação financeira. Os deveres de transparência, lealdade e defesa dos interesses do investidor que sobre o intermediário financeiro impendem, obrigam apenas à informação sobre os riscos endógenos ao mecanismo de funcionamento do concreto instrumento financeiro, não abrangendo o risco geral de incumprimento das obrigações. Neste sentido não estava o intermediário financeiro obrigado a informar especificamente sobre o risco de insolvência da entidade emitente de determinado produto. </font></i>
</p><p><i><font>48. Do elenco de factos provados não resultam factos provados suficientes que permitam estabelecer uma ligação entre a qualidade (ou falta dela) da informação fornecida ao Autor e o acto de subscrição.</font></i>
</p><p><i><font>49. A nossa lei consagra essa perfeita autonomia de cada um dos pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, apresentando-os e regulando-os de forma perfeitamente estanque.</font></i>
</p><p><i><font>50. No que toca à causalidade não conseguimos sequer vislumbrar como passar da presunção de culpa – juízo de censura ético-jurídico sobre o agente do ilícito, e expressamente prevista na lei – à causalidade – nexo factual de associação de causa-efeito, como se de uma inevitabilidade se tratasse!</font></i>
</p><p><i><font>51. Do texto do art. 799º nº 1 do C.C. não resulta qualquer presunção de causalidade.</font></i>
</p><p><i><font>52. E, de resto, nos termos do disposto no artº 344º do Código Civil, a inversão de ónus depende de presunção, ou outra previsão, expressa da lei!</font></i>
</p><p><i><font>53. Se em abstracto, e de jure condendo até se pode, porventura e em tese, perceber esta interpretação para uma obrigação principal de um contrato – tendo por critério o interesse contratual positivo do credor -, não se justifica já quando estão em causa prestações acessórias do mesmo contrato.</font></i>
</p><p><i><font>54. Analisado o fim principal pretendido pelo contrato aqui em apreço – contrato de execução da actividade de intermediação financeira, de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem -, parece-nos evidente que o mesmo se circunscreve à recepção e retransmissão de ordens de clientes – no caso o Autor é este o único conteúdo cpico e essencial do contrato e que é, portanto, susceptível de o caracterizar.</font></i>
</p><p><i><font>55. Não é por um dever de prestar ser mais ou menos relevante para qualquer parte, ou até para o comércio jurídico em geral, que será quantificável como prestação principal ou prestação acessória de um contrato. Releva outrossim se o papel de uma tal prestação na economia do contrato se revela como o núcleo típico ou não do acordo contratual entre as partes.</font></i>
</p><p><i><font>56. A única prestação principal neste contrato será a de recepção e transmissão de ordens do cliente.</font></i>
</p><p><i><font>57. Sendo uma obrigação acessória, a prestação de informação não estaria nunca ao abrigo da proclamada presunção de causalidade.</font></i>
</p><p><i><font>58. Estamos perante uma situação em que e configuram dois contratos distintos e autónomos entre si: por um lado, (i) um contrato de execução de intermediação financeira, e por outro, (ii) a contratação de um empréstimo obrigacionista do cliente a entidade terceira ao primeiro contrato!</font></i>
</p><p><i><font>59. Neste caso, estaremos perante uma falta de resultado no âmbito da emissão obrigacionista e não do contrato de execução de intermediação financeira.</font></i>
</p><p><i><font>60. O contrato de intermediação financeira foi já cumprido no acto de subscrição, tendo-se esgotado nesse momento.</font></i>
</p><p><i><font>61. É esta uma óbvia dificuldade: como pode a falta do resultado normativamente prefigurado de um contrato desencadear uma presunção de ilicitude, culpa e causalidade no âmbito de um outro contrato?</font></i>
</p><p><i><font>62. O juízo de verificação de causalidade mecânica, aritmética ou hipotética tem inevitavelmente de se fundar em factos concretos que permitam avaliar da referida probabilidade, e não apenas em juízos abstratos ou meras impressões do julgador!</font></i>
</p><p><i><font>63. A causalidade resume-se a uma avaliação de um dano hipotético apenas em casos em que esse dano não seja efectivo, como é o caso do citado dano da perda da chance! Em todos os restantes casos, o juízo deverá ser feito, não numa perspectiva probabilidade, mas sim de adequação entre uma causa e um efeito.</font></i>
</p><p><i><font>64. No âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem!</font></i>
</p><p><i><font>65. O nexo causal sujeito a prova será necessariamente entre um concreto ilícito – uma concreta omissão ou falta de explicação de uma determinada informação - e um concreto dano (que não hipotético)!</font></i>
</p><p><i><font>66. Não basta afirmar-se genericamente que eles não foram informados do risco de insolvência ou da falta de liquidez das obrigações, ou de qualquer característica do produto, e que é essa causa do seu dano!</font></i>
</p><p><i><font>67. Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou.</font></i>
</p><p><i><font>68. Num segundo momento é necessário provar que aquele concreto negócio produziu um dano.</font></i>
</p><p><i><font>69. E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objectiva ao tempo da lesão.</font></i>
</p><p><i><font>70. E nada disto foi feito!</font></i>
</p><p><i><font>71. Dizer simplesmente que não subscreveriam se soubessem que o capital não era garantido é manifestamente insuficiente pelas razões já acima explanadas relativamente à compreensão desta expressão.</font></i>
</p><p><i><font>72. Aceitar esta alegação seria o mesmo que dizer que este Autor, que se define como cliente de depósito a prazo, nunca o subscreveria se soubesse que os mesmos não eram garantidos a 100%.</font></i>
</p><p><i><font>73. Dir-se-ia, a ser assim, que o nexo só se verificaria se resultasse provado que, se soubessem de todas as características dos produtos em causa, o Autor teria guardado os seus valores em casa, debaixo do colchão!!!</font></i>
</p><p><i><font>74. A origem do dano do Autor reside na incapacidade da SLN em solver as suas obrigações, circunstância a que o Banco é alheio!</font></i>
</p><p><i><font>Termos em que se conclui pela admissão do presente recurso, e sua procedência, e, por via dele, pela revogação da douta decisão recorrida e sua substituição por outra que absolva o Banco-R. do pedido”</font></i><font>.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>O recurso foi admitido como revista excecional.</font>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<u><font>Nas Instâncias foram julgados como provados e não provados, os seguintes factos</font></u><font>:</font>
<p><i><font>“1 - No dia 13 de Abril de 2006, a Autora apôs a sua assinatura num documento denominado "SLN 2006 - Boletim de Subscrição", datado de 13 de Abril de 2006, contendo no canto superior esquerdo o logotipo do BPN e constando, designadamente, o seguinte: "Emissão de obrigações subordinadas. Natureza da emissão: Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma (…)», (artº 1º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>2 - O Prazo e reembolso das obrigações "SLN 2006”, identificado no documento refere «(…) O prazo da emissão é de 10 anos, sendo o reembolso do capital efectuado em 09 de Maio de 2016.</font></i>
</p><p><i><font>O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da "SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA", a partir do 5º ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.</font></i>
</p><p><i><font>Remuneração: (cupões) 1º Semestre; 9 cupões seguintes; restantes semestres; (taxa anual nominal bruta) 4,5%; Euribor 6 meses + 1,15%; Euribor 6 meses + 1,50% (…).» (artº 2º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>3 - A Autora, a 13 de Abril de 2006, já era titular, junto do "BPN - Banco Português de Negócios, S.A.", da conta de depósitos à ordem com o número ...01, (artº 3º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>4 - A aqui Autora subscreveu uma obrigação, no montante total de € 50.000,00. (artº 4º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>5- Tendo na conta de depósitos à ordem da aqui Autora, com o número ...01, sido debitada da importância de € 50.000,00, no dia 8 de Maio de 2006. (artº 5º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>6- As aplicações nas obrigações “SLN 2006”, foram sugeridas pelos funcionários da agência de ... do BPN. (artº 6º da petição inicial e 34 da contestação)</font></i>
</p><p><i><font>7 - Entre a Autora e os funcionários bancários do balcão da ... do aqui Réu, existia uma relação de grande confiança. (artº 7º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>8 - A Autora tinha confiança nos funcionários da agência, designadamente no gestor AA. (artº 8º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>9 - A Autora não possuía aplicações em valores mobiliários. (artº 9º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>10 - A Autora aplicou o seu dinheiro por sugestão dos funcionários da agência de ... do BPN. (artºs 8ºA e 10º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>11- A Autora à data da subscrição, não possuía conhecimentos financeiros que lhe permitissem aperceber-se das características das aplicações que realizava. (artº 11º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>12 – A Autora não investia em produtos com risco. (artº 12º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>13 - A Autora investiu nas obrigações “SLN 2006”, porque os funcionários do Réu, indicaram que não havia risco nenhum. (artº 13º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>14 - A Autora, como cliente do Réu, tinha como principal preocupação na aplicação dos seus fundos a segurança e a rentabilidade. (artº 14º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>15 - Tal facto é conhecido dos funcionários da agência de ..., onde tem a sua conta aberta. (artº 15º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>16 - A Autora desconhecia a natureza subordinada das obrigações que adquiriu e queo risco, afinal, não seria assumido pelo "BPN - Banco Português de Negócios, SA". (artº 16º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>17 - A Autora, quando adquiriu as obrigações, ficou convencida que estava a adquirir algo semelhante a um depósito a prazo, com capital garantido, rentabilidade assegurada e com possibilidade de mobilizar o capital. (artº 17º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>18 - De outro modo, a Autora não teria subscrito as obrigações “SLN 2006”, se soubesse que estava a comprar dívida da Sociedade L..., que a garantia de capital era prestada por esta entidade e não pelo "BPN - Banco Português de Negócios, SA", e que não podia mobilizar antecipada e livremente o capital. (artº 18º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>19 - A Autora é uma congregação de irmãs religiosas. (artº 19º da petição inicial - parte)</font></i>
</p><p><i><font>20 - A Autora dedica-se a atividades com fins religiosos e a ajudar o próximo. (artº 20º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>21 - A Autora durante todos estes anos recebeu do aqui Réu extratos de títulos, em como era proprietário de títulos “SLN 2006”, no valor de € 50.000,00. (artº 21º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>22 - Em Março de 2019, a Autora recebeu o extrato de títulos, enviado pelo aqui Réu, referente ao período de 2019/02/01 a 2019/02/28, onde constava o valor de € 50.000,00 na sua carteira de títulos de obrigações “SLN 2006”. (artº 22º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>23 - A Autora, à data da subscrição, não possuía conhecimentos financeiros que lhe permitissem aperceber-se das características das aplicações que realizava, subscrevendo-as por sugestão dos funcionários do aqui Réu. (artº 28º da petição inicial)</font></i>
</p><p><i><font>24 - A Autora foi induzida em erro pelos funcionários do Banco, aqui Réu, para subscrição de um produto financeiro, que não subescreveria se não fosse essa atuação, o que lhe causou danos patrimoniais, no valor de € 50.000,00. (artº 33º da petição inicial)</font></i></p><div><br>
<i><font>*</font></i></div><br>
<i><font>Com interesse para a decisão da causa não se provaram os seguintes factos:</font></i>
<p><i><font>Da petição inicial:</font></i>
</p><p><i><font>19º (parte) já com certa idade e sem conhecimentos bancários.</font></i>
</p><p><i><font>24º A ... (...) BB, deslocou-se ao balcão em ..., do aqui Réu, em Maio de 2019, a requerer o pagamento do valor dos títulos, quando foi informada pelos funcionários do aqui Réu, que não o podiam fazer, só recorrendo à via judicial.</font></i>
</p><p><i><font>Da contestação:</font></i>
</p><p><i><font>36. O certo é que o gestor da A. apresentou o produto como se tratando de subscrição de obrigações,</font></i>
</p><p><i><font>38. Tendo igualmente explicado de que tal sociedade-emitente se tratava da sociedade mãe do Banco, pelo que se tratava naturalmente de um produto seguro,</font></i>
</p><p><i><font>39. Com um nível de risco semelhante ao de um Depósito a Prazo.</font></i>
</p><p><i><font>40. Mais apresentou as condições do produto,</font></i>
</p><p><i><font>41. E concretamente a sua remuneração, vantajosa relativamente aos DP’s,</font></i>
</p><p><i><font>42. O seu prazo, de 10 anos,</font></i>
</p><p><i><font>43. E as condições de reembolso,</font></i>
</p><p><i><font>44. E de obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que apenas seria possível por via de endosso,</font></i>
</p><p><i><font>45. O que, de resto, era, à data, extremamente fácil e rápido, porquanto a procura superava inúmeras vezes a oferta,</font></i>
</p><p><i><font>46. Sendo que sempre que solicitado endosso de tais obrigações, era uma questão de minutos até obter um comprador.</font></i>
</p><p><i><font>47. Tudo o que a A. compreendeu de forma exaustiva!</font></i>
</p><p><i><font>48. A A. foi total e exaustivamente esclarecida sobre as condições do produto, aliás de forma acompanhada com a respetiva nota técnica,</font></i>
</p><p><i><font>49. Tendo então dado ordem expressa para subscrição dos ditos instrumentos financeiros.</font></i>
</p><p><i><font>50. E sabia perfeitamente que não tinha um DP, ou sequer algo parecido com um DP,</font></i>
</p><p><i><font>51. Tendo o Banco-R. apresentado as características do produto, e depois cumprido as instruções dadas pela A.</font></i>
</p><p><i><font>52. Nunca a Ré disse à A. que o Banco garantiria fosse o que fosse quanto ao cumprimento ou incumprimento das obrigações da SLN,</font></i>
</p><p><i><font>53. Como nunca disse que o Banco pagaria ele próprio o produto.</font></i>
</p><p><i><font>54. Como nunca o faria, diga-se, se acaso anunciasse um DP! </font></i>
</p><p><i><font>55. E como já alegado, a A. soube exatamente o produto que subscreveu,</font></i>
</p><p><i><font>56. Como, ainda que o não soubesse, não podia desconhecer imediatamente após a sua subscrição,</font></i>
</p><p><i><font>57. Fosse por via de aviso de débito em conta do valor da aplicação,</font></i>
</p><p><i><font>58. Ou pelos extratos periódicos em que a titularidade de obrigações vinha perfeitamente discriminada e identificada,</font></i>
</p><p><i><font>59. de forma separada em relação aos depósitos a prazo</font></i><font>”.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608º, 635º, nº 3 a 5 e 639º, nº 1, do C.P.C. </font>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font>
</p><p><font>-Se o Banco réu deu cumprimento, em relação à autora, dos deveres de informação que legalmente lhe eram impostos, no âmbito do contrato de intermediação financeira que celebraram em 13-04-2006 (entendendo o réu recorrente que não violou esse dever de informação).</font>
</p><p><font>-Consequências que advêm do cumprimento ou, incumprimento, desses deveres de informação (entendendo o réu recorrente que não se verifica nexo de causalidade entre a sua atuação e o dano que a autora diz ter sofrido).</font>
</p><p><font>-</font><b><font>Do dever de informação</font></b><font>:</font>
</p><p><font>A atividade de intermediação financeira (e há acordo nos autos de que de contrato de intermediação financeira se trata) desenvolvida pelos bancos é legalmente regida por normas e princípios atinentes ao exercício e organização. Tendo em conta o tempo da celebração do contrato, 2006, é aplicável o preceituado nos artigos 73 e seg. do Dl 298/92, de 31/12 (RGICSF) e, em especial, o disposto nos artigos 7, 304, 309, 312 e 314 do DL 486/99, de 13/11 (CVM), dos quais decorrem que a mesma é norteada por elevados padrões de exigência e pelos princípios, entre outros, da boa-fé (ou da probidade comercial) e do conhecimento e da proteção (e prevalência) dos interesses do cliente, designadamente em relação a qualquer interesse que o intermediário financeiro tenha no serviço a prestar.</font>
</p><p><font>Dessas normas releva o seguinte:</font>
</p><p><font>Artigo 7.º -Qualidade da informação</font>
</p><p><font>1 - Deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a atividades de intermediação e a emitentes que seja suscetível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liqu | [0 0 0 ... 0 1 0] |
gDJxu4YBgYBz1XKviQlo | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Processo n.º 439/18.5T8FAF.G1.S1 </font>
<p><font>***</font>
</p><p><b><font>1</font></b><font>. AA e mulher BB, intentaram a presente ação de reivindicação contra CC, também conhecida por CC, viúva e DD e mulher, EE e formulam os seguintes pedidos:</font>
</p><p><font>A.) que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio urbano, sito na Rua …, n.º … (ou rua ...) da freguesia ..., do Concelho ..., constituído por uma casa de cave, R/c, 1.º andar e logradouro, com a superfície coberta de 187,00m2 e descoberta de 576,50m2, descrito sob o número ..., a confrontar de Norte caminho municipal, Sul FF, Nascente domínio público e Poente CC, inscrito na matriz urbana sob o artigo n.º …, com o limite melhor identificado na planta topográfica junta;</font>
</p><p><font>B.) que sejam os Réus condenados a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre o referido prédio;</font>
</p><p><font>C.) que sejam os Réus condenados a reporem a área do prédio dos autores, nela integrando a área de 146,m2, em falta, recuando para tal o muro divisório do seu prédio, do lado nascente em toda a sua extensão norte – sul, com a delimitação melhor indicada na planta topográfica junta;</font>
</p><p><font>D.) que sejam os Réus condenados a proceder à demolição do muro existente e reconstrução do muro divisório em conformidade com o que consta da alínea c) do petitório;</font>
</p><p><font>E.) Sejam os Réus condenados a absterem-se de praticar quaisquer atos que atentem contra o direito de propriedade dos autores, mormente, que impeçam o uso e fruição, plena e exclusiva, do dito prédio identificado no art. 1º da Petição Inicial, por parte dos ora autores.</font>
</p><p><b><font>2</font></b><font>.Para tanto alegaram:- que são donos e legítimos possuidores do prédio urbano que identificaram, onde construíram a sua casa de habitação, reparando-o e administrando-o à vista de todos, sem oposição de ninguém; tal parcela foi-lhes doada pela 1ª Ré, que tinha 763,50 m2 e foi desanexada do prédio descrito na mesma Conservatória sob o n.º ..., a qual, após a construção daquela habitação, procedeu à edificação de um muro divisório, na confrontação nascente/poente de ambos os prédios, mas que, por erro de medição, este entrou cerca de 7,80 m para dentro da parcela dos autores, tendo a 1ª Ré assumido logo à data o erro, comprometendo-se a reconstruí-lo no local certo. Esta ainda pretendeu posteriormente restaurar a situação do muro, mas não foi possível, porque os 2ºs Réus se opuseram.</font>
</p><p><b><font>3</font></b><font>.Embora a 1ª Ré não tenha contestado, os 2ºs Réus apresentaram contestação, impugnando e defendendo a improcedência da ação, alegando, em súmula, que a 1ª Ré é possuidora do imóvel - casa e terreno - que ocupa atualmente como usufrutuária, mas ininterruptamente, desde há mais de 20 anos, sendo a sua posse anterior à dos Autores. A 1º Ré adquiriu o prédio por sucessão, objeto de registo na Conservatória no ano de 1993, e, também, por usucapião e os 2º Réus ao adquirir a raiz do prédio urbano sito na Rua ..., nº …, em ..., por doação da 1ª Ré, em 2015, sucederam-lhe na posse e em todos os direitos transmitidos pelo anterior possuidor; os novos prédios resultantes da desanexação, de natureza urbana, desde 1999 não sofreram qualquer alteração no que respeita à respetiva configuração e área.</font>
</p><p><font>Deduziram ainda reconvenção na qual peticionaram que seja declarado e reconhecido pelos Autores o seu direito de propriedade da raiz do prédio urbano composto de casa de habitação de r/chão e logradouro, sito na Rua ..., nº …, ..., …, inscrita na matriz sob o artigo 959º e descrito na Conservatória sob o número 816.</font>
</p><p><b><font>4</font></b><font>. Saneados os autos, realizou-se julgamento e foi proferida sentença, a qual julgou a ação parcialmente procedente, declarando os autores proprietários do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o número ...e improcedentes os demais pedidos formulados contra os Réus. </font>
</p><p><font>Mais julgou a reconvenção totalmente procedente e declarou os Reconvintes proprietários do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ....</font>
</p><p><b><font>5</font></b><font>. Não se conformando com o assim decidido </font><b><font>vieram os autores interpor</font></b><font> recurso de apelação, que mereceu a seguinte deliberação do Tribunal da Relação de Guimarães:</font>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, acorda este Tribunal em:</font></i>
</p><p><i><font>-Alterar a matéria de facto provada e não provada nos termos apontados na Fundamentação de Facto;</font></i>
</p><p><i><font>- julgar parcialmente procedente a apelação e em consequência, mantendo-se o que foi decidido na 1ª instância quanto ao pedido reconvencional, revoga-se parcialmente a sentença e:</font></i>
</p><p><i><font>-Declara-se que os Autores são proprietários do prédio urbano, sito na Rua ..., n.º … (ou rua ...) da freguesia ..., do Concelho ..., constituído por uma casa de cave, R/c, 1.º andar e logradouro, com a superfície coberta de 187,00m2 e descoberta de 576,50m2, descrito sob o número ..., a confrontar de Norte caminho municipal, Sul FF, Nascente domínio público e Poente CC, inscrito na matriz urbana sob o artigo n.º …, com o limite melhor identificado na planta topográfica junta na perícia realizada nos autos, condenando-se os Réus a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre o referido prédio e a abster-se de praticar quaisquer atos que atentem e impeçam o uso e fruição, plena e exclusiva, deste prédio por parte dos ora autores.</font></i>
</p><p><i><font>-Condenam-se os Réus a reporem a área do prédio dos autores, nela integrando a área de 114,60m2, em falta, demolindo para tal o muro divisório do seu prédio, do lado nascente em toda a sua extensão norte – sul, com a delimitação melhor indicada na planta topográfica junta com a perícia e</font></i>
</p><p><i><font>-Absolvem-se os Réus do demais peticionado pelos Autores.</font></i>
</p><p><font>*</font>
</p><p><b><font>6</font></b><font>-Agora, inconformados com o decidido pela Relação, interpõem </font><b><font>recurso de Revista</font></b><font> para este STJ, os 2ºs réus e, formulam as seguintes conclusões:</font>
</p><p><i><font>“A) O douto acórdão recorrido, do Tribunal da Relação de Guimarães, julgou parcialmente procedente a apelação dos AA., e revogou a decisão da 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font>B) Salvo melhor opinião, o Tribunal a quo aderiu à alteração da factualidade assente, proposta pelos AA., em violação do direito processual. Art. 662º do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>C) E, procedeu, ainda, a uma errada interpretação dos factos e aplicação do direito, pelo que se impõe o presente recurso de Revista.</font></i>
</p><p><i><font>D) Consideram os RR/Recorrentes que o Tribunal de 1ª instância apreciou de forma criteriosa e correta toda a prova carreada para os autos, tendo efetuado a adequada subsunção jurídica dos factos, não merecendo a decisão qualquer censura.</font></i>
</p><p><i><font>E) A decisão proferida sobre a matéria de facto só pode ser alterada se a prova produzida impuser decisão diversa da obtida na 1ª instância.</font></i>
</p><p><i><font>F) O Tribunal a quo baseou a alteração da factualidade assente, com fundamento nas declarações da Ré CC e na escritura de doação de 13/5/1999.</font></i>
</p><p><i><font>G) Porém, os AA./Recorridos não alegaram nem provaram que a diferença de área do seu prédio - de 114,60 m2 - só pode ter resultado da construção do muro na confrontação Poente, pela Ré CC.</font></i>
</p><p><i><font>H) Uma vez que a divergência de área (de 114.60 m2) pode ter resultado de outra realidade como a retificação de estremas, cedência ao domínio público, ou até, de simples erro de medição.</font></i>
</p><p><i><font>I) Considerou ainda o Tribunal a quo que a Ré CC prestou as suas declarações de forma desinteressada e sem querer tomar partidos, ou no dizer do acórdão: “(até depôs de forma a prejudicar o seu património)”.</font></i>
</p><p><i><font>J) Este entendimento carece de fundamento porquanto foi patente do aludido depoimento a sua parcialidade, a favor dos AA. e, também, por saber que em nada prejudicava o seu património com tal depoimento por já não ser proprietária de qualquer prédio desde 2015.</font></i>
</p><p><i><font>K) Por outro lado, o Tribunal de 1ª instância havia expressamente consignado na sentença, a propósito das declarações da Ré CC: “Destas declarações que podiam ter sido a chave para a decisão, o tribunal nada pode retirar atenta a ausência de credibilidade das mesmas, resultantes em grande parte da vontade de não querer estar mal com ninguém.”</font></i>
</p><p><i><font>L) No julgamento da matéria de facto e face aos princípios da imediação, da oralidade e da concentração, o Tribunal aprecia livremente as provas, segundo a sua prudente convicção. Art. 607º do CPC</font></i>
</p><p><i><font>M) Esta apreciação livre das provas está subordinada à experiência e prudência do julgador com base numa análise serena de todos os elementos de facto que foram levados a julgamento, designadamente a prova produzida pelos RR/Recorrentes que o Tribunal a quo relevou.</font></i>
</p><p><i><font>N) Atente-se o ARG de 11/7/2017, no Proc. 5527/16.0T8GMR.G1:</font></i>
</p><p><i><font>II. O uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação…., nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova).</font></i>
</p><p><i><font>O) O Tribunal a quo não apontou o erro de apreciação cometido pelo Tribunal de 1ª instância, tanto mais que não dispôs da evidência da perceção e oralidade da audiência de julgamento.</font></i>
</p><p><i><font>P) Porém, devia a Relação determinar a renovação da prova se dúvidas houvesse sobre a credibilidade da Ré CC. Art. 662º do CPC</font></i>
</p><p><i><font>Q) Não existindo erro de apreciação da factualidade assente na 1ª instância impunha-se que a mesma se mantivesse inalterada.</font></i>
</p><p><i><font>R) Sem prescindir, e salvo melhor opinião, o douto Acórdão recorrido revela uma errada interpretação e aplicação dos arts. 1260º, 1263º, 1264º, 1287º e 1290º do C.Civil.</font></i>
</p><p><i><font>S) Está provado - alíneas r), t), u) e v) da matéria de facto provada - que os RR/Recorrentes exercem os poderes de facto sobre a parcela de terreno – de 114.60 m2 - em questão.</font></i>
</p><p><i><font>T) Incumbia aos AA/Recorridos demonstrar que os RR./Recorrentes eram apenas meros detentores, uma vez que existe a inversão do ónus da prova previsto no art. 1252º do CC.</font></i>
</p><p><i><font>U) A posse adquire-se pela prática reiterada, com publicidade, dos atos materiais correspondentes ao exercício do direito e, também, pelo constituto possessório. Arts. 1263º e 1264º</font></i>
</p><p><i><font>V) O constituto possessório não opera automaticamente mas requer antes um acordo pelo qual o anterior possuidor continue a deter a coisa sem a entregar ao novo possuidor, passando a possuidor precário.</font></i>
</p><p><i><font>W) No caso sub judice, nada foi alegado que permita concluir ter existido tal acordo de vontades e que a Ré CC tenha passado a ser mera detentora em nome de outrem.</font></i>
</p><p><i><font>X) Forçoso é, pois, concluir que não se verificou o constituto possessório, como forma de aquisição solo consensu da posse.</font></i>
</p><p><i><font>Y) Sendo certo que, apesar da doação, a Ré CC não deixou de usar como quis a parcela de terreno de 114,60m2, sendo a sua posse integrada pelos dois elementos – corpus e animus – exercida sobre todo o terreno que delimitou com o muro. Art. 1251º do CC</font></i>
</p><p><i><font>Z) Assim, a posse da Ré CC, que antecedeu a dos RR/Recorrentes, só pode ser tida por titulada, de boa fé, pacífica e pública, que perdura há mais de 20 anos, e, constituiu fundamento de aquisição derivada da propriedade por via da usucapião. Art. 1287º do CC</font></i>
</p><p><i><font>AA) O douto acórdão violou as disposições legais citadas e deve ser revogado”.</font></i>
</p><p><b><font>7</font></b><font>-</font><b><font> Foram apresentadas contra-alegações</font></b><font> pelos autores, nas quais concluem:</font>
</p><p><i><font>“A. No presente recurso, as questões suscitadas pelos recorrentes radicam em saber se houve ou não uma errada alteração da matéria de facto levada a cabo pelo tribunal a quo (Tribunal da Relação de Guimarães) em violação do direito processual e se houve uma errada interpretação e aplicação do direito;</font></i>
</p><p><i><font>B. Analisadas as alegações e as conclusões apresentadas, em lado algum, os recorrentes, especificam em que medida o tribunal a quo ao alterar a matéria factual o fez em clara violação das regras processuais;</font></i>
</p><p><i><font>C. O que, na realidade, os recorrentes fazem é discordar do entendimento levado a cabo pelo tribunal a quo para alterar a factualidade provada e não provada;</font></i>
</p><p><i><font>D. Face ao preceituado no nº 3 do art. 674.º e, no nº 2 do art. 682 º do CPC, aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido (Relação) o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julga adequado, sendo que a decisão da matéria de facto só pode ser excepcionalmente alterada por este Supremo havendo ofensa de disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova”;</font></i>
</p><p><i><font>E. Pelo que, em bom rigor, não pode o Supremo Tribunal de Justiça conhecer a primeira das questões levantadas pelos recorrentes, devendo, por conseguinte, manter-se inalterada a factualidade provada e não provada;</font></i>
</p><p><i><font>F. Tanto mais que, o tribunal a quo, Tribunal da Relação de Guimarães, confrontado com a prova documental, com a prova pericial e com o depoimento da Ré CC, não teve dúvidas em alterar a factualidade constante do acórdão recorrido, nos moldes em que o fez e segundo a aplicação criteriosa dos preceitos legais a que estava vinculado;</font></i>
</p><p><i><font>G. Não existe assim qualquer argumento válido invocado por parte dos recorrentes que sustente a procedência do recurso de revista quanto à questão da alteração da matéria de facto, porquanto nenhuma violação normativa pode ser assacada ao acórdão recorrido;</font></i>
</p><p><i><font>H. E, não tendo o tribunal a quo tido quaisquer dúvidas quanto aos depoimentos e demais prova, não poderia, como pretendem os recorrentes, determinar a renovação da prova;</font></i>
</p><p><i><font>I. Assim, situando-se a questão suscitada pelos recorrentes no domínio da apreciação e fixação das provas, matérias que cabem por excelência nos poderes de aferição e produção de prova das instâncias, in casu, do Tribunal da Relação, não pode este Venerando Supremo Tribunal conhecer da primeira questão suscitada pelos recorrentes;</font></i>
</p><p><i><font>J. Os recorrentes alegam, ainda que, mesmo que a matéria de facto se mantenha alterada, conforme determinado no tribunal a quo, o certo é que mesmo assim o acórdão recorrido revela uma errada interpretação e aplicação dos artigos 1260.°, 1263.°, 1264.°, 1287°, e 1290°, todos do Código Civil, mas sem razão;</font></i>
</p><p><i><font>K. Mas, ao contrário do que pretendem fazer crer, ao arrepio da alteração factual operada pela tribunal a quo, a verdade é que, foi precisamente a alteração da matéria factual constantes das alíneas r), t), u), v), x) e z), que permitiu que o entendimento jurídico perfilhado pelo tribunal a quo fosse em sentido contrário ao adoptado pelo tribunal de primeira instância;</font></i>
</p><p><i><font>L. Da factualidade constante das alíneas r), u) e v) dos factos provados, não resultou qualquer posse da parcela antes da construção da habitação dos autores, ora recorridos, assim como não resultou qualquer publicidade da mesma posse quanto à parcela de terreno, nem sequer resultou qualquer prova quanto ao prazo da utilização por mais de 20 anos da mesma parcela de terreno;</font></i>
</p><p><i><font>M. Pela análise da factualidade dada como provada, não restam dúvidas que os autores ora, recorridos, provaram ter adquirido, por contrato de doação outorgado a 13 de Maio de 199, o direito de propriedade sobre o prédio desanexado do prédio da primeira ré, prédio este, que como também resultou provado tem uma área de 763,50m2, e se encontra devidamente registado a favor dos autores;</font></i>
</p><p><i><font>N. Também, não restam dúvidas que a primeira Ré após a construção da casa, por parte dos autores, construiu um muro que devia separar os dois prédios, mas para dentro do prédio dos autores, e passou a usar a faixa de terreno que ficou do seu lado como se fosse sua.</font></i>
</p><p><i><font>O. Ao contrário do que possa parecer, nos presentes autos resultou provado na al. u) que a posse dos réus exercida e mantida à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, ou seja, a posse pacifica e pública, só ocorreu quanto ao prédio referido em n) e já não quanto à faixa de terreno com área de 114,60m2 que segue ao longo desse muro referida em z.</font></i>
</p><p><i><font>P. Em lado algum resultou provado que a primeira Ré, CC e consequentemente os réus, recorrentes, tivessem tido a posse pública e pacífica, convencidos de que estavam a exercer um direito próprio e que não prejudicavam ninguém, quanto à faixa do terreno e antes da construção do referido muro.</font></i>
</p><p><i><font>Q. Para efeitos de usucapião, é indispensável que se verifique uma situação de posse, nos termos definidos no art. 1251.º do CC, equivalente ao poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício material do direito de propriedade ou de outro direito real. A relevância jurídica conferida à posse assenta, fundamentalmente, na necessidade de tutelar a aparência no mundo direito, ditada por exigências de segurança nas relações sociais e sancionamento da inércia do titular do direito;</font></i>
</p><p><i><font>R. A posse da coisa sem animus possidendi equivale a posse precária ou simples detenção - art. 1253.º, alínea a), do CC;</font></i>
</p><p><i><font>S. Tendo em conta a factualidade provada no acórdão recorrido, conclui-se que a primeira Ré, embora, possa ter praticado actos materiais sobre a parcela de terreno reivindicada, ocupando-a e fruindo-a, não o fez, contudo, como se fosse sua proprietária, ou seja, no exercício do direito de propriedade sobre a mesma parcela, faltando assim provar o elemento do animus possidendi, que competia aos segundos Réus (art. 342.º, n.º 1, do CC).</font></i>
</p><p><i><font>T. Neste contexto, a posse exercida simplesmente no aproveitamento de tolerância concedida pelos autores corresponde a uma situação de simples detenção ou posse precária - art. 1253.º, alíneas b) e c), do CC, que não confere o direito à aquisição da propriedade, por usucapião (art. 1290.º do CC);</font></i>
</p><p><i><font>U. Não havendo dúvidas sobre a titularidade do direito de propriedade, a primeira Ré era mera detentora ou possuidora precária;</font></i>
</p><p><i><font>V. Por essa razão não poderia haver acessão na posse da primeira Ré para os segundos Réus;</font></i>
</p><p><i><font>W. E, mesmo que houvesse a posse sempre seria não titulada, tendo em conta o preceituado no artigo 1256.º, n.º 2, do Código Civil, e por isso de má-fé;</font></i>
</p><p><i><font>X. É manifesto que os segundos réus não adquiriram a parcela de terreno por usucapião e, por isso, a reconvenção devia ter improcedido, como improcedeu;</font></i>
</p><p><i><font>Y. Ao contrário do que alegam os recorrentes, nos termos n.º 1 do artigo 1264.º do Código Civil, “se o titular do direito real, que está na posse da coisa, transmitir esse direito a outrem, não deixa de considerar-se transferida a posse para o adquirente, ainda que, por qualquer causa, aquele continue a deter a coisa”, não necessitando de qualquer alegação ou sequer que seja invocado um acordo nesse sentido;</font></i>
</p><p><i><font>Z. Conclui-se assim que os recorridos, não provaram a aquisição originária, por usucapião, do direito de propriedade sobre o terreno em litígio, decorrente da posse, exercida por mais de 20, 30 e 50 anos, de forma pacífica, pública, contínua, de boa-fé, com justo título;</font></i>
</p><p><i><font>AA. Tratando-se a presente acção de uma acção de reivindicação, dispõe o artigo 1311.º do Código Civil que todo o proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor o reconhecimento do seu direito de propriedade e a restituição do que lhe pertence, e caso o autor consiga demonstrar que é o titular do direito real, como demonstrou in casu, o possuidor ou detentor, os aqui recorrentes, só podem evitar a restituição caso provem que adquiriram o direito originalmente ao abrigo das disposições que protegem terceiros de boa fé, que tem sobre o objecto um direito real compatível com a propriedade ou a detêm em virtude de um direito pessoal bastante;</font></i>
</p><p><i><font>BB. Ora, no caso dos autos, os autores, recorridos, reivindicaram a área em falta (114,60m2), do prédio que adquiriram à primeira Ré, por escritura pública de doação, área que resulta do título (escritura) e do registo;</font></i>
</p><p><i><font>CC. Os autores, recorridos, provaram, ainda, que o prédio se encontra, na sua totalidade, registado a seu favor, pelo que nos termos do artigo 7.º do Código de Registo Predial, o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define;</font></i>
</p><p><i><font>DD. Assim sendo, não podia o tribunal a quo deixar de considerar, como considerou, que por escritura pública de doação, lavrada no dia 13 de Maio de os autores adquiriram, por doação à primeira Ré, uma parcela de terreno que com área de 763,50m2, descrita na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n…., da freguesia ..., …, e tendo-se provado que o prédio dos autores tem menos 114,60m2 em relação ao que consta do título de aquisição o que resultou do facto da ré CC ter construído um muro fora do limites do seu prédio, podendo a área ser reposta com a demolição e recuo do muro de vedação em toda a extensão de forma a restituir aos autores, recorridos, os 114,60m2, a decisão do tribunal a quo só poderia ser no sentido de “condenar os réus a reporem a área do prédio dos autores, nela integrando a área de 114,60m2, em falta, demolindo o muro divisório do seu prédio, do lado nascente em toda a extensão norte-sul, com a delimitação melhor indicada na planta topográfica junta com a perícia;</font></i>
</p><p><i><font>EE. Os recorres, réus, por sua vez, ao contrário do que pretendem fazer crer, não provaram qualquer causa impeditiva da restituição da parcela em causa;</font></i>
</p><p><i><font>FF.O recurso não merece assim acolhimento em toda a linha, impondo-se a manutenção do acórdão recorrido;</font></i>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos demais de direito que Vossas Excelências proficientemente suprirão, deverá o recurso apresentado pelos recorrentes ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se o acórdão recorrido”.</font></i>
</p><p><font>*</font>
</p><p><font>O recurso foi admitido.</font>
</p><p><font>Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font>*</font>
</p><p><font>Nas Instâncias foram </font><b><font>julgados como provados e não provados, os seguintes factos </font></b><font>(incluídas as alterações introduzidas pelo Tribunal da Relação na decisão do recurso da matéria de facto):</font>
</p><p><i><font>1. Factos provados</font></i>
</p><p><i><font>a. Está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número ..., o prédio urbano, sito na Rua ..., n.º … (ou rua ...) da freguesia ..., do Concelho ..., constituído por uma casa de cave, R/c, 1.º andar e logradouro, com a superfície coberta de 187,00m2 e descoberta de 576,50m2, a confrontar de Norte caminho municipal, Sul FF, Nascente domínio público e Poente CC, inscrito na matriz urbana sob o artigo n.º …; </font></i>
</p><p><i><font>b. Este prédio está inscrito a favor dos aqui autores, pela Ap. 26 de 1999-06-08;</font></i>
</p><p><i><font> </font></i>
</p><p><i><font>c. O referido prédio resultou da desanexação de uma parcela de terreno do prédio descrito na Conservatória sob o n.º ..., parcela essa descrita como parcela de terreno com 763,50 m2, a confrontar de Norte caminho municipal, Sul com FF, Nascente domínio público e FF;</font></i>
</p><p><i><font>d. No dia 13 de maio de 1999, foi outorgada no cartório Notarial ..., a fl. 60 a 60v do livro Quatrocentos e Setenta A, escritura de doação, através da qual a primeira Ré CC declarou doar a referida parcela de terreno ao autor marido;</font></i>
</p><p><i><font>e. Os autores, por si e pelos ante possuidores foram administrando livremente o referido prédio, nomeadamente, construído a habitação, pedindo a respetiva licença de construção e habitabilidade, construindo muros, fazendo obras de manutenção e reparação, construindo passeios e jardim, cortando e limpando ou mandando limpar o quintal, erva e demais vegetação.</font></i>
</p><p><i><font>f. Plantando arbusto e flores no jardim.</font></i>
</p><p><i><font>g. No quintal, plantando árvores de fruto, couves, alfaces e demais produtos hortícolas.</font></i>
</p><p><i><font>h. E, onde os anteriores possuidores haviam plantado horta, semeado erva e jardim.</font></i>
</p><p><i><font>i. E, foram-no utilizando de acordo com a sua autónoma e livre vontade, afetando-o como muito bem entenderam.</font></i>
</p><p><i><font>j. Dele foram retirando todos os frutos e demais utilidades.</font></i>
</p><p><i><font>k. E, sempre pagaram as contribuições sobre o prédio incidentes.</font></i>
</p><p><i><font>l. O que tudo tem feito de forma contínua, sem interrupção e sem oposição de ninguém.</font></i>
</p><p><i><font>m. O que sempre fizeram de forma pública, pacifica e de boa-fé, por ignorarem lesar direitos de terceiros, à vista e com conhecimento de toda a gente, designadamente da ré, sem violência ou oposição de quem quer que fosse. </font></i>
</p><p><i><font>n. Está descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ... e inscrito na matriz sob o artigo n.º …, o prédio composto por casa de rés-do-chão e logradouro, com a superfície coberta de 122,00m2 e logradouro de 2.396.5m2;</font></i>
</p><p><i><font>o. Este prédio encontra-se inscrito a favor dos segundos Réus, através da Ap. 2336 de 2015-08-25, sendo a causa da aquisição uma doação efetuada pela primeira Ré CC;</font></i>
</p><p><i><font>p. Está ainda averbado pela Ap. 2637 de 2015-08-25 uma reserva de usufruto a favor da primeira Ré;</font></i>
</p><p><i><font>q. Os prédios supra identificadas confrontam entre si do lado nascente/poente;</font></i>
</p><p><i><font>r. Após a conclusão das obras do prédio descrito na Conservatória sob o art. 1253, a primeira ré mandou edificar um muro divisório para separar os dois prédios e delimitar o terreno objeto do destaque do terreno que ficava para o logradouro do prédio mãe;</font></i>
</p><p><i><font>s. Da reconvenção</font></i>
</p><p><i><font>t. Desde antes da edificação do supra referido muro que a 1ª Ré e depois os 2ºs Réus usam o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o art. ... para aí habitarem, cuidando também do respetivo terreno conforme entendem, recebendo visitas e familiares, fazendo obras de conservação e suportando os encargos que lhes são inerentes. </font></i><b><i><font>Na sequência da decisão da impugnação da matéria de facto esta alínea passa a ter a seguinte redação:</font></i></b><i><font> t. “A 1ª Ré habitou, cuidando também do respetivo terreno e usou conforme entendeu, recebendo visitas e familiares, fazendo obras de conservação e suportando os encargos que lhes são inerentes, o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ... na sua primitiva configuração e na que resultou da desanexação referida em c), primeiro sozinha e depois acompanhada dos demais Réus; igualmente utilizou como bem quis, a partir da construção do muro referido em r), a faixa de terreno com área de 114,60 m2, que segue ao longo desse muro, referida em z).”</font></i>
</p><p><i><font>u. O que fazem à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, convencidos de estarem a exercer um direito próprio e de que não prejudicam ninguém. </font></i><b><i><font>Na sequência da decisão da impugnação da matéria de facto esta alínea passa a ter a seguinte redação: </font></i></b><i><font>U. O que fizeram à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém quanto a toda a área de terreno que utilizaram; convencidos de estar a exercer um direito próprio e de que não prejudicavam ninguém relativamente ao prédio referido em n), mas já não quanto à faixa de terreno com área de 114,60 m2, que segue ao longo desse muro, referida em z.</font></i>
</p><p><i><font>v. De forma ininterrupta e há mais de 20 anos - </font></i><b><i><font>Na sequência da decisão da impugnação da matéria de facto esta alínea passa a ter a seguinte redação:</font></i></b><i><font> V. De forma ininterrupta e há mais de 20 anos quanto ao prédio sob o nº ... nas configurações que teve ao longo do tempo; e desde a construção do muro referido em r), quanto à faixa de terreno do prédio, com área de 114,60 m2, referida em z).</font></i>
</p><p><i><font>X. A habitação foi construída numa parcela de terreno destinada a construção com a área total de 763.50m2, que deu lugar ao prédio urbano descrito no nº. 1253 da Conservatória. </font></i><b><i><font>(alínea aditada na sequência da procedência da impugnação da matéria de facto não provada)</font></i></b>
</p><p><i><font>Z. O muro, referido em r), que a poente do prédio referido em a) o separa do referido em n), não foi construído na linha divisória dos supra identificados prédios, mas dentro do terreno pertencente ao prédio referido em a), seguindo em toda a sua extensão a cerca de 6,40m para dentro do limite daquele prédio. </font></i><b><i><font>(alínea aditada na sequência da procedência da impugnação da matéria de facto não provada)</font></i></b>
</p><p><i><font>2. Factos não provados</font></i>
</p><p><i><font>a. Que o prédio urbano descrito no art. 1253 da Conservatória tenha sido construído pelos autores numa parcela de terreno destinada a construção com a área total de 763.50m2; (</font></i><b><i><font>esta alínea passou para a matéria de facto provada, com a redação dada à supra aditada alínea X)</font></i></b><i><font>.</font></i>
</p><p><i><font>b. Que os Autores tenham exercido os atos descritos em e. a m. dos factos provados sobre a parcela descrita no art. 43º, da petição inicial; </font></i>
</p><p><i><font>c. Que por erro de medição, o muro não foi feito na linha divisória dos supra identificados prédios, mas dentro do terreno pertencente à parcela de terreno objeto de construção e que faz parte integrante do prédio dos autores. (</font></i><b><i><font>esta alínea passou para a matéria de facto provada, conjuntamente com o constante da alínea d), com a redação dada à supra aditada alínea z</font></i></b><i><font>). </font></i>
</p><p><i><font>d. Tendo o muro sido construído no alinhamento a cerca de 7.80 metros para dentro do limite do lote de terreno. (</font></i><b><i><font>esta alínea passou para a matéria de facto provada, conjuntamente com o constante da alínea c), com a redação dada à supra aditada alínea z</font></i></b><i><font>).</font></i>
</p><p><font>*</font>
</p><p><b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font>
</p><p><font>São as questões suscitadas pelos recorrentes e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do CPC.</font>
</p><p><font>Os recorrentes suscitam as seguintes questões:</font>
</p><p><font>- </font><a></a><font>julgamento da matéria de facto pelo tribunal da Relação (conclusões A) e Q)): os recorrentes entendem que o tribunal recorrido não podia ter alterado a decisão de facto com fundamento nas declarações da 1.ª ré e na escritura de doação;</font>
</p><p><font>- erro de direito (conclusões R) a AA)): os recorrentes entendem que a 1.ª ré exerceu posse pública, pacífica, de boa fé e titula | [0 0 0 ... 0 0 0] |
eTFXu4YBgYBz1XKvlvdl | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
</p><p><font>“Baseaff, L.da” instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação dos RR. AA e mulher BB, a pagar-lhe a quantia em dívida no montante de 65.053,17 €, acrescida dos juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.</font><br>
</p><p><font>Alegou, em súmula, ter celebrado com os RR. um contrato de empreitada para construção de uma habitação familiar térrea, pelo preço total de 168 559,09 Euros, cujo preço deveria ser pago no prazo de 3 [três] dias após os pedidos de vistoria e consequente libertação de tranche de dinheiro por parte da entidade bancária, realizou ainda um conjunto de trabalhos a mais a solicitação dos RR no valor de 13 165,69 Euros.</font><br>
</p><p><font>Sustenta que no dia 03 de março de 2020, e antes de terminada a obra, por carta registada com aviso de receção, a autora resolveu o “contrato de construção” celebrado com os réus, com justa causa e efeitos imediatos, já que até essa data os RR. apenas haviam pago o quantitativo global de 75 000,00 Euros, não obstante estar realizada obra correspondente a 74,83% no valor de 126 140,47 Euros, a que acresce o valor dos trabalhos a mais.</font><br>
</p><p><font>Os RR. contestaram e deduziram pedido reconvencional. Impugnaram os factos alegados pela A., sustentaram que o preço acordado foi no montante de 116.508,00 (+IVA), não tendo sido solicitadas ou executadas quaisquer obras a mais; que a A. resolveu o contrato no período concedido pelos RR à autora, por interpelação expressa, para que a obra fosse cumprida, sob pena do mesmo ser resolvido por incumprimento definitivo, já que a A. havia-se comprometido contratualmente a edificar a dita moradia familiar no prazo máximo de 12 meses e volvidos quase 36 meses a mesma encontrava-se longe do seu termino.</font><br>
</p><p><font>A Autora, agiu da forma descrita consumando de forma clara, expressa e inequívoca a sua manifesta intenção em não cumprir, e antecipando o incumprimento definitivo do contrato de empreitada, abandonou a obra, deixando-a por concluir, e em face do seu incumprimento definitivo, tiveram os reconvintes que adjudicar a outra empresa de construção a sua conclusão por um preço superior.</font><br>
</p><p><font>O incumprimento da autora causou danos, patrimoniais e não patrimoniais.</font><br>
</p><p><font>Concluem pedindo a improcedência da ação e procedência do pedido reconvencional, pedindo que seja declarado o incumprimento definitivo do contrato de empreitada por culpa única e exclusivamente imputável à autora/reconvinda e consequentemente seja esta condenada a pagar aos reconvintes, a quantia de 40.950,32 euros, a que acrescem juros legais de mora contabilizados desde a citação/notificação até integral e efetivo pagamento.</font><br>
</p><p><font>Mais requererem a condenação da A. e sua mandatária como litigantes de má-fé em multa e em indemnização aos RR., nunca inferior a 20.000,00.</font><br>
</p><p><font>Replicou a A., solicitando a retificação de alguns erros de escrita da PI; mais impugnando os factos alegados pelos RR. e sustentando que a autora resolveu o contrato de empreitada nos termos gerais de direito com base nos fundamentos aí invocados, após prévia interpelação; que a obra só foi interrompida, após o dono de obra, ter exigido alterações à execução da mesma e a realização de uma serie de trabalhos extra.</font><br>
</p><p><font>Invoca abuso de direito por parte dos RR e pede a condenação destes como litigantes de má fé em multa e indemnização no valor de 5.000,00 €.</font><br>
</p><p><font>Concluindo como na p.i. [o que, como refere, inclui o reconhecimento judicial da resolução pela autora do contrato de empreitada celebrado com os réus, com justa causa e efeitos imediatos].</font><br>
</p><p><font>Realizada a audiência final, foi proferida sentença, onde se decidiu:</font><br>
</p><p><i><font>«- julgar parcialmente procedente a presente acção, e em consequência, condenar os RR. A pagar à A. a quantia de € 12.331,87 (doze mil, trezentos e trinta e um euros e oitenta e sete cêntimos), mais IVA, acrescida de juros de mora, à taxa devida para os juros comerciais, até integral pagamento, a contar da citação;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condenar a A. a pagar aos RR. a quantia de 13.416,69 € (treze mil, quatrocentos e dezasseis euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até integral pagamento, a contar da notificação da reconvenção.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas da acção e da reconvenção por A. e RR., na proporção do respectivo decaimento, e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido aos RR</font></i><font>.»</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformados com a sentença final, dela recorreram a autora e os réus sendo, após deliberação, decidido pelo Tribunal da Relação:</font><br>
<p><i><font>“Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação interposta pela autora e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, a qual passa a ter o seguinte teor:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Condena-se os RR. a pagar à A. a quantia de 32.905,43€ (com IVA já incluído), acrescida de juros de mora, à taxa devida para os juros comerciais, até integral pagamento, a contar da citação;</font></i><br>
</p><p><i><font>Mais acordam, em julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelos RR e, em consequência, condenam ainda a autora/reconvinda a pagar aos réus/reconvintes o montante a apurar em sede de liquidação de sentença, com o limite de 15.341,31€, que resultar do diferencial entre o valor da obra em falta à data da resolução do contrato (já determinado nos termos expostos -35.399,41€-) e o custo que os AA. tiveram que pagar ao novo empreiteiro para finalizar a conclusão da obra, considerando apenas o valor que os RR. terão que despender pela conclusão dos trabalhos que já se mostravam contidos no contrato celebrado com a A. (e no qual não deverá ser considerada a eliminação das patologias a que alude a alínea HH) dos factos provados, em cujo valor a autora já se mostra condenada), a apurar nos termos do disposto pelo artigo art. 609.º, n.2 do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas das apelações pela A. e pelos RR, na proporção de metade para cada um e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário dos RR.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas da acção e da reconvenção na proporção do respectivo decaimento e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário dos RR".</font></i><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Novamente inconformada com o decidido pela Relação, </font><b><font>interpõe recurso de Revista para este STJ autora/reconvinda</font></b><font> e, formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“I. Constituem objeto do presente recurso nulidades processuais, erro material e erro do julgamento em matéria de direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. A matéria da realização de obras na cave pela recorrente na moradia objeto do contrato de empreitada em crise nos autos, é facto suscetível de ter relevância jurídica; complementa factos alegados pelas partes; sobre eles foi exercido o contraditório; dos autos resulta que a recorrente realizou essas obras, mas a matéria de facto provada, é omissa quanto à mesma.</font></i><br>
</p><p><i><font>III. Pelo que, salvo melhor opinião, o STJ, com os seus poderes de substituição, pode e deve afastar as deficiências, que encontre na decisão proferida pela Relação, reformado o Ac. em recurso dele fazendo constar da matéria de facto provada que: “KK) Durante a execução da empreitada, a autora realizou obras na cave da moradia objeto do contrato de empreitada em crise nos autos.”, sob pena de se deixar de pronunciar sobre questões que devesse apreciar [cfr. 1º parte da al. c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC] e/ou violar o poder-dever previsto na al. c) do n.º 2 do art.º 662º do CPC, cfr. n.º 3 do art.º 682º do CPC, o que se requer.</font></i><br>
</p><p><i><font>IV. O teor do caderno de encargos e dos projetos de execução, bem como o plano de pagamentos em anexo ao contrato de construção em crise nos autos. é facto suscetível de ter relevância jurídica; complementa factos alegados pelas partes; sobre eles foi exercido o contraditório; dos autos resulta que a recorrente realizou essas obras, mas a matéria de facto provada, é omissa quanto à mesma.</font></i><br>
</p><p><i><font>V. Pelo que, salvo melhor opinião, o STJ, com os seus poderes de substituição, pode e deve afastar as deficiências, que encontre na decisão proferida pela Relação, reformado o Ac. em recurso dele fazendo constar da matéria de facto provada que: “LL) Resulta do caderno de encargos junto aos autos a fls. que “Paramentos e revestimentos interiores – Paredes – […] os acabamentos das paredes da garagem e arrumos da garagem serão em Reboco de Argamassa com acabamento areado uniforme e posteriormente pintados com tinta aquosa para paredes interiores tipo CIN®, ou similar, com primário e tinta de acabamentos mate.[…]</font></i><br>
</p><p><i><font>Tetos […] Tetos na zona da garagem e arrumos de garagem será em reboco areado com acabamento uniforme e posteriormente pistados com tinta aquosa para paredes interiores tipo CIN®, com primário e tinta e acabamento mate.[…]</font></i><br>
</p><p><i><font>Pavimento […] Pavimento da garagem e arrumos de garagem será em betáo C25/30, sem revestimento, afagado e devidamente impermeabilizada com Weber.dry Iastic.[…]</font></i><br>
</p><p><i><font>Serralharias – Portões: O portão de acesso à garagem será portão automático seccionado do tipo Eletrocelos, ou similar, com motor Rosso Evo da Motorline Professional, ou similar.”</font></i><br>
</p><p><i><font>E ainda que:</font></i><br>
</p><p><i><font>“MM) O Plano de Pagamentos dos Trabalhos corresponde a um valor de construção de:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Execução de estrutura em betão armado, alvenarias exteriores em bloco térmico e pavimento térreo em habitação unifamiliar (Cave + Piso + Cobertura), pelo Valor Global de 34.713,00€ (Trinta e Quatro mil, Setecentos e Treze Euros).</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Carpintarias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias, Instalações técnicas, conforme caderno de encargos em anexo. Piso + Cobertura (Exclui-se neste preço arranjos de exteriores, mobiliários de cozinha, estores brisa-solares e muros de vedação). Pelo Valor Global de 91.795,00€ (Oitenta e Um Mil, Setenta e Sete Euros e Cinquenta Cêntimos).</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Serralharias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias, Instalações técnicas, conforme caderno de encargos em anexo. Cave + Piso + Cobertura (Exclui-se neste preço arranjos exteriores, mobiliários de cozinha, estores brisa-solares e muros de vedação). Pelo Valor Global de 95.077,50€ (Noventa e Cinco Mil, Setenta e Sete Euros e Cinquenta Cêntimos)</font></i><br>
</p><p><i><font>Perfazendo para a execução da Opção a) somada à opção b) o valor global final de 116.508,00€ (Cento e Dezasseis Mil, Quinhentos e Oito Euros), aos quais acresce o valor do IVA à taxa Legal em vigor.</font></i><br>
</p><p><i><font>Em caso, de mudança da opção b) para c) acresce o diferencial entre as duas opções ao valor final.”, sob pena de se deixar de pronunciar sobre questões que devesse apreciar [cfr. 1ºparte daal. c)do n.º1 do art.º615ºdo CPC] e/ouviolar opoder-dever previsto na al. c) do n.º 2 do art.º 662º do CPC, cfr. n.º 3 do art.º 682º do CPC, o que se requer.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI. Consultados os documentos que o Ac. em crise se refere sobre a matéria do arrendamento de habitação, bem como do pagamento da respetiva renda, verifica-se existe apenas 1 recibo, datado de 17/04/2020, e que do mesmo consta ser “referente à renda de abril de 2020, valor da renda de 3,94 €, e referente à renda de maio de 2020, valor da renda de 381,69 €”!?.</font></i><br>
</p><p><i><font>VII. O Instituto de Segurança Social, IP cancelou o apoio judiciário que inicialmente havia concedido aos RR., porquanto no requerimento inicial “se descrevem elementos factuais não constantes dos documentos anexos suscetíveis de colocar em causa a decisão final de deferimento”.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII. O Ac. em é omisso [porque efetivamente inexiste!] quanto à explicitação da prova testemunhal que confirme a factualidade a que alude os pontos T) e U) da matéria de facto provada.</font></i><br>
</p><p><i><font>IX. Pelo que, e salvo melhor opinião, justifica-se que o STJ altere a decisão proferida pela Relação, e, em consequência, anule a decisão da matéria dos pontos T) e U) dos factos provados e a altere para matéria de FACTO NÃO PROVADA, porquanto a mesma é nula à luz do preceituado na 1º parte da al. b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, al. a a) e b) do n.º 2 do art.º 616º e/ou viola o previsto no n.º 1 do art.º 342º do Código Civil, o que se requer.</font></i><br>
</p><p><i><font>X. Se assim não se entender, a decisão proferida viola a regra sobre o ónus da prova prevista no art.º 342º, n.º 1 do Código Civil e o princípio da livre apreciação da prova previsto no art.º 607º, n.º 5 do Código de Processo Civil, o que é suscetível de revista nos termos da al. a) e b) do art.º 674º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XI. E isto porque parte do pressuposto que os recorridos procederam ao pagamento das rendas com base nas regras da experiência comum e assenta a sua decisão num facto inscrito no requerimento de apoio judiciário que veio posteriormente a ser cancelado, o que, por si só e desde logo inquina a credibilidade sobre toda e qualquer factualidade ínsita no mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>XII. Os recorridos não fizeram prova de que viveram em casa arrendada, nem fizeram prova de que efetivamente viveram na habitação objeto do contrato de arrendamento junto aos autos; mais não fizeram prova bastante que procederam mensalmente ao pagamento de um quantitativo a título de renda.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIII. Tal factualidade, para ser inequivocamente demonstrada, teria igualmente de vir acompanhada de outra prova, designadamente testemunhal, que a confirmasse, e não, como refere o Ac. em recurso, por se depreender das regras da experiência comum, e bem fácil seria demonstrar os factos que os recorridos se propunham provar, bastava para o efeito juntar todas as faturas e todos os recibos de renda ou comprovativos de pagamento e apresentar prova testemunhal que confirmasse que, durante o período em crise, os recorridos residiram na habitação a que o contrato de arrendamento junto aos autos alude; por último, nunca os recorridos alegaram, e muito menos demonstraram, dificuldades inultrapassáveis de apresentação de prova inequívoca dos factos em presença.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIV. A fundamentação segundo a qual “é pressuposto, segundo as regras da experiência comum, o respetivo pagamento das rendas” eleva o facto em questão ao patamar do facto notório, o que no nosso modesto entendimento, revela alguma temeridade do acórdão proferido e viola o n.º 1 do art.º 342º do CC e o art.º 607º do CPC., pelo que o acórdão proferido é suscetível de revista nos termos da al. a) e b) do art.º674ºdo CPC, vide Ac. deste Venerando Tribunal de 26/02/2019, proferido no âmbito do processo 1316/14.4TBVNG-A.P1; e Ac. de 03/11/2021, proferido no âmbito do processo 4096/18.0T8VFR.P1.S1; o Ac. do TRL de 07/06/2018, proferido no âmbito do processo 29369/15.0T8LSB.L1-6; e o Ac. do TRC de 11/02/2020, proferido no âmbito do processo 37/08.1TBSCD.C1. </font></i><br>
</p><p><i><font>XV. Assim, face a inexistência de prova bastante que o demonstre, deve materialidade constante dos pontos T) e V) da matéria de facto provada ser alterado para matéria de FACTO NÃO PROVADA, o que se requer.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVI. O Ac. em análise decidiu condenar a “autora/reconvinda a pagar aos réus/reconvintes o montante a apurar em sede de liquidação de sentença, com o limite de 15.341,31€, que resultar do diferencial entre o valor da obra em falta à data da resolução do contrato (já determinado nos termos expostos -35.399,41€-) e o custo que os AA. tiveram que pagar ao novo empreiteiro para finalizar a conclusão da obra, considerando apenas o valor que os RR. terão que despender pela conclusão dos trabalhos que já se mostravam contidos no contrato celebrado com a A. (e no qual não deverá ser considerada a eliminação das patologias a que alude a alínea HH) dos factos provados, em cujo valor a autora já se mostra condenada), a apurar nos termos do disposto pelo artigo art. 609.º, n.2 do CPC, por danos decorrentes do interesse contratual positivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVII. Constituiu motivação da decisão o seguinte trecho: “Reportando à situação dos autos, teremos que face à resolução operada, terão os RR. direito a ser indemnizados pela A., no pagamento do diferencial entre o valor de obra em falta à data da resolução do contrato, e o preço que os AA. tiveram de pagar ao novo empreiteiro para finalizar a mesma (com o limite do pedido deduzido na acção 15.341,31€ - considerando o princípio do dispositivo - 3º n.1 do CPC - e o princípio do nº 1, do art. 609º, do CPC, segundo o qual a sentença não pode exceder os limites quantitativos e qualitativos do pedido).”</font></i><br>
</p><p><i><font>XVIII. Assim, ficaram por indicar as circunstâncias [leia-se factos!] que, em homenagem ao princípio da equidade previsto no arts. 8.º, n.º 3, do Código Civil, e no art.º 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, determinaram a condenação da autora [para além de tudo em quanto foi condenada em matéria de interesse contratual negativo] no diferencial entre o valor de obra em falta à data da resolução do contrato, e o preço que os RR tiveram de pagar ao novo empreiteiro para finalizar a mesma, o que consubstancia a falta de fundamentação de facto que justifica a decisão, e, por conseguinte, a nulidade da sentença prevista na primeira parte da al. b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIX. Ou, se assim não se entender, verifica-se oposição entre os fundamentos [que ditam a verificação de factos que imponham a reposição da equidade] e a decisão proferida [de condenação da autora sem a verificação dos factos que determinam a mesma], o que consubstancia nulidade da sentença prevista na primeira parte da al. c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XX. Por outro lado, e como se disse, inexiste matéria que justifique a condenação da recorrente nos termos expostos, na senda aliás da decisão proferida na primeira instância, sendo certo que o tribunal julgou não provado, factualidade entretanto transitada em julgado, que:“5-A adjudicação da conclusão da obra a outra empresa fez com que a obra passe a ter um custo final, quando terminada nos termos que a Ré se havia comprometido e contratualizado edificar, pela quantia de 158.646,15 euros (75.000,00 já pagos à aqui AA. e 83.646,15 euros pelo que pagará à empresa a quem adjudicada a conclusão da obra), ou seja, por um preço superior em pelo menos 15.341,31 euros (158.646,15 – 143.304,84).”</font></i><br>
</p><p><i><font>XXI. Em matéria de consequências da resolução do contrato e de calculo dos valores das indemnizações a pagar é maioritária a posição doutrinária e jurisprudencial que defende ser só de admitir, na resolução do contrato, inclusive nos casos de incumprimento definitivo, a indemnização dos danos provenientes da não realização do contrato, ou seja, em sede de violação do interesse contratual negativo.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXII. E diga-se, que no caso dos autos, a recorrente assentou a sua atuação tendo por base tal entendimento. E fê-lo, não porque este sempre seria economicamente mais favorável, mas porque é essa a interpretação do que para si resulta do preceituado no art.º 227º do CC em conjugação com os arts. 8.º, n.º 3, do Código Civil, e no art.º 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIII. No modesto entendimento da recorrente, conforme brilhantemente resume o AC. deste Venerando Tribunal de 28/09/2021, proferido no âmbito do processo 344/18.5T8AVR.P1.S1., “a resolução tem uma função puramente repristinatória do satus quo ante, dado o seu efeito ex tunc equiparado ao da invalidade, por via de regra, retroativo, conforme o estatuído, respetivamente, nos artigos 433.º, com referência aos artigos 289.º e 290.º, e 434.º, n.º 1, do CC. E, como tal, seria contraditório que o contraente fiel optasse pela resolução e, ao mesmo tempo, pretendesse a indemnização de um prejuízo que o colocasse, afora o efeito resolutivo, numa posição equivalente àquela em que estaria se o contrato tivesse sido celebrado – dano in contractu, correspondente ao interesse contratual positivo. Daí que, em caso de resolução, só lhe restasse optar pela indemnização dos prejuízos, a título de danos emergentes ou de lucros cessantes, mas referentes à violação do interesse contratual negativo (dano in contrahendo ou dano de confiança); ou seja, os prejuízos que não teria se não tivesse celebrado o contrato frustrado, nomeadamente os lucros, mas apenas os lucros que deixara de obter pela não celebração de outros negócios alternativos. Seria neste sentido, segundo esta orientação que deveria ser interpretada a ressalva do direito a indemnização feita no n.º 2 do artigo 801.º do CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIV. Tal orientação é sustentada, entre outros, por Francisco Pereira Coelho -In Obrigações – Sumários das Lições ao Curso de 1966-1967, edição policopiada, Coimbra, 1967, p. 230 -; Pires de Lima e Antunes Varela - in Código Civil Anotado, Vol. II, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 58, nota 3. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 7.ª Edição, 1997, pp. 109-112 -; Inocêncio Galvão Telles - In Manual de Direito das Obrigações, tomo 1, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1965, pp. 248 e segs., sendo que na na 7.ª Edição desta última obra, de 1997, o Autor, em nota de rodapé (1) a pag. 463, admite que “o julgador, além dos danos negativos, atenda também aos positivos se, no caso concreto, essa solução se afigurar mais equilibrada segundo as circunstâncias. -; Carlos Mota Pinto - In Cessão da Posição Contratual, Almedina, 1982, p. 412, nota 1-; Almeida Costa - In Direito das Obrigações, Almedina, 12.ª Edição, 2009, pp. 1044-104 -; Pinto Monteiro - In Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, 1990, pp. 694, embora ressalvando, na nota 1568, que tal entendimento não é inteiramente pacífico -; Calvão da Silva - In Responsabilidade Civil do Produtor, Almedina, 1990, p. 248, perfilhando a tese de Pereira Coelho.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXV. Pelo que, ao decidiu como decidiu, o Ac. da Relação violou o preceituado no art.º 227º, 562º a 564º do CC, em conjugação com os arts. 8.º, n.º 3, do Código Civil, e no art.º 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, de modo que deve ser revogado, e substituído por outro que absolva a recorrente do pagamento de danos resultantes de alegado interesse contratual positivo, por inadmissibilidade legal, o que se requer, cfr al. a) do n.º 1 do art.º 674º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVI. Ainda que assim não se entenda, os factos em presença não justificam que excecional e complementarmente se determine a condenação da recorrente [para além de tudo em quanto foi condenada em matéria de interesse contratual negativo] no diferencial entre o valor de obra em falta à data da resolução do contrato, e o preço que os recorridos tiveram de pagar ao novo empreiteiro para finalizar a mesma, vide entre o mais, ac. de 08/09/2016 - processo n.º 21769/10.9T2SNT.L1.S1 (rel. Lopes do Rego) - deixou-se expresso que “Embora se venha admitindo que, em determinadas circunstâncias específicas, a indemnização, no caso de resolução de contrato, possa não se circunscrever absolutamente ao perímetro dos danos ligados à violação do interesse contratual negativo, podendo abarcar justificadamente outros danos, como forma de obter uma plena tutela do interesse do credor, não é aceitável que, por sistema, a parte que resolve o contrato pretenda obter automaticamente todas as prestações a que teria direito se o contrato resolvido subsistisse intocado na sua eficácia inter partes – cabendo-lhe, neste caso, pedir em primeira linha indemnização pelo interesse contratual negativo e só excepcionalmente e em situações materialmente fundadas lhe sendo possível peticionar uma indemnização complementar.” E ac. de 7461/11.0TBCSC.L1.S1 Tomé Gomes que exaustivamente faz o histórico da evolução doutrinaria e jurisprudencial e no mesmo sentido conclui) é a de que, com abertura jurisprudencial à indemnização pelo interesse contratual positivo no caso da resolução do contrato as decisões que a têm vindo a defender respaldam sempre a remissão para o crivo fixado no ac. de 12/2/2009 referente ao equilíbrio e/ou benefício justificado, por contraposição aquele que levaria a um desequilíbrio manifesto e ostensivo. Assim, sendo de considerar admissível a cumulação da resolução com a indemnização pelo interesse contratual positivo impõe-se sempre uma ponderação casuística a fazer, à luz do princípio da boa-fé, no concreto contexto dos interesses em jogo, mormente em função do tipo de contrato em causa, de modo a evitar situações de grave desequilíbrio na relação de liquidação ou de benefício injustificado por parte do credor lesado” [sublinhado nosso].</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVII. Pelo que, motivando a sua decisão unicamente na resolução operada, a decisão da Relação viola o preceituado nos art.º 227º, n.º 1, 562 a 564º do CC e o princípio constitucional da igualdade relativa, previsto no art.º 8.º, n.º 3, do Código Civil, e no art.º 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, de modo que deve ser revogada, e substituída por outra que absolva a recorrente do pagamento de danos resultantes de alegado interesse contratual positivo, por inadmissibilidade legal, o que se requer, cfr al. a) do n.º 1 do art.º 674º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVIII. Atento o escrito nas páginas 90 e 95 do Ac. em crise, em face do sentido da decisão, o valor da empreitada já paga [por referência ao valor de 107.905,53€] é de 30.672,98€ [e não 32.905,43€] e o valor em falta, se a obra tivesse sido concluída pela recorrente, era de 32.905.53€ [e não de 35.399,41€].</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIX. Enforma assim o Ac. em crise de erro material – erro de cálculo, motivo pelo qual deve o mesmo ser retificado, o que, nos termos do n.º 1 e 2 do art.º 614º do CPC se requer.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXX. Quanto ao recurso da decisão que recaiu sobre o contrato celebrado entre as partes, concluíram as decisões proferidas que “quanto ao preço da obra, na falta de prova segura que permita afirmar as alterações aos termos do contrato junto aos autos, provou-se a versão que é objetivamente suportada pelo mesmo”, todavia, as mesmas violam o princípio do dispositivo previsto no n.º 1 do art.º 5º e n.º 1 do art.º 609º ambos do CPC, pelo que, deve ser alterada.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXI. No artigo 4º da p.i., a recorrente alegou “que o “contrato de construção” foi celebrado pelo preço total de 159 642,32 Euros [sendo que todas as referências a quantitativos monetários da presente peça processual têm valor de IVA incluído] visto que, antes da execução da obra, os réus optaram pela execução a que correspondem cumulativamente as opções a) e c) do plano de pagamento anexo ao referido contrato” e peticionou serem os recorridos condenados a pagar o remanescente do preço devido tendo em conta o preço acordado de 159 642,32, a percentagem de obra executada e o valor entretanto pago.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXII. Do contrato de construção de fls. 8º v.º a 10 v.º, assinado pela recorrente e recorrido marido, consta do plano de pagamentos de fls. 11, assinado pelo recorrido marido, consta que: “O Plano de Pagamentos dos Trabalhos corresponde a um valor de construção de: A) Execução de estrutura em betão armado, alvenarias exteriores em bloco térmico e pavimento térreo em habitação unifamiliar (Cave + Piso + Cobertura), pelo Valor Global de 34.713,00€ (Trinta e Quatro mil, Setecentos e Treze Euros). B) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Carpintarias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias, Instalações técnicas, conforme caderno de encargos em anexo. Piso + Cobertura (Exclui-se neste preço arranjos de exteriores, mobiliários de cozinha, estores brisa-solares e muros de vedação). Pelo Valor Global de 91.795,00€ (Oitenta e Um Mil, Setenta e Sete Euros e Cinquenta Cêntimos). C) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Serralharias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias, Instalações técnicas, conforme caderno de encargos em anexo. Cave + Piso + Cobertura (Exclui-se neste preço arranjos exteriores, mobiliários de cozinha, estores brisa-solares e muros de vedação). Pelo Valor Global de 95.077,50€ (Noventa e Cinco Mil, Setenta e Sete Euros e Cinquenta Cêntimos). Perfazendo para a execução da Opção a) somada à opção b) o valor global final de 116.508,00€ (Cento e Dezasseis Mil, Quinhentos e Oito Euros), aos quais acresce o valor do IVA à taxa Legal em vigor. Em caso, de mudança da opção b) para c) acresce o diferencial entre as duas opções ao valor final. 1ª Prestação: LEVANTAMENTO DO ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO E INICIO DE OBRAS: 5.000,00€ (Cinco Mil Euros) 2ª Prestação e Seguintes: Serão conforme pedidos de vistoria e consequente libertação de tranches de dinheiro por parte da entidade bancária correspondente a cada processo.”</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIII. Os dizeres riscados não foram alegados/invocados nem por recorrente, nem pelos recorridos, em qualquer peça processual, nem a rasura dos ditos dizeres foi impugnada pelos recorridos; da matéria de facto provada [pontos G), I) e P)] resulta que os recorridos pretenderam a execução de trabalhos de acabamentos na cave da moradia; a recorrente remeteu aos recorridos, que não as devolveram, faturas que imputam ao contrato de empreitada em crise nos autos o preço de 159.642,32 Euros; Da assentada ditada em ata de audiência de julgamento de 12 de abril de 2021, consta que a depoente [recorrida mulher] “confessou que a A. colocou o tubo de distribuição de águas na cave e que as paredes e o teto estavam rebocados, esclarecendo que essas obras estavam inicialmente contratadas”; A matéria do contrato celebrado entre as partes foi objeto de contestação pelos recorridos nos seguintes termos: “art.º 6º Aliás, tal valor, de 116.508,00 (+IVA] resulta expressamente do contrato que da própria autora junta, sendo que, só em caso de mudança para a opção A) + C) é que existiria o pagamento do diferencial”. art.º 7º Essa mudança, opcional [opção A) + C)] NUNCA EXISTIU, nunca foi expressa ou tacitamente solicitada, e muito menos foram encetadas obras nesse sentido por parte da empreiteira. art.º 51ºFazendo com que a obra passe a ter um custo final, quando terminada nos termos que a ré se havia comprometido e contratualizado edificar, pela quantia de 158.646,15 euros […]”.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIV. Conforme resume MARIANA FRANÇA GOUVEIA, in “O princípio dispositivo e a alegação de factos em processo civil: a incessante procura da flexibilidade processual”, texto escrito para os estudos em homenagem aos Professores Palma Carlos e Castro Mendes, o princípio dispositivo é a tradução processual do princípio constitucional do direito à propriedade privada e da autonomia da vontade. Subjacente ao processo civil está um litígio de direito privado, em regra disponível, pelo que são as partes que têm o exclusivo interesse na sua propositura em tribunal. O interesse público, neste âmbito, limita-se à correta aplicação do seu Direito para que haja segurança e paz nas relações privadas. Assim, o exato limite da intervenção estadual é fixado pelas partes que não só têm a exclusiva iniciativa de propor a ação (e de se defender), como delimitam o seu objeto.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXV. In casu, verifica-se que nem a recorrente nem os recorridos defenderam a versão que o Tr | [0 0 0 ... 0 0 1] |
KjJxu4YBgYBz1XKvGwlr | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Proc. nº 583/16.3T8FND.C1.S1 </font><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Acordam, em conferência, os Juízes do Supremo do Tribunal de Justiça, 1ª Secção:</font>
<p><b><font>1</font></b><font>- No Tribunal da Relação de Coimbra foi proferido acórdão que confirmando a decisão do relator que julgou intempestiva a apresentação do recurso de apelação, deliberou: “</font><i><font>Julga-se improcedente a reclamação e, em consequência, mantém-se a decisão do relator”</font></i><font>.</font>
</p><p><b><font>2</font></b><font>- AA, requerida na presente ação especial de divisão de coisa comum, interpôs recurso de apelação contra a sentença proferida em 4 de Julho de 2019 que, pronunciando-se sobre a questão da indivisibilidade da coisa comum em causa nos autos [prédio urbano, situado em ..., n.º …, ... com a área total de 255 m2, sendo 188,4 m2 de área coberta; e 66,6 m2 de área descoberta, composto de casa de rés-do-chão, 1º andar e logradouro, a confrontar a norte com terreno público, do sul com ..., do Nascente com a rua e do poente com Casa dos ..., inscrito na matriz da freguesia do ... sob o artigo ….], decidiu declarar a indivisibilidade em substância do prédio.</font>
</p><p><font>O relator entendeu que o recurso fora interposto fora do prazo legal e que, por tal razão, não podia conhecer-se do objeto do recurso, entendimento confirmado em conferência. As razões de tal entendimento foram as seguintes:</font>
</p><p><font>- O recurso foi interposto no 31.º dia a contar da notificação da decisão;</font>
</p><p><font>- Vista a tramitação do processo especial de divisão de coisa comum constante dos artigos 925 a 929 do CPC, a decisão recorrida correspondia à que estava prevista no n.º 2 do artigo 926 do CPC, ou seja, à decisão proferida pelo juiz sobre questões suscitadas pelo pedido de divisão, no caso, sobre a questão da indivisibilidade; questão que o juiz tem o dever de conhecer oficiosamente ainda que não suscitada pelas partes (n.º 4 do artigo 926 do CPC).</font>
</p><p><font>- Da decisão proferida pelo tribunal sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão, ao abrigo do n.º 2 do artigo 926 do CPC, designadamente sobre a questão da indivisibilidade cabia, nos termos da parte final deste mesmo preceito, apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo; </font>
</p><p><font>- Estava-se perante um caso de apelação autónoma especialmente previsto na lei, a que se referia a alínea i) do n.º 2 do artigo 644 do CPC;</font>
</p><p><font>- Salvo disposição legal em contrário, que não existia no caso, o prazo para a interposição dos recursos de apelação especialmente previstos na lei era o de 15 dias a contar da notificação da decisão, por aplicação conjugada da alínea i) do n.º 2 do artigo 644 do CPC com o n.º 1 do artigo 638 do mesmo diploma, na parte em que este dispõe que o prazo para a interposição do recurso reduz-se para 15 dias nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644 do CPC;</font>
</p><p><font>- A interposição do recurso de apelação no 31.º dia posterior à notificação da decisão recorrida estava fora do prazo legal; </font>
</p><p><font>- Era condição do conhecimento do recurso que o mesmo tivesse sido interposto dentro do prazo previsto na lei;</font>
</p><p><font>- A circunstância de ele ter sido interposto fora de prazo obstava ao conhecimento do respetivo objeto.</font>
</p><p><b><font>3</font></b><font>- Do acórdão da Relação que julgou intempestivo o recurso de apelação foi interposto recurso de revista por AA, requerida na presente ação especial de divisão de coisa comum, no qual conclui:</font>
</p><p><i><font>“A) A decisão jurisdicional de intempestividade de recurso de que aqui se recorre, proferida no Acórdão do Venerando TRCoimbra, não havia sido suscitada pelo Tribunal de primeira instância, que admitiu o recurso de apelação interposto e decorreu de uma interpretação feita, pela primeira vez no processo, por aquele, sendo certo que põe termo à fase do processo de divisão de coisa comum que, como adiante se verá, não é apenas declarativa mas mesmo constitutiva, além do que contradiz jurisprudência de outro Tribunal da Relação.</font></i>
</p><p><i><font>B) Nessa medida, não só o recurso será em abstracto admissível, subsumindo-se à previsão do nº 1 do artº 671º/1 do CPCivil, como também a questão que se coloca no presente recurso, conhecida no Douto Acórdão recorrido, não foi ainda sindicada consagrando por isso, a sua deduzida e eventual admissão, a garantia legal e Constitucional do duplo grau de jurisdição, não se verificando, para mais, a dupla conforme impeditiva, como prevista e estatuída no artº 671º/3 do CPC, isto se Vª Exªs entenderem a sua aplicabilidade in casu.</font></i>
</p><p><i><font>C) A recorrente reafirma e dá por inteiramente reproduzidas as alegações e conclusões produzidas no presente recurso, bem como no requerimento apresentado ao abrigo do disposto no artº 655º/1 do CPCivil, assim como no requerimento de prolacção do Acórdão de que agora se recorre, realçando que o conhecimento da presente questão é da máxima importância para melhor aplicação do direito, na medida em que visa clarificar se a decisão a que se refere o artº 926º/2 do CPCivil constitui sentença ou, pelo contrário, mero despacho;</font></i>
</p><p><i><font>D) Tal esclarecimento é de grande relevância social dada a enormíssima quantidade de situações de compropriedade na ordem jurídica, e de acções de divisão de coisa comum, isto tanto mais que a sua fase executiva sofreu profundas alterações, promovendo soluções profundamente lesivas da manutenção da propriedade na pessoa de algum dos comproprietários.;</font></i>
</p><p><i><font>E)- Certo é que há, pelo menos, uma decisão em sentido diametralmente oposto à proferida nos autos, cuja cópia se junta a final, na medida em que:</font></i>
</p><p><i><font>i) em ambas se fixou indivisibilidade do imóvel a dividir;</font></i>
</p><p><i><font>ii) em ambas o tribunal conheceu de qual o prazo de recurso e qual, em concrecto, a norma do artº 644º do CPC aplicável, fazendo-o, um e outro, de forma diametralmente oposta, tendo aquele considerado aplicável o disposto no nº 1 desse artigo e, logo, o prazo recursivo de trinta dias, e o agora em sindicância o a al. i) do nº 2 do mesmo artigo e, logo, o prazo recursivo de quinze dias;.</font></i>
</p><p><i><font>F) Finalmente, a matéria do Douto Acórdão recorrido é nova nos autos, não tendo sequer sido suscitada em primeira instância, na qual o recurso de apelação foi admitido, pelo que se impõe, sempre salvo melhor opinião e o devido respeito, que é muito, respeitar a regra do duplo grau de jurisdição, como elemento integrante, antes de mais nada, do princípio do Estado de Direito Democrático, como consagrado no artº 2º da Constituição da República Portuguesa, sendo que a recorerente entende que a decisão singular proferida pela Exmª Senhora Desembargadora Relatora não o garante;</font></i>
</p><p><i><font>G) Na Douta Sentença recorrida, veio o Mmº Juiz a quo fixar a indivisibilidade do prédio objecto da acção, por entender que tal indivisibilidade, invocada pela A, não foi contestada pela R., tendo pois o recurso de apelação sido interposto de decisão que, nos termos do disposto no artº 926º/2 do NCPCivil, fixou a indivisibilidade do imóvel objecto da presente acção, dando-se aqui por reproduzidas as respectivas conclusões;</font></i>
</p><p><i><font>H) O recurso foi apresentado a Juízo em 24.09.2019, no terceiro dia útil posterior ao trigésimo dia após notificação, como resulta dos autos -considerando a suspensão de prazo por efeito de férias judiciais-, tendo a respectiva multa sido liquidada e paga antes da sua junção aos autos, reiterando, o douto Acórdão recorrido, o que havia sido fixado no Douto Despacho reclamado, a saber, que a decisão prevista no artº 926º/2 do NCPCivil consta do elenco de despachos previstos no artº 644º/2/i) do NCPC, razão porque se fixou que o respectivo prazo de recurso é de 15 dias e não de 30, por aplicação do disposto no seu nº 2, isto porque deu como pressuposto que se está ante mero despacho e não ante verdadeira sentença.</font></i>
</p><p><i><font>I) Como bem sumariza (entre outros) o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23.02.2017, proferido no Procº 166/12.7T2MFR-E.L1-2 (Relatora Exmª Senhora Desembargadora Ondina Carmo Alves) ( in </font></i><i><font>www.dgsi.mj.pt</font></i><i><font> ) : “(…)1.O processo de divisão de coisa comum, previsto nos artigos 925.º a 930.º do Código de Processo Civil, destina-se ao exercício do direito atribuído no artigo 1412.º do Código Civil, nos termos do qual, em geral, nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão.</font></i>
</p><p><i><font>2.Esta acção especial comporta duas fases, uma declarativa e outra executiva.</font></i>
</p><p><i><font>3.A fase declarativa destina-se à determinação da natureza comum da coisa, à fixação das respectivas quotas, à divisibilidade em substância e jurídica da coisa dividenda.</font></i>
</p><p><i><font>4.A fase executiva destina-se ao preenchimento dos quinhões em espécie ou por equivalente, mediante adjudicação, por acordo ou por sorteio, ou, se a coisa for indivisível, à sua adjudicação a algum dos interessados ou à sua venda.</font></i>
</p><p><i><font>(…)”</font></i>
</p><p><i><font>J) Está-se pois perante um processo especial que, se não for remetido para os meios comuns ao abrigo do disposto no nº 3 do artº 926º do NCPCivil, se divide numa parte declarativa/constitutiva e numa parte executiva, sendo que a fase declarativa termina, precisamente, com a prolação da decisão a que se refere o nº 2 do mesmo artigo e, em concreto nos autos, traduz a Douta Sentença recorrid, sendo que a fase declarativa da acção de divisão de coisa comum processa-se, em regra, como incidente de instância, sobre o qual recai prazo de recurso também de trinta dias – Neste sentido, entre outros, Douto Ac TRC, de 12.03.2013, proferido no processo 86/11.2TBVZL-A.C1 (Relatora Exmª Senhora Desembargadora Sílvia Pires) (in </font></i><i><font>www.dgsi.mj.pt</font></i><i><font> ), no qual se sumariza:</font></i>
</p><p><i><font>L)16- O que se discute na fase declarativa é absolutamente diverso daquilo que se fará na fase seguinte, e fixa, de forma definitiva, a medida e conteúdo de um direito de propriedade -como uma verdadeira acção de reivindicação-, assim como a in/divisibilidade física e jurídica de um bem imóvel, sendo por isso que o legislador entendeu, e fixou, no referido artº 926º/2 do NCPCivil, que a apelação dessa Sentença/Decisão sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.</font></i>
</p><p><i><font>M) Certo é que a Doutrina Recente entende que o prazo de recurso é de trinta dias, sendo aplicável, à sentença proferida ao abrigo do disposto no artº 926º/2 do NCPC o regime do artº 638º/1 do NCPC – neste sentido, Luís Filipe Pires de Sousa in “Processos Especiais de divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas”, Almedina – 2016, ele próprio referindo Manuel Tomé, e muito Doutamente referido na Douta Decisão Singular proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa no seu processo de reclamação – artº 643º do CPC- nº 160/15.6T8MFR-A.L1 (Relator Exmº Senhor Desembargador Nuno Sampaio), que se junta como documento nº 1 (devidamente anonimizado) por não ter sido encontrado disponibilizado online, e no qual se conclui: “Numa acção de divisão de coisa comum a “decisão” prevista no nº 2 do artº 926º do Código de Processo Civil é uma sentença, da qual cabe recurso de apelação a interpor no prazo de trinta dias, nos termos dos art.ºs 638º, nº 1 e 644º, nº 1, al. a) do mesmo artigo.”</font></i>
</p><p><i><font>N) O Douto Acórdão recorrido, ao considerar que o prazo de recurso é, in casu, de quinze dias por se tratar de mero despacho interlocutório, não só viola directamente a previsão do artº 926º/2 do NCPC, como viola também o disposto nos artºs 638º/1/primeira parte e 644º/1/a) do mesmo Diploma, por não aplicação do seu dispositivo e, isso sim, errada aplicação do dispositivo da última parte daquele nº 1 (do artº 638º) e dal al. i) do nº 2 daquele artº 644º;</font></i>
</p><p><i><font>O) O artº 926º/2 do Código de Processo Civil, interpretado -como o foi no Douto Acórdão recorrido-, no sentido de que a expressão ali constante “decisão” traduz um mero despacho e não uma sentença constitutiva de direitos, desconsiderando assim o seu efeito constitutivo na fixação de um direito real de propriedade, é inconstitucional não só por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, como vertida para o artº 20º/5 da Constituição da República Portuguesa, mas também por violação do direito, constitucionalmente garantido, à propriedade privada, esta na medida em que tal configura uma desapropriação através de acto jurídico desprovido de dignidade para o efeito.</font></i>
</p><p><i><font>P) Também o artº 638º/1 do CPCivil, interpretado como o foi no Douto Acórdão recorrido-, no sentido de que, por a “decisão” prevista no seu artº 926º/2 não integrar a sua previsão por não ser uma sentença mas um mero despacho, não lhe sendo por isso aplicável a sua estatuição, é também inconstitucional não só por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, como vertida para o artº 20º/5 da Constituição da República Portuguesa, mas também por violação do direito, constitucionalmente garantido, à propriedade privada, esta na medida em que tal configura uma desapropriação através de acto jurídico desprovido de dignidade para o efeito.</font></i>
</p><p><i><font>Q) Nessa medida, ambas as referidas normas devem ser fixadas inconstitucionais, na interpretação que lhes foi dada no Douto Acórdão recorrido, o que ora expressamente se requer.</font></i>
</p><p><i><font>R) Assim, impunha-se, na perspectiva da Recorrente, decisão diversa da que foi seguida no Douto Acórdão Recorrido, a saber: a de ser fixada a tempestividade do recurso de apelação interposto nos autos, o que não ocorreu, razão porque o mesmo deve ser revogado, o que desde já expressamente se requer;</font></i>
</p><p><i><font>Pelo que se requer a Vªs Exªs, Senhores Conselheiros:</font></i>
</p><p><i><font>a) Seja admitido o presente recurso, ao abrigo do disposto no artº 629º/1 e 671º/1 do CPCivil;</font></i>
</p><p><i><font>b) Subsidiariamente, seja admitido o presente recurso ao abrigo do disposto no artº 672º do mesmo Diploma;</font></i>
</p><p><i><font>c) Ainda subsidiariamente, seja admitido o presente recurso ao abrigo do disposto nos artºs 629º/1 e 2/d), e 671º/1/b) do mesmo diploma, este último interpretado em conformidade com a Constituição da República Portuguesa;</font></i>
</p><p><i><font>d) Em qualquer dos casos, que seja dado provimento ao recurso, de acordo com as suas conclusões, aqui dadas por reproduzidas”.</font></i>
</p><p><b><font>4</font></b><font>- O recurso foi admitido ao abrigo do disposto no art. 652, nº 5 al. b) e 671, nº 1, ambos do CPC.</font>
</p><p><font>Dispensados os vistos, cumpre decidir.</font>
</p><p><b><font>5</font></b><font>- </font><b><font>DECIDINDO</font></b><font>:</font>
</p><p><font>Em causa está uma ação de divisão de coisa comum e saber se da decisão proferida pelo tribunal sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão ao abrigo do n.º 2 do artigo 926 do CPC, nos termos da parte final deste preceito o prazo do recurso de apelação é de 30 dias, como entende a recorrente, ou de 15 dias, como entendeu o tribunal recorrido.</font>
</p><p><font>A ação especial de divisão de coisa comum é considerada uma distinta forma de dissolução da comunhão ou compropriedade, caracterizada por se dirigir a todos os consortes e ter como fim a cessação da compropriedade, conferindo um carácter universal à ação – cfr. neste sentido Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª ed, 387.</font>
</p><p><font>Para a solução da questão do recurso interessam as normas adjetivas quanto à forma processual de divisão da coisa comum, e estas, estão contidas nos artigos 925 a 929 do CPC.</font>
</p><p><font>Interessa, essencialmente a norma do art. 926:</font>
</p><p><font>“</font><i><font>Citação e oposição</font></i>
</p><p><i><font>1 - Os requeridos são citados para contestar, no prazo de 30 dias, oferecendo logo as provas de que dispuserem.</font></i>
</p><p><i><font>2 - Se houver contestação ou a revelia não for operante, o juiz, produzidas as provas necessárias, profere logo decisão sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão, aplicando-se o disposto nos artigos 294.º e 295.º; da decisão proferida cabe apelação, que sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.</font></i>
</p><p><i><font>3 - Se, porém, o juiz verificar que a questão não pode ser sumariamente decidida, conforme o preceituado no número anterior, manda seguir os termos, subsequentes à contestação, do processo comum.</font></i>
</p><p><i><font>4 - Ainda que as partes não hajam suscitado a questão da indivisibilidade, o juiz conhece dela oficiosamente, determinando a realização das diligências instrutórias que se mostrem necessárias.</font></i>
</p><p><i><font>5 - Se tiver sido suscitada a questão da indivisibilidade e houver lugar à produção de prova pericial, os peritos pronunciam-se logo sobre a formação dos diversos quinhões, quando concluam pela divisibilidade.</font></i><font>”</font>
</p><p><font>A regulação do processamento para a divisão de coisa comum é um procedimento simples e célere, que segue a forma incidental, se houver contestação ou a revelia não for operante. </font>
</p><p><font>No caso vertente, a ré, “válida e regularmente citada, não contestou a pretensão de divisão da coisa comum, nem os respetivos fundamentos”.</font>
</p><p><font>Se tivesse havido contestação produzir-se-iam as provas necessárias e o juiz decidiria, aplicando-se, neste caso, os art.s 294 e 295, ou seja, “a parte não pode produzir mais de cinco testemunhas” (n.º 1 do art. 294) e, “finda a produção de prova, pode cada um dos advogados fazer uma breve alegação oral, sendo imediatamente proferida decisão por escrito, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 607” (art. 295).</font>
</p><p><font>Em qualquer das situações, ou seja, com oposição ou não, é proferida decisão (exceto se a questão não puder ser sumariamente decidida – nº 4 do referido art. 926) sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão em tudo semelhante a uma sentença.</font>
</p><p><font>Sentença em que a 1ª Instância decidiu: “DECLARO A INDIVISIBILIDADE EM SUBSTÂNCIA DO PRÉDIO IDENTIFICADO NO PONTO 1), DO FACTOS DADOS COMO PROVADOS (ASSENTES)”.</font>
</p><p><font>A declaração de indivisibilidade de prédio urbano, é decisão final correspondente e respeitante à fase declarativa do processo especial de divisão de coisa comum, fase essa em que se define o direito e a que alude o art. 926, nºs 2 e 3 do CPC.</font>
</p><p><font>“A tudo acresce, note-se, de forma incontornável, a imposição legal de conhecimento oficioso da questão da indivisibilidade, vale dizer, do dever proferir decisão pelo Tribunal, na 1ª Instância ou em recurso, logo que o processo forneça os necessários elementos – art. 1053-4 CPC” [atual art. 926 nº 4] - Acórdão nº STJ_08A1432 de 05-06-2008.</font>
</p><p><font>Acrescenta este aresto que se trata de decisão final respeitante à fase declarativa do processo, fase esta em que se define o direito a que alude o art. 1053-2 e 3 CPC, agora art. 926 nºs 2 e 3 do NCPC.</font>
</p><p><font>Como refere o Ac. da Rel. de Lx. de 23-02-2017, no Proc. nº 166/12.7T2MFR-E.L1-2, </font><i><font>“1.O processo de divisão de coisa comum, previsto nos artigos 925 a 930 do Código de Processo Civil, destina-se ao exercício do direito atribuído no artigo 1412 do Código Civil, nos termos do qual, em geral, nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão. 2.Esta ação especial comporta duas fases, uma declarativa e outra executiva. 3.A fase declarativa destina-se à determinação da natureza comum da coisa, à fixação das respetivas quotas, à divisibilidade em substância e jurídica da coisa dividenda. 4.A fase executiva destina-se ao preenchimento dos quinhões em espécie ou por equivalente, mediante adjudicação, por acordo ou por sorteio, ou, se a coisa for indivisível, à sua adjudicação a algum dos interessados ou à sua venda</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>E o Ac. da Rel. de Guimarães de 21-02-2019, proferido np Proc. nº 37/16.8T8VRM.G1 refere: </font><i><font>“2- A ação de divisão de coisa comum destina-se ao exercício do direito potestativo conferido aos comproprietários de porem termo à comunhão e, do ponto de vista processual, desenvolve-se em duas fases distintas: uma fase declarativa e uma fase executiva. 3- Na fase declarativa define-se o direito do autor, através da determinação da natureza da coisa, da existência ou subsistência da invocada compropriedade sobre a coisa, fixação das quotas dos comproprietários e determinação do caráter divisível ou indivisível da coisa. 4- Instaurada ação de divisão de coisa comum, o aí réu tem, em sede de contestação, de deduzir todas as exceções de que disponha ao direito de compropriedade que o autor se arroga titular sobre a coisa (art. 573 do CPC), sob pena de não fazendo não poder suscitar essas exceções posteriormente. 5- Não suscitando o réu da ação de divisão de coisa comum essas exceções (ou fazendo-o, mas não logrando fazer prova dessa matéria de exceção que deduziu), caso seja proferida sentença, na fase declarativa da ação de divisão de coisa comum, declarando que o autor e o réu são comproprietários da coisa dividenda, não pode esse réu, posteriormente, instaurar ação contra o autor da ação de divisão de coisa comum pedindo o reconhecimento do seu direito de propriedade exclusiva sobre essa coisa, por a isso se opor o princípio da concentração da defesa (art. 573º do CPC) e a autoridade do caso julgado da decisão, transitada em julgado, proferida na fase declarativa da ação de divisão de coisa comum, que julgou procedente essa ação, reconhecendo que a coisa dividenda é compropriedade desse autor e réu</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>Do exposto resulta que uma decisão como a proferida na 1ª Instância em que se decide: “DECLARO A INDIVISIBILIDADE EM SUBSTÂNCIA DO PRÉDIO IDENTIFICADO NO PONTO 1), DO FACTOS DADOS COMO PROVADOS (ASSENTES)” que termina a fase declarativa desta forma especial de processo e que pode formar caso julgado (declarada a compropriedade não se pode posteriormente vir pedir o reconhecimento da propriedade em exclusivo), é uma verdadeira e real sentença.</font>
</p><p><font>E em relação a essa parte declarativa é decisão proferida em 1ª Instância que põe termo à causa, pelo que o recurso de apelação cabe no nº 1, al. a), do art. 644 do CPC, sendo o prazo para a interposição do recurso de apelação de 30 dias, nos termos do nº 1, primeira parte, do art. 638 do mesmo CPC.</font>
</p><p><font> Assim, a expressão da norma do art. 926 nº 3 do CPC, parte final, “da decisão proferida cabe apelação, que sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo”, trata-se de apelação de sentença que põe termo àquela causa (fase declarativa).</font>
</p><p><font>Deste modo, se discorda dos fundamentos do acórdão recorrido quando refere: </font><i><font>“Ora, o n.º 2 do artigo 926.º do CPC, na parte em que prevê recurso de apelação da decisão proferida sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão, designadamente sobre a questão da indivisibilidade da coisa comum, é preceito especial em relação ao do n.º 1 do artigo 644.º do mesmo diploma. E assim sendo, a recorribilidade da decisão decorre directamente do n.º 2 do artigo 926.º do CPC e não do n.º 1 do artigo 644.º do mesmo diploma. Quando a recorribilidade de uma decisão decorrer directamente de uma norma especial, o recurso nela prevista é um caso de recurso (no caso apelação) especialmente previsto na lei. </font></i>
</p><p><i><font>A especialidade do recurso interposto contra a decisão proferida sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão manifesta-se ainda no seu modo de subida (subida nos próprios autos) e no seu efeito (efeito suspensivo). </font></i>
</p><p><i><font>Manifesta-se no seu modo de subida pois, caso a recorribilidade da citada decisão resultasse da norma geral da alínea a) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC, como sustenta a recorrente, a apelação subiria em separado. E subiria em separado porque, em relação às apelações previstas no artigo 644.º do CPC, só sobem nos próprios autos as previstas no n.º 1 do artigo 645.º do mesmo diploma e a presente apelação não se ajusta a nenhuma delas.</font></i>
</p><p><i><font>Manifesta-se no seu efeito porque resulta dos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 647.º do CPC que, em matéria de efeito da apelação, a regra é o efeito meramente devolutivo e a presente apelação tem efeito suspensivo. </font></i>
</p><p><i><font>Sendo a apelação da decisão que se pronuncia sobre as questões suscitadas pelo pedido de divisão um caso de apelação especialmente previsto na lei, o prazo para a sua interposição é o de 15 dias a contar da notificação da decisão, por aplicação do n.º 1 do artigo 638.º do CPC, na parte em que estabelece que o prazo para interposição do recurso reduz-se para 15 dias nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644.º do CPC [só assim não seria se houvesse disposição legal em contrário, o que não é o caso]”</font></i><font>.</font>
</p><p><font>Temos que o facto de a norma do art. 926, nº 2, parte final, ao dispor, “da decisão proferida cabe apelação, que sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo” mais reforça a força dessa decisão como final, relativamente à fase declarativa que com essa decisão/sentença se encerra.</font>
</p><p><font>E o Ac. do STJ de 14-12-2016, proferido no proc, nº 232/15.7TGDM-B.P1.S1 refere que: “o n.º 2 do artigo 644 prefigura hipóteses de recurso de apelação autónoma sobre decisões interlocutórias em derrogação da regra estabelecida no n.º 3 do mesmo artigo, segundo a qual dessas decisões não cabe apelação autónoma, mas mera impugnação no recurso que vier a ser interposto das decisões previstas no n.º 1 (decisões finais e do despacho saneador que não ponha termo ao processo), ressalvada ainda a hipótese do n.º 4.</font>
</p><p><font>É nesse quadro que o indicado n.º 2 do artigo 644, depois de enunciar os tipos particulares de decisões interlocutórias previstas nas respetivas alíneas a) a h), remata, na alínea i), com a ressalva geral dos demais casos especialmente previstos na lei.</font>
</p><p><font> Assim, da economia daquele normativo depreende-se que os demais casos especialmente previstos na lei serão os casos de decisões interlocutórias que, segundo disposição especial, não ficam sujeitas à regra estatuída no n.º 3 do artigo 644”. </font>
</p><p><font> Na linha deste entendimento, impõe-se concluir que a decisão referida no n.º 2 do artigo 926 do CPC não deve ser considerada como um dos casos especiais preconizados na alínea i) do n.º 2 do artigo 644.</font>
</p><p><font>E como supra exposto, não se trata de decisão interlocutória uma decisão que termina a fase declarativa no processo de divisão de coisa comum.</font>
</p><p><a></a><font>Resta referir que, tendo a recorrente interposto a apelação no 31º dia, a mesma deu cumprimento ao disposto no art. 139, nº 5, al. a) do CPC, pelo que, também daí não resulta extemporaneidade na interposição do recurso.</font>
</p><p><font>Face ao exposto, julga-se procedente o recurso e se concede a revista.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<font>Sumário elaborado ao abrigo do disposto no art. 663 nº 7 do CPC:</font>
<p><font>I- A declaração de indivisibilidade de prédio urbano, é decisão final correspondente e respeitante à fase declarativa do processo especial de divisão de coisa comum, fase essa em que se define o direito a que alude o art. 926, nºs 2 e 3 do CPC.</font>
</p><p><font>II- Uma decisão proferida na 1ª Instância e que termina a fase declarativa da forma especial de processo, divisão de coisa comum, é uma verdadeira e real sentença.</font>
</p><p><font> III- E em relação a essa parte declarativa é decisão proferida em 1ª Instância que põe termo à causa, pelo que o recurso de apelação cabe no nº 1, al. a), do art. 644 do CPC, sendo o prazo para a interposição do recurso de apelação de 30 dias, nos termos do nº 1, primeira parte, do art. 638 do mesmo CPC.</font></p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<b><font>Decisão: </font></b>
<p><font>Pelos fundamentos expostos, julga-se procedente o recurso, concede-se a revista e, consequentemente, revoga-se o acórdão recorrido, baixando os autos ao Tribunal da Relação, para que admitindo o recurso, conheça do objeto da apelação.</font>
</p><p><font>Custas pela parte vencida a final.</font>
</p><p><font>Lisboa, 21 de outubro de 2020</font>
</p><p><font>Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator</font>
</p><p><font>Nos termos do art. 15-A, do Dl. nº 10-A/2020 de 13-03, aditado pelo art. 3 do Dl. nº 20/2020 atesto o voto de conformidade dos srs. Juízes Conselheiros adjuntos.</font>
</p><p><font>Maria Clara Sottomayor – Juíza Conselheira 1ª adjunta</font>
</p></font><p><font><font>António Alexandre Reis – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
gTJxu4YBgYBz1XKvigmz | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Processo nº 48776/18.0YIPRT-A.P1.S1</font>
<p><font>***</font>
</p><p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font>
</p><p><font>A autora Zacarias de Carvalho e Associados, Sociedade de Advogados, R.I. interpôs em 26/abr./2018 uma ação de injunção contra a R. com base num contrato de mandato judicial, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 4.810,40 €, acrescidos de juros vencidos desde 14/fev./2018, à taxa legal comercial e até efetivo pagamento.</font>
</p><p><font>A ré Águas do Norte, S.A. deduziu oposição em 06/jun./2018, suscitando a prescrição das dívidas peticionadas e impugnou a versão da A.</font>
</p><p><font>Na sequência de um convite ao aperfeiçoamento foi apresentada em 11/jul./2018 nova petição, que em 12/set./2018 foi contestada, mantendo, no essencial, a sua versão anterior quanto à exceção invocada e impugnação.</font>
</p><p><font>Mais veio a R. em distinto requerimento suscitar a incompetência absoluta dos tribunais judiciais, sustentando que os serviços prestados no âmbito de um mandato forense, tiveram por base um contrato de natureza administrativa, tendo a A. respondido em sentido contrário, pugnando pela competência dos tribunais judiciais.</font>
</p><p><font>Foi proferida decisão em 15/out./2019, que julgou improcedente a suscitada exceção dilatória de incompetência em razão da matéria.</font>
</p><p><b><font>Inconformada veio a R.</font></b><font> interpor recurso de apelação, sendo deliberado e a final proferido acórdão do seguinte teor:</font>
</p><p><font>“Nos termos e fundamentos expostos, delibera-se conceder provimento ao recurso interposto pela R. Águas do Norte, S.A. e, em consequência, revoga-se o despacho recorrido, julgando-se os tribunais judiciais incompetentes em razão da matéria para apreciar e resolver a ação proposta pela A. Zacarias de Carvalho e Associados, Sociedade de Advogados, R.I. contra aquela R.”.</font>
</p><p><b><font>Inconformada com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpõe recurso de Revista para este STJ a A. e formula as seguintes conclusões:</font>
</p><p><i><font>“1.ª - “OS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PODEM CELEBRAR CONTRATOS ADMINISTRATIVOS SUJEITOS A UM REGIME SUBSTANTIVO DE DIREITO ADMINISTRATIVO OU CONTRATOS SUBMETIDOS A UM REGIME DE DIREITO PRIVADO.” (ART.º 200.º, 1, DO CPA)</font></i>
</p><p><i><font>2.ª – SOB A EPÍGRAFE “PROCEDIMENTOS PRÉ-CONTRATUAIS”, DISPÕE O ARTIGO 201.º, 1, DO CPA, QUE “A FORMAÇÃO DOS CONTRATOS CUJO OBJETO ABRANJA PRESTAÇÕES QUE ESTEJAM OU SEJAM SUSCETÍVEIS DE ESTAR SUBMETIDOS À CONCORRÊNCIA DE MERCADO ENCONTRA-SE SUJEITA AO REGIME ESTABELECIDO NO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS OU EM LEI ESPECIAL.”</font></i>
</p><p><i><font>3.ª – SOB A EPÍGRAFE “REGIME SUBSTANTIVO”, DISPÕE O ARTIGO 202.º, 2, DAQUELE MESMO CÓDIGO: ”NO ÂMBITO DOS CONTRATOS SUJEITOS A UM REGIME DE DIREITO PRIVADO SÃO APLICÁVEIS AOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA AS DISPOSIÇÕES DESTE CÓDIGO (Código do Procedimento Administrativo) QUE CONCRETIZAM PRECEITOS CONSTITUCIONAIS E OS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ADMINISTRATIVA.”</font></i>
</p><p><i><font>ORA,</font></i>
</p><p><i><font>4.ª – A DOUTA DECISÃO RECORRIDA ASSENTA, ESSENCIALMENTE, NO PRESSUPOSTO DE QUE “… O CONTRATO DE MANDATO JUDICIAL CELEBRADO ENTRE ADVOGADO E UMA «ENTIDADE PÚBLICA ADJUDICANTE» (…) ASSUME A NATUREZA DE CONTRATO PÚBLICO (…).”</font></i>
</p><p><i><font>5.ª – MAS, SALVO SEMPRE O DEVIDO RESPEITO, O CONTRATO DE MANDATO FORENSE TEM A NATUREZA DE CONTRATO DE DIREITO PRIVADO, SUJEITO AO REGIME SUBSTANTIVO DE DIREITO PRIVADO;</font></i>
</p><p><i><font>6.ª – CONSEQUENTEMENTE, COMPETENTE PARA DIRIMIR LITÍGIOS EMERGENTES DE CONTRATOS SUJEITOS A REGIME DE DIREITO PRIVADO, COMO É O CASO DO CONTRATO DE MANDATO FORENSE, É A JURISDIÇÃO COMUM;</font></i>
</p><p><i><font>7.ª – O DISPOSTO NO ARTIGO 280.º, 1, DO CCP, IDENTIFICA OS CONTRATOS A QUE SE APLICA O REGIME SUBSTANTIVO PREVISTO NA SUA PARTE III, DA QUAL ESTÁ EXCLUÍDO, POR NÃO ENCAIXAR NELA, O CONTRATO DE MANDATO FORENSE;</font></i>
</p><p><i><font>8.ª – O QUE SE CONCLUI NAS CONCLUSÕES ANTERIORES SÓ SOFRE A EXCEÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 280.º, 3, DO CCP. AÍ SE ESTABELECE, REPORTANDO-SE A CONTRATOS QUE, EMBORA SUBMETIDOS NA SUA FORMAÇÃO AO REGIME ESTABELECIDO NESTE CÓDIGO, NÃO SÃO CONTRATOS ADMINISTRATIVOS;</font></i>
</p><p><i><font>9.ª – </font></i><i><u><font>ASSIM, NOS TERMOS DESTA NORMA, A ESSES CONTRATOS, NÃO OBSTANTE NÃO SE INTEGRAREM NO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DA PARTE III DO CCP, SÓ LHES É APLICÁVEL</font></u></i><i><font> O REGIME AÍ ESTABELECIDO QUANTO À INVALIDADE (ARTIGOS 283.º A 285.º), LIMITES À MODIFICAÇÃO DO CONTRATO (ARTIGO 313.º COM REMISSÃO PARA O ARTIGO 312.ª (Trata-se de limites à intervenção da própria entidade adjudicante.)) À CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL E À SUBCONTRATAÇÃO (ARTIGOS 316.º A 324.º);</font></i>
</p><p><i><font>10.ª – COMO SE VÊ, O ESTABELECIDO NA REFERIDA PARTE III DO CCP – DISCIPLINA DO REGIME SUBSTANTIVO DOS CONTRATOS – NUNCA SE APLICA À EXECUÇÃO DOS CONTRATOS DE DIREITO PRIVADO, SALVO NO QUE TANGE À VALIDADE DA CONTRATAÇÃO E ÀS MODIFICAÇÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS DO MESMO;</font></i>
</p><p><i><font>11.ª – O CASO DOS AUTOS NÃO CONTEMPLA QUALQUER DAQUELAS QUESTÕES, ANTES O LITÍGIO SE ENQUADRA NA FALTA DE PAGAMENTO, PELA RECORRIDA, DOS HONORÁRIOS PETICIONADOS PELA RECORRENTE;</font></i>
</p><p><i><font>12.ª – ATENTO O COMANDO CONSTITUCIONAL, VERTIDO NO ARTIGO 212.º, 3, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, “COMPETE AOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS O JULGAMENTO DAS AÇÕES E RECURSOS CONTENCIOSOS QUE TENHAM POR OBJETO DIRIMIR </font></i><i><u><font>OS LITÍGIOS EMERGENTES DAS RELAÇÕES JURÍDICAS ADMINISTRATIVAS</font></u></i><i><font>”;(DESTACADO NOSSO)</font></i>
</p><p><i><font>13.ª – O QUE SIGNIFICA QUE A COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA SE AFERE PELA NATUREZA ADMINISTRATIVA DAS RELAÇÕES JURÍDICAS EM LITÍGIO;</font></i>
</p><p><i><font>14.ª – E A NATUREZA ADMINISTRATIVA DAS RELAÇÕES JURÍDICAS, QUANDO RESULTANTES DE CONTRATO, NÃO DEPENDE NEM RESULTA DO FORMALISMO OU DO PROCEDIMENTO PRÉ-CONTRATUAL QUE O PRECEDEU, MAS DOS SEUS INTRÍNSECOS FATORES DE ADMINISTRATIVIDADE;</font></i>
</p><p><i><font>15.ª – SÓ QUESTÕES RELACIONADAS COM A FORMAÇÃO DO CONTRATO, NEGOCIAÇÕES OU FORMALISMOS, PODEM SER SINDICADAS PELA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA NO CASO DE CONTRATOS DE DIREITO PRIVADO;</font></i>
</p><p><i><font>16.ª – AS QUESTÕES QUE SE SUSCITEM QUANTO AO REGIME SUBSTANTIVO DOS CONTRATOS PRIVADOS ESTÃO EXCLUÍDOS DA SINDICÂNCIA DA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA VERTIDA NA PARTE III DO CCP;</font></i>
</p><p><i><font>17.ª – O CONTRATO DE MANDATO FORENSE É UM ESPECÍFICO CONTRATO DE DIREITO PRIVADO, QUER PELAS SUAS CARACTERÍSTICAS (IMPOSSIBILIDADE DE SE FIXAR O PRAZO, O PREÇO E MESMO O OBJETO) QUER PELA NATUREZA DA RELAÇÃO ENTRE CLIENTE E ADVOGADO QUE RADICA NA CONFIANÇA PESSOAL MÚTUA;</font></i>
</p><p><i><font>18.ª – OUTROSSIM, E POR ISSO MESMO, NÃO É POSSÍVEL, POR EXEMPLO, A ELABORAÇÃO DE ESPECIFICAÇÕES CONTRATUAIS SUFICIENTEMENTE PRECISAS QUE PERMITAM DEFINIR QUALITATIVAMENTE ATRIBUTOS DE PROPOSTAS NECESSÁRIOS À FIXAÇÃO DE UM CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO;</font></i>
</p><p><i><font>19.ª – ATÉ O DIREITO EUROPEU QUE ENDEUSA A “CONCORRÊNCIA”, ASSIM O ENTENDE. O ARTIGO 10.º, D), I), DA DIRETIVA 2014/24/EU, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 26 DE FEVEREIRO DE 2014, EXCLUI, EXPRESSAMENTE, DAS NORMAS DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA, OS CONTRATOS DE MANDATO FORENSE E DE ASSESSORIA JURÍDICA;</font></i>
</p><p><i><font>20.ª – ASSIM É QUE, ENTENDENDO-SE COMO NECESSÁRIO UM PROCEDIMENTO PRÉ-CONTRATUAL ELE SÓ PODERIA CONSISTIR NO AJUSTE DIRETO, POR CRITÉRIOS MATERIAIS, INDEPENDENTEMENTE DO VALOR;</font></i>
</p><p><i><font>21.ª – ALIÁS, SÓ ASSIM SERIA EXEQUÍVEL A ESCOLHA E CONTRATAÇÃO DE UM ADVOGADO, POIS NÃO HAVERIA TEMPO PARA TRATAR DE PROCEDIMENTO MAIS COMPLEXO, DADA A EXIGUIDADE DOS PRAZOS PROCESSUAIS;</font></i>
</p><p><i><font>22.ª – FINALMENTE, DA LEI ORDINÁRIA, SALIENTA-SE A PREVISÃO DO ARTIGO 67.º, 2, DO ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS, APROVADO PELA LEI N.º 145/2015, DE 9 DE SETEMBRO, ONDE SE PROCLAMA CATEGORICAMENTE:</font></i>
</p><p><i><font>“O mandato forense não pode ser objeto, por qualquer forma, de medida ou acordo que impeça ou limite a escolha pessoal e livre do mandatário pelo mandante.”</font></i>
</p><p><i><font>23.ª – O QUE SIGNIFICA QUE, NO MANDATO FORENSE, NÃO HÁ MEDIDA OU ACORDO – OU CONCURSO – QUE OBRIGUE O MANDANTE A ESCOLHER COMO SEU MANDATÁRIO PESSOA DIFERENTE DA QUE ELE, EM SEU EXCLUSIVO CRITÉRIO, ESCOLHERIA.</font></i>
</p><p><i><font>24.ª – POR ISSO É QUE O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO, É PASSÍVEL DE CENSURA, </font></i>
</p><p><i><font>25.ª – JÁ QUE TERÁ VIOLADO O DISPOSTO NOS ARTIGOS 212.º, 3, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, 67.º, DO ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS, APROVADO PELA LEI N.º 145/2015, DE 9 DE SETEMBRO, 200.º E 202.º, DO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, 280.º, DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS, E 4.º, 1, E), DO ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS.</font></i>
</p><p><i><font>NESTES TERMOS, E NOS DO DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, REVOGADA A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, JULGANDO-SE, COMO NA PRIMEIRA INSTÂNCIA, COMPETENTE A JURISDIÇÃO COMUM PARA DIRIMIR A PRESENTE CAUSA”.</font></i>
</p><p><b><font>Foram apresentadas contra-alegações</font></b><font> pela R. nas quais conclui:</font>
</p><p><i><font>“1. O douto Tribunal da Relação do Porto decidiu acertadamente quanto à questão de incompetência suscitada pela Recorrida, quando concluiu que: “I. Os tribunais administrativos são jurisdicionalmente competentes para as questões de interpretação, validade e execução dos contratos celebrados pelas “entidades adjudicantes públicas”, abrangendo estas os “organismos de direito público”, como sejam as entidades concessionárias para exploração e gestão do abastecimento de água e de saneamento, desde que tais contratos estejam sujeitos ao regime de contratação pública. </font></i><b><i><font>II. Os contratos de aquisição de serviços celebrados por tais “organismos de direito público”, como sucede com as sociedades concessionárias de um serviço público, integradas por capitais públicos, que sejam submetidos à regulamentação de contratação pública, são sempre considerados como contratos públicos, independentemente da impressão genética administrativa ou privada de tais contratos.</font></i></b><i><font> III. No contrato de mandato judicial celebrado entre advogado e uma “entidade pública adjudicante” e ainda que se trate de um contrato público, está sempre assegurada a autonomia funcional e técnica no exercício da advocacia. </font></i><b><i><u><font>IV. Os tribunais administrativos são competentes em razão da matéria para conhecer da execução de um contrato público de prestação de serviços de advocacia, incluindo a liquidação e cobrança dos correspondentes honorários.</font></u></i></b><i><font>” (negrito, sublinhado e itálico nosso).</font></i>
</p><p><i><font>2. Salvo o devido respeito, considera a Recorrida que a Recorrente carece de qualquer fundamento e razão no seu recurso, não tendo tomado em consideração na sua argumentação, quer a natureza jurídica da aqui Recorrida, quer o vínculo contratual que se estabeleceu entre as partes, pelo que acaba por realizar uma errada leitura daquele que é o direito aplicável, assim como parece ignorar toda a jurisprudência que se sedimentou quanto a esta matéria (principalmente o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/06/2019, proferido no processo nº 46229/18.6YIPRT; Acórdão do Tribunal de Contas, no Acórdão n.º 1/2015-3ª, Proc. 03JFR/2014; Acórdão do Tribunal de Conflitos n.º 020/16) e, mais recentemente, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 45639/18.3YIPRT.G1.S1, datado de 02/06/2020 (e que, por facilidade de leitura, e por ainda não se encontrar disponível nas plataformas digitais, se juntou ao presente) .</font></i>
</p><p><i><font>3. Repare-se que, a Recorrente vem, através de requerimento de injunção apresentado, peticionar o pagamento de honorários alegadamente devidos pelos serviços prestados no âmbito do mandato forense, relativo ao processo n.º 1950/12.7BEPRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto.</font></i>
</p><p><i><font>4. Sucede, contudo, que tais serviços prestados derivam de uma relação contratual estabelecida entre Recorrida e Recorrente, estando em causa a discussão de honorários devidos no âmbito de um mandato forense, que se insere dentro de um contrato de prestação de serviços - contrato esse de natureza administrativa!</font></i>
</p><p><i><font>5. Tendo em consideração que a Recorrida é uma entidade de natureza eminentemente pública, nomeadamente uma concessionária de um serviço público – facto que decorre do próprio Decreto-Lei que a constitui, tal como já havia sido enunciado em requerimento de oposição à injunção -, está em causa a resolução de litígio referente a uma relação jurídica administrativa.</font></i>
</p><p><i><font>6. Pelo que, tal litígio sempre estaria sujeito ao âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos, nos termos dos artigos 64.º do CPC, 1.º e 4.º do ETAF e 37.º, n.º1, al. l) do CPTA, pela conjugação destes duas realidades jurídicas que, diga-se, fazem parte dos factos e das matérias jurídicas discutidos nos presentes autos, não podendo o Exmo. Tribunal a quo desconhecer. Pois vejamos que,</font></i>
</p><p><i><font>7. A Recorrida, enquanto concessionária de um serviço público e pessoa coletiva de capitais exclusivamente públicos, é considerada enquanto entidade adjudicante, segundo o disposto no artigo 2°, n°1, al. a) do CCP.</font></i>
</p><p><i><font>8. Nesse sentido, a matéria controvertida nos presentes autos, relativa aos honorários devidos pelos mandatos conferidos, está dependente de decisão que vier a ser proferida quanto à interpretação e cumprimento de um contrato de prestação de serviços, sendo que umas das partes é uma concessionária que, pela sua natureza, se submete ao direito público.</font></i>
</p><p><i><font>9. Ora, tendo em consideração aquele normativo legal, são considerados contratos públicos todos os que forem celebrados pela Recorrida e que não se mostrem expressamente excluídos nos artigos 4º e 5° do referido Código – sendo certo que, tal como confirmado pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 27.06.2019, Proc. Nº 46229/18.6YIPRT.G1 (disponível em: <a>http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/db518361abda75ed80258446002fc11b?OpenDocument</a>), o contrato de aquisição de serviços em causa não se integra na contratação excluída, quer tendo em consideração os normativos nacionais, quer tendo em consideração o teor das diretivas europeias, concluindo aquele douto Tribunal que:</font></i>
</p><p><i><font>“O que é relevante (...) para determinar o âmbito “contratual” da jurisdição administrativa, continua a ser a natureza jurídica do procedimento que antecedeu - ou que devia ou podia ter antecedido - a sua celebração, e não a própria natureza do contrato.”</font></i>
</p><p><i><font>(…) Assim, o contrato em análise é um contrato administrativo legalmente tipificado e nominado nos termos do art. 1º, nº 6, al. a) e 450º e está o mesmo submetido à disciplina da contratação pública dos procedimentos para a formação de contratos previstos nos art. 16º, nº 1 e ss do C.C.P.. Atento o art. 4º este contrato não está excluído da aplicação deste diploma e nos termos do art. 5º não está excluído da contratação pública porquanto não nos encontramos perante uma prestação que, em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato ou do contexto da sua própria formação, não esteja, nem seja susceptível de estar submetidas à concorrência de mercado. Com efeito, o facto de nos encontrarmos perante um contrato em que o factor confiança é determinante, de modo algum, inviabiliza que a contratação deva ser efectuada segundo as regras da concorrência ainda que por ajuste directo. A Directiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014 relativa aos contratos públicos não exclui do seu âmbito de aplicação todos os contratos de mandato forenses, mas, a nosso ver, apenas os contratos destinados a serviços jurídicos em processos judiciais perante os tribunais de um outro Estado-Membro.”.</font></i>
</p><p><i><font>– Em boa verdade, tal entendimento já resulta de vasta jurisprudência dos Tribunais Administrativos, do Tribunal de Conflitos e, principalmente, do Tribunal de Contas (vide, Acórdão n.º 1/2015-3ª, Proc. 03JFR/2014).</font></i>
</p><p><i><font>10. Sendo que, também nesse sentido veio a decidir este douto Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão proferido em 02/06/2020 (e junto ao presente):</font></i>
</p><p><i><font>“Assim, nos termos do artigo 1.º, n.º 6, al. a) do CCP, e atento o disposto no art. 4.º do mesmo diploma (que não exclui expressamente tal contrato do âmbito do diploma) deve o referido contrato de mandato de 2008 ser qualificado como contrato administrativo. Mas também o deve ser nos termos do art. 1.º, n.º6, al. d) do CCP (já atrás transcrito), a tal não obstando o art. 5 do mesmo diploma que dispõe: “A parte ii do presente Código não é aplicável à formação de contratos a celebrar por entidades adjudicantes cujo objeto abranja prestações que não sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato ou do contexto da sua própria formação.”. É que os advogados cobram um preço pelos seus serviços, que é, obviamente, levado em conta na altura da contratação. Aliás, a sociedade de advogados autoria disso dá conta no seu requerimento de injunção: “Em outubro de 2011 foi aprovada por requerente e requerida (por deliberação do seu Conselho de Administração) uma fórmula de cálculo de honorários que aqui a requerente seguiu à risca. Por outro lado, nos termos de um contrato, paralelo, de assessoria jurídica que vigorava entre as Partes, os honorários a debitar correspondiam a 50% dos honorários que fossem devidos nos termos de tal fórmula de cálculo, condição que também foi cumprida na nota de honorários em dívida.”. Não pode, assim, afirmar que o contrato de mandato forense não está, de todo, sujeito à concorrência de mercado.”</font></i>
</p><p><i><font>11. Assim, da conjugação destas normas resulta que um contrato celebrado pela concessionária Recorrida e que tem por objeto a aquisição de um serviço prestado pelos agentes particulares em regime concorrencial, concretamente o serviço de patrocínio judiciário, está sujeito ao regime da contratação pública.</font></i>
</p><p><i><font>12. Motivo pelo qual, aquele tem de estar submetido às regras do direito dos Contratos Públicos, pelo que a decisão quanto à sua existência/ validade/ interpretação/ execução sempre será de natureza administrativa - Tanto que a presente ação está incluída no âmbito da previsão da al. e) do n°1 do artigo 4° do ETAF, sendo, portanto, da competência dos tribunais administrativos!</font></i>
</p><p><i><font>13. Ora, tendo em consideração que o regime da contratação pública estabelecido na parte ii é aplicável à formação dos contratos públicos que, independentemente da sua designação e natureza, sejam celebrados pelas entidades adjudicantes referidas no presente Código e não sejam excluídos do seu âmbito de aplicação – artigo 1, n.º 2 do CCP.</font></i>
</p><p><i><font>14. E sendo certo que nos termos do artigo 278º do mesmo diploma, “na prossecução das suas atribuições ou dos seus fins, os contraentes públicos podem celebrar quaisquer contratos administrativos, salvo se outra coisa resultar da lei ou da natureza das relações a estabelecer”,</font></i>
</p><p><i><font>15. E, sendo ainda de relevar que, nos contratos administrativos especialmente previstos no CPC encontra-se o contrato de aquisição de serviços, definido no artigo 450º, que se caracteriza por ser aquele “pelo qual um contraente público adquire a prestação de um ou vários tipos de serviços mediante o pagamento de um preço”.</font></i>
</p><p><i><font>16. Posto isto, apenas se poderá concluir que um contrato celebrado por uma concessionária (entidade adjudicante nos termos da al. a), do n.º 2, do artigo 2.º do CCP), tendo por objeto a aquisição de serviços mediante um preço, é um contrato administrativo especialmente previsto no referido Código e, como tal, um contrato que possui aspetos específicos do respetivo regime substantivo regulado por normas de direito público – Neste preciso sentido, Cfr. Acórdão do Tribunal de Conflitos, datado de 31-01-2017, Proc. n.º 023/16.</font></i>
</p><p><i><font>17. Ou seja, perante qualquer contrato de mandato forense outorgado entre Recorrida e Recorrente, sempre se estaria perante uma relação jurídica administrativa, quer devido à natureza publicista da Recorrida, quer devido à natureza iminentemente administrativa do contrato de prestação de serviços (mandato forense) quando outorgado por uma entidade sujeita ao regime jurídico do CCP.</font></i>
</p><p><i><font>18. Nesse sentido, veja-se, também, o decido pelo Acórdão do Tribunal de Conflitos, proferido em 11.01.2017, Proc. n.º 020/16, concretamente:</font></i>
</p><p><i><font>“Consequentemente, para julgar o presente processo é competente a jurisdição administrativa, sendo irrelevante para a determinação da competência a natureza privada ou administrativa do contrato. Na verdade, como decorre do art. 4º, 1, al. e) do ETAF, o elemento determinante da competência não é a natureza jurídica da relação jurídica de onde emerge o litígio, mas sim a sujeição do mesmo ou a possibilidade da sua sujeição a um regime pré-contratual de direito público, o que quer dizer que a jurisdição administrativa é competente quer a relação jurídica subjacente seja, ou não, uma relação jurídico-administrativa.”</font></i>
</p><p><i><font>19. Por outro lado, e quanto à fundamentação da Recorrente, relativa à caracterização estatuída pela Ordem dos Advogados no que concerne às características essenciais e imprescindíveis do mandato forense, sempre se diga que o mesmo também se encontra em contradição jurisprudencial com a decisão proferida pelo douto Tribunal de Contas, no Acórdão n.º 1/2015-3ª, Proc. 03JFR/2014.</font></i>
</p><p><i><font>20. Nesse sentido, vem o Tribunal de Contas (já em 2015!) esclarecer, precisamente, que o carácter concorrencial em que se deve firmar o procedimento pré-contratual de contratação de advogado não contraria a relação de confiança e a independência, características de um mandato forense, nem impede ou limita a escolha pessoal e livre do mandatário, uma vez que “a relação de confiança que se estabelece com os prestadores de serviços jurídicos tem de ser aferida por critérios objetivos, designadamente por parâmetros curriculares, referenciados a matérias trabalhadas, respetiva extensão e resultados, pelo que não deve eleger-se a relação de confiança subjetiva entre o prestador e o beneficiário dos serviços como fundamento material de adoção do procedimento de ajuste direto”.</font></i>
</p><p><i><font>21. Pelo que apenas se poderá concluir que o recurso a um procedimento de contratação pública para formação de um contrato de mandato forense não melindra, em nada, a independência do mandatário naquela que é a sua praxis jurídica, uma vez que aquele contrato não deixa de ser um contrato típico de prestação de serviços, com as especificidades que a sua natureza forense determina.</font></i>
</p><p><i><font>22. De facto, todas as disposições administrativas de “gestão contratual”, que, alegadamente, se opõe à natureza de um contrato de mandato forense, encontram disposições semelhantes no direito civil (que, alegadamente, é o direito aplicável aos presentes autos, pelo simples facto de ser aquele que melhor se coaduna com as características daquele mandato), concretamente:</font></i>
</p><p><i><font>22.1. O artigo 437.º e ss. do Código Civil também dispõe sobre “resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias” – à semelhança do que acontece no direito público, artigos 311.º e ss. do CCP;</font></i>
</p><p><i><font>22.2. No Direito Civil o mandante poderá responsabilizar contratualmente o mandatário (responsabilidade civil contratual), por incumprimento contratual de um contrato de prestação de serviços (inclusive, um contrato de mandato forense!), dentro daquela que é a natureza iminentemente finalística de um contrato de mandato forense (ou seja, tendo apenas em consideração aquela que é uma obrigação de resultado previsível) – e mesmo que considerássemos o mandato forense um contrato administrativo, a entidade adjudicante apenas poderia responsabilizar contratualmente o mandatário, quando provasse, tal como numa ação de responsabilidade civil contratual, que o aquele incumpriu gravemente a sua obrigação de resultado, bem como que tal resultado era mais que espectável (fora do âmbito da artis legis);</font></i>
</p><p><i><font>22.3. E também nesse sentido, quanto à possibilidade de aplicação de multas contratuais por parte da entidade administrativa, sempre se diga que as mesmas nunca são de aplicação automática, por pura e simplesmente estar em causa um contrato administrativo, uma vez que tais multas/sanções têm de estar previstas no Caderno de Encargos, cujo cocontratante expressamente aceita aquando a submissão da sua proposta – não obstante também ser verdade que, regra geral, estas multas/sanções contratuais nunca são previstas para contratos de mandato forense, pelo facto de a entidade adjudicante ter precisamente em consideração as suas especiais características.</font></i>
</p><p><i><font>23. Motivo pelo qual, e salvo devido respeito, não parece aceitável dizer-se que um contrato de Direito Administrativo é incompatível com a excelsa prestação de serviços de um mandatário judicial, uma vez que não há qualquer disposição sancionatória ou restritiva da independência ou liberdade do mandatário, que não tenha igual ou semelhante disposição no âmbito do direito civil – sendo que, a única diferença inultrapassável é a sujeição daqueles contratos, durante a sua fase pré-contratual, às regras da concorrência e à tipicidade e transparência características dos procedimentos de contratação pública.</font></i>
</p><p><i><font>24. Tanto que, é precisamente nesse sentido que veio a decidir este douto Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão datado de 02/06/2020, veja-se:</font></i>
</p><p><i><font>“Argumenta-se, em contrário, com a preservação da independência e da autonomia funcional e técnica do advogado (previstas no seu Estatuto).</font></i>
</p><p><i><font>Todavia, não se descortinam bem as razões pelas quais a natureza pública do contrato pode impedir a independência e autonomia funcional e técnica do advogado ou a relação de confiança entre as partes, aqui se sufragando o que a propósito se refere no acórdão da Relação de Guimarães de 30.1.2020, proc. 43621/19.2YIPRT.G1, em www.dgsi.pt: “o recurso a um procedimento de contratação pública para formação de um contrato de mandato forense não melindra, em nada, a independência do mandatário naquela que é a sua praxis jurídica, uma vez que aquele contrato não deixa de ser um contrato típico de prestação de serviços, com as especificidades que a sua natureza forense determina”.</font></i>
</p><p><i><font>Esse entendimento está, aliás, em linha com o manifestado pelo Ac. Do Tribunal de Conflitos de 11.1.2017, Proc. 20/16, em www.dgsi.pt (ainda que tirado no Âmbito do Dec. Lei 197/99, de 8 de junho).</font></i>
</p><p><i><font>(…) Também não se nos afigura que a liberdade com que o mandato é exercido, a confiança pessoal entre as partes ou a independência e autonomia funcional e técnica do advogado (previstas no seu Estatuto), possam impedir que a sua celebração esteja dependente do procedimento de formação atinente ao contrato administrativo.”</font></i>
</p><p><i><font>25. Em suma, apenas cumpre à Recorrida concluir que a Recorrente faz tábua rasa de toda a jurisprudência existente e atinente à presente questão jurídica, inclusive à jurisprudência fixada por este douto Tribunal Superior.</font></i>
</p><p><i><font>26. E não pode a Recorrente vir dizer que a diretiva 2014/24/EU exclui expressamente o mandato judicial do seu âmbito de aplicação, pois que, e salvo devido respeito, padece de absoluto erro a interpretação jurídica – tal consubstancia numa interpretação abusiva da própria lei!</font></i>
</p><p><i><font>27. Pois que, ao contrário do que a Recorrente parece fazer crer, não se encontram excluídos do âmbito de aplicação da respetiva diretiva todos os contratos de mandato forense, mas antes aqueles que se inserem no âmbito de uma outra diretiva, a diretiva 77/249/CEE – que tem como finalidade facilitar o exercício efetivo da livre prestação de serviços pelos advogados, ou seja, tem como objetivo regular a prestação de serviços de advogados noutros Estados-Membros que não o Estado-Membro de origem (vide considerandos da diretiva suprarreferida).</font></i>
</p><p><i><font>28. Tanto que, o próprio artigo 10.º, alínea b), ponto i) estabelece que a representação por advogado se exclui do âmbito de aplicação da diretiva 2014/24/EU APENAS quando este represente um cliente “numa arbitragem ou conciliação realizada num Estado-Membro ou num país terceiro ou perante uma instância internacional de arbitragem ou conciliação” ou “em processos judiciais perante os tribunais ou autoridades públicas de um Estado-Membro ou de um país terceiro ou perante tribunais ou instituições internacionais”.</font></i>
</p><p><i><font>29. Ou seja, a diretiva exclui do seu âmbito de aplicação mandatos forenses exercidos por advogados noutro Estado que não o Estado de Origem, de acordo com o âmbito de aplicação da diretiva 77/249/CEE – o que faz todo o sentido, dado que maioria das vezes são contratados advogados que exerçam no país do foro competente, pelo que seria materialmente impossível a realização de um contrato público, para esse efeito.</font></i>
</p><p><i><font>30. Motivo pelo qual sempre deverá ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto pela Recorrente, por se encontrar em clara colisão com as normas legais referidas e as correntes jurisprudenciais supra melhor identificadas, devendo a relação jurídica controvertida ser classificada como uma relação jurídica administrativa e, portanto, sujeita à jurisdição administrativa e competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais – mantendo-se a decisão do douto Tribunal a quo.</font></i>
</p><p><i><font>31. Pelo que, sempre será de concluir que a resolução do presente litígio não compete ao Tribunal Judicial da Comarca do Porto – com efeito, é aos Tribunais Administrativos que cabe apreciar os processos que tenham por objeto dirimir litígios emergentes das relações jurídicas administrativas – cfr. artigo 212.º da CRP e artigo 1.º conjugado com a al. a), do n.º 1 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF).</font></i>
</p><p><i><font>32. Nesse sentido, é pacífico o entendimento de que o pressuposto processual da competência se determina em função da ação proposta, tanto na vertente objetiva, atinente ao pedido e à causa de pedir, como na subjetiva, respeitante às partes (entre muitos outros, Acórdãos do Tribunal de conflitos de 28.09.2010, 20.09.2011, 10.07.2012 e 08.11.2012, disponíveis em www.dgsi.pt).</font></i>
</p><p><i><font>33. Também assim, veja-se que a competência dos Tribunais Administrativos é fundamentalmente delimitada pelo que se dispõe nos artigos 1.º e 4.º do ETAF, cumprindo realçar para o caso a al. e) do n.º 1 deste último, nos termos da qual é atribuída competência aos tribunais administrativos para apreciar, nomeadamente, “Validade de atos pré-contratuais e interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes”.</font></i>
</p><p><i><font>34. In casu, e tendo em consideração tudo quanto supra foi mencionado, não restam dúvidas de que a relação estabelecida tem a natureza de relação jurídica administrativa, porquanto estamos perante a realização de uma competência de direito público, ao abrigo de concretas normas de direito público.</font></i>
</p><p><i><font>35. Assim, e porque forçoso será concluir que, pretendendo a Recorrente discutir a execução de um contrato de prestação de serviços (em concreto no que concerne a faturação e pagamentos), face ao disposto no artigo 4.º, n.º | [0 0 0 ... 0 0 0] |
KzJxu4YBgYBz1XKvHAmw | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<font>Processo nº 19408/17.6T8LSB.Ll.S1</font>
<p><font>***</font>
</p><p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font>
</p><p><font>AA interpôs no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (Juízo Central Cível de Lisboa, Juiz 15) ação declarativa de condenação, com processo comum, contra o Banco Espírito Santo S.A., e Outros.</font>
</p><p><font>Os Réus contestaram.</font>
</p><p><font>O Réu Banco Espírito Santo S.A. (em liquidação) veio requerer que se declarasse a extinção da instância quanto a si, dada a revogação da autorização para o exercício da atividade bancária operada pelo Banco Central Europeu, antes da propositura da presente ação, revogação que produziu os efeitos da declaração de insolvência, nos termos legais. Requereu ainda, em alternativa, a suspensão da instância, caso se não reconhecesse a inutilidade superveniente da lide.</font>
</p><p><font>Também nas suas contestações, os Réus Fundo de Resolução, Banco de Portugal e Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) arguiram a incompetência absoluta deste Tribunal judicial em razão da matéria, nos termos do artigo 4, n.° 2 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), por, em síntese, todos estes demandados se tratarem de entidades públicas (pessoas coletivas de direito público) ligadas aos demais Réus por um vínculo de solidariedade, mas assumindo o presente litígio natureza jus-administrativa, devendo a presente ação ser tramitada junto da jurisdição administrativa e fiscal. Ainda segundo os Réus, sempre seria irrelevante que o ato em causa fosse constitutivo de responsabilidade no domínio da gestão pública ou da gestão privada.</font>
</p><p><font>Por Decisão de 16 de Maio de 2018, o Tribunal a quo, decretou: - Declarar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, ao abrigo do art. 277°, e), do C. P. Civil, quanto ao Réu Banco Espírito Santo S.A. (em liquidação), e julgar-se incompetente, em razão da matéria, e, em consequência, absolver todos os Réus da instância.</font>
</p><p><b><font>Inconformado veio o A.</font></b><font> AA interpor recurso de apelação, sendo deliberado e a final proferido acórdão do seguinte teor: “</font><i><font>Em Consequência - Decidimos:</font></i>
</p><p><i><font>Anular a douta Decisão de 16 de Maio de 2018, de molde a que se conheça dos fundamentos que levaram ao decreto, constantes na questão nº 1</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>Respeitando a questão nº 1 a: “</font><i><font>1 - Não obstante a decretada improcedência da excepção da incompetência absoluta em razão da matéria, invocada pelos Réus, CMVM, Fundo de Resolução e Banco de Portugal, a sentença impugnada, in fine, toma a posição que a seguir se transcreve: "...Pelo exposto, ao abrigo dos normativos citados, julgo este Tribunal incompetente, em razão da matéria e, em consequência, absolvo todos os Réus (sublinhado nosso) da instância…”. Verifica- se que, na douta sentença recorrida, existe clara contradição entre a fundamentação apresentada e a decisão final, e por isso, está ferida de nulidade, nos termos do consignado na alínea c) do n° 1 do artº 615° do C. P. Civil</font></i><font>”. </font>
</p><p><b><font>Inconformada com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpõe recurso de Revista para este STJ a ré, COMISSÃO DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS (CMVM), e formula as seguintes conclusões:</font>
</p><p><i><font>“a. A presente revista tem por objeto o acórdão proferido em 19.12.2019, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que decidiu anular a sentença proferida pela 1.ª instância a 16.05.2018 (que havia absolvido os Réus da instância por incompetência absoluta do Tribunal), com fundamento em nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>b. Nesse acórdão foi lavrado um voto de vencido, a cujos fundamentos se adere, no qual se refere que (i) não existe qualquer nulidade da decisão proferida a 16.05.2018; e (ii) ainda que assim não fosse, a mesma sempre poderia ser suprida através da regra da substituição ao tribunal recorrido (prevista no art.º 665.º do CPC).</font></i>
</p><p><i><font>c. O presente recurso de revista é admissível nos termos do art.º 671.º, n.º 1 do CPC, porquanto o mesmo vem interposto de acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância que pôs termo ao processo (declarando extinta a instância quanto ao BES, por inutilidade superveniente da lide, e absolvendo os demais RR. da instância por incompetência absoluta do Tribunal).</font></i>
</p><p><i><font>d. Para o caso se assim não se entender, o que não se concede, o presente recurso sempre será admissível, ao abrigo da alínea a) do art.º 673.º do CPC. Com efeito, sendo o acórdão recorrido uma decisão interlocutória, proferida na pendência do recurso na Relação, que apenas se pronunciou sobre uma questão processual (referente à pretensa nulidade da sentença da 1.ª instância, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC), sem conhecer do objecto da apelação (como impõe o art.º 665.º do CPC), do mesmo caberá recurso de revista autónomo ao abrigo da alínea a) do art.º 673.º do CPC, porquanto a sua impugnação com o recurso de revista a final seria absolutamente inútil.</font></i>
</p><p><i><font>e. A retenção do presente recurso torná-lo-ia sem finalidade alguma, já que o que se pretende evitar é precisamente que os autos tenham de baixar, desnecessariamente, à 1.ª instância, para que se conheçam (novamente) os fundamentos da declarada incompetência em razão da matéria, conforme determinado no acórdão ora recorrido quando, no entender da Recorrente, o objecto da apelação poderia ter sido de imediato conhecido, com a confirmação da absolvição da ora Ré da instância. </font></i>
</p><p><i><font>f. Acresce que o presente recurso é, ainda, admissível quer directamente pelo disposto no art.º 629.º, n.º 2, alínea a) do CPC (casos em que o recurso é sempre admissível), quer por remissão da alínea b) do artigo 673.º do CPC, porquanto tem fundamento na violação das regras da competência em razão da matéria (cf. infra a conclusão g) destas alegações).</font></i>
</p><p><i><font>Com efeito, o Tribunal da Relação deveria ter conhecido do objecto da apelação nos termos do n.º 1 do art.º 665.º do CPC, confirmando a decisão de absolvição da Ré da instância por incompetência absoluta do Tribunal, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f) do ETAF (cf. A jurisprudência unânime dos nossos tribunais superiores), sem ter de se debruçar sequer sobre a aplicação do art.° 4.° n° 2 do ETAF que foi posta em crise, com o que fez errada interpretação e aplicação das regras de competência em razão da matéria …</font></i>
</p><p><i><font>g. A presente revista tem por fundamento, nos termos do art.º 674.º do CPC, o erro de julgamento do acórdão recorrido na interpretação e aplicação da lei substantiva e da lei de processo, designadamente dos o artigos 97.º, n.º 1 e 578.º, 615.º, n.º 1 alínea c) e 665.º do CPC, bem como dos artigos 4.º, n.º 1, alínea f) do ETAF, art.º 3.º, n.º 3, al. b), da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, artigos 3.º, n.º 1 e 5.º, n.º 2, n.º 3, alínea b), da LQER, art.º 1.º, n.º 1 e n.º 2 alínea b), dos Estatutos da CMVM, artigos 64.º, 96.º, alínea a) e 99.º, n.º 1, 576.º, n.ºs 1 e 2, e 577.º, alínea a), todos do CPC, considerando em suma que:</font></i>
</p><p><i><font>i) Ao contrário do decidido, a sentença proferida em 16.05.2018 não é nula, nos termos do art.º 615.º, n.º 1 alínea c), pois da mesma resulta, inequivocamente, que se julgou verificada a exceção de incompetência absoluta do Tribunal, que é de conhecimento oficioso (cf. os artigosº 97.º, n.º 1 e 578.º do CPC), relativamente a todos os RR. – considerando quer os Réus entidades públicas (CMVM, Banco de Portugal e Fundo de Resolução), quer os Réus entidades privadas (Novo Banco e Lina Pires) – precisamente porque concluiu ser aplicável o disposto nos artigos 4º, n.º 2 do ETAF e 10º, n.º 9, CPTA. </font></i>
</p><p><i><font>ii) Ainda que assim não se entendesse, o que não se concede e se admite por mera hipótese de raciocínio, essa pretensa nulidade sempre poderia ser suprida através da regra da substituição ao tribunal recorrido prevista no n.º 1 do art.º 665.º do CPC, que impunha ao Tribunal da Relação o conhecimento do objecto da apelação e a confirmação da decisão de absolvição da Ré CMVM da instância, por incompetência do Tribunal em razão da matéria, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f) do ETAF.</font></i>
</p><p><i><font>h. O Tribunal da 1.ª instância julgou procedente a exceção dilatória de incompetência absoluta em razão da matéria relativamente a todos os RR., considerando na sua fundamentação e dispositivo quer os Réus entidades públicas (CMVM, Banco de Portugal e Fundo de Resolução), quer os Réus entidades privadas (Novo Banco e Lina Pires), por ter concluído pela aplicação do disposto no artigo 4.º, n.º 2 do ETAF, sufragando expressamente o entendimento de que essa disposição legal é aplicável às situações de “litisconsórcio voluntário passivo emergente de responsabilidade solidária ou conjunta extracontratual ou contratual da entidade pública e de uma entidade particular.”</font></i>
</p><p><i><font>i. A discordância do Apelante ou dos venerandos Juízes Desembargadores relativamente à sentença recorrida, por entenderem que o art.° 4.° n.° 2 do ETAF seria aplicável, exclusivamente, a casos de litisconsórcio necessário passivo, não se traduz em qualquer contradição da decisão, nem em qualquer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, pois a nulidade prevista no art.º 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC não se confunde com o erro de julgamento </font></i>
</p><p><i><font>j. Sendo esse o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa relativamente ao art.º 4.° n.° 2 do ETAF, ao invés de determinar a anulação da sentença recorrida nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, este deveria ter mantido o decidido no tocante a absolvição dos RR. entidades públicas (Fundo de Resolução, Banco de Portugal e CMVM), determinando a revogação da decisão apenas no tocante à absolvição da instância dos RR. entidades privadas (Novo Banco e Lina Pires), com fundamento em erro na aplicação do direito. Nesse sentido, vide, entre outros, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 6.12.2017, no âmbito do processo n.º 18455/16.0T8LSB.L2.</font></i>
</p><p><i><font>k. Contrariamente ao referido no acórdão recorrido, a circunstância de apenas os Réus Fundo de Resolução, Banco de Portugal e CMVM terem arguido a exceção incompetência absoluta deste Tribunal Judicial em razão da matéria também não determina a nulidade da sentença que absolveu todos os RR. da instância, pois estamos perante um exceção de conhecimento oficioso do Tribunal, nos termos dos artigosº 97.º, n.º 1 e 578.º do CPC, como refere, aliás, a própria sentença recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>l. Assim, a douta sentença proferida pela 1.ª instância não padece de qualquer nulidade nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, porquanto nela se deixa bem claro, quer na parte da fundamentação, quer no seu dispositivo, que considera procedente a exceção de incompetência absoluta do tribunal, em razão da matéria, em relação a todos os RR., considerando aplicável o disposto no artigo 4.º, n.º 2 do ETAF.</font></i>
</p><p><i><font>m. Pelo que, ao concluir pela nulidade da sentença recorrida, o acórdão recorrido fez errada interpretação e aplicação dos artigosº 97.º, n.º 1, 578.º e 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>n. Mas ainda que se entendesse que a decisão da 1.ª instância seria nula, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, o que não se concede e se admite por mera hipótese de raciocínio, essa pretensa nulidade sempre poderia ter sido suprida através regra da substituição ao tribunal recorrido, prevista no n.º 1 do art.º 665.º do CPC, o que permitiria ao Tribunal da Relação conhecer dos fundamentos da declarada incompetência em razão da matéria relativamente a todos os Réus e conhecer do objecto da apelação.</font></i>
</p><p><i><font>o. Independentemente de qual fosse entendimento adoptado relativamente ao art.° 4.° n.° 2 do ETAF, sempre seria de manter a decisão de absolvição da Ré CMVM da instância por incompetência absoluta do Tribunal, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f) do ETAF, na linha do que tem sido decidido, de forma unânime e pacífica, pelos nossos Tribunais superiores, em processos de teor semelhante ao presente.</font></i>
</p><p><i><font>p. Nos termos do disposto no artigo 3.º, n.º 3, al. b), da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, cujo artigo 2.º aprova a LQER, a CMVM constitui uma entidade reguladora, e, como tal, é uma pessoa coletiva de direito público, com a natureza de entidade administrativa independente (cfr. artigo 3.º, n.º 1, da LQER).</font></i>
</p><p><i><font>q. Nos termos do artigo 5.º, n.º 2, da LQER, são subsidiariamente aplicáveis à CMVM, quando esta atua no exercício de poderes públicos, o Código de Procedimento Administrativo e as leis do contencioso administrativo, assim como, em consonância, ainda, com o artigo 5.º, n.º 3, alínea b), da LQER, o regime da responsabilidade civil do Estado.</font></i>
</p><p><i><font>r. A configuração atribuída pelo Autor/Apelante, à presente causa impõe que se conclua que o litígio assume, no que à CMVM diz respeito, natureza jusadministrativa e, portanto, que se verifica incompetência absoluta do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa por infração das regras de competência em razão da matéria.</font></i>
</p><p><i><font>s. Com efeito, sendo peticionado o ressarcimento de (alegados) danos por (também alegada) omissão da CMVM no exercício das suas atribuições de supervisão, é aplicável o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pelo artigo 1.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, na redação introduzida pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 31/2008, de 17 de julho (“RRCEE”).</font></i>
</p><p><i><font>t. Ora, são exclusivamente competentes para a apreciação da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, nos termos conjugados do artigo 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e dos artigos 1.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1, alínea f), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (“ETAF”), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, na redação introduzida pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro.</font></i>
</p><p><i><font>u. De onde resulta que a R. CMVM deve ser absolvida da instância por verificação de exceção dilatória de incompetência absoluta do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, decorrente da infração das regras de competência em razão da matéria, em conformidade com o disposto nos artigos 64.º, 96.º, alínea a) e 99.º, n.º 1, 576.º, n.os 1 e 2, e 577.º, alínea a), todos do CPC, confirmando-se a douta sentença recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>v. E na hipótese remota de se entender que, na ação em causa, no que toca à CMVM, estamos perante uma relação jurídica de direito privado ou perante atos de gestão privada, a verdade é que é entendimento consolidado do Tribunal dos Conflitos que é da competência dos Tribunais Administrativos o julgamento das ações de responsabilidade civil extracontratual contra o Estado e demais entes públicos ainda que esteja em causa uma relação jurídica de direito privado (Acórdão do Tribunal dos Conflitos de 01.06.2017, Proc. n.º 08/17).</font></i>
</p><p><i><font>w. Ora, no presente caso não há qualquer dúvida sobre a natureza pública da CMVM, em o A./Apelante impugna essa natureza, e também não pode negar que, tal como o A. configura a ação, está em causa a responsabilidade extracontratual da CMVM, pelo que deve concluir-se que a competência para julgar o presente litígio pertence aos tribunais administrativos e fiscais.</font></i>
</p><p><i><font>x. Por outro lado, no que respeita à CMVM, fora do quadro da responsabilidade civil extracontratual, que nenhuma adesão tem à configuração que o A. fez da ação, a qual conduz à incompetência absoluta do Tribunal em razão da matéria conforme supra explanado, qualquer outra hipotética configuração da causa de pedir e dos pedidos tal como formulados pelo A. – como aquela que o Apelante ensaiou, sem razão face à causa de pedir e aos pedidos constantes da p.i., na conclusão P) das suas alegações – leva à conclusão de que a CMVM é parte ilegítima.</font></i>
</p><p><i><font>y. Com efeito, o pedido a) formulado pelo A. na p.i. é dirigido contra os RR. na sua qualidade de intermediários financeiros, por violação dos deveres de informação, diligência e lealdade, nos termos do disposto no artigo 304.º-A do CdVM.</font></i>
</p><p><i><font>z. Ora, a CMVM não é, nem intermediário financeiro, nem o A. alega que o seja, nem lhe é aplicável o artigo 304.º-A do CdVM, pelo que nunca poderá ser parte na relação material controvertida configurada pelo A. de que são sujeitos este, por um lado, e intermediários financeiros, por outro, pelo que não se revelando processualmente possível a condenação da CMVM, na qualidade de intermediário financeiro, ao pagamento de qualquer quantia peticionada pelo A., não tem esta Comissão interesse em contradizer e é, portanto, parte ilegítima.</font></i>
</p><p><i><font>aa. Quanto ao pedido formulado na alínea b), no qual o A. peticiona a nulidade do contrato de intermediação financeira por inobservância da forma, uma vez que a CMVM não é intermediário financeiro, nem o A. o alega, a CMVM não pode ser parte em nenhum contrato de intermediação financeira alegadamente celebrado pelo A., visto que só os intermediários financeiros podem exercer, a título profissional, atividades de intermediação financeira, e em decorrência, celebrar os contratos de intermediação financeira com os seus clientes.</font></i>
</p><p><i><font>bb. Acresce que é o próprio A. que configura a correspondente causa de pedir em termos que o contrato de intermediação financeira em apreço se estabeleceu entre, por um lado, o A. e, por outro, o 1º R, o 3º R e o 6º R, não incluindo nesta relação contratual a 5ª R, CMVM (cf., em especial, artigos 157.º a 166.º da p.i.), pelo que, a CMVM não é parte nesta relação material controvertida, tal como o A. a configura.</font></i>
</p><p><i><font>cc. Assim, quanto ao pedido b), também não se revela processualmente possível a condenação da CMVM ao pagamento de qualquer quantia peticionada pelo A. em virtude da eventual declaração de nulidade de um contrato a que a CMVM é totalmente estranha, não tendo por isso esta Comissão interesse em contradizer e sendo, portanto, parte ilegítima.</font></i>
</p><p><i><font>dd. Relativamente ao pedido formulado na alínea c), em que é peticionada a declaração de nulidade do contrato de mútuo bancário ou, caso assim não se entenda, a declaração de anulabilidade do contrato de mútuo bancário, é também manifesta a ilegitimidade passiva da CMVM.</font></i>
</p><p><i><font>ee. Com efeito, por um lado, a CMVM não tem nem competência nem capacidade jurídica para celebrar qualquer contrato de mútuo bancário, nomeadamente como mutuante, porque não é um banco nem uma instituição de crédito; e porque, como entidade pública que é, está sujeita ao princípio da legalidade ou da competência, e a lei não só em parte alguma lhe confere poderes de concessão de crédito como lhe veda esta possibilidade.</font></i>
</p><p><i><font>ff. Por outro lado, é o próprio A. que afirma, no próprio texto do pedido c), que o alegado contrato de mútuo bancário foi “realizado entre o A. e o 1º R”, ou seja, o BES, e não com a CMVM, não alegando em parte alguma que a CMVM seja parte nessa relação material controvertida.</font></i>
</p><p><i><font>gg. Assim, também não se revela processualmente possível a condenação da CMVM ao pagamento de qualquer quantia peticionada pelo A. em virtude da eventual declaração de nulidade ou da anulação de um contrato a que a CMVM é totalmente estranha, não tendo por isso esta Comissão interesse em contradizer e sendo, portanto, parte ilegítima.</font></i>
</p><p><i><font>hh. Relativamente ao pedido de condenação pelo ressarcimento dos danos não patrimoniais, o A. omite quaisquer factos constitutivos dessa responsabilidade relativamente à CMVM, no âmbito de qualquer relação contratual que tenha sido estabelecida entre o A. e a Ré, o que bem se compreende visto que entre um e outra não se estabeleceu qualquer relação contratual, nem o A. o alega.</font></i>
</p><p><i><font>ii. Acresce que a questão da competência dos tribunais para julgar as ações nas quais se discuta a atividade de supervisão da CMVM, nomeadamente quanto ao “Caso BES”, tem vindo a ser decidida pela jurisprudência, sendo esta uniforme na fixação dos tribunais administrativos e fiscais como competentes para julgar este tipo de litígios.</font></i>
</p><p><i><font>jj. De entre a referida e já vasta jurisprudência destacam-se os seguintes arestos proferidos em processos de teor muito semelhante ao presente: Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 28.06.2018 (Proc. n.º 19.190/16.4T8LSB.L1), 20.12.2018 (Proc. n.º 19155/16.6T8LSB.L2), 6.12.2017 (Proc. n.º 18455/16.0T8LSB.L2), 11.12.2018 (Proc. n.º 18769/16.9T8LSB.L1), estes dois últimos já transitados em julgado, e ainda os Acórdãos do Tribunal de Conflitos de 14.02.2019 (Conflitos n.os 46/18 e n.º 31/18) de 11.04.2019 (Conflitos n.os 30/18 e 1/19), de 23.05.2019 (Conflito n.º 39/18) e de 30.05.2019 (Conflito n.º 9/19), os quais são definitivos, entre muitos outros.</font></i>
</p><p><i><font>kk. Nos presentes autos, deve ser convocada a uniformidade de entendimento no sentido de atribuir a competência à jurisdição administrativa para apreciar os pedidos deduzidos contra a Ré CMVM, em ações em que os demandantes ofereceram configuração muito idêntica à aqui exibida pelo Autor, o que se requer, “sob pena de se pôr em causa a relativa previsibilidade e segurança na aplicação do direito, bem como o princípio da igualdade, consagrado no art. 13º da CRP – que exige que se tenha em consideração «todos os casos que mereçam tratamento análogo» (art. 8º nº 3 do CC)” – Nesse sentido o acórdão proferido no Conflito n.º 46/18.</font></i>
</p><p><i><font>ll. Em suma, o objeto do presente litígio, no que à CMVM se reporta, é do exclusivo conhecimento dos tribunais administrativos e fiscais, conforme conjugadamente decorre do artigo 212.º, n.º 3, da CRP, dos artigos 1.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1, alínea f), do ETAF e, bem assim, do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), e nº3, alínea b) da LQER.</font></i>
</p><p><i><font>mm. Pelo que, ao contrário do defendido pelo Apelante nas suas alegações, o Tribunal da 1.ª instância aplicou corretamente o disposto nos artigos 96.º, 99.º n.º 1, al. a) e 278.º n.º 1 al. a), 571.º n.º 2 segunda parte, 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º al. a) e 578.º, não existindo qualquer vício de inconstitucionalidade, nem violação da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, razão pela qual deveria ter sido confirmada a douta sentença recorrida, e em conformidade, absolvida a Recorrida CMVM da instância por força da incompetência absoluta do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, decorrente da infração das regras de competência em razão da matéria, nos termos do disposto nos artigos 64.º, 96.º, al. a), e 99.º, n.º 1, 576.º, n.os 1 e 2, e 577.º, al. a), todos do CPC.</font></i>
</p><p><i><font>nn. Pelo exposto, entende-se que o acórdão recorrido, ao anular a sentença da 1.ª instância, violou o disposto no n.º 1 do art.º 665.º do CPC, bem como as disposições legais acima referidas, em especial os artigos 4.º, n.º 1, alínea f) do ETAF, art.º 3.º, n.º 3, al. b), da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, artigos 3.º, n.º 1 e 5.º, n.º 2, n.º 3, alínea b), da LQER, porquanto o Tribunal da Relação deveria ter suprido a pretensa nulidade em causa, conhecendo dos seus fundamentos no que respeita à declarada incompetência em razão da matéria relativamente a todos os Réus, e tomado conhecimento do mérito da apelação, concluindo pela sua improcedência no que respeita à absolvição da Ré CMVM da instância por incompetência absoluta do Tribunal.</font></i>
</p><p><i><font>Termos em que a presente revista deverá ser admitida e julgada totalmente procedente, sendo, em consequência, revogado o acórdão recorrido e confirmada a douta sentença de 16.05.2018, que absolveu a R. CMVM da instância por incompetência material do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa.</font></i>
</p><p><b><font>Não foram apresentadas contra-alegações</font></b><font>.</font>
</p><p><font>*</font>
</p><p><font>O recurso foi admitido, pelo relator, nos termos do art. 629, nº 2 al. a) do CPC (violação das regras de competência em razão da matéria), conforme despacho de 19-10-2020.</font>
</p><p><font>Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir.</font>
</p><p><font>*</font>
</p><p><b><font>Questão prévia</font></b><font>:</font>
</p><p><font>Suscita-se a questão da admissibilidade do recurso de revista, face ao decidido no acórdão recorrido.</font>
</p><p><font>Apesar do despacho do relator de 19-10-2020 admitir o recurso de revista, tal despacho não vincula o Tribunal Coletivo com competência para o decidir.</font>
</p><p><font>Trata-se de despacho genérico ou tabelar, do relator, de admissão do recurso de revista, o qual não adquire força de caso julgado formal.</font>
</p><p><font>Refere o Ac. nº 151/2015, do TC, in Diário da República n.º 132/2015, Série II de 2015-07-09 que, “Como escreveu Alberto dos Reis: «Não pode deixar de atribuir-se ao tribunal que há de pronunciar-se sobre o mérito do recurso, o poder jurisdicional de decidir, em plena liberdade e com absoluta soberania, se o recurso é admissível, se a espécie adequada é agravo ou apelação, revista ou agravo, se o verdadeiro efeito do recurso é suspensivo ou meramente devolutivo. Privar o tribunal superior da possibilidade de conhecer livremente destes pontos, a título de que o tribunal inferior já os resolveu em determinado sentido, equivaleria a mutilar a competência do tribunal de recurso, a retirar a este tribunal, em benefício do tribunal recorrido, um poder jurisdicional que essencialmente lhe pertence, dada a atribuição, que a lei lhe comete, de conhecer da matéria do recurso» (na RLJ, Ano 83, pág. 58)”. Ora, julgando os tribunais superiores em Tribunal Coletivo (conferência) compete a este julgar da admissibilidade do recurso, mesmo que tenho sido admitido (esse recurso) por tribunal de instância ou, como no caso, tenha sido admitido pelo relator.</font>
</p><p><font>No mesmo Ac. nº 151/2015, do TC se refere, “Em todas estas situações o desígnio de que deve competir, em última análise, ao tribunal competente para conhecer do mérito do recurso, a decisão final sobre a sua admissibilidade, devendo ter caráter provisório as decisões que entretanto tenham que ser tomadas, relativamente a essa matéria, por outros tribunais ou outras formações do mesmo tribunal intervenientes na tramitação do recurso, parece-nos ser fundamento racional e suficiente para que sobre tais decisões não se forme caso julgado, inserindo-se tal opção fundamentada na margem de liberdade do legislador”.</font>
</p><p><font>Assim que o despacho (no caso tabelar ou genérico) de admissão do recurso de revisão não adquire força de caso julgado formal e não é vinculativo para o Tribunal Coletivo a quem legalmente compete conhecer do mérito.</font>
</p><p><font>Atendendo às conclusões do recurso, que, segundo os arts. 608, n.º 2, 635, n.º 4 e 639, do CPC, delimitam o seu objeto, e não podendo o Supremo Tribunal de Justiça conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excecionais de conhecimento oficioso.</font>
</p><p><font>No recurso tem de se ponderar o decidido no acórdão recorrido desfavorável ao recorrente (na falta de especificação, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente -art. 635, nº 3, do CPC), pelo que, apenas está em causa a questão de se saber se o acórdão recorrido padece de nulidade por violação do disposto no art. 615, nº 1 al. c) do CPC (que constitui a parte dispositiva do acórdão recorrido).</font>
</p><p><font>Ou seja, as conclusões do recurso devem respeitar e incidir sobre o conteúdo da decisão e não sobre o que a recorrente entende deveria ter sido decidido.</font>
</p><p><font>Refere o Ac. recorrido: “Verifica-se que, na douta sentença recorrida, existe clara contradição entre a fundamentação apresentada e a decisão final, e por isso, está ferida de nulidade, nos termos do consignado na alínea c) do n° 1 do art° 615° do C. P. Civil”.</font>
</p><p><font>E no mesmo sentido a recorrente CMVM, conforme conclusão a) “A presente revista tem por objeto o acórdão proferido em 19.12.2019, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que decidiu anular a sentença proferida pela 1.ª instância a 16.05.2018…, com fundamento em nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC”.</font>
</p><p><font>Assim que é esta a questão suscitada no recurso de revista e não a violação das regras de competência em razão da matéria.</font>
</p><p><font>Na conclusão c), refere a recorrente que “O presente recurso de revista é admissível nos termos do art.º 671.º, n.º 1 do CPC, porquanto o mesmo vem interposto de acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância que pôs termo ao processo (declarando extinta a instância quanto ao BES, por inutilidade superveniente da lide, e absolvendo os demais RR. da instância por incompetência absoluta do Tribunal)”.</font>
</p><p><font>Como refere esta conclusão, a sentença de que foi interposta apelação é que colocaria termo ao processo (se transitasse em julgado), mas não a decisão do acórdão recorrido que decidiu, “Anular a douta Decisão de 16 de Maio de 2018, de molde a que se conheça dos fundamentos que levaram ao decreto, constantes na questão nº 1”. Donde resulta que a Relação não conheceu do mérito da causa, nem pôs termo ao processo, pelo que não é admissível o recurso de revista nos termos do art. 671, nº 1 do CPC.</font>
</p><p><font>A recorrente reconhece que o acórdão recorrido é uma decisão interlocutória.</font>
</p><p><font>Mas, de seguida, refere a recorrente que o recurso será admissível ao abrigo do art. 673, al. a) do CPC, considerando que a “retenção do recurso o tornaria absolutamente inútil.</font>
</p><p><font>No entanto, o recurso em apreço não incide sobre acórdão proferido na pendência do processo na Relação. O art. 673 do CPC respeita, apenas, a acórdãos que incidam sobre questões incidentais que ocorram na pendência do processo na Relação e não a acórdãos proferidos no desenvolvimento normal da lide seguindo a via da competência hierárquica (será o caso, por exemplo, de com a alegação formulada em sede de recurso de Apelação o recorrente solicitar a junção aos autos de vários documentos, o que veio a ser indeferido).</font>
</p><p><font>A vingar o entendimento da recorrente, o art. 673 do CPC consagrava uma via direta (mais ampla que os casos em que é sempre admissível recurso) para que houvesse sempre possibilidade de recurso para o STJ, porque todas as apelações são decididas por Tribunal da Relação e, desde que o processo dá entrada no Tribunal da Relação até ser decidido (com transito ou com recurso, se possível), o processo encontra-se pendente nesse Tribunal.</font>
</p><p><font>O Ac. da Relação em análise é acórdão interlocutório, no sentido de que não conhece do mérito da causa, nem põe termo ao processo e, assim sendo, sobre o mesmo não tem aplicação o estatuído no art. 673 do CPC, mas apenas o disposto no art. 671, nº 1 e 2 do CPC.</font>
</p><p><font>Entende a recorrente que o recurso que interpõe é, ainda, admissível quer diretamente pelo disposto no art. 629, n.º 2, alínea a) do CPC (casos em que o recurso é sempre admissível), quer por remissão da alínea b) do artigo 673.º do CPC, porquanto tem fundamento na violação das regras da competência em razão da matéria.</font>
</p><p><font>Voltamos a dizer, repetindo o já dito, que o fundamento do recurso é a decisão de que se recorre e o que aí foi decidido e, aí decidiu-se pela anulação da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão e não por ter havido violação das regras de competência em razão da matéria. </font>
</p><p><font>Mais entende a recorrente que o recurso de revista tem por fundamento, nos termos do art.º 674 do CPC, o erro de julgamento do acórdão recorrido na interpretação e aplicação da lei substantiva e da lei de processo. E que, ao contrário do decidido, a sentença proferida em 16.05.2018 não é nula, nos termos do art.º 615.º, n.º | [0 0 0 ... 0 0 0] |
SzFbu4YBgYBz1XKvbfpo | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>AA e BB intentaram a presente ação de impugnação pauliana, demandando, Marcelo Peixoto, S.A. e Otoxiep Power, Unipessoal, LDA.</font><br>
</p><p><font>Requereram que fossem declaradas ineficazes quanto aos autores, as vendas dos veículos e de todos os equipamentos/máquinas identificados nos itens 17 e 26 da petição.</font><br>
</p><p><font>Foi apresentada contestação.</font><br>
</p><p><font>A seu tempo foi requerida pela Ré Marcelo Peixoto, S.A a suspensão da instância, com fundamento na instauração de PER.</font><br>
</p><p><font>O tribunal proferiu despacho de deferimento desta pretensão.</font><br>
</p><p><font>Os AA recorreram e este tribunal da Relação revogou o despacho que decretou a suspensão da instância tendo ordenado a prossecução dos autos, por acórdão que transitou em julgado.</font><br>
</p><p><font>Posteriormente, veio a Ré Marcelo Peixoto, S.A, apresentar novo requerimento nos autos invocando que foi aprovado e homologado o seu Plano de Recuperação no âmbito do processo n.º 134/20...., por despacho de homologação proferido no dia 7 de novembro de 2020, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Comércio ... – Juiz ..., transitado em julgado no dia 2 de dezembro de 2020.</font><br>
</p><p><font>Que o crédito que é peticionado em sede da presente Ação Pauliana, foi igualmente reclamado em sede do referido PER, onde foi qualificado como crédito subordinado, por decisão já transitada em julgado.</font><br>
</p><p><font>Ao abrigo deste plano os créditos subordinados, como o peticionado, nos presentes autos deixam de existir, sendo objeto de perdão.</font><br>
</p><p><font>Ainda que assim não fosse, ao abrigo do artigo 17º-E CIRE, as ações para cobrança suspendem-se com a entrega do PER (conforme prevê o n.º 4 do art. 17º- C do CIRE), ou seja, extinguem-se com o encerramento de tal plano, isto é, com a sua aprovação e homologação.</font><br>
</p><p><font>Os AA opuseram-se.</font><br>
</p><p><font>O TRIBUNAL PROFERIU DESPACHO DE INDEFERIMENTO DO REQUERIDO, FUNDAMENTADO, ESSENCIALMENTE, NO SEGUINTE:</font><br>
</p><p><font>(…) Nos termos do n.º 10 do art. 17.º-F do CIRE, a decisão de homologação vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações”. O mesmo é dizer que o crédito dos autores está extinto, facto que aproveita a terceiros (art. 866.º, n.º 1, do Cód. Civil).</font><br>
</p><p><font>O crédito dos autores (extinto por perdão) poderá “renascer”, em caso de declaração de insolvência da primeira ré durante a execução do plano de recuperação (com uma duração de 10 anos), conforme decorre do disposto (…) n.º 1 do art. 218.º do CIRE, “se, antes de finda a execução do plano, o devedor for declarado em situação de insolvência em novo processo”. Já a instauração de novo processo especial para revitalização, por exemplo, não afeta os efeitos resultantes da homologação do plano, cfr. Ac. do TRP de 24-10-2019 (923/19.3T8AVR-A.P1).</font><br>
</p><p><font>A decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto nestes autos traça o paralelismo entre a ação de impugnação pauliana pendente na data da instauração do processo de insolvência e aquela que se encontra pendente na data da instauração do processo de recuperação, concluindo, na esteira do Ac. do TRP de 29-09-2016 (1252/14.4TBPRD.P1): “se a instauração de processo insolvência e a consequente declaração de tal situação não obsta, por si só, ao prosseguimento de ação de impugnação pauliana instaurada por determinado credor do devedor/insolvente, por maioria de razão, a tal prosseguimento não deve obstar a instauração de processo revitalização do devedor (…) a aprovação do plano de recuperação, à semelhança da aprovação do plano de insolvência, não tem efeitos substantivos sobre o crédito que fundamenta a impugnação pauliana, designadamente extintivos. Assim, por força da aplicação combinada do n.º 7 do art. 17.º-F e do n.º 3 do art. 127.º do CIRE, “o interesse do credor (…) é aferido, para efeitos do artigo 616.º do Código Civil, com abstração das modificações introduzidas ao seu crédito por um eventual plano de” recuperação conducente à revitalização da empresa. Esta conclusão é coerente com os efeitos da impugnação pauliana reafirmados Tribunal da Relação do Porto nestes autos, os quais se repercutem, essencialmente, sobre o património do terceiro que, sendo o ato oneroso, age consciente do prejuízo causado ao credor – por vezes mesmo, como é alegado no caso dos autos, com propósitos fraudulentos. E é ainda coerente com a jurisprudência do nosso mais alto tribunal, conforme se pode concluir da leitura do Ac. do STJ de 04-05-2017 (206/14.5T2STC-A.E1.S1.S1), este já sobre uma garantia especial das obrigações.”</font><br>
</p><p><font>“Em conclusão, por não ter a aprovação do plano de recuperação efeitos processuais nem substantivos sobre o crédito, para efeitos de preparação e julgamento da ação de impugnação pauliana, indefere-se a requerida extinção da instância, fundada numa alegada inutilidade superveniente da lide.</font><br>
</p><p><font>A RÉ MARCELO PEIXOTO, S.A., RECORREU DESTE DESPACHO, E O RECURSO FOI ADMITIDO A SUBIR DIFERIDAMENTE, NOS AUTOS E COM EFEITO DEVOLUTIVO.</font><br>
</p><p><font>Prosseguiram os autos para julgamento tendo sido proferida SENTENÇA QUE DECRETOU:</font><br>
</p><p><font>A PROCEDENCIA DAS IMPUGNAÇÕES DOS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA REFERIDOS NOS PONTOS 7.º − FACTOS ASSENTES – E 8.º − FACTOS ASSENTES –, CELEBRADOS PELAS RÉS MARCELO PEIXOTO, S.A., E OTOXIEP POWER, UNIPESSOAL, L.DA, NAS QUALIDADES DE VENDEDORA E DE COMPRADORA, RESPETIVAMENTE.</font><br>
</p><p><font>TÊM OS AUTORES, AA E BB, O DIREITO EXECUTAR OS BENS OBJETO DOS REFERIDOS CONTRATOS NO PATRIMÓNIO DA RÉ OTOXIEP POWER, UNIPESSOAL, L.DA, SE NESTE SE VIEREM A ENCONTRAR, NA MEDIDA DO SEU INTERESSE NA LIQUIDAÇÃO DO VALOR DE € 494.398,00 (QUATROCENTOS E NOVENTA E QUATRO MIL, TREZENTOS E NOVENTA E OITO EUROS).</font><br>
</p><p><font>Desta sentença apelaram as rés tendo, após deliberação, sido decidido pelo Tribunal da Relação:</font><br>
</p><p><font>“IMPROCEDEM OS RECURSOS. </font><br>
</p><p><font>MANTÉM-SE A SENTENÇA RECORRIDA.</font><br>
</p><p><font>CUSTAS PELA RECORRENTE”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Novamente inconformadas com o decidido pela Relação, interpõem recurso de Revista excecional, as rés, e formulam as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“A. Na douta sentença primitivamente recorrida entendeu o Tribunal a quo (1ª Instância) que, o facto de ter sido aprovado um Plano Especial de Revitalização, no qual crédito objeto destes autos foi perdoado, não tem efeitos, quer substantivos quer processuais, nesta instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Anteriormente a Primeira Recorrente, em Requerimento datado de 05/02/2021, havia-se defendido pela falta de pressupostos para uma impugnação pauliana e requerido a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, posição esta que reitera na presente revista e que, pretende fazer ver a V/Exas. tal patente ausência de requisitos legais, a situação aqui em apreço visava uma apreciação de direito puramente substantiva, mormente no que tange aos efeitos externos do acordo aprovado e homologado em sede do PER da Primeira Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>C. Discordando de tal aplicação das normas jurídicas ao caso concreto, as Recorrentes, apelaram da proferida sentença para o Tribunal da Relação do Porto.</font></i><br>
</p><p><i><font>D. Sobre estas questões que mereceram a melhor atenção dos Venerandos Desembargadores, decidiram os mesmos manter a Sentença recorrida in totum, confirmando de forma dupla o que foi decidido na sentença proferida na primeira instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>E. Salvo o devido respeito, que é muito, não fizeram os Venerandos Desembargadores a quo uma adequada aplicação das normas de direito aplicáveis ao caso sub judice, nem uma correta interpretação dos argumentos explicados e apresentados, nomeadamente da concreta situação em apreço e às normas de direito substantivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>F. Mais propriamente, não fizeram os Mesmíssimos a interpretação correta, na opinião das Recorrentes, dos efeitos e respetivas consequências da aprovação de um Plano em sede de Processo Especial de Revitalização, dando até a entender que nenhum efeito decorre do recurso a tal expediente, dando a entender às aqui Recorrentes, após leitura atenta do respetivo Acórdão, que se torna absolutamente inútil ao Devedor que se apresenta ao PER na expectativa de poder revitalizar, recuperar e reestruturar a sua empresa e aos Credores que, tendo a esperança de ver parte ou totalidade do seu crédito ser pago por via desta plano especial de pagamentos, como uma melhor solução para que os créditos venham a ser saldados que a insolvência do devedor.</font></i><br>
</p><p><i><font>G. Salvo o devido e merecido respeito, existe aqui uma clara confusão relativo aquilo que é o instituto da “novação” e os efeitos jurídicos de um acordo homologado por sentença e que sujeita o devedor ao cumprimento de certas obrigações e o facto de não consubstanciar uma novação, strictu sensu, não implica que não haja produção de efeitos externos ao próprio PER.</font></i><br>
</p><p><i><font>H. A decisão oferecida pela Relação do Porto, nos termos ali constantes, não oferece qualquer segurança e certeza jurídica ao nosso ordenamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>DA INEXISTÊNCIA DO ALEGADO CRÉDITO DOS RECORRIDOS,</font></i><br>
</p><p><i><font>I. Os recorridos não possuem qualquer crédito para com a primeira recorrente, o seu crédito, inexiste, foi perdoado tendo sido extinto.</font></i><br>
</p><p><i><font>J. Consta dos autos que a Primeira Recorrente apresentou um Processo Especial de Revitalização (PER) no dia 13 de Janeiro de 2020, no âmbito de tal processo foi aprovado e homologado o Plano de Recuperação da Recorrente no âmbito do processo n.º 134/20...., por despacho de homologação proferido no dia 7 de novembro de 2020, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Comércio ... – Juiz ..., e já transitada em julgado no dia 2 de dezembro de 2020.</font></i><br>
</p><p><i><font>K. O crédito alegado e peticionado em sede da presente ação pauliana, foi igualmente reclamado em sede do PER, onde foi reconhecido e qualificado como crédito subordinado, por decisão já transitada em julgado, ao abrigo do referido plano, já aprovado e homologado, transitado em julgado no dia 2 de dezembro de 2020, os créditos subordinados, tal como o peticionado na ação pauliana nos presentes autos, deixam de existir, sendo objeto de perdão</font></i><br>
</p><p><i><font>DO ENTENDIMENTO DA NÃO PRODUÇÃO DE EFEITOS EXTRAPROCESSUAIS DA SENTENÇA QUE APROVOU E HOMOLOGOU O PLANO DE RECUPERAÇÃO DA PRIMEIRA RECORRENTE</font></i><br>
</p><p><i><font>L. Entendeu o Tribunal da Relação do Porto que a sentença homologatória no PER não produz efeitos extra processuais, uma vez que não visa a determinação e configuração do direito do credor, mas somente viabilizar a revitalização financeira do devedor.</font></i><br>
</p><p><i><font>M. Essa não é a opinião da Jurisprudência, nem foi, de todo a intenção do legislador, e veja-se a este propósito o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 29/01/2019, proc. 1563/16.4T8AMT.P1.S2, “Aliás, essa ideia de irradiação externa doo efeitos do plano de revitalização não é estranha ao legislador do CIRE” (restante teor do Ac. supra) Das finalidades do PER</font></i><br>
</p><p><i><font>N. Veio o Ac. do Tribunal da Relação referir que um dos argumentos para que o PER não tenha efeitos extra processuais é as finalidades do próprio PER.</font></i><br>
</p><p><i><font>O. Da definição dada por lei pode dizer-se que o PER prossegue dois objetivos imediatos, que são a possibilidade de negociação entre o devedor e seus credores e a conclusão do acordo de revitalização e consta diretamente do artigo 17.º-A do CIRE que este processo se destina a permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização.</font></i><br>
</p><p><i><font>P. Efetivamente, não decorre diretamente da letra de lei que o PER e respetiva sentença homologatória visem “a determinação da existência e configuração do direito do credor” pois, desde logo, não se trata de uma ação declarativa no qual se visa apreciar se o Credor é efetivamente detentor daquele direito e os termos, âmbito e limite do mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Q. Porém, determinar que o acordo celebrado, aprovado e homologado entre o devedor e os seus credores não tem efeitos extra processuais é ir em sentido diametralmente oposto às finalidades do PER, à vontade da maioria dos credores e a forma mais suscetível de impedir a devida revitalização da empresa devedora.</font></i><br>
</p><p><i><font>R. Um acordo deste género vê estas cedências serem juridicamente garantidas por sentença, publicada, oponível a terceiros e que vincula todos os intervenientes e até outros que não participaram nas ditas negociações.</font></i><br>
</p><p><i><font>S. E isso resulta, claro está e inequivocamente, no nº 10, do artigo 17.º - F do CIRE, “A decisão de homologação vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 4 do artigo 17.º-C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal.”.</font></i><br>
</p><p><i><font>T. E isso encontra-se assente na jurisprudência supracitada.</font></i><br>
</p><p><i><font>U. Desde logo, e apesar de não se aplicar aos Recorridos, uma vez que estes participaram ativamente nas negociações, na reclamação e graduação do seu crédito, A DECISÃO DE HOMOLOGAÇÃO DO PLANO, OS TERMOS DO PLANO VINCULAM TODOS OS CREDORES MESMO OS QUE NÃO TENHAM INTERVINDO NESTAS.</font></i><br>
</p><p><i><font>V. Este é salvo o devido e maior respeito, o expoente máximo de efeitos oponíveis a terceiros previsto no nosso ordenamento jurídico, ainda assim, e caso assim não fosse, acresce que a decisão é notificada a todas.</font></i><br>
</p><p><i><font>W. Sem prescindir, é ainda publicitada o que visa dar o conhecimento do mesmo a todos os interessados extra processo bem como a todos os terceiros e, como se não bastasse, é ainda registada a decisão por parte da secretaria judicial.</font></i><br>
</p><p><i><font>X. A publicação e o registo são o reflexo máximo da intenção do legislador em querer tornar oponível a todos os terceiros ao processo e às suas negociações o plano aprovado bem como os seus termos, e vincular todos estes. Além disto, a vontade de fazer perceber a todos os terceiros que a empresa devedora está em revitalização, está sujeita às contingências decorrentes desse processo judicial é tanta que ainda antes da homologação do plano, tem de haver até uma publicitação da deliberação que aprova o plano proposto – isto nos termos do artigo 213.º do CIRE.</font></i><br>
</p><p><i><font>Y. Então, estatuiu e exigiu o legislador tantas obrigatoriedades quanto à publicidade do processo, aos termos do contrato, às moratórias do mesmo, aos perdões ali concedidos para agora, no momento em que se faz valer todo o elenco de deveres a que está adstrita a empresa revitalizada, o tribunal vir estatuir que este não tem efeitos externos?</font></i><br>
</p><p><i><font>Z. E mesmo que assim fosse, os Recorridos foram intervenientes ativos em todo o processo, parte que atuou em tudo e que, ainda assim, está vinculada aos termos aprovados e homologados – não lhes é aplicável o conteúdo material do plano? Embora todos os credores estejam vinculados aos termos estatuídos no plano, mesmo os que não intervieram na sua negociação, os Recorridos (certamente credores especialíssimos) podem-se desvincular do mesmo e ver o seu crédito ser pago à frente dos restantes por esta via? Não pode lograr este entendimento!</font></i><br>
</p><p><i><font>AA. Este entendimento, que não colhe, inviabiliza totalmente que a instauração de um PER tenha algum efeito útil para o devedor.</font></i><br>
</p><p><i><font>BB. Aliás, como se cumpre assim a finalidade do PER: a revitalização da empresa e o cumprimento das obrigações negociadas com os credores se, afinal, estes Credores podem recorrer a estes expedientes engenhosos e ardilosos para se frustrarem as contingências do plano? </font></i><br>
</p><p><i><font>CC. Permitir esta interpretação, é dar azo a que se permita, na ordem jurídica portuguesa, uma violação escandalosa do principio da igualdade dos credores previsto e tutelado nos termos do artigo 194.º do CIRE e nos termos do artigo 13.º da CRP.</font></i><br>
</p><p><i><font>DD. Sem prescindir, é também efeito direto de forma a garantir a finalidade do PER a previsão do artigo 17.º - E do CIRE que, referente a um momento anterior à homologação do próprio plano, se verificam desde logo diversos efeitos externos deste instituto jurídico. </font></i><br>
</p><p><i><font>EE. E o que demonstra, desde logo, que é absolutamente imperativo que este tipo de ações, tal como a que os recorridos intentaram não pode proceder, nem pode continuar os seus termos, sob pena de por em risco todo o intuito do Processo Especial de Revitalização – este normativo é mais um efeito reflexo dos efeitos extra processuais que se verifica com o PER. Aliás, diga-se, são bastantes os efeitos extra processuais que são impostos por lei para salvaguardar A FINALIDADE DO PER.</font></i><br>
</p><p><i><font>FF. Por tudo exposto é cabal e única a conclusão a retirar quanto às finalidades do PER: a existência de efeitos externos, oponíveis a terceiros e extra processuais é absolutamente essencial para permitir a revitalização da empresa, a renegociação da divida, a sua recuperação e a sua permanência no mercado.</font></i><br>
</p><p><i><font>Dos efeitos das modificações alcançadas no passivo (as moras e o perdão), </font></i><br>
</p><p><i><font>GG. Ora, as moras e o perdão de divida constituem contingências que são parte integrante do plano de insolvência e do plano especial de revitalização e o Acórdão recorrido que estas alterações ao passivo “apenas operam no âmbito do próprio plano”.</font></i><br>
</p><p><i><font>HH. E fundamenta tal entendimento com recurso advogando que o DL 79/2017 veio consagrar uma remissão do artigo 218.º para o PER por esse mesmo motivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. Toda esta argumentação em torno do artigo 218.º redunda num silogismo falacioso, que não corresponde à intenção do legislador, pelo contrário, o artigo 218.º do CIRE, a contrario, corrobora in totum o entendimento das aqui Recorrentes e o entendimento que deverá ser atendido por este Distinto Tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>JJ. É necessário interpretar este artigo a contrario - EM TODAS AS SITUAÇÕES NÃO CONSTANTES DESTE ARTIGO O PERDÃO E AS MORATÓRIAS MANTÉM OS SEUS EFEITOS NA SUA PLENITUDE.</font></i><br>
</p><p><i><font>KK. Posto isto, a única forma, nos termos do artigo 218.º do CIRE, de vermos ficar sem efeito o perdão e as moratórias é se se verificarem as situações previstas naquelas alíneas – e aí sim, por lei, fica sem efeito os termos constantes do acordo homologado por sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>LL. Assente que está este entendimento (cfr. parágrafo do acórdão divido entre a penúltima e a última página) resta-nos analisar se efetivamente se verifica alguma das situações da alínea a) ou da b) do artigo 218.º e, caso não se verifiquem, pode-se constatar de forma inequívoca que o perdão constante do acordo mantém os seus efeitos em pleno e, por consequência, inexiste o crédito dos Recorridos.</font></i><br>
</p><p><i><font>MM. Sem prescindir, como se trata de um perdão do crédito, e em consequência a sua extinção, é manifestamente impossível que haja incumprimento para com os recorridos por parte da Primeira Recorrente </font></i><br>
</p><p><i><font>NN. Quanto à alínea a) o devedor, aqui primeira recorrente, não se encontra em mora de maneira alguma (nem o podia quanto aos Recorridos, dada a extinção do seu crédito do qual não resulta qualquer obrigação) e, além do mais, teria ainda de cumprir as exigências da própria alínea, isto é, a interpelação para o seu cumprimento acrescido de juros no prazo de 15 dias. Ora, é manifesta a conclusão de que apenas se “ativa” esta alínea nos termos ali constantes: primeiro é necessário o tal incumprimento (que é impossível) e, depois, a tal interpelação para o cumprimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>OO. No que concerne à alínea b), é necessário verificar-se uma situação de insolvência, o que não se denota no presente caso pelo que se mantém intocável o perdão do crédito dos recorridos.</font></i><br>
</p><p><i><font>PP. Assim, não se verificando qualquer incumprimento das obrigações do plano aprovado e homologado nos termos da alínea a), nem a declaração de insolvência da empresa revitalizada, não ficam sem efeito as modificações de passivo convencionadas no plano. A aplicação deste artigo, e por conseguinte, o perdão ficar sem efeitos está sempre sujeita a uma CONDIÇÃO e, não se verificando a mesma, é absolutamente contra legem arguir que os termos do plano não produzem efeitos externos.</font></i><br>
</p><p><i><font>QQ. De tudo o exposto é possível concluir de forma inequívoca que, salvo o devido e maior respeito, o artigo 218.º tem de ser interpretado a contrario e resulta dessa interpretação, contrariamente ao entendido no acórdão em crise, que este normativo legal é corolário dos efeitos extra processuais do PER, mormente das moratórias e perdões de crédito ali estatuídos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Da Doutrina citada no douto acórdão,</font></i><br>
</p><p><i><font>RR. Ainda no que à fundamentação constante do douto acórdão é importante referir a citação dos Autores Nuno Salazar Casanova e D. Sequeira Dinis, in per – O processo especial de revitalização, 79, também não encontra no Acórdão o reflexo e a posição dos Autores.</font></i><br>
</p><p><i><font>SS. Leia-se a totalidade da reflexão dos Autores: “A decisão sobre a reclamação de créditos é meramente incidental pelo que nos termos do n.º 2 do artigo 96.º do CPC não constitui caso julgado fora do respectivo processo” – pelo que, em momento algum é referido por aqueles Autores que as modificações relativamente aos créditos (isto é, as alterações do passivo) não constituem caso julgado no PER – pois aí estamos a falar sobre os termos acordados no PER (QUE EFETIVAMENTE FAZ CASO JULGADO EXTRA PROCESSO) – o que não faz, é só e apenas as decisões relativas à reclamação de créditos (nomeadamente a sua qualificação e quantificação – como, e bem, reclamaram os Recorridos por todos os meios que tinham ao seu dispor na tentativa de ver uma qualificação do seu crédito como crédito comum e não subordinado, contudo, tentativas estas todas improcedente.</font></i><br>
</p><p><i><font>Do efeito novatório (ou não),</font></i><br>
</p><p><i><font>TT. É também concluso no Ac. recorrido que não tem qualquer efeito novatório em extinguir o crédito, por isso tal não tinha efeito na presente ação.</font></i><br>
</p><p><i><font>UU. Ora, salvo o devido respeito, também esta conclusão não é propriamente correta e absolutamente unânime e clara, apenas se tem como assente, diga-se, a inexistência de efeito novatório quanto aos fiadores, garantes e codevedores, nos termos do artigo 217.º, n.º 4 do CIRE.</font></i><br>
</p><p><i><font>VV. Tendo a jurisprudência como assente esta situação, exemplificando, caso a sociedade Segunda Recorrente fosse fiadora da Primeira, efetivamente o crédito continuaria a existir perante esta, podendo os recorridos vir exigir o seu pagamento ao garante mas a contrario, pode-se entender que não se tratando de um garante, fiador ou codevedor, efetivamente pode-se considerar a existência deste efeito novatório.</font></i><br>
</p><p><i><font>WW. Isto porque, o acordo obtido no âmbito do PER, sendo um acordo global entre o devedor e o credor no sentido de reestruturar e programar o pagamento das dívidas, importa a consideração de moratórias e perdão de divida (alguns totais e outros parciais), contudo o cumprimento deste acordo estará sempre sujeito às condições do artigo 218.º, isto é, a contrario, caso não se verifique nenhuma daquelas situações e o plano seja cumprido – EFETIVAMENTE DEU-SE A TAL NOVAÇÃO – a transformação da divida/obrigação originária, substituída pelo efetivo cumprimento do plano.</font></i><br>
</p><p><i><font>XX. Uma espécie de novação sob condição e no mesmo sentido exato do que aqui se expõe já teve a oportunidade de se pronunciar o Tribunal da Relação de Évora, de 11/04/2019, proc. 425/18.5T8BJA-A.E1.</font></i><br>
</p><p><i><font>YY. Este acórdão não só corrobora o já acima refletido quanto à inaplicabilidade do artigo 218.º para afirmar que o PER não produz efeitos extra processuais, como também vem expressamente afirmar esta NOVAÇÃO quando não verificada a condição que poder tornar sem efeito os termos acordados em sede de PER.</font></i><br>
</p><p><i><font>ZZ. Por tudo o exposto, pelos termos constantes da Lei e da Constituição da República Portuguesa, nos termos do intuito do legislador na criação do instituto PER resta apenas epilogar que o Acórdão recorrida não prima de todo por uma boa aplicação do direito tendo culminado com uma aplicação errónea do Direito uma vez que é inequívoco que o acordo aprovado e homologado por sentença judicial tem efeitos extra processuais e vinculado todos os credores, pelo que tendo sido o crédito qualificado como crédito subordinado e, por conseguinte, perdoado e extinto!</font></i><br>
</p><p><i><font>AAA. Conclui-se assim que inexistindo este crédito, inexistem os pressupostos legais essenciais para a procedência da ação de impugnação pauliana. Como se constata da presente Revista Excecional, não possuem os Recorridos nenhum crédito sobre as Recorrentes pelo que não pode proceder a Impugnação Pauliana por não se verificarem as exigências legais dos artigos 610º e seguintes do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>BBB. De outro modo, todos os restantes Credores poder-se-iam valer deste expediente para se frustrarem às contingências e exigências aprovadas pela Assembleia de Credores e posteriormente homologados por Sentença, havendo assim uma clara violação do principio da igualdade e abuso de direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>CCC. O seu crédito foi perdoado em sede o PER uma vez que foi considerado crédito subordinado – e este perdão tem efeitos extra processuais até haver um incumprimento do plano que “ative” o artigo 218.º do CIRE, a solução oferecida pelo douto acórdão recorrido está errada e está em confronto total com a finalidade e a vontade do legislador com a criação do instituo do PER – sendo absolutamente incompatível a solução destes autos e o aquele instituto jurídico.</font></i><br>
</p><p><i><font>DDD. Tudo o que se expõe no presente Recurso de Revista Excecional urge por uma intervenção derradeira do Supremo Tribunal de Justiça e de uma melhor aplicação do Direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>EEE. Nesse sentido, devem as considerações supra escrutinadas e referentes aos efeitos extra processuais do acordo aprovado e homologado por decisão judicial serem atendidas por Suas Exas., declarando-se como oponível nos presentes autos o perdão e respetiva extinção do crédito dos recorridos, considerando-se não reunidos os pressupostos para a procedência da ação de impugnação pauliana.</font></i><br>
</p><p><i><font>FFF. Esta é a única decisão adequada por forma a não inviabilizar o intuito do Processo Especial de Revitalização, por forma a não contrariar a Lei, por forma a não violar os princípios constitucionais protegidos nos artigos 2º, 13.º e 20º da CRP; deste modo deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que permita uma solução que resulta numa melhor aplicação do direito nos termos do artigo 672º do CPC e assim se fazendo JUSTIÇA.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser declarado procedente e em consequência ser o Acórdão proferido revogado com as demais consequências legais.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim fazendo Vossas Excelências, como sempre, inteira e sã J U S T I Ç A !”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Respondem os autores e concluem:</font><br>
</p><p><i><font>“INADMISSIBILIDADE DO RECURSO</font></i><br>
</p><p><i><font>1.ª Invocam, as recorrentes, como pressupostos para o presente recurso de revista excecional, a necessidade da prolação de uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça que permita uma melhor aplicação do direito, relativamente às questões de direito que levantam.</font></i><br>
</p><p><i><font>2.ª Apesar de indicarem a existência de oposição de julgados e, como tal, pensaríamos que estaria a lançar mão do disposto no art. 672.º, n.º 2, al.c) do CPC, facto é que incumpriram o ónus que impede sobre o recorrente nesta matéria.</font></i><br>
</p><p><i><font>3.ª Pois apesar de, nas suas alegações indicarem a existência de vários Acórdãos, onde se inclui o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 29/02/2019, proc. 1563/16.4T8AMT.P1.S2; facto é que não juntam o Acórdão fundamento, por tal não existir.</font></i><br>
</p><p><i><font>4.ª Nem o poderiam fazer, porquanto tais Acórdãos não se debruçam concretamente sobre as questões de direito já previamente levantadas e decididas nos autos, e que são igualmente objeto do presente recurso de revista excecional.</font></i><br>
</p><p><i><font>5.ª De facto, os Acórdãos referidos aludem aos efeitos externos do PER quanto aos garantes das obrigações da devedora em PER (avalistas, fiadores) e, a apreciação de tal questão, tem resultado em soluções diversas na Jurisprudência e Doutrina.</font></i><br>
</p><p><i><font>6.ª Contudo, a situação destes autos, nada tem a ver com garantes das obrigações da devedora em PER.</font></i><br>
</p><p><i><font>7.ª Em todo o caso, não tendo sido cumprido o ónus que impendia sobre as recorrentes, relativamente ao Recurso de Revista Excepcional com base no disposto no 672.º, n.º 2, al.c) do CPC, restou às recorrentes invocar, como fundamento para o presente recurso, os previstos no art. 672.º, n.º 1, als. a) e b) do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>8.ª Igualmente cremos que não fui cumprido o ónus de alegar e fundamentar a razão pela qual se reputa como necessária uma decisão para uma melhor aplicação do direito e bem assim o interesse de particular importância social das questões levantadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>9.ª Desde logo, as recorrentes, apesar de, nas suas alegações invocarem serem estes os fundamentos para este Revista Excepcional, em nenhum momento das suas conclusões explanam a sua motivação ou sequer o referem.</font></i><br>
</p><p><i><font>10.º Cremos que o ónus de, nas conclusões, serem invocados os motivos e fundamentos do recurso abrange, igualmente, pelo menos a exposição que permita ao Tribunal verificar a existência de admissibilidade do mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>11.º Em todo o caso, e remetendo-nos às alegações (cfr. fls 10 §4 das alegações), sumariamente as recorrentes invocam que as decisões proferidas nestes autos pela 1.ª Instância e pelo Tribunal da Relação do Porto, são de extrema relevância social, pois no PER existem trabalhadores e as suas famílias dependentes da revitalização (Art. 672.º, n. 1, al.b) CPC); e por outro lado 12.ª alegam as recorrentes que, procedendo a impugnação pauliana, é permitir que este credor e os demais venham a instaurar ações de igual cariz e fugirem às obrigações do Plano e suprirem as contingências que daí advêm (cfr. fls 11 §1 das alegações).</font></i><br>
</p><p><i><font>13.ª Contudo, as recorrentes não invocaram, as razões do ponto de vista do debate Doutrinal e Jurisprudencial que justifiquem o presente recurso, nem apresentam a diversidade de soluções para o problema jurídico em causa, bem como, apesar de não ser possível o recurso ao disposto no art. 672.º, n.º 1, al.c) do CPC, ainda assim não invocam que a questão jurídica sub judice, faça surgir na Doutrina e Jurisprudência decisões controversas e contraditórias.</font></i><br>
</p><p><i><font>14.ª Não o | [0 0 0 ... 0 0 0] |
4jJqu4YBgYBz1XKv0wT5 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>No Tribunal Judicial da ... - Juízo Local Cível do ... – na presente ação com forma de processo comum, a sociedade </font><b><font>Símbolo Justo, Lda. demanda</font></b><font> </font><b><font>AA</font></b><font>, pedindo que seja a ré condenada a celebrar consigo o negócio projetado na comunicação à preferência e aceite pela autora com estipulação de prazo, bem como a condenação da ré numa sanção pecuniária compulsória à taxa diária de €50,00 por cada dia de atraso na celebração da escritura pública de compra e venda.</font><br>
</p><p><font>Alegou, para o efeito, que após a ré lhe transmitir que iria vender o imóvel a que alude no artigo 8.º da petição inicial, exerceu cabalmente o seu direito de preferência, tendo a ré incumprido o mesmo.</font><br>
</p><p><font>Na contestação, a ré defende que, não obstante ter enviado a missiva a que a autora alude no artigo 8.º na petição inicial, a mesma consubstanciou um mero lapso, até porque o aludido imóvel não foi objeto de contrato de compra e venda e sim de arrendamento. Mais informou aí a ré que iria intentar de imediato a competente ação de preferência contra a autora e que requereria a suspensão da presente instância, invocando como fundamento a pendência de causa prejudicial.</font><br>
</p><p><font>Neste sentido veio a ré posteriormente a requerer a suspensão da instância por ter intentado intentou a ação de preferência a que aludiu.</font><br>
</p><p><font>No despacho saneador veio o tribunal a indeferir o pedido de suspensão da instância requerido pela ré e, julgando a ação procedente condenou “a ré AA a celebrar com a autora o negócio projetado na comunicação à preferência Símbolo Justo, Lda., descrito no ponto 5 dos factos provados, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença e (…) com vista a assegurar a eficácia do acima determinado, fixo em €50,00 a importância devida por cada dia em que a ré não cumprir o determinado (…).”</font><br>
</p><p><b><font>Inconformada veio a Ré</font></b><font> interpor recurso de apelação, sendo deliberado e a final proferido acórdão do seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>“Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a Apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Novamente inconformada, com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpõe recurso de Revista para este STJ a ré, e formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><font>“</font><i><font>1ª - </font></i><i><font>A primeira questão fundamental do direito consiste, assim, em apurar qual o efeito jurídico da recepção pelo titular do direito à preferência da comunicação feita pelo obrigado da sua intenção de venda do imóvel – contendo os elementos essenciais do projectado negócio e necessários à decisão do titular do direito – e da consequente recepção pelo segundo da comunicação pelo primeiro da sua vontade de exercer tal direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>2ª - A segunda questão fundamental do direito é a de saber se, verificada a existência de outra acção que se constitui como causa prejudicial da presente acção, se deve determinar a suspensão da instância desta, mesmo que aquela tenha sido intentada posteriormente a esta e não existindo quaisquer indícios de que aquela tenha sido intentada unicamente para se obter a suspensão ou de que a causa dependente está tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens”.</font></i><br>
</p><p><i><font>3ª – quanto à primeira questão entendemos que a tese que melhor se coaduna com os interesses em conflito é a de que a notificação para preferência aproxima-se da figura do convite a contratar, sendo-lhe aplicável o artigo 227.º do Código Civil (cfr. o acórdão-fundamento de 08/01/2009, proferido no processo n.º 08B2772 que, por economia processual, aqui reproduzimos na íntegra).</font></i><br>
</p><p><i><font>4ª – a ré, aqui recorrente, não pode, assim, ser condenada nos termos em que o foi devendo ser absolvida dos pedidos.</font></i><br>
</p><p><i><font>4ª - Atento o prescrito no art.º 672º, n.º 2 do CPC e o alegado a montante, estão verificados os pressupostos para que o presente recurso de revista excepcional seja admitido quanto a tal questão.</font></i><br>
</p><p><i><font>5ª – Com efeito, como se disse, a questão em apreço tem relevância jurídica bastante para que a sua apreciação seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>6ª – justifica-se, outrossim, a admissão do presente recurso na medida em que estão em causa interesses de particular relevância social, conforme se tentou demonstrar.</font></i><br>
</p><p><i><font>7ª – Verifica-se, por último, que o acórdão recorrido está em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/01/2009, proferido no âmbito do Processo n.º 08B2772 de que se junta cópia e se encontra disponível, designadamente, em www.dgsi.pt>jstj.nsf.</font></i><br>
</p><p><i><font>8ª – É, assim, de acolher, no caso dos autos, a posição jurisprudencial que decorre do acórdão-fundamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>9ª - no que tange à segunda questão, não estando demonstrados minimamente quaisquer dos requisitos ínsitos no n.º 2 do art.º 272º do CPC e, por outro, não sendo juridicamente correcta a asserção no acórdão recorrido de que é “impossível proceder à suspensão da instância com base na prejudicialidade do que se discute noutra, se esta tiver sido proposta posteriormente”, deve efectivamente ser decretada a suspensão da presente instância enquanto a acção de preferência intentada pela aqui recorrente não se mostrar decidida.</font></i><br>
</p><p><i><font> 10ª – Também a apreciação desta questão se justifica, conforme supra se alegou, à luz do disposto no art.º 672º, n.º 1, alínea a) do CPC. </font></i><br>
</p><p><i><font> 8ª – </font></i><font>(repetida a numeração) </font><i><font>A sentença e o Acórdão recorridos violam, assim, designadamente o disposto nos art.ºs 227º e 416º do C. Civil, o art.º 272º, n.º 2 e º do C. P. Civil e os princípios constitucionais do direito de propriedade privada, da proporcionalidade, da protecção da confiança, da segurança e da paz jurídicas.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, anular-se a sentença e o Acórdão recorrido, substituindo-se por outro Acórdão de acordo com o propugnado nas conclusões antecedentes</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Mais requer, a recorrente, de harmonia com o disposto no art. 686, n.º 2 do CPC, que o julgamento do recurso se faça com intervenção do pleno das Secções Cíveis.</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O processo foi remetido à Formação, tendo esta deliberado admitir o recurso, nos seguintes termos.</font><br>
<p><i><font>“Ora, como o próprio acórdão recorrido documenta, a questão de saber se a comunicação prevista no nº 1 do art. 416º do CC que preencha os requisitos nele enunciados configura, ou não, uma proposta de contrato não tem obtido uma solução uniforme nos nossos tribunais, independentemente de apurar se tal dissídio jurisprudencial se inclina maioritariamente para qualquer dos sentidos trilhados. E é o que, desde logo, também patenteia a falta de sintonia entre o acórdão recorrido e o invocado como fundamento, sem necessidade de aferir se a subsunção jurídica feita em qualquer dessas decisões operou sobre o mesmo núcleo factual. </font></i><br>
</p><p><i><font>Sinalizada a existência dessa divergência jurisprudencial, que pode gerar insegurança na aplicação do direito, mostra-se idoneamente justificada a excepcional intervenção deste Supremo Tribunal, com vista a clarificar, uma vez mais, o entendimento sobre a matéria atinente à primeira das questões suscitadas e a ultrapassar tal insegurança, podendo o seu impacto determinar, para além do concreto litígio, a apreciação de outros muitos casos em que se suscite uma semelhante controvérsia.</font></i><br>
</p><p><i><font>Face ao exposto, admite-se a revista excepcional apenas quanto à decisão sobre o mérito e devolve-se ao Exmo. Relator a apreciação sobre a admissibilidade do recurso na parte que tem por objecto a decisão de indeferimento do pedido de suspensão da instância</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Por despacho notificado foi decidido que:</font><br>
</p><p><font>- Não se verificavam os requisitos de admissão do recurso de revista ordinária, no segmento do recurso respeitante à existência, ou não, de outra ação que se constituiu como causa prejudicial da presente ação e que fosse determinativa da suspensão da instância desta.</font><br>
</p><p><font>- Por isso, não foi admitido o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, neste segmento, prosseguindo os autos para apreciação, apenas, do segmento do recurso que incide sobre a decisão de mérito (revista excecional). </font><br>
</p><p><font>- Remetido o processo ao Exmº Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça para efeitos do disposto no art. 686 do CPC, pelo mesmo foi despachado no sentido do indeferimento do pedido de julgamento ampliado da revista.</font><br>
</p><p><font>Foram dispensados os vistos dos Exmos Conselheiros adjuntos.</font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Nas Instâncias foi julgada como provada</font></b><font> a seguinte matéria de facto:</font><br>
<p><font>“</font><i><font>1. Encontra-se inscrito em nome da autora o imóvel sito em ..., com natureza rústica e inerente matriz ...33 e natureza urbana e inerente matriz ...23, com cultura arvense de regadio, cultura arvense, montado de sobreiros, olival, pinhal, pomar de citrinos, mato e pastagem e edifício com ... e ... e descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o artigo ....26</font></i><br>
</p><p><i><font>2. O dito imóvel confronta a norte com BB, a sul com CC, a nascente com EE e a poente com FF.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Encontra-se inscrito em nome da autora imóvel sito em ..., com natureza rústica e inerente matriz …32, com pinhal e mato e descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o artigo ....26</font></i><br>
</p><p><i><font>4. O dito imóvel confronta a norte e nascente com DD e sul e poente com caminho público.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. No dia 23 de maio de 2019, a autora recebeu uma missiva endereçada pela ré datada de 14 de maio de 2019 com os seguintes dizeres: “Venho na qualidade de proprietária dar conhecimento a V. Ex(a) (s). que vamos vender o prédio inscrito na respectiva matriz urbana sob o n.º …50 e na matriz rústica sob o n.º ...54 e descrito na Conservatória do Registo Predial do ..., sob o n.º ...76, sito em ... ..., ... pelo valor de quarenta e dois mil euros, a GG. A escritura pública de compra e venda ou documento particular autenticado será realizado no prazo máximo de 30 dias na cidade de ... e o pagamento do preço será efectuado da seguinte forma: i) com a assinatura do contrato de promessa de compra e venda é paga através de cheque a quantia de 4.200 euros (quarto mil e duzentos euros), que ocorrerá após o prazo para V. Ex(a) (s.) preferirem na referida transmissão; ii) com a outorga da escritura pública de compra e venda será pago o remanescente que ascende a 37.800 (trinta e sete mil oitocentos euros). Como confinante, assiste-lhe o direito de preferir na referida transmissão. Pelo exposto, fico a aguardar no prazo legal de oito dias, findo o qual se não houver comunicação de V. Ex(s) (s), nesse sentido, caducará o respectivo direito, nos termos do artigo 416 n.º 2 do Código Civil.”</font></i><br>
</p><p><i><font>6. No dia 29 de maio de 2019, a autora enviou à ré uma missiva com os seguintes dizeres: “pretende exercer o direito de preferência na venda do imóvel sito em ..., ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ...50 e na matriz rústica sob o n.º ...54 e descrito na CRP do ... sob o n.º ...76, pelo preço e condições que constam da V. carta de 14 de maio de 2019 (…) solicita assim que desenvolvam as diligências necessárias para a realização do contrato promessa e prometido e nos remetam a documentação actualizada do imóvel.”</font></i><br>
</p><p><i><font>7. No dia 02 de Agosto de 2019, a autora enviou à ré notificação judicial avulsa a comunicar o exercício do direito de preferência.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. No dia 10 de setembro de 2019, a ré enviou à autora a missiva com os dizeres: “Venho por este meio informar que foi por lapso enviada uma carta de direito de preferência relativamente ao imóvel misto sito em ... – ..., inscrito na matriz predial urbana com o artigo ...50 e na matriz predial rústica com o artigo ...54 da freguesia de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o número ....76. O negócio a realizar é sobre uma habitação de primeira residência permanente, parte integrante da propriedade, onde inclusive já residem os compradores há mais de ano e meio e na qual já efectuaram diversas obras de benfeitorias. Ambas as propriedades têm artigos urbanos contidos nelas e o valor dos prédios urbanos prevalece sobre o valor dos prédios rústicos nos dois casos, o que leva a considerar que ambas as propriedades se destinam prioritariamente a habitação e em segundo plano a exploração agrícola ou florestal. Constata-se ainda que as culturas das duas propriedades são diferentes, sendo que na quinta do ... existe uma exploração agrícola de regadio, enquanto na quinta da ... existe uma exploração florestal e silvo pastoral. Assim sendo, a Símbolo Justo, Lda. não tem direito de preferência nestas circunstâncias, pelo que iremos proceder à escritura de compra e venda previamente acordada pelo Contrato de Promessa de Compra e Venda já assinado em 31 de Outubro de 2018</font></i><font>.”</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>E são os seguintes os </font><b><font>factos pertinentes na decisão do acórdão fundamento</font></b><font>:</font><br>
<p><i><font>Estão provados os seguintes factos:</font></i><br>
</p><p><i><font>A ré é proprietária do prédio urbano descrito na ... Conservatória do Registo Predial de ......, sob o no …77 da freguesia de ..., actualmente inscrito na matriz sob o artigo ...25 da freguesia de ..., sito na Av...., n°s... a..., tornejando para a Rua ..., n°s ... a ..., em ..., conforme inscrição no … registada a seu favor pela Ap. 5 de 17.03.1975.</font></i><br>
</p><p><i><font>A autora, que tem como objecto o exercício da actividade industrial hoteleira, nomeadamente a exploração de estabelecimentos de comidas e bebidas ou restaurantes, podendo ainda dedicar-se ao comércio de mercearia a retalho, é arrendatária dos n°s ... do imóvel supra descrito onde desenvolve o seu comércio.</font></i><br>
</p><p><i><font>Por escritura de arrendamento celebrada em 11.03.1921, do livro de actos e contratos no 454, a fls. 87, do ......, Dr. JJ, posteriormente … Cartório Notarial de ......, e escritura de alteração de arrendamento e fiança celebrada em 24.01.1990, do livro 128-F a fls. 92 a 94 verso do … Cartório Notarial de ......, no que respeita à renda mensal e ao ramo comercial, a ré deu de arrendamento à autora a loja com acesso pelos n° ... do prédio urbano sito na Avenida..., supra identificado, destinada ao ramo comercial de pastelaria e snack, mediante o pagamento da renda mensal de 50.000S00 (cinquenta mil escudos), com vencimento no primeiro dia útil imediatamente anterior àquele a que disser respeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sendo o contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de um ano.</font></i><br>
</p><p><i><font>Tendo a renda o valor mensal actual de € 550,19 (quinhentos e cinquenta euros e dezanove cêntimos).</font></i><br>
</p><p><i><font>Sucede que a ré, através do seu Departamento de Gestão Imobiliária e Património, enviou à autora uma carta registada com aviso de recepção, datada de 22.09.2004, com o seguinte teor: "ASSUNTO: Direito de preferência na compra do prédio sito na Av.... n°s ... a ..., tornejando para a Rua ... n°s... a ...</font></i><br>
</p><p><i><font>A Santa Casa da Misericórdia........., vem, pelo presente meio, comunicar a V. Ex.a que vai proceder à venda do prédio sito na ........, n°s ... a ..., tornejando para a Rua ..., n°s ... a ..., em ..., ao ......, com sede na Rua ..., n° ..., em ..., pelo valor de 2.842.000,00 Euros (Dois milhões oitocentos e quarenta e dois mil euros), a ser pago integralmente no acto da escritura pública de compra e venda.</font></i><br>
</p><p><i><font>A respectiva escritura pública vai ser realizada no próximo mês de Outubro, data em que se prevê que estejam reunidas todas as condições para o efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestas condições, poderá V. Exa. exercer o direito de preferência, que lhe assiste, no prazo de oito dias, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 47° e seguintes do Regime de Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n° 321/B/90, de 15 de Outubro, e artigo 416° e seguintes do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com os melhores cumprimentos</font></i><br>
</p><p><i><font>O Adjunto da Mesa (M... de L...)</font></i><br>
</p><p><i><font>…</font></i><br>
</p><p><i><font>Em resposta, a autora enviou à ré carta registada com aviso de recepção, datada e registada de 01.10.2004 e recebida pela ré em 06.10.2004, com o seguinte teor:</font></i><br>
</p><p><i><font>"Exmos. Senhores,</font></i><br>
</p><p><i><font>Acusamos a recepção, em 27.09.04, da vossa carta datada de 22.09.04, referente ao direito de preferência na compra do prédio sito na ....... n°s ... a ..., tornejando para a Rua ... n°s ... a ..., em ....</font></i><br>
</p><p><i><font>Não obstante da carta em causa não constarem alguns elementos fundamentais para o exercício da preferência que a lei nos confere, desde já informamos V.Exas. que estamos interessados em exercer aquele direito, nas condições de preço e prazo por vós referidas.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sucede, porém, que, para ponderarmos devidamente a aquisição, toma-se necessário o fornecimento de algumas informações que não constam da vossa carta.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim sendo, agradecemos que nos informem se o prédio é vendido sem quaisquer ónus ou encargos, ou se, sendo vendido com ónus, como julgamos que será (pelo menos no que respeita aos inquilinos), quais os contratos de arrendamento em vigor, quem são os inquilinos e quais os montantes das rendas actuais.</font></i><br>
</p><p><i><font>Mais agradecemos que todas as informações inerentes aos demais ónus existentes nos sejam facultadas, por forma a podermos, de forma definitiva, exercer o direito que a Lei nos confere, na posse de todas as informações essenciais necessárias para o efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Mais informamos V. Exas. que, independentemente da intenção manifestada nesta carta, de virmos a exercer o direito de preferência, consideramos, em conformidade com o supra referido, que não nos foram fornecidas todas as informações essenciais sobre a compra e venda em causa, nomeadamente no que concerne aos ónus com os quais o prédio será vendido, não tendo, por isso sido, cumprido o disposto no art. 416° do CC, pelo que aguardamos nova notificação, desta feita instruída com os elementos em falta, por forma a, no prazo legal, exercermos, de forma definitiva e esclarecida, o nosso direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com os melhores cumprimentos e ao dispor, para os esclarecimentos que entenderem por convenientes, nos subscrevemos,</font></i><br>
</p><p><i><font>A gerência".</font></i><br>
</p><p><i><font>Na ausência de qualquer resposta por parte da ré ao que lhe fora solicitado pela autora, enviou esta àquela nova carta registada com aviso de recepção, datada de 22.10.2004, mas registada a 25.10.2004 e recebida pela ré em 27.10.2004, com o seguinte teor:</font></i><br>
</p><p><i><font>"Exmos. Senhores,</font></i><br>
</p><p><i><font>Temos presente a nossa carta do passado dia 1 do corrente, que não mereceu, até ao momento, a atenção de uma resposta.</font></i><br>
</p><p><i><font>Independentemente das informações solicitadas, manifestámos a V.Exas. a nossa intenção de exercer o direito de preferência que por Lei nos está conferido e do qual não abdicamos, referente ao prédio sito na ....... n°s ... a ..., tornejando para a Rua ..., n°s ... a ..., em ....</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim sendo, e uma vez que a escritura estava prevista para o mês de Outubro, tivemos, desde logo, que libertar as verbas correspondentes ao preço, o que implicou custos financeiros elevados, pelo que agradecemos que, conjuntamente com as informações solicitadas, nos informem quando e onde irá ter lugar a escritura de compra e venda.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com os melhores cumprimentos,</font></i><br>
</p><p><i><font>A gerência".</font></i><br>
</p><p><i><font>A autora recebeu da ré, do mesmo Departamento de Gestão Imobiliária e Património, uma carta registada com aviso de recepção, datada de 24.11.2004, com o seguinte teor:</font></i><br>
</p><p><i><font>"ASSUNTO: Prédio sito na Avª.... nºs ... a ..., tornejando para a Rua ..., nºs ... a ..., em ... "Exmos Senhores"</font></i><br>
</p><p><i><font>Relativamente à notificação efectuada a V. Exas, por carta registada de 22.09.2004, para o exercício da preferência na compra de prédio sito na ......, n°s ... a ..., tornejando para a Rua ..., n°s ... a .... em ..., cumpre-nos informar de que esta ... já não vai proceder à respectiva venda, pelo que aquela notificação se deve considerar sem efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com os melhores cumprimentos O Adjunto da Mesa (M... de L...)</font></i><br>
</p><p><i><font>…53 anulação".</font></i><br>
</p><p><i><font>A ré não vendeu o imóvel.</font></i><br>
</p><p><i><font>A autora dispunha, através do seu legal representante, de fundos financeiros suficientes para adquirir o imóvel dado de preferência pela ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>A autora teve por parte da sociedade "A... - C... e U..., ..., com sede na ......, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ...... sob o n°..., com o capital social de € 2.000.000,00, que tem como objecto a compra e venda de imóveis e tudo o que se relacione com esta actividade, incluindo o arrendamento e revenda dos adquiridos para esse fim, urbanizações, construção civil e obras públicas, e a reparação e restauro de imóveis, uma oferta para aquisição do imóvel dos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Tendo sido comunicado ao legal representante da autora, Sr. AA, por parte do Administrador da citada "A...", Sr. BB, que estaria disposto a pagar a quantia de € 3.176.730,00 (três milhões cento e setenta e seis mil setecentos e trinta euros) pelo imóvel dos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Tendo a citada "A..." e respectivo Administrador, capacidade financeira para despender tal montante.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pedido pela autora à mencionada "A..." que colocasse por escrito essa sua vontade e intenção, foi entregue por essa entidade ao citado Sr. AA a carta datada de 12.10.2004, com o seguinte teor: "Assunto: Compra do prédio sito na Avenida...,.../..., tornejando para a ...... EX.mos Senhores,</font></i><br>
</p><p><i><font>Conforme já transmitido verbalmente, vimos desta forma formalizar a nossa intenção/proposta de compra do imóvel identificado em epígrafe que V. EX.as irão adquirir à ........., estando a nossa empresa disposta a oferecer a quantia de € 3.176.730,00 (três milhões cento e setenta e seis mil setecentos e trinta euros), suportando ainda nos termos legais todos os encargos inerentes com a transmissão, nomeadamente com emolumentos de escritura, imposto de selo e IMT.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, com a escritura do contrato promessa entregaremos a título de sinal a quantia de € 635.346,00 (seiscentos e trinta e cinco mil trezentos e quarenta e seis euros) e o restante na data da escritura, a ocorrer no prazo máximo de 45 dias a contar da assinatura do contrato promessa, onde deverá ficar prevista a autorização para a nossa empresa vistoriar todo o imóvel, requerer licenças de construção junto da Câmara e efecluar benfeitorias, logo após a assinatura do contrato. Agradecemos deste modo, por forma a avançar com as dcmarchcs inerentes ao negócio, nomeadamenle com a disponibilização das quantias envolvidas, que nos informem da data prevista para a assinatura do contrato e reconhecimento notarial das assinaturas.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com os melhores cumprimentos.</font></i><br>
</p><p><i><font>A Administração".</font></i><br>
</p><p><i><font>Aditado pela Relação:</font></i><br>
</p><p><i><font>O negócio entre a autora e a "A..." só não se concretizou por a ré não ter vendido o imóvel à autora”</font></i><font>.</font><b><font> </font></b><br>
</p><div><br>
<b><font>*</font></b></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C. </font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- Saber se a comunicação prevista no nº 1 do art. 416 do CC que preencha os requisitos nele enunciados configura uma proposta de contrato ou, apenas um convite a contratar.</font><br>
</p><p><font>Ou como diz a ré, “A primeira questão fundamental do direito consiste, assim, em apurar qual o efeito jurídico da receção pelo titular do direito à preferência da comunicação feita pelo obrigado da sua intenção de venda do imóvel – contendo os elementos essenciais do projetado negócio e necessários à decisão do titular do direito – e da consequente receção pelo segundo da comunicação pelo primeiro da sua vontade de exercer tal direito”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>A jurisprudência, tal como a doutrina, encontram-se divididas, mas temos que com tendência, maioritária, para julgar a comunicação, do obrigado à preferência ao preferente, como uma proposta de contrato.</font><br>
<p><b><font>Sobre a questão, pronuncia-se o acórdão recorrido</font></b><font>, nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“Situando os termos da discussão, observamos que de acordo com os factos provados no dia 23 de maio de 2019, a autora recebeu uma carta endereçada pela ré e datada de 14 de maio de 2019 onde esta dava conhecimento de ir proceder à venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial do ..., sob o n.º ...76; que a escritura pública de compra e venda ou documento particular autenticado seria realizado no prazo máximo de 30 dias informando igualmente o preço e a forma de pagamento e declarando que como confinante, assistia à autora, ora recorrida, o direito de preferir na referida transmissão, para o que concedia o prazo de oito dias.</font></i><br>
</p><p><i><font>Na sequência desta comunicação, a autora, ora recorrida, em 29 de maio de 2019, enviou à ré uma carta informando que pretendia exercer o direito de preferência na venda do imóvel solicitando que fossem desenvolvidas as diligências necessárias para e fosse remetida a documentação actualizada do imóvel.</font></i><br>
</p><p><i><font>No dia 02 de Agosto de 2019, a autora, ora recorrida, enviou à ré notificação judicial avulsa a comunicar o exercício do direito de preferência e, no dia 10 de setembro de 2019, a ré enviou à autora uma carta em que comunicava que o envio da carta datada de 14 de maio tinha sido um lapso por lapso porque o negócio a realizar era sobre uma habitação de primeira residência permanente, parte integrante da propriedade, onde já residiam os compradores há mais de ano e meio e que a autora, ora recorrida, afinal, não tinha direito de preferência.</font></i><br>
</p><p><i><font>Perante o exposto, a recorrente, depois de ter visto a acção proposta pela autora no sentido do reconhecimento da preferência que lhe foi oferecida julgada procedente, vem esgrimir que a notificação para a preferência, mesmo que contenha todos os elementos nucleares necessários para a decisão do preferente, não configura uma verdadeira proposta contratual que possa ser julgada vinculativa mas antes consubstancia, apenas, um convite a contratar a que é aplicável a disciplina artigo 227.º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, conclui, a carta enviada à autora e a resposta remetida por esta, aceitando a preferência, não determinava o efeito jurídico que foi fixado na sentença, fundando este argumento na jurisprudência que cita (Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 11 de Março de 1996, publicado na CJ, Ano XXI, tomo II,</font></i><br>
</p><p><i><font>pág. 188; o acórdão da Relação de ..., datado de 26 de Novembro de 1998, o acórdão da Relação de Coimbra de05/04/2001, proferido no processo n.º 1244/09.5TBTNV.C1, e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19/04/2001, proferido no processo n.º 419/01-7 e de 08/01/2009, proferido no processo n.º 08B2772) e da qual retira a conclusão de a declaração de pretender preferir não poder corresponder a uma aceitação de qualquer proposta porque a carta remetida pela ré/recorrente e apenas poder configurar uma informação do projecto de contrato e não mais que isso.</font></i><br>
</p><p><i><font>Quanto a esta questão, respeitante à natureza e aos efeitos jurídicos produzidos pela comunicação para preferir, o ac. do STJ de 7.12.2010 sinalizava já a divergência, quer na doutrina, quer na jurisprudência, relativamente a saber se a notificação para preferência envolve uma proposta contratual que, uma vez aceite, se torna vinculativa para o autor daquela comunicação, ou se configura antes um simples convite a contratar, tendo-se registado nesse acórdão como dominante a primeira posição (Reforçando este entendimento, o acórdão de 21.2.2006).</font></i><br>
</p><p><i><font>No sentido de que a notificação para preferência valerá como proposta contratual, em regra, desde que contenha todos os elementos necessários à decisão do preferente, ou seja, desde que observe os requisitos estabelecidos no nº 1 do art. 418º do CC, a qual, uma vez aceite, se torna vinculativa, além do acórdão de 21.2.2006 do STJ, outros mais, datados 19.10.2010, 9.7.98, 11.5.93, 31.3.93, 15.6.89 e de 2.3.99 propenderam a defender este entendimento. Em sentido contrário, porém, o acórdão do STJ de 8.1.2009 sustentava a posição de que a notificação para preferência não encerra uma verdadeira proposta contratual no sentido técnico-jurídico, antes se aproximando mais do chamado convite a contratar (Em sentido intermédio, o ac. do STJ de 19.4.2001 no proc. 419/01, in dgsi.pt defendia que sendo um convite a contratar se lhe aplicava o art. 227º do CC).</font></i><br>
</p><p><i><font>Julgamos que como matriz da exposição decisória, o acórdão do STJ de 27.11.2018, no proc. 14589/17.1T8PRT.P1.S1, que foi seguido pela decisão recorrida, constitui um bom e seguro itinerário porque tem actualidade cronológica, historifica a questão a resolver, fundamenta a resolução, identifica a solução maioritária e propõe esta como a adequada com argumentos em que nos revemos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Os termos da divergência, remetem para o que, conforme a doutrina e a jurisprudência do STJ entendem ser a natureza do direito legal de preferência e que é assumido como direito potestativo, com eficácia real, enquanto fundado em razões de interesse e ordem pública.</font></i><br>
</p><p><i><font>É nesta natureza que colhe razão e fundamento que os direitos legais de preferência impliquem uma limitação à liberdade contratual e ao próprio exercício do direito de propriedade e que se imponha um dever de comunicação no qual se transmita «o projecto de venda e as cláusulas do respectivo contrato», nos termos estabelecidos no nº 1 do art. 416º do CC. Assim, Antunes Varela sustentava que «Por um lado o preferente é titular de um verdadeiro direito de crédito, quer a preferência tenha, quer não tenha, eficácia real. Por outro lado, gozando de eficácia real, como sucede com os direitos legais de preempção, a preferência atribui ainda a esse sujeito a titularidade de um direito real de aquisição» (Antunes Varela, RLJ, 105, pp. 12/3).</font></i><br>
</p><p><i><font>Na sua cronologia, como o entendeu o STJ (Vd. ac. de 27-11-2018 no proc. 14589/17.1T8PRT.P1.S1, in dgsi.pt), o primeiro momento do direito legal de preferência, ocorre quando o obrigado à preferência decide realizar o negócio, e isto porque, o dever de comunicação pa | [0 0 0 ... 0 0 0] |
rTFau4YBgYBz1XKvlPnb | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>AA e mulher BB intentaram ação declarativa, com processo comum contra, CC e mulher, DD, EE e marido, FF, GG e mulher, HH, II e mulher, JJ e KK, pedindo que se declare nula e de nenhum efeito a partilha judicial anteriormente efetuada entre estes no âmbito do processo de Inventário n.º ...0, condenando-se os demandados a reconhecerem a inexistência jurídica dessa mesma partilha.</font><br>
</p><p><font>Alegaram para tanto e em síntese, que o Autor AA e os RR CC, EE, GG, II e KK são irmãos e filhos de LL e de MM, falecidos respetivamente em ... de janeiro de 2008 e em ... de julho de 1998. Aquando do falecimento de sua mãe, dadas as dificuldades económicas em que alguns dos filhos se encontravam, tendo em vista evitarem os credores, o viúvo e o A e RR irmãos resolveram simular uma partilha, pela qual todos os bens dos falecidos ficariam a pertencer apenas ao filho falecido NN e à filha e R KK, por serem solteiros e não terem dívidas. Assim, requereram inventário judicial e procederam à partilha, acordando falsamente que todos os bens eram adjudicados apenas àqueles dois irmãos, ficando o pai e os restantes recebedores de tornas que falsamente declararam ter recebido, o que não foi verdade. Porém, nem o viúvo nem os filhos receberam quaisquer tornas, nem os bens lhes foram entregues, pois o Pai continuou a disfrutar deles como na verdade queriam entre eles que fosse, com o sobredito propósito. Após a morte do pai, NN e KK foram colocando diversos bens em nome de alguns dos irmãos, por doações ou vendas, a saber, II, CC, e EE, pois já podiam ter bens em seu nome por, entretanto terem pago as suas dívidas. Relativamente ao A, e ao R GG, porém, falecido o NN em .../11/2013, a R KK recusa-se a cumprir o combinado por inaceitáveis razões.</font><br>
</p><p><font>Perante a simulação da partilha referida e sendo o negócio simulado nulo por força do disposto no art.º 240 e seguintes do CC, devem os RR ser condenados a reconhecer a inexistência jurídica da partilha descrita que deve ser declarada nula e de nenhum efeito.</font><br>
</p><p><font>Citados os RR., CC e esposa DD, EE e marido FF, II e esposa JJ, e KK, apresentaram contestação.</font><br>
</p><p><font>Por excepção invocaram a incompetência do tribunal em razão da matéria e do valor da causa, a caducidade da acção, a falta de interesse em agir do Autor e o abuso de direito ; por via impugnatória, refutam a alegada simulação da partilha, e além do mais, terem adquirido por usucapião os imóveis em causa, não sendo também admissível a anulação da partilha homologada face ao disposto no artigo 1388º, nº1 do CPC em vigor ao tempo; pugnam a final pela procedência das excepções e absolvição do pedido.</font><br>
</p><p><font>Os AA. apresentaram réplica, pronunciando-se pela improcedência das excepções invocadas.</font><br>
</p><p><font>Através das decisões interlocutórias documentadas nos autos, foi declarada a incompetência da instância inicial e competente o tribunal de ... e fixada, oportunamente, o valor da causa em €66.839,92, que se encontra apensa aos autos de inventário nos quais foi homologada a partilha; foi ainda designada data para realização de audiência prévia, que se frustrou.</font><br>
</p><p><font>Prosseguindo os autos os trâmites subsequentes, o tribunal a quo, entendendo poder conhecer do mérito da causa, notificou as partes para o contraditório, nos termos e para os efeitos do artigo 3º, nº3, do CPC.</font><br>
</p><p><font>Os Autores pronunciaram-se no sentido da improcedência da aludida excepção inominada da manifesta improcedência da acção, face ao que dispõe o artigo 291º, nº2 do CC; quanto aos RR, apenas a Ré KK se pronunciou, secundando o sentido apontado da decisão, à semelhança do que já havia alegado na contestação.</font><br>
</p><p><font>Decidindo o tribunal julgou improcedentes as invocadas excepções da falta de interesse em agir dos Autores e da caducidade da acção; no demais, concluiu pela procedência da excepção dilatória inominada de manifesta improcedência – art 590º, n.º 1 do CPC, conforme anunciado e absolveu os RR. da instância.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Os AA recorreram de apelação sendo, após deliberação, decidido por maioria:</font><br>
<p><i><font>“Pelo exposto, acordam os Juízes em negar provimento ao recurso, e em consequência, manter a sentença, embora por motivos não integralmente coincidentes.</font></i><br>
</p><p><i><font>As custas são a cargo dos Autores apelantes”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Novamente inconformados com o decidido pela Relação, interpõem recurso de Revista para este STJ os autores, e formulam as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“a.- O douto acórdão recorrido determinou que a partilha judicial homologada por sentença não segue o regime geral de impugnação dos negócios jurídicos, que razões de segurança reforçadas pela força do caso julgado, impedem a aplicação analógica do artigo 2121 do Código Civil, pelo que os recorrentes, por não terem invocado no processo de inventário os fundamentos aqui invocados, estão impedidos de impugnar a sua validade e eficácia à margem de requisitos legais que indica.</font></i><br>
</p><p><i><font>b.- Todavia, estamos perante uma questão que deve ser juridicamente analisada em face da lei vigente.</font></i><br>
</p><p><i><font>c- Ora, os recorrentes "mais não pedem que a destruição dos efeitos negociais decorrentes da" homologação, nos termos do artigo 291 do Código do Processo Civil Revisto, atento o fundamento invocado: acordo simulatório.</font></i><br>
</p><p><i><font>d.- Os factos provados documentalmente (Conferência de Interessados -a 4 de abril de 2001 - e sentença homologatória - 25 de maio de 2021) levantam a questão da aplicação da lei no tempo que é o Código Civil aprovado pelo decreto-lei 47344 de 25 de novembro de 1966, que nos artigos 242.1 e 286, que permitem arguir-se a nulidade do negócio simulado pelos simuladores mesmo fraudulenta e a todo o tempo.</font></i><br>
</p><p><i><font>e.- Acontece que o regime de inventário agora em vigor, aprovado em 2019, só se aplica aos processos entrados a partir de 1 de janeiro de 2020 (ver artigo 11), sendo que as normas processuais são a Lei 23/2013 de 5 de março, destinada aos processos entrados a partir de 2 de setembro de 2013 (ver seu artigo 8o), como é a presente ação entrada em 22 de outubro de 2015 que para ter cobertura legal, impõe-se a sua integração (ver Processo de Inventário - Lei n° 117/19, de 13 de setembro, Desembargadora OO, Almedina, 2021).</font></i><br>
</p><p><i><font>f.- E como o pedido formulado nesta ação é a condenação dos RR a reconhecerem "a inexistência jurídica da partilha que deve ser declarada nula e de nenhum efeito", este pedido baliza a questão. Não se pede a anulação da partilha, como julgou a 1.a Instância "mas, sim, a declaração da sua inexistência por conluio simulatório entre todos os interessados na partilha".</font></i><br>
</p><p><i><font>g.- Por isso o Tribunal da 1 .a Instância não podia, salvo o devido respeito, conhecer do pedido no despacho saneador sentença, "devendo a ação seguir os seus termos conforme previsto nos artigos 591 e 596 do Código do Processo Civil Revisto (ver Ac. Do Tribunal da Relação do Porto, de 27 de maio de 2010, relatado pela Desembargadora Maria Catarina Ramalho Gonçalves -www.itrp.pt).</font></i><br>
</p><p><i><font>h.- Deve por isso, ainda salvo o devido respeito, ser revogado o despacho saneador sentença agora em crise, determinando-se "o regular andamento do processo", porque o acórdão recorrido não fez a melhor JUSTIÇA”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Não foi apresentada resposta.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Nas Instâncias foram julgados como provados e não provados, os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>“Os Factos</font></i><br>
</p><p><i><font>Para o que importa decidir, dos autos resulta incontrovertido que:</font></i><br>
</p><p><i><font>- </font></i><i><font>Os Autores e os Réus foram partes num inventário judicial por morte de MM, que correu termos nos autos aos quais estes se encontram apensados;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Nesse inventário judicial, as partes acordaram na partilha da relação de bens, declararam já ter recebido as tornas, foi proferido o despacho de forma à partilha e elaborado o mapa da partilha, homologada por sentença datada de 25/05/2001 e já transitada”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608º, 635º, nº 3 a 5 e 639º, nº 1, do C.P.C. </font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- Saber se a partilha judicial homologada por sentença segue, ou não, o regime geral de impugnação dos negócios jurídicos;</font><br>
</p><p><font>- Saber se podem ser destruídos os efeitos negociais decorrentes da homologação da partilha, declarando a inexistência jurídica da partilha, atento o fundamento invocado: acordo simulatório.</font><br>
</p><p><font>Diz o acórdão recorrido que:</font><br>
</p><p><font>- À partilha judicial não são aplicáveis as normas gerais do Código Civil referentes aos vícios da vontade, nomeadamente as referentes às consequências do acordo simulatório, exceto se as normas referentes ao inventário para estas remeterem.</font><br>
</p><p><font>- Sobre o alcance e natureza da sentença homologatória da partilha judicial no inventário, entende: </font><i><font>“… afigura-se-nos que, homologada a partilha judicial, transitada em julgado, salvo na situação de revisão de sentença, e das situações contempladas no artigo 1388º do CPC, não é possível obter a sua nulidade com fundamento em simulação das vontades declaradas pelos interessados, em aplicação das regras de ineficácia e de invalidade próprias dos negócios jurídicos em geral previstas nos artigos 285º e seguintes do Código Civil”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>- Relativamente à pretendida aplicação do disposto no art. 2121º, do Cód. Civil, entende: “</font><i><font>será de refutar a aplicação analógica à partilha judicial do disposto no artigo 2121º do Código Civil, que diz respeito à impugnação de partilha </font></i><font>[extra]</font><i><font> judicial, em coerência com a sua natureza estritamente contratual que a distancia em substância e na forma daquela outra</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>A presente ação visa que se declare inexistente e de nenhum efeito uma partilha judicial (destruídos os efeitos), confirmada por sentença homologatória devidamente transitada em julgado.</font><br>
</p><p><font>Tem aplicação o regime jurídico do processo de inventário anterior ao introduzido pela Lei 23/2013, de 5 de março que, conforme do art. 7º, ressalvava a sua aplicação aos processos de inventário instaurados após a sua entrada em vigor, ou seja, excluía os processos pendentes (ou findos) à data da sua entrada em vigor. </font><br>
</p><p><font>E para este efeito conta o processo de inventário, máximo o transito em julgado da decisão homologatória da partilha e não a data da instauração desta ação de impugnação da partilha.</font><br>
</p><p><font>Sobre a matéria dispunham os arts. 1386º a 1388º do CPC então vigente, referentes às possibilidades de emenda ou anulação da partilha judicial.</font><br>
</p><p><font>A emenda, por acordo de todos os interessados ou seus representantes, podia ocorrer em caso de ocorrência de erro de descrição ou qualificação dos bens ou outro erro que pudesse viciar a vontade das partes.</font><br>
</p><p><font>A emenda na falta de acordo só podia ser pedida em ação intentada dentro de um ano a contar do conhecimento do erro e, se este fosse posterior à sentença da partilha.</font><br>
</p><p><font>A anulação da partilha poderia ocorrer a pós a sentença transitada apenas se (só pode) tivesse havido preterição ou falta de intervenção de algum dos co-herdeiros e tivesse havido dolo ou má-fé de outros interessados quanto à preterição.</font><br>
</p><p><font>Também poderia ocorrer a anulação por via de recurso extraordinário de revisão (verificando-se os requisitos de interposição).</font><br>
</p><p><font>Com o transito em julgado da sentença que homologou a partilha fixa-se o direito dos interessados no processo de inventário, apenas podendo haver alteração se verificados os pressupostos de emenda ou alteração da partilha.</font><br>
</p><p><font>No caso vertente não se pretende a emenda à partilha mas a anulação desta, embora os recorrentes se refiram a "declaração da sua inexistência por conluio simulatório entre todos os interessados na partilha", mas invocando o art. 291º, do CPC ora vigente que se reporta à nulidade e anulabilidade. </font><br>
</p><p><font>Como refere Lopes Cardoso in Partilhas Judiciais, 3ª ed. 1980, vol. II, pág. 542, “No caso de emenda, a partilha mantem-se na sua essência e apenas se corrige a parte que carece de correção; no caso de anulação a partilha é completamente invalidada, fica destruída”.</font><br>
</p><p><font>E na pretensão de anulação da partilha há que distinguir a situação de partilha amigável (escritura pública) da ocorrida em processo de inventário, homologada por sentença com transito.</font><br>
</p><p><font>E só à partilha amigável (extrajudicial) são aplicáveis as regras jurídicas de impugnação dos contratos, como dispõe o art. 2121º do Cód. Civil e só a esta forma de partilha são aplicáveis as regras de nulidade e anulabilidade dos negócios jurídicos, nos termos dos arts. 285º e seguintes do Cód. Civil.</font><br>
</p><p><font>Neste sentido veja-se o Ac. do STJ de 19-06-2018, no Proc. nº 262/17.4T8STR.E1.S2, onde refere que “</font><i><font>A partilha judicial, dependendo do trânsito em julgado da sentença que a homologar, só pode ser impugnada nos casos previstos no artigo 1388º do CPC</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E acrescenta </font><i><font>“Na realidade, o chancelamento de uma partilha mediante sentença passada em julgado, com tudo o que isso representa, não pode estar no mesmo patamar de impugnabilidade de uma partilha amigável realizada pelos interessados através de instrumento notarial. Daí que o caminho processual para a impugnação da partilha judicial tenha de ser mais estreito ou mesmo excepcional, em nome da certeza e segurança jurídicas que dimanam da força e autoridade do caso julgado.</font></i><br>
</p><p><i><font> Por outro lado, não estando os interessados conformados com o modo como se fez a partilha judicial homologada por sentença, têm sempre eles ao seu dispor um instrumento legal poderoso para conseguirem a modificação do decidido: o recurso. Mas, se deixarem transitar em julgado a decisão homologatória da partilha, só lhes restará a possibilidade de pedirem a anulação da partilha, nos apertados casos acima descritos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Certo para nós é que não podem as Autoras recorrentes usar a acção declarativa comum para esse efeito, ao abrigo da aplicação analógica do artigo 2121º, pelo que bem decidiram as instâncias ao considerarem verificar-se a excepção dilatória inominada de inadequação do meio processual utilizado”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>A partilha judicial e como refere Lopes Cardoso in Partilhas Judiciais, vol. II, pág. 544, porque “revestida da autoridade que dimana do caso julgado, só em casos muito restritos poderá anular-se”.</font><br>
</p><p><font>O já referido art. 1388º do CPC, então vigente, se reporta à “partilha judicial confirmada por sentença passada em julgado” que é o mesmo que sentença transitada em julgado, com força de caso julgado em relação aos interessados intervenientes no processo de inventário.</font><br>
</p><p><font>Como consta dos factos tidos como provados, os Autores e os Réus foram partes num inventário judicial onde foi proferido o despacho de forma à partilha e elaborado o mapa da partilha, homologada por sentença datada de 25/05/2001 e já transitada.</font><br>
</p><p><font>Não houve nem vem alegada a preterição ou falta de intervenção de algum co-herdeiro, como taxativamente exigia o art. 1388º citado.</font><br>
</p><p><font>Nos termos do art. 665º do CPC então vigente (uso anormal do processo), o juiz devia obstar ao objetivo anormal pretendido pelos interessados de praticar ato simulado, combinando-se para prejudicar terceiros.</font><br>
</p><p><font>Mas, o juiz do processo de inventário não se tendo apercebido do conluio dos interessados, nem tinha como se aperceber, prosseguiu normalmente com o inventário e a partilha foi homologada por sentença.</font><br>
</p><p><font>Mas nos termos do art. 1388º já referido, restringindo, apenas permite aos não intervenientes no inventário, terceiros prejudicados, a impugnação da partilha homologada por sentença e transitada em julgado.</font><br>
</p><p><font>Refere Lopes Cardoso na obra citada, pág. 550 que, “pode convir aos próprios simuladores anular a sentença proferida na partilha em que se conluiaram, por vítimas da simulação com que se houveram”.</font><br>
</p><p><font>A questão foi discutida quando das várias reformas do Processo Civil, mas sem integração de norma concludente.</font><br>
</p><p><font>Nos estudos que precederam o CPC de 1961 e, “do relatório de quem foi encarregado de rever os recursos extraordinários de revisão e de oposição de terceiro colhe-se como certo que a simulação processual não pode fundamentar o primeiro daqueles recursos” – Lopes Cardoso, obra citada pág. 554.</font><br>
</p><p><font>O atual CPC no art. 696º, al. g) refere que a decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão quando: -o litígio assente sobre ato simulado das partes e o tribunal não tenha feito uso do poder que lhe confere o art. 612º, por se não ter apercebido da fraude.</font><br>
</p><p><font> Mas sendo a sentença homologatória da partilha proferida em 2001, há muito que transitou e, precludido ficou, o prazo para interposição de recurso de revisão, conforme art. 697º, nºs 2 e 3, do CPC ora vigente.</font><br>
</p><p><font>Em causa não está ação (recurso) de revisão, mas ação de impugnação da partilha requerendo-se a nulidade da mesma.</font><br>
</p><p><font>E como já supra se referiu </font><font>o processo de inventário é uma forma especial de processo, com regulamentação própria e específica, apenas sendo aplicáveis as normas gerais do direito substantivo, ou do processo comum quando expressamente previsto.</font><br>
</p><p><font>E não se vê diferença entre pedir que seja reconhecida “a inexistência jurídica da partilha que deve ser declarada nula e de nenhum efeito” ou requerer a anulação da partilha julgando-a completamente invalidada e destruída de efeitos.</font><br>
</p><p><font>Assim também entendeu o Ac. da Rel. do Porto de 07-03-2022, no Proc. nº 4787/08.4TBGDM-B.P1, onde se refere: </font><i><font>“A anulação da partilha visa produzir um efeito constitutivo, relativamente ao próprio ato de partilha, destruindo-o e aniquilando os respetivos efeitos, ao afetar irremediavelmente a sua validade; daí que, por evidentes razões de segurança jurídica - reforçadas por estarmos perante um ato coberto pela força do caso julgado, associado à sentença homologatória da partilha -, tal anulação só tenha cabimento nas situações definidas de forma taxativa na lei, sendo, nessa medida, insuscetíveis de extensão analógica</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Como já referido, se os interessados deixarem transitar em julgado a decisão homologatória da partilha, só lhes restará a possibilidade de pedirem a anulação da partilha, nos apertados casos acima descritos (podendo atualmente fazê-lo por via do recurso extraordinário de revisão).</font><br>
</p><p><font>E nesses limites estreitos não se enquadra a pretensão dos recorrentes, pelo que deve improceder o recurso e manter o acórdão recorrido.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Sumário elaborado nos termos do art. 663 nº 7 do CPC:</font><br>
<p><font>I -</font><font> </font><font>Com o transito em julgado da sentença que homologou a partilha fixa-se o direito dos interessados no processo de inventário, apenas podendo haver alteração se verificados os pressupostos de emenda ou alteração da partilha.</font><br>
</p><p><font>II - Só à partilha amigável (extrajudicial) são aplicáveis as regras jurídicas de impugnação dos contratos como dispõe o art. 2121º do Cód. Civil e, só a esta forma de partilha é aplicável as regras de nulidade e anulabilidade dos negócios jurídicos, nos termos dos arts. 285º e seguintes do Cód. Civil.</font><br>
</p><p><font>III -</font><font> </font><font>O processo de inventário é uma forma especial de processo, com regulamentação própria e específica, apenas sendo aplicáveis as normas gerais do direito civil substantivo, ou do processo comum quando expressamente previsto.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Decisão</font></b><font>:</font><br>
<p><font>Em face do exposto acorda-se em julgar o recurso improcedente, nega-se a revista, e mantem-se o acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font>Custas pelos recorrentes.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 11-10-2022</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator </font><br>
</p><p><font>Jorge Arcanjo – Juiz Conselheiro 1º adjunto </font><br>
</p></font><p><font><font>Isaías Pádua – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
szFau4YBgYBz1XKvnfld | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>***</font></div><br>
<font>Capital Leiloeira, Lda., com sede na Praça da Justiça, n.º 168, Braga, apresentou requerimento de injunção contra AA, residente na Rua ..., em ..., Braga, solicitando que este fosse notificado no sentido de lhe pagar a quantia global de €34.883,75, sendo €33.050,00 a título de capital, €1.180,75, a título de juros de mora vencidos, €500,00 a título de outras quantias, e €153,00 a título de taxa de justiça paga.</font>
<p><font>Prosseguindo o processo seus termos, foi decidido pela 1ª Instância:</font>
</p><p><font>“</font><i><font>Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julgando pela parcial procedência da demanda, decido:</font></i>
</p><p><i><font>a) Condenar o réu a pagar à autora a quantia de € 33.050,00 (trinta e três mil e cinquenta euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos contados às taxas legais sucessivamente aplicáveis, resultantes do disposto no artigo 102º § 5º do Código Comercial e Portaria nº 277/2013, de 26 de Agosto, desde o dia 14/06/2019 e até efectivo e integral pagamento;</font></i>
</p><p><i><font>b) Condenar o réu a pagar à autora a quantia de € 40,00 (quarenta euros), a título de indemnização pelos custos de cobrança da dívida, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei nº 62/2013, de 10 de Maio;</font></i>
</p><p><i><font>c) Condenar a autora e o réu no pagamento das custas do processo, na proporção do respectivo decaimento, como determina o artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.</font></i></p><div><br>
<i><font>*</font></i></div><br>
<i><font>Notifique.</font></i>
<p><i><font>Registe”</font></i><font>.</font>
</p><p><font>Inconformado o Réu interpôs recurso de apelação, sendo decidido pelo Tribunal da Relação:</font>
</p><p><font>“</font><i><font>Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar totalmente improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>As custas são da responsabilidade do Recorrente</font></i><font>”.</font>
</p><p><font>Continuando inconformado, o réu interpõe recurso de revista concluindo:</font>
</p><p><i><font>“I - No acórdão recorrido, a Relação veio a confirmar integralmente a decisão da 1ª instância, em termos de pura denegação de justiça, incorrendo em várias nulidades, em inúmeras violações e erradas aplicações da lei processual, e bem assim em chocantes violações das leis substantivas aplicáveis ao caso, mormente as dos artigos 220°, 221°, 351°, 393° e 394° do Código Civil, o artigo 607°, n° 5, do CPC, 20° e 205° da CRP, 3°, al. c) do DL n° 24/2014 e 2°, al. c), 15°, n° 1 e 16°, n° 1, al. b) do DL n° 155/2015.</font></i>
</p><p><i><font>II - As presunções, conforme se extrai do citado Ac.STJ, de 7/1/2004, processo 03P3213, Rel. Henriques Gaspar, só poderão ser extraídas com juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que não com simples apelo à figura desse meio de prova e com mistura de factos de incerta credibilidade e com leituras absurdas e até contraditórias, o que só por si deve afastar qualquer legítima conexão com o facto probando.</font></i>
</p><p><i><font>III - Pois, deixa-se aqui desde já um exemplo claríssimo do apelo, no caso presente, e com relevo decisório e confirmatório elevados (se não fosse assim, não se tinha escrito o que se escreveu!) a uma afirmação conclusiva, alegadamente notória mas absurda em último grau.</font></i>
</p><p><i><font>IV - Por motivos de se poder utilizar o processo de injunção contra um sujeito singular particular, veio a ser alegado que tal sujeito “é pessoa muito conhecida pela sua actividade, de resto bem-sucedida, na indústria extractiva, bem como na construção civil, comércio de materiais inertes para esta actividade, sendo, ainda, conhecido como investidor imobiliário” e que “Mesmo que o Reu tenha comprado estes prédios em seu próprio nome, tal facto não retiraria a natureza comercial ao acto praticado”.</font></i>
</p><p><i><font>V - Dadas as voltas probatórias, veio a assentar-se que:</font></i>
</p><p><i><font>“9. O réu dedica-se à venda de inertes destinados à construção civil e à compra e venda de bens imobiliários, tendo adquirido os prédios em referência com o intuito de os revender”.</font></i>
</p><p><i><font>VI - À margem, tem de se esclarecer que o réu é sócio-gerente, com dois filhos, de uma empresa de exploração de inertes, destinados aos mais variados fins, incluindo a construção por construtores civis. </font></i>
</p><p><i><font>VII - Pois bem, da motivação, chamada à colação pela Relação e por esta louvada com rasgados elogios e expressamente confirmada, consta o seguinte:</font></i>
</p><p><i><font>“Foi com base nestes meios de prova que o tribunal considerou suficientemente demonstrado que o réu se dedica também a negócios no ramo do imobiliário, com intuito lucrativo - o que, de resto, é muito comum os empresários ligados à construção fazerem nesta zona da cidade de Braga"!?</font></i>
</p><p><i><font>VIII - Não são precisas muitas palavras para, olhando para estas, se concluir que, a par de muitas outras afirmações do mesmo género, esta, só por si, deixa fatalmente inquinada toda a confirmação da sentença.</font></i>
</p><p><i><font>IX - As questões que num recurso devem ser solucionadas têm que se cingir aos pontos fáctico-jurídicos que estruturam a causa, seja ela qual for, havendo omissão de pronúncia se o Tribunal omite o dever de, dentro desses parâmetros, solucionar o conflito nos limites pedidos pela parte, sob pena de se barrar às partes o direito a raciocinarem e, com isso, o direito ao recurso, através da imposição inelutável de raciocínio alheio, tantas vezes mal feito, inconsequente, infundamentado, incoerente e ilógico, não podendo o n° 5 do artigo 607° cobrir tudo ou valer por exercício fundamentativo.</font></i>
</p><p><i><font>X - Sobre a nulidade da falta da fundamentação ou o seu equivalente, do acórdão recorrido, o recorrente, seguindo de perto o Ac.STJ, de 12/7/2018 e a decisão do TEDH, no caso Tatishvili c. Rússia, segundo os quais não é só nos casos de falta absoluta de fundamentação que há nulidade, mas sim nos casos de “manifesta deficiência”, como, com apelo aos respectivos textos, normas e doutrina, demonstra ter ocorrido no caso presente.</font></i>
</p><p><i><font>XI - A Relação, como de todos trechos do acórdão revidendo emana, além de improvisar afirmações ilógicas, e até contraditórias com a 1ª instância e consigo mesma, para saltar certas questões, procedeu ao conhecimento “não reapreciando, como devia, as provas apresentadas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente“, traduzindo-se a reapreciação “em meras considerações genéricas”, "abstendo-se por isso, sem mais, de conhecer da substância do recurso” - Cfr. Ac.STJ de 2/3/2011, processo 1675/06.2TBPRD.P1.S1.</font></i>
</p><p><i><font>XII - E persiste naquilo que o TEDH consignou na sua citada decisão do caso Tatishvili c. Rússia, ou seja, fez um raciocínio inadequado, “simplesmente caucionou as razões da decisão do tribunal de primeira instância”. “técnica de raciocínio por um Tribunal de apelação ...em princípio, aceitável”, mas que “nas circunstâncias do presente caso ela não satisfez as exigências de um julgamento justo”, pois “confirmou... de forma sumária, sem rever os argumentos na declaração de apelação do requerente”.</font></i>
</p><p><i><font>XIII - Por outras palavras, e tomando como referência as proposições do Ac.STJ, do processo n° 1675/06.2TBPRD.P1.S1, a Relação, incorrendo na nulidade absoluta da sua decisão que se invoca nos termos da alínea b) do n° 1 do artigo 615° do CPC, ex vi do n° 1 do artigo 666°, desrespeitou gravemente a exigência da lei, em termos de reapreciação da matéria de facto, fazendo um simples exercício formal, com considerações teóricas, conclusões vagas, chavões e afirmações genéricas, e fazendo integral adesão aos fundamentos da decisão recorrida, abstendo-se, assim, de tomar parte activa na avaliação dos elementos probatórios indicados pelo recorrente.</font></i>
</p><p><i><font>XIV - Assim, o que nesta revista está essencialmente em causa, mas que viola gravemente as leis de processo e substantiva e afecta vários direitos fundamentais do recorrente, são, além do mais, os expedientes usados pela Relação para se furtar a conhecer adequadamente o recurso, o que, verificando-se, como se crê que se verifica, e como tais expedientes prejudicaram nitidamente o recorrente.</font></i>
</p><p><i><font>XV - Não estão directamente em causa, nesta revista, a impugnação de provas sujeitas ao princípio da livre apreciação, mas sim ter sido a inconsequente motivação da 1ª instância conhecida pela Relação do modo descrito, isto é, com afirmações sem nexo e vaguidades, precisamente aquilo que esse Supremo Tribunal vem recorrentemente a censurar, e a partir dessa serem praticadas outras nulidades e violações extremas, escapando assim aos deveres que lhe são cometidos no artigo 662°, n° 2.</font></i>
</p><p><i><font>XVI - Além das nulidades arguidas, a Relação chegou ao ponto de se contradizer com a 1ª instância e nos seus próprios fundamentos, com relevo decisório evidente e em desfavor do recorrente.</font></i>
</p><p><i><font>XVII - No caso presente, não fazendo a 1ª instância, em toda a sentença, a mínima referência legal (a não ser sobre mora e juros), a Relação veio a trabalhar com várias disposições e múltiplas previsões, com as quais, de modo indevido e/ou errado, afastou e denegou pretensões do recorrente.</font></i>
</p><p><i><font>XVIII - Isto, considerando se entendeu que foi invocada uma questão nova, que também não seria de conhecimento oficioso, sem se atender a que, devem ser ponderadas todas as particularidades de cada caso e à natureza da questão, de facto ou de direito, e no caso persente o que foi submetido foi uma questão de direito, que não buliu com o objecto da causa e é sobre esse que não pode ser levada questão nova aos recursos.</font></i>
</p><p><i><font>XIX - No caso, conhecendo a Relação de facto e de direito, a arguição de uma nulidade específica, prevista por duas vias para protecção da transparência de negócios imobiliários, é apenas isso, uma questão de direito, naturalmente aberta às partes, desde logo, nos termos do artigo 639° do CPC: “2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas”, cujo ónus o recorrente cumpriu.</font></i>
</p><p><i><font>XX - Conhecendo a 1° instância de factos que potenciavam o conhecimento jurídico das normas invocadas no recurso sobre a nulidade e efeitos inobservância da forma escrita, estava, pois, a Relação, dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrou o Tribunal recorrido.</font></i>
</p><p><i><font>XXI - No acórdão recorrido, confirmativo, em toda a amplitude e com repetidos e adjectivados elogios, da decisão ali recorrida, depois da omissão absoluta e tabelar das correspondentes arguições e questões do recorrente, todas relativas aos temas da causa, com relevo especial para sérias contradições dos depoimentos das testemunhas da autora, faz a Relação apelo, para os itens em causa, a várias afirmações presuntivas ilógicas. </font></i>
</p><p><i><font>XXII - A Relação é um Tribunal Superior, cabendo-lhe conhecer efectivamente de todas as questões que lhe são postas, e sobre ela impendendo o mesmo dever de fundamentação dos Tribunais de 1ª instância, com o acréscimo e inerência da sua qualidade.</font></i>
</p><p><i><font>XXIII - Por isso, se um recorrente lhe apresenta, como legais fundamentos de um recurso, raciocínios em determinado sentido e com determinada motivação, a Relação deve conhecer desses fundamentos, mostrando, com clareza e acuidade, que aqueles raciocínios estão ou não conformes com as regras de avaliação, valendo ou não valendo ante os do Tribunal e impondo ou não decisão diversa.</font></i>
</p><p><i><font>XXIV - O argumento corrente, da exclusividade da falta absoluta de fundamentação para haver nulidade, além de ser praticamente improvável, não tem qualquer suporte legal e doutrinal, e antes sendo um escape para ultrapassar fundamentações manifestamente deficientes, logo, inexistentes e incontroláveis, apesar de, mesmo assim, poderem ser revogáveis por omissão da pronúncia devida ou por denegação de justiça.</font></i>
</p><p><i><font>XXV - Em qualquer dos diplomas - do DL n° 155/2015, da Lei n° 15/2013 e do DL n° 24/2014 -, com previsões inequívocas de nulidade, as respectivas omissões contendem com valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé e, em concreto, por contenderem com leis imperativas.</font></i>
</p><p><i><font>XXVI - E atenta a natureza das previsões imperativas em causa e de algumas justificadas regras específicas - ex., a nulidade não ser invocável pela mediadora o regime aplicável à nulidade aqui em causa, da inobservância da forma escrita da alegada convenção adicional, é o geral de direito civil - artigo 220° do Código Civil.</font></i>
</p><p><i><font>XXVII - Ao prever, no artigo 2° do DL 155/2015, que é “«Destinatário», a pessoa singular ou colectiva que adquire um bem a cliente da empresa leiloeira na sequência de um leilão”, o legislador, na harmonia do sistema, quis consagrar, e consagrou, um conceito de consumidor específico, adequado à actividade de mediação imobiliária e leiloeira.</font></i>
</p><p><i><font>XXVIII - E, obviamente, aquele conceito não é condicionado aos afazeres do comprador, às suas ocupações pessoais ou profissionais e, tal como para as pessoas colectivas, sem vinculação do destino dos bens, o que seria totalmente oposto às actividades económicas respectivas.</font></i>
</p><p><i><font>XXIX - Afigura-se-nos meridianamente claro e objectivo que, devendo constar de instrumento escrito (sob pena da mais gravosa sanção civil, a nulidade da convenção) a forma de remuneração, a hermenêutica daquela estatuição deriva da necessidade de salvaguarda estável e firme daquele cuja esfera jurídica é afectada ao pagamento.</font></i>
</p><p><i><font>XXX - In casu, para mais afectando-se ao pagamento um terceiro, estranho ao clausulado inicial, a estabilidade do comércio jurídico pretendida pelo diploma em apreço fica seriamente perigada se a oneração de um terceiro não ficar salvaguardada pela mesma forma escrita. </font></i>
</p><p><i><font>XXXI - Além do mais, ainda no plano da hermenêutica e independentemente do enquadramento legal do negócio original, não se pode perder de vista que quem está, por natureza do negócio, obrigado ao pagamento é o proprietário, e contratante com a A. Leiloeira, pelo que a transmissão dessa obrigação daquele para o ora R. deve constar de instrumento escrito.</font></i>
</p><p><i><font>XXXII - Não se aplicando os artigos 4° a 21° do DL 24/2014, conforme o citado artigo 2°, n° 2 do mesmo DL, “aos "d) Contratos relativos à construção, à reconversão substancial, à compra e venda ou a outros direitos respeitantes a imóveis...”, não são aplicáveis aos negócios de leilão em geral, nem ao contrato junto aos autos e à omissão da forma escrita da convecção adicional relativa à remuneração, quer a matéria da nulidade prevista no artigo 9°, n° 1, quer a definição de consumidor inscrita no artigo 3°, al. c).</font></i>
</p><p><i><font>XXXIII - E consequentemente, e sem prejuízo da sua impugnação e dos efeitos dos vícios invocados ao acórdão recorrido, torna-se, afinal, inócua a classificação profissional constante do ponto 9 dos factos provados e inaplicável a qualidade de consumidor prevista no artigo 3°, que foi decisiva no acórdão para “falecer” a “...a argumentação do Recorrente relativamente à impossibilidade de considerar provada tal matéria com base em prova testemunhal”.</font></i>
</p><p><i><font>XXXIV - Em qualquer dos diplomas - do DL 155/2015, da L 15/2013 e do DL 24/2014 -, com previsões inequívocas de nulidade, as respectivas omissões contendem com valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé e, em concreto, por contenderem com leis imperativas.</font></i>
</p><p><i><font>XXXV - E atenta a natureza das previsões imperativas em causa e de algumas justificadas regras específicas - ex., a nulidade não ser invocável pela mediadora -, o regime aplicável à nulidade aqui em causa, da inobservância da forma escrita da alegada convenção adicional, é o geral de direito civil - artigo 220° do Código Civil.</font></i>
</p><p><i><font>XXXVI - O acórdão entende que “ficando a opção pela invocação da nulidade nas mãos do consumidor, tal impede o conhecimento oficioso da nulidade”, pois “estamos no campo das designadas nulidades relativas ou invalidades mistas, pois acabam por ter em comum com a anulabilidade a limitação da legitimidade para serem invocadas a pessoas em cujo interesse a lei a estabelece a invalidade (cfr. artigo 2870 n. 01 do Código Civil)”.</font></i>
</p><p><i><font>XXVII - E desse modo, conclui que “Por isso, e quanto à questão suscitada pelo Recorrente de nulidade decorrente de falta de forma, não sendo a mesma de conhecimento oficioso, não poderá este Tribunal da Relação conhecer da mesma, porque se trata de questão nova, que não foi apreciada pela primeira instância”.</font></i>
</p><p><i><font>XXXVIII - Abreviando razões, além da indevida citação do regime dos contratos de crédito ao consumo (?!), há vários erros neste escrito, que ficarão resolvidos com a demonstrada não aplicação dos artigos 4° a 21° do DL 24/2014, conforme o citado artigo 2°, n° 2 do mesmo DL, “aos "d) Contratos relativos à construção, à reconversão substancial, à compra e venda ou a outros direitos respeitantes a imóveis...”.</font></i>
</p><p><i><font>XXXIX - E bem assim, com a demonstrada expressão legislativa do artigo 2° do DL 155/2015, que define “«Destinatário», a pessoa singular ou colectiva que adquire um bem a cliente da empresa leiloeira na sequência de um leilão”, ou seja, o legislador quis consagrar, e consagrou, um conceito de consumidor específico, adequado à actividade de mediação imobiliária e leiloeira, obviamente não condicionado aos afazeres do comprador, às suas ocupações pessoais ou profissionais e, tal como para as pessoas colectivas, sem vinculação do destino dos bens, o que seria totalmente oposto às actividades económicas respectivas.</font></i>
</p><p><i><font>XL - Destas duas razões emerge, obviamente, o entendimento de que o regime aplicável à nulidade aqui em causa, da inobservância da forma escrita da alegada convenção adicional, é o geral de direito civil - artigo 220° do Código Civil - e de que o comprador tem legitimidade plena para invocar a nulidade, sem prejuízo de ela dever ser declarada oficiosamente - artigo 286° do Código Civil.</font></i>
</p><p><i><font>XLI - Essa solução legislativa específica não é desfasada nem prejudicada pelo que se prevê no artigo 16°, n° 1, al. b) do regime da actividade leiloeira, que remete para as “disposições ...que lhes sejam aplicáveis”, pois aquela norma específica, do artigo 2° do DL 155/2015 se sobrepõe àquela remessa. </font></i>
</p><p><i><font>XLII - O alegado acordo do réu com a autora (lembre-se, também a versão da réplica, de que houve um acordo “entre Autora, vendedoras e Réu) no sentido de ele pagar o preço correspectivo dos serviços que esta prestou na intermediação, é manifestamente uma convenção adicional àquele contrato - cfr. art° 394° do Código Civil -, subordinada, pois, ao dito regime jurídico da actividade leiloeira.</font></i>
</p><p><i><font>XLIII - Se as vendedoras deram preferência à leiloeira, por esta prever que a comissão seria paga pelo comprador e se o contrato de prestação de serviços entre elas foi reduzido a escrito - art° 15° do DL 155/2015 -, o contrato em apreço, do deferimento do pagamento da remuneração a um terceiro, deveria fazer intervir o destinatário dos bens, o aqui réu, em convenção adicional escrita e não o fizeram.</font></i>
</p><p><i><font>XLIV - Mas, independentemente da nulidade, a matéria da imputação ao réu da aceitação de um acordo para pagar a remuneração da autora e outras alcavalas, integrando uma estipulação verbal acessória ao contrato escrito, não pode ser provada por testemunhas.</font></i>
</p><p><i><font>XLV - Sendo o contrato principal obrigatoriamente reduzido a escrito, por força de lei, não podia a prova de alteração verbal sobre a imputação da responsabilidade pelo elemento essencial da remuneração ser efectuada senão por documento de valor idêntico, nos termos do disposto no art. 364° e 393° ambos do Código Civil.</font></i>
</p><p><i><font>XLVI - Quer isto dizer que a prova da existência de um alegado acordo verbal entre as partes do contrato escrito e o comprador, com o citado âmbito, nunca poderia ser feita por testemunhas - cfr. Ac.TRG de 31-01-2013, proc. 356/11.OTBPVL.G1.</font></i>
</p><p><i><font>XLVII - A Relação, além de decidir antes de analisar - “...antecipando desde já a nossa decisão, entendemos não assistir razão ao Recorrente” -, fazer “análise por remissão” e por chavões e adjectivada confirmação, tudo para saltar as questões essenciais do recurso, procedeu ao conhecimento “não reapreciando, como devia, as provas apresentadas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das aleaacões do recorrente“, traduzindo-se a reapreciação “em meras considerações genéricas”, "abstendo-se por isso, sem mais, de conhecer da substância do recurso" - Cfr. cit Ac.STJ, de 02/03/2011, p° 1675/06.2TBPRD.P1.S1.</font></i>
</p><p><i><font>XLVIII - Retomando como referência as proposições do referido Ac.STJ, do processo n° 1675/06.2TBPRD.P1.S1, é pertinente dizer que a Relação, incorrendo na nulidade absoluta da sua decisão, desrespeitou gravemente a exigência da lei, em termos de reapreciação da matéria de facto, fazendo um simples exercício formal, com considerações teóricas, conclusões vagas e afirmações genéricas, e fazendo uma simples adesão aos fundamentos da decisão recorrida, abstendo-se, assim, de tomar parte activa na avaliação dos elementos probatórios indicados pelo recorrente e nos que deveria adquirir oficiosamente.</font></i>
</p><p><i><font>XLIX - Como se evidencia e se tem por assente, a jurisprudência superior é toda, de modo unívoco, pacífico e uniforme, no sentido de que o tipo de conhecimento meramente formal, formatado e tabelar não vale, não passando de um arremedo de conhecimento, que viola aquilo que às pessoas é devido: "...como é merecido e proveitoso para a prossecução da justiça”, como se diz no acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça, de 26/04/2012, processo 1314/07.4TBCTB.C1.S1.</font></i>
</p><p><i><font>L - A cedência total e absoluta da Relação à 1- instância vem traduzida no ponto I do sumário do acórdão, com o “argumento” de que “É o juiz da 1 a Instância, perante o qual a prova é produzida, que está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação...”</font></i>
</p><p><i><font>LI - Trata-se de um argumento totalmente vazio e não passa de um estereótipo para tentar encobrir a evidência, tão grande, que não pode escapar ao próprio Tribunal, da absoluta insuficiência de análise e raciocínios próprios.</font></i>
</p><p><i><font>LII - Pela forma como germinam e se instalam, os estereótipos são um perigo para a inteligência, para a cultura em geral, e patentemente gravíssimos na área do direito, pois são absolutamente contrários ao direito como ciência e como modelo axiológico.</font></i>
</p><p><i><font>LIII - Têm a vantagem de serem mais facilmente assimiláveis do que a exegese mais profunda e, por essa facilidade de apreensão, além de também facilmente se sedimentarem, tem ainda a “virtude” de também serem facilmente corrompidos por adaptações de conveniência, pois se não têm como base um método rigoroso de formação, estão mais sujeitos à plasticidade casuística, espalhando-se o erro inicial como labaredas em palha seca. </font></i>
</p><p><i><font>LIV - É o caso da invocação da imediação, mesmo com descrição de “rubores", “tiques mímicos”, etc., pois isso pode ter uma série de explicações e, só por si, pode encobrir uma errada ou má convicção, pois também neste aspecto nada há que permita que se atribua à imediação de um julgador maior valor do que a de qualquer outra pessoa, ou sequer que isso se possa presumir.</font></i>
</p><p><i><font>LV - Invocar a imediação é uma falácia se não se justificar, com elementos concretos, em que é que essa imediação foi pertinente, sobretudo de forma a permitir controle desse aspecto da motivação.</font></i>
</p><p><i><font>LVI - Com efeito, não basta dizer que a imediação permitiu optar por este ou aquele depoimento, sendo imperioso relatar e demonstrar objectivamente os dados dessa imediação e a lógica das ilações deles retirados.</font></i>
</p><p><i><font>LVII - A invocação da imediação, quando não é assim explicada - e no caso, encerra-se o sumário em si mesmo, sem um avo de fundamentação -, é um nítido sinal da carência de suporte da opção decisória e apenas permitirá reacção com outra imediação...</font></i>
</p><p><i><font>LVIII- Ao assegurar a todos o acesso aos Tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 20°) e, especificamente, ao prever o direito a um processo justo e equitativo, com a expressão incontornável do princípio do direito ao recurso, (artigos 20°, nos 4 e 5, e 32°, n° 1), a Constituição não só assegura todos meios necessários e adequados para o feito, como impede a existência ou a invocação de normas processuais - ou de interpretações normativas - que se traduzam na destruição dos direitos que enformam os seus princípios.</font></i>
</p><p><i><font>LIV - Em suma, de todo o exposto, e sempre sem prejuízo de douto suprimento, crê o recorrente que se verifica:</font></i>
</p><p><i><font>i - Violação pela Relação da lei substantiva e da lei processual;</font></i>
</p><p><i><font>ii - Aplicação indevida, para efeitos de não conhecimento de uma nulidade por não redução a escrito, da norma do artigo 3°, al. c) - conceito de consumidor - do DL 24/2014, a contratos de actividade leiloeira incidentes sobre a venda de bens imóveis, quando o artigo 16°, n° 1, al. b) do regime daquela actividade, que remete apenas para as “disposições ...que lhes sejam aplicáveis”, do citado DL 24/2014 e este diploma prevê, no artigo 2°, n° 2, que “Sem prejuízo do disposto no número anterior, os artigos 4.° a 21° não se aplicam a: d) Contratos relativos à construção, à reconversão substancial, à compra e venda ou a outros direitos respeitantes a imóveis...”:</font></i>
</p><p><i><font>iii - Violação da lei substantiva, por aplicação errada do conceito de consumidor previsto no artigo 3° do Decreto-Lei n.° 24/2014 - ”a pessoa singular que atue com fins que não se integrem no âmbito da sua atividade comercial, industrial, artesanal ou profissional” -, quando o artigo 2° do DL 155/2015, define “«Destinatário», a pessoa singular ou colectiva que adquire um bem a cliente da empresa leiloeira na sequência de um leilão”, o que significa, na harmonia do sistema, que o legislador quis consagrar, e consagrou, um conceito de consumidor específico, adequado à actividade de mediação imobiliária e leiloeira;</font></i>
</p><p><i><font>iv - A formação de juízos de prova e presunções com total e inaceitável ilogicidade e mesmo em contradição própria e com a 1° instância;</font></i>
</p><p><i><font>v - Desrespeito das normas reguladoras da força probatória dos meios de prova admitidos para o caso concreto;</font></i>
</p><p><i><font>vi - Fuga à alteração ou modificação da matéria de facto e à reapreciação própria das provas;</font></i>
</p><p><i><font>vii - Foi feita especificação aos depoimentos por remissão, adesão e simples confirmação, através de chavões e furtando-se a formar a sua própria convicção;</font></i>
</p><p><i><font>viii - Não houve reapreciação, como devida, das provas apresentadas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrida.</font></i>
</p><p><i><font>LV - E, por último, inserem-se aqui as inconstitucionalidades que, s.m.j., se entendem verificadas:</font></i>
</p><p><i><font>a) Por violação dos princípios do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo, deixa-se invocada a inconstitucionalidade das normas extraídas da interpretação dos artigos 16°, nos i e 5, da Lei n° 15/2013, de 08/02 e 15°, nos i e 2, do DL n° 155/2015, de 14/02, no sentido de que a inobservância da forma escrita não determina a nulidade dos contratos previstos em cada um dos regimes e de que não é aplicável ao regime do DL n° 155/2015 a previsão de nulidade da Lei n° 15/2013.</font></i>
</p><p><i><font>b) Por violação dos princípios do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo, deixa-se invocada a inconstitucionalidade das normas extraídas da interpretação do artigo 662° do CPC, no sentido de, pela consideração dos princípios gerais da imediação e da oralidade, hem como da concentração e da livre apreciação da prova, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada quando se possa concluir, com a necessária segurança, que analisada e conjugada a prova produzida esta aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida em 1- instância.</font></i>
</p><p><i><font>c) Por violação dos princípios do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo, deixa-se invocada a inconstitucionalidade das normas extraídas da interpretação do artigo 662° do CPC, no sentido de serem omitidos ou supridos os deveres de alteração, renovação, anulação e determinação de fundamentação, previstos nos nos 1 e 2 do artigo 662°, por supremacia abstracta da imediação no julgamento da 1- instância.</font></i>
</p><p><i><font>d) Por violação dos indicados princípios, do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo - artigo 204°, parte final, da CRP -, são inconstitucionais as normas extraídas do artigo 607°, n° 5, do CPC, quando interpretadas no sentido de, delimitado o objecto do litígio e delimitado o objecto do recurso nas conclusões, ser lícito ao Tribunal de 2- instância, ex vi do artigo 666°, louvar-se apenas na adesão e replicação da motivação da 1- instância e, a partir dela, elaborar afirmações conclusivas para a decisão final.</font></i>
</p><p><i><font>e) Por violação dos indicados princípios, do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo - artigo 204°, parte final, da CRP -, são inconstitucionais as normas extraídas do artigo 607°, nos 4 e 5, do CPC, quando interpretadas no sentido de, delimitado o objecto do litígio e delimitado o objecto do recurso nas conclusões, ser lícito ao Tribunal de 2- instância, ex vi do artigo 666°, louvar-se apenas na adesão e replicação da motivação da 1° instância e, a partir dela, elaborar afirmações conclusivas para a decisão final.</font></i>
</p><p><i><font>f) Por violação dos indicados princípios, do Estado de Direito, do direito ao recurso e da obtenção de um processo justo e equitativo - artigo 204°, parte final, da CRP -, são inconstitucionais as normas extraídas do artigo 607°, nos 4 e 5, do CPC, quando interpretadas no sentido de para descreditar um depoimento se invoque ser o mesmo contrário a outro.</font></i>
</p><p><i><font>Assim Vas Exas decidindo, farão boa e sã JUSTIÇA”</font></i><font>.</font>
</p><p><font>Responde a autora, concluindo:</font>
</p><p><i><font>“Não se encontram violadas quaisquer normas que ponham em causa a validade plena da relação jurídica estabelecida com o Recorrente.</font></i>
</p><p><i><font>O Acórdão recorrido apreciou a relação jurídica contratual da Capital Leiloeira com as vendedoras para concluir tratar-se de um contrato de leilão nos termos do artigo 15.º do DL n.º 155/2015, “referindo-se o acordo celebrado com o réu (recorrente) apenas ao acerto do montante da remuneração prevista no contrato, como sendo da responsabilidade do adquirente, conforme estipulado nas condições de venda da Autora; competindo ao adquirente, in casu, o reu (recorrente) aceitar ou não proceder à compra nessas condições, sendo certo que o fez e, para além de acordar o montante da remuneração, negociou uma redução do preço com fundamento nesse pagamento” (Cfr. Acórdão, fls 25, último parágrafo).</font></i>
</p><p><i><font>Por isso, a Relação manteve, e bem, a decisão da 1ª instância quanto à não admissibilidade desta questão nova.</font></i>
</p><p><i><font>Finalmente, o Recorrente invoca e pugna pela nulidade do acordo celebrado entre o Recorrente e a Autora, por não ter sido reduzido a escrito e se tratar de um contrato celebrado fora do estabelec | [0 0 0 ... 0 0 1] |
4DJqu4YBgYBz1XKv0QRQ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Acordam em audiência, na 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça.</font><br>
<p><br>
</p><p><b><font>AA</font></b><font>, casado, contribuinte nº ..., residente na Rua..., ..., veio instaurar esta ação declarativa (agora a prosseguir sob a forma de processo comum) contra BB, casada, contribuinte nº ..., residente na Avenida..., ... ... e contra CC, viúvo, contribuinte nº ..., “declarado incapaz por interdição por anomalia psíquica, sendo sua tutora a aqui primeira ré, mas a ser representado, como se requereu, por curador especial “ad litem” a nomear”, residente na Rua..., ....</font><br>
</p><p><b><font>Como fundamento da ação</font></b><font>, em resumo e no essencial, alega:</font><br>
</p><p><font>O Autor é irmão da Ré MM, sendo ambos filhos do Réu CC, declarado incapaz por sentença de 17 de Julho de 2009, transitada em julgado, proferida pela ... Vara, ...Secção do Tribunal Judicial do ..., tendo sido aí nomeada como sua tutora sua filha, a aqui 1ª Ré.</font><br>
</p><p><font>Em 1984 o autor abriu uma conta bancária no ... (...) em ..., na qual, efetuou diversos depósitos em numerário com dinheiro que lhe pertencia. Por razões de segurança (residia e trabalhava em ..., país que atravessava uma fase de crise e de guerra civil), o autor abriu a referida conta como primeiro titular e, como restantes titulares com poderes de movimentação, os seus pais. Com o óbito da sua mãe, no dia 9 de Setembro de 2003, e porque a sua filha entretanto atingira a maioridade, o autor acrescentou esta última como titular da conta.</font><br>
</p><p><font>Em 05-05-2004, o saldo da conta do Autor era de 526.916,58 USD (quinhentos e vinte e seis mil novecentos e dezasseis dólares americanos e cinquenta e oito cêntimos), a que correspondia o valor em euros de € 440.197,64(quatrocentos e quarenta mil, cento e noventa e sete euros e sessenta e quatro cêntimos).</font><br>
</p><p><font>A partir de 05-05-2004, o Autor deixou de receber correspondência do banco.</font><br>
</p><p><font>Estranhando a situação, o Autor, em 23-12-2004, contactou a entidade bancária depositária, vindo a saber então com enorme surpresa e perplexidade, que a quantia, de dinheiro, correspondente ao saldo da sua conta, tinha sido levantada na totalidade.</font><br>
</p><p><font>Alega que solicitou de imediato à entidade bancária, via fax, cópia do documento que serviu de suporte ao referido movimento e no mesmo dia recebeu o ora Autor o documento solicitado, do qual consta o pedido de emissão de 4 cheques no valor total de 526.916,58 USD (quinhentos e vinte e seis mil novecentos e dezasseis dólares americanos e cinquenta e oito cêntimos), a favor da aqui Ré BB – cf. documento que se junta sob nº 7- fazendo esta suas tais quantias.</font><br>
</p><p><font>Alega que resulta ainda desse documento o pedido de mudança de morada do titular da conta, para o domicílio da Ré MM. </font><br>
</p><p><b><font>Concluiu o autor a petição inicial, formulando os seguintes pedidos</font></b><font>: “Termos em que deve a ação vir a ser julgada provada e procedente, condenando-se ambos os Réus:</font><br>
</p><p><font>1. A reconhecerem o Autor como o único dono e legítimo possuidor da quantia de 526.916,58 USD, que se encontrava depositada no BES/Miami e, consequentemente,</font><br>
</p><p><font>2. A restituírem ao Autor essa quantia de 526.916,58 USD convertida em contravalor em Euros com base na taxa cambial em vigor à data da efetiva restituição e na proporção da responsabilidade que lhes vier a ser atribuída, sendo que este valor se liquida para feitos processuais e para fixação do pedido nesta data em € 388.822,00.</font><br>
</p><p><font>3. A pagarem ao Autor, solidariamente e na mesma proporção de responsabilidade, uma indemnização a liquidar em execução de sentença, correspondente aos juros perdidos desde 05-05-2004 até à data da restituição, calculados com base na taxa aplicável ao referido depósito em USD no BES/Miami e por idêntico período de tempo, convertida e Euros com base na taxa de câmbio à data do pagamento.”</font><br>
</p><p><b><font>Contestou a ré </font></b><font>BB, excecionando a prescrição do direito alegado pelo autor (tratando-se de responsabilidade por factos ilícitos alegadamente praticados em 2004 a eventual responsabilidade pelos mesmos teria prescrito em 2007). Impugnando, alega que todas as quantias depositadas em tal conta bancária eram pertença do seu pai (segundo réu), que querendo beneficiá-la, emitiu e entregou-lhe quatro cheques no valor total de USD 526,916.58, fazendo sua essa quantia por doação do seu referido pai, concluindo pela sua absolvição (tudo igualmente como melhor consta do seu articulado/contestação de fls. 197 e ss.) 2</font><br>
</p><p><font>Após nomeação de curador ad litem, </font><b><font>contestou também o réu</font></b><font> CC (por intermédio do seu referido curador), e, em resumo, impugnando os factos alegados na petição concluiu pela sua absolvição do pedido (articulado de fls. 251 e ss. que também se dá por reproduzido).</font><br>
</p><p><b><font>O autor respondeu</font></b><font> às contestações (articulados de fls. 230 e 260)</font><br>
</p><p><b><font>Foi proferido despacho saneador</font></b><font> do processo (que relegou para final o conhecimento da exceção de prescrição), com seleção da matéria de facto, fixando-se os factos já assentes e elaboração da base instrutória (despacho de fls.270).</font><br>
</p><p><font>Entretanto, o autor foi nomeado tutor do 2º Réu, em substituição da 1ª Ré no processo de interdição.</font><br>
</p><p><font>E posteriormente, por requerimento de fls. 622, após a apresentação pelos Réus das respetivas contestações, o Autor, alegando ter sido nomeado tutor do 2º Réu, CC, seu pai, desistiu da instância relativamente a este último, desistência que foi aceite pelo Conselho de Família convocado pelo Autor na qualidade de tutor do 2º Réu.</font><br>
</p><p><font>Essa desistência foi homologada por despacho/sentença de fls. 694.</font><br>
</p><p><font>Procedeu-se à realização da audiência final observando-se o legal formalismo e </font><b><font>foi proferida sentença</font></b><font> com o seguinte teor:</font><br>
</p><p><i><font>A - Julgar improcedente a exceção de prescrição invocada pela ré BB, dela absolvendo o autor AA, ambos com os demais sinais dos autos;</font></i><br>
</p><p><i><font>B - Condenar a ré BB a reconhecer que o autor AA, é o único dono e proprietário da quantia de 526.916,58 USD (quinhentos e vinte e seis mil novecentos e dezasseis dólares americanos e cinquenta e oito cêntimos), que se encontrava depositada no BES/Miami;</font></i><br>
</p><p><i><font>C - Condenar a mesma ré BB a restituir ao autor AA, a quantia de 526.916,58 USD (quinhentos e vinte e seis mil novecentos e dezasseis dólares americanos e cinquenta e oito cêntimos), convertida no respetivo contravalor em Euros com base na taxa cambial em vigor à data da efetiva restituição, quantia esta acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde Abril de 2004 até efetivo pagamento (assim ficando prejudicado o pedido de condenação em liquidação de sentença).</font></i><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformada a ré interpôs recurso de apelação, sendo decidido pelo Tribunal da Relação do Porto:</font><br>
<p><font>“</font><i><font>Pelo exposto, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, julgamos a ré/recorrente parte ilegítima, absolvendo-a da instância o que, obsta ao conhecimento do mérito do recurso</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Inconformado com o decidido pela Relação, interpõe recurso de Revista para este STJ, o autor, vindo a ser proferido acórdão no qual se entendeu que, face ao modo como o autor configura a ação e os pedidos formulados não se mostra necessária a intervenção (ao lado do autor ou da ré) de qualquer outro sujeito processual, ordenando o prosseguimento dos autos com vista à apreciação e decisão das questões suscitadas na apelação, e se deliberou: “</font><i><font>Em face do exposto acordam, no Supremo Tribunal de Justiça e 1ª Secção, em julgar o recurso procedente e, concedendo-se a revista revoga-se o acórdão recorrido, que deve ser substituído por outro que, no prosseguimento dos autos, conheça das questões suscitadas no recurso de apelação</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>Em novo acórdão, pela Relação, foi decidido</font></b><font>: “</font><i><font>os Juízes do Tribunal da Relação do Porto, acordam em julgar procedente o recurso de apelação e, assim, julgando procedente o recurso sobre a decisão da questão de fato, revogam a decisão recorrida e absolvem a ré-recorrente dos pedidos formulados pelo autor-recorrido</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Novamente inconformado com o decidido pela Relação, o </font><b><font>autor interpõe recurso de Revista para este STJ</font></b><font>, concluindo: </font><br>
</p><p><i><font>“1. Ao Supremo Tribunal de Justiça impõe-se a efetivação do controlo, em concreto, da legalidade do uso dos poderes/deveres da Relação quando, para além de outras situações, proceda a um verdadeiro novo julgamento, reapreciando toda a produção da prova, testemunhal e documental, alterando profundamente a matéria de facto, como é o caso.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Este controlo é legalmente conferido pelos artigos 674º nº 3, 682º nº 3 e 683º do CPC, podendo ser exercido em relação ás decisões da 2ª Instância em matéria de facto que não se revelem suficientemente fundamentadas ou quando pequem por omissão de pronúncia e não conheçam de factos alegados ou provas produzidas relevantes para a boa decisão jurídica do pleito, declarando a respetiva nulidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Em função dos pedidos principais formulados na petição inicial, está basicamente em causa o reconhecimento de que o Autor era o único dono e legítimo possuidor da quantia de 526.916,58 USD, convertida em € 388.822,00, que se encontrava depositada no BES/Miami e a condenação da 2ª Ré (tendo em conta que o 1ª Ré foi pelo Autor excluída de tal pedido) e a restituição dessa quantia, da qual se havia apropriado.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Na sua contestação, a Ré não pôs em causa a existência desta conta, nem o levantamento do saldo, que nela existia, nem o facto de ter esse saldo vultuoso revertido totalmente a seu favor, tendo justificado estes factos alegando, em síntese, que o dinheiro era dos seus pais CC e DD, que seu pai a “queria beneficiar”, que “está na sua posse por doação do seu pai”, que “a redita doação foi do conhecimento de todos os membros da família” e que “aceitou a doação estando de boa fé” (artigos 47º,48º, 58º, 59º e 60º da contestação).</font></i><br>
</p><p><i><font>5. O cerne da questão, em matéria de facto, assenta, pois, no que foi objeto de quesitação no artigo 3º da base instrutória e que viria a ser respondido nos termos da alínea g) da sentença proferida em 1ª Instância nos seguintes termos: “este montante respeitava a poupança do autor, produto do seu trabalho”.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. Assim, ao contrário do que vem sustentado em diversos pontos no acórdão recorrido, o cerne da questão, de que dependeriam as respostas a dar em relação à maioria das outras questões da matéria de facto, não reside no subtema da abertura da conta, operada em 1984, nem quanto à concreta operação bancária que deu origem ao depósito nessa conta das duas quantias iniciais totalizando USD 200.000,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Contudo, na reapreciação da prova produzida em 1ª Instância resultou uma profunda modificação da matéria de facto tendo basicamente em conta a valoração da prova no tocante à referida alínea e) dos factos provados na sentença da 1ª Instância, mas com marginalização e desconsideração do tema, a nosso ver, mais relevante e fulcral, concentrado na matéria dada com provada na alínea g), que de facto provado passou a facto não provado.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Uma marginalização que se refletiu, notoriamente, na desvalorização da prova testemunhal oferecida pelo Autor sobre a questão da propriedade efetiva do valor depositado em conta, prova essa alicerçada em vários depoimentos claros e convincentes, transcritos nas contra-alegações e agora referidos nestas alegações, que não deixaram quaisquer dúvidas obre a sua credibilidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>9. Ouve assim erro de julgamento resultante de violação de lei.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. A prova assente em depoimentos com base no conhecimento indireto dos factos não pode, pura e simplesmente, ser afastada nem deixar de ser valorada na formulação de um juízo probatório conclusivo, à luz de presunções legítimas.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. As presunções judiciais constituem um mecanismo necessário para conduzir o Tribunal a afirmar a verificação de um determinado facto controvertido, suprindo as lacunas de conhecimento ou de informação que não possam ser preenchidas por outros meios de prova, ou servindo ainda para valorar os meios de prova produzidos, como é reconhecido pelo artigo 349º do C. Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. Se as presunções não constituem verdadeiros meios de prova, não podem deixar de assumir o papel que lhes está confiado por lei, isto é, o de serem meios lógicos e mentais pelos quais o julgador parte de um determinado facto conhecido para afirmar um facto desconhecido, servindo-se, para esse fim, de regras deduzidas da experiência da vida, num exercício dedutivo decorrente dos factos provados e tendentes à obtenção da justiça material.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Ora, tendo-se verificado que tal exercício não foi concretamente elaborado na Relação exclusivamente por terem sido considerados depoimentos indiretos, sem serem avaliados em associação com outros factos provados e demais provas produzidas, resultou num erro de julgamento em relação ao ponto concreto da alínea g) dos factos provados na 1ª Instância, o que inquinou a resposta quanto aos demais factos que dessa resposta eram dependentes.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Tais depoimentos deveriam ter sido necessariamente valorados no seu conjunto e á luz das regras da experiência e logicidade e numa perspetiva de enquadramento da prova global produzida, o que a Relação não fez, dando origem a uma radical e contraditória resposta, em relação à 1ª Instância, sobre a matéria de facto da referida alínea g).</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Também não foi minimamente apreciada a relevância do posicionamento assumido nos autos por II, quer como testemunha equidistante das partes, quer quanto ao teor do que alegou na sua contestação em representação do 2º Réu, enquanto seu curador “ad litem”.</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Consequentemente, o Tribunal da Relação não fundamentou com suficiência a sua decisão de alterar a matéria de facto na alínea g) da sentença da 1ª Instância, dando-a como não provada quando havia sido dada como provada em 1ª Instância abstendo-se de apreciar de forma crítica e especificamente todos os elementos de prova existentes nos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Como tem sido jurisprudência deste Supremo Tribunal, se a Relação ouviu os depoimentos questionados, se analisou os demais elementos dos autos, pode e deve proceder a uma análise critica dessas provas de forma a assegurar em temos práticos o duplo grau de jurisdição em matéria de facto, assim recaindo sobre si o ónus de apreciar de forma precisa e específica a matéria de facto impugnada, tendo em conta não só as alegações do recorrente como as da contraparte.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. Ao agir por omissão desse dever legal, ocorre causa de nulidade pelo disposto no artigo 615º nº 1 b) do CPC, o que se argui para todos os efeitos legais.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. Acresce que o acórdão recorrido padece ainda de clara contradição geradora de idêntica nulidade, mas agora por força da alínea c) do mesmo normativo processual, tendo em vista o teor dos factos que aditou como fatos provados sob as alíneas f) e g) a fls. 41 do acórdão recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sem prejuízo destas antecedentes 19 conclusões:</font></i><br>
</p><p><i><font>20. Mesmo admitindo-se, como hipótese de raciocínio, que este Supremo Tribunal não comungue com os fundamentos da invocada dupla causa de nulidade do acórdão recorrido e que, assim, se deve considerar consolidada a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal da Relação, ainda assim presente ação não poderá ser julgada totalmente improcedente.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. Como o Autor sempre defendeu e foi corretamente entendido no Tribunal em 1ª Instância, a pretensão concretamente formulada na petição insere-se no quadro típico de uma ação de reivindicação e não de uma ação de responsabilidade civil por factos ilícitos, embora nesta se alicerce, acessoriamente, um pedido de indemnizar pela prática do esbulho e subsequente privação do bem indevidamente apropriado.</font></i><br>
</p><p><i><font>22. Na verdade, são dois os pedidos que integram e caracterizam a reivindicação: o reconhecimento do direito de propriedade, por um lado, e a restituição da coisa, por outro, tal como sucedeu na petição inicial consubstanciada na formulação dos 1º e 2º pedidos (pedidos principais).</font></i><br>
</p><p><i><font>23. No caso em apreço, está em causa uma quantia em dinheiro em depósito em conta que, à data da sua movimentação indevida, era titulada pelo Autor como 1º titular e ainda por seu pai CC e sua filha e FF.</font></i><br>
</p><p><i><font>24. A manter-se a decisão da matéria de facto, em termos definitivos, tal como dela conheceu agora o Tribunal da Relação pelo acórdão recorrido, resulta que não ficou provado que o dinheiro depositado na conta do ... era pertença exclusiva do Autor.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Mas também não se provou que fosse pertença exclusiva do 2º Réu CC e sua esposa, DD, como foi alegado como base da sua tese (artigo 31º da contestação)</font></i><br>
</p><p><i><font>26. Na verdade, apenas ficou assente que a conta era cotitulada, desde 8.12.2002, pelo Autor, por sua filha, FF e por seu pai CC e que os fundos nela depositados não pertenciam á Ré (que alega tê-los recebido por doação do 2º Réu) embora tivesse recebido e feito sua a quantia total que nela estava depositada.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Consequentemente, prevalece para todos os efeitos legais a presunção de cotitularidade do dinheiro depositado nessa conta, tal com vem regulado nos artigos 512ºe 516º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>28. A titularidade das contas solidárias não predetermina a propriedade dos fundos nelas contidos, a qual pode pertencer apenas a alguns dos seus titulares cotitulares, pelo que podendo qualquer dos cotitulares ter, perante o banco, o direito e dispor da totalidade do dinheiro que constitui o objeto do depósito, na respetiva esfera patrimonial de cada um dos cotitulares só se radica um direito próprio sobre o numerário se, efetivamente lhe couber, como proprietário, qualquer parte no saldo de depósito, e só dentro dos limites dessa parte.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. Pelo que, em virtude da presunção de solidariedade, que não foi ilidida, deve o Tribunal reconhecer que uma terça parte do valor depositado sempre pertenceria ao Autor, outra terça parte a sua filha FF e apenas uma outra terça parte a CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>30. No quadro legal da compropriedade, assiste ao Autor o direito, na defesa do seu direito de propriedade, ao abrigo do disposto no artigo 1405º n.º 2 do C. Civil, de reivindicar de terceiro a coisa comum, sem que a este seja lícito opor-lhe que ela lhe não pertence por inteiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>31. No caso concreto da presente ação de reivindicação, deve assim a Ré ser condenada a reconhecer que, no mínimo, ao Autor pertencia uma terça parte do valor retirado da conta coletiva solidária, cujo valor alega ter-lhe sido doada por seu pai, e ainda a restituir ao Autor o valor correspondente á sua parte, de que se locupletou indevidamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>32. Restituição essa independentemente do que no mesmo sentido lhe vier ser eventualmente exigido pala cotitular FF, que não é parte na presente ação, sem prejuízo do dever de colação para efeito de partilha da herança indivisa por óbito de CC, para cômputo nesta do valor doado que ao “de cujus” pertencia, a ter em conta no processo de inventário pendente, onde são interessados, para além do Autor e da Ré, seus irmãos GG e HH.</font></i><br>
</p><p><i><font>33. Resulta esse dever de restituição por estarmos confrontados, de acordo com a tese da Ré, numa doação feita por seu pai que excedeu a parte que este possuía no valor da conta coletiva solidária por força de presunção legal não ilidida, e assim, em relação ao valor excedentário (2/3), corresponde a uma doação de bens alheios, regulada pelo artigo 956º do Código Civil, pelo que é nula nos termos do nº1 deste preceito legal.</font></i><br>
</p><p><i><font>34. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>35. Sendo o Autor titular do direito ofendido, pela referida doação, é inegavelmente para legitima para arguir a nulidade, a qual deve ser declarada com efeitos retroativos – artigo 289º nº 1 do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>36. Acresce que a restituição na mesma proporção seria também exigível ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa caso não fosse tomada em consideração a existência da alegada doação, porquanto não se vislumbra nos autos qualquer outra causa justificativa assente em negócio jurídico praticado pela Ré, que iniba a invocação deste regime em face do seu carácter de subsidiariedade e reconhecido último instrumento legal para impedir o injusto enriquecimento da Ré à custa do património do Autor, assim se justificando a aplicação dos artigos 473º e seguintes do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>37. Finalmente, não respondendo a Ré, face aos factos que por ora vêm fixados pela Relação, por responsabilidade civil extracontratual, tal como apenas acessoriamente se peticionou para fundar o pedido de indemnização, fica, contudo, obrigada a restituir pelo valor atual correspondente ao que fez seu em 2004, através da conversão desse valor em função da aplicação corretora com base nas taxas anuais de inflação fixadas pelo I.N.E. para os preços ao consumidor, a liquidar em execução de sentença, cumprindo-se com o disposto no artigo 289º nº 1 do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Termos em que, dando-se provimento à revista,</font></i><br>
</p><p><i><font>A – Deve o acórdão recorrido ser considerado nulo por força das alíneas b) e c) do nº 1 dos artigos 615º do CPC; ordenando-se a baixa dos autos à 2ª Instância para sanação das respetivas causas de nulidade;</font></i><br>
</p><p><i><font>B – Caso assim não se entenda, o que se admite por hipótese de raciocínio, deve ao acórdão recorrido ser revogado, proferindo-se em sua substituição acórdão condenando-se a Ré a reconhecer que ao Autor pertencia, pelo menos, uma terça parte do valor do saldo da conta no BES Miami que foi levantado e de que se apropriou, fazendo sua essa quantia, com inerente obrigação de restituição desse montante, atualizado com base nas taxas anuais de inflação fixadas pelo I.N.E. para os preços ao consumidor, a liquidar em execução de sentença”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Contra-alegou a ré, concluindo:</font><br>
</p><p><i><font>“A) Actualmente, para formar a sua própria convicção, pode a Relação proceder, como in casu procedeu, não só à reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes, como de todos aqueles que se mostrem acessíveis nos autos e estejam abarcados pela previsão do art. 662º;</font></i><br>
</p><p><i><font>B) Face ao preceituado no nº 3 do art. 674ºe, nº 2 do art.682º do NCPC, aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido (Relação) o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julga adequado, sendo que a decisão da matéria de facto só pode ser excepcionalmente alterada por este Supremo havendo ofensa de disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova, excepção na qual não se integra, manifestamente, o caso em apreço, pelo que a matéria de facto não pode ser reapreciada;</font></i><br>
</p><p><i><font>C) A questão levantada pelo Autor relativamente á resposta dada pela Relação à matéria de facto referida na alínea g) pressupunha que o Supremo Tribunal de Justiça invadisse e manuseasse a zona de conhecimento matéria de facto na sua globalidade, dado que esse tema está intimamente relacionado com as outras alíneas, o que significaria, recorrer da matéria de facto, o que não é processualmente admissível; </font></i><br>
</p><p><i><font>D) Não se vislumbra a razão de ser do Recorrente trazer à liça presunções nem se vê que matéria de facto deveria ser presumida, já que não estamos perante factos sujeitos a prova vinculada, pelo que estão sujeitos (no que concerne à prova produzida) à livre apreciação do tribunal, de acordo com o disposto no art.º 607.º, nº 4 do CPC e 396.º do C. Civil;</font></i><br>
</p><p><i><font>E) A testemunha II nada sabia acerca dos factos que o Autor se propôs provar, disse-o na sua contestação enquanto curador- conforme passagens citadas no alegatório supra-, pelo que reiterou esse desconhecimento da audiência de julgamento, em face do que o seu, ainda que pobre, depoimento foi tido em consideração pelo Tribunal da Relação conforme expressamente foi consignado no douto acórdão posto em crise;</font></i><br>
</p><p><i><font>F) O acórdão do Tribunal da Relação não padece de falta de fundamentação, apresentando-se laborioso, meticuloso, escorreito e que não deixa dúvidas a ninguém, pelo que, cotejando-o, todo ele é coerente, sendo um exemplo do domínio de toda a matéria fáctica, estando bem fundamentado por referência aos documentos e às testemunhas que determinaram a convicção do Tribunal – o percurso lógico de cada segmento da decisão “de facto” está impecavelmente detalhado;</font></i><br>
</p><p><i><font>G) Não há qualquer contradição entre as alíneas f) e g) da matéria de facto, pois o Autor, no seu recurso, subtilmente, só fez referência a uma parte do que foi dado por provado de modo a deturpar o sentido das frases, quando o que se verifica é que o que ali se diz é que o Autor contactou o bancou em Dezembro pelo facto de estranhar não receber correspondência desde 29.05.2004, não se dizendo que o Autor nunca mais recebeu correspondência alguma a partir daquela data; </font></i><br>
</p><p><i><font>H) Na Petição Inicial, o Autor identificou a acção de que lançou mão contra o seu pai e a Ré sua irmã como sendo uma acção emergente de responsabilidade civil, pelo que foi ele próprio que fez tal enquadramento, que assim desenhou a causa de pedir, quando em 66.º da P.I. disse que “Assim, os RR ao privarem de forma ilícita e abusiva o Autor de usar, fruir e dispor do seu dinheiro incorrem em responsabilidade civil nos termos do artigo 483º do C. Civil.”;</font></i><br>
</p><p><i><font>I) O Autor voltou a enquadrar assim a causa de pedir em75.º da mesma P.I., onde referiu que “Acresce que, subsidiariamente à responsabilidade civil por acto ilícito, sempre o dever de restituição e de compensação por igual valor existiria em virtude da aplicação do instituto de enriquecimento sem causa”;</font></i><br>
</p><p><i><font>J) O Autor, no formulário da plataforma Citius, levou a acção à distribuição indicando que a mesma tinha como objecto “factos ilícitos”, o que demonstra claramente, se alguma dúvida houvesse, a forma como o Autor enquadrou a causa: acção para efectivação da responsabilidade civil por factos ilícitos, pelo que só por razões de mera conveniência e em ato de contorcionismo processual veio agora falar de reivindicação;</font></i><br>
</p><p><i><font>K) A questão da propriedade ou compropriedade do dinheiro depositado numa dada conta bancária, portanto, em sede de acção de reivindicação, teria de ser esgrimida entre todos os contitulares dessa conta e só entre eles por ser matéria das suas relações internas, enquanto contitulares da conta bancária e a Ré não era, nem nunca foi, titular da conta bancária; </font></i><br>
</p><p><i><font>L) O Autor nunca teve na sua propriedade o (mesmo) dinheiro que a Ré tem em seu poder; o Autor apenas tinha um direito de crédito sobre o Banco e se esse direito de crédito se esvaziou foi porque lhe foi subtraído pelo Senhor CC, contitular da conta bancária, ao transferir uma determinada quantia para a Ré, donde se conclui que não foi a Ré que lhe esvaziou o direito de crédito sobre o banco, pois esta nunca foi titular de qualquer conta com ele;</font></i><br>
</p><p><i><font>M) Estamos perante uma conta bancária aberta num banco dos ..., portanto, num quadro exterior à União Europeia, onde são convocadas fontes específicas de Direito e, concretamente, o regime jurídico a aplicar ao contrato de depósito bancário teria de ser o americano;</font></i><br>
</p><p><i><font>N) Saber se o Autor, enquanto contitular de uma conta bancária americana, do Estado da ..., é o único proprietário do dinheiro lá depositado ou se é proprietário de um terço do dinheiro lá existente, importa levar em consideração, para além do contrato de abertura de conta (que nem sequer consta do processo, como vimos…), o que diz a lei estadual e federal a esse respeito, da ... e dos Estados Unidos da América, respectivamente, saber se é uma conta conjunta ou solidária e demais elementos caracterizadores dum depósito e em todos estes pontos o Impetrante tinha o ónus da prova e não o satisfez.</font></i><br>
</p><p><i><font>O) Não ficou provado que o Autor tenha aberto no ano de 1984 a concreta conta bancária identificada na petição inicial, nem que as disponibilidades monetárias aí depositadas fossem propriedade exclusiva do Autor, a implicar que não está provado que o autor foi o único depositante do saldo da conta bancária aberta no ano de 1984, nem que a ré se tenha apropriado desse saldo de forma ardilosa. </font></i><br>
</p><p><i><font>P) Os factos provados da alíneas d) a h), fazem concluir que não resulta que o Autor fosse o único titular das disponibilidades monetárias aí referidas como tendo sido levantadas e entregues pelo seu pai à primeira ré e ainda que se tratasse de conta solidária, é sabido que a titularidade destas não predetermina a propriedade dos fundos nelas contidos, resulta que a propriedade dos fundos ou valores (i) pode pertencer a algum ou a alguns dos seus cotitulares ou (ii) mesmo porventura a um terceiro, a implicar que o substrato factual que logrou demonstração não permite afirmar a ocorrência de uma conduta ilícita da ré, alegadamente traduzida em levar o pai das partes a subscrever cheques da conta colectiva e entregar à ré elevada quantia monetária de exclusiva propriedade do autor, mediante o aproveitamento da alegada especial debilidade de seu pai.</font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE QUE NÃO DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO AO PRECURSO APRESENTADO PELO AUTOR”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Foi admitido o recurso de revista.</font><br>
<p><font>Foram dispensados os vistos, sendo remetidas as peças processuais relevantes.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Face à alteração operada pela Relação, a matéria de facto dada como assente/provada e como não provada, com a alteração da sua numeração, daí decorrente, é a seguinte:</font><br>
<p><i><font>“Factos Provados e Não Provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Dá-se por integralmente reproduzida a certidão de fls. 163 a 184, extraída dos autos de ação especial de interdição nº 590/09...., em especial a decisão final (sentença) de fls. 164 a 169 que decretou a interdição de CC, nomeando sua tutora a aqui ré BB, sentença transitada em julgado em 30 de Julho de 2009;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) A data de início da incapacidade do interdito foi fixada na data da efetivação da perícia médica (9 de Outubro de 2008), à falta de outros elementos para o efeito (cfr. sentença acima referida e relatório pericial de fls. 30 a 37, em especial fls. 36);</font></i><br>
</p><p><i><font>c) O autor AA é irmão da ré BB, sendo ambos filhos de CC;</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Na sequência de pedido efetuado e subscrito po | [0 0 0 ... 0 0 0] |
9jFZu4YBgYBz1XKvovj9 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>Por apenso aos autos de execução de sentença para pagamento da quantia de €57.017,64, que lhes é movida por AA e BB, vieram os executados, CC e DD, deduzir embargos, invocando, em síntese, falta de título executivo, porquanto a sentença não os condenou a pagar qualquer quantia monetária, nem a sua atualização monetária, nem juros, nem sanção pecuniária compulsória. </font><br>
</p><p><font>Os embargados contestaram, citando abundante jurisprudência da qual extraem que “a declaração de anulação do negócio de compra e venda através da escritura pública outorgada em 23-05-1985, decretada pela douta sentença de fls., entre as partes, então, autores e réus, (aqui Exeq.tes e Exec.dos), configura-se como verdadeiro título executivo no que se reporta à obrigação de restituição do que foi prestado, ou seja da quantia exequenda”.</font><br>
</p><p><font>Dispensou-se a audiência prévia, proferiu-se despacho saneador e, por considerar que os autos o permitiam, o Mmº Juiz “a quo” conheceu do mérito, proferindo sentença em que decidiu:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Julgar os presentes embargos parcialmente procedentes, em consequência, determino a restituição aos exequentes do valor de 12.968,74 euros, acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal, a contar do trânsito em julgado do douto Ac. até integral pagamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelos embargantes e exequentes na proporção do decaimento</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><font>Inconformados com o assim decidido, quer os embargantes, quer os embargados, interpuseram recurso, vindo a ser decidido pelo Tribunal da Relação:</font><br>
</p><p><i><font>“Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação dos embargantes, revogando a sentença recorrida e, em sua substituição, julgam procedentes os embargos e sem título a execução, determinando-se a sua extinção.</font></i><br>
</p><p><i><font>Consequentemente fica prejudicada a apreciação do recurso interposto pelos embargados.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas em ambas as instâncias pelos embargados/apelados”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Novamente inconformados com o decidido pela Relação, interpõem recurso de Revista para este STJ os embargados (ver conclusão V), e formulam as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“I. O aqui Recorrente vem interpor o presente Recurso por não se conformar, de modo algum, com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães datado de 10 de Março de 2022,</font></i><br>
</p><p><i><font>II. O qual, erroneamente e sem qualquer fundamento válido, julgou procedente a apelação dos Embargantes, revogando a sentença recorrida e, nessa sequência, julgando procedentes os embargos e sem título a execução, determinando-se a sua extinção.</font></i><br>
</p><p><i><font>III. Nessa conformidade, o ora Recorrente, iniciará, as presentes alegações de Recurso, pela abordagem a uma questão prévia e ao enquadramento circunstancial inerente ao caso em concreto, senão vejamos:</font></i><br>
</p><p><i><font>IV. Cumpre, antes de mais, ao aqui Recorrente fazer alusão a uma breve questão prévia que diz respeito à habilitação de herdeiros efetuada no âmbito dos presentes autos executivos.</font></i><br>
</p><p><i><font>V. Isto porque, no passado dia ... de Fevereiro de 2022, faleceu, AA, Exequente nestes autos de processo, no estado de casado no regime de comunhão geral de bens com BB - cfr. Assento de óbito ao diante junto como Documento 1 e cujos seus efeitos se dão por integralmente reproduzidos.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI. Assumindo, este ultimo, o cargo de cabeça de casal, nos termos e para os efeitos do preceituado no n.º1 do artigo 2080.º, ambos do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>VII. Nessa conformidade, a malograda AA deixou a suceder-lhe como únicos e universais herdeiros, o seu cônjuge e os seus filhos, a saber: BB; EE; FF;</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII. Razão pela qual, em 06 de Abril de 2022, apresentou, o aqui Recorrente, o competente incidente de habilitação de herdeiros junto do Douto Tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>IX. Porém, e uma vez que, até ao momento, ainda não foi proferida sentença no que concerne a tal habilitação, as presentes alegações de recurso apenas são apresentadas pelo aqui Recorrente, sem prejuízo de após ser proferida a sentença de habilitação de herdeiros, os efeitos do presente recurso também aproveitarem aqueles, EE e FF, que com a tal sentença que os habilita assumirem, assim, a posição jurídica da decujus/Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>X. Posto isto, e no que diz respeito ao enquadramento circunstancial que pauta o caso em apreço, sempre se dirá que os presentes autos tiveram origem na apresentação, por parte do aqui Recorrente e da sua Esposa, AA, entretanto falecida, do competente requerimento executivo alegando, em suma, o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Que em virtude de, em 23 de Maio de 1985, se ter celebrado um contrato de compra e venda, no qual, através de erro grosseiro (e malicioso), os Executados venderam a fração sob a designação com letra D, sita na Rua ..., ..., ..., ..., quando, de facto, os Exequentes ab initio, sempre negociaram a aquisição de outra fração distinta designada sob a letra E, estes últimos intentaram a competente ação de condenação competente no Tribunal Judicial ..., processo com o n.º 4080/16....-..., Juiz ..., afim de reporem a legalidade;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) No âmbito desses autos, foi proferida sentença decretando a anulação do negócio de compra e venda celebrado e determinando, em consequência, o cancelamento da inscrição da aquisição do direito de propriedade a favor dos Autores, decisão essa que veio, de forma integral, a ser confirmada por douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, transitando em julgado em 12-06-2020;</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Nessa conformidade, e atenta a anulação do referido negócio jurídico, deve ser restituído o preço aos aqui exequentes que os mesmos pagaram (indevidamente) pela coisa, que, à data da realização do malogrado negócio, fora de dois milhões e seiscentos mil escudos, que hoje, atualizada a moeda pelo INE, a singelo, corresponde ao capital de 53.744,92€ (cinquenta e três mil setecentos e quarenta e quatro euros e noventa e dois cêntimos);</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Acrescendo, a tal quantia, os competentes juros, perfazendo a quantia total de €57.017,64 (cinquenta e sete mil setecentos e quarenta e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos), pelo que devem os executados serem condenados a pagar, solidariamente, aos exequentes a importância total já referida.</font></i><br>
</p><p><i><font>XI. Nesse seguimento, e por apenso aos autos de execução, vieram os Recorridos, CC e DD deduzir embargos, invocando, para além do demais, a inexistência de título executivo,</font></i><br>
</p><p><i><font>XII. Já que, no seu entendimento, a sentença proferida no processo n.º 4080/16...., que correu os seus legais termos no Tribunal judicial da Comarca ... - ... - Juiz ...,</font></i><br>
</p><p><i><font>XIII. Não os condenou ao pagamento de qualquer quantia monetária, nem a sua correspondente atualização monetária, nem tão pouco juros ou sanção pecuniária compulsória.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIV. Desta feita, o Tribunal de 1.ª Instância proferiu despacho saneador e, por considerar que os autos o permitiam, respetiva sentença conhecendo do mérito da questão, a qual julgou os embargos parcialmente procedentes e, nessa linha de raciocínio, determinou a restituição ao Exequentes da quantia de €12.968,74 (doze mil novecentos e sessenta e oito euros e setenta e quatro cêntimos), acrescido dos juros de mora, á taxa legal, a contar desde o transito em julgado da decisão até efetivo e integral pagamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>XV. Com efeito, inconformados com o teor de tal decisão, quer os Exequentes/Embargados, quer os Executados/Embargantes interpuseram alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães,</font></i><br>
</p><p><i><font>XVI. Sendo que os primeiros salientam a errada qualificação, pelo Tribunal a Quo, do valor peticionado no Requerimento executivo como obrigação pecuniária, restringindo, assim, o valor peticionado ao diminuto valor de €12.968,74 (doze mil novecentos e sessenta e oito euros e setenta e quatro cêntimos),</font></i><br>
</p><p><i><font>XVII.E os segundos, o facto da sentença proferida nos autos de processo n.º 4080/16.... não poder configurar um título executivo, porquanto a mesma não os condenou no pagamento de qualquer quantia monetária.</font></i><br>
</p><p><i><font>XVIII. Contudo, foi agora, proferido Acórdão por aquele Tribunal da Relação de Guimarães que decide no já elencado sentido de julgar procedente a apelação dos Executados/Embargantes, revogando a sentença recorrida e, nessa sequência, julgando procedentes os embargos e sem título a execução, determinando-se a sua extinção.</font></i><br>
</p><p><i><font>XIX. Todavia, não pode, nem deve o aqui Recorrente aceitar tal Decisão, por se mostrar desprovida de qualquer fundamento factual ou legal, como melhor infra se demonstrará:</font></i><br>
</p><p><i><font>XX. Como bem se sabe, de acordo com o estatuído nos artigos 635.º, n.º4 e 639.º, ambos do CPC, o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas nas alegações de recurso,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXI. Constituindo, na linha de raciocínio do Acórdão recorrido, questões as resolver no caso em apreço:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Por um lado, se a sentença dada à execução constitui título executivo;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) E, por outro e se assim se concluir, se o crédito dos Exequentes, constituí dívida de valor, devendo o valor nominal da quantia a restituir ser atualizado.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXII. Assim sendo, e no que diz respeito ao primeiro ponto – se a sentença proferida no âmbito do processo n.º 4080/16.... dada à execução constitui, ou não, título executivo,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIII. Refere o Acórdão recorrido que “a jurisprudência vem admitindo que, mesmo quando o pedido de restituição não tenha sido formulado na ação, a sentença que declara a nulidade deve condenar na restituição do que houver sido prestado por força do negócio nulo”, contudo, uma vez que “(…) não estamos perante um negócio nulo, muito menos um caso em que a nulidade do negócio tenha sido declara oficiosamente”,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIV. Mas, ao invés, “ (…) perante um caso de anulabilidade do negócio, que não pode ser conhecida oficiosamente, carecendo de ser arguida pelas pessoas em cujo interesse a lei a estabelece (…)”e, por essa ordem de razão, não tendo, os Exequentes, formulado qualquer pedido de restituição,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXV. “Nem sequer, atenta a fundamentação da sentença exequenda e a divergente jurisprudência sobre a questão, se pode concluir que, no dispositivo, apenas foi omitida a condenação na restituição, que na fundamentação se entendeu ser devida, mas apenas, que o dispositivo se cingiu aos pedidos formulados.”</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVI. Porém, e de acordo com o já referido, não pode, nem deve, o aqui Recorrente concordar com tal posição assumida, porquanto carece de qualquer fundamento válido a afirmação proferida no Acórdão recorrido no sentido da procedência dos embargos de executado deduzidos nos presentes autos por não haver qualquer título, que sirva de base à execução.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVII. Na verdade, é pedra angular da presente ação executiva o dizer-se que, da declaração de nulidade decorre o efeito jurídico assinalado no n.º1, do artigo 289.º, do Código Civil, isto é, a restituição de tudo o que tiver sido prestado.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXVIII. Em suma, esse preceito manda restituir tudo o que tiver sido prestado, o que significa que a declaração de nulidade implica, necessariamente, tal restituição.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXIX. E, nessa conformidade, não se torna necessária, a expressa declaração disso mesmo, considerando-se implícita, nessa declaração de nulidade, a condenação do Réu a restituir o que recebeu do Autor, não se ofendendo, com isto, qualquer interesse do Demandado digno de proteção.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXX. A tal conclusão nos leva, de forma inelutável, a bem sabida afirmação de que o fundamento de tal restituição é o supra aludido artigo 289.º, do Código Civil, pelo que, contrariamente ao decidido na decisão recorrida, o aqui Recorrente e sua esposa, intentaram a presente ação executiva com base num título executivo,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXI. Ou seja, na sentença, que decretou a anulação do negócio de compra e venda celebrado pelas Partes através de escritura pública outorgada em 23 de maio de 1985, já transitada em julgado.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXII. Ora, tal torna-se, assim, mais do que pertinente a conclusão de que esse é o único petitório exigido, não necessitando ele, portanto, de vir formular novo petitório.</font></i><br>
</p><p><i><font> XXXIII. Até porque hoje, aliás como sempre, o direito material, não se compadece no seu caminhar para a realização da Justiça, com pruridos e delongas de natureza adjetiva, quando a solução mais justa tem a necessária correspondência na Lei a interpretar e a aplicar.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIV.E a solução encontrada na decisão recorrida olvida isso mesmo, de forma patente, dando prevalência a uma visão puramente literal da Lei, com sobreposição do direito adjetivo ao direito substantivo, e pondo de parte a própria flexibilização do princípio do pedido, o que não pode subsistir, e a evolução do sistema jurídico no sentido da Justiça Material, por via jurisprudencial, como se peticiona na presente ação executiva.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXV. Reiterando-se, em suma, o alegado pelo aqui Recorrente, e sua esposa, na contestação apresentada aos embargos deduzido pelos Executados:</font></i><br>
</p><p><i><font>e) O Julgador, investido de autoridade judicial, profere e decreta condenação, cujo objeto se refere à anulação total do negócio jurídico realizado entre as partes;</font></i><br>
</p><p><i><font>f) O legislador prescreve que, in casu, deve ser restituído o preço pago indevidamente e com efeitos retroativos;</font></i><br>
</p><p><i><font>g) Por sua vez, o comprador lesado reclama o preço, injustamente, pago;</font></i><br>
</p><p><i><font>h) Assim, a decisão judicial (condenatória) que decreta a declaração de anulação do negócio de compra e venda em causa configura-se como verdadeiro título executivo, aplicável no caso sub judice, ou seja, aplicável na presente execução para pagamento de quantia certa no montante também certo de €57.017,64 (cinquenta e sete mil e dezassete euros e sessenta e quatro cêntimos);</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXVI. Ora, tendo por base que toda a execução tem por base um título executivo, e que, nos presentes autos configura a sentença proferida no processo n.º 4080/16...., é certo que não obstante essa declaração de anulação do contrato de compra e venda, nada se disse na parte dispositiva final da sentença sobre restituição a qualquer título,</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXVII. Tal não traduz, sem mais nem menos, que a sentença proferida não constitua um verdadeiro título executivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXVIII. Como refere o Professor Anselmo de Castro, é pelo contexto do título que se há-de determinar a espécie da prestação e da execução que lhe corresponde (entrega de coisa, prestação de facto, dívida pecuniária) se determinará o quantum da prestação e se fixará a legitimidade activa e passiva para a ação.</font></i><br>
</p><p><i><font>XXXIX. Desse modo, e no que concerne a exequibilidade das sentenças condenatórias referenciadas no artigo 46 nº1 al. a) do CPC entendeu, o Acórdão do Supremo tribunal de Justiça de 1999, que “para que a sentença possa servir de base à execução, não é necessário que condene no cumprimento de uma obrigação, bastando que esta obrigação que se pretende executar dela derive implicitamente” (sublinhado e negrito nossos).</font></i><br>
</p><p><i><font>XL. E, de facto, tendo isto na devida consideração, impõe-se analisar, com o rigor e precisão necessários, o contexto do título executivo em questão, como se disse, constituído pela Sentença proferida no âmbito do processo n.º 4080/16.....</font></i><br>
</p><p><i><font>XLI. Isto porque, pese embora na parte dispositiva final, a Sentença omita a condenação na restituição das prestações realizadas, o mesmo já não se passa na parte da motivação (fundamentação) onde a questão da restituição de tais prestações é tratada direta e expressamente quando aí a determinado passo se consigna.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLII. Assim, e contrariamente ao referido no Acórdão recorrido, se atendermos ao próprio contexto do título oferecido à execução, nomeadamente através dos seus próprios fundamentos, a restituição simultânea das prestações realizadas está compreendida no próprio título executivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIII. A este respeito subscreve-se a posição do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 9/5/1996 in BMJ 457 263 em que se entendeu “ não ser de excluir que se possa recorrer à parte motivória da sentença para reconstituir e fixar o verdadeiro conteúdo da decisão”</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIV. E sobre a questão da restituição simultânea tal Acórdão acentua” declarada na sentença ao abrigo do art. 289 nº1 do C. Civil a nulidade dos contratos de compra e venda dos prédios negociados, há lugar à restituição simultânea dos mesmos e dos montantes dos preços desembolsados à sociedade autora e aos réus compradores respetivamente”.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLV. Não repugna, no caso dos autos, sufragar tal entendimento, porquanto em função da aplicação do regime do art. 289 nº1 do C. Civil e por força do contexto (fundamentação) do próprio Acórdão (título executivo) está implícito que a condenação abrangeu também a restituição simultânea das prestações realizadas,</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVI. Sendo, desse modo, lícito, aos Exequentes, intentarem processo executivo com base na sentença proferida no processo n.º 4080/16...., peticionando o pagamento, pelos aqui Executados, da quantia de 53.744,92€ (cinquenta e três mil setecentos e quarenta e quatro euros e noventa e dois cêntimos), a título de restituição das prestações realizadas,</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVII. Quantia essa aferida tendo em conta a competente atualização monetária, acrescida dos respetivos juros, o que perfaz a quantia total de € 57.017,64€ (cinquenta e sete mil e dezassete euros e sessenta e quatro cêntimos), invocando o estatuído nos artigos 289.º, nº 1 e 290.º, nº1 ambos do C. Civil, afim de repor o statu quo ante, ou seja, o regresso à situação anterior à celebração do negócio.</font></i><br>
</p><p><i><font>XLVIII. Com efeito, e na conformidade de tudo o supra exposto, impõe-se concluir que:</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Para se determinar, reconstituir e fixar o verdadeiro conteúdo e alcance dum título executivo constituído por uma sentença, há que considerar também o contexto em que o mesmo se insere, não sendo, por isso, de excluir o recurso à própria fundamentação (motivação) da sentença;</font></i><br>
</p><p><i><font>e) A declaração de anulação de um contrato de compra e venda relativo às prestações realizadas, através de uma sentença, implica ao abrigo do art. 289 nº1 do C. Civil a restituição dos montantes dos preços que foram pagos aos compradores (aqui Recorrentes);</font></i><br>
</p><p><i><font>f) E incumbindo às partes outorgantes no contrato deveres recíprocos de restituição nos termos supra referidos, estão sujeitas ao princípio do cumprimento simultâneo nos termos do artigo 290.º, do C. Civil;</font></i><br>
</p><p><i><font>XLIX. Assim, deve o Acórdão proferido ser revogado nesta parte, conforme V/Exas., Venerandos Conselheiros, certamente decidirão, só assim se fazendo inteira Justiça Material!</font></i><br>
</p><p><i><font>L. Sem prescindir, o que não se concebe, quanto ao ponto que questiona se o crédito dos Exequentes constituí dívida de valor, devendo o valor nominal da quantia a restituir ser atualizado.</font></i><br>
</p><p><i><font>LI. Sempre se dirá que assente, assim e portanto, que a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância no âmbito do processo n.º 4080/16.... constitui titulo executivo, impõe-se a inelutável conclusão de que à mesma deve ser atribuído o sentido de condenar os Recorridos a pagarem ao Recorrente a atualizada quantia de €57.017,64 (cinquenta e sete mil e dezassete euros e sessenta e quatro cêntimos).</font></i><br>
</p><p><i><font>LII.E isto porque, hoje mais do que nunca, a valorização monetária é um facto notório que não tem de ser alegado, nem provado, pelo aqui Recorrente, sendo também de salientar, a este propósito, que como estatui o artigo 9.º, do Código Civil, quando à interpretação da Lei, esta não deve cingir-se à letra da mesma, ou seja, a simples interpretação literal da Lei não constitui qualquer interpretação válida, pois não toma em consideração os elementos sistemático, lógico e teleológico, sendo este último a verdadeira justificação social da lei.</font></i><br>
</p><p><i><font>LIII. Ora, no caso presente, pese embora o Acórdão recorrido não fazer qualquer menção a esta questão, por entender que com a procedência do recurso interposto pelos Recorridos, a mesma fica prejudicada,</font></i><br>
</p><p><i><font>LIV. Contrariamente ao decidido na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, o crédito dos Exequentes constituí uma dívida de valor e, como tal, sujeita às competentes atualizações.</font></i><br>
</p><p><i><font>LV. Basta, para tanto, ter na devida consideração o decidido em sede de Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado 12 de Junho de 2012, 521-A/1999.L1.S1, que indica:</font></i><br>
</p><p><i><font>«Embora nos pudéssemos cingir a remeter para a decisão que aqui se acolhe, sem outros considerandos, ex vi do art. 713.º, n.º 5, do CPC, aplicável à revista nos termos do art. 726.º, consideramos que a problemática em apreço merece maiores reflexões, dado, inclusive, o pouco tratamento que tal questão tem merecido, designadamente em termos jurisprudenciais, e que respeita a saber se a obrigação de restituição, proveniente da resolução do contrato de compra e venda (à semelhança do que ocorre quando o contrato é nulo ou anulado), quando não seja possível a reposição em espécie, deve ser considerada uma mera obrigação pecuniária ou antes como uma típica dívida de valor.</font></i><br>
</p><p><i><font>O legislador optou por equiparar a resolução do contrato, quanto aos seus efeitos, ao regime das invalidades (tanto da declaração de nulidade como da anulação), por via do art. 433.º do CC, não a submetendo a qualquer regime específico.</font></i><br>
</p><p><i><font>Essa equiparação significa que a resolução destrói o vínculo contratual ex tunc, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado, nos termos do art. 289.º, n.º 1, do CC: melhor, os efeitos da resolução são a restituição de tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição não for possível, o valor correspondente.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ou seja, dissolvido o contrato, cada uma das partes terá de restituir à contraparte tudo o que indevidamente mantiver em consequência da cessação do vínculo contratual.</font></i><br>
</p><p><i><font>Adverte Pedro Romano Martinez, “a resolução não dá origem a um novo contrato, pelo qual se pretende dissolver o anterior, mas cria uma relação legal que obriga as partes a devolverem o que receberam; trata-se, pois, de uma obrigação ex lege de reposição do status quo ante”.</font></i><br>
</p><p><i><font>O princípio geral aqui aplicável aponta para a obrigação de restituir in natura, consagrado no art. 562.º do CC, mas não sendo possível essa restituição natural, deve a parte entregar o valor correspondente, de harmonia com a regra constante do art. 289.º, n.º 1, in fine, do CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>Brandão Proença salienta, de forma impressiva, que “esta «restauração», envolvendo, em princípio, uma restituição natural das coisas prestadas (ou per tantundem se se tratar de coisas genéricas), pode ter que traduzir-se numa mera restituição do valor correspondente (ou do equivalente) em caso de impossibilidade material essencial (a coisa recebida pelo contraente que suporta a resolução, pode ter sido consumida, perdida, destruída, deteriorada, confundida, ou ter desaparecido culposa ou «não culposamente») ou jurídica (pela existência de direitos de terceiros nos termos do art. 435.º do CC), ocorrida anteriormente à «declaração» resolutiva ou quando essa restituição seja «exigida» pela natureza da prestação em causa (prestações de facto que se esgotaram numa prestação de serviços, na execução de certo trabalho ou na concessão da utilização de certa coisa ou do gozo de certo local)”.</font></i><br>
</p><p><i><font>No caso em debate não está controvertido o entendimento atrás enunciado, nem a obrigação de restituição, mas sim o que entender pelo “valor correspondente” afirmado no art. 289.º, n.º 1, do CC (normativo para o qual remete o art. 433.º relativo à resolução contratual).</font></i><br>
</p><p><i><font>A pergunta que se impõe será, então: devemos procurar o valor (sucedâneo) que o bem tinha à data do negócio ou o valor que esse bem tem no momento em que se tem que proceder à devolução/restituição?</font></i><br>
</p><p><i><font>Considerando que “a restituição em espécie, após a declaração de nulidade ou a decretação da anulação do negócio, não é possível em muitos casos: pode a coisa ter sido consumida ou ter desaparecido, e pode ter-se constituído sobre ela um direito de terceiro, que deva ser respeitado nos termos do artigo 291.º”, Pires de Lima e Antunes Varela avançam, sem hesitações, que “nestes casos haverá lugar à restituição em valor. Como a restituição abrange tudo o que tiver sido prestado (quer se trate de declaração de nulidade, quer da decretação da anulação), não há que atender às regras do enriquecimento sem causa”.</font></i><br>
</p><p><i><font>Explicando o âmbito da restituição, a que alude o art. 289.º, Carlos Mota Pinto, afirma que, “em consonância com a retroactividade haverá lugar à repristinação das coisas no estado anterior ao negócio, restituindo-se tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente (artigo 289.º, n.º 1). Tal restituição deverá ter lugar, mesmo que se não verifiquem os requisitos do enriquecimento sem causa, isto é, cada uma das partes é obrigada a restituir tudo o que recebeu e não apenas com que se locupletou, ao contrário do Código Civil Alemão”.</font></i><br>
</p><p><i><font>Continuando as suas reflexões, este autor entra, então, naquilo que verdadeiramente nos interessa indagar aqui: a natureza da obrigação de restituição e a sua compatibilização com o regime das dívidas de valor.</font></i><br>
</p><p><i><font>Escreve Paulo Mota Pinto, a este propósito, que “embora com vozes discordantes e nem sempre acompanhada pela jurisprudência, a qualificação como dívidas de valor das obrigações de restituição, cujo objecto não consiste directamente numa importância ou soma monetária mas antes numa prestação diversa, tem sido sustentada entre nós (…)» (sublinhado e negritonosso).</font></i><br>
</p><p><i><font>LVI. Aqui chegados é tempo de concluir, como o faz a melhor doutrina, que a obrigação de restituição fundada na resolução, por via da aplicação remissiva do art. 289.º, n.º 1, ex vi do art. 433.º, ambos do CC, é uma verdadeira dívida de valor, neste sentido se pronunciando, abertamente, os seguintes autores:</font></i><br>
</p><p><i><font>LVII. Para Vaz Serra (embora recorrendo à analogia com o enriquecimento sem causa): “uma vez admitido que a obrigação de restituição do valor das prestações efectuadas em cumprimento de um contrato anulável (ou depois de anulado), por ser impossível a restituição em espécie (Cód. Civil, arts. 289.º, n.º 1, 479.º, n.º 1), é uma dívida de valor, segue-se que «o risco de uma depreciação da moeda não afecta o credor ou só o afecta em pequena medida», como é próprio das dívidas de valor. Nesse caso, a dívida, expressa em dinheiro, pode ser actualizada, de maneira a atribuir ao credor o mesmo poder aquisitivo que a prestação tinha no momento em que a obrigação se constituiu (Cód. Civil, art. 551.º)”.</font></i><br>
</p><p><i><font>LVIII. Com maior rigor e desenvolvimento, Brandão Proença, tece os seguintes comentários:</font></i><br>
</p><p><i><font>“apesar de a obrigação de restituição do valor, em consequência de resolução, não estar sujeita aos princípios correctores do enriquecimento sem causa, cremos poder falar aqui também de «dívidas de valor», cujo respectivo cálculo deverá ser feito no momento em que a contraparte (depois de lhe haver sido declarada a resolução) declara a sua impossibilidade de restituir o recebido ou na data da propositura da acção de resolução. Esta posição não desvirtua (pelo menos numa visão global do facto resolutivo) a exigência de uma certa paridade na «liquidação», na medida em que a atribuição ao titular do direito de um quantitativo monetário que lhe permita (desde que se trate de uma coisa fungível) adquirir o mesmo objecto (e que, v.g., a contraparte alienou onerosamente a um terceiro devidamente protegido) tem a sua «justificação» no sentido reintegrador da resolução”.</font></i><br>
</p><p><i><font>LIX. Mais recentemente, Maria Clara Sottomayor redigiu: “a obrigação de restituição representa o lado subjectivo do regime da nulidade, e visa, por isso, repor as partes no status quo ante, ou seja, restituir-lhes o equilíbrio económico vigente antes de o contrato ser executado. Este aspecto do regime da nulidade tem por objectivo não só reintegrar a ordem jurídica violada pelo negócio jurídico nulo, destruindo a aparência criada por este, mas também eliminar as suas consequências económicas. A obrigação de restituição assume, assim, uma finalidade semelhante à responsabilidade civil, podendo, portanto, ser caracterizada, tal como a obrigação de indemnização, como uma dívida de valor”</font></i><br>
</p><p><i><font>LX. Isto tudo a revelar que sendo, como clara e indubitavelmente supra se provou, o crédito dos Exequentes uma verdadeira dívida de valor e, como tal, sujeita à competente atualização monetária,</font></i><br>
</p><p><i><font>LXI. Atualização essa que terá de ser feita de harmonia com o valor atual, ou seja, €53.744,92 (cinquenta e três mil setecentos e quarenta e quatro euros e noventa e dois cêntimos) acrescida dos competentes juros.</font></i><br>
</p><p><i><font>LXII. Assim, e por tudo o supra explanado, e sem necessidade de mais amplas considerações, devem V/Exas., Venerandos Desembargadores, revogar o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, e, nessa sequência, proferir decisão no sentido de considerar a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância no âmbito do Processo n.º 4080/16.... como verdadeiro título executivo,</font></i><br>
</p><p><i><font>LXIII. Bem como qualifique o crédito dos Exequentes como dívida de valor e, assim, reconheça e valide o pedido apresentado por estes últimos no requerimento executivo, sendo os Executados condenados a pagar o montante total de € 57.017,64 (cinquenta e sete mil e dezassete euros e sessenta e quatro cêntimos).</font></i><br>
</p><p><i><font>LXIV. Pois só assim se fará inteira Justiça Material! </font></i><br>
</p><p><i><font>Termos em que e nos melhores de Direito deverão V/Exas, Venerandos Conselheiros, proferir decisão que nessa conformidade:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Julgue o presente recurso procedente e revogue o Acórdão recorrido, e, nessa sequência, proferir decisão no sentido de considerar a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância no âmbito do Processo n.º 4080/16.... como verdadeiro título executivo;</font></i><br>
</p><p><i><font>Sem prescindir,</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Julgue o presente recurso procedente e revogue o Despacho recorrido, e, subsequentemente, proferir decisão que qualifique o crédito dos Exequentes como dívida de valor e, assim, reconheça e valide o pedido apresentado por estes últimos no requerimento executiv | [0 0 0 ... 0 0 0] |
9DJzu4YBgYBz1XKvwAqX | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div></div><br>
<font>Processo nº 4435/17.1T8BRG.G1.S1</font><div><font>***</font></div><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<b><font>1</font></b><font>-AA instaurou contra Liberty Seguros, S.A., BB e CC, ação declarativa com processo comum, pedindo que os réus sejam condenados: </font><br>
<font>a- a pagarem-lhe a quantia de 122 334,52€, acrescida dos juros que sobre este montante recaírem, à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação até efetivo e integral pagamento,</font><br>
<font>b- A ministrar no futuro, todo o tipo de tratamentos, internamentos, acompanhamento médico e medicamentoso, suportando ainda os custos e encargos com intervenções cirúrgicas, internamentos, tratamentos, fisioterapia e psiquiatria. </font><br>
<font>Alegou para tanto e em síntese, que no dia 25/09/2014, pelas 13:45 horas, na Rua da ..., freguesia de ..., concelho de ..., o veiculo ligeiro de passageiros, marca ..., modelo ..., matricula -EQ, propriedade do demandado BB e conduzido pelo demandado CC, que circulava por essa estrada, sem que nada o fizesse prever, invadiu a metade da faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário ao seu e aí foi colher o autor, provocando-lhe diversas lesões corporais que, além do mais, lhe determinaram uma incapacidade geral nunca inferior a 22%. Pretende ser indemnizado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu em consequência deste acidente, que imputa à atuação culposa do condutor do veículo automóvel, sendo que para a companhia de seguros demandada se mostrava transferida a responsabilidade civil por danos causados com a circulação do referido veículo. Subsidiariamente invoca a responsabilidade pelo risco.</font><div><font>*</font></div><b><font>2</font></b><font>- Os 2º e 3º réus apresentaram contestações, onde, entre o mais, excecionaram a respetiva ilegitimidade processual.</font><div><font>*</font></div><b><font>3</font></b><font>- A ré seguradora impugnou a dinâmica do acidente alegada na P.I., apresentando a sua versão da ocorrência. Impugnou os danos, mormente a IPP, que, a existir, alega não será superior à fixada pela junta médica do processo de acidente de trabalho (6,88%). Alegou que pelo dano patrimonial decorrente da incapacidade de ganho o autor já foi indemnizado em sede de acidente de trabalho e que o pedido formulado a título de danos patrimoniais futuros carece de substrato fáctico. Impugna ainda os valores indemnizatórios pedidos pelo autor, que reputa de exagerados.</font><div><font>*</font></div><b><font>4</font></b><font>- Realizou-se a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador em que se apreciaram as invocadas exceções, reconhecendo-se que os 2º e 3º demandados careciam de legitimidade processual e, por isso, foram absolvidos da instância. Identificou-se o objetivo do litígio e enunciaram-se os temas da prova.</font><br>
<font>Realizou-se a audiência de julgamento.</font><br>
<font>Proferiu-se sentença em que se decidiu julgar a ação totalmente improcedente.</font><div><font>*</font></div><b><font>5</font></b><font>- Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, vindo a ser proferido acórdão pelo Tribunal da relação de Guimarães com o seguinte dispositivo:</font><br>
<font>“Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogando a sentença recorrida, julgam a ação parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia de €25.934,52 (vinte e cinco mil, novecentos e trinta e quatro euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescida dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal para as obrigações civis, contados da data da sentença (7.3.2019)”.</font><div><font>*</font></div><b><font>6</font></b><font>- </font><b><font>Inconformado recorreu a ré LIBERTY SEGUROS, COMPANIA DE SEGUROS Y REASEGUROS, S.A. -SUCURSAL EM PORTUGAL, recurso de revista</font></b><font>, instruído com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões:</font><br>
<font> </font><i><font>1. O local era em reta e aí só circulava a viatura EQ no sentido ...-..., encontrando-se outra (com atrelado-compressor) estacionada do lado esquerdo considerado o mesmo sentido.</font></i><br>
<i><font>2. Tratando-se de via relativamente estreita (4,50 metros de largura) e não existindo qualquer trânsito, o condutor do EQ ocupava menos de um palmo da via contrária.</font></i><br>
<i><font>3. Quando o condutor do EQ já se encontrava praticamente a par do dito veículo estacionado, surgiu então o autor a sair da traseira desse veículo e a ingressar na via, sem atender ao trânsito que se processava do seu lado direito, isto é, na metade da via por onde circulava o EQ.</font></i><br>
<i><font>4. O autor deslocou-se para a frente do EQ no preciso momento em que este já se encontrava praticamente a par do veículo estacionado.</font></i><br>
<i><font>5. O autor não era visível ao condutor do EQ.</font></i><br>
<i><font>6. Destes factos provados só se pode concluir que o autor, aqui recorrido, seguia sem atenção nem cuidado, pois não atendeu ao trânsito que se processava do seu lado direito.</font></i><br>
<i><font>7. Por isso, não só não se apercebeu da presença do veículo EQ, ao lado do veículo estacionado de cuja traseira saiu o autor, que não era visível ao condutor do EQ, como se precipitou para a frente deste.</font></i><br>
<i><font>8. O autor não esboçou sequer qualquer tentativa para evitar o embate.</font></i><br>
<i><font>9. Nenhum facto se provou do qual se pudesse extrair qualquer comportamento transgressivo ou culposo do condutor do EQ, seguro na recorrente, pois não teve qualquer hipótese de evitar o acidente, pois não via o autor, que lhe surgiu de trás do veículo estacionado quanto o condutor do EQ já se encontrava praticamente a ar desse veículo.</font></i><br>
<i><font>10. Assim, a culpa pela produção do acidente pertenceu ao autor, pelo que se impõe a alteração do acórdão recorrido, decidindo-se a ação improcedente e absolvendo a recorrente dos pedidos.</font></i><br>
<i><font>11. A sentença recorrida não respeitou o estatuído nos art°s. 483, 505 e 570, todos do Código Civil e nos preceitos estradais.</font></i><br>
<i><font>Deve o presente recurso ser procedente e o acórdão recorrido revogado e substituído por outro que julgue a ação não provada e improcedente e absolva a recorrente dos pedidos</font></i><font>.</font><br>
<b><font>7</font></b><font>- </font><b><font>O autor AA apresenta contra-alegações</font></b><font> onde conclui:</font><br>
<i><font>A) – O condutor do veículo segurado na R. violou o disposto no artigo 13 do Código da Estrada, pois, como ficou provado, circulava ocupando parcialmente a metade esquerda da via atento o seu sentido de marcha.</font></i><br>
<i><font>B) – O condutor do EQ praticou a contraordenação prevista no artigo 13, n.º 4 do Código da Estrada, o que, constitui presunção judicial de culpa.</font></i><br>
<i><font>C)–A contraordenação do condutor foi causal do acidente, pois, se o EQ circulasse à direita, em obediência ao disposto no citado art.º 13 do CE, o acidente não teria ocorrido.</font></i><br>
<i><font>D) – A culpa do A. revela reduzida gravidade, pois o mesmo, em princípio, só contava com os veículos que por circulassem na hemifaixa onde se encontrava, isto é, provenientes do seu lado esquerdo e desse lado efetivamente não havia trânsito.</font></i><br>
<i><font>E) – Não merece reparo a repartição de culpas operada pelo Tribunal a quo ao brigo do disposto no artigo 570 do Código Civil.</font></i><br>
<i><font>F) – A R. discorre quanto à eventual culpa dos intervenientes no acidente sem fazer lusão à violação das normas do Código da Estrada.</font></i><br>
<i><font>G) – Não existia qualquer justificação para que o condutor do EQ circulasse na hemifaixa contrária.</font></i><br>
<i><font>H) – A via permitia perfeitamente que os veículos circulassem dentro das respetivas faixas de rodagem conservando da berma uma distância de segurança suficiente.</font></i><br>
<i><font>I) – O facto de não existir trânsito de veículos em sentido contrário não pode justificar a ocupação de parte da hemifiaxa contrária.</font></i><br>
<i><font>J) – A norma constante do artigo 13 do Código da Estrada não visa apenas acautelar o trânsito de veículos.</font></i><br>
<i><font>K) –O A deslocou-se para a frente do EQ, mas a frente do EQ, no local onde se deu o embate, não estava na faixa de rodagem em que devia seguir.</font></i><br>
<i><font>L) – O condutor do EQ teve hipótese de evitar o acidente, bastando para tal circular pelo lado direito da faixa de rodagem.</font></i><br>
<i><font>DEVE assim o douto acórdão recorrido ser mantido</font></i><font>.</font><div><font>*</font></div><font>O recurso foi admitido.</font><br>
<font>Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.</font><div><font>*</font></div><b><font>Nas Instâncias foram julgados como provados</font></b><font> os seguintes factos:</font><br>
<font>«1. No dia 25/09/2014, pelas 13h45m, na Rua da ..., freguesia de ..., concelho de ..., ocorreu um sinistro no qual foi interveniente o veículo ligeiro de passageiros, marca ..., modelo ..., matrícula -EQ, propriedade de BB e conduzido por CC; e o autor, apeado.</font><br>
<font>2. O local do sinistro configura uma recta, com cerca de 600 metros, tendo a faixa de rodagem uma largura de 4,50 metros.</font><br>
<font>3. Estava sol.</font><br>
<font>4. O autor, ... de profissão, dirigiu-se para um veículo automóvel da sua entidade empregadora para recolher material.</font><br>
<font>5. E foi embatido pela viatura -EQ, que seguia no sentido ...-...,</font><br>
<font>6. A colisão ocorreu a 15 cm do eixo da via, na hemifaixa destinada à circulação automóvel no sentido contrário, ou seja, ...-....</font><br>
<font>7. No momento não circulava qualquer viatura no sentido inverso, ...-....</font><br>
<font>8. A colisão deu-se na frente do EQ, tendo o autor sido projectado contra o vidro frontal, partindo o espelho esquerdo, tudo do lado do condutor do EQ.</font><br>
<font>9. Após a colisão, o veículo EQ imobilizou-se, contra um muro, deixando uma travagem com cerca de 15,10 metros à frente do local do embate.</font><br>
<font>10. O condutor do EQ travou após a colisão.</font><br>
<font>11. Por contrato de seguro titulado pela apólice ..., estava transferida para a ré Liberty a responsabilidade pelos danos causados pelo veículo EQ.</font><br>
<font>12. O autor sofreu fractura da vertente proximal da diáfise da tíbia e do perónio, na perna direita, feridas abrasivas na pele da perna direita e dor no cotovelo direito.</font><br>
<font>13. Foi transportado de ambulância para o Hospital de Braga.</font><br>
<font>14. Imobilizada a fractura, foi transferido para o Hospital de ....</font><br>
<font>15. Em 01/10/2014, o autor foi submetido a intervenção cirúrgica no Hospital de ... para encavilhamento endomedular da tíbia e osteossíntese do perónio.</font><br>
<font>16. Tendo tido alta médica em 06/10/2014.</font><br>
<font>17. Foi tratado e acompanhado pelos serviços clínicos da Ageas Portugal – Companhia de Seguros, S.A., a quem estava transferida a responsabilidade pelos danos emergentes de acidente de trabalho.</font><br>
<font>18. Fez fisioterapia e foi seguido em centro de enfermagem, sob a supervisão do Dr. DD.</font><br>
<font>19. Submeteu-se a consultas médicas e tratamentos.</font><br>
<font>20. Em 7/10/2015 foi internado no Hospital Privado de Braga, para retirar o material de osteossíntese.</font><br>
<font>21. O autor apresenta as seguintes sequelas, no membro inferior direito, relacionáveis com o acidente: cicatriz do tipo cirúrgico localizada na face anterior do joelho medindo 15 cm; quatro cicatrizes de tipo cirúrgico localizadas no terço distal da perna e tornozelo, a maior das quais medindo 3 cm; cicatriz distrófica medindo 13x7cm, facilmente ulcerável, localizada na face póstero-lateral externa do terço médio/terço superior da perna; amiotrofia da coxa de 1cm (48x47cm); sem alterações da flexão ou extensão do joelho, embora com queixas de gonalgia; instabilidade do joelho, o que não acontece no contralateral; e muito discreta rigidez do pé na dorsiflexão.</font><br>
<font>22. Durante o período de tratamentos, o autor foi sujeito a exames e foi-lhe ministrada medicação para as dores.</font><br>
<font>23. Continua a sentir dores na perna e tornozelo direitos.</font><br>
<font>24. Em 04/12/2015 ocorreu a consolidação médico-legal das lesões sofridas no acidente.</font><br>
<font>25. O autor teve um deficit funcional temporário total (período durante o qual viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se a repercussão na actividade profissional) de 17 dias.</font><br>
<font>26. Teve um deficit funcional temporário parcial (período que passou a consentir algum grau de autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se a repercussão na actividade profissional, ainda que com limitações) de 418 dias.</font><br>
<font>27. Teve um período de repercussão temporária na actividade profissional total (período durante o qual viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade profissional habitual) de 435 dias.</font><br>
<font>28. Sofreu um quantum doloris (valorização do sofrimento físico e psíquico vivenciado entre a data do evento e a data da consolidação das lesões) fixável no grau 4, numa escala de 7.</font><br>
<font>29. À data do acidente, o autor exercia as funções de ....</font><br>
<font>30. A retribuição mensal do autor, incluindo vencimento base, diuturnidades e outros complementos, ascendia a uma retribuição anual ilíquida de 9 767,30€.</font><br>
<font>31. As sequelas descritas em 21 são compatíveis com o exercício da actividade de ... mas implicam esforços suplementares.</font><br>
<font>32. O autor não executa com a mesma destreza e produtividade as suas funções de ..., devido às dores que sente no tornozelo, nomeadamente quando precisa de se agachar ou suportar peso com a perna direita.</font><br>
<font>33. Carecendo do apoio dos colegas de trabalho para a realização de algumas tarefas, o que o entristece.</font><br>
<font>34. O autor não consegue andar muito tempo a pé, pois em consequência das lesões sofridas, o seu pé direito incha, aumentando as dores sentidas.</font><br>
<font>35. Dores que se agravam com as mudanças de tempo.</font><br>
<font>36. O autor padece de um deficit funcional permanente (afectação definitiva da integridade física e/ou psíquica, com repercussão nas actividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, independente das actividades profissionais) de 6 pontos.</font><br>
<font>37. Na data do acidente, o autor tinha 33 anos de idade e três filhos menores.</font><br>
<font>38. O sinistro descrito foi também caracterizado como acidente de trabalho.</font><br>
<font>39. Neste sentido, correu termos na 2ª Sec. Trabalho – J1, da Instância Central de ..., com o n.º 2055/15.0T8BCL, o respectivo processo especial de acidente de trabalho.</font><br>
<font>40. No âmbito do qual foi atribuída ao autor uma pensão anual e vitalícia de 470,39€, correspondente ao capital de remição de 7 665,48€, que o mesmo recebeu da Companhia de Seguros Ageas Portugal, S.A. e da sua entidade patronal.</font><br>
<font>41. As cicatrizes que o autor apresenta desfeiam o autor.</font><br>
<font>42. O dano estético permanente de que padece é fixável num grau 4, numa escala de 7.</font><br>
<font>43. O autor teve a perna engessada.</font><br>
<font>44. As intervenções cirúrgicas a que se submeteu causaram-lhe dor no período de convalescença e condicionaram a sua liberdade de movimentos.</font><br>
<font>45. O autor gostava de jogar futebol e de andar de bicicleta, actividades que deixou de praticar;</font><br>
<font>46. O que lhe causa tristeza.</font><br>
<font>47. O autor deixou de realizar tarefas na horta.</font><br>
<font>48. (redação dada pela Relação) -O autor ingressou na Rua da ... sem atender ao trânsito que na via se processava do seu lado direito.</font><br>
<font>49. O EQ seguia (parcialmente) pela metade direita da rua, atendo o sentido ...-....</font><br>
<font>50. (redação dada pela Relação) -Ao chegar perto do número de polícia 2229 surgiu o autor, saindo por trás de um veículo com atrelado (compressor) que se encontrava estacionado no lado esquerdo da referida rua, atento o sentido do EQ.</font><br>
<font>51. Não sendo visível ao condutor do EQ.</font><br>
<font>52. (redação dada pela Relação) -Deslocando-se da esquerda para a direita, atento o sentido do EQ, e à frente deste; </font><br>
<font>53. E quando o condutor do EQ já se encontrava praticamente a par do dito veículo.</font><br>
<font>54. Após a colisão com o autor, o condutor do EQ travou e desviou-se para a direita.</font><br>
<font>55. Foi na sequência desse desvio que o EQ embateu e raspou no muro situado à direita da Rua da ..., atento o sentido ...-....</font><br>
<font>56. Antes do embate o autor percorreu na via de trânsito a distância de 2,10 metros.»</font><br>
<b><font>Factos julgados não provados</font></b><font>:</font><br>
<font>i) Aquando do facto referido em 4 o autor previamente acautelou a inexistência de trânsito.</font><br>
<font>ii) A projeção do autor, em consequência da colisão, foi de cerca de 5 metros.</font><br>
<font>iii) O condutor do EQ imprimia ao veículo uma velocidade superior a 60/70Km/h.</font><br>
<font>iv) O autor sofreu escoriações e hematomas no tórax.</font><br>
<font>v) A fisioterapia referida em 18 foi realizada também na Clínica ......, sob supervisão do Dr. EE.</font><br>
<font>vi) Mercê das limitações de que padece a entidade patronal do autor passou a incumbi-lo de tarefas menores.</font><br>
<font>vii) O autor tem muitas vezes dificuldade em dormir por causa das dores.</font><br>
<font>viii) Não descansando o suficiente, o que afecta o seu rendimento profissional.</font><br>
<font>ix) O autor tornou-se uma pessoa triste, nervosa e tensa, o que lhe causa dificuldade no relacionamento com os colegas de trabalho e demais pessoas </font><br>
<font>x) O autor tinha uma passadeira em casa que deixou de conseguir usar depois do acidente.</font><br>
<font>xi) Quando o autor ingressou na estrada o veículo EQ encontrava-se a não mais de 1/2 metros dele.</font><br>
<font>xii) O EQ seguia a velocidade não superior a 30/40 km/h.</font><br>
<font>xiii) O autor deslocou-se em corrida.</font><div><font>*</font></div><b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C. </font><br>
<b><font>No caso em análise questiona-se</font></b><font>: A culpa ou concorrência de culpas dos intervenientes no acidente.</font><br>
<font>A recorrente Companhia de Seguros entende que o seu segurado não teve culpa na ocorrência do acidente porque a via onde ocorreu era estreita (4,50 metros de largura) motivo pelo qual ocupava menos de um palmo da via contrária e porque não existia qualquer trânsito.</font><br>
<font>O acidente ocorreu quando o condutor do EQ já se encontrava praticamente a par de um veículo (com atrelado - compressor) estacionado do lado esquerdo considerando o mesmo sentido.</font><br>
<font>O autor não era visível ao condutor do EQ.</font><br>
<font>O recorrido autor entende que deve ser mantido o acórdão porque o segurado da ré circulava ocupando parcialmente a metade esquerda da via atento o seu sentido de marcha, em contravenção a norma estradal, circunstância com que o autor não contava ao atravessar a estrada, porque a via permitia perfeitamente que os veículos circulassem dentro das respetivas faixas de rodagem conservando da berma uma distância de segurança suficiente.</font><br>
<font>Por seu lado, considerou o acórdão recorrido:</font><br>
<i><font>“Dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual</font></i><br>
<i><font>Estabelece o art. 483 do CC que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.</font></i><br>
<i><font>As normas do Código da Estrada destinam-se a proteger interesses alheios, mormente os dos seus utentes.</font></i><br>
<i><font>No art. 13 do Código da Estrada (doravante CE) determina-se que o trânsito de veículos se deve fazer pelo lado direito da faixa de rodagem, conservando das bermas ou passeios uma distância suficiente que permita evitar acidentes.</font></i><br>
<i><font>No caso em apreço estamos perante uma via estreita, com 4,5 metros de largura. Apesar de estreita permitia o trânsito de veículos nos dois sentidos e o cruzamento sem necessidade de imobilização. Aliás não foi alegado que o veículo em questão necessitasse, para circular, de ocupar mais de metade da via. </font></i><br>
<i><font>Ora o veículo EQ circulava ocupando parcialmente a metade esquerda da via atento o seu sentido de marcha, </font></i><br>
<i><font>Consequentemente, o respetivo condutor incumpriu o disposto no citado art. 13 do CE, praticando uma contraordenação prevista e punida pelo seu nº 4.</font></i><br>
<i><font>A jurisprudência dos nossos Tribunais há muito que entende que “a violação de uma norma legal de trânsito constitui presunção judicial (art.º 351.º do C.C.) de culpa do condutor que a viola, desde que a norma violada se destine a proteger o interesse ofendido, podendo o condutor infrator ilidir a presunção” (acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 31.3.2016, relatado por Fernando Fernandes Freitas no processo 252/12.3TBMNC.G1, publicado em dgsi.pt.</font></i><br>
<i><font>Na sentença recorrida entendeu-se que esta contraordenação não foi causal do acidente e que este era apenas imputável à conduta contraordenacional e culposa do autor porque violadora do disposto no art.º 99 do CE (trânsito de peões).</font></i><br>
<i><font>Ora, independentemente de conduta culposa do lesado poder “concorrer” com a culpa do condutor do EQ, entendemos nós que a contraordenação do condutor foi causal do acidente, pois, se o EQ circulasse à direita, em obediência ao disposto no citado art. 13 do CE, o acidente não teria ocorrido.</font></i><br>
<i><font>Como a contraordenação não foi indiferente ao resultado (atropelamento), pois não se pode afirmar que o mesmo sempre teria ocorrido mesmo que não tivesse sido praticada, não se pode excluir a culpa do condutor do EQ na produção do acidente e, consequentemente, o dever da ré indemnizar o autor pelos danos que este sofreu em consequência do acidente de viação.</font></i><br>
<i><font>Contudo o autor também foi imprudente. Não cremos que tenha praticado a contraordenação prevista no art. 99 do CE, que se destina ao trânsito de peões. No caso o autor encontrava-se na via, não para transitar por ela no sentido prefigurado em tal norma, mas para aceder a um veículo onde ia recolher material (facto nº 4). </font></i><br>
<i><font>Tal circunstancialismo enquadra-se, a nosso ver, nas cargas e descargas (art. 56) caso em que a própria lei impõe que se efetuem ou pela traseira ou pelo lado esquerdo.</font></i><br>
<i><font>Contudo, o percurso pela faixa de rodagem com vista a tal descarga de material (ferramenta), não dispensa o cuidado e atenção de quem o faz, como a qualquer peão. E o autor foi imprevidente, pois deveria ter parado junto à traseira da carrinha e verificado se circulava algum veículo do seu lado direito, antes de prosseguir a marcha. </font></i><br>
<i><font>O art. 487, n.º 2, do CC estabelece que a culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso. Consagra assim um critério da culpa em abstrato, reportado à diligência de um homem normal, medianamente sagaz, prudente e cuidadoso, em face do condicionalismo próprio do caso concreto. </font></i><br>
<i><font>No presente caso o autor, ao ter entrado na via e prosseguido a marcha, sem atentar nos veículos que circulavam à sua direita (provenientes do seu lado direito), violou os deveres gerais de prudência, isto é, não atuou com a diligência de um “bonus pater famíliae” –art. 487 do CC.</font></i><br>
<i><font>O seu grau de culpa não é grave, considerando precisamente o homem médio, porque, na hemifaixa onde se encontrava, em princípio só contava com os veículos que por ela circulassem, isto é, provenientes do seu lado esquerdo e desse lado efetivamente não havia trânsito. Contudo não estava dispensado de verificar se do seu lado direito algum veículo se aproximava.</font></i><br>
<i><font>Por outro lado o condutor do EQ, apesar de ter infringido o disposto no art. 13 do CE, circulava por uma via bastante estreita e só pôde avistar o autor imediatamente antes do embate, o que também é de ponderar.</font></i><br>
<i><font>Estabelece o art. 570 do CC que: “Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída”.</font></i><br>
<i><font>Ora, no caso em apreço, tudo ponderado, entendemos que a indemnização que vier a ser concedida deve ser reduzida em 20%, assim repartindo as culpas de ambas as partes, em 80% para o condutor e 20% para o autor.</font></i><br>
<i><font>A ré é responsável pela satisfação da indemnização que venha a ser atribuída ao autor, nos termos do contrato de seguro que celebrou com o proprietário do veículo EQ</font></i><font>”.</font><br>
<b><font>Vejamos</font></b><font>:</font><br>
<font>O recurso encontra-se circunscrito à matéria da culpa dos intervenientes na ocorrência do acidente. Entende a recorrente que o Tribunal recorrido “não decidiu bem quanto à culpa pelo acidente, pois os factos dados como provados evidenciam a culpa exclusiva do autor”.</font><br>
<font>Como vem sendo entendimento deste Supremo Tribunal, estando excluído do âmbito do recurso de revista a apreciação da decisão de facto, o controlo que o STJ pode fazer sobre o juízo das instâncias relativamente à culpa em acidente de viação limita-se a verificar se foi observado o critério definido pelo nº 2 do artigo 487 do CC. Apurar se o agente atuou com o grau de diligência que seria exigível, e que a lei fixa fazendo apelo àquela que teria uma pessoa medianamente diligente e cuidadosa, colocada nas circunstâncias concretas do caso, assim adotando um conceito objetivado de culpa -Cfr. Acs. do STJ de 14-10 2010, proc. nº 845/06.8TBVCD.Pl.Sl, e de 7-02- 2013, proc. nº 3557/07.1 TVLSB.L 1.S 1.</font><br>
<font>Mas a apreciação da culpa é questão de direito, no que diz respeito à inobservância de preceitos legais e regulamentares e entende-se que o critério legal de apreciação da culpa, quer no âmbito da responsabilidade extracontratual (art. 487, nº 2, do CC), quer no da responsabilidade contratual (art. 799, nº 2, do CC) se integra na competência do STJ como tribunal de revista – Cfr. Ac. do STJ de 04-07-2013, no proc. nº 2848/07.6TBVNG.P1.S1 - 1.ª Secção. </font><br>
<font>O STJ pode averiguar se dos factos provados se pode determinar que o concreto agente atuou com o grau de diligência que lhe era exigível para evitar o dano e que a lei fixa fazendo apelo àquela que (abstratamente) teria um homem médio, colocado nas circunstâncias concretas do caso. </font><br>
<font>No caso em análise, temos a matéria de facto constante dos pontos 1 a 10 e 48 a 56 que, no essencial referem:</font><br>
<font>- No dia 25/09/2014 ocorreu um sinistro no qual foi interveniente o veículo ligeiro de passageiros, matrícula -EQ e o autor, apeado.</font><br>
<font>- O local do sinistro configura uma reta, com cerca de 600 metros, tendo a faixa de rodagem uma largura de 4,50 metros.</font><br>
<font>- O autor foi embatido pela viatura -EQ, e a colisão ocorreu a 15 cm do eixo da via, na hemifaixa destinada à circulação automóvel no sentido contrário.</font><br>
<font>- No momento não circulava qualquer viatura no sentido inverso.</font><br>
<font>- A colisão deu-se na frente do EQ, tendo o autor sido projetado contra o vidro frontal, partindo o espelho esquerdo, tudo do lado do condutor do EQ.</font><br>
<font>- Após a colisão, o veículo EQ imobilizou-se, contra um muro, deixando uma travagem com cerca de 15,10 metros à frente do local do embate. O condutor do EQ travou após a colisão.</font><br>
<font>-O autor ingressou na Rua da ... sem atender ao trânsito que na via se processava do seu lado direito.</font><br>
<font>- O EQ seguia (parcialmente) pela metade direita da rua e no local do embate surgiu o autor, saindo por trás de um veículo com atrelado (compressor) que se encontrava estacionado no lado esquerdo da referida rua, atento o sentido do EQ, deslocando-se da esquerda para a direita, atento o sentido do EQ, e à frente deste, e quando o condutor do EQ já se encontrava praticamente a par do dito veículo.</font><br>
<font>- Não sendo visível ao condutor do EQ.</font><br>
<font>- Após a colisão com o autor, o condutor do EQ travou e desviou-se para a direita.</font><br>
<font>- Foi na sequência desse desvio que o EQ embateu e raspou no muro situado à direita da Rua da ..., atento o sentido ...-....</font><br>
<font>- Antes do embate o autor percorreu na via de trânsito a distância de 2,10 metros.</font><br>
<font>Desta matéria de facto apurada resulta que o condutor do veículo infringiu a regra estradal que proíbe (com exceção da necessidade de efetuar manobras) os condutores de invadirem a faixa de rodagem contrária, ainda que parcialmente (no caso em 15 cms), imposição do art. 13, nº 4 do CE.</font><br>
<font>Ao autor também se impunha o dever de cuidado de olhar e verificar da ocorrência de trânsito em toda a estrada (nos dois sentidos) e não apenas no sentido de onde, em primeiro lugar, podiam aparecer veículos.</font><br>
<font>Assim, só se pode concluir, como no acórdão recorrido, pela concorrência de culpas.</font><br>
<font>Ponderando a matéria de facto provada e o disposto no art. 487, nº 2 do CC, tem de concluir-se que o autor não agiu de acordo com o padrão de cuidado exigível (diligência de um bom pai de família, na terminologia legal, diligência exigível a um homem médio) e, quanto ao condutor do veículo segurado da ré, também contribuiu culposamente para os danos, por não ter cumprido as regras estradais e conduzir por modo a ocupar parcialmente a faixa de rodagem contrária.</font><br>
<font>Mas a responsabilidade, a culpa do condutor do segurado da ré é em grau muito superior à culpa do autor porque se não tem invadido a faixa de rodagem contrária (apesar de ser num espaço de apenas 15 cms), o acidente (embate) não teria ocorrido.</font><br>
<font>Assim sendo, concordando, mantem-se a proporção da culpa do condutor do segurado da ré e do autor, fixada no acórdão recorrido, “em 80% para o condutor e 20% para o autor”, como medida em que cada um contribuiu para a ocorrência do acidente. </font><br>
<font>Nada mais sendo questionado neste recurso, há que julgar o mesmo improcedente e negar a revista e manter o acórdão recorrido.</font><br>
<b><font>Decisão</font></b><font>:</font><br>
<font>Face ao exposto, acordam no Supremo Tribunal de Justiça e 1ª Secção em julgar o recurso improcedente e, consequentemente, nega-se a revista.</font><br>
<font>Custa pela recorrente.</font><br>
<br>
<font>Lisboa, 05-05-2020</font><br>
<br>
<font>Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator</font><br>
<br>
<font>Nos termos do art. 15-A, do Dl. nº 10-A/2020 de 13-03, aditado pelo art. 3 do Dl. nº 20/2020 atesto o voto de conformidade dos srs. Juízes Conselheiros adjuntos.</font><br>
<font>Maria Clara Sottomayor – Juíza Conselheira 1ª adjunta</font><br>
<font>António Alexandre Reis – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
9TFdu4YBgYBz1XKv0_t9 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>Soconsferma – Sociedade de Construções S.A., executada na execução instaurada pelo Condomínio do Prédio sito na Av. Arantes de Oliveira, n.º 21, Lisboa, veio </font><b><font>deduzir embargos</font></b><font>, invocando, em síntese, que a execução para prestação de facto não poderá ser convolada para execução para pagamento de quantia de certa; que nos termos do plano aprovado e homologado no PER da executada, o crédito da embargada constitui um crédito comum, pelo que, deverá receber o mesmo tratamento previsto para os restantes créditos comuns, sendo, por conseguinte, aplicável um perdão de 90%, sobre o capital em dívida e, bem assim, perdão total de juros moratórios e remuneratórios associados a tais dívidas; não poderá ser penhorado qualquer bem ou direito à embargante enquanto esta se encontrar a cumprir com o Plano de Recuperação; que inexiste título executivo para suportar o pedido formulado pelo exequente, pois a presente ação não ficou decidida apenas pela sentença dada à execução, mas igualmente, pelo despacho proferido pelo tribunal e que julgou extinto o pedido subsidiário formulado na ação declarativa; alega, ainda, que a perícia requerida na execução é desnecessária, porquanto, o valor eventualmente devido corresponderá a 10% do valor do pedido subsidiário formulado na ação declarativa pelo exequente.</font><br>
</p><p><font>Os embargos suscitavam, assim, duas questões essenciais, a primeira a de saber os efeitos do PER da executada sobre a execução, mormente no caso de convolação da execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa por via do incumprimento da prestação fungível em que a executada foi condenada (reparação dos defeitos elencados na sentença dada à execução), e a segunda questão a de saber que repercussão poderia ter na execução, face aos pedidos formulados pelo exequente, a decisão proferida na ação declarativa – extinção da instancia por inutilidade da lide – relativa ao pedido subsidiário de pagamento do valor de 250 mil euros necessário para reparação dos defeitos invocados pelo exequente, autor na mencionada ação.</font><br>
</p><p><font>Entretanto, por via da necessidade de tramitar a execução em conformidade com o que a lei dispõe para a execução especial para prestação de facto, foi proferido despacho na execução com o seguinte teor: </font><i><font>“Após o curso do prazo para a executada Soconsferma S.A., cumprir a prestação a que está condenada pela sentença exequenda, veio o exequente requerer a nomeação de perito para avaliar o custo da prestação, tendo em vista o prosseguimento da execução com a penhora de bens. A tal requerimento opôs-se a executada invocado, em síntese e no que importa, que a execução não pode ser convolada em execução para pagamento de quantia certa, porque atravessa um processo de revitalização em que foi homologado o plano de recuperação em 13.1.2016 e que prevê o perdão de 90% dos créditos comuns e perdão integral de juros; na acção declarativa o exequente fez um pedido subsidiário de condenação da executada a pagar-lhe a quantia de 250 mil euros de indemnização destinada a custear a reparação dos defeitos, mas esse pedido foi extinto por inutilidade superveniente da lide por causa da existência do PER, o que a exequente omite, entendendo que tal despacho estende os seus efeitos aos pedidos principais. Diz ainda que a quantia correspondente à prestação de facto encontra-se determinada no âmbito da acção declarativa, pelo que, o crédito da exequente é um crédito comum e deverá receber o tratamento dos restantes créditos do PER com perdão de 90%, e não poderá ser penhorado qualquer bem enquanto estiver a cumprir o plano de recuperação; acresce, diz, que a sentença não permite à exequente peticionar a totalidade do que peticionou na acção declarativa, fazendo a exequente tábua rasa das decisões proferidas na acção declarativa, pretendendo com a acção executiva os efeitos que pretendia com o pedido subsidiário. Por seu turno, o exequente, parecendo qualificar o requerimento da executada como articulado superveniente vem dizer que não é admissível e defender o prosseguimento da execução por não lhe ser aplicável o decidido no PER já que o seu direito à data não estava constituído, era litigioso e o pedido principal da acção declarativa não respeitava a qualquer crédito, tendo a executada sido condenada numa prestação de facto. A questão pertinente nesta fase processual é a de saber se a execução deve prosseguir com a nomeação de perito para avaliar o custo da prestação, seguindo-se os demais termos previstos no art.870.º do CPC, ou em virtude da existência do PER invocado pela executada a execução não pode prosseguir para a fase seguinte na qual se prevê já a penhora de bens. E por tal questão importar à tramitação processual impõe-se que seja decidida. Em primeiro lugar haverá de deixar claro que o título executivo da presente execução é uma sentença que condenou a executada numa prestação de facto fungível, ou seja, na reparação dos defeitos identificados na decisão, donde a execução não nasce para cobrança de divida (cfr. art.17.º -E n.º1 do CIRE), pelo que, nada obstava ab initio à sua instauração ainda que existisse o PER, porquanto, sendo a prestação efectuada pela executada ainda que no âmbito da execução, todas as questões ficavam ultrapassadas. Sucede que a executada não cumpriu a prestação de facto a que estava obrigada pela sentença, e a exequente pretende que seja avaliado o custo da reparação dos defeitos para que a prestação possa ser feita por terceiro. E aqui chegados resolvamos a questão seguinte que é pressuposta para resolução da principal, é na execução através do mecanismo da avaliação do custo da prestação que é fixado o valor pelo qual pode seguir a execução para pagamento de quantia certa em que a execução inicial para prestação de facto se transmuta (art.870.º do CPC). Por isso, irreleva para a execução o valor do pedido subsidiário de condenação no pagamento da quantia de 250 mil euros a título de indemnização para reparação dos defeitos, deduzido na ação declarativa. Sendo um pedido subsidiário como alegado pela executada e se comprova da leitura do relatório da sentença, o mesmo só era apreciado na improcedência do pedido principal como é mister dos pedidos subsidiários, pelo que, tendo procedido o pedido de reparação dos defeitos o tribunal na acção declarativa não apreciou de mérito esse pedido, nada decidindo sobre se o exequente tinha ou não direito a indemnização e no valor peticionado. E tanto assim é que relativamente a esse pedido subsidiário a instância foi declarada extinta por inutilidade da lide, ou seja, contrariamente ao que diz a executada o pedido não foi julgado improcedente. A extinção da instância desse pedido subsidiário por inutilidade da lide, numa situação em que o pedido principal vem a proceder e estamos a executar a sentença que condenou no pedido principal, a nosso ver nenhuma consequência tem na execução, porque, contrariamente, também ao pugnado pela executada, inexiste identidade jurídica entre o dito pedido subsidiário e o valor que venha a ser fixado como valor do custo da prestação não cumprida pela executada. São realidades jurídicas completamente distintas, não se impondo na execução qualquer efeito de caso julgado por via da extinção do pedido subsidiário formulado na acção declarativa. Aliás, salvo o devido respeito por opinião diferente, afigura-se-nos que a situação haverá de ter o mesmo tratamento que teria se não tivesse havida a extinção do pedido subsidiário por inutilidade da lide e a sentença viesse a condenar no pedido principal. Só no caso de improceder o pedido principal é que se divisam efeitos daquela extinção por inutilidade, quais sejam os de dispensar o tribunal da acção declarativa de o apreciar, caso em que inexistia a sentença dada à execução. Pelo que se acaba de expor as decisões proferidas na acção declarativa sobre o pedido subsidiário aí formulado pela exequente e que, repete-se, pedido que não faz parte da condenação que se executa, têm os seus efeitos limitados à acção declarativa, sem repercussão nesta acção executiva cuja tramitação se terá que fazer em conformidade com a lei processual relativa ao processo executivo e em função do título executivo e do direito da exequente aí plasmado e do correspondente dever da executada. A sentença exequenda não reconhece à executada nenhum direito de crédito mas sim o direito a uma prestação de facto. Também na execução não há que falar em pedido alternativo, a exequente instaura a execução para obter o cumprimento da prestação, aplicando-se no mais o previsto na lei para as situações em que a prestação, sendo fungível, ou seja, podendo ser prestada por terceiro, não é voluntariamente cumprida no prazo que veio a ser fixado já neste tribunal. Assim, o direito da exequente a obter um pagamento e seu montante surge no âmbito da execução em função da avaliação que aqui se faz do custo necessário à reparação dos defeitos. A exequente se não executar a sentença que condenou na prestação de facto não tem ainda qualquer direito de crédito sobre a executada, nem sequer um crédito ilíquido. Nessa medida se compreende, também, que irreleve qualquer valor que a exequente tenha entendido na acção declarativa corresponder à indemnização para custear as obras, o falado pedido subsidiário. A prestação pode aqui vir a ser avaliada em valor inferior ou superior e será este que baliza os termos subsequentes, sem qualquer influência, a nosso ver, de quaisquer decisões interlocutórias proferidas no processo declarativo. E tanto assim que apesar do PER a acção prosseguiu para a apreciação do pedido principal, não se tendo entendido por conseguinte que o PER impedia esse prosseguimento. Assim, as questões do âmbito da execução terão que ser decididas na execução, pelo que, haverá de ser aqui que se tem que apreciar os efeitos do PER sobre a execução, estando ultrapassados os efeitos que esse mesmo PER teve na ação declarativa em conformidade com as decisões aí proferidas. E quanto aos efeitos do PER nesta execução as partes estão em manifesto desacordo. A executada instaurou PER, no âmbito do qual veio a ser homologado acordo por decisão proferida em 13.1.2016, junta nos embargos de executado. O plano de recuperação homologado, prevê, entre o mais, o perdão de 90% do valor dos créditos comuns, com a consequente redução para 10% do seu valor nominal a serem pagos numa única prestação no prazo de dois anos a contar da data da data do trânsito em julgado da decisão de homologação judicial do plano. (cfr. plano junto nos embargos). A sentença exequenda está datada de 3.3.2017. Resulta desses factos que o plano de recuperação da executada foi homologado antes de ser proferida a sentença que reconheceu ao exequente o direito à eliminação dos defeitos. Como se já se disse o exequente por via da sentença não tem desde logo um direito de crédito sobre a executada, pelo aquando do PER, que finda em 2016 com a homologação do plano, o exequente, a nosso ver, não podia reclamar no PER qualquer direito de crédito sobre a executada. O direito de crédito embora se funde ainda na sentença por via da condenação na prestação constitui-se, cremos, já no âmbito da execução onde se vem a demonstrar o não cumprimento da prestação no prazo que foi aqui fixado. Por conseguinte à data em que é nomeado administrador judicial provisório no PER da executada, necessariamente antes do despacho que o homologa, o exequente não tinha constituído a seu favor um crédito sobre a executada. E afigura-se-nos ser o momento da constituição do crédito que determina a sujeição do exequente aos efeitos do PER, em conformidade com o disposto no art.17.º-F n.º10 do CIRE que estabelece “A decisão vincula a empresa e os credores, mesmo que não hajam reclamado os seus créditos ou participado nas negociações, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º4 do artigo 17.º -C, e é notificada, publicitada e registada pela secretaria do tribunal.” . Desta norma decorre um efeito para todos os credores cujo crédito esteja constituído na data de nomeação de administrador judicial provisório: ficam vinculados ao decidido no PER, ou seja, ao plano aí homologado. Em conformidade, e porque estando tais créditos constituídos podiam aí reclamá-los, não podem esses credores tomar medidas coercivas contra o devedor, pelo que, não podem instaurar acções para cobrança de dividas e as pendentes extinguem-se quando aprovado o plano a menos que este preveja a sua continuação (art.17.º-E n.º1 do CIRE). Mas estabelecendo a lei que a decisão vincula todos os credores quanto aos créditos constituídos à data da decisão de nomeação de administrador provisório, afigura-se-nos que não pode deixar de excluir desse carácter vinculativo os créditos não constituídos a essa data e que por isso não podiam ser reclamados nem considerados, não estando esses credores em igualdade de situações com aqueles que participaram no PER ou aí poderiam ter participado. Ademais se tais créditos não estavam constituídos (note-se que é coisa diferente de vencidos) não podiam os mesmos ter qualquer influencia na situação de dificuldade económica ou insolvência eminente que desencadeou o recurso ao PER, compreendendo-se que tais créditos não fiquem vinculados ao plano de recuperação homologado. E se assim é, como nos parece ser, então não tem razão de ser, por não lhe ser aplicável o plano nem as restrições que o mesmo consagra, que estejam inibidos de instaurar acções para cobrança desses créditos. Ao vincular todos os credores com créditos constituídos na data em que é nomeado administrador provisório a lei, ao plano aprovado quer hajam ou não reclamdo os créditos ou participado nas negociações, a lei pretende tratar de igual forma os credores que se encontravam em condições de aí participarem e puderem aprovar ou não o plano, obstando também a que esses credores obstem à recuperação, furtando-se aos efeitos do PER ao nele não participarem ou não reclamarem os créditos. Mas tal desiderato legal não se impõe a quem não podia participar nem reclamar créditos porque os mesmos não estavam constituídos. Poder-se-á, é certo, entender que embora não vinculados à decisão proferida no PER, mantendo v.g. incólumes os créditos que só se constituíram depois do despacho de nomeação de administrador provisório, ainda assim não podem instaurar acções de cobrança de divida, designadamente execuções. Mas a ser assim, afigura-se-nos, ficariam mais prejudicados de que os credores que estão vinculados ao plano e que ainda que com restrições possam obter algum pagamento no âmbito do mesmo, pelo que, somos levados a não perfilhar tal entendimento, e considerar da conjugação do n.º10 do art.17.º-F e n.º1 do art.17.º-E, que a impossibilidade de instaurar acções para cobrança de divida não se estende aos credores cujos créditos não estavam constituídos aquando da nomeação de administrador provisório, como é o caso da presente execução. Pelo exposto, decide-se que a presente execução deve prosseguir com a nomeação de perito para avaliação do custo da prestação tal como requerido pela exequente</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><font>A executada interpôs recurso desse despacho, mas o mesmo veio a ser confirmado pelo acórdão do Tribunal da Relação, e de cujo sumário, por elucidativo ficou a constar: </font><i><font>“1 - As questões que “sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado” e que se devem considerar integradas pela autoridade de caso julgado que decorre da sentença, são tão só aquelas que se apreendem do teor da mesma, e não as que decorrem de decisões tomadas no processo, mas não incluídas no conteúdo dessa sentença, como é o caso da decisão sobre a suspensão da instância e da decisão sobre a extinção da instância quanto ao pedido subsidiário, por impossibilidade superveniente da lide. 2 - A decisão sobre a suspensão da instância e a decisão sobre a extinção da instância quanto ao pedido subsidiário, por impossibilidade superveniente da lide, respeitam a decisões que apreciaram matéria de direito adjectivo, pelo que apenas produzem os seus efeitos na acção declarativa onde foram proferidas, não tendo qualquer efeito de caso julgado para além da mesma, designadamente no processo onde está a ser executada a sentença aí proferida e para efeitos do prosseguimento dessa acção executiva, nos termos do art.º 870º do Código de Processo Civil. 3 - O direito a uma prestação de facto fungível que não é considerado no plano de recuperação aprovado no PER (por estar a ser discutido numa acção declarativa pendente), e que mais de três anos depois dessa aprovação ainda não é susceptível de quantificação pecuniária, porque só então vai ter lugar a avaliação do custo dessa prestação (nos termos do art.º 870º do Código de Processo Civil), não é um direito que se mostre abrangido pelos efeitos do referido plano, no sentido de ser reduzido a 10% do “seu valor nominal” e de ser pago “numa única prestação, no prazo de dois anos” a contar do trânsito em julgado da homologação judicial desse plano aprovado</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><font>Resulta, assim, do decidido na execução que as questões suscitadas nos embargos se encontram já apreciadas em toda a sua extensão, porquanto, se encontra decidido que o direito dos exequentes não se encontra abrangido no PER da executada, encontra-se decidido que a decisão proferida sobre o pedido subsidiário formulado na ação declarativa não tem efeitos na execução, razão pela qual foi determinada a nomeação de perito para apurar o custo da prestação – ficando prejudicada dessa forma a questão invocada nos embargos relativa à desnecessidade de perícia -; e decorre dessas decisões que inexiste qualquer obstáculo à penhora de bens, face ao prosseguimento da execução.</font><br>
</p><p><font>Desta feita, os presentes embargos revelam-se supervenientemente inúteis.</font><br>
</p><p><font>Assim, declaro extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.277.º e) do CPC.</font><br>
</p><p><font>Custas pela embargante.</font><br>
</p><p><font>Notifique e registe.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Requeria a executada a suspensão da execução invocando o art.733.º n.º1 c), dizendo que </font><i><font>“a quantia exequenda peticionada, no âmbito do pedido alternativo formulado não é exigível porquanto, no âmbito do Plano de Especial de Revitalização da Embargante, foi aprovado e homologado um plano que prevê o perdão de 90% dos créditos comuns e o perdão integral dos juros remuneratórios ou moratórios associados àqueles créditos.”, acrescentando “sendo evidente que 90% da dívida exequenda não existe, não sendo, por maioria de razão, exigível, encontram-se reunidos os pressupostos de aplicação do art.º 733º, n.º 1, c), aplicável ex vi do art.º 868º, n.º 3, ambos do CPC</font></i><font>.”</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Desse despacho/sentença recorreu a embargante para este STJ, recurso per saltum (art. 678 do CPC).</font><br>
<p><font>No recurso interposto </font><b><font>conclui a recorrente</font></b><font>:</font><br>
</p><p><i><font>“A. Como dito inicialmente, para alcançar o desiderato constante da Sentença sindicada, o Tribunal a quo considerou que as questões objeto dos embargos de executado haviam já sido apreciadas em sede de despacho já anteriormente proferido pelo Tribunal a quo nos autos principais (datado de 08.10.2019), referindo, ainda, que sobre tal decisão havia sido inclusivamente já proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa (datado de 18.06.2020).</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Existem, porém, questões que não foram objeto de apreciação e que importa agora determinar, correspondentes, essencialmente, à data em que se deverá considerar constituído o crédito do Exequente, aqui Recorrido, perante a Executada, ora Recorrente e por referência ao n.º 10 do artigo 17.º-F do CIRE.</font></i><br>
</p><p><i><font>C. Em 1.º lugar, e relativamente aos principais factos em causa, recorde-se que na ação declarativa de condenação, que correu termos sob o n.º de processo 2301/11.3TVLSB, o ora Recorrido peticionou a condenação da Recorrente na reparação de vários defeitos de construção do prédio sino na Av. Engenheiro Arantes e Oliveira, n.º 21, Lisboa;</font></i><br>
</p><p><i><font>D. Subsidiariamente, peticionou ainda a condenação da ora Recorrente ao pagamento de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) a título de indemnização, destinados a custear os trabalhos necessários para reparar e eliminar os defeitos;</font></i><br>
</p><p><i><font>E. No decorrer daquela ação declarativa, foi instaurado um Processo Especial de Revitalização (PER) pela Recorrente, no âmbito do qual, por despacho com data de 18.05.2015, foi nomeado Administrador Judicial Provisório, tendo a aqui Recorrente apresentado, na ação declarativa, requerimento de suspensão desse processo (ao abrigo do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE);</font></i><br>
</p><p><i><font>F. Atendendo ao PER, o Tribunal de 1.ª instância, na ação declarativa, decidiu aplicar o artigo 17.º-E do CIRE e, consequentemente, por despacho, suspender a ação declarativa, tal como havia sido requerido pela Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>G. Inconformado com esta decisão de suspensão, o Recorrido interpôs recurso de apelação, o qual confirmou a decisão recorrida e manteve a suspensão da ação declarativa.</font></i><br>
</p><p><i><font>H. O PER veio a ser homologado por sentença no dia 13.01.2016 e previa um perdão de 90% do valor dos créditos comuns, com a consequente redução para 10% do seu valor nominal, a serem pagos numa única prestação no prazo de dois anos a contar da data da decisão de homologação.</font></i><br>
</p><p><i><font>I. Em face desta homologação, no âmbito da ação declarativa – que se encontrava suspensa – o Tribunal de 1.ª instância pronunciou-se, por despacho de 02.03.2016, concluindo pela extinção do pedido subsidiário (de condenação da aqui Recorrente ao pagamento da quantia identificada na ação declarativa) por inutilidade superveniente da lide, determinando a aplicação das disposições e efeitos do PER ao pedido principal em caso de convolação da prestação de facto em pagamento de quantia certa, isto é, reduzindo do seu valor nominal em 90%.</font></i><br>
</p><p><i><font>J. No dia 03.03.2017, o Tribunal proferiu sentença no âmbito da ação declarativa, condenando a Recorrente à reparação de vários defeitos de construção no supracitado prédio.</font></i><br>
</p><p><i><font>K. Com base naquela decisão condenatória, o ora Recorrido intentou, no dia 13.07.2017, a presente ação executiva, ainda que inicialmente como execução para prestação de facto, tendo a 15.02.2018 a aqui Recorrente deduzido Embargos de Executado, correspondentes ao presente apenso A).</font></i><br>
</p><p><i><font>L. Não tendo sido executada a prestação a que se reportava a execução para prestação de facto, em 11.07.2019 o Recorrido requereu ao Tribunal, para os efeitos do n.º 2 do artigo 870.º do CPC, a convolação da execução para pagamento de quantia certa e a nomeação de perito para avaliar o custo provável da prestação.</font></i><br>
</p><p><i><font>M. Notificada daquele requerimento, a Executada e ora Recorrente pronunciou-se, relembrando a homologação do plano do PER e o conteúdo das decisões já proferidas no âmbito da ação declarativa, requerendo o indeferimento da nomeação de perito, a extinção do pedido alternativo de pagamento de quantia certa e a redução da quantia exequenda a 10% do capital peticionado.</font></i><br>
</p><p><i><font>N. Posto isto, o Tribunal de 1.ª instância, nos autos principais, proferiu despacho de 08.10.2019, cujo sumário veio a ser citado na Sentença recorrida, tendo a Executada, aqui Recorrente, desse despacho interposto recurso, após o que foi proferido o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2020, cujo sumário foi igualmente feito constar da decisão recorrida.</font></i><br>
</p><p><i><font>O. Foi na sequência da prolação do despacho de 08.10.2019 e do acórdão de 18.06.2020 que o Tribunal a quo proferiu a Sentença que ora se sindica, na qual foi citado o teor daquele despacho de 08.10.2019 e citado o trecho do sumário do acórdão de 18.06.2020, concluindo-se ali – como anteriormente se referiu e se reitera – pela extinção do presente apenso de embargos de executado.</font></i><br>
</p><p><i><font>P. Em 2.º lugar, e quanto à admissibilidade do recurso per saltum, a Recorrente recorda que se encontram preenchidos os pressupostos do artigo 678.º do CPC;</font></i><br>
</p><p><i><font>Q. Pois a Sentença recorrida põe termo aos embargos de executado, extinguindo a instância, numa ação de valor superior à alçada da Relação, sendo a sucumbência da aqui Recorrente de igual montante [verificam-se os pressupostos enunciados nas alíneas a) e b)].</font></i><br>
</p><p><i><font>R. Por outro lado, no presente recurso são apenas suscitadas questões de direito [assim se verificando o requisito imposto pela alínea c)], não sendo impugnadas quaisquer decisões interlocutórias [logo, considerando-se verificado, também, o requisito imposto pela alínea d)].</font></i><br>
</p><p><i><font>S. Acresce que, conforme enuncia o artigo 644.º, n.º 1, alínea a) e tal como permite o artigo 854.º do CPC, à aqui Recorrente sempre seria permitido interpor recurso de apelação, sendo-lhe ainda permitida a interposição de recurso de revista.</font></i><br>
</p><p><i><font>T. Assim se concluindo, como tal, pela admissibilidade da interposição do presente recurso per saltum pela Recorrente, à luz dos citados normativos.</font></i><br>
</p><p><i><font>U. Ainda assim, reitera-se que, em qualquer caso e em face do determinado no artigo 678.º, n.º 4 do CPC, que ainda que o presente recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça fosse julgado inadmissível – o que não se concede e apenas por exacerbada cautela de patrocínio se pondera – sempre o recurso deverá ser processado como recurso de apelação, caso em que o Supremo Tribunal de Justiça deverá ordenar a baixa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa.</font></i><br>
</p><p><i><font>V. Em 3.º lugar, e no sentido de que contra a admissibilidade deste recurso não obsta qualquer caso julgado, importa recordar que se é certo que no trecho citado na decisão recorrida (do despacho de 08.10.2019) se refere que o crédito do Recorrido se constituiu após o despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório (a que se reporta o artigo 17.º-C, n.º 4 do CIRE), na decisão que é proferida no tal Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, altera-se o que havia sido decidido pelo Tribunal de 1.ª instância de 08.10.2019, e refere-se que o que releva para se concluir pela aplicação do Plano do PER ao crédito exequendo é saber se o Plano do PER já previa, ou não, o pagamento a efetuar ao crédito do aqui Recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>W. Logo, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2020 foram alterados os fundamentos ao abrigo dos quais se considerava que o Plano do PER da Recorrente não podia ser aplicado ao crédito de que o Exequente, aqui Recorrido, se arrogava credor perante a Recorrente pelo simples facto de, alegadamente, a Recorrente não ter incluído no Plano do PER qualquer referência ao crédito de que o Recorrido se arroga credor: ou seja, em tal Acórdão nada se referiu quanto aos efeitos do disposto no n.º 10 do artigo 17.º-F do CIRE;</font></i><br>
</p><p><i><font>X. Quando é precisamente esse um dos fundamentos apresentados pela Recorrente, em sede de Requerimento inicial de embargos de executado, ao dizer que “a aprovação, e homologação, do plano de recuperação no processo especial de revitalização vincula os credores, mesmo os que não tenham participado nas negociações ou discordem desse plano” (é exatamente isto que consta daquele n.º 10 do artigo 17.º-F do CIRE).</font></i><br>
</p><p><i><font>Y. Se assim é, então não se poderá afirmar – como fez o Tribunal a quo na decisão recorrida – que “Resulta, assim, do decidido na execução que as questões suscitadas nos embargos se encontram já apreciadas em toda a sua extensão, porquanto, se encontra decidido que o direito dos exequentes não se encontra abrangido no PER da executada”, pois a circunstância de o crédito do Recorrido se considerar constituído à data da instauração do PER não foi objeto de apreciação pelo Tribunal a Relação de Lisboa;</font></i><br>
</p><p><i><font>Z. Tendo este apenas sustentado que o crédito exequendo – reclamado pelo Recorrido – não podia ser considerado integrado no PER da Recorrente, fruto da circunstância de em tal Plano nada se prever especificamente quanto a tal crédito do Recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>AA. Posto isto, e tal como amplamente explicado e demonstrado nas Alegações antecedentes às presentes Conclusões, não está em causa qualquer situação de caso julgado formal, já que é pressuposto do caso julgado formal que seja, de facto, proferida decisão – o que, como se viu, não foi o caso.</font></i><br>
</p><p><i><font>BB. Concluindo-se pela inexistência de qualquer obstáculo para a tomada de decisão derivada de qualquer caso julgado formal, não tendo o Tribunal da Relação proferido qualquer decisão tomando por base o aludido n.º 10 do artigo 17.º-F do CIRE, nada obsta ao conhecimento, pelo Tribunal ad quem, do objeto do presente recurso.</font></i><br>
</p><p><i><font>CC. Em 4.º lugar, e no que respeita à interpretação do n.º 10 do artigo 17.º F do CIRE (uma vez que a Sentença agora sindicada, fundamentada nas decisões anteriormente proferidas em sede de autos principais, conclui que o direito do Exequente, e aqui Recorrido, não se encontra abrangido no PER da aqui Recorrente), importa agora clarificar que o crédito do Recorrido se constituiu, de facto, aquando da instauração da ação declarativa– o que decorre dos precisos termos daquele n.º 10 do artigo 17.º F do CIRE.</font></i><br>
</p><p><i><font>DD. Com efeito, a Recorrente confirma e reitera – nesta parte acolhendo o entendimento que consta da decisão recorrida – que o crédito do Recorrido, aquando do início do PER da Recorrente e da respetiva homologação por sentença, constituía um crédito litigioso à luz do n.º 3 do artigo 579.º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>EE. Ora, à luz do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24.11.2020, proferido no processo n.º 1319/20.0T8VNG.P1, do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18.09.2018, proferido no processo n.º 190/13.2TBVNC.G1.S1 e do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26.05.2021, proferido no processo n.º 15326/19.1T8SNT.L1-4 não há a mínima dúvida de que o crédito de que o Recorrido se arroga titular perante a aqui Recorrente, sendo um crédito litigioso à data da instauração do PER por parte da aqui Recorrente e, também, à data da homologação do Plano do PER, constituiu-se em data anterior ao PER – e tudo o que consta destes acórdãos é o inverso do que consta da decisão recorrida (e não foi abordado no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2020, citado parcialmente na decisão recorrida).</font></i><br>
</p><p><i><font>FF. Tal como referido nas presentes alegações, o direito de crédito do Recorrido surge na data em que os defeitos de obra são comunicados ao Recorrente, sendo que, no caso sub judice, como vimos, a ação declarativa foi intentada pelo Autor, aqui Recorrido, no ano de 2011, tendo a sentença dessa ação declarativa sido proferida a 01.02.2017 e, pouco antes, homologado por sentença o Plano do PER da Recorrente, a 13.01.2016.</font></i><br>
</p><p><i><font>GG. Logo, ainda que se entendesse que o crédito não nasce aquando da reclamação dos defeitos pelo Recorrido à Recorrente, o crédito do Recorrido sobre a Recorrente constituiu-se, pelo menos, no ano de 2011 – e não com a prolação da sentença naquela ação declarativa ou aquando de qualquer fixação do valor do crédito do Recorrido sobre a Recorrente em sede de ação executiva (o que ainda não ocorreu).</font></i><br>
</p><p><i><font>HH. Não existindo a mínima dúvida de que o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2020 não tomou qualquer decisão quanto à circunstância de o crédito (que é litigioso) do Recorrido – a aceitar-se que poderia ser objeto da presente ação executiva – se constituiu em data anterior ao PER e também em data anterior à respetiva homologação.</font></i><br>
</p><p><i><font>II. Sendo absolutamente indiferente que se c | [0 0 0 ... 0 0 0] |
-TFgu4YBgYBz1XKv-_0_ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>***</font></div><br>
<br>
<font>- Em 12.07.2013, Condomínio do Edifício Parque … instaurou no Tribunal Judicial da Comarca da … - … Juízo Competência Cível (Atualmente, Tribunal Judicial da Comarca … - Juízo Local Cível da … - Juiz ….), ação declarativa, com processo comum, contra Comporto – Sociedade de Construções, S.A., formulando os seguintes pedidos:</font><br>
<p><font>a) Ser a R. condenada a reparar e eliminar todos os alegados defeitos de que enferma o Conjunto Habitacional ou empreendimento identificado nesta petição, e, assim, nele efetuar todas as obras necessárias à sua total irradiação ou supressão;</font><br>
</p><p><font>b) Ser a R. condenada a ressarcir o A. de todos os danos que constituem a consequência adequada da existência dos defeitos referidos, sejam de natureza patrimonial ou não patrimonial, e assim a pagar-lhe a indemnização que vier a liquidar-se em execução de sentença.</font><br>
</p><p><font>Para fundamentar o seu pedido, alegou o autor em síntese: ao autor compete administrar as partes comuns do prédio urbano denominado “Condomínio do Edifício Parque …”; a ré é uma sociedade comercial anónima que se dedica à construção, reparação, promoção e venda de imóveis; o conjunto habitacional administrado pelo autor é composto por cinco blocos, sendo que os blocos A, D e E foram totalmente construídos pela ré; os blocos B e C foram iniciados por uma outra empresa, denominada “N…”, tendo sido concluídos pela ré, que assumiu igualmente a responsabilidade pela boa execução dos mesmos, assim como todas as garantias legais inerentes à edificação de tais blocos, sendo que também as partes comuns destes foram efetivamente realizadas pela ré; o empreendimento ficou a padecer de alguns vícios ou defeitos, alguns dos quais foram reparados e solucionados pela ré, mantendo-se, no entanto, ainda pendentes de reparação os vícios, defeitos ou anomalias que seguidamente se descrevem: a) infiltrações no teto da “casa do lixo” dos Blocos A e B (em virtude de reparação anterior efetuada pela R., o deck, passeio, ficou por terminar); infiltrações no teto da garagem dos Blocos C e D (em virtude de reparação anterior efetuada pela R., o deck, passeio, ficou igualmente por terminar); c) Infiltrações no teto e nas paredes da “casa das máquinas” da piscina; enorme fuga de água da piscina que compõe o Bloco E; a reparação e eliminação de todos estes descritos defeitos, vícios ou anomalias foi devida e prontamente reclamada pelo autor à ré, que procedeu à sua inspeção e monitorização; pese embora as intervenções da ré, as mesmas não se revelaram suficientes e idóneas à erradicação definitiva dos referidos vícios ou anomalias, que se mantém; por esse motivo, em 8 de maio do corrente ano, através de carta registada com aviso de receção, o autor voltou a reclamar a eliminação dos aludidos defeitos; até à presente data, os defeitos atrás indicados não foram reparados, daí decorrendo danos para o autor.</font><br>
</p><p><font>Citada, a ré apresentou contestação impugnando a versão dos factos apresentada pelo autor e alegando em síntese: não realizou a obra do denominado bloco C; somente efetuou parte do bloco B; num total de 12 habitações só realizou trabalhos parciais em 7, sendo certo que, mesmo nessas 7 casas o anterior empreiteiro “N…” já tinha realizado todas as obras respeitantes a movimento de terras, estrutura de betão (incluindo as zonas comuns), tubagens de saneamento, águas pluviais e chãos das garagens; somente efetuou acabamentos nessas 7 casas do bloco B.</font><br>
</p><p><font>Em 6.01.2014 foi proferido despacho, no qual; se fixou o valor da causa em €30.000,01; se dispensou a realização da audiência prévia; se consideraram verificados todos os pressupostos formais que permitem o conhecimento do mérito da causa; se definiu o objeto do litígio e se enunciaram os temas de prova (Objeto do litígio: “apurar se a ré é responsável pela eliminação dos defeitos invocados pelo autor, assim como pela indemnização dos danos que constituem a consequência adequada da existência desses defeitos”.</font><br>
</p><p><font>Temas de prova, apurar:</font><br>
</p><p><font>“a) Dos blocos B e C o que é que foi construído pela ré.</font><br>
</p><p><font>b) Se a ré assumiu a responsabilidade pela execução da totalidade desses blocos B e C. c) Se a “casa do lixo” dos blocos A e B apresenta infiltrações no tecto.</font><br>
</p><p><font>d) Se o tecto da garagem dos blocos C e D apresenta infiltrações.</font><br>
</p><p><font>e) Se a “casa das máquinas” da piscina apresenta infiltrações no tecto e nas paredes. f) Se a piscina do bloco E apresenta fuga de água.</font><br>
</p><p><font>g) Se os passeios entre os blocos do empreendimento estão por terminar</font><br>
</p><p><font>h) Se a ré assumiu a reparação do referido em c) a f) e o que fez para reparar tais defeitos. i) Quais as consequências derivadas do referido em c) a g)</font><br>
</p><p><font>j) Se as causas do referido em c) a f) estão relacionadas com obras de outros empreiteiros”).</font><br>
</p><p><font>Realizou-se audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:</font><br>
</p><p><font>«</font><i><font>Nos termos e fundamentos supra expendidos, decido julgar a presente ação procedente, por só parcialmente provada e em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>A) Condenar a ré a reparar e eliminar os defeitos, designadamente as infiltrações, localizados e decorrentes da junção dos Blocos C) e D).</font></i><br>
</p><p><i><font>B) Condenar a ré a reparar e eliminar os defeitos, designadamente as infiltrações, localizados e decorrentes da junção dos Blocos “A” e “B”.</font></i><br>
</p><p><i><font>C) Condenar a ré a terminar o patamar superior da escada de acesso ao jardim e respetiva escada.</font></i><br>
</p><p><i><font>D) Condenar a ré a reparar as infiltrações verificadas na casa das máquinas da piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>E) Condenar a ré a reparar e eliminar os defeitos constantes da piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>F) Absolver a ré de reparar e eliminar os defeitos, designadamente as infiltrações que se encontram localizadas no Bloco C).</font></i><br>
</p><p><i><font>G) Absolver a ré do pagamento de qualquer indemnização quer a título patrimonial quer a título não patrimonial.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas na proporção dos respetivos decaimentos</font></i><font>».</font><br>
</p><p><font>Não se conformou a ré e interpôs recurso de apelação, sendo decidido pelo Tribunal da Relação …:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Com fundamento no exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso e, em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) em revogar a sentença recorrida no que respeita às alíneas D) e E) do respetivo dispositivo;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) em mantê-la na parte restante.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas do recurso na proporção dos decaimentos que se fixa em partes iguais</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Inconformada com o decidido pela Relação, </font><b><font>interpõem recurso de Revista</font></b><font>, para este STJ, a autora e formula as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><i><font>“1. O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. O presente processo tem o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), pelo que é superior à alçada do tribunal de que se recorre.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Relativamente à sucumbência, versando este recurso sobre a condenação ou não de reparação da piscina em causa nos presentes autos, teremos de atender ao orçamento junto aos autos a 8 de Novembro de 2016 onde é explicitado o valor necessário para se efetuar a reparação dessa mesma piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Assim, de acordo com tal orçamento, a reparação da piscina tinha um custo €17.447 (dezassete mil quatrocentos e quarenta e sete euros), valor que com o IVA, à taxa legal em vigor, o qual teria sempre de ser contabilizado, importaria um montante final de € 21.459,81 (vinte e um mil quatrocentos e cinquenta e nove euros e oitenta e um cêntimos).</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Quer numa situação, quer na outra, tendo por base o valor da causa, a regra da sucumbência plasmada no artigo 629º do C.P.C. se nos afigura respeitada, visto que a decisão impugnada é desfavorável ao ora recorrente em mais de metade do valor da alçada do tribunal de que se recorre.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. O Tribunal da Relação entendeu eliminar a condenação da recorrida na reparação das infiltrações verificadas na casa das máquinas da piscina e absolver ainda a recorrente de reparar e eliminar os defeitos constantes da piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. O facto decisivo para tal absolvição prende-se apenas e tão só com a afirmação constante no ponto 11 dos Factos provados, mais especificamente na alínea E) Fuga de água na piscina, quando o Tribunal de Primeira Instância escreveu que “Existe uma possível perda de água pelo tanque de compensação”.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. O tanque de compensação da piscina é apenas e tão somente uma parte da piscina, a qual é composta igualmente pela piscina em si, pelos motores, canalizações, filtros, caleiros e demais material.</font></i><br>
</p><p><i><font>9. Decidir que a recorrida não tem de reparar a piscina apenas porque o recorrente não terá procedido à manutenção do tanque de compensação ou porque não efetuou a manutenção dos motores ou filtros é uma decisão redutora e completamente injusta.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. A decisão de primeira instância deu como provado vários factos que demonstram a fuga de água na piscina, a saber:</font></i><br>
</p><p><i><font>“A piscina quando funciona pelo caleiro de transbordo, a perda de água é superior, o que dá a entender que possa existir uma rutura no caleiro, que de seguida encaminha a água para o tanque de compensação”;</font></i><br>
</p><p><i><font>“O caleiro de transbordo apresenta algumas fissuras, o que faz com que haja infiltrações”.</font></i><br>
</p><p><i><font>“O caleiro apresenta algumas fissuras”.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. O Tribunal de Primeira Instância deu como provados factos objetivos que justifiquem perda de água na piscina dado que o caleiro de transbordo é uma parte integrante da piscina e não se confunde com o tanque de compensação da mesma, nem com a própria piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. Esse caleiro tem algumas fissuras, o que faz com que haja infiltrações ou fugas de água.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. O Tribunal de Primeira Instância não deu como provado que foi a falta de manutenção do tanque de compensação que provoca as possíveis perdas de água pelo mesmo, ou seja, não deu como provado que houvesse perdas de água pelo tanque de compensação, embora as admita.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Por outro lado, diz o Acórdão que o problema da inundação da casa das máquinas deriva da existência de um estranho tubo que, por razões que se desconhecem, vai desaguar naquele local.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. As inundações derivam dum tubo estranho que vai desaguar à casa das máquinas.</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Quem construiu a piscina foi a recorrida, quem lá colocou o tubo estranho presume-se que também foi ela, a menos que conseguisse demonstrar que nada teve que ver com a colocação de tal tubo, o que não foi o caso.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. O ónus da prova donde provinham as fugas de água pertence à recorrida, bem como que as mesmas se ficaram a dever à falta de manutenção da piscina, ou mais concretamente, do tanque de compensação, dos motores ou dos filtros.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. Nos termos dos artigos 799º, n.º 1 e 1208ºambos do Código Civil, é da responsabilidade do empreiteiro, ou seja, da aqui recorrida, demonstrar e provar que executou a empreitada em conformidade com o convencionado e sem quaisquer vícios.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. O dono da obra, ora recorrente, tinha de provar a existência dos defeitos ou vícios, o que logrou fazer, demonstrando a existência de todos os alegados defeitos, vícios ou desconformidades pelos quais se presume que o empreiteiro é o responsável pela sua eliminação, dado que lhe é imputável o cumprimento defeituoso.</font></i><br>
</p><p><i><font>20. O douto Acórdão recorrido violou, entre outras normas jurídicas, o disposto nos artigos 799º, n.º 1 e 1208º, ambos do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE deve o recurso apresentado ser julgado totalmente procedente, condenando a recorrida a proceder à reparação das infiltrações verificadas na casa das máquinas da piscina (alínea D), assim como a reparar e eliminar os defeitos constantes da mesma piscina (alínea E)”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>A ré apresentou contra-alegações nas quais conclui: </font><i><font>“… que deve manter-se na integra a douta decisão do Acórdão do tribunal a quo, negando-se provimento ao presente recurso”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Nas Instâncias foram tidos em conta </font></b><font>os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>“Face à decisão que antecede, é a seguinte factualidade relevante provada:</font></i><br>
</p><p><i><font>Consignada na sentença recorrida:</font></i><br>
</p><p><i><font>1. Ao A. compete administrar as partes comuns do prédio urbano denominado “Condomínio do Edifício Parque …” sito na …, n.º 49, da freguesia de …, do concelho de … .</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Por sua vez, a R. é uma sociedade comercial anónima que se dedica à construção, reparação, promoção e venda de imóveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. O empreendimento ou conjunto habitacional que compõe o referido condomínio adveio à posse do A. por o ter passado a administrar quando tal condomínio foi formalmente constituído, o que ocorreu no dia 25 de Junho de 2008, tal como se pode ver pela Ata da Assembleia Ordinária junta aos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Tal conjunto habitacional é composto por cinco blocos, sendo que os blocos A, D e E foram totalmente construídos pela aqui R.,</font></i><br>
</p><p><i><font>5. O bloco B foi iniciado por uma outra empresa, denominada “N…”, tendo sido concluído pela aqui R.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. Num total de 12 habitações, a ré apenas realizou trabalhos parciais em sete.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. E nessas sete casas o anterior empreiteiro já tinha realizado todas as obras respeitantes a movimento de terras, estrutura de betão (incluindo as zonas comuns), tubagens de saneamento, águas pluviais e chão das garagens.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. O Bloco C não foi construído pela aqui ré, mas pela construtora N….</font></i><br>
</p><p><i><font>9. A totalidade da obra, antes de ter sido adjudicada à ré, foi realizada pela empresa N… - Sociedade de Construção Civil, S.A.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Por ter sido contratada pela proprietária e promotora da obra, a empresa C… & C… - Construções e Investimentos, Lda., para realizar o empreendimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. O empreendimento ficou a padecer de alguns vícios ou defeitos, alguns dos quais foram reparados e solucionados pela ré, mantendo-se, no entanto, ainda pendentes de reparação os vícios, defeitos ou anomalias que seguidamente se descrevem: </font></i><br>
</p><p><i><font>A) Infiltração no teto da Casa do Lixo (Blocos A e B)</font></i><br>
</p><p><i><font>Existe infiltração localizada no teto, mais precisamente ao longo de toda junta de dilatação entre os dois blocos existente dentro deste compartimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>E, no momento da vistoria o remate da tela na parede do Bloco A estava danificado.</font></i><br>
</p><p><i><font>B) Infiltrações no teto da garagem dos Blocos C) e D)</font></i><br>
</p><p><i><font>Existem infiltrações de água:</font></i><br>
</p><p><i><font>- no tecto da garagem dos Blocos C e D, localizadas nos orifícios de acesso às coretes das grelhas de ventilação;</font></i><br>
</p><p><i><font>- numa das ombreiras entre dois portões de garagem do Bloco D;</font></i><br>
</p><p><i><font>- sob a laje do pátio do Bloco C, em zonas das caixas de ventilação que neste caso são meramente decorativas.</font></i><br>
</p><p><i><font>- sob a laje da escada de acesso ao jardim do Bloco C, ao lado da entrada da garagem, que foi construída sem impermeabilização, sem aplicação de telas asfálticas;</font></i><br>
</p><p><i><font>- no Bloco C existe uma mancha na zona do topo da laje sob o muro de pedra.</font></i><br>
</p><p><i><font>- ainda no Bloco C, existe ainda uma zona com humidade e apresenta a pintura danificada, situada na parede do lado direito da entrada da garagem. Esta humidade é originada, por influência da humidade existente no muro em zona da escada assente sobre piso térreo, de difícil resolução pelo lado da garagem.</font></i><br>
</p><p><i><font>- As patologias por humidades existentes nos tetos, na sua maioria em zona do Bloco C, poderão ter origem apenas nos problemas existentes nas caixas de ventilação, e não propriamente pelas telas;</font></i><br>
</p><p><i><font>- ainda no Bloco C, existe ainda uma zona com humidade e apresenta a pintura danificada, situada na parede do lado direito da entrada da garagem. Esta humidade é originada, por influência da humidade existente no muro em zona da escada assente sobre piso térreo, de difícil resolução pelo lado da garagem. </font></i><br>
</p><p><i><font>O gesso da garagem do teto do Bloco C), está solto e o mesmo já caiu, em duas zonas específicas, sob a laje do pátio e sob a laje da escada de acesso ao jardim, do Bloco C).</font></i><br>
</p><p><i><font>C) Os passeios ou Decks entre os Blocos C) e B), encontram-se por terminar.</font></i><br>
</p><p><i><font>Os passeios ou decks do empreendimento estão concluídos, à exceção do patamar superior da escada de acesso ao jardim e respetiva escada, por terem sido efetuados trabalhos de prospeção e ensaios hidráulicos, com o objetivo de se detetar a origem das infiltrações.</font></i><br>
</p><p><i><font>D) Há infiltrações no teto e nas paredes da casa das máquinas da piscina</font></i><br>
</p><p><i><font>Existe infiltração localizada no teto, no canto superior, junto à entrada de tubagens.</font></i><br>
</p><p><i><font>A restante humidade que se verifica no teto, é originada por condensações e pelo facto do pormenor da tampa de acesso à casa das máquinas não ser o adequado coincidindo com o terreno, o que permite a entrada de águas pluviais e terra.</font></i><br>
</p><p><i><font>Existem também uma outra deficiência que é o facto da casa das máquinas não possuir qualquer ventilação natural ou forçada, o que origina as referidas condensações.</font></i><br>
</p><p><i><font>E) Fuga de água na piscina</font></i><br>
</p><p><i><font>A casa das máquinas tinha 25 cm de água, aquando da ida do Sr. Perito nomeado, para realizar a perícia.</font></i><br>
</p><p><i><font>Um dos três motores faltam peças e está totalmente calcinado, e por esse motivo não funciona;</font></i><br>
</p><p><i><font>O segundo motor também falta peças, daí não ter dado para colocar em funcionamento;</font></i><br>
</p><p><i><font>O terceiro motor está a funcionar normalmente, embora com algumas percas de água, pelos tubos que são visíveis;</font></i><br>
</p><p><i><font>Os motores estavam calcinados, devido à falta de manutenção.</font></i><br>
</p><p><i><font>Dos filtros, apenas um está em funcionamento, não foi detetado nada que esteja danificado; </font></i><br>
</p><p><i><font>Algumas pequenas tijoleiras (pastilha) estão deslocadas, sendo normal que de vez em quando descolem, mas tal, não gera fugas de água.</font></i><br>
</p><p><i><font>O sistema de tratamento de água automático está desativado e em parte desmontado;</font></i><br>
</p><p><i><font>Existe uma possível perda de água pelo tanque de compensação (Estranha-se a formulação, por não se tratar de um facto, mas antes de uma mera hipótese.);</font></i><br>
</p><p><i><font>A piscina quando funciona pelo caleiro de transbordo, a perda de água é superior, o que dá a entender que possa existir uma rutura no caleiro, que de seguida encaminha a água para o tanque de compensação.</font></i><br>
</p><p><i><font>O caleiro de transbordo apresenta algumas fissuras, o que faz com que haja infiltrações.</font></i><br>
</p><p><i><font>Na casa das máquinas alguns materiais estragados, devido as perdas de água tudo porque o tanque de compensação tem um tubo que quando está cheio, faz passagem direta para a casa das máquinas, o que faz que esta fique com excesso de água, e danifique os equipamentos;</font></i><br>
</p><p><i><font>O caleiro apresenta algumas fissuras.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. A reparação e eliminação de todos estes descritos defeitos, vícios ou anomalias foi devida e prontamente reclamada pelo A. à Ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Que procedeu à sua inspeção e monitorização.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Foram realizadas diversas intervenções por parte da R., ou por pessoas que a mesma contratou para esse efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Existindo alegados defeitos denunciados pela A, em zonas limítrofes às obras realizadas, pela empreiteira obrigaram a ré á realização de testes para aferir se as causas dos alegados defeitos adviriam dos seus trabalhos ou das obras de terceiros;</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Concluiu a ré que as causas estavam relacionadas com obras de outros empreiteiros.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Na sequência do facto aludido no ponto anterior a ré comunicou que somente efetuaria a reparação após a adjudicação pela autora, que teria, de assumir os custos de tais reparações;</font></i><br>
</p><p><i><font>18. As últimas das quais ocorreram no período compreendido entre os meses de Julho e Setembro de 2012, conforme decorre do teor da comunicação junta aos autos (doc. 2)</font></i><br>
</p><p><i><font>19. Pese embora as referidas intervenções, as mesmas não se revelaram suficientes e idóneas à erradicação definitiva dos referidos vícios ou anomalias, pelo que os mesmos se mantêm,</font></i><br>
</p><p><i><font>20. Motivo pelo qual, o autor, em 8 de Maio do corrente ano, através de carta registada com aviso de receção voltou a reclamar a eliminação dos aludidos defeitos.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. Face à ausência da sua eliminação, tais defeitos tenderão certamente a agravar-se, dado que a humidade resultante das infiltrações continuará a aumentar nos diversos compartimentos dos blocos que fazem parte do empreendimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>22. Sendo que devido aos defeitos descritos no Bloco C), a tinta está constantemente a descascar e alguns pedaços de cimento estão fragmentar-se.</font></i><br>
</p><p><i><font>23. Situação que pode colocar em risco a segurança das pessoas que frequentam tal garagem, além de poder danificar as viaturas automóveis que circulam na mesma.</font></i><br>
</p><p><i><font>24. Tais defeitos sobrevieram à data das escrituras de compra e venda por parte dos diversos condóminos.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Provocando um mau aspeto estético, implicando e demonstrando a perda de segurança e estanquidade do mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>26. As permanentes e constantes fugas ou perdas de água da piscina acarretam incómodos para o A. </font></i><br>
</p><p><i><font>27. Uma vez que têm de andar sempre a repor o nível de água da piscina, incomodando sempre alguns condóminos para tal efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>28. Os defeitos enumerados não impedem a utilização normal do Conjunto Habitacional ao fim a que se destina que é o da habitação.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. Pese embora as diversas intervenções que levou a cabo, até à presente data, ainda se mantém os apontados defeitos.</font></i><br>
</p><p><i><font>30. Em 28.6.2008 foi realizada uma Assembleia Ordinária de Condóminos, conforme consta da respetiva ata, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.</font></i><br>
</p><p><i><font>31. Antes de ser intentada a presente ação, entre as partes, foi trocada vária correspondência no sentido de lograrem concretizar um acordo extrajudicial.</font></i><br>
</p><p><i><u><font>Factualidade aditada</font></u></i><i><font>:</font></i><br>
</p><p><i><font>32. O autor [Condomínio do Edifício Parque …] não efetuou a necessária manutenção dos equipamentos da piscina: motores e filtros do sistema de tratamento da água.</font></i><br>
</p><p><i><u><font>Factos Não Provados</font></u></i><br>
</p><p><i><font>- Que a construção do Bloco C) tenha sido concluída pela empresa ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que as partes comuns dos Blocos C) e D) tenham sido efetuadas pela ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que a ré se tenha disponibilizado pela reparação e eliminação dos vícios supra elencados.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que a ré na sequência da missiva, junta como doc. n.º 3, tenha assumido a responsabilidade quanto à existência dos defeitos descritos e se tivesse comprometido a proceder à sua reparação.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que os defeitos nos Blocos destinados a habitação devido aos defeitos elencados no ponto 11 dos factos dados como assentes, acarretem perdas de energia.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que exista uma acumulação de bolores que produzem um cheiro nauseabundo, incomodativo, nos vários compartimentos onde se verificam as infiltrações. </font></i><br>
</p><p><i><font>- Que as manchas de humidade tenham origem na falta de isolamento das paredes e tetos.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que os defeitos impeçam a utilização normal do fim a que se destinam, a habitação.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que todos os defeitos se devem à deficiente execução pela ré das obras de construção do edifício habitacional.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que tenham existido sérios desentendimentos entre a promotora C… e empreiteira N…, relacionados com alegados defeitos de construção e alegado falta de pagamento da obra do Parque … litigaram em ação judicial que correu seus termos sob o n.º 4441/04.6…, do … Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial da … .</font></i><br>
</p><p><i><font>- Que em virtude tal litígio e das ações judiciais (providência cautelar e ação principal) o empreendimento em causa nos autos (denominada de Parque …) esteve cerca de um ano completamente paralisada;</font></i><br>
</p><p><i><font>- Afetando naturalmente a qualidade da obra, nomeadamente em termos de resistência, durabilidade e estética dos materiais</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608º, 635º, nº 3 a 5 e 639º, nº 1, do C.P.C.</font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se como defeitos da obra:</font><br>
</p><p><font>- Necessidade de reparação das infiltrações verificadas na casa das máquinas da piscina;</font><br>
</p><p><font>- Necessidade de reparação e eliminação os defeitos constantes da mesma piscina.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Sobre a matéria questionada, o Tribunal da Relação revogou a decisão da 1ª Instância, pronunciando-se nos seguintes termos:</font><br>
<p><i><font>“Como já tivemos oportunidade de referir em nota anterior, não se trata de um facto, mas antes de uma mera hipótese.</font></i><br>
</p><p><i><font>Do exposto decorre, tão simplesmente, que não se provou a existência de “fuga de água” da piscina.</font></i><br>
</p><p><i><font>Acresce que o Tribunal deu como provada a ausência de manutenção por parte do recorrido, dos equipamentos da piscina [«Um dos três motores faltam peças e está totalmente calcinado, e por esse motivo não funciona; O segundo motor também falta peças, daí não ter dado para colocar em funcionamento; O terceiro motor está a funcionar normalmente, embora com algumas percas de água, pelos tubos que são visíveis; Os motores estavam calcinados, devido à falta de manutenção; Dos filtros, apenas um está em funcionamento, não foi detetado nada que esteja danificado; O sistema de tratamento de água automático está desativado e em parte desmontado»], dando ainda como provado que [Na casa das máquinas alguns materiais estragados, devido as perdas de água tudo porque o tanque de compensação tem um tubo que quando está cheio, faz passagem direta para a casa das máquinas, o que faz que esta fique com excesso de água, e danifique os equipamentos], factualidade esta, da qual decorre a conclusão de que o problema da inundação da casa das máquinas deriva da existência de um estranho tubo que, por razões que se desconhecem, vai desaguar nesse local. </font></i><br>
</p><p><i><font>Não se provando a existência de “fuga de água da piscina”, deverá a sentença ser revogada nas alíneas D) e E) do dispositivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Procede o recurso neste segmento</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Os factos apurados relativos às infiltrações verificadas na casa das máquinas da piscina e eliminação os defeitos constantes da mesma piscina são:</font><br>
</p><p><font>-</font><font> </font><font>D) Há infiltrações no teto e nas paredes da casa das máquinas da piscina</font><br>
</p><p><u><font>Existe infiltração localizada no teto, no canto superior, junto à entrada de tubagens</font></u><font>.</font><br>
</p><p><font>A restante humidade que se verifica no teto, é originada por condensações e pelo facto do pormenor da tampa de acesso à casa das máquinas não ser o adequado coincidindo com o terreno, o que permite a entrada de águas pluviais e terra.</font><br>
</p><p><font>Existem também uma outra deficiência que é o facto da casa das máquinas não possuir qualquer ventilação natural ou forçada, o que origina as referidas condensações.</font><br>
</p><p><font>-</font><font> </font><font>E) Fuga de água na piscina</font><br>
</p><p><font>A casa das máquinas tinha 25 cm de água, aquando da ida do Sr. Perito nomeado, para realizar a perícia.</font><br>
</p><p><font>Um dos três motores faltam peças e está totalmente calcinado, e por esse motivo não funciona;</font><br>
</p><p><font>O segundo motor também falta peças, daí não ter dado para colocar em funcionamento;</font><br>
</p><p><font>O terceiro motor está a funcionar normalmente, embora com algumas percas de água, pelos tubos que são visíveis;</font><br>
</p><p><font>Os motores estavam calcinados, devido à falta de manutenção.</font><br>
</p><p><font>Dos filtros, apenas um está em funcionamento, não foi detetado nada que esteja danificado; </font><br>
</p><p><font>Algumas pequenas tijoleiras (pastilha) estão deslocadas, sendo normal que de vez em quando descolem, mas tal, não gera fugas de água.</font><br>
</p><p><font>O sistema de tratamento de água automático está desativado e em parte desmontado;</font><br>
</p><p><font>Existe uma possível perda de água pelo tanque de compensação;</font><br>
</p><p><u><font>A piscina quando funciona pelo caleiro de transbordo, a perda de água é superior</font></u><font>, o que dá a entender que possa existir uma rutura no caleiro, que de seguida encaminha a água para o tanque de compensação.</font><br>
</p><p><u><font>O caleiro de transbordo apresenta algumas fissuras, o que faz com que haja infiltrações</font></u><font>.</font><br>
</p><p><u><font>Na casa das máquinas alguns materiais estragados, devido as perdas de água tudo porque o tanque de compensação tem um tubo que quando está cheio, faz passagem direta para a casa das máquinas, o que faz que esta fique com excesso de água, e danifique os equipamentos</font></u><font>;</font><br>
</p><p><u><font>O caleiro apresenta algumas fissuras</font></u><font>.</font><br>
</p><p><font>Sublinhados nossos e que representam factualidade que consubstancia vícios da obra e a necessitar reparação.</font><br>
</p><p><font>E a piscina perde água, nomeadamente quando funciona pelo caleiro de transbordo. O que não deixa de ser vício da obra, apesar d | [0 0 0 ... 0 0 0] |
FTJtu4YBgYBz1XKv9Af6 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível</font></div><br>
<br>
<font>.</font><br>
<p><font>ATP - ASSOCIAÇÃO TÊXTIL E VESTUÁRIO DE PORTUGAL, associação patronal, com sede na rua …, no edifício do …, nº …, NIPC 501…5, intentou contra o CENTRO TECNOLÓGICO DAS INDÚSTRIAS TÊXTIL E DO VESTUÁRIO DE PORTUGAL (CITEVE), pessoa coletiva de utilidade pública sem fins lucrativos, com sede na rua …, …, NIPC 502…6, a presente ação declarativa, sob a forma comum, tendo pedido seja declarada como legítima possuidora das 817 Unidades de Participação (UP), identificadas no artigo 38º, da petição inicial, e seja o Réu condenado a averbar no respetivo livro de registos das UP a posse da Autora sobre esses títulos e a abster-se de praticar todo e qualquer ato que dificulte ou obstaculize o exercício dos direitos inerentes a essas UP, designadamente os previstos nos artigos 7º e 8º dos seus estatutos.</font><br>
</p><p><font>Para tanto, alegou, em síntese, que:</font><br>
</p><p><font>a) A Autora é uma associação de empregadores, sem fins lucrativos, tendo por objeto a representação de todas as empresas singulares ou coletivas que no País exerçam a atividade de têxteis e vestuário ou outras atividades afins ou complementares e foi constituída para assegurar a defesa e a promoção dos legítimos interesses da atividade têxtil e de vestuário, resultando da fusão com a Associação Nacional das Empresas Têxteis – ANET e da anterior fusão entre a Associação Portuguesa das Indústrias de Malha e Confeção e a Associação Portuguesa de Têxteis e Vestuário, que, por sua vez, se havia fundido com a Associação Portuguesa dos Exportadores de Têxteis;</font><br>
</p><p><font>b) O Réu é uma pessoa coletiva de utilidade pública sem fins lucrativos, criada no âmbito do Decreto-Lei n.º 249/86, de 25.08, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 312/95, de 24.11;</font><br>
</p><p><font>c) O Réu foi fundado por acordo constitutivo, celebrado em 08.05.1989, tendo os seus estatutos sido publicados no Diário da República, nº142, 3ª série, de 23.06.1989;</font><br>
</p><p><font>d) A Autora foi sócia fundadora do Réu e é dona e legítima possuidora de 72 UP; </font><br>
</p><p><font>e) As vicissitudes pelas quais o setor têxtil e vestuário atravessou desde 1989, designadamente as de natureza económica, ditaram a extinção de muitas das empresas têxteis que aderiram ao projeto de criação do CITEVE e foram suas sócias fundadoras;</font><br>
</p><p><font>f) Constatando-se, em 2017, que, pelo menos, 231 empresas, detentoras de um total de 817 UP, tinham sido declaradas insolventes ou tinham sido dissolvidas e liquidadas, sem que tivesse sido dado qualquer destino às UP que estas detinham, ficando assim essas empresas impossibilitadas de exercerem os direitos e obrigações inerentes às UP de que erem titulares, designadamente de participarem e deliberarem nos órgãos sociais e na vida do CITEVE, não obstante continuarem a constar como titulares dessas UP no respetivo livro de registo do CITEVE;</font><br>
</p><p><font>g) Tal teve como consequência que o Estado, enquanto detentor de 1.206 UP, se tornou, contra a sua vontade, no sócio maioritário, dele passando a depender, direta ou indiretamente, todas as decisões dos órgãos sociais do CITEVE;</font><br>
</p><p><font>h) A Autora desenvolveu infindáveis diligências para contactar os administradores da massa insolvente das associadas do CITEVE, que tinham sido declaradas insolventes, assim como os liquidatários e/ou sócios das associadas que foram dissolvidas e liquidadas, com o intuito de adquirir as UP que estas detinham, tendo tais diligências sido votadas a um completo insucesso;</font><br>
</p><p><font>i) Face à inércia prolongada quanto a uma solução para este problema concreto e à inviabilidade de contacto dos titulares dessas UP e à sua livre transmissibilidade, a solução para esse impasse que foi considerada como sendo a mais adequada e exequível foi que a Autora, enquanto associação com maior representatividade no setor têxtil e do vestuário, tomasse para si essas UP, mediante o exercício de poderes possessórios, com vista à sua futura aquisição por via da usucapião, com isso se restabelecendo o normal funcionamento do CITEVE;</font><br>
</p><p><font>j) Assim, em 22.12.2016, a Direção da Autora reuniu-se e deliberou, por unanimidade, assumir a posse das 817 UP, pertencentes aos mencionados 231 associados fundadores do CITEVE;</font><br>
</p><p><font>k) A deliberação foi do seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>(i) - Fazer suas as identificadas UP e assumir, desde logo, a sua posse, passando a usá-las, fruí-las e a delas dispor em termos de proprietária;</font><br>
</p><p><font>(ii) - Que a inversão do título de posse das UP se fizesse com total transparência e de forma pública e pacífica, através da celebração de escritura pública onde ficasse expressa essa vontade de apropriação e a assunção da posse sobre as UP em termos de proprietária, e que, seguidamente, se procedesse à publicitação desse ato através da publicação desse instrumento num órgão de comunicação social;</font><br>
</p><p><font>l) A Direção da Autora deliberou ainda por unanimidade conferir poderes bastantes ao Presidente e Vice-Presidente da Direção para outorgarem a competente escritura notarial e para praticarem todos os atos e assinarem todos documentos adequados à consecução dos fins que decorrem da deliberação de apossamento das UP;</font><br>
</p><p><font>m) No dia 23.12.2016, no cartório notarial …, do Dr. AA, foi lavrada a escritura notarial de assunção da posse pela Autora das referidas UP;</font><br>
</p><p><font>n) Dessa escritura, a Autora fez constar que «[…] pela via da inversão do título de posse, se apossava das UPs, passando a usá-las e frui-las, pública e pacificamente, como se fosse proprietária das mesmas»;</font><br>
</p><p><font>o) Tendo ainda expressado a sua vontade de que pretendia fazer suas essas identificadas UP e que assumia, desde logo, a sua posse, passando a usá-las, frui-las e a delas dispor como proprietária;</font><br>
</p><p><font>p) E que por aquela escritura, a partir daquela data, reconhecia os referidos direitos sobre as UP que estavam identificadas no documento a ela anexo;</font><br>
</p><p><font>q) Seguidamente, a 29.12.2016, a Autora procedeu à publicação de um anúncio no jornal da localidade Opinião Pública, onde publicitou que se tinha apossado das UP, tendo ainda procedido à sua identificação e dos primitivos titulares;</font><br>
</p><p><font>r) Por carta datada de 04.01.2017 e recebida a 9 desse mês, a Direção da Autora comunicou ao Réu que se tinha apossado das UP e requereu o averbamento, em seu nome, das referidas 817 UP, pertencentes aos identificados 231 associados;</font><br>
</p><p><font>s) A resposta do CITEVE a esse pedido chegou a 21.07.2017, por carta datada de 30.06.2017;</font><br>
</p><p><font>t) E na qual, em síntese, comunicou que se recusa a reconhecer a Autora como possuidora das UP e a aceder ao seu pedido de averbamento das mesmas em seu nome;</font><br>
</p><p><font>u) Em resposta a essa missiva, a 01.08.2017, a Direção da Autora fez chegar ao Réu uma carta a referir-lhe que:</font><br>
</p><p><font>«[…] não concordamos com a posição de V. Exas., por considerarmos que a operação efetuada, de inversão do título de posse das Unidades de Participação, está em conformidade com a lei e os Estatutos do CITEVE, e só assim pôde ser realizada.</font><br>
</p><p><font>Como nos tinham informado da decisão de V. Exas. de solicitar um parecer jurídico, a ATP decidiu também proceder de igual modo, pelo que estamos a aguardar a sua elaboração.</font><br>
</p><p><font>Não obstante isso, continuaremos a atuar de forma correspondente ao exercício do direito de propriedade sobre essas Participações, pelo que, em face da posição assumida por V. Exas., iremos promover as diligências necessárias para obter a confirmação do direito que invocamos e para obstar a que se pratiquem atos que perturbem a posse da ATP sobre essas Participações.</font><br>
</p><p><font>Manteremos, como sempre, total abertura no diálogo e cooperação com V. Exas., e informá-los-emos regularmente sobre a evolução da situação»;</font><br>
</p><p><font>v) Em face do silêncio do CITEVE, a Autora, em 15.03.2018, remeteu nova comunicação ao seu Presidente com o seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>«Exmos Snrs:</font><br>
</p><p><font>Em resposta à carta de V. Excias, datada de 30 de junho de 2017, onde nos foi transmitida a recusa do averbamento das 817 unidades de participação (UP’s) do CITEVE que relacionámos na nossa carta datada de 4 de janeiro de 2017, cumpre-nos referir o seguinte:</font><br>
</p><p><font>1. A posse das Unidades de Participação pela ATP</font><br>
</p><p><font>O firme propósito da ATP, no que se prende com as UP’s em questão, é, e sempre foi, o de, num primeiro momento, exercer sobre elas a posse em termos de proprietária durante certo lapso de tempo para depois, num segundo momento, vir a adquirir o direito de propriedade sobre as mesmas pela via da usucapião.</font><br>
</p><p><font>Foi com esse objetivo que, oportunamente, desencadeámos uma série de procedimentos - que foram suficientemente relatados na carta que dirigimos a V. Excias – e que configuram já verdadeiros atos possessórios das referidas UP’s praticados pela ATP: a Deliberação da ATP, de 22 de dezembro de 2016; e a escritura de justificação notarial de 23 de dezembro de 2016, apresentada ao CITEVE em 4 de janeiro de 2017.</font><br>
</p><p><font>Desta forma, a ATP praticou já atos possessórios sobre as UPs do CITEVE, mais concretamente: de modo reiterado e com publicidade, atos materiais que correspondem ao exercício do direito de propriedade (segundo o artigo 1251.º do Código Civil). E, assim, adquiriu originariamente a posse sobre as UPs no CITEVE (por apossamento, nos termos do artigo 1263.º, n.º 1, do Código Civil).</font><br>
</p><p><font>2. A necessidade de definição do destino das UP’s objeto de posse pela ATP</font><br>
</p><p><font>A insolvência ou liquidação de muitos associados deixou as respetivas UPs numa situação de abandono que subverte os princípios e pressupostos da criação e do funcionamento do CITEVE – nomeadamente o de ser obrigatoriamente o setor privado o motor do CITEVE.</font><br>
</p><p><font>Isto porque, a exclusão automática dos sócios em virtude da sua insolvência ou liquidação não foi acompanhada de nenhum procedimento de transmissão das respetivas unidades de participação, não obstante as tentativas frustradas de contacto com os ex-sócios.</font><br>
</p><p><font>E os ESTATUTOS do CITEVE não contêm qualquer preceito que defina, para este caso concreto, o destino a dar a estas UPs.</font><br>
</p><p><font>Definição que se impõe, pois não pode haver unidades de participação sem titular e a falta de exercício dos direitos sociais respeitantes a essas unidades de participação desvirtua o equilíbrio de interesses que esteve presente no momento da constituição do CITEVE e que condiciona todo o seu funcionamento.</font><br>
</p><p><font>Este vazio legal carece de uma solução urgente, sob pena de frustração dos interesses e necessidades que presidiram à criação dos Centros Tecnológicos, em geral, e do CITEVE, em especial.</font><br>
</p><p><font>3. A solução legal</font><br>
</p><p><font>A solução mais expedita, razoável e sem impedimentos legais, passa pela admissibilidade do exercício da posse sobre as UPs do CITEVE, num primeiro momento, e da posterior aquisição do direito de propriedade sobre as mesmas pela via do instituto da usucapião, num segundo momento.</font><br>
</p><p><font>Nessa medida, é nossa firme convicção que o CITEVE está obrigado a averbar no respetivo livro de registos das UP’s a posse da ATP sobre esses títulos e a abster-se de praticar todo e qualquer ato que possa dificultar ou obstaculizar a que possamos exercer os direitos e obrigações inerentes a essas UP’s, designadamente os previstos nos artigos 7º e 8º dos ESTATUTOS.</font><br>
</p><p><font>E assim sendo, não podemos deixar de reiterar a V. Excias o nosso pedido de averbamento da posse das UP’s no competente livro de registo do CITEVE.</font><br>
</p><p><font>Com os melhores cumprimentos. O Presidente da Direção»;</font><br>
</p><p><font>w) Essa carta também não teve resposta;</font><br>
</p><p><font>x) Em abril de 2018, a Autora recebeu um aviso convocatório para uma reunião do Conselho Geral do CITEVE, a ter lugar no dia 23.04.2018, pelas 14 horas;</font><br>
</p><p><font>y) Na impossibilidade de se fazer representar por qualquer membro da Direção, a 16.04.2018, a Autora enviou uma carta ao Presidente do Conselho Geral do CITEVE a delegar a sua representação na sócia Associação dos Industriais de Cordoaria e Redes;</font><br>
</p><p><font>z) Aí mencionando que:</font><br>
</p><p><font>«Na impossibilidade de podermos comparecer na reunião do conselho geral que se vai realizar no próximo dia 23 de abril de 2018, pelas 14:00 horas, nos termos do artigo 16º, nº 3 dos estatutos e enquanto donos de 72 (setenta e duas) e possuidores de 817 (oito centos e dezassete) Unidades de Participação, comunica-se a V. Exa. que mandatamos a Associação dos Industriais de Cordoaria e Redes, com sede na rua … nº…., …, …. - … e NIPC 500…5, para nos representar nessa reunião, podendo discutir, propor e votar qualquer deliberação nos termos que entender.»</font><br>
</p><p><font>aa) Sucede que o Réu impediu que o associado, a quem a Autora delegou a sua representação, pudesse participar na reunião do Conselho Geral com os votos correspondentes às 817 UP de que esta era possuidora, aceitando apenas que esse seu representante participasse com os 72 votos que correspondiam às 61 UP que tinha subscrito e às 11 que tinha adquirido posteriormente;</font><br>
</p><p><font>bb) Conforme melhor consta da ata da reunião, logo no seu início, antes da leitura da convocatória e de se entrar na ordem do dia, o Presidente da Mesa do Conselho Geral do Réu, saudou os associados presentes e informou-os que: «[…] de acordo com o registo da lista de associados e respetivas unidades de participação, a ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal teria registadas 72 unidades de participação (U.P.)»;</font><br>
</p><p><font>cc) Na sequência desse anúncio, o associado a quem a Autora tinha delegado a sua representação, pediu a palavra para comunicar que: «[…] a ATP lhe delegara a representação na presente reunião, mas nos termos do mandato conferido seria suposto representar 72 U.P. de que são “donos” e 817 de que reclamam a posse. Uma vez que apenas foram reconhecidas as 72 U.P. (…) entendeu que a situação “colide abertamente” com o mandato que lhe foi conferido pela ATP e que não tinha condições para a representar nesta reunião. Acrescentou que a sua participação se circunscrevia à representação da AICR – Associação dos Industriais de Cordoaria e Redes»;</font><br>
</p><p><font>dd) A Autora foi impedida pelo Réu de participar na reunião e de exercer os direitos inerentes às 817 UP de que é possuidora, o que se traduz em mais um ato material do CITEVE de turbação da posse da Autora relativamente àquelas UP.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Regularmente citado, o Réu CITEVE apresentou contestação, a fls. 104 a 117, onde, em síntese, alegou, como fundamentos de defesa, pela ordem seguinte, que:</font><br>
<p><font>1) O pedido formulado é legalmente inviável;</font><br>
</p><p><font>2) O pedido de averbamento é extemporâneo, por a pretensão agora formulada judicialmente (pedido de averbamento da posse) não coincidir com o que lhe foi feito antes da propositura da ação (pedido de averbamento da aquisição por usucapião);</font><br>
</p><p><font>3) A Autora não praticou atos de posse desde a data da celebração da escritura até à reunião do Conselho Geral do CITEVE de 23.04.2018;</font><br>
</p><p><font>4) A petição inicial é inepta ou por a causa de pedir ser ininteligível ou por ser insuficiente (para a aquisição por usucapião ou para a posse) ou omitir a alegação de factos essenciais ou por existir contradição entre o pedido e a causa de pedir;</font><br>
</p><p><font>5) Houve, na propositura da ação, preterição de litisconsórcio natural passivo, porque os demais associados têm direito a contradizer a pretensão da Autora, na medida em que podem vir a ser afetados na sua esfera jurídica, já que, por um lado, parte deles são os titulares das UP pretensamente apossadas e, por outro lado, quanto aos restantes, a eventual procedência da ação provocará uma modificação quanto aos termos da representação dos associados no CITEVE, assim como no Conselho Geral.</font><br>
</p><p><font>A título de impugnação, sustentou que a celebração da escritura e a propositura da presente ação constitui um expediente pelo qual a Autora se pretende apropriar de modo gratuito das UP, no valor nominal total de € 407.519,70, sem contribuição alguma da sua parte para o fundo social do CITEVE. Para além disso, invocou que a titularidade das UP (em caso de insolvência) nunca fica desconhecida, não podendo ser atribuídas a qualquer credor, mas apenas transacionadas pelo respetivo administrador da insolvência a outro associado nos termos e nas condições previstas nos Estatutos e, uma vez encerrada a liquidação sem que tenham sido objeto de qualquer transação, extinguem-se, acrescendo o valor representado pelas UP extintas proporcionalmente ao valor das restantes.</font><br>
</p><p><font>Terminou pedindo a procedência das exceções, com a consequente negação do provimento das pretensões da Autora.</font><br>
</p><p><font>Requereu ainda a condenação da Autora como litigante de má-fé, no pagamento de multa e indemnização.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Através do requerimento com a Ref.ª 31…1, a ANICEP/APIV – ASSOCIÇÃO NACIONAL DE INÚSTRIAS TÊXTIL E DE VESTUÁRIO DE PORTUGAL (ANICEP/APIV), CIPC 500…7, com sede na avenida …, …, …, deduziu o incidente de intervenção principal espontânea, tendo pedido seja admitida a intervir na presente ação por ter interesse paralelo ao da Ré, sustentando que a causa deve ser julgada totalmente improcedente (cfr. fls. 245 a 257).</font><br>
<p><font>Invocou, para tanto, que a Autora se arroga possuidora de 2 UP, anteriormente tituladas pela sociedade N.. & CA, L.da, sucedendo, no entanto, que essas participações foram por si adquiridas no âmbito do processo de insolvência relativo àquela, que pendeu no Juízo do Comércio de … – J…, sob o n.º 454/11.0… .</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Notificados para se pronunciarem sobre a admissibilidade do incidente (cfr. fls. 261):</font><br>
<p><font>- A Autora opôs-se à intervenção requerida, com o fundamento de que, para além de ter sido deduzida de forma extemporânea, a Requerente não dispõe de um interesse igual ao do autor ou do réu que lhe permita figurar na ação em litisconsórcio (cfr. fls. 261 a 266);</font><br>
</p><p><font>- O Réu opôs-se, de igual modo, à intervenção, alegando a intempestividade do requerimento e, bem assim, o facto de a transação eventualmente celebrada com a N… & Cª., L.da, ser-lhe ineficaz, para além de inválida, tendo, por isso, sido recusado o averbamento da aquisição, como a Requerente teve oportuno conhecimento. Sem prejuízo, admitiu que a Requerente possa ter intervenção neste processo, não pelo incidente que deduziu, mas por consequência da exceção de preterição de litisconsórcio necessário passivo que arguiu em sede de contestação (cfr. fls. 267 a 270).</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Através do requerimento com a Ref.ª 318…9, a ANICEP/APIV respondeu às oposições deduzidas pelas partes primitivas, pugnando pela tempestividade da dedução do incidente (cfr. fls. 289 a 293).</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Por despacho de fls. 295 a 296, foi concedido à Autora a oportunidade para exercer o contraditório quanto à matéria de exceção articulada na contestação, faculdade de que se prevaleceu através do requerimento de fls. 300 a 315, com a Ref.ª 32…8.</font><br>
<p><font>Nesse requerimento, em súmula:</font><br>
</p><p><font>- Quanto à inviabilidade legal do pedido de averbamento, alegou que:</font><br>
</p><p><font>a) Por um lado, no caso, está em causa uma situação de cumulação real de pedidos, em que o averbamento constitui a consequência do pedido de reconhecimento da Autora como legítima possuidora das UP;</font><br>
</p><p><font>b) Por outro lado, no que se refere aos Estatutos, eles não contemplam qualquer disposição que impeça a aplicação do instituto da posse às participações sociais, o qual tem natureza imperativa e, desse modo, prevalece sobre as normas convencionais;</font><br>
</p><p><font>- Quanto à extemporaneidade do pedido de averbamento, alegou que:</font><br>
</p><p><font>c) Face à recusa do pedido de averbamento pela Ré, era desnecessário e inútil a renovação de um procedimento cuja resposta negativa se sabia de antemão;</font><br>
</p><p><font>d) O Réu não invocou qualquer norma, legal ou estatutária, de que resulte a obrigatoriedade do recurso a qualquer procedimento interno antes de se seguir via judicial;</font><br>
</p><p><font>- Quanto à ininteligibilidade da causa de pedir, sustentou que:</font><br>
</p><p><font>e) Em primeiro, a Ré interpretou convenientemente a causa de pedir articulada;</font><br>
</p><p><font>f) Em segundo, essa causa de pedir não constituiu na usucapião, mas apenas na posse, em cuja qualidade se pretende ver reconhecida, tendo reservado a invocação da inversão do título da posse apenas para o caso de se entender que não se verificam os requisitos de apossamento;</font><br>
</p><p><font>- Quanto à falta de causa de pedir, invocou que:</font><br>
</p><p><font>g) A posse pode existir independentemente de um poder físico sobre a coisa, sendo que a</font><br>
</p><p><font>posse de uma participação social concretiza-se pelo exercício de direitos sociais, não pressupondo o corpus da posse uma relação física;</font><br>
</p><p><font>h) A Autora exerceu atos possessórios quando deliberou a assunção da posse das UP em 22.12.2016, quando apresentou ao Réu a escritura em que corporizou a declaração de assunção da posse, quando reiterou a invocação da titularidade das UP na reunião do Conselho Geral de 23.04.2018 e quando propôs a presente ação;</font><br>
</p><p><font>- Quanto à omissão de alegação de factos essenciais, reiterou as considerações antecedentes, tendo ainda acrescentado que:</font><br>
</p><p><font>i) As UP apossadas encontravam-se ao abandono, tendo as sociedades que as titulavam deixado de as possuir há mais de um ano, não exercendo os direitos sociais correspondentes;</font><br>
</p><p><font>- Quanto à ilegitimidade passiva, referiu que:</font><br>
</p><p><font>j) Tal como a ação está configurada, só o Réu tem interesse direto em contradizer, pois que o exercício dos direitos sociais relativos às UP tem aquele como único destinatário.</font><br>
</p><p><font>Com esse requerimento, juntou o douto parecer, da autoria da Professora Maria Rosa Epifânio, que consta de fls. 316/verso a fls. 335.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Por sua vez, o Réu CITEVE requereu a junção aos autos do douto parecer da autoria do Professor Doutor BB, que consta de fls. 340 a 363.</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Por despacho de 08.07.2019 (cfr. fls. 365), foi determinada a notificação da Autora para indicar o valor atual das UP, ao que respondeu nos termos do requerimento com a Ref.ª 33…7 (cfr. fls. 366 a 369), matéria sobre a qual a Ré exerceu o contraditório respetivo, através do requerimento com a Ref.ª 33…6 (cfr. fls. 373).</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Foi proferido despacho saneador</font></b><font> no qual se decidiu:</font><br>
<p><i><font>“a) Julgo a ação totalmente improcedente, absolvendo o Réu CITEVE do pedido; </font></i><br>
</p><p><i><font>b) Julgo inverificados os pressupostos de condenação da Autora como litigante de má fé”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Desse despacho/sentença recorreu a autora, recurso per saltum (art. 678 do CPC), recurso que foi admitido pelo relator, não havendo reclamação para a conferência, cumprido que foi o disposto no nº 5 do referido art. 678.</font><br>
</p><p><font>No recurso interposto </font><b><font>conclui a recorrente</font></b><font>:</font><br>
</p><p><i><font>“1. A sentença recorrida revela uma leitura formalista e redutora do corpus possessório, desconsiderando a especificidade do domínio de facto quando exercido sobre um bem incorpóreo, como é o caso das UP (Unidades de Participação) e não tomando em devida conta que entre o animus possidendi e o corpus intercede uma relação biunívoca: não há corpus sem animus, nem animus sem corpus;</font></i><br>
</p><p><i><font>2. A tutela possessória visa assegurar a defesa da paz pública, o valor da continuidade do exercício de posições jurídicas, a protecção da confiança do possuidor e a aparência da titularidade de um direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Para que se verifique uma situação possessória é irrelevante que o sujeito possuidor tenha, ou não, na sua esfera jurídica, uma causa legítima de domínio da coisa. Na primeira hipótese, a posse é causal; na segunda, é formal;</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Ao contrário do que sucede na posse causal, na posse formal o sujeito apresenta-se desprovido do direito sobre a coisa, mas em ambos os casos, o conteúdo e os efeitos da posse são os mesmos. Assim, tanto pode invocar a posse aquele que tem o direito – p. ex., o proprietário – como aquele que não o tem – p. ex., o sujeito que se apossou do bem;</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Nessa conformidade, a posse, mesmo quando causal, reveste-se de clara autonomia perante o direito de fundo, tanto no que se refere à sua constituição como às suas vicissitudes; por isso que, na sua constituição, é possível a aquisição da posse sem que haja a aquisição do direito, como sucede no apossamento;</font></i><br>
</p><p><i><font>6. De igual modo, pode transmitir-se o direito de fundo sem que a posse exista na esfera jurídica do transmitente, como é o de o sujeito que vende a coisa já ter perdido a posse pela permanência da posse de outrem por mais de um ano (art. 1267.º, n.º 1, al. a), do CC);</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Pela mesma ordem de razões, a transmissão da posse não é pressuposto da transmissão do direito; em regra, a transmissão da posse é posterior à do direito, exigindo cedência da coisa pelo transmitente (art. 1267.º, n.º 1, al. c), com tradição material ou simbólica (art. 1263.º, al. b), ambos do CC);</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Inversamente, pode haver transmissão da posse sem existência do direito de fundo na esfera jurídica do transmitente, como ocorre quando aquele que adquiriu posse por apossamento vende a coisa a terceiro;</font></i><br>
</p><p><i><font>9. No plano dos fenómenos extintivos a posse goza de autonomia relativamente ao direito de fundo, como é o caso da extinção deste por superveniência de aquisição tabular a favor de terceiro, mantendo-se, ainda assim, a posse;</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Assim sendo, para efeitos de tutela possessória, é irrelevante o facto de o possuidor ser ou não titular do direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Para que exista posse é necessária a verificação simultânea do corpus, enquanto subordinação da coisa à vontade de um sujeito, com início no momento da constituição da posse por apossamento, e do animus possidendi, consubstanciado na intenção do sujeito de exercer sobre a coisa, como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio;</font></i><br>
</p><p><i><font>12. O art. 1251.º do CC consagra a concepção subjectiva da posse, co-envolvendo um elemento empírico – exercício de poderes de facto – e um elemento psicológico-jurídico – o animus de se comportar como titular de um direito real;</font></i><br>
</p><p><i><font>13. A posse, enquanto poder de facto sobre a coisa, não depende da sua detenção física; existe logo que a coisa entra na órbita de disponibilidade táctica do possuidor, no sentido em que que sobre ela pode exercer, querendo, poderes empíricos;</font></i><br>
</p><p><i><font>14. O que nesta sede releva é, tão-só, a circunstância de a coisa ingressar na esfera jurídica de disponibilidade do possuidor; a posse mantém-se não apenas enquanto durar a actuação correspondente ao exercício do direito, como também enquanto existir a possibilidade de a continuar, como resulta claramente dos arts. 1257.º, n.º 1, do CC e 1252 n.º 1, do CC (exercício da posse por intermédio de outrem);</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Quando o objecto da posse não é uma coisa corpórea, como sucede com as UP dos autos, o corpus assume especial relevância como subordinação da coisa à vontade do sujeito, na medida em que ingresse na órbita de senhorio ou de interesse do possuidor;</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Nos termos do disposto no art. 1263.º do CC, a posse adquire-se originariamente por apossamento ou inversão do título, na medida em que surge ex novo na esfera de disponibilidade do adquirente, não sendo geneticamente dependente de uma posse anterior;</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Mesmo que tenha existido uma posse anterior (como acontece em todos os casos de usurpação), a posse do adquirente não provém dela, não tem causa nela, mas adquire-se contra ela ou apesar dela;</font></i><br>
</p><p><i><font>18. São requisitos do apossamento a materialidade, a reiteração e a publicidade;</font></i><br>
</p><p><i><font>19. A materialidade é entendida como um poder de facto, não necessariamente material ou físico, num sentido relacional de contacto corpóreo ou semelhante, mas de disponibilidade fáctica tomada em sentido sócio-cultural;</font></i><br>
</p><p><i><font>20. A reiteração não tem um significado de ininterrupção, continuidade ou periodicidade determinada, mas é entendida como acto de intensidade mínima originadora de uma sujeição prolongada da coisa ao possuidor;</font></i><br>
</p><p><i><font>21. A publicidade consubstancia-se na prática dos poderes empíricos sobre a coisa de forma pública, à vista de todos quantos participam no círculo social onde o domínio é exercido, não sendo exigível, porém, nenhum consensus populi sobre a titularidade do direito; nesta asserção, a publicidade não legitima a posse, antes exclui a clandestinidade da prática reiterada em que assenta;</font></i><br>
</p><p><i><font>22. Por isso que, nos termos do disposto no art. 1262.º do CC, a posse é pública se exercida de modo a ser conhecida pelos interessados; é oculta quando os interessados a não possam conhecer;</font></i><br>
</p><p><i><font>23. Nos termos do disposto no art. 1252.º do CC, a posse presume-se quando alguém exerce um poder de facto sobre a coisa, segundo um critério de aparência que resolve a dúvida a favor de quem publicamente aparente ser possuidor;</font></i><br>
</p><p><i><font>24. Nos termos do art. 125.7º, n.º 2, do CC, adquirida a posse, presume-se a sua manutenção enquanto o possuidor conservar a possibilidade de actuar sobre a coisa; o “corpus” permanece como espiritualizado, enquanto o possuidor tiver a possibilidade de o exercer;</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Verificado o apossamento, a posse anterior cessa após um ano e um dia de duração da nova posse, nos termos do art. 1267.º, n.º 1, al. d) do CC, podendo novo possuidor usar a coisa possuída, sem que lhe seja exigível a prática de todos os actos materiais qualificativos do direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>26. A insolvência ou liquidação de muitos associados do CITEVE deixou as respectivas UP numa situação de abandono que subverte os princípios e pressupostos da criação e do funcionamento do Réu – nomeadamente, a obrigatoriedade do domínio do sector privado no conjunto da participação associativa;</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Apesar das múltiplas diligências encetadas pela Autora, o Réu não observou nenhum procedimento de transmissão das UP desses associados, que assim foram deixadas sem titular, com a correspondente falta de exercício dos direitos sociais e consequente desvirtuamento dos princípios da criação e pressupostos de funcionamento do CITEVE;</font></i><br>
</p><p><i><font>28. Nesse circunstancialismo, e para obviar às descritas consequências gravosas daí advenientes, a Autora, em face da inércia e desinteresse do Réu e à míngua de melhor solução, decidiu adquirir a posse das UP;</font></i><br>
</p><p><i><font>29. As UP são parti | [0 0 0 ... 0 0 0] |
FDJtu4YBgYBz1XKv8wdz | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><b><font>Caixa de Crédito Agrícola Mútuo</font></b><font> do ..., com sede na Rua …, nº 14 em …, </font><b><font>instaurou</font></b><font> </font><b><font>contra</font></b><font> AA, solteiro, maior, contribuinte n. 14…2, residente na Rua …, n. …, em …, e BB, viúva, residente na mesma morada, a presente acção declarativa, a seguir a forma única do processo comum, pedindo a final a condenação dos RR no pagamento da quantia de €167 901,11 (cento e sessenta e sete mil, novecentos e um euros e onze cêntimos), acrescida dos respectivos juros de mora à taxa de 13,82% até integral pagamento.</font><br>
</p><p><b><font>Em fundamento alegou</font></b><font>, em síntese, que no exercício da actividade bancária a que se dedica, atenta a sua qualidade de cooperativa de crédito, celebrou com o l.s R. em 16.12.2014 um contrato de mútuo com fiança, ao abrigo do qual lhe concedeu um empréstimo no montante de €132.000,00, quantia que pelo mesmo foi utilizada.</font><br>
</p><p><font>Mais alegou que o mutuário deixou de pagar o empréstimo em 16.06.2016, incumprimento que determinou o vencimento automático de toda a dívida, dando lugar à exigibilidade imediata do crédito a partir da mencionada data, sendo devedor do capital então em dívida, acrescido dos juros remuneratórios e moratórios nos termos convencionados, que liquidou.</font><br>
</p><p><font>A 2ª Ré é igualmente responsável pelo pagamento das quantias peticionadas uma vez que, na qualidade de fiadora, assumiu-se solidariamente com o Réu AA como devedora e principal pagadora de todas as obrigações e quantias que nos termos do aludido contrato à autora fossem devidas.</font><br>
</p><p><b><font>Citados os RR</font></b><font>, defenderam-se em peça única, na qual alegaram nunca lhes ter sido fornecida pela autora cópia do contrato celebrado, nem tão pouco documento do qual constasse o plano prestacional do pagamento do empréstimo. </font><br>
</p><p><font>Nesta conformidade, impugnaram que o capital em dívida à data de 16 de Junho de 2016 fosse de €118.125,63, tendo igualmente impugnado os valores reclamados pela autora a título de juros remuneratórios e moratórios, que disseram terem sido mal calculados, desde logo porque, conforme a própria alegou, o incumprimento ocorreu apenas em 16 de Junho de 2016.</font><br>
</p><p><font>Acrescentaram que no ano de 2016 foram efectuados pagamentos à autora no montante de €25.413,53, que deviam ter sido imputados em conformidade com o disposto no n.º 2 da cláusula 5.ª do contrato celebrado, o que não ocorreu, concluindo pela sua absolvição dos pedidos formulados.</font><br>
</p><p><b><font>Teve lugar audiência prévia</font></b><font> e nela veio a autora esclarecer que, a par do incumprimento da prestação que se venceu em 16-06-2016, já tinha sido incumprida a prestação de capital vencida em 16-12-2015, de que os RR apenas pagaram parte e muito para além do prazo de vencimento, constituindo-se então em mora, sendo correto o cálculo de juros.</font><br>
</p><p><font>Tabelarmente saneado o processo, prosseguiram os autos com fixação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.</font><br>
</p><p><b><font>Realizou-se a audiência</font></b><font> de discussão e julgamento em cujo termo foi proferida sentença que, na procedência parcial da ação, </font><b><font>condenou</font></b><font> os RR a pagarem à A. o valor que vier a ser apurado em sede de liquidação com o limite de €125 776,48, acrescido de juros de mora à taxa prevista no contrato desde a citação até integral pagamento, absolvendo os RR do demais peticionado.</font><br>
</p><p><b><font>Inconformada, apelou a autora </font></b><font>e julgado o recurso foi</font><b><font> </font></b><font>deliberado e a final proferido acórdão do seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>“Acordam os juízes da 2.ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso interposto, condenando os RR/apelados a pagar à A.:</font><br>
</p><p><font>a) as prestações de capital e juros remuneratórios vencidas e não pagas até à data da citação, sendo que da 1.ª prestação de capital se encontra em dívida o montante de €8 125,63, acrescidas dos juros moratórios calculados nos termos contratualmente estabelecidos desde a data do vencimento de cada uma delas e até integral pagamento;</font><br>
</p><p><font>b) as restantes prestações de capital, no montante de €66 000,00, sobre as quais são devidos juros moratórios à taxa reclamada desde a data de citação até integral pagamento.</font><br>
</p><p><font>As custas nesta e na 1.ª instância ficam a cargo da apelante e dos apelados, na proporção de 15% para a primeira e 85% para estes”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Inconformado com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpõe recurso de Revista para este STJ a autora, e formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“</font></i><b><i><font>Conclusões da Revista Comum</font></i></b><i><font>:</font></i><br>
</p><p><font>(não se reproduzem porque a questão subordinada a revista normal foi decidida por acórdão de 8 de setembro de 2020)</font><br>
</p><p><b><i><font>Conclusões da Revista Excecional</font></i></b><i><font>:</font></i><br>
</p><p><font>(conclusões 15 a 19 respeitam à fundamentação para ser admitida a revista excecional)</font><br>
</p><p><i><font>Assim devem Vossas Excelências admitir a revista excecional.</font></i><br>
</p><p><i><font>20. Entendeu o Tribunal da Relação que o regime de desnecessidade de interpelação do devedor para cumprir relativamente às prestações que se vençam antecipadamente por atrasos nos pagamentos não se encontra suficientemente definido nas cláusulas constantes do contrato de mútuo, convencionadas pelas partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. Todas as questões levantadas pelo Tribunal da Relação, no acórdão recorrido, a propósito da questão atrás enunciada, a qual justifica a revista excepcional, encontram clara e cabal resposta no clausulado do contrato de mútuo, independentemente da sua redação partir da contida em norma legal ou não, sendo desnecessária interpretação à luz dos preceitos legais atrás referidos, como o Tribunal da Relação fez, dada forma clara e concreta como o contrato define os regimes aplicáveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. Tal recurso às normas referenciadas apenas teria lugar caso o contrato fosse, nessa medida, omisso, o que não se verifica, de todo, no caso dos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>22. Estipularam as partes qual o regime aplicável ao incumprimento do pagamento de alguma(s) prestação(ões) de capital e restantes obrigações do contrato, através das cláusulas 3ª nº 4 , 5ª nº 1 e 6ª nº1 do contrato de mútuo, pelo que se afastou a aplicação dos preceitos legais invocados por convenção das partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>24. No respeitante ao regime de interpelação do devedor, em si, que o Tribunal da Relação afirma não se encontrar definido, respondem as cláusulas 3ª, nº 4 e 5ª nº 1, que exprimem claramente a desnecessidade de interpelação do devedor para exigibilidade da prestação, quer relativamente ao atraso no pagamento pontual de uma prestação de capital, quer, de igual modo, às restantes prestações de capital e obrigações que por esse atraso se vencem antecipadamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. No respeitante ao regime, em si, aplicável, em caso de incumprimento da obrigação de pagamento periódico das prestações de capital, às restantes frações da dívida, o Tribunal da Relação entendeu, incorrectamente, que este não se encontra definido pelo contrato, ao que responde a cláusula 6ª, n.º 1, ao prever que o não cumprimento pontual de quaisquer obrigações do mutuário produz o vencimento antecipado e a exigibilidade imediata de todas as suas demais obrigações previstas no contrato na própria data.</font></i><br>
</p><p><i><font>26. Do acordado pelas partes no contrato resulta que, em caso de atraso no pagamento de uma obrigação emergente do contrato, vencida, produz-se o vencimento automático e antecipado das restantes prestações de capital e demais obrigações (juros inclusive), pelo que, vencendo-se automaticamente na mesma data todas as obrigações contratuais pelo não pagamento pontual de uma delas, todas se tornam igualmente exigíveis, porquanto as prestações de capital, juros e demais obrigações são exigíveis e devem ser pagas nas datas dos respetivos vencimentos, sem qualquer necessidade de interpelação ou outro ato de advertência.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Errou o Tribunal da Relação na interpretação e apreciação que fez do contrato e do conteúdo das suas cláusulas, expressão da vontade das partes que assim o convencionaram, porquanto o referido clausulado determina todos os aspetos instrumentais e regime aplicável ao incumprimento contratual e exigibilidade das prestações: as condições de vencimento das prestações, o vencimento automático e antecipado das restantes e correspondentes juros em virtude do não cumprimento pontual, a exigibilidade das prestações, quer de capital, quer de juros e, por fim, a (expressa) desnecessidade de interpelação, nos termos e com os fundamentos que atrás se apresentaram.</font></i><br>
</p><p><i><font>28. Em suma, a recorrente, com o vencimento de uma das prestações e ausência de pagamento pelo devedor, que determina o vencimento antecipado de todas as restantes obrigações, tem o direito de exigir o pagamento integral de todas as obrigações do mutuário, com os respetivos juros que nelas se incluem, sem qualquer necessidade de interpelação.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. Deste modo, em sentido diverso do douto acórdão recorrido, são devidos os juros moratórios e remuneratórios contados desde a data do vencimento antecipado de todas as prestações de capital e restantes obrigações contratuais, por força das Cláusulas 5ª/nº 1, 6ª/ nº 1 e 3ª/nº 4 do contrato, até à presente data, devem, por tanto, Vossas Excelências, julgar procedente o presente recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido, proferindo decisão que condene os recorrente no pagamento das quantias indicadas na P.I.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, revogando-se o acórdão recorrido e procedendo a revista, será feita JUSTIÇA</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>Respondem os réus</font></b><font>, formulando as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><font>(conclusões 1 a 5 respeitavam à admissão da revista excecional)</font><br>
</p><p><i><font>6. Apesar da obrigação ter prazo certo para ser cumprida, como alega a RECORRENTE, o certo é que, a actuação da RECORRENTE nunca indiciou, até ao momento fixado pelo douto Tribunal, que considerava o contrato incumprido.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Resultou dos autos, que a RECORRENTE, após os incumprimentos dos RECORRIDOS, continuou a retirar dos depósitos efectuados por aqueles, os montantes destinados aos pagamentos do empréstimo.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. O artigo 805.º do Código Civil não dispensa a resolução do contrato. </font></i><br>
</p><p><i><font>9. Do facto dado como provado no ponto 13, resulta que, em data posterior às cartas enviadas pela RECORRENTE, e apenas quanto a um dos RECORRIDOS, aquela RECORRENTE imputou dinheiro depositado na conta pelo mesmo ao pagamento dos juros do empréstimo.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. A RECORRENTE não recorreu deste ponto da matéria de facto.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Os valores dos juros eram sempre variáveis e os valores alegadamente em dívida foram adiantados pelo Ilustre Mandatário da RECORRIDA, e confirmados, de forma não convincente e sem razão de ciência por parte das testemunhas.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. O número 2 do artigo 5.º do contrato de mútuo em causa nos presentes autos dispõe o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>13. “2. Todos os pagamentos, seja qual for a indicação do MUTUÁRIO, mesmo os realizados através da referida conta D.O., serão imputados pela ordem seguinte: a despesas e encargos, a comissões, a juros de mora, a juros remuneratórios vencidos, a capital vencido e depois a juros remuneratórios e a capital vincendos”.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Resulta do próprio pedido formulado na Petição Inicial, que as testemunhas da RECORRIDA confirmaram, que o capital em dívida, após pagamentos efectuados pelos RECORRIDOS, é de € 118.125,63.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Ou seja, ao abrigo do numero 2 da cláusula 5.ª, não só todos os juros foram pagos em 30 de Dezembro de 2016, bem como ainda foi amortizado parte do capital.</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Bem andou o douto tribunal a quo, ao ter indeferido o pedido da RECORRENTE no pagamento de juros vencidos desde 16 de Dezembro de 2015, no montante de € 42.123,63.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Os juros previstos no contrato estavam indexados à taxa EURIBOR e não a uma qualquer taxa fixa.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. Cabia à RECORRENTE fazer a prova dos montantes que eram efectivamente devidos à data do vencimento dos juros em consonância com o disposto no artigo 5.º do Código do Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos mais de Direito, deve ser dado provimento às contra-alegações ora apresentadas pela Recorrida, e em consequência ser julgado improcedente o recurso”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Distribuído como recurso de revista excecional, pela Formação foi deliberada a admissão.</font><br>
<p><font>Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir, relativamente à matéria da revista excecional.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Nas Instâncias foram julgados como provados</font></b><font> os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>“Estabilizada e logicamente ordenada, é a seguinte a factualidade a atender:</font></i><br>
</p><p><i><font>1. A autora é uma cooperativa de crédito que, nos termos da lei e dos estatutos, se dedica à atividade bancária, recebendo dinheiro para depósitos e concedendo empréstimos remunerados.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Em 16 de Dezembro de 2014 a autora celebrou com o réu AA um contrato de mútuo com fiança, ao abrigo do qual concedeu a este um empréstimo no montante de €132.000,00, o qual foi creditado na sua conta de depósito à ordem com o IBAN PT50.0045…..46, tendo por ele sido utilizado.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Nos termos do acordo celebrado, designadamente da sua cláusula 2.3, ficou estipulado que:</font></i><br>
</p><p><i><font>"SEGUNDA (Prazo e Reembolso)</font></i><br>
</p><p><i><font>1. O empréstimo é concedido pelo prazo de seis anos, com início na presente data.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. O capital será reembolsado em prestações, anuais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira um ano a contar da data deste contrato e cada uma das restantes no mesmo dia de cada ano subsequente", conforme consta do documento de fls. 6 a 9 dos autos, cujo teor se dá, quanto ao mais, por reproduzido.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. E na cláusula Terceira, atinente aos juros, as partes convencionaram que:</font></i><br>
</p><p><i><font>1. A quantia mutuada vence juros, postecipados e contados dia a dia, à taxa de juros anual nominal que resultar da média aritmética simples das cotações diárias da taxa Euribor a seis meses, durante o mês anterior a cada período semestral de contagem e arredondado à milésima do ponto percentual, por excesso se a casa decimal for igual ou superior a cinco, ou por defeito se for inferior, a que acresce o "spread" ou margem de onze pontos percentuais, sendo que, em qualquer circunstância, a taxa de juro nominal aplicável nunca será inferior ao "spread".</font></i><br>
</p><p><i><font>2. A taxa de juro nominal actual é de onze, cento e oitenta e dois por cento, e a taxa anual efectiva (TAE) deste contrato, calculada nos termos do Dec.-Lei n.º 220/94, de 23 de Agosto, é de onze vírgula trezentos e setenta e oito por cento.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Os juros são pagos postecipadamente vencendo-se a primeira prestação seis meses a contar da data deste contrato, e cada uma das demais no correspondente dia do semestre subsequente.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Em caso de mora no pagamento de qualquer obrigação ou quantia, serão devidos pelo mutuário juros moratórios calculados à taxa que resultar da aplicação de uma sobretaxa anual de três por cento, a acrescer à taxa de juros remuneratórios em vigor nesse momento, que incidirá sobre o capital vencido e não pago, incluindo os juros remuneratórios, capitalizados como previsto no número seguinte, sendo que os juros moratórios se vencem e são exigíveis diariamente e sem dependência de interpelação nem aviso prévio.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. A Caixa Agrícola pode capitalizar os juros remuneratórios correspondentes a períodos não inferiores a 1 (um) mês ou, caso haja carência de pagamento de juros correspondentes a períodos não inferiores a 3 (três) meses, adicionando-os ao capital em dívida, para seguirem o regime deste.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. Em caso de mora no pagamento de qualquer prestação, a acrescer à sobretaxa a que se refere o n.° 4, a Caixa Agrícola poderá, querendo, cobrar a comissão de recuperação de valores em dívida, a qual não poderá exceder 4% (quatro por cento) do valor da prestação vencida e não paga, sempre com os montantes mínimo e máximo que, em cada momento, constarem do preçário (...)" (idem) - facto aditado.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. As partes acordaram sob a cláusula 5.ª do dito contrato, epigrafada de "Condições Gerais", o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>"1. As prestações de capital e juros e demais obrigações são exigíveis e devem ser pagas nas datas dos respectivos vencimentos, independentemente de qualquer aviso ou interpelação para o efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Todos os pagamentos, seja qual for a indicação do MUTUÁRIO, mesmo os realizados através da referida conta D.O., serão imputados pela ordem seguinte: a despesas e encargos, a comissões, a juros de mora, a juros remuneratórios vencidos, a capital vencido e depois a juros remuneratórios e a capital vincendos.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>4. A falta ou demora da CAIXA AGRÍCOLA na cobrança de créditos e na efetivação de débitos na Conta D.O., ou no exercício de algum direito ou faculdade, não representa a concessão de moratória, nem a renúncia ou perda de qualquer prazo ou direito e à percepção dos créditos e quantias que lhe sejam devidas (...)" (doc. de fls. 6 a 9 dos autos).</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Nos termos do estipulado na cláusula 6ª, ponto 1. do acordo celebrado,</font></i><br>
</p><p><a></a><i><font>"O não cumprimento pontual de quaisquer obrigações do MUTUÁRIO para com a CAIXA AGRÍCOLA, ainda que decorrentes de outros actos e títulos, produz o vencimento antecipado e a exigibilidade imediata de todas as demais obrigações (...)".</font></i><br>
</p><p><i><font>6. No mesmo escrito particular de empréstimo garantido por fiança, a ré BB, na qualidade de fiadora, assumiu-se, solidariamente com o réu AA, como devedora e principal pagadora de todas as obrigações e quantias que nos termos do contrato celebrado fossem devidas, nomeadamente, as de reembolso do capital, de pagamento de juros, às taxas e sobretaxas ajustadas, além dos impostos, comissões, encargos e despesas, inclusive como decorrentes de qualquer alteração ou renovação acordada com o réu AA, subsistindo a fiança até à completa extinção das obrigações garantidas.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Pelo mesmo escrito particular BB renunciou a todos e quaisquer benefícios que pudessem limitar a obrigação assumida, designadamente o de excussão prévia, bem como a fazer ou invocar qualquer exceção, oposição ou reserva.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. O dito contrato foi reduzido a escrito e encontra-se assinado pelo réu AA, na qualidade de mutuário e pela ré BB na qualidade de fiadora (doc. de fls. 6 a 9 dos autos).</font></i><br>
</p><p><i><font>9. O empréstimo foi processado na conta de depósitos à ordem com o IBAN PT50.0045….46, obrigando-se o réu nos termos do contrato a ter a mesma provisionada nas datas dos vencimentos das prestações acordadas, as quais eram exigíveis independentemente de qualquer aviso ou interpelação para o efeito.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. O empréstimo foi concedido pela autora e utilizado pelo réu AA pelo montante de €132.000,00 à taxa anual efectiva de 12,378%, a que acrescia 3% em caso de mora sobre todas as quantias em dívida, devendo ser pago no prazo de seis anos através de prestações anuais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira um ano a contar da data do contrato e cada uma das restantes no mesmo dia de cada ano subsequente, e os juros seriam pagos postecipadamente, vencendo-se a primeira prestação no prazo de seis meses a contar da data do contrato e cada uma das restantes no mesmo dia de cada semestre subsequente.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. A primeira prestação de juros venceu-se no dia 16 de Junho de 2015, no valor de €7.462,12, que não foi paga nessa data, tendo sido liquidada por duas vezes: em 31 de Dezembro de 2015, no valor de €6.857,74, com juros; e em 29 de Janeiro de 2016, no montante de €604,38, com juros.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. A segunda prestação de juros venceu-se no dia 16 de Dezembro de 2015, que não foi paga nessa data, tendo sido liquidada por cinco vezes: em 29 de Janeiro de 2016 (€3.479,72 e juros); 29 de Fevereiro de 2016 (€ 462,77 e juros); 1 de Agosto de 2016 (€ 499,91 e juros); 14 de Outubro de 2016 (€-178,59 e juros); e em 30 de dezembro de 2016 (€2.798,25 e juros).</font></i><br>
</p><p><i><font>14. No dia 16 de Dezembro de 2015 venceu-se também a primeira prestação devida para liquidação do capital, no montante de €22.000,00, que não foi paga nessa data.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Em 30 de Dezembro de 2016 a conta do réu foi aprovisionada com o montante de €16.794,96, que foi utilizado para pagamento do remanescente dos juros referentes à prestação vencida em 16 de Dezembro de 2015, tendo sido imputado o montante de €13.874,37 na liquidação da prestação de capital vencida em 16 de Dezembro de 2015.</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Em 16 de Junho de 2016 não foi paga a terceira prestação de juros, de valor não concretamente determinado.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. À CCAM enviou a cada um dos RR, que a receberam, a carta datada de 29/2/2016 cujas cópias fazem os does. 1 e 2 juntos com as alegações, comunicando que o empréstimo concedido ao primeiro se encontrava em atraso desde 16/12/2015, com responsabilidades vencidas correspondentes às prestações ali discriminadas, num total de €26 398,20, mais informando que, atenta a duração da mora e/ou incumprimento, o assunto em apreço seria remetido para os competentes serviços de gestão de incumprimento, aqui se dando por reproduzido, quanto ao mais, o seu teor.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. A CCAM enviou a cada um dos RR, que a receberam, a carta datada de 1 de Agosto de 2016, cujas cópias fazem os does. 3 e 4 juntos com as alegações, comunicando que o empréstimo concedido ao primeiro se encontrava em atraso desde 16/12/2015, com responsabilidades vencidas correspondentes às prestações ali discriminadas, nos montantes de €27 412,86 e de €6 667,64, mais informando que, atenta a duração da mora e/ou incumprimento, o assunto em apreço seria remetido para os competentes serviços de gestão de incumprimento, aqui se dando por reproduzido, quanto ao mais, o seu teor.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. A CCAM, por intermédio do seu II. Mandatário, enviou a cada um dos RR a missiva datada de 25 de Outubro de 2017, na qual informa que, encontrando-se o empréstimo concedido ao primeiro R. em mora, deveria ser efectuada a sua regularização no prazo máximo de 10 dias a contar da recepção da carta, sob pena de recurso à via judicial findo aquele prazo, conforme consta das cópias que constituem os documentos n.5s 5 e 6 juntos com as alegações e cujo teor aqui se dá, quanto ao mais, por reproduzido.</font></i><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões (revista excecional) que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C.</font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- A necessidade de interpelação, ou não, do devedor para serem exigidos juros moratórios em contrato de mútuo bancário amortizável em prestações quando, o incumprimento dos mutuários quanto ao pagamento das prestações importou o vencimento de todas; </font><br>
</p><p><font>- Isso tendo em conta as clausulas do contrato, no que respeita ao pedido de juros.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>As instâncias decidiram que havia necessidade de prévia interpelação do devedor, e a Formação a que alude o art. 672, nº 3 do CPC admitiu a revista excecional, fundamentando: </font><i><font>“A questão essencial de direito passa, pois, por apreciar se o teor do clausulado contratual legitima, por si, a pretensão da A. recorrente sobre a exigibilidade de juros de mora logo a partir da verificação do incumprimento das prestações ou se, acaso, apesar desse clausulado, seria necessária a interpelação dos devedores para o efeito, como decidiram as instâncias.</font></i><br>
<p><i><font>Trata-se de matéria que, relevando para a resolução do caso concreto, pode ter a virtualidade de dar uma resposta mais segura a outros litígios semelhantes, tanto mais que, como a recorrente o refere, o clausulado deste contrato não difere do que é adotado em numerosos outros contratos de mútuo das instituições financeiras e designadamente da recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nesta medida, apesar da dupla conformidade decisória, continua a interessar a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que o que for decidido a este respeito poderá ultrapassar as margens deste processo e expandir-se para a resolução de outros casos semelhantes, tendo em consideração a especial missão que é atribuída ao Supremo Tribunal de Justiça na resolução de questões de direito, como aquele que está em causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com isso, independentemente do resultado que venha a ser declarado e que a esta Formação não interessa avaliar, poderá sair reforçada a segurança na aplicação do direito que constitui um dos desideratos de qualquer sistema judiciário</font></i><font>”. </font><br>
</p><p><font>Dispõe o art. 781, do Código Civil - (Dívida liquidável em prestações)</font><br>
</p><p><font>“Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”.</font><br>
</p><p><font>E o art. 804 do mesmo diploma- (Princípios gerais)</font><br>
</p><p><font>“1.A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor.</font><br>
</p><p><font>2. O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efetuada no tempo devido”.</font><br>
</p><p><font>E, ainda, o art. 805 - (Momento da constituição em mora)</font><br>
</p><p><font>“1.O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.</font><br>
</p><p><font>2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação: </font><br>
</p><p><font>a) Se a obrigação tiver prazo certo;</font><br>
</p><p><font>b) Se a obrigação provier de facto ilícito;</font><br>
</p><p><font>c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido.</font><br>
</p><p><font>3. (…)”.</font><br>
</p><p><font>E do contrato de mútuo celebrado entre autora e réus (na qualidade em que cada um interveio) consta:</font><br>
</p><p><font>- Sob a cláusula 5.ª, como acordado: "1. As prestações de capital e juros e demais obrigações são exigíveis e devem ser pagas nas datas dos respetivos vencimentos, independentemente de qualquer aviso ou interpelação para o efeito”.</font><br>
</p><p><font>- Sob a cláusula 6ª, ponto 1. do acordo celebrado:</font><br>
</p><p><font>"O não cumprimento pontual de quaisquer obrigações do MUTUÁRIO para com a CAIXA AGRÍCOLA, ainda que decorrentes de outros actos e títulos, produz o vencimento antecipado e a exigibilidade imediata de todas as demais obrigações (...)".</font><br>
</p><p><font>O Tribunal recorrido entendeu:</font><br>
</p><p><i><font>“Defende a apelante que, ao invés do entendimento consagrado na sentença, tendo ocorrido incumprimento, conforme se verificou, venceram-se de forma automática todas as prestações vincendas, constituindo-se os devedores em mora sem necessidade de interpelação, conforme o estipulado na cláusula 5.-, nº 1, donde serem devidos juros moratórios sobre a totalidade da dívida de capital e juros vencidos até então, conforme reclamou.</font></i><br>
</p><p><i><font>A propósito do momento da constituição do devedor em mora explicava o Prof. A. Varela (Das Obrigações em Geral, vol. II, 4.ª edição, pág. 112-113) que tal depende da natureza da obrigação quanto ao tempo do seu vencimento. Assim, se a obrigação é pura, embora a prestação seja exigível desde o momento da sua constituição, só há mora depois de o devedor ser interpelado para cumprir, ou seja, a mora depende da reclamação do cumprimento imediato feita pelo credor, judicial ou extrajudicialmente (art.9 805, n.º 1); tendo a obrigação prazo certo, não é necessária a interpelação para que haja mora, a qual se verifica logo que, vencida a obrigação, o devedor não cumpre (805, n.º 2, al. a)).</font></i><br>
</p><p><i><font>A recorrente convoca em benefício da sua posição o n.º 1 da cláusula 5.3, mas cremos que sem razão, uma vez que a sua previsão contempla, em termos redundantes, reconhece-se, as prestações de capital e juros e outras obrigações com prazo de vencimento, afirmando aquilo que decorre da sua natureza, ou seja, que se vencem sem necessidade de interpelação, constituindo-se consequentemente o devedor inadimplente em mora. Mas esta estipulação que, na verdade, se limita a reproduzir a disposição contida na al. a) do n.º 2 do art. 805, não resolve a questão de saber qual o regime aplicável no caso de falta de cumprimento de uma (ou mais) prestação(ões) nas dívidas pagáveis fraccionadamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>No caso das obrigações liquidáveis em prestações o objecto está fixado desde a constituição da dívida, mas o seu pagamento -cumprimento ou liquidação no dizer do art. 781-é repartido por fracções, o que ocorre geralmente para benefício do devedor (Segue-se ainda aqui a lição do Prof. A. Varela, ob. cit., págs. 51 e seguintes). Nestes casos, e por força do citado preceito, se o devedor faltar ao pagamento de qualquer uma das prestações vencer-se-ão todas as que ainda se encontrem em dívida. Tal solução justifica-se pela quebra de confiança causada pelo inadimplemento do devedor, implicando a perda do benefício do prazo quanto a todas as prestações que se venceriam apenas no futuro. Fica o credor, "por conseguinte, com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes, cujo prazo ainda não se tenha vencido", sentido em que se deve interpretar aquele artigo 781, "e não no sentido de que, vencendo-se imediatamente, ex vi legis, as prestações restantes, o devedor comece desde esse momento a responder pelos danos moratórios".</font></i><br>
</p><p><i><font>"O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda se não vencera constitui um benefício que a lei concede -mas não impõe- ao credor, não prescindindo, portanto, da interpelação do devedor" (Ob. cit., pág. 52).</font></i><br>
</p><p><i><font>Sendo este o entendimento, ao que cremos maioritariamente aceite (Cf., por todos, acórdão deste mesmo TRE de 17/1/2019, processo 1560/16.0T8BJA-A.E1, acessível em www.dgsi.pt), e que aqui se perfilha, importa contudo reconhecer que, conforme a apelante chama a atenção, esta norma é supletiva (Cf. acórdão do TRC de 9/1/2017, proferido no processo 4208/15.6T8PBL-A.C1, no qual a ora relatora interveio como 1ª adjunta, acessível em www.dgsi.pt.), podendo portanto ser afastado o regime nela consagrado pela vontade das partes, o que sustenta ter ocorrido no caso vertente. Cremos, toda | [0 0 0 ... 0 0 0] |
ETFfu4YBgYBz1XKvgv3_ | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>***</font></div><br>
<br>
<font>AA e BB, casados, residentes na rua …, Lote … A, 2.º direito, …, instauraram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra Montepio Geral – Associação Mutualista, com sede na rua …, …, …; e Caixa Económica Montepio Geral, Caixa Económica Bancária, S.A., com sede na rua …, …, …;</font><br>
<p><font>Pedindo que a presente ação seja julgada procedente, por provada e, em consequência:</font><br>
</p><p><font>a) Ser a primeira Ré condenada a pagar à segunda Ré o capital em dívida à data da fixação da invalidez, bem como os juros que se venceram desde então até ao desfecho da presente ação;</font><br>
</p><p><font>b) Ser a primeira Ré condenada a restituir aos Autores todos os prémios do seguro já pagos e que vierem a pagar desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação; e</font><br>
</p><p><font>c) Ser a segunda Ré condenada a restituir aos Autores as mensalidades – amortização de capital e juros – pagas por estes desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação.</font><br>
</p><p><font>Fundamentando a sua pretensão, e em síntese, os Autores alegam que solicitaram à segunda Ré um crédito para aquisição de habitação própria permanente e subscreveram Plano de Garantia de Pagamento de Encargos da Associação Mutualista Montepio Geral (GPE), tendo-lhes sido dito tratar-se de um seguro de vida que cobria a eventualidade de invalidez e morte.</font><br>
</p><p><font>Os Autores nunca tiveram acesso às cláusulas do contrato (GPE) que celebraram e apenas em 07.11.2017 lhes foi facultada uma cópia, depois de solicitada.</font><br>
</p><p><font>Em … .10.2015, o Autor sofreu um acidente de trabalho que consistiu numa eletrocussão, tendo-lhe sido atribuída uma incapacidade permanente de 68,745%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) de carpinteiro de cofragem.</font><br>
</p><p><font>A segunda Ré informou o Autor que, para uma possível ativação do GPE por invalidez, o associado teria de ser portador de uma incapacidade igual ou superior a 70%, o que não foi previamente explicado ou negociado com os Autores, nem pela segunda Ré, nem pela primeira, e do qual nenhuma destas entidades deu prévio conhecimento, tendo-lhes sido imposta a celebração deste contrato.</font><br>
</p><p><font>Regularmente citadas, as Rés deduziram contestação pugnando para que a presente ação seja julgada totalmente improcedente, por não provada e infundada, sendo, as Rés, absolvidas de todos os pedidos contra si formulados (cfr. folhas 58 a 66).</font><br>
</p><p><font>A convite do Tribunal, os Autores concretizaram que peticionam que a presente ação seja julgada procedente, por provada e, em consequência:</font><br>
</p><p><i><font>“a) Ser a primeira Ré condenada a pagar à segunda Ré o capital em dívida à data da fixação da invalidez (17.11.2019), no montante de 30.480,80€ (trinta mil, quatrocentos e oitenta euros e oitenta cêntimos), bem como os juros que se venceram desde então até ao desfecho da presente ação;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Ser a primeira Ré condenada a restituir aos Autores todos os prémios do seguro já pagos e que vierem a pagar desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação, e que à data de 19.01.2021 se cifra em 65,24€ (sessenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos); e</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Ser a segunda Ré condenada a restituir aos Autores as mensalidades – amortização de capital e juros – pagas por estes desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação, sendo que em 19.01.2021 se cifrava, a amortização de capital, em 2.865,60€ (dois mil, oitocentos e sessenta e cinco euros e sessenta cêntimos) e os juros em 342,29€ (trezentos e quarenta e dois euros e vinte e nove cêntimos)”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Por despacho de 19.03.2021, foi dispensada a realização de audiência prévia, fixado o valor da ação e indicado o objeto do litígio - “Considerando a causa de pedir e os pedidos deduzidos, o objeto do litígio consiste em saber se foi cumprido o dever de comunicação e de informação relativamente ao grau e à aferição da incapacidade nos termos constantes do contrato celebrado entre os Autores e a segunda Ré, identificado nos autos; bem como apreciar se a atuação da Ré e a referida cláusula contratual – cláusula qualificativa da incapacidade permanente (de pelo menos 70%) – é contrária à boa fé, abusiva, injustificada ou desproporcionada.</font><br>
</p><p><font>Foram ainda enunciados os temas de prova e designada data para a realização de audiência final.</font><br>
</p><p><font>Realizou-se audiência final e foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a ação, e absolveu as Rés Montepio Geral – Associação Mutualista e Caixa Económica Montepio Geral, Caixa Económica Bancária, S.A., dos pedidos formulados pelos Autores, AA e BB.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Inconformados, os autores interpuseram recurso de apelação, vindo a ser decidido pelo Tribunal da Relação:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação …, em julgar procedente o recurso de apelação interposto, e, assim, revogando a sentença recorrida, condenam:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) a primeira Ré a pagar à segunda Ré o capital em dívida à data da fixação da invalidez (17.11.2019), no montante de 30.480,80€ (trinta mil, quatrocentos e oitenta euros e oitenta cêntimos), bem como os juros que se venceram desde então até ao desfecho da presente ação;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Ser a primeira Ré condenada a restituir aos Autores todos os prémios do seguro já pagos e que vierem a pagar desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação, e que à data de 19.01.2021 se cifra em 65,24€ (sessenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos); e</font></i><br>
</p><p><i><font>c) a segunda Ré condenada a restituir aos Autores as mensalidades – amortização de capital e juros – pagas por estes desde a data da fixação da invalidez até ao desfecho da presente ação, sendo que em 19.01.2021 se cifrava, a amortização de capital, em 2.865,60€ (dois mil, oitocentos e sessenta e cinco euros e sessenta cêntimos) e os juros em 342,29€ (trezentos e quarenta e dois euros e vinte e nove cêntimos)”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformada, veio a ré MONTEPIO GERAL – Associação Mutualista, </font><b><font>interpor recurso de Revista</font></b><font>, para este STJ, formulando as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“1. Conforme a douta decisão a quo refere, reapreciando a decisão sobre a matéria de facto, e “reapreciado o depoimento da testemunha das Rés CC, resulta que esta afirmou que mencionou a percentagem de incapacidade de 70% a partir da qual era ativada a garantia de pagamento do capital em dívida, de modo a distinguir os dois produtos que tinham: o produto que os Autores subscreveram e o seguro da Lusitânia, acrescentando que apresentava duas opções: o Plano de Garantia de Pagamento de Encargos da Associação Mutualista Montepio Geral, com uma cobertura de invalidez total e permanente superior a 70%, e o da Lusitânia com uma cobertura de invalidez absoluta e definitiva” (final da página 9 da decisão recorrida, que sublinhámos)</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Acrescenta a douta decisão a quo que a referida testemunha “Relatou o procedimento que na altura era seguido no banco para atender os clientes que queriam subscrever o dito Plano, esclarecendo que agora é necessária a entrega aos clientes da ficha de informação relativa aos créditos (com simulação etc). Em 2002 faziam na mesma a informação ao cliente relativamente aos dois tipos de seguro que existiam, refere que o dito Plano tem os mesmos contornos que um seguro de vida, explicou as principais diferenças (melhor” – e só era melhor porque protegia a partir de uma invalidez total e permanente superior a 70%” – “e mais barato o Plano da Associação) fez simulação ao cliente relativamente ao crédito.” Ainda se refere no douto acórdão recorrido, reapreciando a prova gravada, que a referida testemunha “Não admitiu como possível não ter informado sobre o grau de incapacidade,” (os 70%) “uma vez que tinha entrado há dois anos e estava muito concentrada em executar todos os itens do procedimento a seguir no caso de subscrição de Plano de Garantia da Associação Mutualista” (final da página 10 da decisão recorrida)</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Mas depois conclui a decisão recorrida que “a testemunha, funcionária que tratou de explicar aos autores o significado e alcance da cobertura que foi contratada por estes, afinal, tinha o entendimento, transmitido aos Autores, que a incapacidade, traduzida na situação de invalidez total e permanente, estaria preenchida, se algum deles ficasse incapaz de exercer a sua profissão”, pondo a decisão recorrida de lado e esquecendo em absoluto, a partir de então, a referência, expressa, inequívoca, perentória e reafirmada, a um mínimo de 70%de incapacidade para essa cobertura de risco.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. As conclusões da decisão recorrida omitem ou esquecem por completo a expressa e inequívoca referência da testemunha CC à incapacidade (mínima) de 70%, retiram qualquer importância a essa referência e mostram-se totalmente contraditórias com este facto, que porém se evidencia, e confirma no acórdão recorrido, da prova produzida.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Não esclarece a douta decisão recorrida, nem de forma alguma fundamenta, por que motivo anulou a relevância da repetidamente afirmada (no próprio acórdão recorrido) referência pela testemunha CC aos AA. de que a cobertura da incapacidade implicaria que esta atingisse uma percentagem mínima de 70%. A decisão de desconsiderar a prova realizada através do depoimento da testemunha CC, confirmada após reanalisada em segunda instância, carece em absoluto de fundamentação.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. O sentido decisório do douto acórdão recorrido, alterando a decisão da primeira instância e considerando o facto descrito em 12) como não provado, é absolutamente contrário à fundamentação que vinha sendo apresentada naquele mesmo acórdão recorrido, onde a referência expressa ao mínimo de 70% de incapacidade da cobertura do produto mutualista se mostra evidenciada, reforçada e confirmada, verificando-se um vício formal do silogismo judiciário.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Os AA. tinham conhecimento, porque lhes foi transmitido, que a incapacidade mínima para a proteção contratada era de 70%. Não estando preenchida esta incapacidade, sabiam ou tinham que saber que, nos termos contratuais, a situação de que o A. padece não estaria coberta pela proteção contratada.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. No douto acórdão recorrido não é feita nenhuma análise ou ponderação acerca do que é a normalidade de outros produtos de proteção similares, nada havendo, no conjunto probatório reanalisado ou na sua apreciação crítica, que justifique a alteração do sentido da decisão sobre o facto elencado sob a alínea 13),</font></i><br>
</p><p><i><font>9. A decisão de considerar como não provado o facto que na douta sentença de primeira instância foi descrito no ponto 13) carece em absoluto de fundamentação.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. O Tribunal a quo não podia ter alterado o sentido da decisão da primeira instância sobre os pontos 12) e 13) da matéria de facto, passando a considerá-los como não provados, porque a prova produzida, reapreciada e confirmada não apontava nesse sentido, nem impunha essa alteração.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. A Relação só pode e só deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, caso contrário a alteração da matéria de facto considerada provada ou não provada constitui uma violação dos poderes de decisão da Relação, viciando o acórdão de nulidade – cfr. designadamente o Ac. do STJ de 20.05.2010, dgsi.pt p. 73/2002.S1.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. A lei confere ao tribunal de revista amplos poderes de sindicância sobre o exercício dos poderes por parte da Relação na reapreciação da decisão de facto, mormente quanto aos parâmetros a observar, pelo que, quando o Supremo Tribunal, em sede de revista, entenda que ocorrem ilegalidades ou contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito, deve determinar que o processo volte ao tribunal recorrido (artigo 682.º, n.º 3, do CPC).</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Embora o Supremo Tribunal de Justiça não possa censurar o uso feito pela Relação dos poderes conferidos pelo artigo 662.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, já pode verificar se a Relação, ao usar tais poderes, agiu dentro dos limites traçados pela lei para os exercer, ou se ocorreu violação da lei processual que disciplina os pressupostos e os fundamentos da reponderação, pela segunda instância, da decisão sobre a matéria de facto.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Os preceitos legais que preveem restrições à admissibilidade da revista quanto à decisão sobre a matéria de facto e à sua reapreciação pela Relação, devem ser acolhidos com as devidas cautelas e com o sentido interpretativo menos limitativo dos direitos e mais conforme ao direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º da CRP).</font></i><br>
</p><p><i><font>15. O acórdão recorrido viola os poderes legais de alteração da decisão sobre a matéria de facto pela segunda instância, desrespeitando regras de direito adjetivo de cumprimento estrito e extravasando indevidamente os seus poderes cognitivos, perpetrando uma nulidade processual</font></i><br>
</p><p><i><font>16. O incumprimento pela Relação, ou o cumprimento defeituoso por contradição intrínseca, “do dever de fundamentação sobre cada um dos pontos da matéria de facto impugnada, de modo a explicar e justificar a autónoma convicção, constitui violação quer da disciplina processual a que aludem os arts. 640.º e 662.º, n.º 1, quer do método de análise crítica da prova prescrito no art. 607.º, n.º 4, aplicável por força o disposto no art. 663.º, n.º 2, todos do CPC, impondo-se, por isso, anular o acórdão recorrido.” (Ac. STJ de 11-04-2019 - Revista n.º 308/16.3T8PTM.E1.S1 - 2.ª Secção, que sublinhámos)</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Impõe-se que este Tribunal superior declare verificada tal nulidade, e declare que o Tribunal recorrido fez um mau uso dos poderes que a proposição descrita no artigo 662.ºdo CPC lhe concede, com as legais consequências, designadamente anulando o acórdão recorrido e impondo uma nova decisão sobre a matéria de facto pela Relação, ou repristinando a anterior formulação dos factos em causa, considerando-os provados e proferindo sobre eles decisão de Direito,</font></i><br>
</p><p><i><font>18. Foi feita a comunicação ao aderente do teor das cláusulas contratuais, e referência expressa à condição de 70% de incapacidade (que favoravelmente se distinguia das condições do produto alternativo, o seguro de vida), num esforço explicativo que envolveu também a apresentação de exemplos para exprimir a gravidade da situação protegida, procurando atender à capacidade cognitiva e conhecimentos que os AA. revelavam nesse diálogo, mas que seriam sempre complementares daquela expressamente advertida percentagem de incapacidade mínima.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. Não pode senão concluir-se, conforme concluiu a douta sentença que em primeira instância decidiu o presente pleito, que as RR. Cumpriram o seu dever de informação sobre o conteúdo contratual [em particular sobre a condição que limitava a incapacidade protegida a, pelo menos, 70%] a que os AA. aderiram, optando por um dos dois produtos que lhe foram apresentados.</font></i><br>
</p><p><i><font>20. A lei, em particular o Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (RJCCG), não exige em momento algum que a informação seja transmitida de forma a que fique de forma indelével na mente de quem a recebe, sem que este a esqueça, pois que isso não depende de uma atuação do informador mas das características pessoais do informado e do decurso do tempo.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. O que o RJCCG exige é que a informação seja transmitida de forma suficiente e adequada, considerando o “homem médio”.</font></i><br>
</p><p><i><font>22. A cláusula que impõe uma invalidez igual ou superior a 70% não é abusiva nem desproporcionalmente violadora dos interesses visados.</font></i><br>
</p><p><i><font>23. O R. MGAM é uma associação mutualista, e é também uma instituição particular de solidariedade social, tendo por entidade de tutela relativamente às suas modalidades mutualistas o membro do Governo com competência em matéria de segurança social, nos termos do n.º 2 do artigo 126.ºdo CAM (atualmente Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Direção Geral da Segurança Social).</font></i><br>
</p><p><i><font>24. As modalidades mutualistas constam de regulamentos próprios, incorporados num documento do qual fazem parte integrante, denominado Regulamento de Benefícios, o qual está sujeito a registo junto da Direção-Geral da Segurança Social, nos termos do artigo 25.ºdo Código das Associações Mutualistas e do Regulamento de Registo das Associações Mutualistas e das Fundações de Segurança Social Complementar.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Para que o R. MGAM possa exercer os seus fins através de modalidades individuais e coletivas, quer quando da sua criação quer quando das eventuais alterações, necessita que estas sejam registadas e por consequência aprovadas junto da Direção-Geral da Segurança Social, e, nesta conformidade, o previsto no Regulamento de Benefícios do R. MGAM é devidamente verificado e aprovado pela Direção-Geral da Segurança Social, e considerado conforme com a lei e com o decorrente do estipulado pelo Código das Associações Mutualistas.</font></i><br>
</p><p><i><font>26. A cláusula que se limita a razoavelmente clarificar o conceito de invalidez total e permanente, fixando-a em 70% para os efeitos da proteção contratada, não contraria a boa fé e o princípio da confiança, nem confere ao R. MGAM uma vantagem injustificada e desproporcionada em detrimento dos aderentes, sendo absolutamente razoável e equilibrada e limitando a cobertura contratada em termos com os quais os AA. (ou o cidadão médio), poderiam razoavelmente contar.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Aliás, tanto é razoável este grau de incapacidade mínima aplicável ao contrato, que o grau de incapacidade do A., que é de 55%, não é suficiente para que se encontre reformado por invalidez, e, portanto, considera-se – oficialmente – estar apto para desempenhar uma atividade profissional e, consequentemente, para auferir rendimentos,</font></i><br>
</p><p><i><font>28. E consequentemente, também, pode e deve honrar os compromissos que assumiu para com o Banco, pagando-lhe o que dele recebeu por empréstimo.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. Por tudo o exposto, a decisão recorrida é, assim, nula porque não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão de desconsiderar o depoimento confirmado da testemunha CC, bem como da decisão de considerar não provado o facto elencado em primeira instância, e ali provado, como alínea 13);</font></i><br>
</p><p><i><font>A decisão recorrida é, também, nula porque os fundamentos invocados na decisão recorrida estão em oposição com a decisão de considerar não provado o facto elencado em primeira instância, e ali provado, como alínea 12),</font></i><br>
</p><p><i><font>Ocorrendo ambiguidade ou obscuridade que afetam a regularidade do silogismo judiciário e tornam a decisão ininteligível (artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC).</font></i><br>
</p><p><i><font>30. A decisão recorrida é, ainda, nula por violação dos limites dos poderes de decisão da Relação.</font></i><br>
</p><p><i><font>31. A decisão recorrida mostra-se, assim, violadora – entre outras que V. Ex.as doutamente suprirão – das seguintes disposições legais: artigos 607.º, n.º 4, 640.º, 662.º do CPC artigo 236.º do CC</font></i><br>
</p><p><i><font>32. Não pode o acórdão recorrido deixar de ser revogado, produzindo-se uma decisão, nesta sede ou após retorno à Relação, que considere a presente ação totalmente improcedente por não provada, nos mesmos termos que se decidiram em primeira instância e como se impõe repor nesta sede recursiva.</font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE, e nos demais de Direito que V. Ex.as doutamente suprirão,</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve o presente recurso ser julgado procedente, sendo o acórdão recorrido julgado nulo na parte que determinou a alteração da decisão sobre a matéria de facto provada constante nos pontos 12) e 13) da douta sentença da primeira instância e por violação dos limites dos poderes de decisão da Relação.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve o acórdão recorrido ser revogado repristinando-se a anterior formulação dos factos em causa, considerando-os provados, ou impondo-se uma nova decisão sobre a matéria de facto pela Relação, determinando-se que o processo volte ao tribunal recorrido (artigo 682.º, n.º 3, do CPC)</font></i><br>
</p><p><i><font>E proferindo sobre eles decisão de Direito, não podendo a decisão do presente pleito deixar de ser no mesmo sentido da douta decisão proferida em primeira instância, com total improcedência da presente ação e absolvição das RR. dos pedidos, pois só assim é de DIREITO E JUSTIÇA</font></i><font>!”.</font><br>
</p><p><font>Responderam os autores, concluindo: </font><br>
</p><p><i><font>“1 - A recorrente pretende ver alterado o sentido da douta decisão do Tribunal da Relação … que alterou a matéria de facto dada como provada, referindo e transcrevendo a parte que lhe interessa e omite a mais importante.</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - A recorrente transcreve parte da fundamentação do acórdão recorrido, e que corresponde à transcrição do que a sua testemunha, CC, afirmou, e parte para uma conclusão sem transcrever o resto do depoimento que alicerçou o raciocínio plasmado no acórdão de que recorre.</font></i><br>
</p><p><i><font>3 - No acórdão recorrido, a conclusão de que a testemunha tinha um entendimento diverso do que consta nas cláusulas do seguro em crise sobre a cobertura de invalidez total e permanente, não surgiu do nada, como a Recorrente quer fazer crer, mas daquilo que aquela declarou, no seu conjunto, e não apenas na parte em que interessa à recorrente!</font></i><br>
</p><p><i><font>4 – Foi o conjunto dos depoimentos prestados àquela matéria, na sua totalidade, que alicerçaram, sem qualquer fundamento para censura, a decisão do acórdão recorrido, e não parte dos depoimentos, e principalmente da testemunha que interessa à recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>5 - Pelo que a decisão relativa à alteração do constante no ponto 11 dos factos provados, não merece qualquer censura, devendo ser mantida.</font></i><br>
</p><p><i><font>6 - Ao alterar, fundamentadamente, o facto provado 11, teria de se dar como não provado o facto 12, sob pena de contradição.</font></i><br>
</p><p><i><font>7 - Não obstante o que a testemunha CC disse sobre a comunicação do grau de incapacidade de 70% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades – ponto 12 dos factos assentes -tendo em conta o depoimento que prestou, no seu todo, bem como as declarações de parte dos autores, não podia ser dado como provado, quer porque em oposição com o que ficou provado no ponto 11, quer porque em oposição ao que não ficou provado nas alíneas a), b) e c) dos factos não provados. </font></i><br>
</p><p><i><font>8 - Já quanto ao facto 13, dado como não provado, não merece qualquer censura, quer pela argumentação supra mencionada e que consta do douto acórdão recorrido, quer porque prova alguma se logrou fazer, testemunhal ou documental, a propósito do mesmo, em audiência de discussão e julgamento,</font></i><br>
</p><p><i><font>9 – Foi o tribunal de 1ª instância que deu como provado aquele facto 13, sem qualquer fundamento porque sem qualquer demonstração factual.</font></i><br>
</p><p><i><font>10 - Já o Tribunal da Relação, ao dar aquele facto como não provado, fundamentou-o de modo bastante, ainda que não exaustivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>11 - A decisão recorrida, ao analisar o conjunto dos depoimentos, na sua totalidade, e ao fundamentar a sua decisão de modo completo e coerente, como o fez, quer de facto, quer de direito, cumpriu cabalmente o disposto no art.º. 662.º do CPC, não lhe podendo ser assacada qualquer nulidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>12 – Ao alterar a matéria de facto como alterou, a subsunção ao direito é perfeita, na medida em que esclarecedora, completa e coerente.</font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE MANTENDO-SE A DECISÃO RECORRIDA SE FARÁ INTEIRA E SÃ JUSTIÇA”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Nas Instâncias foram julgados como provados</font></b><font> os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>“3.3. Factos definitivamente julgados provados e não provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:</font></i><br>
</p><p><i><font>1) Os Autores solicitaram à segunda Ré, Caixa Económica Montepio Geral, um crédito para aquisição de habitação própria permanente.</font></i><br>
</p><p><i><font>2) Elaborado o respetivo processo, no balcão da segunda Ré, os Autores subscreveram, em 21.05.2002, uma proposta de adesão ao “Plano de Garantia de Pagamento de Encargos” (GPE) da primeira Ré, Associação Mutualista Montepio Geral, formalizando a candidatura como associados desta última.</font></i><br>
</p><p><i><font>3) O referido pedido de subscrição foi efetuado para garantir um capital de 65.000,00€, por um prazo de 30 anos, cobrindo para ambos os associados, aqui Autores, os riscos de Invalidez Total e Permanente e de Morte, tendo ficado designado como beneficiário da subscrição o contrato hipotecário sediado na segunda Ré, com o n.º 198….7-6.</font></i><br>
</p><p><i><font>4) Em 19.06.2002, outorgaram a escritura pública de compra e venda com mútuo e hipoteca.</font></i><br>
</p><p><i><font>5) A subscrição daquele Plano de Garantia de Pagamento de Encargos foi exigência da segunda Ré, embora tenha apresentado uma outra alternativa à referida subscrição.</font></i><br>
</p><p><i><font>6) Aos Autores foi dito tratar-se de “um seguro de vida” que cobria a eventualidade de “invalidez” e “morte”.</font></i><br>
</p><p><i><font>7) Na data referida em 2), os Autores preencheram e assinaram um formulário, do qual consta: “Risco Coberto – Invalidez e Morte”.</font></i><br>
</p><p><i><font>8) As respetivas cláusulas foram previamente elaboradas às quais os Autores se limitaram a aderir através da subscrição da proposta de adesão.</font></i><br>
</p><p><i><font>9) Da página 5 das cláusulas do Plano de Garantia de Pagamento de Encargos, consta, na alínea a) do ponto 2): “Aceitação / Acionamento das coberturas de risco (…)</font></i><br>
</p><p><i><font>2. No que diz respeito ao acionamento das coberturas de invalidez, verifica-se o seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) A cobertura de Risco Invalidez Total e Permanente pode ser acionada desde que o Associado Subscritor apresente um estado de incapacidade resultante de doença ou acidente, tendencialmente irreversível, a que corresponda, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades, um Grau de Invalidez não inferior a 70% (setenta por cento), ou não inferior à soma daquele limite com o Grau de Invalidez eventualmente existente à data da Subscrição”.</font></i><br>
</p><p><i><font>10) O referido em 9) não foi previamente negociado com os Autores.</font></i><br>
</p><p><i><font>11) No balcão da segunda Ré, foi dada a conhecer a modalidade a subscrever , concretamente, Invalidez e Morte, tendo-lhes sido transmitido que a cobertura de Risco Invalidez Total e Permanente abrangeria uma situação de Incapacidade permanente que torne o lesado incapaz para o exercício da sua profissão habitual, significado que foi interiorizado e aceite pelos autores antes de subscreverem a referida Garantia de Pagamento de Encargos.</font></i><br>
</p><p><i><font>12) Os Autores são pessoas culturalmente simples, tendo como habilitações académicas a 4.ª classe.</font></i><br>
</p><p><i><font>13) Em … .10.2015, o Autor sofreu um acidente de trabalho.</font></i><br>
</p><p><i><font>14) Como consequência direta e necessária do referido acidente, resultou para o Autor uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 68,745% (45,83% x fator 1.5) com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) de … de cofragem – com o esclarecimento de que tal foi declarado por sentença proferida em 17.11.2019, pelo Juízo do Trabalho de … desta Comarca, no processo n.º 5772/15.5… .</font></i><br>
</p><p><i><font>15) Em 11 de janeiro de 2016, a Autora apresentou, em nome do Autor, um pedido de ativação da cobertura de risco de invalidez.</font></i><br>
</p><p><i><font>16) A primeira Ré devolveu-o ao balcão de … da segunda Ré com indicação de documentação em falta por não ter sido apresentado Atestado Médico de Incapacidade Multiuso.</font></i><br>
</p><p><i><font>17) Em 02.06.2020, foi solicitado à primeira Ré o acionamento da cobertura do risco “Invalidez Total e Permanente, por lhe ter sido reconhecida incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, cfr. sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca …, Juízo do Trabalho de …, Juiz …, no âmbito do processo n.º 5772/15.5…”.</font></i><br>
</p><p><i><font>18) Em 21.07.2020, aquela respondeu, através da segunda Ré, solicitando documentos – com o esclarecimento de que solicitou “Atestado Médico de Incapacidade Multiuso (autenticado)” e “Relatório médico com início e evolução da doença”.</font></i><br>
</p><p><i><font>19) Através da supra referida resposta, a segunda Ré informou o Autor que “para uma possível ativação de GPE por invalidez, o Associado tem que ter uma incapacidade igual ou superior a 70%, no caso da mesma ter sido resultante de um acidente, deve ser enviado auto policial da ocorrência ou outro similar”.</font></i><br>
</p><p><i><font>20) O Autor não possui todos os supra referidos documentos – com o esclarecimento de que tem Atestado Médico de Incapacidade Multiuso que lhe atribui incapacidade de 55%.</font></i><br>
</p><p><i><font>21) Não tendo sido, mais uma vez, apresentado o Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, o pedido não foi novamente considerado tendo sido de novo devolvido, com indicação de documentação em falta.</font></i><br>
</p><p><i><font>22) À data de 17.11.2019, referida em 19), o capital em dívida era de 30.480,80€.</font></i><br>
</p><p><font>23 e 24) (inexistem).</font><br>
</p><p><i><font>25) Desde então, os Autores continuaram a pagar à primeira Ré o montante de 65,24€ em prémios de seguro (até 19.01.2021) e à segunda Ré 2.865,60€ de amortização de capital (até 19.01.2021) e 342,29€ de juros (até 19.01.2021).</font></i><br>
</p><p><i><font>Ao abrigo do disposto no artigo 607º, nº4, do CPC, aplicável ao Tribunal da Relação, ex vi, nº2, art 663º do mesmo diploma, julgamos provados com base nos documentos juntos à contestação e com base no acordo das partes, os seguintes factos:</font></i><br>
</p><p><i><font>26. De acordo com “Regulamento de Benefícios”, Aprovado em Assembleia Geral, sessões de 22.10.1991 e 7.07.1992, registado na Direcção Geral dos Regimes de Segurança Social, averbamentos nºs 23 e 24 à inscrição 3/81, a fls 31 verso e 37 v. do Livro nº 2 das ASM, em vigor desde 1.09.1992, conforme fls 84 a 87-verso, a cobertura de Risco Invalidez Total e Permanente pode ser acionada desde que o Associado Subscritor apresente um estado de incapacidade a que corresponda uma percentagem igual ou superior a 70% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades, mas essa percentagem será corrigida, acrescentando-se-lhe o grau de invalidez que existia à data da inscrição.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Em documentos assinados pelos Autores, nomeadamente os que se encontram intitulados como “Montepio Geral – Admissão de Associado” e “Montepio Geral – Inscrição Garantia de Pagamento de Encargos”, no final dos mesmos, após a assinatura daquel | [0 0 0 ... 0 0 0] |
-zFgu4YBgYBz1XKv_v03 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>***</font></div><br>
<br>
<font>- A 24/05/2019, AA e BB intentaram a execução a que estes autos se mostram apensos contra CC e DD, com base numa sentença judicial, transitada em julgado, com vista a obter a cobrança de 87.182,92€, acrescidos de juros.</font><br>
<p><font>- A 28/06/2019, os executados deduziram oposição, mediante embargos, para tanto alegando, em síntese, que a citação efetuada na ação declarativa onde a sentença foi proferida é nula, uma vez que se avançou para a citação edital sem que se mostrassem esgotadas todas as diligências necessárias à concretização da sua citação pessoal, mais alegando que não devem aos exequentes a quantia em que foram condenados.</font><br>
</p><p><font>- Foi proferido despacho liminar que indeferiu parcialmente os embargos, recebendo-os, apenas, na parte em que é alegada a nulidade de citação.</font><br>
</p><p><font>- Os exequentes – notificados a 08/07/2019 - contestaram, pugnando pela improcedência dos embargos, alegando que a citação edital só ocorreu depois de esgotadas todas as diligências tendentes a obter a citação pessoal dos aqui embargantes.</font><br>
</p><p><font>- De seguida foi proferido despacho saneador, julgando os embargos improcedentes.</font><br>
</p><p><font>- A 02/02/2021, os embargantes recorreram deste saneador-sentença, para que seja revogado e substituído por outro que julgue procedentes os embargos, alegando, no essencial, que os factos provados demonstram que se verificou a nulidade da citação, porque o tribunal não esgotou todas as tentativas possíveis de citação pessoal dos réus, sendo por isso nulo todo o processado após a petição inicial (ou, numa variante constante das alegações, depois da “citação”).</font><br>
</p><p><font>- Pelo Tribunal da relação foi decidido: “Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, revogando-se o saneador-sentença recorrido que se substitui por este acórdão que julga procedente os embargos, com a consequente extinção da execução, por se ter verificado a falta de citação dos réus na acção declarativa de que procede a sentença que está a ser executada”.</font><br>
</p><p><b><font>Inconformados com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpõem recurso de Revista para este STJ os exequentes/embargados, e formulam as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><i><font>“1. Deve ser admito o presente recurso com efeito suspensivo, atento o periculum in mora supra alegado;</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Os devedores e aqui recorridos, apesar de nas suas várias peças processuais alegarem “morar” no Brasil, nunca, em momento algum, disseram em que morada ali poderiam ser encontrados – mesmo na procuração forense conferida aos seus mandatários – a morada que indicam é a de Portugal, onde dizem não habitar;</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Foram efetuadas todas as diligências exigíveis e possíveis para citação dos Recorridos/Réus;</font></i><br>
</p><p><i><font>4. O mesmo é dizer que foi escrupulosamente cumprido o previsto nos artigos 236º e 240º do CPC;</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Não colhe o “argumento” dos executados de que a executada CC “… ao menos até Setembro de 2017, era trabalhadora dependente desta Sociedade” pois, além de falsa tal afirmação, os exequentes não sabem nem têm qualquer obrigação de o saber.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. Acresce que é legitimo perguntar: se os executados, que até indicam vizinhos como testemunhas, não tiveram ninguém que os alertasse para a variada correspondência deixada na sua caixa de correio e, pelo menos, duas tentativas de citação pessoal coladas na sua porta, de que adiantaria enviar cartas para a aludida “Sociedade”?</font></i><br>
</p><p><i><font>7. É falso e abusivo afirmar que os exequentes “…bem sabiam que os Réus, aquando da propositura da acção, se encontravam no Brasil…”.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. E tal afirmação é contraditada pelo próprio embargantes que afirmam passar 3 ou 4 meses por ano em Portugal… e ao mesmo tempo afirmam que a executada CC membro dos órgãos sociais e trabalhadora dependente da alegada Sociedade comercial…</font></i><br>
</p><p><i><font>9. Tendo até renunciado à gerência da aludida Sociedade em 29/07/2017;</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Ao considerar que se omitiram diligências tendentes à localização dos RR, o Douto Acórdão faz uma interpretação extensiva do previsto nos artºs 225/6, 236º/1 e 240º, todos do CPC, em violação do previsto no nº 2 do artº 9º do CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Exigir as diligências que no Douto Acórdão agora recorrido se descrevem é, com o muito e devido respeito, violar as normas de interpretação, v.g. o previsto no nº 2 do artº 9º do Código Civil que dispõe: “2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.”</font></i><br>
</p><p><i><font>12. Na verdade, esgotadas as tentativas para citação pessoal, (por os citandos se encontrarem em parte incerta, algures num Continente chamado Brasil), foram feitas todas as diligências impostas pela lei processual para saber o último paradeiro ou residência conhecida, e só após frustração de todas as diligências, foi efetuada a citação edital, no estrito cumprimento do disposto no artº 240º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>Termos em que, com o sempre douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser aceite e julgado procedente, revogando-se o Douto Acórdão recorrido, prosseguindo a execução os seus tramites”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Foram apresentadas contra-alegações pelos executados/embargantes, nas quais concluem:</font><br>
</p><p><i><font>“A – O deferimento do pedido de apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado da taxa de justiça e demais encargos com o processo implica, conforme resulta do disposto no artigo 13º da Portaria nº 1085-A/2004 de 31 de Agosto, o pagamento mensal da quantia fixada até que o somatório das prestações pagas ser de valor superior a quatro vezes o valor da taxa de justiça inicial.</font></i><br>
</p><p><i><font>B – Nos presentes o valor de taxa de justiça inicial foi de £ 612,00, pelo que, nos termos do disposto no artigo acima identificado, o beneficiário do apoio jurídico apenas poderia deixar de pagar as prestações mensais quando o valor pago totalizasse € 2.448,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>C – Compulsados os autos verificamos que pelo Recorrente foram apenas juntos aos autos 5 DUCs, os quais, pressupondo o seu pagamento, totalizam o pagamento de apenas € 800,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>D – Assim desde que o deferimento do pedido de apoio jurídico foi notificado ao Recorrente, o que sucedeu em Junho de 2020, este procedeu ao pagamento da prestação mensal fixada apenas 5 vezes ao invés das 16 exigíveis.</font></i><br>
</p><p><i><font>E – Entendem os Recorridos que, s.m.o, a falta do pagamento das prestações do apoio judiciário equivale ao não pagamento da taxa de justiça devida.</font></i><br>
</p><p><i><font>F – Já a Recorrida AA não beneficia de apoio judiciário, não obstante alegar que está a litigar com apoio judiciário, a verdade é que, e s.m.o, não está, na medida em que em Setembro de 2020 foi junta aos autos, pelo Instituto da Segurança Social, comprovativo da decisão de indeferimento do pedido de apoio jurídico.</font></i><br>
</p><p><i><font>G – Decisão essa aceite pela Recorrente uma vez que esta nunca procedeu ao pagamento de qualquer prestação (com excepção de uma relativa ao presente recurso), pelo menos segundo a informação constante dos autos.</font></i><br>
</p><p><i><font>H – Sendo o pagamento da taxa de justiça requisito para a admissão do recurso, e equiparando-se o pagamento das prestações do apoio judiciário ao pagamento da taxa de justiça devida, e não estando pagas as 16 prestações vencidas, não deverá o presente recurso ser admitido.</font></i><br>
</p><p><i><font>I – Requereram os Recorrentes a a atribuição de efeito suspensivo ao recurso invocando para o efeito que os Recorridos não possuem outros bens em território nacional além do dos montantes já penhorados à ordem dos presentes autos, que os mesmos afirmam não morar em Portugal e que demonstram a sua intenção de nunca virem a ser notificados. </font></i><br>
</p><p><i><font>J – Os Recorridos opõem-se veementemente à atribuição do efeito suspensivo ao presente recurso não por não ser verdade que estejam a tentar “fugir à justiça” mas apenas porque, na sua opinião, não se encontram preenchidos os requisitos necessários para tal.</font></i><br>
</p><p><i><font>K – Assim, os Recorridos, ao contrário do afirmado pelos Recorrentes, têm mais bens em território nacional, conforme informação constante dos autos, os Recorridos não residem em exclusividade no Brasil, antes vivem alternadamente entre o Brasil e Portugal, e por ultimo os Recorridos já forneceram nos autos principais uma morada de notificação para que recebam sempre as notificações no âmbito dos presentes autos. Não existe por isso qualquer risco para os Recorrentes que fundamente a atribuição do efeitos suspensivo ao presente recurso.</font></i><br>
</p><p><i><font>L – Procederam os Recorrentes à junção às suas alegações de recurso de recurso de dois documentos: uma sentença do Tribunal de 1ª Instância proferida no âmbito do processo 17615/17.0…-A e uma certidão comercial da sociedade B… e C…, Lda.</font></i><br>
</p><p><i><font>M – Ora, resulta do disposto no artigo 651º do Código de Processo Civil que a junção de documentos às alegações de recurso é possível apenas nos termos do disposto no artigo 425º do mesmo Código, o qual estipula que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento”.</font></i><br>
</p><p><i><font>N – Parece-nos claro que nada impedia a junção da certidão comercial em data anterior à presente, na medida em que bastaria aos Recorrentes requerer a emissão da referida certidão, o que pode ser feito a todo o tempo, pelo que não existe justificação para a sua junção tardia, não devendo por isso ser admitida.</font></i><br>
</p><p><i><font>O – Já no que respeita à junção da certidão da sentença proferida pela MM Juiz de 1ª Instância no âmbito do Recurso de Revisão de Sentença apresentado pelo aqui Recorridos no âmbito do processo 17615/17.0...-A a sua junção em data anterior não seria possível porquanto apenas agora foi proferida, contudo, e s.m.o, parece-nos que não acrescenta nada no caso presente pois a referida sentença limita-se (ainda que, s.m.o, de forma incorrecta, tendo por isso sido já alvo de recurso) a aplicar aos autos a consequência da decisão do Tribunal da Relação de …, ou seja, havendo uma decisão que julgou a citação edital dos aqui Recorridos nula, tal decisão implica a destruição da sentença do processo em que teve lugar a citação edital ainda que tenha sido proferido no âmbito da instância executiva.</font></i><br>
</p><p><i><font>P – Vem o presente recurso do douto Acórdão do Tribunal da Relação de … que julgou nula a citação edital dos aqui Recorridos por entender que não foram esgotadas todas as tentavas de citação pessoal antes de ter sido ordenada a citação edital, entendendo os Recorrentes que foram cumpridas todas as exigências para a citação edital.</font></i><br>
</p><p><i><font>Q – Naturalmente entendemos que não, conforme seguidamente demonstraremos.</font></i><br>
</p><p><i><font>R – No âmbito do processo 17615/17.0… foram levadas a cabo as seguintes diligencias por forma a citar os Réus:</font></i><br>
</p><p><i><font>1.Em 03 de Outubro de 2017, foram enviadas citações por via postal para a morada indicada pelos Autores na petição inicial, mais concretamente Avenida …, nº 4, 2º C, Urbanização …, …, as quais vieram devolvidas com a menção “objecto não reclamado”;</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Em vista de tal devolução, a secretaria realizou buscas junto da Autoridade Tributária, Segurança Social e Registo Civil, tendo apurado que o endereço dos RR era na Avenida …, nº 16, 2º B, Urbanização …, …, tendo sido remetidas novas citações para a nova morada, as quais vieram a ser devolvidas com a menção de objecto não reclamado”;</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Das buscas resultou ainda que a Ré CC, integrava os órgãos estatuários da Sociedade R… e C…, Lda., com sede na Rua …, nº 18, …, em …, e que, ao menos até Setembro de 2017, era trabalhadora dependente desta Sociedade;</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Por força da devolução das citações foi nomeado Agente de Execução para proceder à citação por contacto pessoal dos Réus, o qual se terá deslocado à morada dos autos, em Janeiro de 2018, e ai sido informado que os Réus não eram vistos no local desde Agosto de 2017, e que os mesmos se encontrariam no Brasil há já 5/6 meses.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Após o que foi ordenado e deferida a citação edital dos Réus.</font></i><br>
</p><p><i><font>S – Dispõe o Código de Processo Civil, no seu artigo 226º nº 6, que a citação edital tem lugar quando o citando se encontre em parte incerta, nos termos do disposto no artigo 236º e 240º ou quando sejam incertas as pessoas a citar.</font></i><br>
</p><p><i><font>T – Para que possamos concluir que a pessoa a citar se encontra ausente em parte incerta é necessário que se esgotem primeiramente todas as tentativas de citação pessoal, pois a lei processual apenas a admite a citação edital quando seja manifestamente impossível a citação por outro meio, e essa exigência existe porque a citação edital, não oferecendo qualquer garantia de efectivo conhecimento do seu teor pelo seu destinatário, é manifestamente uma limitação ao imperativo constitucional presente no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.</font></i><br>
</p><p><i><font>U – No caso ora em discussão não foram, manifestamente, esgotadas todas as possibilidades de citação pessoal dos Réus, aqui Recorridos, na medida em que existiam no processo duas informações relativas aos Réus, aqui Recorridos, que foram, pura e simplesmente, ignoradas.</font></i><br>
</p><p><i><font>V – Constava do processo a informação de que os Réus Recorridos se encontravam no Brasil, sendo por isso conhecida alguma informação quanto ao seu paradeiro, não sendo, por definição, esse paradeiro incerto, logo era exigível que se diligenciasse para apurar a concreta morada dos citandos no Brasil, seja através do Consulado, da Embaixada ou pelo recurso a Convenção Internacional de cooperação em matéria civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>X – Constava igualmente do processo a informação informação, prestada pela Autoridade Tributária e pelo Instituto da Segurança Social em Novembro de 2017, de que a Ré, aqui Recorrida, CC era membro dos órgãos sociais da Sociedade R… e C…, Lda., e bem assim que a Ré Recorrida, pelo menos até Setembro de 2017, exercia a sua actividade nesta Sociedade.</font></i><br>
</p><p><i><font>T – Face a esta informação sempre deveria ter sido tentada a citação pessoal da Ré, aqui Recorrida, naquela morada, o que não sucedeu.</font></i><br>
</p><p><i><font>U – De nada vale virem os Recorrentes juntar aos autos documentos que, além de serem inadmissíveis de junção no presente momento, não foram juntos aos autos na altura, pelo que não é válido o exercício de pura adivinhação da consequência de acções que não foram tomadas para validar as falhas existentes na citação, pois a verdade é que a informação de que a Recorrida havia cessado as funções que desempenhava nos órgãos sociais em Setembro de 2017 não constavam do processo pura e simplesmente.</font></i><br>
</p><p><i><font>V – A verdade é que a repugna ao sistema jurídico que alguém seja condenado sem observância do princípio do contraditório, conforme dispõe o artigo 2º e 20º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa e que a lei ordinária reflete no artigo 3º e 4º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>W – A plena realização da justiça implica que Autores e Réus intervenham no processo em condições idênticas, evitando os riscos de injustiça material, os quais são incomparavelmente superiores aos que decorrem dos processos onde seja assegurado o contraditório efectivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>X – Negando-se à parte este elementar direito, nega-se o direito de acesso a um processo equitativo e justo bem como o acesso aos tribunais e à realização da justiça que a Constituição da Republica consagra e o Estado de Direito exige.</font></i><br>
</p><p><i><font>Y – Existindo no processo informações que poderiam levar à concretização pessoal de, pelo menos, um dos Réus, então era obrigação do Tribunal procurar esgotar essas possibilidades antes de avançar para uma forma de citação que não garante qualquer segurança ao processo decisório.</font></i><br>
</p><p><i><font>Z – Ao não fazê-lo o Tribunal de 1ª Instancia violou os direitos dos Réus, aqui Recorridos, designadamente o direito ao principio do contraditório e o direito à defesa.</font></i><br>
</p><p><i><font>AA – Por todo o exposto, a citação edital foi não só prematura, por não esgotados todos os meios processuais para a efectiva citação dos citandos, como ainda indevida porquanto os citandos não se encontravam ausentes em parte incerta, sendo que uma e outra situação conduzem à nulidade da citação edital efectuada, o que equivale à falta de citação, tudo nos termos do disposto no artigo 188º do Código de Processo Civil, o que aqui se invoca para todos os efeitos legais.</font></i><br>
</p><p><i><font>AB – Sendo nula a citação, é nulo tudo quanto se tiver processado após a petição inicial, nos termos do disposto no artigo 187º do supra mencionado Código, o que se requer seja verificado por este douto Tribunal”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
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<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre conhecer e decidir.</font><br>
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<b><font>Nas Instâncias foram tidos em conta </font></b><font>os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>“Para a decisão da questão principal importam os seguintes factos dados como provados:</font></i><br>
</p><p><i><font>1 - Os exequentes deram à execução a sentença proferida em 13/03/2019 pelo Juízo Central Cível de … (Juiz …) deste Tribunal Judicial da Comarca da Grande Lisboa-Oeste, no processo 17615/17.0…, onde intervieram como autores e os aqui executados como réus, e na qual foi proferida a seguinte decisão: “julgo a presente acção procedente, por provada, e, em consequência, declaro a resolução do contrato promessa celebrado entre autores e réus condenado estes a (i) restituírem aqueles a quantia correspondente ao sinal prestado em dobro, que se fixa em 86.000€, bem como a (ii) pagarem aos autores 1182,92€, tudo acrescido de juros à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.”</font></i><br>
</p><p><i><font>[no contrato-promessa que os autores juntaram, o réu estava identificado, para além de, como a mulher, com um NIF português, com um título de passaporte com n.º e data de validade, emitido pela República Federativa do Brasil; num outro documento junto pelos autores, os réus tinham uma conta bancária portuguesa devidamente identificada; no reconhecimento notarial das assinaturas do contrato a ré tem um número de cartão de cidadão português e o réu tem um cartão de residência permanente em Portugal, emitido pelo SEF de …, devidamente referenciado; em e-mails juntos pelos autores consta um endereço electrónico do réu; numa carta de Set2015, de uma seguradora, junta pelos autores, consta um endereço da ré em …: Rua …, n.º 23, 5.ºB, …. – descrição de elementos de prova feita por este TRL, ao abrigo dos arts. 663/2 e 607/4 do CPC, por serem documentos juntos no processo 17615 pelos autores e não impugnados pelos réus, que também os juntaram na petição de embargos]</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - Para citação dos réus no âmbito daquele processo foram-lhes remetidas, em 04/10/2017, cartas registadas com aviso de recepção para a Av. …, n.º 4-2ºC, Urbanização …, …, morada indicada na petição inicial, que foram devolvidas com a menção de “Objecto não reclamado/Non reclame”.</font></i><br>
</p><p><i><font>3 - Em 13/11/2017, foram efectuadas pesquisas nas bases de dados dos serviços da segurança social, dos serviços de identificação civil e da Direcção-Geral dos Impostos, apurando-se que os réus tinham domicílio na Av. …, n.º16, 2.ºB, Urbanização …, …, mais se apurando em relação à ré que ela constava como membro de órgão estatutário da R… e C…, Lda, com registo de última remuneração em Setembro de 2017.</font></i><br>
</p><p><i><font>4 - Em 20/11/2017, foram então remetidas cartas registadas com aviso de recepção para citação dos réus naquela morada (16/2.ºB), que foram devolvidas com a menção de “Objecto não reclamado/Non reclame”.</font></i><br>
</p><p><i><font>5 - Em 20/12/2017, foram efectuadas novas pesquisas nas bases de dados dos serviços da SS, dos serviços de IC e da DGI, delas resultando que os réus continuavam a ter o mesmo domicílio (16/2.ºB) e que a ré continuava a constar como membro de órgão estatutário daquela sociedade, com registo de última remuneração em Setembro de 2017.</font></i><br>
</p><p><i><font>[na base de dados da identificação civil constam os nomes dos pais da ré, o seu local de nascimento, a sua morada, do 16/2.ºB, etc. – acrescentado por este TR…, ao abrigo dos artigos 663/2 e 607/4 do CPC, com base no documento autêntico constante do processo 17615]</font></i><br>
</p><p><i><font>6 - Foi então nomeado agente de execução para proceder à citação dos réus, através de contacto pessoal, com referência àquela morada (16/2.ºB).</font></i><br>
</p><p><i><font>[a nomeação do AE foi feita com o envio de cópia da PI e documentos - acrescentado por este TR…, ao abrigo dos artigos 663/2 e 607/4 do CPC, com base no documento autêntico constante do processo 17615]</font></i><br>
</p><p><i><font>7 - Tal citação frustrou-se, tendo o AE nomeado vindo informar que: “1. Deslocou-se, no dia 03/01/2018, àquela morada, a fim de proceder à citação por contacto pessoal da ré, NIF 249…7 e do réu, NIF 256…5; 2. No local não encontrou os réus, foi deixado aviso com indicação para citação; 3. No dia 15/01/2017, deslocou-se novamente à morada supra indicada e não encontrou os réus; segundo informação prestada pela vizinha do 1.ºD, os réus não são vistos no local desde Agosto de 2017, julgando que os mesmos se encontram no Brasil; 4. Informação confirmada pelo responsável da empresa V… Sr. …., contacto 96…4; 5. Pelo exposto, não foi possível efectuar a diligência.”</font></i><br>
</p><p><i><font>8 - Notificados da certidão negativa de citação, os autores requereram a citação edital dos réus.</font></i><br>
</p><p><i><font>9 - Foi ordenada a realização de novas buscas nas bases de dados, que foram realizadas em 20/02/2018, delas resultando que os réus continuavam a ter domicílio naquela morada (16/2.ºB) e que a ré continuava a constar como membro de órgão estatutário daquela sociedade, com registo de última remuneração em Setembro de 2017.</font></i><br>
</p><p><i><font>[na base de dados da identificação civil, com cartão de cidadão português emitido a 08/10/2015, constam os nomes dos pais do réu, a data de nascimento do réu e a sua morada no 16/2.ºB; nos dados da AT consta a morada da sociedade onde a ré é membro de órgão estatutária e consta ainda o nome e morada de uma outra sociedade, na …, fonte de rendimentos da ré em 2017; esta última também consta como fonte de rendimentos do réu, em 2017 – este § foi acrescentado por este TRL, ao abrigo dos artigos 663/2 e 607/4 do CPC, com base no documento autêntico constante do processo 17615]</font></i><br>
</p><p><i><font>10 - Nessa sequência, foi então ordenada e concretizada a citação edital dos réus, com afixação de edital à porta do 16/2.ºB em 27/07/2018 [e publicação de anúncios a 10/09/2018 e prova dessa publicação na folha junta a 12/09/2018 – TR…, consulta da acção 17615/17], após o que se procedeu à citação do Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 15 do Código de Processo Civil</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelo recorrente e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608º, 635º, nº 3 a 5 e 639º, nº 1, do C.P.C. </font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- A validade da citação edital dos réus no processo 17615/17.0…, onde foram condenados e em que a sentença proferida constitui o título executivo que serve de base à execução contra eles instaurada e que os presentes embargos impugnam.</font><br>
</p><p><font>A 1ª Instância decidiu: </font><i><font>“Ao contrário do que os embargantes defendem, a citação edital foi precedida da realização de todas as diligências possíveis e legalmente previstas com vista a apurar do seu concreto paradeiro, pelo que não pode considerar-se que tenha sido indevidamente efectuada</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>O Tribunal da Relação com entendimento contrário decidiu: </font><i><font>“julga-se procedente o recurso, revogando-se o saneador-sentença recorrido que se substitui por este acórdão que julga procedente os embargos, com a consequente extinção da execução, por se ter verificado a falta de citação dos réus na acção declarativa de que procede a sentença que está a ser executada</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E fundamenta: </font><i><font>“Nos factos provados não consta que o AE tenha apurado junto de duas pessoas (uma vizinha e uma pessoa que se presume ter uma empresa no local) que os réus se encontravam no Brasil, embora sem indicação da concreta morada. O AE não disse isso, nem disse também que tinha feito a pergunta necessária sobre a morada concreta (designadamente tendo em vista o disposto no art. 235, particularmente claro em confronto com o art. 236/1, ambos do CPC). Para além disso, o AE ainda devia ter averiguado, junto das pessoas que contactou, ainda tendo em vista o disposto naquele artigo 235, se os réus tinham o costume de se ausentar por um certo período de tempo ou se aquela ausência era uma situação inusual. E não o tendo feito o AE, devia-o ter feito a secretaria, por força do art. 236/1, 1.ª parte, do CPC, ao menos por contacto telefónico com o empresário identificado [a título de curiosidade esclareça-se que na certidão predial junta na execução, por consulta ao registo predial feita pelo AE, a 27/05/2019, consta que a sociedade V… registou a aquisição do edifício do n.º 16 da Av. … em 2014; a fracção do 2.ºB foi vendida pela V… à C…, Unipessoal, SA, com registo da aquisição a 05/05/2017, que a veio a permutar aos réus com registo da permuta a 05/05/2017, o que indicia a forte probabilidade de a V… ter informações úteis para o contacto da ré], ou os autores (a título de ónus, porque lhes interessava uma citação com observância de todas as cautelas, de modo a evitar a procedência de uns futuros embargos, com base na falta de citação, tanto mais que requereram a citação edital dos réus, como consta do facto 8).</font></i><br>
</p><p><i><font>Por outro lado, não se tratava de enviar carta para citação dos réus no local de trabalho da ré (como pretendem os réus, argumento seguido pela sentença para o rebater), mas sim da necessidade de o AE fazer averiguações, junto de uma sociedade a que a ré até recentemente estava ligada, da morada dos réus (eventualmente no Brasil). Sendo a ré membro de um órgão estatutário de uma sociedade, da qual tinha recebido remunerações ainda em Set2017, um mês e meio antes da primeira averiguação da base de dados, é muito provável que esta sociedade tivesse informações ou contactos que fossem úteis para se averiguar a morada concreta dos réus (mesmo que no Brasil). E não o tendo feito o AE, devia-o ter feito a secretaria (por força dos artigos 226/1 e 236/1 do CPC) ou os autores (a título do ónus já referido).</font></i><br>
</p><p><i><font>E para além destes elementos que demonstram a possibilidade de outras averiguações, existem outros referidos nos factos 1 e 9, que claramente podiam ter servido para o efeito</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Entendemos que a citação edital é remedeio para evitar a paralisação dos processos pelo que apenas dela deve lançar-se mão, quando seja impossível o contacto pessoal com o citando, ou contacto direto por outro meio, dada a multiplicidade de meios de contacto na atualidade.</font><br>
</p><p><font>A Constituição, consagrando o respeito pelo direito de defesa, no art. 20º, pretende alcançar a garantia de que o réu/demandado tenha efetivo conhecimento do processo contra ele instaurado.</font><br>
</p><p><font>Por isso a lei ordinária dá primazia à citação pessoal (por via eletrónica, pelo correio ou, por contacto pessoal, conforme art. 225º, nº 2, do CPC).</font><br>
</p><p><font>Assim que, só em último recurso se deve fazer uso da citação edital, dada a imprevisibilidade e falta de certeza quanto ao conhecimento de facto, pelo citando, do objeto da citação.</font><br>
</p><p><font>Assim que concordamos com o expandido no Ac. da Rel. do Porto de 29/4/2019, no Proc. nº 18180/16.1T8PRT-B.P1, </font><i><font>“O processo de citação edital implica o cumprimento de várias etapas, com vista à garantia do contraditório: i) a secretaria procura a efetiva citação pessoal por via postal ou por contacto direto (art.º 226.º, n.º 1, do CPC); ii) frustradas as modalidades de citação pessoal do réu em território nacional ou estrangeiro e persistindo a situação de ausência em parte incerta, a secretaria efetua oficiosamente as diligência julgadas pertinentes, junto de qualquer entidade ou serviço, dirigindo-se diretamente a essas entidades por ofício ou qualquer outro meio de comunicação (art.º 236.º e 172.º do CPC); iii) mantendo-se a incerteza quanto ao paradeiro, a secretaria fará o processo concluso ao juiz; iv) confrontado com os elementos constantes do processo, pode o juiz: determinar nova tentativa de citação pessoal, solicitar outros elementos ou, em casos indispensáveis, requisitar informações às autoridades policiais (art.º 236.º, n.º 1 do CPC); v) não se superando a situação de incerteza do paradeiro, deve o juiz ordenar a citação edital</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>A questão é saber se, no caso concreto, outras diligências podiam ter sido levadas a cabo, com vista a dar conhecimento direto aos réus de que contra os mesmos havia sido instaurada uma ação judicial.</font><br>
</p><p><font>É que se foi empregue indevidamente a citação edital, há falta de citação, conforme art. 188º, nº 1 al. c), do CPC.</font><br>
</p><p><font>No caso estamos perante citandos residentes em parte incerta e, eventualmente no estrangeiro.</font><br>
</p><p><font>Há que analisar se se tornou impossível consumar a citação segundo o regime regra, que é a citação pessoal, e porque esta forma de citação é a que melhor garante a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, conforme art. 20º da CRP, dos citandos.</font><br>
</p><p><font>Dispõe o nº 4 do art. 239º, do CPC que, “4 - Estando o citando ausente em parte incerta, procede-se à sua citação edital, averiguando-se previamente a última residência daquele em território português e procedendo-se às diligências a que se refere o artigo 236.º”. </font><br>
</p><p><font>Só nestes casos expressamente consignados é possível a citação edital, sob pena de ser considerada indevidamente a utilizada esta forma de citação e configurada legalmente como falta de citação (art. 188, nº 1 al. c), do CPC). </font><br>
</p><p><font>E preceitua o referido art. 236º, com a epígrafe “- Ausência do citando em parte incerta”.</font><br>
</p><p><font>“1 - Quando seja impossível a realização da citação por o citando estar ausente em parte incerta, a secretaria diligencia obter informação sobre o último paradeiro ou residência conhecida junto de quaisquer entidades ou serviços, designadamente, mediante prévio despacho judicial, nas bases de dados dos serviços de identificação civil, da segurança social, da Autoridade Tributária e Aduaneira e do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres e, quando o juiz o considere absolutamente indispensável para decidir da realização da citação edital, junto das autoridades policiais.</font><br>
</p><p><font>2 - Estão obrigados a fornecer prontamente ao tribunal os elementos de que dispuserem sobre a resi | [0 0 0 ... 0 0 0] |
0TFju4YBgYBz1XKv1_-r | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>AA</font></b><font> (A) intentou a ação declarativa ordinária n.º 155/07.3TBTVR contra Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda. (B), pedindo que se: </font><br>
</p><p><font>a) Declare que o A. adquiriu por usucapião, a propriedade da parcela de terreno com a área, após redução do pedido, de 5.890 m2, tal como de todas as construções e benfeitorias aí efetuadas, sito no sítio do Vau …, freguesia de …, concelho de …, confrontando no Norte, por onde mede 70 m, com BB e Sorimin, do Sul por onde mede 65 m, com BB, do Nascente por onde mede 115 m, com Sorimin, e do Poente por onde mede 108 m, com BB, a desanexar do prédio misto sito em Sítio do Vau …, freguesia de …, concelho de …, inscrito na matriz rústica sob o artigo 40.798 e na matriz predial urbana sob os artigos 1207, 2553, 2554, 2555, 2636, 2637, 2638, 2639, 2704, 2705, 2706, 2707, 2708, 2709, 2710, 2711, 2712, 2713, 2714, 2715, 2716, 2717, 2718, 2719, 2720, 2721, 2722, 2846, 2847, 2848, 2849, 2850, 2851, 2852, 2853, 2854, 2855, 2856, 2857, 2858, 2859, 2860, 2861, 2862, 2863, 2864, 2865, 2866, 2867, 2868, 2869, 2870, 2871, 2872 e 2873, e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 14.552, sendo que da parte urbana o artigo a desanexar é o 2867; </font><br>
</p><p><font>b) Condene a R. a reconhecer o direito de propriedade do A. sobre a aludida parcela de terreno. </font><br>
</p><p><font>Para fundamentar as suas pretensões alega, em síntese, que tem a posse da parcela em causa, quer por si, quer pelos ante possuidores, há mais de 20 anos, pelo que, sendo essa posse pública, pacífica e de boa-fé, adquiriu a mesma por usucapião. </font><br>
</p><p><font>A R. impugna a generalidade dos factos invocados pelo A., pugnando que o mesmo ocupa a moradia em causa por mera tolerância do seu proprietário, bem sabendo que não é dono da mesma. </font><br>
</p><p><font>O A. requereu a intervenção principal provocada da Casa Amiga - Promociones Imobiliarias y Urbanismo, Sociedad de Responsabilidad Limitada, por o imóvel ter registada uma hipoteca a favor desta última, a qual pode ver a sua garantia diminuída caso a ação seja julgada procedente, ampliando o pedido de forma a que se declare que a aquisição por usucapião da parcela em causa ocorreu livre de ónus e encargos e que se declare a hipoteca constituída sobre o imóvel não incidirá sobre a descrição do registo predial que venha a resultar da desanexação da referida parcela. </font><br>
</p><p><font>Foi admitida tal intervenção principal provocada e ampliação do pedido. </font><br>
</p><p><font>Foi apresentada réplica, a qual foi desentranhada dos autos, por se ter entendido que era legalmente inadmissível. </font><br>
</p><p><font>Casa Amiga - Promociones Imobiliarias y Urbanismo, Sociedad de Responsabilidad Limitada apresentou contestação nos autos, em que impugna a generalidade dos factos alegados pelo A. e conclui pela improcedência da ação. Alega que nos autos n.º 1…4/97 já foi considerado que a “Gracer” e a Sorimin eram as titulares da propriedade plena da Quinta … e pede que essa decisão tenha força de caso julgado neste processo.</font><br>
</p><p><font>Quanto à titularidade da Quinta …, o A. respondeu que, face à desistência do pedido da “Gracer” nos autos n.º 1…4/97, foi reconhecido por esta que o direito de propriedade sobre a “Vila …” não lhe pertence, o que faz caso julgado e conclui que tal exceção invocada pela interveniente deve improceder.</font><br>
</p><p><b><font>Na ação que foi apensa</font></b><font> (n.º 1/08.O…), intentada por Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda. (A) contra AA (R), a ali A. pede que se: </font><br>
</p><p><font>a) Declare a A. proprietária plena da parcela do prédio designado por Quinta … (localizado no Sítio do Vau …, freguesia de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 14552, a fls. 161 do Livro B-37) constituída pela Vila …, pelos Cómodos Agrícolas e pelo Pomar, quer a área e as confrontações dessa parcela sejam as indicadas pelo R e referidas no artigo 32.°, quer sejam as obtidas pela A. e referidas nos artigos 26.° e 27.°; </font><br>
</p><p><font>b) Condene o R a reconhecer que a A. é proprietária plena da parcela da Quinta … referida em a); </font><br>
</p><p><font>c) Condene o R. a restituir à A. a parcela da Quinta … referida em a), desocupando-a e entregando-lha livre e devoluta de quaisquer pessoas e bens; </font><br>
</p><p><font>d) Condene o R a pagar à A., com juros vincendos desde a data da citação até integral pagamento: </font><br>
</p><p><font> (i) a título de danos com a alteração do projeto de loteamento, a quantia de € 214.573,23; </font><br>
</p><p><font>(ii) a título de danos pelo atraso na construção e comercialização dos apartamentos a edificar na área presentemente ocupada pelo R., a quantia de € 193.744,67, acrescida da quantia que se vier a liquidar, a final, em função do tempo que o R demorar a desocupar a Vila …, os Cómodos e o Pomar, nos termos dos artigos 467.° a 476.°; </font><br>
</p><p><font>(iii) a título de danos pelo atraso na construção e comercialização dos apartamentos a edificar na área da Quinta … não ocupada presentemente pelo R., a quantia de € 1.514.975,42; </font><br>
</p><p><font>(iv) a título de danos de imagem da A, a quantia de € 150.000,00; </font><br>
</p><p><font>e) Condene o R. a pagar à A., a título de danos financeiros, a quantia que se vier a liquidar posteriormente. </font><br>
</p><p><font>Fundamenta a sua pretensão no facto de ter iniciado um projeto de urbanização e loteamento da Quinta … com a construção do “P… Resort” com 635 apartamentos e, em virtude do A. ter ocupado ilicitamente uma parcela da Quinta, foi obrigada a introduzir alterações nesse projeto, de forma a excluir a área ocupada, com diminuição dos apartamentos a vender, com custos acrescidos e com atrasos no desenvolvimento do projeto e prejuízos nas vendas e na sua imagem. </font><br>
</p><p><font>O R. contestou, impugnando a generalidade da factualidade alegada, designadamente a ilicitude da sua ocupação da parcela da Quinta …, bem como os prejuízos peticionados, que, segundo afirma, não foram causados pela sua conduta. </font><br>
</p><p><font>Depois da apensação das ações, foi proferido despacho-saneador, que não admitiu a réplica do A. na parte em que responde à matéria das contestações por não ter sido deduzida exceção, julgou improcedente a invocada exceção dilatória do caso julgado e fixou a matéria de facto assente e a base instrutória. </font><br>
</p><p><font>O A. apresentou articulado superveniente, no âmbito do qual alega a caducidade do alvará de loteamento do prédio em causa nos autos por despacho da Câmara Municipal de … de 19 de junho de 2013, pretendendo que tal caducidade retira utilidade a todas as despesas que a R. invoca como prejuízos sofridos em consequência da conduta do A., para além de invocar que a R. deixou de pagar o IMI sobre o prédio dos autos e não procede à limpeza do terreno. </font><br>
</p><p><font>Foi liminarmente admitido o articulado superveniente, tendo a R. impugnado a generalidade da factualidade aí invocada, bem como as consequências que o A. pretende extrair da caducidade do alvará de loteamento. </font><br>
</p><p><font>Foi selecionada matéria de facto do referido articulado superveniente. </font><br>
</p><p><font>O A. apresentou 2.° articulado superveniente, em que alega que o alvará de loteamento do prédio em causa nos autos foi declarado parcialmente nulo por decisão transitada em julgado, pretendendo que tal nulidade retira utilidade a todas as despesas que a R. invoca como prejuízos sofridos em consequência da conduta do A., para além de invocar que, em 15.09.2014, requereu o averbamento da Vila … em seu nome no respetiva Repartição de Finanças, tendo pago o IMI relativo aos anos de 2011 a 2014. </font><br>
</p><p><font>Foi liminarmente admitido o articulado superveniente, tendo a R. impugnado as consequências que o A. pretende extrair da nulidade do alvará de loteamento, o qual foi declarado nulo após já ter caducado, tendo pago o IMI do prédio em causa. </font><br>
</p><p><font>Foi selecionada matéria de facto do suprarreferido articulado superveniente. </font><br>
</p><p><font>O A. procedeu à redução do pedido, reduzindo a área da parcela reivindicada para após junção de levantamento topográfico, tendo sido homologada tal redução de pedido. </font><br>
</p><p><b><font>Realizou-se a audiência final</font></b><font>, tendo sido proferido despacho em que se determinou a adequação formal dos autos nos termos do disposto no art.º 6.° do Código de Processo Civil, pelo que, considerando a data do despacho saneador, será este considerado, mas também toda a prova que resultar do processo e da audiência de julgamento, com os limites previstos no art.º 5.° do mesmo Código. </font><br>
</p><p><font>Na sequência da extinção da hipoteca inscrita sobre o prédio dos autos a favor da Casa Amiga - Promociones Imobiliarias y Urbanismo, Sociedad de Responsabilidad Limitada, foi declarada extinta a instância relativamente a esta, por impossibilidade superveniente da lide. </font><br>
</p><p><b><font>Foi proferida sentença que</font></b><font>:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>a) Julgou totalmente improcedente a ação principal intentada por AA contra Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda e, em consequência, absolveu a R do pedido;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Absolveu o Autor AA do pedido de condenação como litigante de má-fé.</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Julgou parcialmente procedente a ação apensa em que é Autora Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda e Réu AA e, em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>d) I - Declarou a Autora Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda proprietária plena da parcela do prédio do prédio misto sito em Sítio do Vau …, freguesia de …, concelho de …, inscrito na matriz rústica sob o artigo 40.798 e na matriz predial urbana sob o artigos 1207, 2553, 2554, 2555, 2636, 2637, 2638, 2639, 2704, 2705, 2706, 2707, 2708, 2709, 2710, 2711, 2712, 2713, 2714, 2715, 2716, 2717, 2718, 2719, 2720, 2721, 2722, 2846, 2847, 2848, 2849, 2850, 2851, 2852, 2853, 2854, 2855, 2856, 2857, 2858, 2859, 2860, 2861, 2862, 2863, 2864, 2865, 2866, 2867, 2868, 2869, 2870, 2871, 2872 e 2873, e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 14.552, a fls. 161 do Livro B-37, constituída pela Vila …, pelos Cómodos Agrícolas e pelo Pomar, que confina a Norte com BB e Sorimin a Sul com BB a Nascente com Sorimin e a Poente com BB confina a Norte com BB e Sorimin a Sul com BB a Nascente com Sorimin e a Poente com BB com a área total de 5.760 m, correspondendo a área de 1.346 m2 à Vila … (artigo 2867), a área de 2.789 m2 aos Cómodos Agrícolas e a área de 1.625 m2 Pomar; </font></i><br>
</p><p><i><font>II - Condenou o Réu AA a reconhecer que a Autora é proprietária plena da parcela da Quinta … referida em i);</font></i><br>
</p><p><i><font>III - Condenou o Réu AA a restituir à Autora a parcela da Quinta … referida em i), desocupando-a e entregando-lha livre e devoluta de quaisquer pessoas e bens;</font></i><br>
</p><p><i><font>IV - Condenou o Réu AA o a pagar à Autora Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda. a quantia de € 100.000,00 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde a citação até integral pagamento, às taxas sucessivamente em vigor para os juros civis;</font></i><br>
</p><p><i><font>V - Absolveu o Réu do demais peticionado</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><b><font>AA veio interpor recurso</font></b><font> da decisão final (interpondo também vários outros recursos, juntamente com aquele), sendo deliberado e a final proferido acórdão do seguinte teor:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de … acordam em:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Indeferir a reclamação e em consequência manter a decisão singular.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UC's.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Em julgar parcialmente procedente o recurso relativo à excepção de caso julgado, e consequentemente:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Revogam a decisão recorrida relativa ao caso julgado e a decisão de condenação na parte que Julgou parcialmente procedente a ação apensa em que é Autora Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda e Réu AA, e em substituição, declaram a autoridade de caso Julgado da sentença proferida no processo n.º 1…4/97, no Apenso A, absolvendo-se o Réu AA da instância, nesse Apenso A.</font></i><br>
</p><p><i><font>- Rejeitar os recursos nº 17º e 18º. </font></i><br>
</p><p><i><font>- Julgar improcedentes os restantes recursos da acção principal, ou seja, a acção intentada por AA, mantendo as decisões recorridas, inclusive a decisão final que Julgou totalmente improcedente a ação principal intentada por AA contra Sorimin, Compra e Venda de Imóveis, Lda e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas na 1.ª instância por ambas partes na proporção do decaimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas nesta instância pelo recorrente, na proporção de 2/3.</font></i><font>”</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Inconformados com o decidido pela Relação</font></b><font>, interpuseram recurso de Revista para este STJ:</font><br>
<p><font>- AA, simultaneamente Autor e Réu;</font><br>
</p><p><font>-</font><font> </font><font>Sorimin – Compra e Venda de Imóveis, Lda. (“Sorimin”), Ré e autora;</font><br>
</p><p><b><font>Conclusões do recorrente AA</font></b><font>:</font><br>
</p><p><i><font>“— OBJETO DO RECURSO</font></i><br>
</p><p><i><font>A) Os presentes autos integram duas acções, uma principal e uma apensa [Apenso A]. Na primeira, o aqui Recorrente é Autor e Ré a sociedade, abreviadamente, denominada por “Sorimin”; na segunda, a posição processual das partes inverte-se, passando o Autor a Réu e a Ré a Autora.</font></i><br>
</p><p><i><font>B) O Acórdão recorrido julgou procedente o Agravo interposto pelo aqui Recorrente, de decisão contida no despacho saneador da acção apensa, em que era Réu, a qual havia julgado improcedente a invocada excepção de caso julgado. O Acórdão recorrido revogou o aludido despacho, julgando procedente a invocada excepção de caso julgado, na vertente da sua autoridade, absolvendo o Réu da instância na acção que corre sob o Apenso A.</font></i><br>
</p><p><i><font>C) Todavia, o Acórdão recorrido não retirou, como deveria, as consequências da mencionada autoridade de caso julgado, no que à acção principal respeita. Pelo que, o presente Recurso de Revista tem por objecto o Acórdão proferido pela Relação de … (em 25.02.2021), na parte em que o mesmo julgou improcedentes recursos interpostos pelo ora Recorrente na Acção principal, mantendo as decisões da 1ª instância, impugnadas em via de recurso, incluindo a Sentença final que julgou totalmente improcedente a acção principal intentada pelo ora Recorrente contra a Ré SORIMIN – Compra e Venda de Imóveis, Lda. e, consequentemente, absolveu a Ré do pedido.</font></i><br>
</p><p><i><font>— DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA DE 1.ª INSTÂNCIA DE IMPROCEDÊNCIA DA ACÇÃO PRINCIPAL VS. CASO JULGADO</font></i><br>
</p><p><i><font>D) Em 30-06-1007, a GRACER – Sociedade de Turismo do Algarve, S.A., antecessora da Ré “Sorimin”, propôs contra o aqui Recorrente uma acção de reivindicação da propriedade de uma parte, não autonomizável juridicamente, da “Quinta …”, i.e. a “Vila …”, a qual correu termos na Secção Única do Tribunal Judicial de …, sob o Proc. n.º 1…4/1997, peticionando que fosse declarada a única dona e legítima proprietária do prédio e o R. condenado a entregar o mesmo livre e devoluto de pessoas e bens (cfr. certidão de fls. 725 e seguintes).</font></i><br>
</p><p><i><font>E) A “Gracer”, por requerimento de 07-02-2006, desistiu do pedido, tendo tal desistência sido homologada por sentença proferida em 20-07-2006 (cfr. Certidão judicial junta a fls. 1046 a 1058, documento autêntico dotado de força probatória plena). Mediante tal desistência a “Gracer” reconheceu que o direito por si invocado não existe, não lhe assiste, e que a sua pretensão era totalmente infundada (art. 285º, nº 1, do CPC2013 = art. 295º, nº 1, do CPC1961).</font></i><br>
</p><p><i><font>F) Em 27 de Julho de 2005, a ora Ré/Recorrida “Sorimin” celebrou com a “GRACER” uma escritura pública de compra e venda, na qual declarou comprar-lhe o prédio misto sito em Sítio do Vau …, conhecido por “Quinta …”, melhor identificado no corpo das alegações.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo que, passou a “Sorimin” a ocupar a posição da “Gracer”, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 293.º, n.º 3, do C.P.C.2013 (= art.º 271.º/3 CPC1961), vendo repercutir-se na sua esfera jurídica os efeitos decorrentes da desistência do pedido, na já identificada acção, uma vez que esta não é sujeita a registo.</font></i><br>
</p><p><i><font>G) O caso julgado formado pela Sentença que homologou a desistência do pedido é oponível à aqui Ré/Recorrida “SORIMIN”, quer no que à acção Apensa respeita, o que foi considerado no Acórdão recorrido; quer quanto à acção principal, o que não foi atendido no Acórdão recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>H) A desconsideração dos efeitos do caso julgado na acção principal, originou um desfecho sui generis do pleito: a “SORIMIN”, pese embora ser titular inscrita no registo predial, não é titular do direito de propriedade sobre a parcela de terreno reclamada em ambas as acções, estando impedida, por força do caso julgado formado no Proc. n.º 1…4/1997, de reivindicar a propriedade da mesma ao aqui autor/recorrente AA; este, por seu turno, pese embora possa continuar a ocupar a mesma parcela de terreno, durante toda a vida, também não foi judicialmente reconhecido como seu proprietário.</font></i><br>
</p><p><i><font>I) O Acórdão recorrido não regulou, como se lhe impunha, definitivamente, a situação jurídica das partes, no que aos litígios em causa respeita, não produzindo o seu efeito útil normal. O Tribunal recorrido estava obrigado a conhecer dos efeitos do caso julgado, formado no Proc. n.º 154/1997, na acção principal, dado que a excepção dilatória de caso julgado ser de conhecimento oficioso [art.ºs 577.º, i) e 578.º, do CPC2013 (= art.ºs 494.º e 495.º do CPC’61)].</font></i><br>
</p><p><i><font>J) Entre a acção que correu termos sob o Proc. n.º 154/97 e a acção principal existe a tríplice identidade (art. 581º-1 do CPC’13/art. 498º-1 do CPC1961): as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, o efeito jurídico pretendido é idêntico e existe uma identidade entre a causa de pedir, na primeira acção, e a causa obstativa à procedência da causa de pedir do Autor, na segunda acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>K) Porém, quer o Tribunal de 1.ª Instância, quer o Tribunal da Relação de …, ao julgarem improcedente a acção principal, com fundamento na existência do direito de propriedade da “Sorimin” e na falta de prova do animus possedendi do Autor AA, qualificando-o como mero detentor, i.e. como possuidor em nome da GRACER e posteriormente da “SORIMIN”, violaram o caso julgado formado na primeira acção [Proc. 154/1997].</font></i><br>
</p><p><i><font>L) Se, porventura, se entender que não opera, no caso concreto, a excepção dilatória do caso julgado, por, em sentido estrito, não existir a tríplice identidade entre as duas acções - no que não se concede -, ainda assim se impõe, no caso em apreço, a aplicação do instituto (excepção peremptória) da autoridade do caso julgado, uma vez que: existe uma relação de prejudicialidade entre a primeira e a segunda ação; o Tribunal incorreria em contradição na decisão da segunda acção, face aos pressupostos substantivos da primeira; o reconhecimento da inexistência do direito de propriedade na primeira acção constitui um antecedente lógico indispensável, um pressuposto indiscutivelmente essencial, à tomada de decisão na segunda acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>M) Na decisão da segunda acção, o Tribunal ad quem tem de ter presente que o caso julgado material que se formou na primeira acção, a saber o reconhecimento de que a aqui Ré não é nem proprietária, nem possuidora do imóvel relativamente ao qual o Autor AA peticiona o reconhecimento da aquisição originária do seu direito de propriedade por via da sua posse continuada (usucapião), é um pressuposto indispensável e indiscutível da mesma. Só desta forma se obstando a contradições, a repetições e à invocação de fundamentos de defesa que já se encontram precludidos, quer por terem sido aventados na primeira acção, quer porque o poderiam e não foram.</font></i><br>
</p><p><i><font>N) O Acórdão recorrido julgou a acção principal improcedente por partir de um pressuposto manifestamente oposto ao decidido na primeira acção, i.e. o de que a GRACER/SORIMIN é proprietária e possuidora do bem imóvel cuja aquisição (por usucapião) é peticionada nesta acção e, como tal, o Autor AA não é um possuidor em nome próprio, mas um mero detentor, por praticar os actos materiais sobre a coisa por via da mera condescendência da sua proprietária e - segundo o Tribunal a quo -nunca ter invertido o título da posse, nomeadamente contra a GRACER/SORIMIN.</font></i><br>
</p><p><i><font>O) O Tribunal a quo ao considerar o Autor como um simples detentor, que nunca inverteu o título da posse, utilizou como antecedentes lógicos da decisão factos e fundamentos contraditórios com a autoridade do caso julgado formado na acção anterior quanto à inexistência do direito de propriedade e da posse da GRACER/SORIMIN, uma vez que: só se pode inverter o título da posse contra alguém que seja possuidor (a SORIMIN, segundo a sentença); só se pode possuir em nome alheio, existindo um possuidor; só um proprietário/possuidor pode condescender na ocupação de imóvel pelo Autor; as presunções de posse só são ilididas mediante a prova do direito de propriedade do titular inscrito.</font></i><br>
</p><p><i><font>P) Sempre tendo por base o referido pressuposto contraditório, em face do caso julgado formado na primeira acção, o Tribunal a quo considerou, mal, que a presunção ínsita no n.º 2, do art.º 1252.º, do C.C., havia sido ilidida, i.e. por a Ré ter alegado e feito prova de que é proprietária e possuidora do bem em causa, atento o trato sucessivo registral e o trato sucessivo da posse titulada invocados. Acontece, porém, que a Ré “Sorimin” estava impedida de, na acção principal, alegar tais factos, por via da preclusão operada pela primeira acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>Q) O Tribunal a quo ao fundamentar a decisão de direito, na acção principal, em factos e fundamentos alegados pela “Sorimin” que já haviam precludido, violou a autoridade do caso julgado, dado que, sendo o seu conhecimento oficioso (art.ºs 577.º, al. i), 578.º e 579.º, todos do C.P.C.), não o poderia ter feito.</font></i><br>
</p><p><i><font>R) A Ré “Sorimin” e a Interveniente Principal “Casa Amiga”, estavam impedidas de contestar a acção principal, quer com fundamento em direitos que anteriormente confessou serem inexistentes (aquisição derivada do direito de propriedade e posse titulada/derivada); quer com fundamentos que, por virtude do princípio da preclusão, poderiam ter sido invocados na primeira ação, nomeadamente: a acessão na posse; a aquisição originária do direito e contra-excepções ao direito invocado pelo Autor. Assim, as ditas contestações têm que ser tidas por não escritas, nas partes em que alegam tal factualidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>S) A desistência do pedido, pela então Autora GRACER , é nada mais que a confissão de não lhe assistir o direito de propriedade, nem a posse, sobre parcela da “Quinta …”. Assim, quer pela autoridade de caso julgado, quer pela confissão operada pela desistência, as contestações têm-se por não escritas e, consequentemente, os factos vertidos na p.i. têm de ser havidos como não impugnados, estando-se perante uma situação de revelia operante (cfr. art.º 567.º, n.º 1, do C.P.C.) e, consequentemente, têm-se por confessados todos os factos alegados pelo Autor AA, o que, conduz, necessariamente, à procedência dos pedidos por ele formulados na acção principal. A decisão recorrida ao valorar tal factualidade, invocada pelas RR., incorreu em erro na interpretação e aplicação do disposto no art.º 581.º do C.P.C..</font></i><br>
</p><p><i><font>T) Devendo o Tribunal ad quem revogar o Acórdão recorrido e, em sua substituição, proferir decisão que, com base nos fundamentos de direito supra expostos, julgue a acção principal totalmente procedente e, consequentemente, declare que o autor AA adquiriu, por usucapião, a parcela da “Quinta …”, mais bem identificada no pedido.</font></i><br>
</p><p><i><font>U) A autoridade do caso julgado tem de produzir efeitos vinculativos, não só quanto às pretensões deduzidas pelos Autores, mas também relativamente à sua defesa, quando na segunda acção ocupam a posição de Réus, pois só assim será evitada a contradição, desta feita, não entre decisões, mas entre pressupostos lógicos subjacentes a uma determinada decisão. A não ser assim, a autoridade do caso julgado permitir ia que uma parte a quem foi negada uma pretensão [reconhecimento do direito de propriedade] a possa utilizar como arma de arremesso em acções que contra ela sejam propostas, obstando, com a sua defesa, à procedência da segunda acção, ainda que com base em direitos que confessou inexistirem (na primeira acção). </font></i><br>
</p><p><i><font>V) Assim, mesmo que não se considere verificada uma situação de revelia operante, no que não se concede e a título subsidiário se alega, ainda assim os fundamentos utilizados pelas RR., para obstarem à procedência da pretensão do Autor, têm que ser tidos por não escritos, nomeadamente quando invocaram: o acto aquisitivo do direito de propriedade; o registo da aquisição do direito de propriedade; o trato sucessivo registral, tendente à demonstração da aquisição derivada válida – probatio diabolica; a prática de actos contidos nos poderes inerentes ao direito de propriedade, seus e dos seus antepossuidores.</font></i><br>
</p><p><i><font>W) Devendo o Tribunal ad quem, no uso dos poderes cassatórios da matéria de facto que lhe são conferidos pelo art.º 674º, nº 3, in fine, do C.P.C., expurgar da matéria de facto julgada provada pelas instâncias uma parte substancial da fundamentação de facto da decisão recorrida, porquanto a desistência do pedido, no Proc. n.º 154/1997, constitui uma confissão (artigo 352º do Código Civil), a qual, para efeitos da presente acção principal, tem a natureza de confissão extrajudicial, feita à então parte contrária, o aí Réu AA, aqui Autor, tendo, por isso, força probatória plena, nos termos do disposto no art.º 358.º, n.º 2, do C.C..</font></i><br>
</p><p><i><font>X) Devem ser expurgados (não escritos), da fundamentação de facto, os factos da Sentença/Acórdão, indevidamente dados como provados, pelas instâncias: 12), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 24), 25), 28), 29), 30), 31), 33), 49), 54), 55), 56), 59), 60), 61), 62), 63), 64), 65), 66), 67), 68) e 69). Tal como devem ser tidos em consideração, na fundamentação de facto, os factos alegados pelo Autor indevidamente considerados não provados, por terem sido impugnados ilegalmente pelas RR., mediante invocação do direito de propriedade e da posse da GRACER/SORIMIN e dos seus ante-proprietários e antepossuidores, a saber os constantes dos seguintes artigos da p.i.: 17.º, 26.º, 33.º, 34.º, 36.º, 37.º, 49.º, 66.º, 67.º, 68.º, 69.º, 70.º, 72.º, 73.º, 74.º, 75.º, 76.º, 78.º, 79.º, 80.º, 81.º, 82.º, 83.º, 84.º e 85.º; e os que integram as alíneas a), c) e d) dos factos não provados do Acórdão. </font></i><br>
</p><p><i><font>Passando estes a ser os únicos factos que devem constar da matéria de facto definitivamente fixada pelo STJ, enquanto tribunal “ad quem”, no exercício dos poderes cassatórios da matéria de facto conferidos pelo cit. art. 674º, nº 3, parte final, do C.P.C..</font></i><br>
</p><p><i><font>Y) Resulta da factualidade que deve integrar, definitivamente, a fundamentação de facto da decisão que: o Autor tem o corpus sobre a parcela de terreno da “Quinta …” cuja aquisição, por usucapião, pretende ver reconhecida na presente acção; é possuidor, atenta a presunção do n.º 2, do art.º 1252.º, do C.C., não ilidida pela “Sorimin”, única entidade que de acordo com as regras de ónus de prova o poderia fazer (art. 350º, nº 2, do Código Civil); presume-se titular do direito correspondente à sua posse, dada a inexistência de presunção fundada em registo anterior a favor da “Sorimin”, dado o início da posse remontar, no pior dos cenários a 1994 e 1996 e o registo ser do ano de 2005 (art.º 1268.º, n.º 1, do C.C.).</font></i><br>
</p><p><i><font>Z) Para a apreciação da posse do Autor sobre os “cómodos agrícolas” relevam os seguintes factos: Facto 33) do Acórdão – expurgado em face das confissões, decorrentes da autoridade do caso julgado]; Al. d) dos factos não provados do Acórdão, que passa a provado; Facto alegado no art.º 83.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 26.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 33.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 34.º da p.i. confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 36.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 37.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 78.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 66.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 67.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto 40) do Acórdão; Facto 41) do Acórdão; Facto alegado no art.º 72.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 73.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto 42) do Acórdão; Facto alegado no art.º 76.º da p.i,, confessado por via da autoridade do caso julgado; Al. a) dos factos não provados do Acórdão, que passa a provado; Facto alegado no art.º 74.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto alegado no art.º 75.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto 43) do Acórdão; Facto alegado no art.º 81.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto 44) do Acórdão; Facto alegado no art.º 80.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; Facto 45) do Acórdão; Facto 46) do Acórdão; Facto 47) do Acórdão; Facto alegado no art.º 70.º da p.i., confessado por via da autoridade do caso julgado; e Facto 48) do Acórdão.</font></i><br>
</p><p><i><font>AA) De tais factos decorre que o Autor é possuidor desde 1981, sendo, desde sempre, a sua posse pública e pacífica (art.ºs 1261.º-1 e 1262.º, ambos do C.C.), não titulada (art. 1259º, nºs 1 e 2 do C.C.), que se presume de má-fé (art.º 1260.º, nº 2, do C.C.) e, consequentemente, só possibilitando a aquisição por usucapião ao fim de 20 (vinte) anos – art.º 1296.º do C.C., ou seja no ano de 2001.</font></i><br>
</p><p><i><font>BB) Devendo o Tribunal ad quem revogando o Acórdão recorrido e declarar que o Autor adquiriu a propriedade da parcela da “Quinta …”, correspondente aos cómodos agrícolas, com a área e delimitações constantes do pedido, no ano de 1981 (art.º 1288.º, do C.C.);</font></i><br>
</p><p><i><font>CC) Dado que a acção que correu termos sob o Proc. n.º 154/97 tinha por objecto a reivindicação, unicamente, da Vila …, não abarcando nem os cómodos agrícolas, nem o pomar, a citação do aqui Autor/Recorrente para os termos da referida acção correspondente ao Proc. n.º 154/97 nunca poderia ter tido a virtualidade de interromper o prazo tendente à aquisição por usucapião (cfr. art.º 323.º, n.º 1, do C.C., aplicável ex vi art.º 1292.º, do mesmo diploma).</font></i><br>
</p><p><i><font>DD) Ainda que assim não se entenda, e mesmo que se desse de barato que a posse do Autor sobre os cómodos agrícolas só se havia iniciado em 1996 e que, por força da sua citação para os termos referida acção (entrada em 30-06-1997), a mesma se terá interrompido em 05-07-1997 (por força da citação ficta prevista no art.º 323.º, n.ºs 1 e 2, do C.C. e do disposto no art.º 326.º, n.º 1, primeira parte do C.C., aplicável ex vi do art.º 1292.º, do mesmo diploma | [0 0 0 ... 0 0 0] |
0jFju4YBgYBz1XKv2f8g | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><b><font>1 </font></b><font>- AA deduziu os presentes embargos invocando a exceção de “caso julgado” da instância executiva quanto aos valores que considera já contemplados pelas sentenças proferidas nos apensos C e F e a prescrição dos juros de mora reclamados por decurso do prazo de cinco anos previsto no artigo 310.º, alínea d), do Código Civil, bem como impugnando a factualidade e os valores constantes do requerimento executivo.</font><br>
</p><p><font>Mais requereu a condenação da exequente/embargada como litigante de má fé em multa e indemnização a favor do executado e do Tribunal, em montante não inferior a € 5.000,00.</font><br>
</p><p><b><font>2 </font></b><font>- Os embargos foram admitidos e, notificada para contestar, a exequente/embargada veio fazê-lo, pugnando pela improcedência das exceções deduzidas e dos demais fundamentos dos embargos.</font><br>
</p><p><font>Mais sustentou não existir da sua parte qualquer atuação com má-fé. </font><br>
</p><p><b><font>3 </font></b><font>- Em resposta ao convite do Tribunal, após suscitar questões que se prendem com o título executivo quanto às prestações reclamadas depois de a filha das partes ter concluído o infantário (cfr. o regime homologado no apenso A) e antes de fixada nova prestação de alimentos no apenso C, a necessidade de a quantia exequenda refletir as várias decisões sobre alimentos proferidas ao longo do tempo e ser liquidada por referência ao período de frequência do infantário e à respetiva mensalidade:</font><br>
</p><p><font>a) a exequente/embargada veio sustentar que o dever de o executado/embargado prestar alimentos não cessou depois de a filha concluir o infantário, mantendo-se a obrigação de pagar o valor equivalente à mensalidade do infantário (conforme determinado no apenso A) até ter sido fixada nova prestação no apenso C; e</font><br>
</p><p><font>b) o executado/embargante veio defender o contrário, ou seja, que no período compreendido entre o fim da frequência do infantário e a fixação de uma prestação no apenso C não houve lugar a obrigação de alimentos por ausência de prestação fixada, sendo que era ónus da progenitora, finda tal frequência, requerer a alteração do regime anteriormente acordado.</font><br>
</p><p><b><font>4 </font></b><font>- Continuando por resolver a questão atinente à discriminação e liquidação da quantia exequenda nos termos acima mencionados, em sede de audiência prévia a exequente/embargada prestou os esclarecimentos correspondentes e, nessa sequência, sem a oposição do executado/embargante, corrigiu o requerimento executivo/liquidou a quantia exequenda em conformidade (cfr. ref.ª 632…85 dos autos de execução).</font><br>
</p><p><font>O executado/embargante, notificado para exercer o contraditório quanto ao teor dessa correção/liquidação mediante o complemento dos seus embargos, apenas reiterou os argumentos descritos em 3-b) supra e alegou/documentou determinados pagamentos por conta da prestação de alimentos (cfr. ref.ª 647…00).</font><br>
</p><p><font>A exequente/embargada não se pronunciou sobre os pagamentos alegados. </font><br>
</p><p><b><font>5 </font></b><font>- Procedeu-se ao saneamento do processo, julgando-se improcedente a exceção de caso julgado pelos fundamentos constantes do despacho saneador, a que acresce, em complemento, a circunstância de as prestações reclamadas no apenso F de incumprimento (a partir de outubro de 2015) respeitarem a período posterior aos valores exigidos na execução (até 1.09.2015), e declarando-se a instância válida e regular.</font><br>
</p><p><font>A exceção de prescrição foi, igualmente, julgada improcedente.</font><br>
</p><p><b><font>6 </font></b><font>- Procedeu-se à identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.</font><br>
</p><p><b><font>7 </font></b><font>- Teve lugar a audiência final, com observância de todo o formalismo legal.</font><br>
</p><p><font>Mantiveram-se os pressupostos que presidiram à prolação do despacho saneador.</font><br>
</p><p><font>Em sede de Questões a decidir consignou-se que estas eram as seguintes:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>A. (In)existência de título executivo quanto a parte das prestações reclamadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Pagamento – parcial – das prestações de alimentos reclamadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>C. Litigância de má-fé por banda da exequente/embargada</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><b><font>8 </font></b><font>- Proferida a sentença, nela foi decidido o seguinte:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Face ao exposto, julgam-se os presentes embargos parcialmente procedentes, deduzindo-se à quantia exequenda (capital e juros vencidos e vincendos) o valor de € 5.150,00, imputando-a nos termos do artigo 785.º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Mais se absolve a exequente/embargada do pedido de condenação como litigante de má-fé em multa e indemnização.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>*</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Custas a cargo do embargante e da embargada na proporção do decaimento, que se fixa, respectivamente, em 85% e 15% (artigo 527.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário.</font></i><br>
<p><i><font>Registe e notifique</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><b><font>9 </font></b><font>- Inconformado, o embargante interpôs recurso de apelação, sendo proferido o acórdão recorrido, no qual se deliberou:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, acordam os Juízes, na …Secção Cível, deste Tribunal da Relação, deferindo parcialmente a reclamação, em:</font></i><br>
</p><p><i><font>1) Julgar parcialmente procedente o presente recurso interposto.</font></i><br>
</p><p><i><font>2) Revogar parcialmente a decisão recorrida - e bem assim a Decisão Sumária proferida em 06.04.2021, que a confirmou - e, julgando os presentes embargos parcialmente procedentes, em consequência, declarar que a sentença proferida em 22.11.2002, no apenso A, que homologou o acordo dos pais quanto à regulação das responsabilidades parentais, não consubstancia título executivo, para a exequente poder obter a quantia exequenda pedida com base nesse título.</font></i><br>
</p><p><i><font>3) Manter, no mais, a sentença recorrida e bem assim a Decisão Sumária proferida em 06.04.2021 (ou seja, quanto às decisões lavradas sobre a improcedência da exceção do caso julgado invocada, a dedução da quantia já paga de € 5.150,00 na quantia exequenda pretendida pela exequente e sobre a improcedência do pedido de condenação da embargada como litigante de má-fé).</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelo recorrente e recorrida na proporção do decaimento</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformada com o decidido pelo Tribunal da Relação, interpõe recurso de Revista para este STJ, a embargada, e formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“A) Será assim de concluir que o valor de €:.174,58 (cento e setenta e quatro euros e cinquenta e oito cêntimos), fixado no Acordo homologado por sentença, proferida em 22/11/2002, integra a pensão de alimentos, sendo, como tal, exequível.</font></i><br>
</p><p><i><font>Porquanto,</font></i><br>
</p><p><i><font>B) Tratava-se de uma ação de alteração de regulação das responsabilidades parentais, em que o Douto Tribunal não deixaria espaços em branco quanto à fixação da pensão de alimentos, e, se não fosse essa a sua intenção, uma menção expressa resultaria do que houve sido acordado.</font></i><br>
</p><p><i><font>C) Constando ainda do mencionado Acordo que o pai, aqui recorrido, deveria pagar o “valor atualizado”, menção que tipicamente se refere ao pagamento da pensão de alimentos.</font></i><br>
</p><p><i><font>D) O progenitor continuou a pagar a pensão de alimentos durante 1 (um) ano, após a saída da menor do infantário que frequentava, tal como devia ter sempre feito devido à inevitável continuidade das naturais despesas com a menor.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ademais,</font></i><br>
</p><p><i><font>E) O Douto Tribunal que fixou o Acordo, com certeza não teria intenção de onerar as Partes a ter de recorrer a Tribunal para que tal aspeto fosse alterado, na medida em que daí se retiraria um uso desadequado e causador de uma sobrecarga injustificada no sistema de Justiça.</font></i><br>
</p><p><i><font>F) E elementos como a educação são já compreendidos na pensão de alimentos, em consonância com as doutas palavras da Sr.ª Dr.ª Juiz …, Juiz de Direito no Juízo de Família e Menores de …: (…) No que respeita especificamente à pensão de alimentos e à expressão “sustento” utilizada no art. 1878º do Código Civil, deve entender-se que esta abrange não apenas a alimentação e a habitação, vestuário e formação escolar- cf. Art. 2003º/1 e 2 do Código Civil – mas também as despesas com assistência médica e medicamentosa, deslocações, actividades de desporto e lazer, e todas as outras que se mostrem inerentes às necessidades da vida quotidiana (…), in A Fixação da Pensão Alimentar a Título Provisório e Definitivo, III Jornadas de Direito da Família e das Crianças, CEF, 2019. (sublinhado nosso), cabendo nesta sede frisá-lo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos, e nos demais de Direito que Vossas Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso, nomeadamente à existência de um dever de prestar a pensão de alimentos, e em consequência, revogar a procedência da decisão do tribunal a quo quanto à não admissibilidade do acordo dos pais quanto á regulação das responsabilidades parentais como título executivo”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>O embargante não contra-alegou.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Os factos apurados são os seguintes:</font><br>
<p><i><font>“2. Os Factos</font></i><br>
</p><p><i><font>2.1. Factos Provados:</font></i><br>
</p><p><i><font>Consideram-se provados, com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos:</font></i><br>
</p><p><i><font>1. BB nasceu em … .08.1999 e é filha do executado/embargante e da exequente/embargada, respectivamente, divorciado e solteiro à data.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Na sequência da separação dos progenitores, por sentença proferida em … .02.2001 nos autos principais, já transitada em julgado, a guarda da jovem foi confiada à mãe (aqui exequente/embargada) e o pai (aqui executado/embargante) ficou obrigado a pagar a título de alimentos a favor da filha, até ao dia 08 de cada mês, por depósito na conta da progenitora, a quantia de 40.000$00 mensais, a actualizar anualmente, a partir de Janeiro de 2002, na mesma proporção em que o fosse o salário mínimo nacional para cada ano, e a comparticipar em metade das despesas extraordinárias de saúde da menor.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Por acordo homologado por sentença proferida em 22.11.2002 no apenso A, já transitada em julgado, foi alterado regime de exercício das responsabilidades parentais, nos seguintes termos:</font></i><br>
</p><p><i><font>“1 O pai pagará a mensalidade do infantário da menor que actualmente ascende a € 174,58 e, sempre que tal valor for aumentado, o pai pagará o valor actualizado.</font></i><br>
</p><p><i><font>2 O pai continuará a comparticipar em metade das despesas extraordinárias de saúde da menor.</font></i><br>
</p><p><i><font>3 O pai pagará metade do acréscimo sobre a mensalidade do infantário devida pela frequência da piscina pela menor, sendo que actualmente tal acréscimo ascende a 3.000$00.”</font></i><br>
</p><p><i><font>4. A jovem frequentou o infantário até Agosto de 2005, inclusive, e a mensalidade foi sempre no valor de € 174,58.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. O progenitor pagou o valor referido em 3-1/4 até Agosto de 2006.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. O Ministério Público, em 10.05.2014, instaurou, em representação da jovem, então menor, acção para alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais (a que corresponde o apenso C), pedindo a fixação de um novo regime de prestação de alimentos de acordo com as necessidades daquela. </font></i><br>
</p><p><i><font>7. Na ausência de acordo, no âmbito da acção referida em 4, por decisão de 21.09.2015, o Tribunal na conferência de pais fixou, a título provisório, uma prestação de alimentos a cargo do progenitor a favor da filha no valor de € 100,00 mensais.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Por sentença proferida no apenso C em 19.07.2016, já transitada em julgado, o Tribunal alterou o regime de exercício das responsabilidades parentais e o progenitor ficou obrigado a contribuir com a quantia mensal de € 125,00 a título de alimentos para a sua filha, a pagar entre os dias 01 e 08 de cada mês, através de cheque ou transferência bancária, e a actualizar anualmente em Janeiro pelo valor de € 1,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>9. O executado/embargante no período compreendido entre 20.12.2007 e 13.02.2009 pagou por conta das prestações de alimentos a quantia total de € 5.150,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>2.2. Factos não provados: </font></i><br>
</p><p><i><font>Não se provou:</font></i><br>
</p><p><i><font>Que o executado/embargante pagou outros montantes para além dos documentados nos autos e não impugnados pela exequente/embargada, no referido total de € 5.150,00, a título de prestações de alimentos devidas à sua filha”.</font></i><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelos recorrentes e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C.</font><br>
</p><p><font>No caso em análise questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- Se o valor de €:.174,58, fixado no Acordo homologado por sentença, proferida em 22/11/2002, integra a pensão de alimentos, sendo, como tal, exequível.</font><br>
</p><p><font>Resulta dos factos provados que por sentença proferida em 22.11.2002, foi homologado o acordo alcançado, do qual consta:</font><br>
</p><p><font>- O pai (executado/embargante) pagará a mensalidade do infantário da menor que, naquela data importava em € 174,58 e, sempre que tal valor for aumentado, o pai pagará o valor atualizado.</font><br>
</p><p><font>Quiseram os autores do acordo que esta mensalidade se reportasse ao período temporal em que a menor frequentasse o infantário, como alega o executado/embargante ou, quiseram reportar-se a mensalidade a título de alimentos que seria substituída por mensalidade do infantário enquanto a menor o frequentasse, como alega a exequente/embargada?</font><br>
</p><p><font>Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva - art. 10º, nº 5, do CPC, indicando o art. 703º, do mesmo diploma, as espécies de títulos executivos, sendo logo referido na al. a), as sentenças condenatórias.</font><br>
</p><p><font>Aqui se englobando as sentenças em que o juiz, de forma expressa ou implícita, impusesse a alguém determinada responsabilidade, tornando-a exequível, o que acontece nas sentenças homologatórias de transação.</font><br>
</p><p><font>O acordo firmado pelos progenitores, no que respeita ao exercício das responsabilidades parentais, e homologado por sentença é exequível.</font><br>
</p><p><font>Bastando emergir da sentença uma condenação implícita no cumprimento de uma obrigação, como salienta o Ac. deste STJ de 08/01/2015, proferido no Proc. nº 117-B/1999.P1.S1, acrescentando: </font><i><font>“Se a exequibilidade intrínseca se verifica relativamente a documentos autênticos e autenticados que constituam ou reconheçam a existência de uma obrigação (art. 707º do NCPC), a recusa desse pressuposto a uma sentença, só porque da mesma não emerge uma condenação explícita no cumprimento de uma obrigação que pela mesma é reconhecida ou constituída, revelar-nos-ia uma incongruência sistémica. Na verdade, malgrado a maior solenidade que rodeia a prolação da sentença e as garantias do contraditório que são asseguradas em todo o percurso processual para a atingir, acabaria por produzir menos efeitos do que os emergentes da apresentação de um daqueles documentos</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>A sentença que constitui título executivo base da execução a que estes embargos são apenso, embora tenha subjacente a existência efetiva duma obrigação de pagamento, a essa obrigação apenas correspondia um direito de crédito na esfera da exequente, desde que respeitasse à mensalidade do infantário da menor, mas não mais do que isso.</font><br>
</p><p><font>Dessa sentença não subjaz, nem de forma expressa nem implícita, a existência da obrigação, para além da mensalidade no infantário da menor.</font><br>
</p><p><font>Assim, apenas enquanto a menor frequentasse o infantário a obrigação subsistiria.</font><br>
</p><p><font>E não se pode querer fazer corresponder essa obrigação à obrigação de prestação de alimentos devidos a menor. </font><br>
</p><p><font>Temos que na interpretação do título executivo não se deve ampliar o sentido do conteúdo do documento que o contém, isto é, não se pode extrapolar o que foi determinado na decisão que transitou em julgado.</font><br>
</p><p><font>E o que foi determinado na sentença que homologou o acordo dos progenitores foi que, o pai (executado/embargante) pagará a mensalidade do infantário da menor. </font><br>
</p><p><font>A interpretação das decisões judiciais, como qualquer interpretação, começa pelo exame do texto a interpretar.</font><br>
</p><p><font>A execução deve seguir o previsto no título executivo, não se podendo sob a alegação de pretender interpretar a decisão, alterar o seu teor.</font><br>
</p><p><font>No caso não é possível falar em interpretação sistemática porque não existe termo de comparação e, a haver (“O pai pagará metade do acréscimo sobre a mensalidade do infantário devida pela frequência da piscina pela menor”) apenas reforça o entendimento de que apenas está em causa a mensalidade do infantário e não a prestação de alimentos.</font><br>
</p><p><font>A sentença homologatória do acordo em que constava esta obrigação é de 2002 e já antes, em 2001, tinha havido uma sentença pela qual o pai (aqui executado/embargante) ficou obrigado a pagar “a título de alimentos” a favor da filha.</font><br>
</p><p><font>Donde resulta não haver dúvida acerca da terminologia utilizada, e quando os progenitores acordaram em o pai da menor pagar a mensalidade do infantário era isso mesmo que pretenderam acordar, inexistindo quaisquer indícios factuais que permitam dar outra interpretação ao acordado, nomeadamente de que se quereriam referir a prestação ou mensalidade a título de alimentos devidos.</font><br>
</p><p><font>Quer da análise global do acordo, que analisando por segmentos se pode concluir, como concluiu a sentença da 1ª Instância que </font><i><font>“…mantendo-se a mesma estrutura dos regimes, é, também, razoável concluir – sendo esta mais uma das circunstâncias atendíveis no caso a considerar pelo intérprete – que os progenitores ao acordarem na alteração pretenderam substituir o valor da prestação (base) anterior (40.000$00 mensais) pelo valor da mensalidade do infantário, reduzindo assim a medida da obrigação de alimentos, continuando a prever-se a obrigação de comparticipar em determinadas despesas extraordinárias…</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E o facto de o embargante pagar a prestação durante um ano após a menor terminar o infantário não significa que a prestação do infantário era uma prestação de alimentos.</font><br>
</p><p><font>Temos que um declaratário normal daria este entendimento ao constante da clausula em análise, conforme art. 236 do Cód. Civil, e o entendimento da recorrente (e da sentença) não tem qualquer correspondência com o constante da clausula em causa- art. 238, do CC, respeitante a interpretação de negócio formal.</font><br>
</p><p><font>Só por si, a obrigação legal de o progenitor contribuir com alimentos ao menor não constitui título executivo, sendo necessária a existência de sentença condenatória.</font><br>
</p><p><font>E o facto de o progenitor ter pago 5150,00€ entre dezembro de 2007 e fevereiro de 1009 a titulo de alimentos, não foi em cumprimento de qualquer sentença condenatória, mas sim em cumprimento da obrigação legal consagrada no art. 1878º do Cód. Civil ao estatuir que compete aos pais prover ao sustento dos filhos.</font><br>
</p><p><font>Assim que concordamos com o entendimento seguido pelo acórdão recorrido que foi: </font><i><font>“Por conseguinte, coloca-se a questão de saber se a sentença que condenou o executado a pagar a mensalidade do infantário continua a constituir título executivo para pagamento da quantia de 174,58 depois da criança sair do infantário.</font></i><br>
</p><p><i><font>Como já referimos supra, afigura-se-nos que a resposta a esta questão, deve ser negativa.</font></i><br>
</p><p><i><font>Com efeito, salvo o devido respeito, singelamente, diremos:</font></i><br>
</p><p><i><font>Desde logo, é o título que determina o fim e os limites da acção executiva – art.º 10.º, n.º 5, do C. P. Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Como sabemos, a sentença é um documento cuja interpretação obedece, além do mais, ao disposto nos art.ºs 236.º e 238.º, ambos do C. Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ora, não há nenhum elemento na sentença proferida em 22.11.2002 que aponte no sentido de que, na hipótese de menor sair do infantário, o pai, em vez de pagar a mensalidade, pagaria a mesma importância da mensalidade, mas a título de alimentos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Por outro lado, a circunstância de o pai da criança, executado, ter continuado a pagar a quantia equivalente à mensalidade do infantário, mesmo depois da filha já o não frequentar, não significa que a sentença deva valer com o sentido de que, na hipótese de menor sair do infantário, o pai, em vez de pagar a mensalidade, pagaria a mesma importância da mensalidade, mas a título de alimentos.</font></i><br>
</p><p><i><font>Saliente-se que não se põe em causa o direito a alimentos da criança, nem que a mãe da criança tenha direito a ser reembolsada pelo pai pelo facto de apenas ela ter sustentado a criança.</font></i><br>
</p><p><i><font>Por conseguinte, e resumindo:</font></i><br>
</p><p><i><font>O que está em causa é saber se a sentença proferida em 22.11.2002, que impôs ao pai a obrigação de pagar a mensalidade o infantário, é título executivo para obter o pagamento coercivo de importância equivalente à mensalidade, depois de a criança deixar o infantário.</font></i><br>
</p><p><i><font>E, quanto a nós, como vimos, não é</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Assim que temos como improcedentes as conclusões do recurso e, consequentemente, a improcedência deste.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Sumário elaborado nos termos do art. 663 nº 7 do CPC:</font><br>
<p><font>I -</font><font> </font><font>O acordo firmado pelos progenitores, no que respeita ao exercício das responsabilidades parentais, e homologado por sentença é exequível.</font><br>
</p><p><font>II - Constando do acordo que “o pai pagará a mensalidade do infantário da menor”, da sentença que o homologa não subjaz, nem de forma expressa nem implícita, a existência da obrigação, para além da mensalidade no infantário da menor.</font><br>
</p><p><font>III -</font><font> </font><font>Na interpretação do título executivo não se deve ampliar o sentido do conteúdo do documento que o contém, isto é, não se pode extrapolar o que foi determinado na decisão que transitou em julgado.</font><br>
</p><p><font>IV -</font><font> </font><font>Quando os progenitores acordaram em o pai da menor pagar a mensalidade do infantário era isso mesmo que pretenderam acordar, inexistindo quaisquer indícios factuais que permitam dar outra interpretação ao acordado, nomeadamente a de que se quereriam referir a prestação ou mensalidade a título de alimentos devidos.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Decisão</font></b><font>:</font><br>
<p><font>Em face do exposto acordam, no Supremo Tribunal de Justiça e 1ª Secção Cível, em julgar o recurso improcedente, nega-se a revista confirmando-se o acórdão recorrido.</font><br>
</p><p><font>Custas pela recorrente, tendo em conta o benefício do apoio judiciário.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 16-11-2021</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator</font><br>
</p><p><font>Isaías Pádua – Juiz Conselheiro 1º adjunto</font><br>
</p></font><p><font><font>Nuno Ataíde – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
-jFgu4YBgYBz1XKv_P3z | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<p></p></div><br>
<br>
<b><font>AA, BB, CC e DD</font></b><font>, intentaram ação declarativa sob a forma de processo comum contra </font><b><font>Liberty Seguros Compañia de Seguros Y Reaseguros, S.A.</font></b><font>, pedindo a condenação da ré no pagamento:</font><br>
<p><font>À autora AA:</font><br>
</p><p><font>Da quantia global de €1.827.706,99 (Conforme retificação do pedido inicial, entretanto requerida, e admitida pelo Tribunal de 1ª Instância) sendo:</font><br>
</p><p><font>a) € 900.000,00 a título de danos patrimoniais futuros, decorrentes do défice funcional permanente de que alegadamente ficou a padecer em virtude do acidente de viação em causa nos presentes autos;</font><br>
</p><p><font>b) € 99.964,00 a título de perdas salariais, computadas desde o dia do acidente até fevereiro de 2019;</font><br>
</p><p><font>c) € 482.090,00 a título de dano futuro no que concerne à aquisição de próteses;</font><br>
</p><p><font>d) € 44.401,28 a título de dano futuro atinente à necessidade de manutenção/revisões das próteses;</font><br>
</p><p><font>e) € 4.950,00 a título de dano futuro atinente a despesas com cremes hidratantes para a zona amputada;</font><br>
</p><p><font>f) € 115.145,10 a título de ajuda de terceira pessoa;</font><br>
</p><p><font>g) € 41.736,62 a título de dano futuro atinente a despesas com tratamentos de fisioterapia/terapia ocupacional;</font><br>
</p><p><font>h) € 25.905,48 a título de dano futuro atinente a despesas com acompanhamento em Psicologia/Psiquiatria;</font><br>
</p><p><font>i) € 13.514,51 de despesas de cabeleireiro;</font><br>
</p><p><font>j) € 100.000,00 a título de danos não patrimoniais.</font><br>
</p><p><font>B) Ao autor BB:</font><br>
</p><p><font>Da quantia de € 40.000,00 a título de danos não patrimoniais;</font><br>
</p><p><font>C) À autora CC:</font><br>
</p><p><font>Da quantia de € 7.500,00 a título de danos não patrimoniais;</font><br>
</p><p><font>D) Ao autor DD: da quantia de € 40.000,00, por danos patrimoniais futuros decorrentes do défice funcional permanente de que alegadamente ficou a padecer em decorrência do acidente de viação em causa nos presentes autos e por danos não patrimoniais.</font><br>
</p><p><font>Os autores formularam os aludidos pedidos a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude de acidente de viação, ocorrido a … de abril de 2014, na E.N. 202, ao Km …, sito na freguesia de …, do concelho de …, em que intervieram os veículos ligeiros de passageiros com a matrícula ...-...-VX, conduzido pelo seu proprietário, o autor BB e ...-...-AQ, conduzido pelo proprietário DD, a cujo condutor atribuem a culpa exclusiva na produção do acidente, alegando ainda que o proprietário de tal veículo tinha transferido para a ré a responsabilidade civil por danos causados a terceiros.</font><br>
</p><p><font>A ré contestou, aceitando que o acidente ocorreu por culpa do veículo seguro, bem como o alegado na petição inicial quanto à dinâmica do acidente, impugnando, contudo, os factos relativos aos danos alegados e os valores indemnizatórios peticionados pelos autores, que reputa de muito exagerados.</font><br>
</p><p><font>Dispensada a realização da audiência prévia, foi fixado o valor da causa, selecionado o objeto do litígio, e foram enunciados os temas da prova, em termos que não mereceram reclamação das partes.</font><br>
</p><p><font>Admitidos os meios de prova, foi realizada a audiência final, no início da qual os autores - BB, CC e DD - e ré chegaram a acordo nos termos da transação exarada em ata e que foi homologada judicialmente, prosseguindo a ação para instrução e decisão referente às pretensões formuladas pela autora AA.</font><br>
</p><p><font>Após produção de prova foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, a qual se transcreve na parte dispositiva:</font><br>
</p><p><i><font>«(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) condena-se a Ré a pagar à A. a quantia de 1.337.614,65, sendo €1.237.614,65 a título de danos patrimoniais e €100.000,00 a título de danos não patrimoniais;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) condena-se a Ré a pagar à A. os juros de mora à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8Abr): desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais; desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Custas a cargo de Autora e Ré na proporção do decaimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Registe e notifique</font></i><font>».</font><br>
</p><p><font>Inconformada a ré recorreu de apelação, sendo deliberado e a final proferido acórdão com o seguinte dispositivo:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, em consequência do que:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Alteram a decisão recorrida - no que concerne ao montante indemnizatório referente ao dano patrimonial futuro decorrente do défice funcional permanente de que a autora ficou a padecer, condenando-se a ré a pagar a este título à autora o valor de € 460.000,00 em vez da quantia de € 500.000,00 atribuída na sentença recorrida;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Revogam a sentença recorrida, no segmento em que condenou a ré a pagar a autora o valor de €13.514,51 a título de despesas de cabeleireiro, e despesas futuras com acompanhamento em Psicologia, absolvendo-a nesta parte;</font></i><br>
</p><p><i><font>c) Em decorrência do enunciado em a) e b), alteram a alínea a) do dispositivo da sentença recorrida, reduzindo para € 585.016,70 a indemnização aí fixada a título de danos patrimoniais, e condenam a ré/recorrente a pagar à autora as quantias que se vierem a liquidar posteriormente, ao abrigo do disposto nos artigos 564.º, n.º 2, do CC e 609.º, n.º 2, do CPC, relativas a dano futuro no que concerne à aquisição de próteses biónicas (de substituição da mão direita) e custos com revisões e/ou reparações de tais próteses, dano futuro atinente a despesas com cremes hidratantes para a zona amputada, dano futuro atinente a despesas com tratamentos de fisioterapia/terapia ocupacional, - seja no membro amputado, seja no contralateral, assim como a uma consulta prévia de fisiatria, dano futuro atinente a despesas com acompanhamento em Psiquiatria, até aos montantes máximos que vêm peticionados a esse título.</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Alteram a sentença recorrida relativamente à alínea b) do dispositivo, determinando que os juros de mora sobre a quantia de €460.00,00 fixada a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro decorrente do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica sejam calculados desde a data da decisão da 1.ª instância;</font></i><br>
</p><p><i><font>e) Decidem manter, em tudo o mais, o decidido na sentença recorrida, sendo os juros desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos restantes danos patrimoniais já liquidados, e desde a data da decisão da 1.ª instância sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas da ação e da apelação pelas ré/apelante e autora/recorrida, na proporção dos respetivos decaimentos”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformada com o decidido pela Relação, a autora interpõe recurso de Revista para este STJ e, formula as seguintes conclusões:</font><br>
<div><br>
<i><font>1ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>O presente recurso prende-se com duas questões: - por um lado a quantificação do dano patrimonial futuro; por outro, a momento a partir do qual se inicia a contagem dos juros de mora no que respeita ao dano patrimonial futuro.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>2ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Quanto à primeira questão importa desde já afirmar que o Tribunal de 1ª Instância arbitrou, a esse título, a quantia de 500.000,00 € (quinhentos mil euros).</font></i><br>
<div><br>
<i><font>3ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>E com a extensa fundamentação constante do acórdão aqui em crise, o Tribunal a quo entendeu reduzir essa quantia para 460.000,00 €.</font></i><br>
<p><i><font>Mas fê-lo depois de ter aferido que a quantia devida à recorrente a esse título ascendia à quantia de 713.057,40 €.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>4ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>A essa quantia assim apurada (que fez questão de referir que era superior àquela que foi encontrada pela Meritíssima Juíza de 1ª Instância) deduziu – e mal – 10% por ser recebida de uma só vez e para não gerar um enriquecimento injustificado por parte da aqui recorrente, tendo resultado dessa operação a quantia de 641.751,44 €.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>5ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>E depois, pasme-se, por comparação com outras decisões e com recurso à equidade, arbitrou a quantia global de 460.000,00 €, isto é, 181.751,66 € a menos em relação à quantia que tinha encontrado!!!.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>6ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Ora, com o devido respeito, essa decisão do Tribunal a quo é tudo menos equitativa ou justa; parece-nos antes que, sempre com o devido respeito, se trata de uma decisão absolutamente arbitrária e não equitativa.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>7ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Que justificação se poderá encontrar para reduzir uma indemnização de 713.057,40 € para 460.000,00 €, isto é, que justificação será possível encontrar para uma redução – sem mais – de 253.057,40 €?</font></i><br>
<p><i><font>Por mais que a recorrente se esforce – e esforçou – não consegue encontrar no acórdão em crise no presente recurso a mais ténue explicação e/ou justificação para tamanha e tão desproporcional redução.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nem mesmo à luz do critério errado que utilizou da aplicação de uma redução de 10% pelo recebimento por inteiro e de uma só vez daquela quantia.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>8ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Será que a recorrente teve alguma culpa na eclosão do acidente? Será que a sua situação económica perante a da lesante (no caso a recorrida) imporia essa redução?</font></i><br>
<p><i><font>Uma e outra questão só podem ter uma resposta clara e objectiva: - NÃO.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>9ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Por isso, resta ao Tribunal a quo a tão falada equidade; mas como se lê em variadíssimos acórdãos dos nossos Tribunais Superiores equidade não é arbitrariedade.</font></i><br>
<p><i><font>A este propósito, e tal como vem referido no corpo do acórdão aqui em crise (pág. 95), diz-nos um acórdão do S.T.J. de 12.04.2007, que a utilização de fórmulas matemáticas, ou tabelas financeiras só possa servir para determinar o minus indemnizatório, o qual terá, posteriormente, de ser corrigido com vários outros elementos, quer objectivos quer subjectivos, que possam conduzir a uma indemnização justa.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>10ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Poderá, assim, reputar-se esta indemnização, com uma redução de mais de 250.000,00 € ao valor encontrado com base nessas tabelas financeiras ou fórmulas matemáticas, de justa?</font></i><br>
<p><i><font>Com o devido respeito, seguramente que não.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nem se encontra eco de tamanha redução em situações similares à da recorrente na Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>11ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Houve, assim, uma errónea interpretação por parte do Tribunal a quo do conceito de equidade, pois que isso não pode, de todo em todo, significar reduzir-se em quase metade o valor de uma indemnização, sem mais, sob o chapéu da equidade.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>12ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>E com o devido respeito, o Tribunal a quo parece ter parado no tempo, ao considerar, como o fez, que teria de se operar uma redução (que previu entre os 10% e os 33%) pelo simples facto de, recebida aquela quantia de uma só vez, poder a recorrente enriquecer à custa da recorrida com alguma aplicação financeira.</font></i><br>
<p><i><font>Que aplicação financeira será essa que permitiria à recorrente, ou a qualquer um de nós, receber juros que capitalizassem aquela quantia?</font></i><br>
</p><p><i><font>Desconhecerá o Tribunal a quo um facto público e notório – que nos entra casa adentro diariamente – que os juros estão, há já vários anos, em patamares negativos, isto é, que têm os depositantes quase de pagar para que as entidades financeiras e bancárias aceitem esses depósitos?</font></i><br>
</p><p><i><font>Parece-nos óbvio que essa circunstância será do desconhecimento do Tribunal a quo...</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>13ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Mas independentemente desse facto público e notório ser ou não do seu conhecimento, deveria ser do seu conhecimento o que vai referido, entre muitos outros doutos acórdãos, a este propósito, nos seguintes acórdãos:</font></i><br>
<p><i><font>- Ac. do S.T.J. de 19.04.2018, no Proc. nº 196/11.6TCGMR.G2.S1 e</font></i><br>
</p><p><i><font>- Ac. do S.T.J. de 14.12.2017, no Proc. nº 1520/04.3TBPBL-A.C1.S1, cujo trecho se transcreveu no corpo desta alegações e aqui se não reproduz por uma questão de economia processual.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>14ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Pelo acabado de referir, parece-nos pacífico que nos tempos que correm não poderá ocorrer seja que redução seja em virtude dessa quantia ser recebida de uma só vez.</font></i><br>
<p><i><font>Bem pelo contrário. A constante e galopante inflacção impõe mesmo que essa redução não seja uma dupla penalização para o lesado, no caso a recorrente.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>15ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Por isso, e depois de terem encontrado os valores que encontraram, melhor teria andado o Tribunal a quo se tivesse deixado inalterada a decisão de 1ª Instância no que tange ao valor arbitrado a título de dano patrimonial futuro, ou seja, a quantia de 500.000,00 €, podendo reputá-la, quando muito, de pecar por defeito; jamais por excesso.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>16ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Permita-se-nos o desabafo para afirmar que o único local onde ainda vale a pena ter um deposito é nos Tribunais, onde vigora uma taxa de juro (ainda que de mora) de 4%...</font></i><br>
<div><br>
<i><font>17ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Quanto aos juros moratórios do dano patrimonial futuro e o momento a partir do qual se deve iniciar a sua contagem, também o Tribunal a quo esteve mal ao ter alterado o que vinha doutamente decidido, o que fez até em flagrante violação do AUJ nº 4/2002, de 09.05.2002.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>18ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>O Tribunal de 1ª Instância decidiu – e bem – que os juros moratórios devidos pelo dano patrimonial futuro se contavam desde a data da citação.</font></i><br>
<p><i><font>E entendeu fazê-lo desse modo porque, não obstante ter apelado à intervenção da equidade na fixação desse montante (500.000,00 €) – como se lhe impõe e é do conhecimento geral – não actualizou essa quantia à data da prolação da decisão.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>19ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Ora, como decorre cristalinamente desse AUJ os juros de mora quanto aos danos patrimoniais são devidos desde a data da decisão desde que essa seja actualizadora do capital a receber; resulta igualmente de forma clara e cristalina da decisão de 1ª Instância que a quantia encontrada para indemnizar a recorrente pelo dano patrimonial futuro não o foi de forma actualizada.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>20ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Logo, e com o devido respeito por opinião diversa, jamais o Tribunal a quo poderia ter afirmado o que não tinha sido referido na decisão de 1ª Instância.</font></i><br>
<p><i><font>E, desse modo, estava-lhe vedada, até por força do supra referido AUJ, qualquer alteração relativamente ao momento a partir do qual deveriam ser contados os juros de mora relativamente ao dano patrimonial futuro arbitrado.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>21ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Do mesmo modo jamais se poderá considerar que a quantia de 460.000,00 € que entendeu – e mal – arbitrar à recorrente o foi de modo actualizado.</font></i><br>
<p><i><font>Como se poderá entender que a quantia de 460.000,00 € é actualizada quando partiu da quantia de 713.057,40 €?</font></i><br>
</p><p><i><font>E teria o Tribunal a quo actualizado a quantia de 500.000,00 € para a quantia final de 460.000,00€?</font></i><br>
</p><p><i><font>Tanto quanto a recorrente julga saber, quando se está perante uma actualização a mesma há-de resultar numa melhoria, num acréscimo que justifique essa mesma actualização para mais.</font></i><br>
</p><p><i><font>Jamais uma redução, e do jaez do que consta do acórdão em recurso poderá reputar-se de actualização...!</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>22ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Por isso, e a este propósito, melhor teria andado o Tribunal a quo se tivesse deixado intocada a decisão de 1ª Instância no que tange ao momento do início da contagem dos juros de mora relativos ao dano patrimonial futuro.</font></i><br>
<div><br>
<i><font>23ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>É que essa diferença de a recorrente ver os juros de mora que incidem sobre o seu dano patrimonial futuro serem contados desde a data da citação ou desde a data da prolação da decisão de 1ª Instância resulta em mais uma redução de mais de 50.000,00 €!!!</font></i><br>
<p><i><font>E a conta é fácil de se realizar:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) - a recorrida foi citada para presente lide em 12.03.2019; aplicando-se a taxa de juro de 4%, até à presente data (29.10.2021) tinha a recorrente direito à quantia de 52.712,33 € a título de juros de mora sobre a quantia de 500.000,00 €;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) - contando-se os juros de mora apenas da data da decisão proferida em 1ª Instância, que ocorreu no dia 21.01.2021, de juros de mora por aquela mesma quantia de 500.000,00 € iria a recorrente receber (contados até ao dia 29.10.2021) apenas a quantia de 15.397,26 €</font></i><br>
</p><p><i><font>Até por aqui, de forma singela, se percebe a insensatez da decisão do Tribunal a quo a propósito da contabilização dos juros de mora.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>24ª</font></i></div><br>
<br>
<i><font>Assim, e para não ocorrer esta dupla penalização e por tudo quanto supra se deixou referido a este propósito, os juros de mora sobre a quantia de 500.000,00 € deverão ter o início da sua contagem à data da citação, tanto mais que se assim não suceder se viola de forma grosseira o disposto no AUJ supra referido.</font></i><br>
<p><i><font>Pelo exposto deverá o acórdão proferido e aqui em crise ser revogado e em sua substituição ser proferido douto acórdão que condene a recorrida ao pagamento da quantia de 500.000,00 € a título de dano patrimonial futuro, com juros a vencerem-se desde a data da citação até efectivo e integral pagamento</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Foram apresentadas contra-alegações pela ré, nas quais conclui:</font><br>
</p><p><i><font>1. Vem a Recorrente refutar o montante fixado pelo Tribunal recorrido, de € 460.000,00, a título de dano patrimonial futuro decorrente do défice funcional permanente de que ficou a padecer, defendendo que o mesmo se encontra subvalorizado.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Contrariamente ao que o Recorrente alega, sendo a perda da capacidade de ganho um dano presente, com repercussão no futuro, durante o período laboralmente activo do lesado, o Tribunal recorrido, à luz do que dispõe o artigo 566.º, n.º 3, do CPC, jamais poderia olvidar o recurso à equidade, tendo em conta que não se poderá antever a “evolução do mercado laboral, do nível remuneratório e do emprego, a evolução do custo de vida, os níveis dos preços, do juros, da inflação, a evolução tecnológica, bem como de outros elementos que influem na retribuição (como é o caso dos impostos)” – cfr. Ac. do STJ de 18-12-2012, Proc. n.º 1030/09.2TBFLG.G1.S1.</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Mais, invoca a Recorrente que o Tribunal da Relação não se socorreu da equidade, mas antes de arbitrariedade, fazendo tábua rasa do recurso a tabelas financeiras.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Neste conspecto, entendeu o Tribunal da Relação, e bem, que “as tabelas por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero caráter orientador, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade, importa avaliar o método de cálculo do dano patrimonial futuro enunciado na decisão recorrida, como meio auxiliar ou indicativo, porquanto estamos perante a aferição de um dano de natureza patrimonial.” (negrito e sublinhado nosso)</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Ao revogar a indemnização fixada nesta sede pelo Tribunal de 1.ª instância, cita-se o acórdão proferido nesta matéria “Trata-se, porém, de um valor que assenta, essencialmente, no cálculo aritmético de rendimentos específicos, e que, por isso, entendemos dever ser alterado, tendo por base o recurso à equidade, enquanto critério legalmente previsto, e considerando todos os elementos, quer objetivos quer subjetivos, que possam conduzir a uma indemnização justa e adequada.”. (negrito e sublinhado nosso)</font></i><br>
</p><p><i><font>6. O Tribunal da Relação fez uma criteriosa conjugação da prova e ponderação da matéria de facto dada como provada, nomeadamente as sequelas que a Recorrente ficou portadora e que lhe causaram um défice permanente da integridade físico-psíquica de 55 pontos, sendo as mesmas compatíveis com o exercício da atividade habitual, ainda que impliquem esforços suplementares.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. No que respeita aos considerandos tecidos pela Relação em face das concretas lesões sofridas pela Recorrente, demonstrou-se não ser possível concluir, necessariamente, pela ocorrência, em definitivo, de uma perda efectiva de ganho futuro no âmbito do exercício da sua actividade profissional habitual, “mas antes que a lesada tem de fazer um maior e considerável esforço para obter o mesmo rendimento (tais sequelas implicam esforços suplementares).” – (negrito e sublinhado nosso)</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Tal como se refere Ac. do STJ de 13-07-2017, Revista n.º 3214/11.4TBVIS.C1.S1, “Em caso de défice funcional permanente que não seja impeditivo de exercício da atividade profissional do lesado, mas que implique ainda assim um maior esforço no desempenho dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual, não se mostra viável, em regra, estabelecer o quantum indemnizatório com base em cálculo aritmético de rendimentos específicos, devendo recorrer-se à equidade dentro dos padrões delineados pela jurisprudência em função do tipo de gravidade das sequelas sofridas”.</font></i><br>
</p><p><i><font>9. Aqui chegados, contrariamente ao invocado pela Recorrente, torna-se mais do que evidente pela leitura do acórdão proferido que o Tribunal da Relação conjugou, além dos elementos objectivos (com base nas lesões advindas para a Recorrente), os padrões seguidos em decisões jurisprudenciais recentes, assentes em casos que merecem tratamento análogo, por forma a obter-se uma interpretação e aplicação uniformes do direito, à luz do que prevê os critérios da equidade (artigo 8.º n.º 3 do CC),</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Sendo que, recorrendo ao método comparativo, elencou, para o efeito, diversas decisões deste Supremo Tribunal de Justiça que versam sobre o dano patrimonial futuro por reporte a situações análogas com a dos presentes autos, concluindo-se, pela análise das mesmas que o montante, a final, arbitrado nos presentes autos revela-se justo e equitativo.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Acresce que, vem a Recorrente invocar que a redução de 10% efectuada pelo Tribunal da Relação em virtude da antecipação do pagamento da totalidade do capital se afigura arbitrária, no entanto sem lhe assistir qualquer razão.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. Será forçoso ponderar-se o imediato recebimento e disponibilidade de valores pecuniários que, normalmente, apenas seriam recebidos faseadamente ao longo de muitos anos, com a consequente possibilidade de rentabilização imediata em termos financeiros.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Veja-se o Acórdão do STJ de 8-05-2012, donde resulta que se deve ponderar o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia.</font></i><br>
</p><p><i><font>14. Na verdade, trata-se de subtrair o benefício respeitante ao recebimento antecipado de capital, de efectuar uma dedução correspondente à entrega imediata e integral do capital, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Na quantificação do desconto em equação, a jurisprudência tem oscilado na consideração de uma redução entre os 10% e os 33% (cfr. acórdãos do STJ de 25/11/2009, proc. nº. 397/03.0GEBNV e da RC de 15/02/2011, proc. nº. 291/07.6TBLRA, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Nestes termos, verifica-se que no que ao dano patrimonial futuro diz respeito, o Tribunal recorrido, atendeu às circunstâncias do caso concreto, sem deixar de atender aos padrões de indemnização adoptados em decisões jurisprudenciais recentes, e com base na equidade decidiu fixar a indemnização no montante de € 460.000,00 em vez dos € 500.000,00 fixados pela 1.ª instância, pelo que entende a Recorrida que o acórdão não merece qualquer censura, devendo manter-se inalterado nesta sede, improcedendo a pretensão da Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. Vem a Recorrente pôr em crise o acórdão proferido no que respeita à contagem de juros de mora, mormente, quanto ao momento da sua contagem, definindo que os mesmos serião calculados a partir da decisão de primeira instância, ao invés da citação, tal como havia sido decidido na sentença revogada.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. Alicerça a sua argumentação com base na inexistência de actualização da indemnização a título de perda futura de ganho, porém conforme se exporá não merece qualquer crédito o explanado pela Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. Entendeu o Tribunal da Relação que “No caso, a indemnização pelos danos patrimoniais futuros decorrentes do défice funcional permanente da integridade físicopsíquica foi fixada com base na equidade, e de forma atualizada, critério que também resulta ter sido observado na sentença recorrida, razão pela qual os juros de mora da indemnização pelos danos patrimoniais futuros decorrentes da incapacidade ou défice funcional permanente devem contar-se desde a data da decisão recorrida.”.</font></i><br>
</p><p><i><font>20. A decisão de primeira instância decidiu que “Quanto aos juros de mora, entende-se que, tendo os danos não patrimoniais sido calculados segundo um juízo de equidade (conforme o art.496º-3 CC), os respectivos juros de mora se aplicam apenas a partir da data em que tais danos foram fixados, e não desde a citação como sucede em relação aos danos patrimoniais (…)”.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. A decisão plasmada no Acórdão recorrido teve apoio no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, de 09-05-200256, donde «Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação».</font></i><br>
</p><p><i><font>22. Conforme resulta do mencionado acórdão, «nesta problemática, não há que distinguir entre danos não patrimoniais e danos patrimoniais e ainda entre as diversas espécies ou categorias de danos patrimoniais, uma vez que todos são indemnizáveis em dinheiro e susceptíveis, portanto, do cálculo actualizado constante do n.º 2 do artigo 566º».</font></i><br>
</p><p><i><font>23. O citado acórdão uniformizador assentou na ideia de uma decisão actualizadora da indemnização, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, em razão da inflação no período compreendido entre ela e o momento do evento danoso.</font></i><br>
</p><p><i><font>24. Nestes termos, jamais poderá a aqui Recorrida conceber que os juros de mora sejam contabilizados a partir da citação tal como defende a Recorrente, devendo a sua pretensão improceder veemente.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Pelo que, deverá manter-se inalterado o acórdão proferido na parte em que determinou que os juros de mora, sobre a quantia de €460.00,00 fixada a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro decorrente do défice funcional permanente da integridade físicopsíquica, sejam calculados desde a data da decisão da 1.ª instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos demais de direito, deve ser negado provimento ao recurso da Autora Recorrente a que ora se responde, e em consequência, ser a Recorrida absolvida dos pedidos ora formulados pela Recorrente</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido. </font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Nas Instâncias foram julgados como provados</font></b><font> </font><b><font>e não provados</font></b><font>, os seguintes factos:</font><br>
<p><i><font>1. Factos provados:</font></i><br>
</p><p><i><font>1.1. Cerca das 17h15 do dia … de Abril de 2014, ocorreu um acidente de viação na E.N. 202, ao Km …, sito na freguesia de …, do concelho de …, em que intervieram os veículos ligeiros de passageiros:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) ...-...-VX, conduzido pelo seu proprietário, o demandante BB e</font></i><br>
</p><p><i><font>b) ...-...-AQ, conduzido pelo proprietário DD.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.2. O veículo ...-...-AQ circulava pela referida E.N. no sentido … → …, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido e com uma velocidade de cerca de 100 Kms/hora, sendo que circulava em localidade com casas de habitação e de comércio de um e do outro lado da via.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.3. Desenhando-se o local em recta, e circulando nas circunstâncias supra descritas, de um modo repentino e inopinado, o veículo AQ invadiu a metade esquerda da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha, onde acabou por embater violentamente na parte lateral esquerda do veículo ...-...-VX, conduzido pelo demandante Manuel.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.4. O veículo ...-...-VX circulava em sentido contrário, ou seja, … → …, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido … → …, com uma velocidade de cerca de 50 Kms/hora.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.5. Assim, quando o condutor do veículo ...-...-VX se apercebeu da manobra repentina e inopinada do veículo ...-...-AQ de invasão da sua faixa de rodagem, atenta a proximidade a que circulavam os veículos, para evitar a colisão frontal, encostou à sua direita o mais que pôde, ou seja, aos railes de protecção lateral (do lado direito, conforme o sentido … → …), com o que, ainda assim, não conseguiu evitar ser embatido na parte lateral esquerda do veículo ...-...-VX pela parte da frente do lado esquerdo do veículo ...-...-AQ.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.6. A demandante AA era passageira do veículo ...-...-VX, transportada gratuitamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.7. Em consequência do embate a demandante sofreu: - amputação transradial direita, pelo terço distal do antebraço direito e - fractura dos ossos do antebraço esquerdo.</font></i><br>
</p><p><i><font>1.8. No local do acidente foi assistida e estabilizada por uma equipa do INEM, após o que foi transportada para o S.U. do Hospital de …, …, onde, à entrada, apresentava amputação transradial direita, pelo terço distal do antebraço direito, com fractura dos ossos do antebraço esquerdo.</f | [0 0 0 ... 0 0 0] |
_DFZu4YBgYBz1XKvqvjn | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><font>AA e BB intentaram a presente ação de impugnação pauliana, demandando, Marcelo Peixoto, S.A. e Otoxiep Power, Unipessoal, LDA.</font><br>
</p><p><font>Prosseguindo o processo seus termos, foi interposto, pelas rés, recurso de revista.</font><br>
</p><p><font>Com data de 13-09-2022 foi proferido acórdão com o seguinte dispositivo: “</font><i><font>Face ao exposto, acordam no Supremo Tribunal de Justiça e 1ª Secção em:</font></i><br>
</p><p><i><font>- Julgar o recurso improcedente, negando-se a revista.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelas recorrentes.</font></i><font>”</font><br>
</p><p><font>Efetuadas as notificações vêm as rés/recorrentes: “(…) </font><i><font>requerer a nulidade da mesma por omissão de pronúncia</font></i><font> (…)”.</font><br>
</p><p><font>Sem formularem conclusões dizem:</font><br>
</p><p><font>- que não houve pronúncia sobre a questão fulcral do recurso;</font><br>
</p><p><font>- que se deveria declarar como oponível nos presentes autos o perdão e respetiva extinção do crédito dos recorridos, considerando-se não reunidos os pressupostos para a procedência da ação de impugnação pauliana.</font><br>
</p><p><font>Resulta da alegação das rés a sua não concordância como a decisão constante no acórdão, mais que a nulidade por omissão de pronuncia.</font><br>
</p><p><font>No acórdão reclamado diz-se: </font><i><font>“Estando em causa ação de impugnação pauliana, pela procedência da mesma a ré (devedora) não está a responder pela dívida que contraiu e, a procedência da impugnação pauliana não invalida o ato de transferência do património do devedor para terceira pessoa (adquirente).</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim sendo os credores, mesmo tendo intervindo na discussão do PER, não ficam inibidos de tentar satisfazer o seu crédito por outra via que não interfira com o património do devedor.</font></i><br>
</p><p><i><font>Aos autores credores apenas é reconhecido o direito de poderem executar esses bens (equipamento vendido) na medida necessária à satisfação do seu crédito, no património da ré adquirente (terceiro) e a impugnação pauliana não tem o efeito de fazer retornar os bens à esfera jurídica do alienante.</font></i><font>”</font><br>
</p><p><font>Nos recursos apreciam-se questões e não razões. E a questão era a de saber se a homologação do PER interferia noutros processos, nomeadamente em processo de impugnação pauliana, o que foi conhecido e decidido.</font><br>
</p><p><font>Entendeu o Tribunal no acórdão reclamado que o facto de ter ocorrido o processo PER, mesmo com a intervenção dos credores, tal não era impeditivo de tentarem a satisfação do seu crédito por outra via que não interferisse no património da devedora, que é o que acontece no caso em analise.</font><br>
</p><p><font>Não havendo interferência no património da devedora, não há colisão com o que haja sido decidido no processo do PER.</font><br>
</p><p><font>E a homologação do plano de recuperação não tem efeitos extra processuais que se alarguem a terceiros, que é a situação da ré adquirente dos bens em causa.</font><br>
</p><p><font>Conforme o nº 10, do artigo 17º - F do CIRE, citado pelas reclamantes, a decisão de homologação vincula a empresa e os credores. Não vincula os credores perante terceiros, nem esses terceiros são beneficiários do PER.</font><br>
</p><p><font>Verifica-se a divergência entre o entendimento manifestado na decisão do acórdão e o entendimento das reclamantes manifestado nas alegações de recurso e nesta reclamação e não qualquer omissão de pronuncia constitutiva de nulidade nos termos da al. d), do nº 1, do art. 615º, do CPC.</font><br>
</p><p><font>Assim que não se verifica a omissão de pronuncia alegada, devendo ser indeferida a reclamação.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Sumário elaborado ao abrigo do disposto no art. 663 nº 7 do CPC:</font><br>
<p><font>I - Não constitui nulidade por omissão de pronuncia a divergência entre o entendimento expresso no acórdão e o entendimento das reclamantes manifestado nas alegações de recurso e na reclamação do acórdão.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Decisão</font></b><font>:</font><br>
<p><font>Face ao exposto, indefere-se a reclamação e consequentemente, mantem-se o acórdão reclamado.</font><br>
</p><p><font>Custas do incidente pelas reclamantes, fixando a taxa de justiça em 2 Ucs.</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Lisboa, 08-11-2022</font><br>
</p><p><font> </font><br>
</p><p><font>Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator</font><br>
</p><p><font>Jorge Arcanjo – Juiz Conselheiro 1º adjunto</font><br>
</p></font><p><font><font>Isaías Pádua – Juiz Conselheiro 2º adjunto</font></font></p> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
ZTFdu4YBgYBz1XKvAPvV | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><b><font>I </font></b><font>– AA instaurou no Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo Central Cível ... a presente ação, com processo comum, contra BB, pedindo a condenação desta:</font><br>
</p><p><font>1.º - A pagar ao autor a quantia de €83.265,00 por via do enriquecimento sem causa, assim discriminada:</font><br>
</p><p><font>a) Tornas pelo valor da casa melhor identificada no artigo 3.º da petição inicial, no valor de metade do valor da venda - €63.750,00;</font><br>
</p><p><font>b) O valor de €11.825,00 relativo aos montantes por si pagos entre 2004 e 2008, quando suportou a totalidade das prestações;</font><br>
</p><p><font>c) Despesas que suportou em exclusivo com a habitação e que constituíram benfeitorias na mesma, assim como despesas com automóveis da ré, mencionados no artigo 13.º da petição inicial, no valor de €19.325,00, deduzindo a quantia paga pela ré aquando da liquidação antecipada do empréstimo.</font><br>
</p><p><font>2º - Se assim não se entender, e em alternativa, ser reconhecido o mútuo da quantia de €52.590,00, correspondente ao valor das prestações pagas pelo autor e o pagamento da quantia de €19.325,00 a título de benfeitorias na habitação e nas viaturas automóveis, propriedade da ré, no montante global de €71.915,00, condenando-se a ré a pagar tal quantia ao autor.</font><br>
</p><p><font>Alegou para tanto, e em síntese, que autor e ré viveram em união de facto entre 1994 e 2008. Em finais de 1995 decidiram adquirir uma moradia sita na Rua ..., ..., para onde foram residir em permanência e para aquisição da mesma contraíram um empréstimo junto do Banco 1.... O autor para a formalização da escritura de compra e venda, pagou a entrada/sinal de 1.840.000$00, a 05.01.1996, e a ré entregou a quantia de 2.200.000$00. O autor pagou sempre metade do valor do empréstimo pedido para a compra da casa. E despendeu, ainda, com a mesma moradia as quantias discriminadas no artigo 13.º da petição inicial. A partir de Abril de 2004 e até 31.12.2008 foi o autor quem pagou a totalidade da prestação mensal, que se cifrava no montante de €600,00/mês, a pedido da ré por esta estar, na altura, a pagar o crédito à habitação do apartamento que, entretanto, comprara na Rua ....</font><br>
</p><p><font>A relação íntima terminou, a finais de 2008, e o autor foi residir para um apartamento na ..., apesar disso continuou, sempre, a pagar metade da prestação até meados de 2013.</font><br>
</p><p><font>Autor e ré convencionaram que na altura da venda a ré daria tornas ao autor, fazendo-se aí também o encontro de contas em relação aos inúmeros gastos que o autor teve e suportou em exclusivo na habitação. A partir de 27.01.2012, a ré começou a pagar ao autor a quantia de €300,00, mensalmente, por transferência bancária para a conta do autor, para lhe restituir o montante de €15.900,00, correspondente a metade da quantia paga por este, entre Abril de 2004 e 31.12.2008, quando suportou a totalidade da prestação mensal do empréstimo.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Pessoal e regularmente citada, a ré veio contestar e pediu a improcedência da ação.</font><br>
<p><font>Para tanto, excecionou a prescrição do direito de restituição das quantias pedidas por enriquecimento sem causa, nos termos do art.º 482.º do C. Civil, por, a ter ocorrido enriquecimento sem causa da ré, ter-se-ia dado aquando da deslocação patrimonial da esfera do autor para a esfera jurídica da ré; não, aquando da venda do prédio urbano pela ré; o último pagamento que o autor efetuou foi em meados de 2013 e a última restituição pela ré ocorreu em Fevereiro de 2013; a presente ação foi proposta a 21.12.2018; logo, está exaurido há muito o prazo de três anos.</font><br>
</p><p><font>Mais impugnou os factos alegados pelo autor defendendo que autor e ré sempre tiveram patrimónios autónomos e separados. Quando, em Janeiro de 1996, autor e ré passaram a viver como “casal” na moradia sita na Rua ..., ..., o autor solicitou à ré a permissão para instalar, na garagem da moradia, uma clínica veterinária, no que esta consentiu. O autor, no seu próprio interesse e benefício, efetuou e custeou as obras de adaptação da garagem que entendeu necessárias, de gradeamento e vedação de modo a que os animais a tratar não fugissem para a via pública nem para a parte habitacional. O autor entendeu, de motu proprio, que deveria pagar, mensalmente, algum dinheiro como contrapartida pelo gozo residencial e profissional do prédio de ... e do de ... (Rua ...) pela alimentação, limpeza, trato de roupa e afins que a ré lhe proporcionava.</font><br>
</p><p><font>As quantias que o autor entregou à ré mormente, por transferência, para a conta n.º ...01 do Banco 1..., foram sempre por ele, unilateral e livremente, definidas e com a antes dita finalidade. A ré ajudou, ainda, o autor financeiramente durante, aproximadamente, um ano (em 2012) com €300,00/mês, quando ele necessitou para cumprir as suas obrigações com terceiros.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O autor, em sede de resposta, reafirmou a existência de um compromisso entre a ré e o autor, desde o início, no sentido de que a habitação sita nas ..., em ..., era dos dois (autor e ré). Por isso, a contribuição de ambos, em partes iguais, até 2004, para o pagamento do empréstimo, depois, até 2008, em exclusivo, pelo autor, e, após a separação (2008), em partes iguais até 2012.</font><br>
<p><font>Na altura da separação, as partes firmaram também o compromisso de que a casa seria vendida e o produto da venda seria dividido entre os dois, com acerto de contas. Daí que o enriquecimento só se deu com a venda da casa e não com a entrega de valores.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador que relegou o conhecimento da exceção de prescrição para a sentença. Fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova.</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença de onde consta:</font><br>
<p><font>“</font><i><font>Julgo, nos termos e pelos fundamentos expostos, a acção parcialmente procedente e em resultado disso:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Declaro dissolvida desde Outubro de 2008 a união de facto existente entre autor e ré; b) Condeno a ré a pagar ao autor:</font></i><br>
</p><p><i><font>1º - O valor pago pelo autor entre agosto de 1995 e Maio (incluído) de 2004, correspondente a metade do valor de 106 prestações do empréstimo referido em 3 e 4 dos Factos Provados, a apurar em incidente de liquidação;</font></i><br>
</p><p><i><font>2º - A quantia €41.675,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>Absolvo a Ré do mais pedido. Custas na proporção de vencido</font></i><font>”. </font><br>
</p><p><font>Inconformada com a tal decisão, dela veio a ré recorrer de apelação, sendo, após deliberação, decidido:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar as presentes apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pela ré/apelante</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Novamente inconformada, com o decidido pela Relação, a ré </font><b><font>interpõe recurso de Revista para este STJ </font></b><font>e formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“1ª) de acordo com alegado pela Recorrente na contestação e na apelação e contrariando o decidido na sentença em Primeira Instância, o douto Tribunal da Relação do Porto julgou e declarou prescrito o direito à restituição, por via do enriquecimento sem causa, que o A./Recorrido pretendia fazer valer na ação sub judice;</font></i><br>
</p><p><i><font>2ª) conforme douto entendimento do insigne Tribunal da Relação do Porto, o prazo prescricional em causa completou-se a 13.10.2017;</font></i><br>
</p><p><i><font>3ª) contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal da Relação do Porto, a exceção perentória de prescrição suprarreferida é alegável pela Recorrente e não constitui abuso de direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>4ª) o A./Recorrido não alegou ou invocou, em momento processual algum, que a Recorrente ao defender-se, invocando e alegando a mencionada prescrição, estivesse a fazê-lo com abuso de direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>5ª) a sentença proferida em Primeira Instância também não julgou abusivo o direito da Recorrente à alegação e invocação da aludida exceção de prescrição, sendo completamente omissa quanto a esta questão;</font></i><br>
</p><p><i><font>6ª) a Recorrente nada fez que obstasse ao exercício tempestivo do direito por parte do A./Recorrido;</font></i><br>
</p><p><i><font>7ª) nada obstava, nem obstou, a que o A./Recorrido exercesse judicial e tempestivamente o seu direito – caso quisesse fazê-lo – e não o fez;</font></i><br>
</p><p><i><font>8ª) da matéria de facto considerada provada também nada resulta no sentido de se considerar que, após a venda que efetuou da moradia em questão, a Recorrente haja praticado qualquer facto que obstasse ao exercício tempestivo do pretenso direito por parte do A./Recorrido;</font></i><br>
</p><p><i><font>9ª) resulta da matéria provada que, nos termos do acordo verbal havido, a divisão do preço apenas ocorreria “se e quando vendesse a casa”;</font></i><br>
</p><p><i><font>10ª) a venda da casa não ficou estabelecida como certa;</font></i><br>
</p><p><i><font>11ª) os “se e quando”, atrás referidos, não eram aptos a alicerçar no R./Recorrido uma crença assertiva na venda da moradia que justificasse, da sua parte, uma confiança inabalável que objetivamente obstasse ao tempestivo exercício do seu direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>12ª) aliás, se a Recorrente, ao invés de ter vendido a moradia referida nos autos recorridos, a houvesse doado, arrendado ou, no limite, se esta se transmitisse mortis causa, já não haveria obrigação de restituir ao A./Recorrido o que quer que fosse;</font></i><br>
</p><p><i><font>13ª) ao alegar a prescrição do direito que o A./Recorrido pretende fazer valer na ação sub judice, a Recorrente não violou a confiança daquele no exercício do seu direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>14ª) não excede os limites impostos pela boa fé (subjetiva e ética), não é chocante, nem reprovável o facto de a Recorrente alegar a prescrição do direito pretendido exercer pelo A./Recorrido atenta, nomeadamente, a matéria de facto provada, referida no precedente número 6.1. da motivação deste recurso;</font></i><br>
</p><p><i><font>15ª) atenta, nomeadamente, a matéria de facto provada, referida no precedente número 6.2. da motivação deste recurso, ofende a Justiça e o sentimento jurídico dominante vir o A./Recorrido pretender, fora de prazo, que a Recorrente lhe devolva quantias que esta nunca lhe pediu e que este nunca antes da ação sub judice lhe exigiu;</font></i><br>
</p><p><i><font>16ª) a alegação da prescrição do direito à restituição, por via do enriquecimento sem causa, que o A./Recorrido pretendia fazer valer na ação sub judice, não se traduz nem consubstancia exercício de direito pela Recorrente “fora do seu objetivo natural e da razão justificativa da sua existência” e não cria “uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício do direito” de alegar aquela prescrição “e as consequências a suportar por aquele contra o qual é invocado”;</font></i><br>
</p><p><i><font>17ª) ao alegar a prescrição do direito que o A./Recorrido pretende fazer valer na ação sub judice, a Recorrente exerceu legítima e licitamente o seu direito à defesa, não tendo incorrido em abuso de direito;</font></i><br>
</p><p><i><font>18ª) vedar à Recorrente a alegabilidade da prescrição do direito pretendido exercer pelo A./Recorrido na ação sub judice constitui, isso sim, uma abusiva e inaceitável limitação ao seu direito de defesa;</font></i><br>
</p><p><i><font>19ª) sem prescindir (por cautela de patrocínio), ainda que se considerasse (de acordo com o raciocínio vertido no douto acórdão recorrido) que a prescrição do direito do A./Recorrido era inalegável pela Recorrente, por “abuso de direito” (na modalidade de venire contra factum proprium), tal inalegabilidade apenas se deveria circunscrever às quantias acordadas restituir, por Recorrente e A./Recorrido, aquando da separação ocorrida entre ambos, em 2008 (ou seja, às quantias correspondentes a metade das prestações totais pagas pelo A./Recorrido entre junho de 2004 e 30/12/2008);</font></i><br>
</p><p><i><font>20ª) sempre sem prescindir (por cautela de patrocínio) e seguindo o raciocínio vertido no douto acórdão recorrido, nenhum outro acordo ou promessa de pagamento por parte da Recorrente se encontrando provado que seja posterior ao referido no nº 25 dos factos provados, relativamente às quantias pagas pelo A./Recorrido “em princípios de 2009 (…) até março de 2013 (inclusive)”, no montante de € 41.675,00, não ocorre qualquer abuso de direito, sendo alegável a prescrição do direito pretendido exercer pelo Recorrido;</font></i><br>
</p><p><i><font>21ª) o douto acórdão recorrido viola a correta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 334º e 482º do Cód. Civil, bem como o disposto nos artigos 572º, alíneas b) e c), 573º, nº 1, 574º, nº 1, e 576º, nº 3, do Cód. Proc. Civil e, ainda, nos artigos 17º, 18º, nº 1, e 20º, nº 4, segunda parte, da Constituição da República Portuguesa – disposições legais que devem ser interpretadas e aplicadas no sentido de:</font></i><br>
</p><p><i><font>I) - se reconhecer como lícita e legítima a alegação pela Recorrente da prescrição do direito à restituição, por via do enriquecimento sem causa, que o A./Recorrido pretende exercer pela ação sub judice; </font></i><br>
</p><p><i><font>II) - e, julgada que foi procedente tal exceção peremptória, absolver-se a Recorrente dos pedidos contra si formulados na ação em causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>NESTES TERMOS e nos melhores de Direito, cujo douto suprimento se invoca, deverá ser concedido provimento ao recurso sub judice, substituindo-se o douto acórdão recorrido por outro que, julgando totalmente improcedente a ação, absolva a Ré/Recorrente de todos os pedidos contra si formulados pelo A./Recorrido, como é de JUSTIÇA!”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>O autor contra-alegou, concluindo:</font><br>
</p><p><i><font>“1. A Ré viu o seu recurso improceder e a ser confirmada pela Relação a sentença da 1ª instância, tendo, contudo, a final, vertido entendimento e fundamentação diversa, quanto à alegada prescrição que havia sido invocada, e «oficiosamente conhecido e decidido pela verificação do abuso de direito, na vertente de “venire contra factum proprium”.</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Entende a Ré que deve operar a prescrição do direito do Autor, e que não se verifica o abuso de direito nem dele devia ter conhecido o Tribunal da Relação </font></i><br>
</p><p><i><font>3. Concorda-se em absoluto com as Distintas Desembargadoras da Relação do Porto e aplaude-se o conhecimento do abuso do direito, impedindo a invocação do instituto da prescrição no caso concreto.</font></i><br>
</p><p><i><font>4. Os tribunais da relação não estão circunscritos a apreciar apenas o que é alegado pelas partes, nos seus recursos, em matéria de facto e/ou de direito, podendo conhecer de outras matérias, oficiosamente, quando resultar dos autos todos os elementos para tal.</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Sempre se dirá, no entanto, que foi pelo facto de a própria Recorrente ter suscitado a questão da prescrição, que a relação ao analisar esta matéria de direito, apura, e bem, o abuso de direito, na vertente “venire contra factum proprium”.</font></i><br>
</p><p><i><font>6. Logo, não nos parece sequer correcto dizer que não devia ter conhecido do que não lhe é trazido a decidir ou a pronunciar-se; foi a Recorrente que trouxe a si o conhecimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Sufraga-se e subscreve-se nesta parte o entendimento vertido nos Acs. do STJ de 11.12.2012 e 12.07.2018, aos quais também alude o Acórdão recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Agiu a Ré em abuso do direito, na vertente de “venire contra factum proprium”.</font></i><br>
</p><p><i><font>9. A Relação do Porto, pela prova produzida e ouvida por conta da impugnação da matéria dada como provada, deduzida pela Recorrente, assim o concluiu.</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Efetivamente tal resulta dos pontos 22 a 28 inclusive dos factos provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Sendo por isso, falso quando a Recorrente refere que nada fez para obstar ao exercício tempestivo do seu direito e, fez o mais importante para que ele não agisse, criou nele a confiança de que o acordo se ia cumprir, levando o Autor para mostrar a casa a potenciais compradores, mantendo este as chaves ainda que não lá vivesse, começando a restituir parte dos valores que o Autor tinha pago, quando pagou entre 2004 e 2008 a totalidade das prestações.</font></i><br>
</p><p><i><font>12. A Ré acordou com o Autor, aquando da separação, que a casa seria vendida e que nessa altura, restituía ao Autor os valores pagos.</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Só assim se compreende que depois da rutura, o Autor tenha continuado a pagar metade do empréstimo, quando naquela moradia já não residia sequer. </font></i><br>
</p><p><i><font>14. Saindo reforçado tal acordo, pelo facto de adicionalmente a Ré ter em 2012 começado a restituir os 300.00€, por referência aos anos entre 2004 e 2008 quando o Autor pagou a totalidade e para se irem igualando as posições e pagamentos dos dois.</font></i><br>
</p><p><i><font>15. Se assim não fosse, como se justificam os pagamentos da Ré para o A. desde 2012? Já que não provou que ajudou financeiramente o A. e numa altura em que sobre ela pendiam dois empréstimos bancários ainda? O da casa de ... e o do apartamento da Rua ...? Justificam-se unicamente por via do compromisso e do acordo firmado entre as partes, radicando aqui de novo a má fé da Ré, e por esses motivos o Autor não comtemplava sequer nessa altura que a Ré não ia cumprir, e concretizando-se assim por parte da Ré, esta prática de atos que obstavam ou impediam o Autor de reagir.</font></i><br>
</p><p><i><font>16. Tendo até o A. participado nas diligências atinentes à venda ou ao arrendamento daquele imóvel.</font></i><br>
</p><p><i><font>17. A casa de ..., foi inclusivamente posta à venda a partir do momento em que passaram a residir no apartamento da ..., fazia assim, como fez, todo o sentido continuar a pagar as prestações, como fez, sempre iludido pelas promessas no cumprimento do acordo que havia sido feito pelos dois, bem sabendo a Ré que defraudava as suas expectativas, mas ainda assim sempre continuando na mesma atuação.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. A confiança ia sendo renovada no Autor, pela actuação da Ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. Não se oferecem, pois, dúvidas quanto à correcta aplicação do abuso do direito e inalegabilidade da prescrição pela Ré.</font></i><br>
</p><p><i><font>20. Ainda assim entende o Recorrido contudo que não se verifica a prescrição, e se deve confirmar o entendimento da 1ª instância, quanto à prescrição e com aquela fundamentação, crendo que a tal conclusão decorre da fundamentação apresentada pela Relação, ainda que proceda à contagem de forma diferente.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. A Relação considerou que o prazo de prescrição de 3 anos, para invocação de enriquecimento sem causa, se conta a partir da data da ruptura da relação, ao invés, a 1ª instância considerou o início do prazo, após a data da venda da casa, 13/07/2017, para os devidos efeitos, por ser, e transcreve-se o segmento da sentença proferida em 1ª instancia, no que aqui importa, “</font></i><i><u><font>por ser aquela até à qual o A. poderia esperar a restituição das prestações, confiando, como confiou, em termos de boa fé, na Ré. Certo é que esta não cumpriu, como ele esperava e ela se comprometera</font></u></i><i><font>.”– (sublinhado nosso).</font></i><br>
</p><p><i><font>22. O enriquecimento sem causa, dá-se, efectivamente, com a venda da habitação, atendendo neste caso sobretudo aos factos provados e até ao abuso de direito da Ré, a qual só ocorreu em Agosto de 2017, só ali se dando a deslocação patrimonial em definitivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>23. O Autor continuou a pagar a casa mesmo após a separação, na sequência do dado como provado acordo que existiu entre Autor e Ré quanto ao momento da restituição das quantias, e que tal momento era a venda da casa, pelo que só ali há o locuptamento, enriquecimento da Ré a expensas do Autor.</font></i><br>
</p><p><i><font>24. Contudo e se assim não se entender, mesmo com a fundamentação expendida pela Relação do Porto no proferido acórdão, cremos também que chegamos à mesma conclusão, a não verificação da prescrição.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Entende o Tribunal da Relação do Porto que a contagem do prazo para efeitos de prescrição se inicia com a rutura da relação amorosa entre Recorrido e Recorrente, ou seja, a partir de Outubro de 2008, sendo certo que logo após tal prazo se interrompeu, por efeitos do acordo firmado entre as partes já melhor identificadas nos autos principais e de acordo com os factos dados como provados.</font></i><br>
</p><p><i><font>26. Mais entende que tal prazo por força da interrupção, faz reiniciar a contagem após a venda da moradia em 13/07/2017.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. Inutilizado que fica assim todo o prazo que possa ter corrido entretanto, (tendo-se entendido que nem sequer chegou a correr pois o acordo foi feito logo de seguida), recomeça assim a contar aquando da venda, e logo, quando a acção é intentada em juízo, ainda não tinha ocorrido a prescrição, faltando isso sim mais de ano e meio para se alcançar o decurso dos 3 anos.</font></i><br>
</p><p><i><font>28. Não se alcança pois o entendimento que a Relação do Porto teve ao chamar à colação o prazo do artigo 321º do Código Civil, como restando apenas 3 meses para intentar a acção, após a venda, quando pela exposição e seguindo o pensamento cronológico apresentado no Acordão, o prazo ainda mal teria começado a correr, aquando da venda, pelo que e após a mesma, não poderiam apenas restar 3 meses para o Autor intentar a acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. O prazo de prescrição, ainda que se inicie com a rutura da relação, foi de imediato interrompido e suspenso, pelo que, não chegando a correr, após a venda, teria de correr ainda na totalidade dos 3 anos para que precludisse o direito do Autor, o que não aconteceu.</font></i><br>
</p><p><i><font>30. E é só neste ponto que se permite, e sempre com a devida vénia por melhor entendimento, fazer o reparo ao acórdão proferido.</font></i><br>
</p><p><i><font>31. Mas a verdade é que quer se entenda que o prazo se iniciou com a ruptura da relação, quer que se inicia com a venda da moradia já melhor identificada nos autos, a prescrição não ocorreu quando o Autor dá entrada da acção, ou quando a Ré é citada.</font></i><br>
</p><p><i><font>32. No mais, de novo se aplaude a confirmação da decisão da 1ª instância, assim como o conhecimento do abuso de direito, porque dela podia conhecer e porque dos autos assim inequivocamente resultou provado, por parte da Ré, fazendo assim o Acordão a merecida Justiça.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, deve o recurso improceder, mantendo-se o Acordão proferido, confirmando a decisão da 1ª instância na integra, quanto à prescrição, mas sempre, e ainda que quanto a esta matéria assim não se entenda, ali se tendo feito JUSTIÇA, mais se confiando e esperando saía reforçada destarte pelos Insignes Juízes Conselheiros”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido.</font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<u><font>Nas Instâncias foram julgados como provados e não provados, os seguintes factos</font></u><font>:</font><br>
<p><i><font>“1 - Por escritura de 13.07.2017, outorgada no Cartório Notarial ..., BB, divorciada, declarou vender a CC e mulher DD, pelo preço de €127.500,00, que já recebeu, o seguinte prédio urbano de sua propriedade: </font></i><br>
</p><p><i><font>- Prédio urbano, composto de rés-do-chão, 1.º andar, sótão, anexos, logradouro e jardim, destinado a habitação, sito na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo ...66, descrito na Conservatória do Registo Predial ..., inscrito a favor da vendedora pela Ap. ...20 – fls. 489/493 (A).</font></i><br>
</p><p><i><font>2. Este imóvel fora adquirido, para habitação própria permanente, por BB, por escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca de 28.07.1995, lavrada no Cartório Notarial ..., à Sociedade “C..., Ld.ª, pelo preço de 14.600.000$00, já pagos – fls. 240/244 (B).</font></i><br>
</p><p><i><font>3. Para o efeito, o Banco 2..., S.A., emprestou, mediante hipoteca, à compradora, ora ré, 16.500.000$00, sendo 14.600.000$00 para habitação e 1.900.000$00 para obras de beneficiação – fls. 242 (C).</font></i><br>
</p><p><i><font>4. O empréstimo foi concedido pelo Banco à compradora, ora ré, sob a forma de abertura de crédito nos termos das cláusulas de fls. 245/252 que não adianta transcrever (D).</font></i><br>
</p><p><i><font>5. Pelo acordo escrito de 21.12.1998, o Banco 1... (nova designação do Banco 2..., S.A.) e a ora ré subscreveram a alteração das condições do empréstimo concedido para a compra da habitação própria feita pela escritura de 28.07.1995 quanto à taxa de juros que, a partir de 30.01.1999, passou de fixa a variável, a rever trimestralmente – fls. 255/256 (E).</font></i><br>
</p><p><i><font>6. BB foi titular junto do Banco 1... da conta n.º ...01, a qual, no momento da sua abertura, tinha, ainda, como co-titular EE – fls. 257 (F).</font></i><br>
</p><p><i><font>7. Esta conta foi encerrada a 10.02.2018 – fls. 257 (G).</font></i><br>
</p><p><i><font>8. Por escritura de 31.05.2004, a sociedade “C..., Ld.ª” vendeu a BB, que aceitou comprar, para sua habitação permanente, por €137.000,00, a fracção autónoma designada pela ..., destinada a habitação, correspondente ao 2.º andar, tipo T2, no ... mais a norte, no lado norte do ..., com uma garagem, a do lado nascente, na terceira fila, no sentido poente nascente a quinta do sentido sul – norte, do prédio urbano sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo provisório n.º 4884 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...14 – fls. 259/263 (H).</font></i><br>
</p><p><i><font>9. A compra foi feita por recurso ao crédito bancário junto da Banco 3..., por empréstimo titulado pela ré e garantido por hipoteca – fls. 261/263 (I).</font></i><br>
</p><p><i><font>10. Por contrato, celebrado a 23.12.2008, o ora autor AA tomou de arrendamento, para sua habitação, a FF o apartamento T2, melhor identificado a fls. 321, pela renda anual de €5.400,00 a pagar em duodécimos, sendo o prazo de duração do contrato de arrendamento de cinco anos, com início a 01.02.2009 – fls. 321/322 (J).</font></i><br>
</p><p><i><font>11. Autor e ré viveram em união de facto, pelo menos entre 1996 e 2008 (K).</font></i><br>
</p><p><i><font>12. A ré liquidou, junto do Banco 1..., em Março de 2014, o remanescente do empréstimo da moradia no montante de € 23.270,00 (L).</font></i><br>
</p><p><i><font>13. Após a venda da moradia, a ré não mais contactou o autor. (M).</font></i><br>
</p><p><i><font>14. O autor e a ré começaram a viver em união de facto (em condições análogas às dos cônjuges) no final de 1994, num apartamento, propriedade da ré, em ..., no Bairro ....</font></i><br>
</p><p><i><font>15. No início de 1996 passaram a residir na moradia sita na Rua ..., ....</font></i><br>
</p><p><i><font>16. A ré, a partir de meados de 2004, passou a residir, em permanência, no apartamento identificado em 8 dos Factos Provados, sito na Rua ..., ....</font></i><br>
</p><p><i><font>17. O autor, entre meados de 2004 e Outubro de 2008, residiu alternadamente na moradia da Rua ..., ..., e no apartamento da ré na Rua ..., por o seu relacionamento com a ré atravessar uma fase difícil.</font></i><br>
</p><p><i><font>18. A relação amorosa entre autor e ré terminou em Outubro de 2008.</font></i><br>
</p><p><i><font>19. O autor deixou, definitivamente, de residir na moradia, no início de Fevereiro de 2009, e foi residir para um apartamento na ....</font></i><br>
</p><p><i><font>20. A conta n.º ...01 foi aberta a 30.03.1995 junto do Banco 2..., S.A. (actual Banco 1...) e tinha como co-titulares a ora ré e a mãe desta EE – fls. 257.</font></i><br>
</p><p><i><font>21. O autor passou a ser co-titular da mesma conta a partir de 27 de Abril de 2005. </font></i><br>
</p><p><i><font>22. O autor pagou:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) desde o início e até Maio de 2004, metade da prestação mensal do empréstimo referido em 3 e 4 dos Factos Provados; e</font></i><br>
</p><p><i><font>b) a partir de Junho de 2004 até 31.12.2008, pagou a totalidade da prestação mensal no montante de €600,00, a pedido da ré, por esta estar a ter dificuldades em suportar este crédito e o crédito da habitação do imóvel sito na Rua ....</font></i><br>
</p><p><i><font>23. O autor, em princípios de 2009, passou novamente a pagar apenas metade da prestação do empréstimo à moradia em ... (€250,00) e pagou-o até Março de 2013 (inclusive).</font></i><br>
</p><p><i><font>24. O autor continuou a fazer estes pagamentos de metade das prestações do empréstimo para a compra da moradia até Março de 2013, confiado no acordo verbal existente entre ele e a ré de que, se e quando vendesse a casa, seria dividido o preço entre ambos.</font></i><br>
</p><p><i><font>25. Aquando da separação de ambos, a ré acordou restituir ao autor o montante correspondente à metade das prestações totais pagas por este, respeitantes entre Junho de 2004 e 30.12.2008, quando procedesse à venda da moradia. </font></i><br>
</p><p><i><font>26. O autor tomou parte activa em várias diligências efectuadas para procurar vender a moradia.</font></i><br>
</p><p><i><font>27. A partir de 27.01.2012, a ré começou a pagar, mensalmente, €300,00 ao autor para lhe restituir metade da quantia que aquele pagou entre Junho de 2004 e 30.12.2008, quando suportou a totalidade da prestação mensal de €600,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>28. Restituiu apenas €4.075,00 entre Janeiro de 2012 e Fevereiro de 2013.</font></i><br>
</p><p><i><font>29. Foi unicamente a ré que decidiu comprar e comprou, a 28.07.995, para si, a moradia sita na Rua ..., da freguesia ..., à sociedade “C..., Ld.ª”, pelo preço de 14.600.000$00 (€72.824,00).</font></i><br>
</p><p><i><font>30. As prestações de amortização do aludido empréstimo eram efectuadas através da conta da ré n.º ...16 de que ela era titular na agência de ... do aludido Banco 2..., S.A..</font></i><br>
</p><p><i><font>31. No mês de Outubro de 1996 o Banco 1..., adquiriu aquele Banco 2..., S.A., pelo que a autor passou a proceder aos pagamentos das prestações do empréstimo através da conta n.º ...01, domiciliada no Banco 1....</font></i><br>
</p><p><i><font>32. A 18.11.1998, a ré (e apenas a ré) solicitou ao Banco 1... a revisão do contrato de empréstimo, tendo sido no seguimento deste requerimento alteradas as condições do empréstimo, designadamente quando à taxa de juros de modalidade das prestações.</font></i><br>
</p><p><i><font>33. Autor e ré sempre tiveram patrimónios autónomos e separados.</font></i><br>
</p><p><i><font>34. Quando, em Janeiro de 1996, autor e ré passaram a residir na moradia sita na Rua ..., da freguesia ..., o autor solicitou à ré a permissão para instalar na garagem da moradia um consultório veterinário, dispondo-se a realizar e a custear as obras de adaptação do prédio de modo a assegurar a coexistência do consultório veterinário e dos seus utentes com a parte reservada a habitação.</font></i><br>
</p><p><i><font>35. Tendo a ré consentido, o autor, no seu próprio interesse e benefício, efectuou e custeou as obras de gradeamento e vedação de modo a que os animais a tratar não fugissem para a via pública nem para a parte habitacional.</font></i><br>
</p><p><i><font>36. O autor exercia aqui, a título privado, medicina veterinária, no final do dia, quando lhe apareciam clientes.</font></i><br>
</p><p><i><font>37. Mandou const | [0 0 0 ... 0 0 0] |
yDJpu4YBgYBz1XKvNQP0 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<br>
<p><b><font>1 </font></b><font>- AA intentou ação de processo comum contra CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A. e FIDELIDADE-MUNDIAL, S.A., peticionando que:</font><br>
</p><p><font>a) seja declarada a validade e eficácia do contrato de seguro de adesão celebrado entre o A. e Ré Companhia de Seguros Fidelidade S.A., supra identificado, a que corresponde a apólice nº .....06, onde a 1ª Ré Caixa Geral de Depósitos figura como tomadora do mesmo;</font><br>
</p><p><font>b) Seja a 2ª. Ré, seguradora, condenada a pagar à 1ª. Ré, todos os valores que, por força do contrato de seguro, lhe forem devidos, contados da mencionada data em que foi fixada a invalidez total e absoluta do A.;</font><br>
</p><p><font>c) Seja, a 2ª Ré, condenada a pagar ao A. o eventual remanescente do capital seguro;</font><br>
</p><p><font>d) Seja, a 1ª. Ré, Caixa Geral de Depósitos, S.A. condenada a restituir ao A. o valor das prestações que, deste, recebeu indevidamente, a partir do dia 1/04/2011 (data em que foi declarada a invalidez de 100% pela Segurança Social francesa), acrescidas dos respetivos juros, à taxa legal, desde o momento em que a Ré delas se apropriou e até efetivo reembolso; </font><br>
</p><p><font>e) Sejam, as RR., solidariamente condenadas a pagar ao A. a importância de € 5.000,00 (cinco mil euros) a título de danos de carácter não patrimonial por todos os incómodos e desgaste psicológico supra relatado, que a não resolução desta situação lhe tem acarretado.</font><br>
</p><p><font>Alegou, em súmula, que:</font><br>
</p><p><font>No dia 20 de Junho de 2003, o A., juntamente com o ex-cônjuge, BB, celebraram escritura de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, através da qual aqueles adquiriram, a CC, pelo preço de € 58.500,00, um prédio urbano destinado a habitação, sito no ..., da freguesia de ...;</font><br>
</p><p><font>No mesmo ato, o A. e ex-cônjuge celebraram ainda com a 1ª Ré, Caixa Geral de Depósitos, S.A., um contrato de mútuo, através do qual esta concedeu aos primeiros um empréstimo da mesma quantia de € 58.500,00 e associado a este contrato de mútuo, e por imposição da ora 1ª Ré, o A. e o ex-cônjuge viram-se obrigados a celebrar, com a ora 2ª Ré, Companhia de Seguros Fidelidade S.A., contrato de seguro de adesão, com inicio em 20/07/2003, a que corresponde a apólice nº ......06, figurando a 1ª Ré como tomadora do mesmo, sendo, o capital seguro no valor de € 49.301.77;</font><br>
</p><p><font>Através deste contrato de seguro a Companhia de Seguros comprometeu-se em caso de morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença do A. ou cônjuge a liquidar à CGD o empréstimo em dívida.</font><br>
</p><p><font>A partir de 01/04/2011, a Segurança Social francesa atribuiu ao A., nessa data, com apenas 40 anos de idade, uma incapacidade/invalidez absoluta e permanente de 100%.</font><br>
</p><p><b><font>2 </font></b><font>- A Ré FIDELIDADE-MUNDIAL, S.A., deduziu contestação, reconhecendo a celebração do contrato de seguro e arguindo, sinteticamente, que:</font><br>
</p><p><font>O Autor sofria desde Abril de 1999 de retinopatia proliferonte bilateral e maculopatia diabética, doença que omitiu na subscrição do seguro. Se tivesse tido conhecimento de tal doença, nunca teria aceite a adesão do Autor, pelo que, em 19 de Março de 2013, fez cessar o contrato de seguro.</font><br>
</p><p><font>Concluiu, pugnando pela improcedência da ação.</font><br>
</p><p><b><font>3 </font></b><font>- A Ré CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A. igualmente contestou, advogando a improcedência da ação.</font><br>
</p><p><b><font>4 </font></b><font>-</font><font> </font><font>Foi proferido despacho saneador, bem como o despacho que identificou o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.</font><br>
</p><p><b><font>5 </font></b><font>- Realizada a audiência final foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu as RR. dos pedidos contra si deduzidos.</font><br>
</p><p><b><font>6 </font></b><font>- Inconformado veio o A. recorrer, interpondo recurso de apelação, vindo a ser proferido acórdão que julgou improcedente a apelação, confirmando a decisão da 1ª Instância.</font><br>
</p><p><b><font>7 </font></b><font>- Inconformado com o decidido pela Relação, interpõe o A. recurso de Revista normal e recurso de revista excecional (em requerimentos separados) para este STJ.</font><br>
</p><p><b><font>8 </font></b><font>- No recurso (denominado) de revista normal, formula as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><i><font>“1 - Em face dos factos considerados provados e não provados nos autos, quer em sede de primeira instância, quer os ora aditados pelo Venerando Tribunal da Relação, impunha-se concluir, sem margem para dúvidas, não ter sido, in casu, dado cabal cumprimento ao dever de informação a que as rés se encontram obrigadas por força do disposto nos artigos 5º e 6 do DL 446/85, de 25 de Outubro, e artigo 4º do o DL 176/95, de 26 de Julho. Com efeito,</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - Tendo, o Venerando Tribunal da Relação, considerado não provado que “Aquando da apresentação e assinatura da proposta de adesão ao contrato de seguro ora em causa, o A. foi cabalmente esclarecido e advertido, pelo funcionário da Ré que o atendeu, de que deveria ter especial cuidado quanto ao preenchimento do questionário clínico que constava do verso dessa proposta e responder com verdade e prestar todas as informações lá solicitadas, sob pena do contrato de seguro poder vir, no futuro, a ser anulado” (alínea f) dos factos não provados),</font></i><br>
</p><p><i><font>3 - E que “as rés não fizeram prova de terem remetido ao autor as condições do contrato de seguro”,</font></i><br>
</p><p><i><font>4 - Não fazendo, designadamente, prova, de que foi comunicada ao autor, a cláusula de exclusão da cobertura do seguro no caso de doença ou incapacidades pré-existentes à data da aceitação da adesão ao contrato de adesão ao contrato de seguro, prevista na alínea a) do ponto 5.3 das condições gerais do mesmo;</font></i><br>
</p><p><i><font>5 - Impunha-se considerar, a mesma, excluída do contrato de seguro, nos termos do artigo 8º do DL nº 446/85, de 25 de Outubro.</font></i><br>
</p><p><i><font>6 - Esta questão é prévia e condiciona a declaração prestada pelo autor em sede do questionário clínico que preencheu, porquanto, aquando da subscrição do contrato, a vontade do autor não se encontrava cabalmente esclarecida, em virtude da violação do dever de informação por parte das rés. </font></i><br>
</p><p><i><font>7 - Pelo que, não pode ser responsabilizado por quaisquer declarações inexatas que tenha prestado, já que não lhe foram sequer, previamente fornecidas as cláusulas do contrato, por forma a lê-las e interpretá-las em toda a sua extensão.</font></i><br>
</p><p><i><font>8 - Acresce que, pelo facto de se tratar de um contrato de adesão, onde a posição do segurado é ainda mais frágil, impõe-se, mais ainda, o cumprimento do dever de informação, uma vez que os restantes intervenientes são poderosos grupos económicos, que elaboram o contrato, conhecem o regime jurídico do contrato de seguro e beneficiam do mesmo</font></i><br>
</p><p><i><font>9 - E porque a entidade seguradora é a grande beneficiária neste tipo de seguros contributivos, não impende somente sobre o tomador do seguro (a, aqui primeira ré, Caixa Geral de Depósitos, S.A.), mas também sobre aquela, aqui segunda ré, Companhia de Seguros Fidelidade, S.A., a obrigação de informar.</font></i><br>
</p><p><i><font>10 - Tal como refere o douto o acórdão deste Colendo Tribunal, proferido no âmbito do processo nº 294/2002.E1.S1“A responsabilização direta da Seguradora para com o segurado resulta, quer do princípio da boa-fé, quer da consideração de que, estando-se no domínio do direito do consumo, se deve proteger, em primeira linha, a parte mais débil na relação contratual - o consumidor segurado (…) Estando em causa uma terceira parte, dependente economicamente do Banco e que adere às condições do contrato de seguro, o comportamento da Seguradora não pode analisar-se de forma isolada ou separada dos interesses do segurado nem da relação de dependência do segurado em relação ao Banco, mutuante e Tomador do Seguro.”</font></i><br>
</p><p><i><font>11 - Entendemos, pois, estar vedado à seguradora, sob pena de violação do princípio da boa fé, tomar mão de eventuais inexatidões nas declarações prestadas pelo autor aquando da subscrição do contrato, fazendo cessar o mesmo, tendo, ela própria, incumprido a sua obrigação de informar, designadamente, como no caso sub iudice, através do prévio envio ao autor das condições gerais do contrato e questionário clínico. </font></i><br>
</p><p><i><font>12 - Invocar, nestas circunstâncias, a invalidade do contrato configura, quanto a nós, uma situação de abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum próprio”, e, como tal, inaceitável, nos termos do disposto no artigo 334º do código civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>13 - Ao considerar, sem mais, o contrato de seguro em causa, inválido, abstendo-se, inclusive, de se pronunciar sobre os restantes pedidos deduzidos pelo autor, aplicando “cegamente” as regras do LCS, designadamente as contidas nos artigos 24, nº 1, 26º, nºs 1 e 2 e 4, e 78º, sem as harmonizar com as normas da LCCG, designadamente as contidas nos artigos 5º, 6º, nº 1 e 8º do DL 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo DL 220/95, de 31 de Agosto, e ainda, o artigo 4º do DL 176/95, de 26 de Julho, o Venerando Tribunal da Relação fez uma incorreta interpretação de todas, violando-as.</font></i><br>
</p><p><i><font>14 - A douta decisão viola, ainda, o princípio da boa fé, plasmado no artigo 227º do Código Civil, e a norma contida no artigo 334º do mesmo diploma legal, que regula o instituto do abuso de direito.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos, e nos melhores de direito aplicável, deverá ser dado provimento ao presente Recurso de Revista, e, em consequência, ser proferido douto Acórdão que revogue e substitua o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, acolhendo a pretensão do autor”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Contra-alegou a recorrida Fidelidade, pugnando pela não admissão do recurso ou, pela improcedência do mesmo.</font><br>
</p><p><font>Subsidiariamente recorreu o autor, invocando fundamento para a admissão da revista excecional.</font><br>
</p><p><font>- Determinada a remessa dos autos à Formação referida no nº 3 do art. 672 do CPC, com vista a verificar os requisitos específicos da admissibilidade da revista excecional, foi decidido ser relevante a questão suscitada e admitida a revista excecional.</font><br>
</p><p><font>É a seguinte a decisão do acórdão da Formação, relativamente à revista excecional:</font><br>
</p><p><i><font>“(…) Está aqui em causa, essencialmente, a interpretação do regime dos contratos de seguros de grupo do ramo vida, associados a mútuos e frequentemente oferecidos e intermediados pelo próprio banco (e tomador do seguro) que concede o financiamento, e, em geral, celebrados aquando da conclusão do mútuo a que se encontram associados, numa prática bancária de comercializar de modo combinado serviços bancários e segurísticos, oferecendo ao mutuário a adesão a um seguro colectivo que o banco celebrara com a seguradora e por ele previamente conformado, com vista a garantir o segurado em caso de perda da capacidade para cumprir as respectivas obrigações contratuais, em caso de morte ou de invalidez, sendo o banco mutuante/tomador do seguro o beneficiário directo do seguro.</font></i><br>
</p><p><i><font>Trata-se, pois, de um contrato bilateral, oneroso, aleatório, de adesão – já que uma das partes se limita a aderir aos termos que lhe são propostos, não ajustando o teor do contrato – e de boa-fé (objectiva), que obriga ambas as ambas, ao estabelecerem contactos com vista a determinado negócio, a comportarem-se nas negociações de acordo com as respectivas regras, subjacentes aos deveres de protecção, de informação e de lealdade.</font></i><br>
</p><p><i><font>É por isso que em algumas decisões deste Tribunal já se tem sustentado, no âmbito da aplicação da norma do artigo 429º do C. Comercial, a ideia de que se deve atender aos particulares contornos de cada caso para se poder aferir se faz sentido que um segurador pretenda eximir-se totalmente da sua responsabilidade, prevalecendo-se de declarações inexactas do proponente (…).</font></i><br>
</p><p><i><font>Por outro lado, também não tem sido inteiramente pacífica a questão de saber se, ao abrigo do citado art. 429º, a anulabilidade do contrato depende (ou não) da existência de nexo de causalidade entre a inexactidão e o sinistro.</font></i><br>
</p><p><i><font>(…) Por isso, tendo em conta os particulares contornos da situação em apreço, tem suficiente interesse e utilidade uma intervenção última do Supremo Tribunal sobre os equívocos que tais questões propiciam, tendo em conta os benefícios que dela podem resultar para a clarificação de tal matéria, com um impacto para além do concreto litígio, por determinar a apreciação de outros casos”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Foi admitido o recurso de revista.</font><br>
<p><font>Foram dispensados os vistos, sendo remetidas as peças processuais relevantes.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Face à alteração operada pela Relação, a matéria de facto dada como assente, (provada e não provada), com a alteração da sua numeração, daí decorrente, é a seguinte:</font><br>
<p><b><font>A)</font></b><font> </font><b><font>Factos</font></b><font> </font><b><font>provados</font></b><br>
</p><p><font>1. O Autor casou com BB, em … de agosto de 2000, tendo este casamento sido dissolvido por divórcio, por decisão de … de Dezembro de 2011.</font><br>
</p><p><font>2. Por escritura pública de Compra e Venda, Mútuo Com Hipoteca e Fiança, celebrada no Cartório Notarial de ..., em 20.06.2003, CC declarou que “</font><i><font>pelo</font></i><font> </font><i><font>preço</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>cinquenta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>oito</font></i><font> </font><i><font>mil</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>quinhentos</font></i><font> </font><i><font>euros,</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>já</font></i><font> </font><i><font>recebeu,</font></i><font> </font><i><font>vende</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>AA</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>BB</font></i><font> </font><i><font>(terceiros</font></i><font> </font><i><font>outorgantes)</font></i><font> </font><i><font>um</font></i><font> </font><i><font>prédio</font></i><font> </font><i><font>urbano</font></i><font> </font><i><font>sito</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>...,</font></i><font> </font><i><font>freguesia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>...,</font></i><font> </font><i><font>concelho</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>...,</font></i><font> </font><i><font>descrito</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>Conservatória</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Registo</font></i><font> </font><i><font>Predial</font></i><font> </font><i><font>deste</font></i><font> </font><i><font>concelho,</font></i><font> </font><i><font>sob o número ...67,</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>dita</font></i><font> </font><i><font>freguesia</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>inscrito</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>respetiva</font></i><font> </font><i><font>matriz</font></i><font> </font><i><font>predial</font></i><font> </font><i><font>sob o artigo ...89”</font></i><font>, declarando a segunda outorgante ..., em representação dos terceiros outorgantes, que para os seus representados “</font><i><font>aceita</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>presente</font></i><font> </font><i><font>contrato</font></i><font> </font><i><font>nos</font></i><font> </font><i><font>termos</font></i><font> </font><i><font>exarados</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>3. Na escritura referida em 2), também declararam a segunda e os terceiros outorgantes, nas qualidades em que outorgam: “</font><i><font>que,</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>presente</font></i><font> </font><i><font>escritura,</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>Caixa</font></i><font> </font><i><font>Geral</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Depósitos,</font></i><font> </font><i><font>S.A.</font></i><font> </font><i><font>concede</font></i><font> </font><i><font>aos</font></i><font> </font><i><font>representados</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>segunda</font></i><font> </font><i><font>outorgante</font></i><font> </font><i><font>um</font></i><font> </font><i><font>empréstimo</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>quantia</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>cinquenta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>oito</font></i><font> </font><i><font>mil</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>quinhentos</font></i><font> </font><i><font>euros,</font></i><font> </font><i><font>importância</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>esta</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>confessa</font></i><font> </font><i><font>solidariamente</font></i><font> </font><i><font>devedores.</font></i><font> </font><i><font>Tal</font></i><font> </font><i><font>empréstimo</font></i><font> </font><i><font>reger-se-á</font></i><font> </font><i><font>pelas</font></i><font> </font><i><font>cláusulas</font></i><font> </font><i><font>constantes</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>referida</font></i><font> </font><i><font>escritura</font></i><font> </font><i><font>bem</font></i><font> </font><i><font>como</font></i><font> </font><i><font>pelas</font></i><font> </font><i><font>cláusulas</font></i><font> </font><i><font>constantes</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>um</font></i><font> </font><i><font>documento</font></i><font> </font><i><font>complementar</font></i><font> </font><i><font>elaborado</font></i><font> </font><i><font>nos</font></i><font> </font><i><font>termos</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>n.º</font></i><font> </font><i><font>2</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>artigo</font></i><font> </font><i><font>64</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Código</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>notariado</font></i><font> </font><i><font>(…)</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>garantia</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>capital</font></i><font> </font><i><font>emprestado,</font></i><font> </font><i><font>no</font></i><font> </font><i><font>referido</font></i><font> </font><i><font>montante</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>cinquenta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>oito</font></i><font> </font><i><font>mil</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>quinhentos</font></i><font> </font><i><font>euros,</font></i><font> </font><i><font>dos</font></i><font> </font><i><font>respetivos</font></i><font> </font><i><font>juros</font></i><font> </font><i><font>até</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>taxa</font></i><font> </font><i><font>anual</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>8,785%</font></i><font> </font><i><font>(…)</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>parte</font></i><font> </font><i><font>devedora</font></i><font> </font><i><font>constitui</font></i><font> </font><i><font>hipoteca</font></i><font> </font><i><font>sobre</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>prédio</font></i><font> </font><i><font>urbano</font></i><font> </font><i><font>identificado</font></i><font> </font><i><font>nessa</font></i><font> </font><i><font>escritura</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>adquirido</font></i><font> </font><i><font>pelos</font></i><font> </font><i><font>terceiros</font></i><font> </font><i><font>outorgantes</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>4. Com início às 00:00 horas do dia 20.07.2003, pelo período temporal anual e renovável automaticamente a 1 de Janeiro, pela adesão n.º ..., para o período de 01.01.2013 até 31.12.2013, com o capital seguro em 01.01.2013 de 43.486,65 euros, o Autor declarou aderir ao “Contrato de Seguro de Vida Grupo”, titulado pela Apólice n.º ..., celebrado entre as Rés “Companhia de Seguros Fidelidade Mundial, S.A.” e Caixa Geral de Depósitos.</font><br>
</p><p><font>5. A Ré FIDELIDADE-MUNDIAL, S.A. subscreveu com a Caixa Geral de Depósitos, S.A. um “seguro de grupo” contributivo Ramo Vida titulado pela apólice nº .....06, consignando-se Caixa Geral de Depósitos, SA como tomadora de seguro e beneficiários as pessoas seguras como os clientes do Tomador de Seguro.</font><br>
</p><p><font>6. As condições gerais do seguro referenciado em 5) consignam, designadamente, que: “</font><i><font>Artigo</font></i><font> </font><i><font>1.º</font></i><font> </font><i><font>Definições</font></i><br>
</p><p><i><font>Invalidez</font></i><font> </font><i><font>Total</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>Permanente</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>limitação</font></i><font> </font><i><font>funcional</font></i><font> </font><i><font>permanente</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>sem</font></i><font> </font><i><font>possibilidade</font></i><font> </font><i><font>clinica</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>melhoria</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>,</font></i><font> </font><i><font>cumulativamente,</font></i><font> </font><i><font>estejam</font></i><font> </font><i><font>preenchidos</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>seguintes</font></i><font> </font><i><font>requisitos:</font></i><br>
</p><p><i><font>a)</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>Pessoa</font></i><font> </font><i><font>segura</font></i><font> </font><i><font>fique</font></i><font> </font><i><font>completa</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>definitivamente</font></i><font> </font><i><font>incapacitada</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>exercer</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>sua</font></i><font> </font><i><font>profissão</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>qualquer</font></i><font> </font><i><font>outra</font></i><font> </font><i><font>actividade</font></i><font> </font><i><font>remunerada</font></i><font> </font><i><font>compatível</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>seus</font></i><font> </font><i><font>conhecimentos</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>aptidões;</font></i><font> </font><br>
</p><p><i><font>b)</font></i><font> </font><i><font>Corresponda</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>um</font></i><font> </font><i><font>grau</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>desvalorização</font></i><font> </font><i><font>igual</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>superior</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>percentagem</font></i><font> </font><i><font>definida</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>Condições</font></i><font> </font><i><font>Particulares,</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>acordo</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>Tabela</font></i><font> </font><i><font>Nacional</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Incapacidades</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>Acidentes</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Trabalho</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>Doenças</font></i><font> </font><i><font>Profissionais</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>vigor</font></i><font> </font><i><font>na</font></i><font> </font><i><font>data</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>avaliação</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>desvalorização</font></i><font> </font><i><font>sofrida</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>Pessoa</font></i><font> </font><i><font>Segura,</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>entrando</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>seu</font></i><font> </font><i><font>cálculo</font></i><font> </font><i><font>quaisquer</font></i><font> </font><i><font>incapacidades</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>patologias</font></i><font> </font><i><font>preexistentes.</font></i><br>
</p><p><i><font>c)</font></i><font> </font><i><font>Seja</font></i><font> </font><i><font>reconhecida</font></i><font> </font><i><font>previamente</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>Instituição</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>Segurança</font></i><font> </font><i><font>Social</font></i><font> </font><i><font>pela</font></i><font> </font><i><font>qual</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>Pessoa</font></i><font> </font><i><font>Segura</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>encontre</font></i><font> </font><i><font>abrangida</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>pelo</font></i><font> </font><i><font>Tribunal</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Trabalho</font></i><font> </font><i><font>ou,</font></i><font> </font><i><font>caso</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>Pessoa</font></i><font> </font><i><font>Segura</font></i><font> </font><i><font>não</font></i><font> </font><i><font>se</font></i><font> </font><i><font>encontre</font></i><font> </font><i><font>abrangida</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>nenhum</font></i><font> </font><i><font>regime</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>Instituição</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>Segurança</font></i><font> </font><i><font>Social,</font></i><font> </font><i><font>por</font></i><font> </font><i><font>Junta</font></i><font> </font><i><font>Médica</font></i><font>.</font><br>
</p><p><i><font>Invalidez</font></i><font> </font><i><font>absoluta</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>definitiva</font></i><font> </font><i><font>–</font></i><font> </font><i><font>A</font></i><font> </font><i><font>limitação</font></i><font> </font><i><font>funcional</font></i><font> </font><i><font>permanente</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>sem</font></i><font> </font><i><font>possibilidade</font></i><font> </font><i><font>clínica</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>melhoria</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>incapacite</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>pessoa</font></i><font> </font><i><font>segura</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>exercício</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>qualquer</font></i><font> </font><i><font>actividade</font></i><font> </font><i><font>remunerada,</font></i><font> </font><i><font>necessitando</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>assistência</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>uma</font></i><font> </font><i><font>terceira</font></i><font> </font><i><font>pessoa</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>efectuar</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>actos</font></i><font> </font><i><font>normais</font></i><font> </font><i><font>da</font></i><font> </font><i><font>vida</font></i><font> </font><i><font>diária.”.</font></i><br>
</p><p><font>7. As condições particulares do seguro referido mencionado em 5) consignam, designadamente, que:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Artigo</font></i><font> </font><i><font>1.°</font></i><font> </font><i><font>Objecto</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Seguro</font></i><br>
</p><p><i><font>O</font></i><font> </font><i><font>presente</font></i><font> </font><i><font>contrato</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>seguro</font></i><font> </font><i><font>cobre</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>riscos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>morte</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>invalidez</font></i><font> </font><i><font>ligados</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>contratos</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>mútuo</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>crédito</font></i><font> </font><i><font>à</font></i><font> </font><i><font>habitação,</font></i><font> </font><i><font>garantindo</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>pagamento</font></i><font> </font><i><font>ao</font></i><font> </font><i><font>beneficiário</font></i><font> </font><i><font>designado</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>capital</font></i><font> </font><i><font>seguro</font></i><font> </font><i><font>em</font></i><font> </font><i><font>caso</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>morte</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>invalidez</font></i><font> </font><i><font>total</font></i><font> </font><i><font>e</font></i><font> </font><i><font>permanente.</font></i><br>
</p><p><i><font>Artigo</font></i><font> </font><i><font>2.°</font></i><font> </font><i><font>Pessoas</font></i><font> </font><i><font>Seguras</font></i><br>
</p><p><i><font>São</font></i><font> </font><i><font>Pessoas</font></i><font> </font><i><font>Seguras</font></i><font> </font><i><font>os</font></i><font> </font><i><font>clientes</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Tomador</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Seguro</font></i><font> </font><i><font>que</font></i><font> </font><i><font>contratem</font></i><font> </font><i><font>com</font></i><font> </font><i><font>o</font></i><font> </font><i><font>Tomador</font></i><font> </font><i><font>do</font></i><font> </font><i><font>Seguro</font></i><font> </font><i><font>empréstimo</font></i><font> </font><i><font>para</font></i><font> </font><i><font>a</font></i><font> </font><i><font>compra</font></i><font> </font><i><font>de</font></i><font> </font><i><font>habitação</font></i><font> </font><i><font>própria</font></i><font> </font><i><font>(1ª</font></i><font> </font><i><font>habitação</font></i><font> </font><i><font>ou</font></i><font> </font><i><font>habitação</font></i><font> </font><i><font>secundária),</font></i><font> | [0 0 0 ... 0 0 0] |
cTJku4YBgYBz1XKvqQBq | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font></div><br>
<br>
<font> </font><br>
<p><font>Nos presentes embargos de executado deduzidos por AA e BB na ação executiva que lhes move CC e DD, os embargantes, a 31 de agosto de 2020, interpuseram recurso, de apelação, do despacho proferido a 13 de julho de 2020, despacho esse do seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Do despacho conjunto que fixa o valor à causa e indefere a admissão do recurso cabe reclamação nos termos do artigo 643.º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>No caso concreto, a mesma foi interposta fora do prazo legal de 10 dias.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, não se admite a reclamação deduzida</font></i><font>.”</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Importa ter presente que resulta dos termos do processo o seguinte:</font><br>
<p><b><font>1</font></b><font> - A 5 de fevereiro de 2020, foi proferido o seguinte despacho:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>O valor da causa foi fixado no requerimento executivo pelos exequentes e nos embargos de executado pelos executados em € 3.150,00.</font></i><br>
</p><p><i><font>Este é o valor da causa, o qual não é evolutivo ao longo do processo de acordo com os interesses processuais das partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, nos termos dos artigos 306.º n.º 1, 2 e 3, 299.º n.º 4 e 641.º do CPC fixo o valor à causa em € 3.150,00</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Por inadmissível em face do valor da causa, indefere-se o recurso interposto pelos embargantes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelos recorrentes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Notifique.</font></i><br>
</p><p><i><font>O conhecimento das restantes questões levantadas encontra-se prejudicado.</font></i><br>
</p><p><i><font>Notifique</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><b><font>2</font></b><font> - Por notificação elaborada a 10 de fevereiro de 2020, os embargantes, na pessoa do seu ilustre mandatário, foram notificados do despacho mencionado no ponto 1.</font><br>
</p><p><b><font>3</font></b><font> - A 28 de fevereiro de 2020, os embargantes apresentaram requerimento de interposição de recurso, nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“AA e BB, Embargantes nos autos acima identificados, nos quais são Embargados CC e DD, tendo sido notificados do despacho com a referência 393…463, o qual fixou o valor da causa, não se conformando com o mesmo, vêm, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 627.º, 629.º, n.º 2, alínea b), 631.º, 637.º, 638.º n.º 1, 644.º n.º 2 alínea g), 645.º, n.º 1, alínea a) e 647.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil, interpor recurso, o qual é de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E concluindo: </font><br>
</p><p><i><font>“Nestes termos, deverá o despacho que fixou o valor da acção ser substituído por outro que fixe o valor da causa em € 58.750,00 (cinquenta e oito mil setecentos e cinquenta euros) e que determine a subida do recurso da sentença que foi interposto pelos Recorrentes em 2 de Dezembro de 2019</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>4</font></b><font> - A 2 de março de 2020, os embargantes requereram o aproveitamento do recurso como reclamação, “</font><i><font>caso o Tribunal considere que o meio processual aplicável para reagir ao referido despacho seria a reclamação prevista no n.º 1 do artigo 643.º do Código de Processo Civil</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>5 - Em 13-07-2020 foi proferido despacho do seguinte teor:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Do despacho conjunto que fixa o valor à causa e indefere a admissão do recurso cabe reclamação nos termos do artigo 643.º do CPC.</font></i><br>
</p><p><i><font>No caso concreto, a mesma foi interposta fora do prazo legal de 10 dias.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, não se admite a reclamação deduzida.</font></i><br>
</p><p><i><font>Notifique</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>6 </font></b><font>- Em 31-08-2020, os embargantes apresentaram requerimento de interposição de recurso, nos seguintes termos:</font><br>
</p><p><i><font>“AA e BB, Embargantes nos autos acima identificados, nos quais são Embargados CC e DD, tendo sido notificados do despacho com a referência 397…484, o qual não admitiu o recurso/reclamação do despacho que fixou o valor da causa, não se conformando com o mesmo, vêm, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 627.º, 631.º, 637.º, 638.º n.º 1, 644.º n.º 2 alínea g), 645.º, n.º 1, alínea a) e 647.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil, interpor recurso, o qual é de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>7 </font></b><font>- Sendo proferido o acórdão recorrido, no qual se deliberou:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação, em conferência, em julgar improcedente a apelação, mantendo o despacho proferido pelo tribunal recorrido a 13 de julho de 2020.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas da apelação pelos recorrentes</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><b><font>8 </font></b><font>- Havendo voto de vencido no qual se conclui:</font><br>
</p><p><i><font>“(…) Por isso decidiria, com os fundamentos da decisão sumária que proferi nos autos e que aqui dou por inteiramente reproduzida, em</font></i><br>
</p><p><i><font>1 - julgar a Apelação improcedente, mantendo a decisão que fixou o valor dos embargos em € 3.150,00, fundamentadamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - relativamente ao douto despacho de 5-2-2020, ref. 393…463, ficar sem efeito o segmento em que o Senhor Juiz se pronunciou sobre o recurso interposto pelos Embargantes da decisão final de embargos, no sentido de não o receber.</font></i><br>
</p><p><i><font>3 - a apreciação do requerimento de interposição de recurso teria lugar oportunamente, na 1ª instância, determinado que fosse em definitivo o valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>4 - dar por prejudicada a apreciação de outras questões colocadas</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Inconformados com o decidido pelo Tribunal da Relação, interpõem recurso de Revista para este STJ e formulam as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“A - Os Recorrentes optaram por qualificar a presente peça processual como recurso (e não como reclamação), apenas por razões de coerência com o despacho sub judice, que determinou o não recebimento da reclamação.</font></i><br>
</p><p><i><font>B - No entanto, se se considerar que deveria ter sido apresentada uma reclamação, deverá, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 193.º do Código de Processo Civil, ser corrigido o erro de qualificação do meio processual apresentado e, em consequência, deverá a presente peça ser tramitada como uma reclamação.</font></i><br>
</p><p><i><font>C - Nodia28.10.2019 o Tribunal “a quo” proferiu sentença no processo de embargos de terceiro, sem ter, contudo, fixado, em momento algum do processo, o valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>D - No dia 02.12.2019, os ora Recorrentes apresentaram, simultaneamente, reclamação quanto à falta de fixação do valor da causa e recurso da decisão final no processo de embargos de terceiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>E - Seguidamente, o Tribunal “a quo” proferiu, a 05.02.2020, nos termos do n.º 1 do artigo 306.º do Código de Processo Civil, despacho que fixou o valor da causa em € 3.150,00 (três mil cento e cinquenta euros) e, em consequência, indeferiu o recurso apresentado pelos ora Recorrentes, por inadmissível face ao valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>F - Na sequência disso, no dia 28.02.2020, os ora Recorrentes interpuseram, nos termos do alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil, recurso do despacho que fixou o valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>G - Pois que, sendo sempre admissível o presente recurso, o mesmo vem interposto do despacho com a referência 393…463, o qual fixou o valor da causa em € 3.150,00 (três mil cento e cinquenta euros).</font></i><br>
</p><p><i><font>H - Não obstante, o Tribunal “a quo” determinou que “o valor da causa foi fixado no requerimento executivo pelos exequentes e nos embargos de executado pelos executados” no valor supra mencionado, não sendo tal valor evolutivo ao longo do processo de acordo com os interesses das partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>I - Face a tal valor – inferior à alçada do Tribunal de 1.ª Instância –, o Tribunal “a quo” julgou inadmissível o recurso interposto pelos Embargantes em 02.12.2019. </font></i><br>
</p><p><i><font>J - Não podem os ora Recorrentes deixar de discordar do entendimento perfilhado pelo douto Tribunal “a quo”, porquanto o valor da presente acção deveria ter sido fixado em montante superior e, em consequência, deveria ter sido admitido o recurso da sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>K - Em primeiro lugar, importa referir que o valor indicado pelos Recorridos no requerimento executivo era aquele que estava em dívida em 18 de Outubro de 2016, valor esse que não contabilizava, por impossibilidade prática, o montante correspondente à sanção pecuniária compulsória até ao momento da decisão final.</font></i><br>
</p><p><i><font>L - Posteriormente, no requerimento inicial de embargos de executado, os ora Recorrentes limitaram-se a reproduzir o valor da execução que foi indicado no requerimento executivo pelos ora Recorridos,</font></i><br>
</p><p><i><font>M - nomeadamente porque, no momento em que foram deduzidos os embargos de executado, não era possível determinar com certeza qual era o valor da acção senão por referência ao valor indicado no requerimento executivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>N - Com efeito, não era de todo possível, naquela data, determinar quantos dias de sanção pecuniária compulsória seriam aplicáveis no momento em que fosse proferida a sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>O - Assim, é evidente que o Juiz não poderia ter considerado, no despacho em que fixou o valor da causa, os valores indicados pelas partes na fase dos articulados, porquanto nessa fase era impossível determinar com certeza o valor do processo.</font></i><br>
</p><p><i><font>P - A tarefa que cabia ao Juiz do Tribunal “a quo” – e que este não cumpriu – era a de verificar qual era o valor do pedido dos Recorridos no momento da fixação do valor da causa, ou seja, após ter sido proferida a sentença condenatória.</font></i><br>
</p><p><i><font>Q - Em nada influindo, obviamente, nesse cálculo os valores indicados pelas Partes nos seus articulados, até porque tais valores tiveram por referência um momento distinto daquele em que ocorreu a fixação do valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>R - Sendo que, na presente acção, o momento que tem interesse para a fixação do valor da causa é o momento em que o processo fornece os elementos necessários para tal, ou seja, o momento subsequente à sentença ser proferida.</font></i><br>
</p><p><i><font>S - Com efeito, sendo a presente uma acção em que a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção, determina o n.º 4 do artigo 299.º do Código de Processo Civil que o valor inicialmente aceite deve ser corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários – ou seja, após a prolacção da sentença. </font></i><br>
</p><p><i><font>T - Isto significa que, ainda que as partes tenham indicado, na fase dos articulados, o valor de € 3.150,00 (três mil cento e cinquenta euros), tendo em consideração o tipo de acção em causa –em que só no final é que é possível saber o valor total da sanção pecuniária aplicável – o valor deveria ter sido fixado tendo em conta o valor aplicável após a sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>U - Nesse sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2019, Processo n.º 255/10.2T2AVR-J.P1-A.S1 (disponível em www.dgsi.pt).</font></i><br>
</p><p><i><font>V - Fácil é de verificar que a situação a que se refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2019 acima indicado é exactamente a mesma que a dos presentes autos: é um processo em que o Juiz não fixou o valor da causa em momento anterior à sentença e em que, após ter sido interposto recurso da sentença, esse valor foi fixado ao abrigo do n.º 3 do artigo 306.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>W - Ora, na acção objecto do referido Acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça considerou que o Juiz deveria recorrer a uma actualização ou correcção do valor indicado pelas partes no momento em que a acção foi proposta, devendo ser considerada a utilidade económica do pedido no momento em que o valor da causa foi fixado, ou seja, após a prolacção da sentença.</font></i><br>
</p><p><i><font>X - Nesse sentido, é evidente que também o Tribunal “a quo”, no caso sub judice, deveria ter considerado a utilidade económica do pedido dos ora Recorridos no momento em que fixou o valor da acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>Y - Não obstante, o Juiz do Tribunal “a quo” optou por considerar, em clara violação do disposto no n.º 4 do artigo 299.º do Código de Processo Civil, o valor inicialmente indicado pelas Partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Z - Acresce que a argumentação utilizada no despacho sub judice não é, de todo, suficiente para servir de base à determinação do valor da causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>AA - Com efeito, o Juiz do Tribunal “a quo” justifica a fixação do valor da causa em € 3.150,00 (três mil cento e cinquenta euros) simplesmente e tão só no facto de as partes terem indicado tal valor nos seus articulados.</font></i><br>
</p><p><i><font>BB - Ora, como é por demais evidente, o Juiz não pode fundamentar o despacho de fixação do valor da causa apenas com base nos valores indicados pelas partes, até porque, se o valor da causa fosse sempre aquele que é indicado pelas Partes, o despacho previsto no artigo 306.º do Código de Processo Civil seria uma formalidade despida de qualquer utilidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>CC - Como bem refere o n.º 1 do artigo 306.º do Código de Processo Civil, sem prejuízo do dever de indicação que incide sobre as Partes, compete sempre ao Juiz a fixação do valor da causa, o que também é aplicável, obviamente, no caso em que as partes indicam o mesmo valor da acção.</font></i><br>
</p><p><i><font>DD - Ora, verificando-se que os valores indicados pelas partes não vinculam o Juiz, parece lógico que este não deve fixar o valor da causa por simples referência ao valor indicado nos articulados das Partes, sem qualquer fundamentação adicional.</font></i><br>
</p><p><i><font>EE - Ao abrigo do n.º 1 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa e do n.º 1 do artigo 154.º do Código de Processo Civil, todas as decisões que não sejam de mero expediente devem ser sempre fundamentadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>FF - No caso sub judice o Juiz do Tribunal “a quo” não fundamentou devidamente o despacho de fixação do valor da causa, porquanto a única justificação que foi utilizada para a fixação de tal valor foi, como já se viu, manifestamente infundada.</font></i><br>
</p><p><i><font>GG - Assim, verifica-se que, por falta de fundamentação, o despacho recorrido é nulo, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.</font></i><br>
</p><p><i><font>HH - Convém ainda voltar a realçar que, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 299.º do Código de Processo Civil, no caso sub judice – que é, sem dúvida alguma, um processo em que a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação – o valor da causa, ainda que seja inicialmente aceite pelas partes, “é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.”</font></i><br>
</p><p><i><font>II - Aquando a propositura da acção executiva, em 13 de Outubro de 2016, os Recorridos requereram a condenação dos Recorrentes no pagamento da sanção pecuniária compulsória prevista no acordo judicial de 2 de Fevereiro de 2016, no valor de € 50,00 (cinquenta euros) por cada dia de atraso na conclusão das obras, a qual, nessa data, perfazia € 2.150,00 (dois mil cento e cinquenta euros). Os Recorridos peticionaram, ainda, o valor de € 1.000,00 (mil euros) previsto no referido acordo judicial a título de sanção penal, por não terem sido iniciadas as obras no prazo acordado.</font></i><br>
</p><p><i><font>JJ - Por conseguinte, à data de 13 de Outubro de 2016, os Recorridos atribuíram à ação o valor de € 3.150,00 (três mil cento e cinquenta euros).</font></i><br>
</p><p><i><font>KK - Na sequência disso, quando os Recorrentes deduziram os embargos de executado, por impossibilidade de determinar outro valor, reproduziram o valor indicado pelos Recorridos no requerimento executivo.</font></i><br>
</p><p><i><font>LL - Sucede que, de acordo com a sentença proferida, os Recorrentes foram condenados no pagamento da supra mencionada sanção pecuniária compulsória até ao momento da conclusão das obras. </font></i><br>
</p><p><i><font>MM - Ora, ao abrigo do referido acordo judicial, a sanção pecuniária compulsória deve ser contada a partir de dia 1 de Setembro de 2016, porquanto é essa a data prevista para a conclusão das obras.</font></i><br>
</p><p><i><font>NN - Por outro lado, a sanção pecuniária compulsória deve ser considerada até dia 19 de Novembro de 2019, data em que foi notificada às partes a sentença, uma vez que, independentemente do momento da conclusão das obras, para efeitos da presente acção, o valor da causa deve ser considerado no momento da prolacção da sentença, por forma a ser possível aferir se existe ou não direito de recurso.</font></i><br>
</p><p><i><font>OO - Ora, tendo decorrido, entre 1 de Setembro de 2016 e 19 de Novembro de 2019, 1.175 (mil cento e setenta e cinco) dias, o valor total da sanção pecuniária que deveria ter sido considerado, para efeitos de fixação do valor da causa, era de € 58.750,00 (cinquenta e oito mil setecentos e cinquenta euros).</font></i><br>
</p><p><i><font>PP - As regras gerais da fixação do valor da causa dispõem, no artigo n.º 1 do artigo 297.º do Código de Processo Civil, que “se pela ação se pretender obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa.”</font></i><br>
</p><p><i><font>QQ - Dispõe também o n.º 1 do artigo 300.º do Código de Processo Civil que “Se na ação se pedirem, nos termos do artigo 557º, prestações vencidas e prestações vincendas, toma-se em consideração o valor de umas e outras”.</font></i><br>
</p><p><i><font>RR - No presente caso, no momento em que foi proferida a sentença, tornou-se possível quantificar a utilidade económica do pedido dos ora Recorridos, pelo que, nos termos do já mencionado n.º 4 do artigo 299.º do Código de Processo Civil, o Tribunal “a quo” deveria ter corrigido, nesse momento, o valor inicialmente indicado pelas partes.</font></i><br>
</p><p><i><font>SS - Note-se que os Recorrentes foram condenados no pagamento de uma quantia que, na data em que foi proferida a sentença, ascendia a € 58.750,00 (cinquenta e oito mil setecentos e cinquenta euros), pelo que, por não concordarem com o disposto na sentença, é natural que pretendam exercer o seu direito de recurso.</font></i><br>
</p><p><i><font>TT - Sucede que o despacho ora recorrido não admitiu o recurso que foi apresentado da sentença, pelo que, para assegurar o direito de recurso dos Recorrentes, é imperativo que o despacho que fixou o valor da acção seja substituído por outro despacho que fixe tal valor em € 58.750,00 (cinquenta e oito mil setecentos e cinquenta euros).</font></i><br>
</p><p><i><font>UU - Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 629.º do Código de Processo Civil, “o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal”.</font></i><br>
</p><p><i><font>VV - No presente caso, alterando-se o valor da acção para € 58.750,00 (cinquenta e oito mil setecentos e cinquenta euros), a causa passará a ter valor superior à alçada do Tribunal “a quo” e a decisão impugnada será desfavorável aos Recorrentes em valor superior a metade da alçada do mesmo Tribunal.</font></i><br>
</p><p><i><font>WW - Só assim se assegurará o direito de recurso dos Recorrentes, consagrado constitucionalmente no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa.</font></i><br>
</p><p><i><font>XX - De seguida, a 02.03.2020, os Recorrentes submeteram no processo um requerimento no qual informaram que, caso se considerasse que o meio adequado de reacção ao despacho de 05.02.2020 era a reclamação, o recurso interposto deveria ser tramitado como uma reclamação.</font></i><br>
</p><p><i><font>YY - Posteriormente, o Tribunal “a quo” proferiu o despacho sub judice, o qual considerou (i) que do despacho que fixa o valor à causa e indefere a admissão do recurso cabe apenas reclamação e (ii) que a reclamação teria sido interposta fora do prazo legal de 10 (dez) dias.</font></i><br>
</p><p><i><font>ZZ - É verdade que o n.º 1 do artigo 643.º do Código de Processo determina que do despacho que não admita o recurso deve o recorrente reclamar para o Tribunal que seria competente para dele conhecer.</font></i><br>
</p><p><i><font>AAA - Sucede que o despacho de 05.02.2020 não é um simples despacho de não admissão de recurso, mas sim um despacho que fixa o valor da causa, nos termos do n.º 1 do artigo 306.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>BBB - A alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil determina é sempre admissível recurso das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre.</font></i><br>
</p><p><i><font>CCC - Esta disposição legal tem plena aplicação quando estamos, como é o caso, perante um despacho proferido nos termos do n.º 1 do artigo 306.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>DDD - Assim, resta concluir que, ao contrário do determinado no despacho sub judice, era admissível recurso do despacho de 05.02.2020 que fixou o valor da causa, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>EEE - Mas, ainda que se entenda que deveria ter sido apresentada uma reclamação – o não se concede –, sempre se deverá considerar que a peça processual – que os ora Recorrentes expressamente referiram que, se fosse o caso, deveria ser aproveitada como reclamação – foi apresentada no último dia concedido por lei para a prática do acto com multa.</font></i><br>
</p><p><i><font>FFF - O despacho que fixou o valor da causa tem como data de certificação Citius da notificação aos ora Recorrentes o dia 10.02.2020, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 248.º do Código de Processo Civil, os Recorrentes consideram-se notificados no dia 13.02.2020.</font></i><br>
</p><p><i><font>GGG - O prazo para apresentar a reclamação era, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 643.º do Código de Processo Civil, de 10 (dez) dias, pelo que terminava no dia 24 de Fevereiro de 2020.</font></i><br>
</p><p><i><font>HHH - No presente caso, o dia imediatamente seguinte ao último dia do prazo era o dia 25 de Fevereiro de 2020, dia de Carnaval, no qual foi dada pelo Governo tolerância de ponto aos funcionários públicos.</font></i><br>
</p><p><i><font>III - O n.º 3 do artigo 138.º do Código de Processo Civil determina que se consideram encerrados os tribunais nos dias em que for dada tolerância de ponto.</font></i><br>
</p><p><i><font>JJJ - Assim, se no dia 25 de Fevereiro de 2020 os Tribunais se consideravam encerrados, não pode, obviamente, ser esse dia considerado como dia útil para efeitos de contagem dos dias para a prática do acto mediante o pagamento de multa.</font></i><br>
</p><p><i><font>KKK - Assim, o primeiro dia de multa era o dia 26 de Fevereiro de 2020, o segundo dia de multa era o dia 27 de Fevereiro de 2020 e o terceiro dia de multa era o dia 28 de Fevereiro de 2020, tendo o acto sido praticado nesse mesmo dia.</font></i><br>
</p><p><i><font>LLL - Mais se note que, no momento da prática do acto, foi paga uma taxa de justiça de € 357,00 (trezentos e cinquenta e sete euros), muito superior ao somatório do valor da taxa de justiça da reclamação e dos três dias de multa (€ 25,50 + € 10,20).</font></i><br>
</p><p><i><font>MMM - Assim, verifica-se que, ao contrário do referido no despacho sub judice, não é verdade que o acto tenha sido praticado intempestivamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>NNN - Neste sentido, veja-se o disposto no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.09.2003, que, chamado a decidir uma situação em tudo idêntica à presente, determinou que os dias de tolerância de ponto não devem ser contabilizados para efeitos da contagem dos dias de multa.</font></i><br>
</p><p><i><font>OOO - Assim, se o Supremo Tribunal de Justiça, num caso idêntico ao presente, considerou que o acto tinha sido praticado tempestivamente, não se compreende como pode o Tribunal “a quo” considerar que, no presente caso, o acto foi praticado fora do prazo legal </font></i><br>
</p><p><i><font>PPP - Note-se que, conforme expressamente referido neste Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.09.2003, o Acórdão de fixação de jurisprudência de 10.10.1996, que decidiu em sentido contrário ao primeiro, já não tem qualquer tipo de actualidade, pelo que não pode, obviamente, ser aplicado ao caso concreto.</font></i><br>
</p><p><i><font>QQQ - Ora, sendo jurisprudência assente que os dias de tolerância de ponto não podem ser considerados para efeitos de contagem dos dias para a prática do acto mediante o pagamento de multa, é inevitável concluir que o despacho sub judice andou mal quando considerou que a reclamação tinha sido praticada fora do prazo legal.</font></i><br>
</p><p><i><font>RRR - Tudo visto, verifica-se que o despacho sub judice é ilegal, porquanto: (i) o despacho que fixou o valor da causa era recorrível e (ii) em qualquer caso, o acto foi praticado dentro do prazo conferido para a reclamação.</font></i><br>
</p><p><i><font>Nestes termos e nos demais de Direito que doutamente se suprirão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, com as legais consequências”.</font></i><br>
</p><p><font>Respondem os embargados, concluindo as suas alegações:</font><br>
</p><p><i><font>“A. Não se encontram preenchidos os pressupostos necessários para a admissão do recurso de Revista, mormente:</font></i><br>
</p><p><i><font>a. Falta o requisito geral relativo ao valor da causa, nos termos do número 1 do artigo 629.º do Código de Processo Civil;</font></i><br>
</p><p><i><font>b. Falta o requisito especial relativo à existência de “fundamentação substancialmente diferente” a que alude o número 3 do artigo 671.º</font></i><br>
</p><p><i><font>c. Falta a arguição e verificação de um dos fundamentos constantes das alíneas a) a c) do número 1 do artigo 672.º, ambos do Código de Processo Civil que permitiriam a Revista;</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Em face do referido em A., deverá ser proferido Despacho de Não Admissão do Recurso de Revista formulado pelos Recorrentes, com as legais consequências daí advenientes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Em caso de admissão do Recurso de Revista,</font></i><br>
</p><p><i><font>C. O meio processual para impugnar a decisão que não admita o recurso, haja ou não fixação do valor da causa no despacho que aprecia o requerimento de interposição do recurso, é, por força do art. 641º nº 6 do C.P.C., a reclamação, pelo que estamos perante um erro na qualificação do meio processual, sendo que</font></i><br>
</p><p><i><font>D. A sua convolação apenas seria possível à luz se a convolação da reclamação permitisse considerar a mesma como apresentada no prazo de 10 (dez)dias a que alude o número 1 do artigo 643.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>E. O prazo para reclamação terminou no dia 24 de fevereiro de 2020 e, não obstante o pagamento de multa para a prática do ato, tendo o dia de Carnaval coincidido com o 1º dia útil subsequente ao termo do prazo e não com o 3º dia útil, não é equiparado a dia em que os tribunais estão encerrados, pelo que, na data em que os Recorrentes apresentaram o Requerimento de Interposição de Recurso com objeto no Despacho de 5 de fevereiro de 2020, já tinha terminado o prazo para reclamar do Despacho, com as legais consequências daí advenientes, mormente quanto à fixação do valor da ação.</font></i><br>
</p><p><i><font>Assim, nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. mui douta e sapientemente suprirão, deve:</font></i><br>
</p><p><i><font>A. Reconhecer-se que não se encontram preenchidos os pressupostos necessários para a admissão do recurso de Revista, devendo o mesmo ser objeto de Despacho de não admissão, com as legais consequências daí advenientes;</font></i><br>
</p><p><i><font>Ainda que assim se não entenda,</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Ser o Recurso julgado totalmente improcedente, com as legais consequências daí advenientes</font></i><font>.”</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>O recurso foi admitido ao abrigo do disposto no art. 629º, nº 2 al. b), do CPC.</font><br>
<p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Os factos relevantes constam do relatório supra.</font><br>
<div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelos recorrentes e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C.</font><br>
</p><p><font>No caso em análise e relevante para a questão em apreço:</font><br>
</p><p><font>- Analisar da (in)admissibilidade do recurso respeitante ao valor da causa quando o valor é fixado apenas no despacho previsto no art. 641º do CPC, por força do disposto no art. 306º, nº 3, ambos do CPC.</font><br>
</p><p><font>- As demais questões alegadas e eventualmente pertinentes para a fixação do valor não relevam, pelo que, delas não se toma conhecimento.</font><br>
</p><p><b><font>Valor da causa</font></b><font>:</font><br>
</p><p><font>Refere o art. 306º, do CPC, com a epígrafe “Fixação do valor”: </font><br>
</p><p><font>“1 - Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes. </font><br>
</p><p><font>2 - O valor da causa é fixado no despacho saneador, salvo nos processos a que se refere o n.º 4 do artigo 299º e naqueles em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença. </font><br>
</p><p><font>3 - Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho referido no artigo 641º”.</font><br>
</p><p><font>A situação presente enquadra-se no nº 3 do preceito e, não tendo sido fixado antes pelo juiz, o valor da causa deve ser fixado no despacho que aprecie e se pronuncie sobre o requerimento de interposição do recurso. Trata-se de despacho proferido incidentalmente sobre o requerimento de interposição de recurso e, só após decisão definitiva de tal incidente se deve, ou não, admitir o recurso da decisão recorrida.</font><br>
</p><p><font>Este nº 3 apenas se reporta ao momento até quando o juiz pode/deve fixar o valor da ação e, sendo o valor da ação fixado no momento aí previsto (porque o não foi antes) não se pode, de imediato, decidir pela não admissão do recurso, nomeadamente quando o valor fixado interfira na (não) admissão do recurso. </font><br>
</p><p><font>Nessa situação de o valor fixado ser obstáculo à admissão do recurso, deve notificar-se o despacho de fixação do valor e, deixar transitar em julgado esse despacho e, só depois decidir pela inadmissibilidade.</font><br>
</p><p><font>Isso impõe o nº 2 al. b), do art. 629º, do CPC.</font><br>
</p><p><font>Temos, pois, como acertado o entendimento expresso no voto de vencido, pelo Exmº Desembargador, 2º adjunto, ao referir que “</font><i><font>A pronúncia sobre o requerimento de interposição do recurso está dependente da decisão sobre o valor da causa em termos definitivos, pelo menos nos casos em que o valor da causa colide com a admissibilidade do recurso.</font></i><br>
</p><p><i><font>Só acontecerá quando houver decisão definitiva sobre o valor da causa</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>No sentido do nosso entendimento se pronuncia Abrantes Geraldes in “ | [0 0 0 ... 0 0 0] |
djFgu4YBgYBz1XKvDf00 | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<p></p></div><br>
<br>
<font>AA intentou ação declarativa de condenação contra Companhia de Seguros Tranquilidade-Seguradoras Unidas, SA e o Fundo de Garantia Automóvel.</font><br>
<p><font>O autor pediu que o Tribunal: 1) Condenasse a ré Seguradoras Unidas, SA «à regularização do valor indemnizatório de 33.870,00€, acrescida de juros vincendos até efetivo e integral pagamento, sendo 7.500,00€ a título de danos não patrimoniais, correspondendo o demais aos danos patrimoniais e juros moratórios já vencidos; 2) Conhecesse e decretasse com força obrigatória geral a nulidade da cláusula 40.ª, n.º 1, al. c), «que a ré integra "alegada e ilegalmente" nas Condições Gerais Contratuais dos contratos de seguro de responsabilidade civil automóvel que subscreve», «bem como proibir-se a mesma de a utilizar nos contratos futuros, aplicando-se uma sanção pecuniária compulsória de 4.987,98€ diários, agravada pelo número de contratos de seguro onde for aplicada, com reversão do valor, em partes iguais, para o requerente e autor e para o Estado Português.</font><br>
</p><p><font>Subsidiariamente, o autor requereu a condenação do Fundo de Garantia Automóvel «a liquidar a indemnização global, em termos de danos patrimoniais e não patrimoniais, supra indicados, nos mesmos termos formulados para a l.ª ré».</font><br>
</p><p><font>Para fundamentar as suas pretensões, o autor alegou que é proprietário do veículo automóvel de matrícula ...-TH-... e que celebrou com a ré Tranquilidade-Seguradoras Unidas, SA um contrato de seguro automóvel obrigatório, o qual se mostrava em vigor na data de 30 de outubro de 2017, data em que o autor sofreu um acidente de viação quando conduzia o supra referido veículo na estrada nacional n.º 531-1, no regresso a sua casa; a dada altura do seu percurso na referida estrada nacional, e sem que nada o fizesse prever, um cão invadiu a faixa de rodagem por onde o autor circulava e este, para não atropelar o dito animal, desviou-se para o seu lado direito e entrou com a roda direita frontal numa valeta aberta e não protegida, o que originou o capotamento da viatura; após uma longa espera, sem que passasse qualquer veículo pelo local para o socorrer e desprovido do seu automóvel, o autor viu-se obrigado a abandonar o local para ir em busca de auxílio.</font><br>
</p><p><font>Após lhe terem sido prestados os primeiros socorros, o autor contactou com a ré e diligenciou pelo reboque da viatura sinistrada para a oficina da rede convencionada e, no dia seguinte ao do sinistro, deslocou-se ao posto da GNR de … para participar o acidente; a ré veio a rejeitar qualquer responsabilidade pela regularização dos danos materiais resultantes do sinistro, invocando a cláusula 40.ª, n.º 1, al. a) das Condições Gerais.</font><br>
</p><p><font>Mais alegou o autor ter sofridos danos morais não apenas em resultado do despiste e capotamento, mas também em consequência do modo como a 1ª ré tem vindo a tratar o assunto, declinando a sua responsabilidade pelo ressarcimento dos danos sofridos pelo autor. </font><br>
</p><p><font>O autor sustentou que a interpretação realizada pela ré relativamente à cláusula por ela invocada para excluir a sua responsabilidade é abusiva na medida em que exclui a responsabilidade da seguradora «quando o autor não abandonou o local do acidente, em termos técnico-jurídicos, mas outrossim logrou, por momentos, ausentar-se, atento o lugar ermo e sem comunicações em que se encontrava, para obter a assistência necessária» e que a referida cláusula não foi devidamente comunicada nem explicada ao autor.</font><br>
</p><p><font>Na sua contestação o Fundo de Garantia Automóvel defendeu-se por exceção, invocando a respetiva ilegitimidade passiva, e por impugnação.</font><br>
</p><p><font>A ré, na sua contestação, defendeu-se por exceção, invocando a ilegitimidade ativa do autor quanto ao pedido de condenação na abstenção do uso de cláusulas contratuais gerais e a exclusão da sua responsabilidade por força da cláusula 40ª, n.º 1, al. c) das condições Especiais da apólice de seguro, e por impugnação.</font><br>
</p><p><font>O autor apresentou réplica.</font><br>
</p><p><font>Foi realizada audiência prévia, na qual o tribunal convidou o autor a aperfeiçoar a sua petição inicial no que respeita à concretização dos danos materiais sofridos no seu veículo na sequência do acidente e de liquidar o valor reportado à regularização indemnizatória referida no ponto I da PI.</font><br>
</p><p><font>O autor respondeu ao convite, vindo a apresentar uma nova PI na qual pediu que lhe fosse paga uma indemnização no montante de 33.870,23€, acrescido de juros vincendos até efetivo e integral pagamento, sendo 7.500,00€ correspondentes a danos não patrimoniais.</font><br>
</p><p><font>Realizada nova audiência prévia, o tribunal emitiu despacho fixando à causa o valor de 63.870,24€ e, consequentemente, declarou-se incompetente em razão do valor para conhecer a ação, ordenando a remessa dos autos ao juízo central de … .</font><br>
</p><p><font>Em sede de (nova) audiência prévia, o tribunal proferiu despacho-saneador, no qual conheceu das exceções de ilegitimidade ativa do autor e de ilegitimidade do réu Fundo de Garantia Automóvel, tendo declarado a ilegitimidade do autor para o pedido de condenação da ré a abster-se de utilizar em contrato futuros a cláusula 40.ª. n.º 1, al. c) das condições gerais da apólice, absolvendo a ré Seguradoras Unidas, SA da instância relativamente a tal pedido, e declarado a ilegitimidade passiva do Fundo de Garantia Automóvel, o qual absolveu da instância, tendo relegado para a sentença o conhecimento da exceção resultante de cláusula de exclusão da responsabilidade da ré. Depois de fixar o objeto do litígio bem como os temas de prova, decidiu sobre os requerimentos de prova das partes, ordenando, designadamente, a realização da perícia solicitada pelo autor, fixou os quesitos sobre os quais a perícia deveria recair e designou data para a realização da audiência final.</font><br>
</p><p><font>Realizada audiência final veio a ser proferida sentença pela qual se decidiu julgar a ação improcedente e absolver a ré Seguradoras Unidas, SA dos pedidos e condenou o autor como litigante de má-fé em multa de 8 UC.</font><br>
</p><p><font>Inconformado com a sentença veio o autor dela interpor recurso de apelação sendo, após deliberação, decidido:</font><br>
</p><p><i><font>“1 - Revogam a sentença recorrida;</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - Declaram excluída do contrato de seguro outorgado entre as partes a cláusula 40.ª, al. c) das Condições Gerais da Apólice.</font></i><br>
</p><p><i><font>3 - Condenam a apelada Seguradoras Unidas, SA a pagar ao apelante AA uma indemnização por danos patrimoniais no montante de vinte e um mil euros (21.000,00€), acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal civil, contados desde 4 de dezembro de 2017 e até integral e efetivo pagamento.</font></i><br>
</p><p><i><font>As custas são repartidas entre as partes na proporção do respetivo decaimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ordena-se a notificação das partes, sendo ainda o apelante notificado para se pronunciar, querendo, sobre a possibilidade de vir a ser condenado, em multa, por litigância de má-fé</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>Após o autor se ter pronunciado foi proferido acórdão e decidida a questão relativa à má-fé do autor, nos seguintes termos: </font><i><font>“1 - Julgar improcedente a apelação na parte relativa à condenação do apelante AA em multa de oito unidades de conta por litigância de má-fé.</font></i><br>
</p><p><i><font>2 - Condenar o apelante AA por litigância de má-fé na presente instância de recurso, em multa de quatro unidades de conta”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Inconformados com o decidido pela Relação, </font><b><font>interpõem recurso de Revista </font></b><font>para este STJ a ré “GENERALI SEGUROS, SA”, anteriormente denominada “SEGURADORAS UNIDAS, S.A.” e o autor AA.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>A ré “GENERALI SEGUROS, SA” formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>“a) Pela via do presente recurso, pretende a ora Recorrente demonstrar o desacerto da douta decisão de fls. dos autos, proferida pelo tribunal de segunda instância, que decidiu condenar a Ré/Recorrente a indemnizar o Autor/Apelante, pela violação dos deveres de comunicação e informação, nos termos dos artigos 5º e 6º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro </font></i><br>
</p><p><i><font>b) Em causa, encontra-se pugnada a cláusula 40ª das condições gerais da apólice, sob a epígrafe “Exclusões”, a qual estabelece que “Para além das exclusões previstas na cláusula 5.ª o contrato também não garantirá ao abrigo das coberturas facultativas acima previstas as seguintes situações: c) (..) </font></i><i><u><font>bem como quando, voluntariamente e por sua iniciativa, abandone o local do acidente de viação antes da chegada da autoridade policial, quando esta tenha sido chamada por si ou por outra entidade</font></u></i><i><font> (…) (Negrito e sublinhado nossos).</font></i><br>
</p><p><i><font>c) É do nosso entendimento que o facto de o Recorrido abandonar voluntariamente o local do acidente antes da chegada da autoridade policial, sem que esta tivesse oportunidade de efectuar o teste de alcoolémia, é bastante para que se dê como preenchida a parte final da cláusula de exclusão da responsabilidade da Recorrente.</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Considerou o Tribunal a quo que não se julgou provado o cumprimento dos deveres de informação e de comunicação acima mencionadas, por banda da ré/apelada.</font></i><br>
</p><p><i><font>e) Sendo que, perante os factos apresentados, o Venerando Tribunal da Relação de … não considerou “suficientes, para se retirar a ilação de que o autor conhecia a cláusula de abandono.” – Cfr. Acórdão recorrido, pág. 54, para. 1</font></i><br>
</p><p><i><font>f) Para se aferir do cumprimento de tal dever de comunicação, caberá, em primeiro lugar, enquadrar o contrato de seguro em questão.</font></i><br>
</p><p><i><font>g) Além da lei contratual geral, estabelecida no Código Civil, regem os normativos específicos do contrato de seguro automóvel, nos termos do Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril.</font></i><br>
</p><p><i><font>h) Destarte, o contrato de seguro automóvel é constituído pela apólice de seguro, que, por sua vez, é composta pelas condições contratuais gerais, pelas condições particulares e pelas condições especiais.</font></i><br>
</p><p><i><font>i) Desde logo, existe a possibilidade de as partes conformarem o conteúdo do contrato de seguro a condições particulares, previamente negociadas, de acordo com o princípio da liberdade contratual, previsto no artigo 405º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>j) O princípio da liberdade contratual encontra-se confinado pelas limitações estabelecidas pela ordem jurídica, decorrentes da aplicação de outros princípios, como, por exemplo, a ordem pública ou a boa-fé.</font></i><br>
</p><p><i><font>k) Além do princípio da boa-fé, que deve nortear a actuação contratual entre as partes, estendendo-se aos preliminares e formação do contrato, nos termos do artigo 227º do Código Civil, relevante será ainda, a este propósito, o artigo 406º, no qual se prevê que os contratos devem ser pontualmente cumpridos.</font></i><br>
</p><p><i><font>l) No caso objecto dos autos, trata-se de um seguro do ramo automóvel, com a cobertura facultativa de danos próprios, que contempla, além do mais, os danos resultantes de “choque, colisão e capotamento”, até ao limite de €32.640,00, sem qualquer franquia, conforme resulta dos factos dados por provados (Cfr. elenco factos provados/facto c) e Cfr. Documento em anexo 3 junto aos autos com a referência CITIUS 57…9, “Condições Particulares da Apólice 00045…70”).</font></i><br>
</p><p><i><font>m) No âmbito do contrato de seguro celebrado entre o Autor e a Ré, estão previstas nas Condições Gerais da Apólice cláusulas gerais de exclusão de responsabilidade e cláusulas específicas dos Riscos e Garantias de Subscrição facultativa (Cfr. Documento em anexos 2 e 3 junto aos autos com a referência CITIUS 57…9, Condições Gerais, págs. 14 a 29 e Particulares da Apólice 00045…70).</font></i><br>
</p><p><i><font>n) Quanto à cobertura facultativa de danos próprios, a cláusula 40ª estabelece que, para além das exclusões previstas no art.º 5, o contrato também não cobre “c) Sinistros resultantes de demência do condutor do veículo ou quando este conduza em contravenção à legislação aplicável à condução sob o efeito do álcool, ou sob a influência de estupefacientes, outras drogas ou produtos tóxicos, </font></i><i><u><font>bem como quando voluntariamente ou por sua iniciativa, abandone o local do acidente antes da chegada da autoridade policial, quando esta tenha sido chamada por si ou por outra entidade</font></u></i><i><font>.”(Negrito e sublinhado nossos.)</font></i><br>
</p><p><i><font>o) Resulta dos factos provados que o Autor, ora Recorrido, abandonou o local do sinistro antes da chegada das autoridades policiais. (Cfr. elenco factos provados | factos j, m, n.)</font></i><br>
</p><p><i><font>p) Assim, impedindo que estas recolhessem os elementos essenciais do sinistro, confirmassem a sua habilitação legal para conduzir e lhe fizessem o teste de alcoolémia, a que este estava obrigado a se submeter (art. 156, nº 1, 153, nº 1 e 152, nº 1 do CE).</font></i><br>
</p><p><i><font>q) Inclusive, encontra-se análogo respaldo na alínea c), in fine, do art. 19° do DL. 522/85, que estabelece uma ratio preventiva do direito de regresso da seguradora, decorrente do abandono de sinistrado pelo condutor do veículo seguro, sendo, esta norma, de cariz preventivo, pedagógico e sancionador, visando, como tal, evitar o comportamento de abandono de sinistrado nela previsto.</font></i><br>
</p><p><i><font>r) Deverá presumir-se, desta forma, o nexo de causalidade entre o sinistrado que abandone o local previamente à chegada das autoridades policiais, de modo a que se possa efectuar o respectivo exame toxicológico, e a presunção legal da sua respectiva condução sob efeito de álcool. (Vide a este respeito, inter alia, o Acórdão do STJ de 2015.07.02, processo n.º 620/12.0T2AND.C1.S1, Relator: Lopes do Rego, disponível em www.dgsi.pt.)</font></i><br>
</p><p><i><font>s) Como tal, não se pode impor o mesmo rigor no sentido de esclarecer uma cláusula que subjaz facilmente interpretável pelo seu próprio texto, e cujo substrato normativo decorre de razões de ordem pública, sendo imperativamente cognoscível para um homem médio, cujo comportamento ordeiro será também, este, peremptoriamente espectável.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sem prescindir,</font></i><br>
</p><p><i><font>t) Não obstante, desaprovou o Tribunal a quo que a seguradora tivesse cumprido os deveres de comunicação e informação a que estava obrigada, ditando esse alegado incumprimento a exclusão da mencionada cláusula, nos termos do artigo 8º do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais.</font></i><br>
</p><p><i><font>u) O dever de comunicação é qualificado, pelo que dificilmente se pode considerar cumprido, porquanto não se afigura, em termos inequívocos, a existência de uma tomada de conhecimento tal que garanta, impreterivelmente, que a contraparte aderente se consciencializou efectivamente do alcance das cláusulas subscritas.</font></i><br>
</p><p><i><font>v) Não se podendo auferir, para efeitos do regime probatório, da prova documental, exarando, inter alia, que o Autor declarou ter tido conhecimento de todas as cláusulas contratuais, resta tão somente o recurso à prova testemunhal.</font></i><br>
</p><p><i><font>w) Ora, no caso em questão, sem que tivesse merecido a devida valoração pelo Venerando Tribunal da Relação de …, referiu o mediador de seguros que o contrato em causa foi assinado pelo Autor, na sua presença, após comunicação/informação, e posterior esclarecimento. (Cfr. Ponto 35) das presentes alegações)</font></i><br>
</p><p><i><font>x) Pelo contrário, tivessem tal depoimento sido devidamente valorado, não se concebe quais as demais presunções judiciais que poderia o Tribunal a quo sido tomado, que não o do preenchimento deste dever de comunicação.</font></i><br>
</p><p><i><font>y) Ainda que, ao arrepio de todos os supramencionados depoimentos, entendeu o Tribunal a quo valorar o depoimento do Autor, que insiste não ter tido conhecimento da referida cláusula em questão.</font></i><br>
</p><p><i><font>z) É que, afigura-se-nos quimérico que se pretenda, no caso concreto, comprovar o cumprimento do dever de comunicação, ao esperar que o predisponente se transporte para o consciente do aderente, quando o próprio, ao admitir alheamento, num exercício retroactivo de pura ficção, consegue, assim, desmentir plenamente qualquer prova apresentada a juízo.</font></i><br>
</p><p><i><font>aa) Uma vez que toda a parte contraente pode alegar não ter sido explanada de forma aceitável, daí se desvinculando ulteriormente de qualquer cláusula contratual cujo teor se não lhe aprouver de valorado interesse, não se justifica tamanho desequilíbrio negocial, até mesmo por uma questão de segurança jurídica contratual.</font></i><br>
</p><p><i><font>bb) Tendo o Autor, aderente, aceitado o contrato nas condições em que o fez, podendo e devendo ter colhido elementos detalhados do mediador de seguros e da Recorrente, predisponentes, relativos a aspectos muito relevantes para a responsabilização do risco, não pode agora, ante a verificação do sinistro, pretender a omissão da clausula que menos lhe cativa para se desobrigar do seu cumprimento integral, alegando negligência.</font></i><br>
</p><p><i><font>cc) A inobservância da diligência mínima, com vista ao exacto conhecimento do risco a que aceitou dar cobertura, implica, por aplicação dos princípios da boa-fé e do abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, que aquele deverá suportar as inerentes consequências, não podendo, para se desvincular de uma só cláusula em específico do contrato, escudar-se posteriormente numa alegada falta de consciencialização para a qual, contribuiu e teve oportunidade (e o dever) de evitar.</font></i><br>
</p><p><i><font>dd) Com efeito, ao exigir uma comunicação atempada e adequada, em princípio, na generalidade dos casos em que a celebração do contrato é instantânea, revela-se nitidamente prejudicado o cumprimento desse dever.</font></i><br>
</p><p><i><font>ee) Em suma, ao indicar que leu a cláusula de exclusão, e, bem assim, o contrato na sua íntegra, tendo por certo que assinou a declaração confirmando que o fez, criou o Autor, desta forma, tal convicção na contraparte, (Cfr. Doc. 4 da contestação com referência CITIUS 5…3, “Proposta 00045…70 Seguro Automóvel NOVO”) devendo o Tribunal a quo ter-se debruçado sobre todas as declarações negociais envolvidas, e não tão somente sobre uma cláusula de exclusão em particular.</font></i><br>
</p><p><i><font>ff) Convicção, essa, que, por todos os motivos supra elencados, induziu a seguradora, ora Recorrente, em crer que o aderente, de diligência média, houvesse lido o clausulado, em qualquer espaço de tempo, e interiorizado as normas contratadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>gg) Todavia, mesmo que assim não se entendesse, deveria, nesse cenário, o princípio da boa-fé, basilarmente positivado na ordem jurídica, ter sido atendido, considerando o negócio jurídico como um todo, tendo esta universalidade sido afectada pela má-fé do Autor, aderente, com as consequências previstas na lei geral. (Cfr. 227.º, n.º 1 do Código Civil)</font></i><br>
</p><p><i><font>hh) Isto posto, ainda que o Autor não tivesse lido, sequer, as condições da apólice subscrita, (Cfr. Ponto 36) das presentes alegações) certo é que as mesmas lhe foram comunicadas.</font></i><br>
</p><p><i><font>ii) Resulta, talqualmente, que o teor da mesma clausula se nos afigura plenamente cognoscível, porquanto esta se encontra redigida de forma simples, configurada, até, para aderentes dotados de instrução básica.</font></i><br>
</p><p><i><font>jj) Atento o grau de instrução do Autor, aderente, afigura-se nos inequívoco que tal dever de comunicação por parte da Recorrente foi plenamente cumprido, tendo presentes as declarações prestadas em sede de prova testemunhal, tendo o mediador de seguros comunicado de forma oral, e, bem assim, pelas múltiplas declarações escritas do Autor em que se arroga ter lido.</font></i><br>
</p><p><i><font>kk) Certo é que, tal “cláusula de abandono”, bem como todo o restante clausulado, encontram-se plenamente pré-configuradas e disponíveis, a todo o tempo, para consulta ou impressão no sítio da internet, de simples acesso.</font></i><br>
</p><p><i><font>ll) Reiterando a posição do próprio Supremo Tribunal de Justiça, não se justifica que a protecção concedida à parte mais fraca vá ao ponto de açambarcar situações em que tal falta de conhecimento decorra de falta de diligência dessa parte, que teve todas as condições para as conhecer, mas não o fez por mera negligência. (Vide Acórdão do STJ de 2017.10.03, nota de rodapé supra 23.)</font></i><br>
</p><p><i><font>mm) Sempre se tornará imensuravelmente inexequível tal ónus de prova do dever de comunicação e informação, até por via de regras da experiência comum, pois que se revela irrealizável que o predisponente atestasse a consciencialização do aderente de má-fé, que, por sua vez, viu assim reforçado o conteúdo da sua declaração negocial ao activamente confirmar, também por via de declaração impressa, a sua intenção em contratar, conquanto se tenha, ou não, efectivamente instruído das cláusulas.</font></i><br>
</p><p><i><font>nn) Ao não interpretar da forma sugerida a decisão recorrida violou o disposto no artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil, porquanto partiu de factos não provados para concluir que o Autor não foi devidamente comunicado do clausulado em questão, pelo que deve o acórdão de que ora se recorre ser revogado, e substituído por outro que mantenha inalterada a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, e, em consequência, ser:</font></i><br>
</p><p><i><font>A. Revogado o acórdão e, substituído por outro que mantenha inalterada a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, no que respeita à matéria relativa ao dever de comunicação, atento os fundamentos de facto e direito invocados nos anteriores pontos 1) e 80) das alegações, bem como a) a nn) das conclusões;</font></i><br>
</p><p><i><font>B. Revogado o acórdão e, substituído por outro que mantenha inalterada a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, no que respeita à matéria relativa à indemnização pelo dano do veículo, resultante da exclusão de responsabilidade civil da Recorrente”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Responde o autor, concluindo:</font><br>
</p><p><i><font>“I - As Alegações e Conclusões de Recurso apresentadas pela Recorrente limitam-se a eximir a sua responsabilidade, alegando ter cumprido o ónus da prova da comunicação e informação que sobre si impendia ao entregar, em formato papel e disponibilizando no seu sítio da internet, as condições gerais e especiais da apólice de seguro.</font></i><br>
</p><p><i><font>II - Terá sido por negligência ou por comportamento pouco diligente que o Recorrido não terá tido conhecimento da cláusula 40.a, alínea c), da Condições Gerais da Apólice de Seguro, já que a referida documentação lhe foi facultada antes da assinatura da apólice de seguro, suportando tal conclusão com o depoimento da Testemunha BB, o qual esteve presente aquando da assinatura da apólice, tendo o mesmo utilizado expressões vagas como “provavelmente leu (se o Autor leu ou não as condições gerais)” e “provavelmente sim [sobre se explicou ou não a cláusula 40.a, alínea c)]”.</font></i><br>
</p><p><i><font>III - A matéria de facto dada como provada respeitante ao (in)cumprimento do dever de comunicação e de informação foi a seguinte:</font></i><br>
</p><p><i><font>«Por proposta subscrita pelo autor, no dia 24.08.2017, este declarou terem-lhe sido prestadas todas as informações relevantes para a subscrição do contrato de seguro celebrado, nomeadamente, as suas principais características, âmbito das garantias e exclusões.</font></i><br>
</p><p><i><font>g. O autor declarou terem-lhe sido explicadas e colocadas à disposição no acto da celebração, as Condições Gerais aplicáveis à Apólice de Seguro, as quais também lhe serão entregues, em qualquer data, numa loja da tranquilidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>h. Declarando, ainda, que tomou conhecimento que, para sua maior comodidade, as Condições Gerais e Especiais aplicáveis se encontram, ainda, disponíveis, a todo o tempo, para consulta ou impressão no sítio da internet wn w.tranqitilidade.pl.</font></i><br>
</p><p><i><font>i. Para além das referidas informações, esclarecimentos e advertências, tal como supra referido foi, ainda, entregue ao Autor “Nota informativa", com um resumo das Condições Gerais e Especiais da Apólice de Seguro aplicáveis ao contrato.».</font></i><br>
</p><p><i><font>IV - A alegada negligência ou comportamento pouco diligente do Recorrido aquando da subscrição da apólice de seguro não foi objeto de produção de prova e, consequentemente, não existe nenhum facto provado que demonstre, ou sequer indicie, negligência ou comportamento pouco diligente por parte do Recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>V - A Recorrente, de forma sub-reptícia, tenta impor uma alteração à matéria de facto, chamando à colação um alegado comportamento negligente ou pouco diligente do Recorrido. Contudo, dispõe o artigo 682.°, n.° 2, do Código de Processo Civil que «A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada», o que implicará que a matéria de facto dada como provada é imutável.</font></i><br>
</p><p><i><font>VI - Tal implicará que o invocado erro de interpretação e de determinação da norma aplicável não tem sustentação factual.</font></i><br>
</p><p><i><font>VII - Já no que respeita ao cumprimento do dever de comunicação e informação, a inclusão das denominadas "cláusulas de confirmação”, não é mais do que uma tentativa por parte da Seguradora de eximir-se às responsabilidade que decorrem dos artigos 4.° e seguintes da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII - Tais “cláusulas de confirmação”, consubstanciado uma declaração de concordância ou aceitação do cliente, não são suficientes, já que o utilizador tem de comunicar as condições gerais e proporcionar a possibilidade de um conhecimento real do respetivo conteúdo ao cliente.</font></i><br>
</p><p><i><font>IX - O Douto Acórdão recorrido conclui, e bem, que «a cláusula em análise infringe, logo por aqui, as normas imperativas contidas nos arts. 4." e ss da lei das cláusulas contratuais gerais, atinentes à incorporação das condições no contrato singular. De resto, para lá da própria contrariedade às imposições da referida lei, a cláusula está, in nuce, destituída de qualquer relevância jurídica, não podendo aspirar a produzir efeitos práticos [...]. Por outro lado, uma cláusula deste tipo, que passa por cima das exigências que impendem sobre o utilizador e faz derivar a concordância com a vigência de condições gerais da simples contratação do serviço, não pode certamente “eliminar” a regra que faz recair sobre aquele o ónus da prova da comunicação adequada e efetiva (cfr. art. 5.°, n." 3). [...] Não é pois possível reconhecer-lhe eficácia constitutiva, suscetível de a fazer funcionar como substituto da concordância da contraparte com a vigência das condições gerais tidas em vista pelo utilizador ou como sucedâneo da verificação dos restantes pressupostos legais de incorporação no contrato singular.».</font></i><br>
</p><p><i><font>X - A Recorrente não logrou fazer prova de que cumpriu o dever de comunicação e informação que sobre si impendia, já que os expedientes utilizados para se eximir dessa mesma responsabilidade são irrelevantes, não sendo suficientes para provar, de forma inequívoca, que a Recorrente efetuou uma comunicação adequada e efetiva do teor do clausulado ao Recorrido antes da subscrição da proposta de seguro.</font></i><br>
</p><p><i><font>XI - Pelo apenas podemos concluir da mesma forma que o Douto Acórdão recorrido, ou seja «não se mostra cabalmente demonstrado pela Ré - sobre a qual recaí o ónus da prova — que aquela proporcionou ao apelante, antes de este se vincular ao contrato - um conhecimento efetivo e completo do clausulado e, concretamente, da cláusula 40.“, al. c), das condições gerais da apólice de seguro» e, consequentemente, deverão as Conclusões de Recurso apresentadas pela Recorrente serem julgadas improcedentes, confirmando-se o Douto Acórdão recorrido.</font></i><br>
</p><p><i><font>NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE V. EX.ª DOUTAMENTE SUPRIRÁ, DEVERÁ:</font></i><br>
</p><p><i><font>I - ADMITIR AS PRESENTES CONTRA-ALEGAÇÕES DE RECURSO; E, EM CONSEQUÊNCIA,</font></i><br>
</p><p><i><font>II - JULGAR IMPROCEDENTE O RECURSO DE REVISTA, CONFIRMANDO O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><b><font>Do recurso interposto pelo autor e relativo à condenação por litigância de má-fé</font></b><font>, o mesmo conclui:</font><br>
</p><p><i><font>“I a IV - </font></i><font>(Irrelevantes por respeitarem a recurso de revista excecional em matéria de litigância de má-fé)</font><br>
</p><p><i><font>V - O acórdão do TR… padece do chamado ERRO DE OMISSÃO, posto nos artigos 608.° e 609.°, e 615.°, n.ºs 1, alínea d), e 4, do NCPC, visto que, por notória comodidade e «acoitados pela dupla conforme», o tribunal “a quo”, usando uma retórica formal e abstractizante, deixou de se pronunciar sobre um aspecto essencial, imprescindível para a condenação em multa processual, por litigância de má fé e que se reporta à identificação dos factos que lhe permitem efectuar um juízo de inferência relativamente à CULPA ou IMPUTAÇÃO SUBJECTIVA, dado que, a tal propósito, apenas refere </font></i><font>(segue-se transcrição de parte do acórdão)</font><br>
</p><p><i><font>VI - Não pode existir DOLO ou «NEGLIGÊNCIA GRAVE», para efeitos do artigo 542.1’, n." 2 (intróito), do NCPC, se, depois, no que à alteração da verdade dos factos ou omitidos, eles não forem RELEVANTES para a decisão da causa. Ora,</font></i><br>
</p><p><i><font>VII - Há contradição, confusão e violação de lei, com NULIDADE do acórdão do TR…, quando pretende que o «MOTIVO DO ABANDONO», que não foi APURADO NOS AUTOS (!), pois, naturalmente, a Ré, sempre pretendia calcorrear uma «tese alcoólica» mas, quiçá, inebriada, foi-se agarrando a uma cláusula de exclusão da sua responsabilidade que, em si mesma, é NULA e materialmcnte inconstitucional quando, na verdade, originariamente concebida para proteger as vítimas de SINISTRO, a precisarem de auxílio (que, uma vez negado, pelo abandono, igualmente releva em termos penais — crime de omissão de auxílio), mas que não faz sentido algum, em termos do seu âmbito de protecção, quando imposto a um condutor, sem vítimas, já que configura um cerceamento da vontade de decisão e, ainda, da liberdade deambulatória que não resiste ao teste da concordância prática e da necessidade de «autorização constitucional expressa» ou «implícita» para permitir a discriminação, restrição ou limitação no gozo de tais direitos fundamentais. E, por isso,</font></i><br>
</p><p><i><font>VIII - Não se percebe como é que, escondendo ou não, propositadamente ou não, o motivo do abandono do local (tenha sido por alcoolémia ou outro), como é que tal configura um «FACTO RELEVANTE PARA A DECISÃO», tal qual como exigido pelo artigo 542.°, n.° 2, alínea h), do NCPC, para que se verifique, quer o dolo, quer a negligência grave. E, por isso,</font></i><br>
</p><p><i><font>IX - Não há dolo ou negligência grave se a direcção da vontade ou o descuido do agente implica com factos ou realidades que não estão em condições de bulir com o cerne da decisão (indemnização por sinistro). E, na verdade,</font></i><br>
</p><p><i><font>X - A litigância existiria, exclusivamente, se o AUTOR TIVESSE NEGADO QUE TINHA ABANDONADO O LOCAL DO SINISTRO, não foi o que fez, como o afirma e confirmam ambas as instâncias!</font></i><br>
</p><p><i><font>XI - A interpretação do artigo 542.°, n.° 2, alínea h), do NCPC, como permitindo a punição de um agente, com multa processual civil, por litigância de má fé, quando indicou um motivo diferente, para um facto, | [0 0 0 ... 0 1 1] |
dzFgu4YBgYBz1XKvDv1W | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção.</font><br>
<p></p></div><br>
<br>
<font>AA e mulher BB, residentes em lugar do …, freguesia de …, concelho de …, instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, destinada a efetivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, demandando a ré, Ageas Portugal, Companhia de Seguros S. A., com sede em Rua …, n.º …, …, pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia de €135.000,00 (cento e trinta e cinco mil euros) a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento.</font><br>
<p><font>Em síntese, alegam ter ocorrido um acidente de viação, em que foram intervenientes, o filho dos autores, que conduzia um velocípede sem motor, e um veículo ligeiro de passageiros, matrícula ...-DS-..., conduzido por CC. Do acidente resultou uma vítima mortal, o filho dos autores, sendo estes os seus únicos herdeiros. Imputam a causa do sinistro à conduta culposa do condutor do veículo ligeiro de passageiros. Alegam os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos cujo ressarcimento peticionam.</font><br>
</p><p><font>Subsidiariamente, na eventualidade de não se apurar a culpa do condutor do veículo, pedem que a ré seja condenada a título de responsabilidade pelo risco.</font><br>
</p><p><font>A ré contestou, declinando a responsabilidade do condutor do veículo seu segurado e alegando uma outra versão do acidente, para concluir que o mesmo ocorreu por culpa da vítima.</font><br>
</p><p><font>Termina pedindo a improcedência da ação e sua absolvição do pedido.</font><br>
</p><p><font>Tramitada a causa, após audiência final, foi proferida sentença, que se reproduz na sua vertente dispositiva:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Decisão:</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, decide-se julgar totalmente improcedente a presente acção e absolver a ré do pedido nela formulado.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelos autores – artigo 527, ns.º 1 e 2 do CPC</font></i><font>.”</font><br>
</p><p><font>Inconformados, os autores vieram recorrer desta decisão, sendo deliberado no acórdão da Relação:</font><br>
</p><p><i><font>“Pelo exposto, decide-se julgar totalmente improcedente o recurso em apreço confirmando-se integralmente a decisão proferida em primeira instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>Custas pelos apelantes”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Novamente inconformados vieram interpor recurso de Revista excecional, para este STJ, formulando as seguintes conclusões:</font><br>
</p><p><i><font>“A.</font></i><br>
</p><p><i><font>Entendem os recorrentes que cabe recurso de revista excepcional do acórdão ora proferido pelo Tribunal da Relação …, nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>B.</font></i><br>
</p><p><i><font>A doutrina e jurisprudência tradicionais têm entendido que em matéria de acidentes de viação, a verificação de qualquer das circunstâncias referidas no artigo 505.º do Código Civil, maxime, ser o acidente imputável a facto, culposo ou não, do lesado, exclui a responsabilidade objectiva do detentor do veículo, não se admitindo o concurso do perigo especial do veículo com o facto da vítima, de modo a conduzir a uma repartição de responsabilidade: a responsabilidade pelo risco é afastada pelo facto do lesado.</font></i><br>
</p><p><i><font>C.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ora, esta corrente doutrinal e jurisprudencial engloba as situações mais díspares e não distingue as condutas culposas das não culposas e dentro daquelas as de culpa mais grave das de culpa mais leve, conduzindo muitas vezes a resultados chocantes e injustos e mostra-se ainda insensível ao alargamento crescente, por influência do direito comunitário, do âmbito da responsabilidade pelo risco e da expressa consagração da hipótese da concorrência entre o risco da actividade do agente e um facto culposo do lesado, que tem tido tradução em recentes diplomas legais.</font></i><br>
</p><p><i><font>D.</font></i><br>
</p><p><i><font>No entanto, nestes últimos anos, tem vindo a surgir jurisprudência que privilegia uma interpretação progressista e actualista do artigo 505.º do Código Civil, no sentido de nele se acolher a regra do concurso da culpa do lesado com o risco próprio do veículo.</font></i><br>
</p><p><i><font>E.</font></i><br>
</p><p><i><font>In casu, quer a 1.ª instância, quer o Colendo Tribunal da Relação … consideraram culposa a actuação do lesado, e que a culpa na produção do acidente coube na totalidade àquele, pelo que com base nesta conclusão a decisão de que ora se recorre arredou a possibilidade de aplicação da tese actualista i.é. a concorrência entre o risco e o facto do lesado.</font></i><br>
</p><p><i><font>F.</font></i><br>
</p><p><i><font>A decisão recorrida, partindo da conclusão de que o lesado teve culpa na produção do acidente, afastou logo a responsabilidade do condutor do veículo ligeiro de passageiros sem sequer ter apreciado a hipótese de este poder ser responsabilizado pelo risco.</font></i><br>
</p><p><i><font>G.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ademais, o douto acórdão recorrido, ao não ter equacionado nem apreciado a responsabilidade do condutor do ligeiro com base no risco, mesmo havendo culpa do lesado, encontra-se em contradição com outro acórdão do STJ já transitado em julgado no domínio da mesma legislação - artigos 503.º, 505.º e 570.º do CC - e sobre a mesma questão fundamental de direito - concorrência de culpa e risco em acção emergente de acidente de viação, designadamente o acórdão proferido em 28-03-2019 no Processo n.º 954/13.7TBPMS.C1.S1 (cuja cópia se junta).</font></i><br>
</p><p><i><font>H.</font></i><br>
</p><p><i><font>Sendo certo que não foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência sobre a matéria em questão.</font></i><br>
</p><p><i><font>I.</font></i><br>
</p><p><i><font>Apesar da diversidade da matéria de fado, pois que, como é natural, não existem acidentes iguais, o acórdão-fundamento, numa situação de facto equiparável à dos autos, decidiu atribuir indemnização ao lesado com base na concorrência entre a culpa do lesado e o risco inerente à circulação do veículo automóvel, quando os tribunais a quo a tinham afastado, por concluírem ser o acidente imputável a título de culpa ao sinistrado, sem se ter demonstrado qualquer parcela de culpa do condutor do veículo envolvido.</font></i><br>
</p><p><i><font>J.</font></i><br>
</p><p><i><font>In casu, o Tribunal a quo concluiu pela culpa do condutor do velocípede – que efectuou o atravessamento da via prioritária sem ter imobilizado, previamente, o mesmo, no sinal de STOP; que trajava indumentária de cor escura e sem que o velocípede estivesse provido de dispositivos luminosos ou reflectores e sem ser portador de capacete (cfr. pontos 22.º, 23.º e 24.º da matéria de facto provada) – deixando de apreciar a possibilidade de responsabilidade objectiva do outro interveniente, o condutor do ligeiro de passageiros.</font></i><br>
</p><p><i><font>K.</font></i><br>
</p><p><i><font>Ademais, o douto acórdão recorrido, ao afastar a culpa do condutor do automóvel, apesar de este circular acima do limite máximo legal estabelecido para o local do acidente (circulava entre os 50 e 60km/hora), entra em contradição com outro acórdão do STJ já transitado em julgado, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-12-2018, no processo 1685/15.9T8CBR.C1.S1 (cuja cópia se junta).</font></i><br>
</p><p><i><font>L.</font></i><br>
</p><p><i><font>Apesar de não estarmos também perante situações comparáveis (o que sempre será virtualmente impossível quando se trata de acidentes de viação) certo é que o Acórdão de que ora se recorre não teve em consideração que o ligeiro não circulava a uma velocidade adequada ao local da ocorrência, pelo que circulava em velocidade excessiva, violando as normas ínsitas no Código da Estrada, mormente os artigos 24.º e 25.º.</font></i><br>
</p><p><i><font>M.</font></i><br>
</p><p><i><font>Entendem os recorrentes que do quadro fáctico dos autos resulta que a culpa do lesado não é exclusiva e que o condutor do veículo ligeiro deve ser responsabilizado pelo risco, ou mesmo até a título de culpa.</font></i><br>
</p><p><i><font>N.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve entender-se que para o acidente concorreu também o risco do próprio veículo automóvel – como se lê num dos aresto citados “um veículo automóvel é dotado de maior capacidade lesiva activa” - cuja perigosidade, em abstracto, decorre da sua própria natureza.</font></i><br>
</p><p><i><font>O.</font></i><br>
</p><p><i><font>Acresce ainda que o condutor do velocípede (um utilizador vulnerável) se deslocar – de acordo com as regras da experiência – a uma velocidade reduzida face ao veículo que lhe embateu, o que não pode ser entendido como facto culposo.</font></i><br>
</p><p><i><font>P.</font></i><br>
</p><p><i><font>Deste modo, a condução do ligeiro está indiscutivelmente ligada à ocorrência do acidente, enquanto máquina de funcionamento complexo. Dentro dos riscos próprios do veículo, a que se refere o artigo 503.º do Código Civil cabem “além dos acidentes provenientes de máquinas de transporte, os ligados ao outro termo do binómio que assegura a circulação desse veículo (o condutor)” - A. Varela "Das Obrigações em Geral", vol. I, 7.ª edição, pág. 664.</font></i><br>
</p><p><i><font>Q.</font></i><br>
</p><p><i><font>Dos factos provados fica a noção de que o condutor do veículo automóvel podia, e devia, ter atuado de forma diferente, reduzindo significativamente a velocidade para responder de forma mais adequada às circunstâncias do local, isto é, um cruzamento normalmente atravessado por ciclistas e peões que se deslocam para uma padaria/pastelaria e para uma agência bancária. O que aliás era do conhecimento do condutor do ligeiro (cfr. ponto 27.º da matéria de facto provada).</font></i><br>
</p><p><i><font>R.</font></i><br>
</p><p><i><font>O que, de acordo com a interpretação actualista do preceituado no artigo 505.º do Código Civil reclama a subsunção desta situação concursal de causas de dano à norma da repartição do dano que é o artigo 570.º do Código Civil, repartição que deve ser efectuada em igual proporção de 50% para o lesado e 50% para o risco do veículo.</font></i><br>
</p><p><i><font>S.</font></i><br>
</p><p><i><font>Salvo o devido respeito, os recorrentes entendem que o acórdão recorrido violou por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 503.º, 505.º e 570.º do Código Civil, bem ainda o disposto nos artigos 24 e 25.º do Código da Estrada.</font></i><br>
</p><p><i><font>T.</font></i><br>
</p><p><i><font>Pelo que deve proceder-se a repartição de responsabilidades de forma proporcional nos termos ora enunciados, ou noutra proporção que se entenda melhor adequada ao caso concreto,</font></i><br>
</p><p><i><font>U.</font></i><br>
</p><p><i><font>E deve ser atribuída aos Autores (pais do lesado, vítima mortal), a quantia €67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos euros) para indemnização dos danos não patrimoniais sofridos por estes.</font></i><br>
</p><p><i><font>Termos em que,</font></i><br>
</p><p><i><font>Deve o presente Recurso ser considerado provido nos termos enunciados nas conclusões”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Respondeu a ré seguradora concluindo que deverá ser mantida a decisão proferida nos autos, indeferindo-se o recurso interposto pelos autores.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Sendo interposto recurso de revista excecional, pela Formação foi deliberada a admissão.</font><br>
<p><font>No acórdão de admissão foi referido: </font><i><font>“Pese embora as diretrizes da jurisprudência do STJ acima citada em torno da admissibilidade da concorrência entre o risco e a culpa à luz de uma interpretação atualista e conjugada dos artigos 505.° e 570.° do CC, em sintonia com as Diretivas da União Europeia, não se afigura que tais diretrizes se encontrem ainda inteiramente sedimentadas à escala da demais jurisprudência, como parece decorrer da posição assumida pelas instâncias, ao afastar, de forma automática, a aplicação da responsabilidade pelo risco em caso de culpa do lesado”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Considerando como relevante: </font><i><font>“i) - Está em causa um acidente ocorrido entre um veículo automóvel ligeiro e um velocípede, do qual resultou a morte do condutor deste,</font></i><br>
</p><p><i><font>ii) - A factualidade provada não se afigura de molde a tornar, de todo, inviável ou prejudicada a discutibilidade da questão da concorrência entre a culpa atribuída ao condutor do velocípede e o risco próprio do veículo DS, a qual foi suscitada pelos A.A. ao longo da ação;</font></i><br>
</p><p><i><font>iii) - Todavia, as instâncias não equacionaram essa questão por se considerar que o regime consagrado nos artigos 505.°, 506.° e 570.° do CC não admite a concorrência entre a culpa do lesado, tida por exclusiva, e o risco próprio do veículo colidente, com aparente alheamento do entendimento que tem vindo a ser seguido pela jurisprudência do STJ no sentido de que esse regime não afasta, automaticamente, a possibilidade dessa concorrência;</font></i><br>
</p><p><i><font>iv) - Tal questão envolve, segundo a tese dos Recorrentes, no contexto específico do caso, a consideração do condutor do velocípede como utilizador viário vulnerável e a ponderação da adequação causal entre a gravidade do dano sofrido por aquele ciclista e o seu grau de culpa na eclosão do acidente ou o risco próprio do veículo DS, aspetos estes cujos parâmetros não se encontram ainda inteiramente estabilizados ou consolidados na nossa jurisprudência”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Concluindo que se tem </font><i><font>“por verificado o invocado pressuposto da revista excecional previsto na alínea a) do n.° 1 do art.° 672.° do CPC com o alcance alargado a todo o objeto do recurso”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>Cumpre apreciar e decidir.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Temos como mero lapso de escrita a referência nos pontos 12 e 15 da matéria de facto, ao veículo BN quando o veículo segurado na ré é DS “</font><i><font>matrícula ...-DS-...</font></i><font>”.</font><br>
<p><b><font>Nas Instâncias foram julgados como provados</font></b><font> os seguintes factos:</font><br>
</p><p><i><font>“1. No dia … de Março de 2016, cerca das 06h15m, ao Km … da Estrada Nacional 109, na freguesia de …, concelho de …, ocorreu um acidente de viação.</font></i><br>
</p><p><i><font>2.º Nesse dia faleceu DD, filho dos Autores, que são os seus únicos e universais herdeiros, tendo DD falecido no estado de solteiro e sem descendentes (habilitação de herdeiros de fls. 35 a 38)</font></i><br>
</p><p><i><font>3.º No dia referido em 1º, pelas 06h15m, DD conduzia um velocípede sem motor e atravessava o cruzamento da Estrada Nacional (EN) 109, ao Km …, na freguesia de …, concelho de …, vindo da Rua … em direção à Rua da …, ambas perpendiculares à mencionada estrada nacional.</font></i><br>
</p><p><i><font>4.ºÀ mesma hora e local, mas no sentido V…/M… da EN 109, circulava um veículo ligeiro de passageiros de cor preta, marca …, modelo …, matrícula ...-DS-..., conduzido por CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>5.ºOs dois veículos intervenientes efetuavam as suas marchas de forma perpendicular entre si e vieram a colidir fronto/lateralmente, ocorrendo o ponto máximo de impacto (embate) em plena via da direita da EN 109, considerando o sentido de circulação do veículo ligeiro de passageiros.</font></i><br>
</p><p><i><font>6.º Após tal embate, o veículo ligeiro imobilizou-se a 18 metros do ponto de impacto;</font></i><br>
</p><p><i><font>7.º Tendo DD sido projetado sobre a sua zona lateral direita e caído no solo a 6 metros e meio da parte frontal do automóvel, em relação ao ponto em que este se imobilizou.</font></i><br>
</p><p><i><font>8.º O embate dá-se sensivelmente a 1m do lado direito da via, atento o sentido de marcha do DS.</font></i><br>
</p><p><i><font>9.º No local do sinistro, a via caracteriza-se por ser uma reta, com pelo menos 100 metros de comprimento, com sete metros de largura, 3,5m para cada lado, dois sentidos de trânsito e com traço misto (M3 – linha contínua adjacente a linha descontínua) permitindo o atravessamento do cruzamento supra referido;</font></i><br>
</p><p><i><font>10.ºÀ hora em que ocorreu o sinistro – 6h15m -, o dia estava a amanhecer, havia alguma claridade.</font></i><br>
</p><p><i><font>11.º O tráfego era ainda reduzido e não existiam quaisquer obstáculos na via que obstassem à normal circulação rodoviária ou que impedissem a visibilidade e o piso encontrava-se seco.</font></i><br>
</p><p><i><font>12.º DD já tinha atravessado a hemi faixa esquerda, atento o sentido de trânsito do BN e estava a atravessar a hemi-faixa direita, quando foi embatido lateralmente pelo veículo ligeiro:</font></i><br>
</p><p><i><font>13.º O DS vinha a uma velocidade compreendida entre os 50 a 60 Km/h;</font></i><br>
</p><p><i><font>14.º O condutor era o único ocupante do veículo ligeiro de passageiros, é … e nesse dia tinha terminado um turno de seis horas (das 23h45 às 05h45), - sentindo-se um pouco fatigado;</font></i><br>
</p><p><i><font>15.º O condutor do BN não se apercebeu da presença do ciclista, apenas o viu quando embateu nele;</font></i><br>
</p><p><i><font>16.º DD fazia aquele percurso regularmente, para ir tomar o pequeno-almoço à pastelaria “B…”;</font></i><br>
</p><p><i><font>17º A EN 109, no local em causa, era ladeada de habitações e espaços comerciais, situando-se dentro de uma localidade;</font></i><br>
</p><p><i><font>18.º No local do sinistro existe pelo menos um poste de iluminação noturna;</font></i><br>
</p><p><i><font>19.º Na EN 109, no local do sinistro, não existe qualquer tipo de sinalização, seja vertical, seja horizontal, seja semafórica;</font></i><br>
</p><p><i><font>20.º A Rua do …, para quem circule na mesma e pretendia passar a circular no interior da EN 109, tem um sinal de STOP;</font></i><br>
</p><p><i><font>21.º O DS circulava com as luzes na posição de “médios”.</font></i><br>
</p><p><i><font>22.º O condutor do velocípede efetuou o atravessamento da via prioritária sem ter imobilizado, previamente, o mesmo, no sinal de STOP que existe na Rua do … para o trânsito que pretende passar a circular na EN 109.</font></i><br>
</p><p><i><font>23.º O condutor do velocípede trajava indumentária de cor escura, não se encontrando o velocípede provido de dispositivos luminosos ou refletores que permitissem a sua referenciação quando visualizado de frente, traseira ou lateralmente.</font></i><br>
</p><p><i><font>24.º O condutor do velocípede não era portador de capacete.</font></i><br>
</p><p><i><font>25.º Como consequência direta e necessária do embate, DD sofreu as lesões melhor identificadas no relatório de autópsia médico-legal, designadamente lesões traumáticas meningo-encefálicas, torácica abdómino-pélvicas, raqui-meningo-medulares, cervico-dorso-lombares e de ambos os membros inferiores, tendo aquelas resultado na sua morte, ocorrida no dia … de Março de 2016, pelas 06h56, no local do acidente de viação. (fls. 75 a 84)</font></i><br>
</p><p><i><font>26.º O titular do seguro do veículo ligeiro de passageiros, de marca …, modelo Golf, matrícula ...-DS-..., conduzido por CC, havia transferido para a Ré a garantia da responsabilidade civil emergente da circulação do mesmo, através de contrato de seguro automóvel titulado pela apólice com o n. 0045…39 (fls. 131)</font></i><br>
</p><p><i><font>27.º O condutor do veículo segurado da Ré, reside na freguesia de …, conhecia o local do acidente, nomeadamente as características da via, os espaços envolventes e o facto de, naquele cruzamento em específico (o da B…), ser um local com muito tráfego.</font></i><br>
</p><p><i><font>28.º À data do acidente DD tinha cinquenta e cinco (55) anos de idade, tendo nascido do dia … de Maio de 1960. (fls. 38)</font></i><br>
</p><p><i><font>29.º Era um homem cheio de energia e bem disposto, que gostava de estar sempre ativo e vivia com os pais, sendo solteiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>30.º Era conhecido e estimado pelos habitantes da freguesia, habituados a vê-lo circular de bicicleta;</font></i><br>
</p><p><i><font>31.º DD auferia uma pensão mensal por invalidez de €219,95 (duzentos e dezanove euros e noventa e cinco cêntimos) da Segurança Social (fls. 91).</font></i><br>
</p><p><i><font>32.º A morte de DD deixou para os Autores um vazio enorme nas suas vidas e nos seus corações, com desgosto, tristeza, solidão;</font></i><br>
</p><p><i><font>33.º O sinistrado não prestava alimentos a qualquer um dos Autores.</font></i><br>
</p><div><br>
<i><font>*</font></i></div><br>
<br>
<i><font>O tribunal considerou não provados designadamente os seguintes factos:</font></i><br>
<p><i><font>Petição:</font></i><br>
</p><p><i><font>13.º: sobre a visibilidade provou-se o que consta do artigo 10º.</font></i><br>
</p><p><i><font>17.º provado apenas o que consta do facto 12º;</font></i><br>
</p><p><i><font>36.º Provado apenas o que consta do artigo 27º”</font></i><font>.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Conhecendo</font></b><font>:</font><br>
<p><font>São as questões suscitadas pelos recorrentes e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C.</font><br>
</p><p><font>No caso em análise, tendo em conta o decidido pela Formação, questiona-se:</font><br>
</p><p><font>- Concorrência entre a culpa atribuída ao condutor do velocípede e o risco próprio do veículo DS;</font><br>
</p><p><font>- Em função do que for decidido sobre esta questão, a eventual análise e decisão sobre os pedidos formulados na ação.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>Concorrência entre culpa e risco dos intervenientes no acidente</font></b><font>:</font><br>
<p><font>As instâncias entenderam verificar-se culpa exclusiva da vítima (filho dos autores), na ocorrência do acidente.</font><br>
</p><p><font>Importa averiguar se a culpa atribuída à vítima constitui óbice, ou não, à concorrência com o risco próprio do veículo segurado na ré, interveniente no acidente.</font><br>
</p><p><font>Da matéria de facto resulta que o acidente ocorreu num cruzamento de estradas e foram intervenientes, a vítima que seguia num velocípede sem motor e o condutor do veículo ligeiro de passageiros segurado da ré.</font><br>
</p><p><font>O condutor do velocípede atravessava o cruzamento da Estrada Nacional (EN) 109, vindo da Rua do … em direção à Rua da … ambas perpendiculares à mencionada estrada nacional.</font><br>
</p><p><font>O condutor do veículo ligeiro de passageiros de cor preta, segurado da ré circulava na EN 109, no sentido V…/M… .</font><br>
</p><p><font>Os dois veículos intervenientes efetuavam as suas marchas de forma perpendicular entre si e vieram a colidir fronto/lateralmente, ocorrendo o ponto máximo de impacto (embate) em plena via da direita da EN 109, considerando o sentido de circulação do veículo ligeiro de passageiros.</font><br>
</p><p><font>Após tal embate, o veículo ligeiro imobilizou-se a 18 metros do ponto de impacto, </font><br>
</p><p><font>tendo a vítima sido projetada sobre a sua zona lateral direita e caído no solo a 6 metros e meio da parte frontal do automóvel, em relação ao ponto em que este se imobilizou.</font><br>
</p><p><font>O embate dá-se sensivelmente a 1m do lado direito da via, atento o sentido de marcha do ligeiro de passageiros.</font><br>
</p><p><font>No local do sinistro, a via era em reta, com pelo menos 100 metros de comprimento, com sete metros de largura, 3,5m para cada lado, dois sentidos de trânsito e com traço misto (M3 – linha contínua adjacente a linha descontínua) permitindo o atravessamento do cruzamento suprarreferido.</font><br>
</p><p><font>À hora em que ocorreu o sinistro – 6h15m -, o dia estava a amanhecer, havia alguma claridade.</font><br>
</p><p><font>O tráfego era ainda reduzido e não existiam quaisquer obstáculos na via que obstassem à normal circulação rodoviária ou que impedissem a visibilidade e o piso encontrava-se seco.</font><br>
</p><p><font>A vítima já tinha atravessado a hemi faixa esquerda, atento o sentido de trânsito do BN </font><font>(DS entendemos nós) e estava a atravessar a hemi-faixa direita, quando foi embatido lateralmente pelo veículo ligeiro.</font><br>
</p><p><font>O DS vinha a uma velocidade compreendida entre os 50 a 60 Km/h.</font><br>
</p><p><font>O condutor era o único ocupante do veículo ligeiro de passageiros, é guarda-noturno e nesse dia tinha terminado um turno de seis horas (das 23h45 às 05h45), - sentindo-se um pouco fatigado.</font><br>
</p><p><font>O condutor do BN (DS entendemos nós) não se apercebeu da presença do ciclista, apenas o viu quando embateu nele.</font><br>
</p><p><font>A vítima fazia aquele percurso regularmente.</font><br>
</p><p><font>A EN 109, no local em causa, era ladeada de habitações e espaços comerciais, situando-se dentro de uma localidade.</font><br>
</p><p><font>Na EN 109, no local do sinistro, não existe qualquer tipo de sinalização, seja vertical, seja horizontal, seja semafórica.</font><br>
</p><p><font>A Rua do …, para quem circule na mesma e pretendia passar a circular no interior da EN 109, tem um sinal de STOP;</font><br>
</p><p><font>O DS circulava com as luzes na posição de “médios”.</font><br>
</p><p><font>O condutor do velocípede efetuou o atravessamento da via prioritária sem ter imobilizado, previamente, o mesmo, no sinal de STOP que existe na Rua do … para o trânsito que pretende passar a circular na EN 109.</font><br>
</p><p><font>O condutor do velocípede trajava indumentária de cor escura, não se encontrando o velocípede provido de dispositivos luminosos ou refletores que permitissem a sua referenciação quando visualizado de frente, traseira ou lateralmente.</font><br>
</p><p><font>O condutor do velocípede não era portador de capacete.</font><br>
</p><p><font>Na fundamentação jurídica diz o acórdão recorrido: “</font><i><font>Sabendo-se que “o condutor do velocípede efectuou o atravessamento da via prioritária sem ter imobilizado, previamente, o mesmo, no sinal de STOP que existe na Rua do … para o trânsito que pretende passar a circular na EN 109 e que trajava indumentária de cor escura, não se encontrando o velocípede provido de dispositivos luminosos ou refletores que permitissem a sua referenciação quando visualizado de frente, traseira ou lateralmente, não usando capacete” e apurando-se, por outro lado, que o condutor do veículo automóvel respeitava os limites de velocidade existentes no local e que travou o seu automóvel assim se apercebeu do inopinado, imprevisível aparecimento da vítima, teremos que concluir pela absolvição da demandada/seguradora”</font></i><font>.</font><br>
</p><p><font>No entanto esta não é a orientação, numa interpretação atualista (mas já desde há alguns anos) da doutrina e da jurisprudência.</font><br>
</p><p><font>Veja-se o Ac. deste STJ de 04-10-2007, in RLJ ano 137º, nº 3946, pág. 35 e segs., anotado pro Calvão da Silva, com o título “</font><i><font>Concorrência entre risco do veículo e facto do lesado: o virar da página?</font></i><font>”</font><br>
</p><p><font>Nesse acórdão, e no sentido de abandonar a doutrina e jurisprudência tradicionais inspiradas em A. Varela, que considerava que qualquer das circunstâncias referidas no art. 505º, do Cód. Civil excluía a responsabilidade objetiva do detentor do veículo, não se admitindo o concurso do perigo especial do veículo com o facto da vítima, de modo a conduzir a uma repartição da responsabilidade, pois essa orientação tradicional vinha no sentido de a responsabilidade pelo risco ser afastada pelo facto do lesado, escreveu-se: “</font><i><font>O texto do art. 505º, do CC deve ser interpretado no sentido de que nele se acolhe a regra do concurso da culpa do lesado com o risco próprio do veículo, ou seja, que a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo</font></i><font>”. Entendendo-se que a interpretação tradicional do art. 505º do CC uniformizava as ausências de conduta, as condutas não culposas, as pouco culposas e as muito culposas dos lesados, conduzindo, por vezes a “</font><i><font>resultados chocantes</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E que para a mudança de paradigma influenciou o direito comunitário, com o alargamento do âmbito da responsabilidade pelo risco, consagrando expressamente a hipótese de concorrência entre o risco da atividade do agente e um facto culposo do lesado.</font><br>
</p><p><font>Calvão da silva pronunciava-se na RLJ, Ano 134º, a pág. 115 e sobre “</font><i><font>o princípio da concorrência do risco da actividade do agente com a culpa do lesado e a interpretação do art. 505º do Código Civil</font></i><font>”, dizendo: “</font><i><font>no ensino que ministro na cadeira de «Direito das Obrigações», interpreto assim o preceito transcrito</font></i><font> [art. 505º, do CC] :</font><br>
</p><p><i><font>Sem prejuízo do concurso da culpa do lesado, a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.</font></i><br>
</p><p><i><font>Equivale isto a admitir o concurso da culpa da vítima com o risco próprio do veículo, sempre que ambos colaborem na produção do dano, sem quebra ou interrupção do nexo de causalidade entre este e o risco pela conduta da vítima como causa exclusiva do evento lesivo. Afora o caso de o facto do lesado (como o facto de terceiro) ter sido a causa única do dano, a responsabilidade fixada pelo nº 1 do art. 503º não é afastada, admitindo-se que a indemnização seja totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída. </font></i><br>
</p><p><i><font>(…)</font></i><br>
</p><p><i><font>Não faz sentido interpretar a 1ª parte do art. 505º (“sem prejuízo do disposto no art. 570º”) como aplicável «havendo culpas de ambas as partes», pois a responsabilidade fixada pelo nº 1 do art. 503º não assenta na culpa do detentor do veículo e o concurso da conduta culposa do detentor/condutor como um facto culposo do lesado está previsto diretamente no art. 570º</font></i><font>”.</font><br>
</p><p><font>E esta interpretação atualista venceu barreiras e é hoje sustentada na doutrina e jurisprudência</font><br>
</p><p><font>Conforme Ac. deste STJ e desta Secção, de 25-05-2021, proferido no Processo nº 3883/18.4T8FAR.E1.S1, “</font><i><font>A jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça tem admitido que uma interpretação atualista das normas conjugadas dos artigos 505.º e 570.º, n.º 2, ambas do Código Civil, comporta a possibilidade de, em determinados quadros fácticos, se aceitar um concurso entre responsabilidade pelo risco do veículo e culpa do lesado. Esta solução é também imposta pelo princípio de interpretação conforme ao Direito Comunitário, como decorre do Acórdão 2007-10-04 (Processo n.º 07B1710), em cujo sumário se concluiu que «5. O texto do art. 505º do CC deve ser interpretado no sentido de que nele se acolhe a regra do concurso da culpa do lesado com o risco próprio do veículo, ou seja, que a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo. 6. Ao concurso é aplicável o disposto no art. 570º do CC. 7. A este resultado conduz uma interpretação progressista ou actualista do art. 505º, que tenha em conta a unidade do sistema jurídico e as condições do tempo em que tal norma é aplicada, em que a responsabilidade pelo risco é enfocada a uma nova luz, iluminada por novas concepções, de solidariedade e justiça. 8. Ademais, na interpretação do direito nacional, devem ser tidas em conta as soluções decorrentes das directivas comunitárias no domínio do seguro obrigatório automóvel e no direito da responsabilidade civil, já que as jurisdições nacionais estão sujeitas à chamada obrigação de interpretação conforme, devendo interpretar o respectivo direito nacional à luz das dir | [0 0 0 ... 0 0 0] |
eDFXu4YBgYBz1XKvlPdc | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
</p><p><b><font>1</font></b><font>-Os Autores – AA e esposa BB – instauraram (.../.../2018) na Comarca ... ação declarativa, com forma de processo comum, contra o Réu – Banco BIC PORTUGUÊS SA.</font><br>
</p><p><font>Alegaram, em resumo:</font><br>
</p><p><font>Em Abril de 2006, adquiriam ao balcão (agência de ...) do Banco Português de Negócios, BPN (atual Banco BIC) a obrigação SLN Rendimento Mais 2006 no valor de € 50.000,00, tendo-lhes sido garantido pelos funcionários do banco que o capital era garantido 100%, tudo igual a um depósito a prazo, o que motivou a subscrição, tratando-se de pessoas com perfil conservador, e só procederam à subscrição porque estavam convencidos, em face da informação, de que estava assegurado o reembolso do capital e juros, ou seja, tinha a mesma garantia de depósito a prazo.</font><br>
</p><p><font>Nunca os funcionários do banco os informaram sequer em que consistiam obrigações subordinadas, nem lhes foi entregue qualquer contrato. Em consequência da atuação do Réu sofreram preocupação e ansiedade.</font><br>
</p><p><font>Pediram a condenação do Réu:</font><br>
</p><p><font>a) A pagar aos AA. o capital e juros vencidos e garantidos que, nesta data, perfazem a quantia de 57.000,00€, bem como os juros vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento;</font><br>
</p><p><font>Ou assim não se entendendo:</font><br>
</p><p><font>b) Seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado os 50.000,00€ que os AA. entregaram ao R., em obrigações subordinadas SLN 2006;</font><br>
</p><p><font>c) Seja declarado ineficaz em relação aos AA. a aplicação que o R. tenha feito desses montantes;</font><br>
</p><p><font>d) Se condene o R. a restituir aos AA. 57.000,00€ que ainda não receberam dos montantes que entregaram ao R. e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento;</font><br>
</p><p><font>E, sempre,</font><br>
</p><p><font>e) Seja o R. condenado a pagar aos AA. a quantia de €3.000,00, a título de dano não patrimonial.</font><br>
</p><p><b><font>2</font></b><font>-O Réu contestou defendendo-se com a exceção da prescrição e por impugnação. </font><br>
</p><p><b><font>3</font></b><font>- Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar procedente a ação e condenar o Réu a restituir aos Autores a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) de capital acrescido dos juros contratuais vencidos desde 7/5/2015 até à data em que deveria ter ocorrido a restituição do capital contratualmente, bem como no pagamento dos juros vincendos sobre aquele capital, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento e a pagar aos autores a quantia de € 3000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.</font><br>
</p><p><b><font>4</font></b><font>- Inconformado, o Banco recorreu de apelação, que mereceu a seguinte deliberação do Tribunal da Relação:</font><br>
</p><p><font>“</font><i><font>Pelo exposto, decidem:</font></i><br>
</p><p><i><font>1)- Julgar a apelação improcedente e confirmar a sentença. </font></i><br>
</p><p><i><font>2)- Condenar o Apelante nas custas</font></i><font>”.</font><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<b><font>5</font></b><font>-Continuando inconformado, agora com o decidido pela Relação, o réu interpõe </font><b><font>recurso de Revista</font></b><font> para este STJ e formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><font>(As conclusões 1 a 8 respeitam à admissibilidade do recurso de revista excecional)</font><br>
</p><p><i><font>“9) A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer senso desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação... A este propósito, de resto, e quase esvaziando tudo o que pudéssemos alegar, é eloquente o parecer adiante junto do PROF. PINTO MONTEIRO, onde se chega a esta mesma conclusão!</font></i><br>
</p><p><i><font>10) A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!</font></i><br>
</p><p><i><font>11) Veja-se a este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt!</font></i><br>
</p><p><i><font>12) Vale isto por dizer que, ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá firmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!</font></i><br>
</p><p><i><font>13) insistimos no facto de esta menção, ainda que interpretada por um “leigo” apenas deveria permitir concluir pela segurança atribuída ao instrumento financeiro em causa! E não a qualquer tipo de garantia absoluta de cumprimento da entidade emitente.</font></i><br>
</p><p><i><font>14) A apresentação de características de um produto financeiro meramente descritivas, com indicação de prazo, remuneração, garantia de capital, liquidez por endosso não parece constituir de qualquer forma uma forma de manifestação de uma vontade de vinculação por parte de quem as anuncia!</font></i><br>
</p><p><i><font>15) E o certo é que as Obrigações eram então, como são ainda de uma forma geral, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, e em abono desta sociedade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu - mais, de ser a sua sociedade totalmente dominante!</font></i><br>
</p><p><i><font>16) Tanto mais que o risco de um DP no Banco seria, então, semelhante a uma tal subscrição de Obrigações SLN, porque sendo a SLN dona do Banco a 100%, o risco da SLN estava indexado ao risco do próprio Banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>17) Ao entender esta expressão como tendo valor negocial, o tribunal a quo violou o disposto no art.º 236 º do Código Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>De resto,</font></i><br>
</p><p><i><font>18) O dever de informação quanto aos “riscos do tipo de instrumento financeiro” surge perfeitamente densificado quanto ao seu cumprimento, não deixando o legislador uma cláusula aberta que permita margem para dúvida quanto ao alcance do seu dever.</font></i><br>
</p><p><i><font>19) De facto, se é verdade que a informação tem que ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita (art. 7º CdVM), não é menos verdade que o cumprimento desse dever de transmissão da informação não se compadece com qualquer conceptologia idílica e de delimitação difusa quanto ao seu inadimplemento.</font></i><br>
</p><p><i><font>20) E desde logo, não se compadece com ideias simplistas como as de mera reprodução de prospectos dos produtos, principalmente antes da transposição da chamada DMIF, em que a complexidade técnica da documentação de cada instrumento financeiro era enorme.</font></i><br>
</p><p><i><font>21) A adequação da informação começa exactamente por afastar o cumprimento meramente formal do dito dever de informação, antes visando uma efectiva informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>22) O CdVM estabelece objectiva e precisamente qual a informação que tem de ser prestada quanto a cada um dos contratos de intermediação financeira e até – em alguns casos –, quanto aos instrumentos financeiros objecto dessa intermediação.</font></i><br>
</p><p><i><font>23) E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea e) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”. Ora, tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução. E a verdade é que tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si (como, aliás, na redacção aplicável ao caso).</font></i><br>
</p><p><i><font>24) Neste sentido apontam não só o elemento histórico decorrente da redacção anterior da lei, como também o elemento sistemático já abordado, como até o seu próprio elemento literal.</font></i><br>
</p><p><i><font>25) Mas, o que é certo é que, o legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do tipo do instrumento financeiro em causa.</font></i><br>
</p><p><i><font>26) Assim é que nas quatro alíneas do nº 2 do art. 312º-E obriga a que a descrição dos riscos do tipo do instrumento em causa incluam:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento;</font></i><br>
</p><p><i><font>b) A volatilidade do preço do instrumento financeiro e as eventuais limitações existentes no mercado em que o mesmo é negociado;</font></i><br>
</p><p><i><font>c) O facto de o investidor poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de aquisição do mesmo;</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Quaisquer requisitos em matéria de margens ou obrigações análogas, aplicáveis aos instrumentos financeiros desse tipo.</font></i><br>
</p><p><i><font>27)São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação!</font></i><br>
</p><p><i><font>28) A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>29) O investimento em Obrigações, não é sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade.</font></i><br>
</p><p><i><font>30) Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso!</font></i><br>
</p><p><i><font>31) Recordemos que qualquer contrato, seja qual for a sua natureza, apenas um de dois destinos: o cumprimento ou incumprimento! Ou seja, é de uma ingenuidade atroz pensar-se que alguém toma a prestação de qualquer contrato como certa, e não apenas como mais ou menos segura!</font></i><br>
</p><p><i><font>32) Por isso, a informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ SE tais riscos de facto existirem!</font></i><br>
</p><p><i><font>33) Não se pode confundir a advertência sobre o risco de perda do investimento com a análise de qualquer qualidade e robustez (ou falta dela) do emitente do título!</font></i><br>
</p><p><i><font>34) Não cometeu o R. qualquer acto ilícito!</font></i><br>
</p><p><i><font>35) A decisão recorrida violou por errónea interpretação ou aplicação o disposto no art.º 312 do CdVM (na redacção aplicável), e os art.ºs 74 e 75 do RGCISF.</font></i><br>
</p><p><i><font>Termos em que se conclui pela procedência do presente recurso, e por via dele, pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que absolva o Réu do pedido”.</font></i><br>
</p><p><b><font>6</font></b><font>-</font><b><font>Foram apresentadas contra-alegações</font></b><font> pelos autores, nas quais concluem</font><i><font>:</font></i><br>
</p><p><font>(As conclusões 1 a 15 respeitam à inadmissibilidade do recurso de revista excecional)</font><br>
</p><p><i><font>“B) Do recurso da matéria de direito:</font></i><br>
</p><p><i><font>i. Da responsabilidade civil do Banco Réu:</font></i><br>
</p><p><i><font>16- A aplicação do direito aos factos, efetuada na douta sentença recorrida é intocável, não merecendo qualquer reparo, a qual corroboramos na íntegra.</font></i><br>
</p><p><i><font>17- O BPN, na sua relação com os Autores, intervinha como instituição de crédito e como intermediário financeiro, por conta da SLN, apesar de estes não o saberem.</font></i><br>
</p><p><i><font>18- Como instituição de crédito, estava sujeito às regras de conduta que o RGICSF – em vigor na altura da subscrição das obrigações, nomeadamente os artigos (art.73º e 74º do RGICSF), e ainda o critério de diligência previsto no artigo 76.º, segundo o qual devia atuar nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição dos riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos investidores.</font></i><br>
</p><p><i><font>19- Por sua vez, enquanto intermediário financeiro (cf. arts. 289º, nº1, al. a) e 290º, nº1, al. c), do Código dos Valores Mobiliários) encontrava-se vinculado às normas que estabelecem regras próprias quanto aos deveres dos intermediários financeiros (cf. arts. 304º a 342º, do CVM).</font></i><br>
</p><p><i><font>20- O CVM (desde a sua redação originária conferida pelo DL 486/99, de 13.11), aplicável ao caso dos autos, continha (e contém) várias normas de proteção ao investidor, impondo ao intermediário financeiro uma multiplicidade de deveres visando permitir ao cliente formar um juízo esclarecido acerca da adequação do investimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>21- Se o dever de informação era menos densificado na versão inicial do Código, isso não pode significar que nesse tempo não houvesse dever de informação, desde logo porque, mesmo na falta de previsão específica, se haveria de ponderar o dever civil de boa-fé nas negociações do contrato.</font></i><br>
</p><p><i><font>22- Também não podemos aceitar que na versão posterior se densificaram os deveres de informação e que isso significa que o artigo 7º e o artigo 312º foram remetidos a índice, não tendo autonomia própria nem servindo de outra coisa senão dum índice, dos deveres esses sim definidos na densificação, não o podemos aceitar enquanto daí se pretende retirar a consequência que o primitivo preceito nenhum valor vinculativo tinha.</font></i><br>
</p><p><i><font>23- A obrigação de informação está inscrita no artigo 312º do CVM e, o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada.</font></i><br>
</p><p><i><font>24- Sendo certo que, o critério em função do qual se afere o cumprimento dos deveres que recaem sobre o intermediário financeiro há-de ser o seguinte: quanto menor o conhecimento e experiência do cliente em relação ao objeto do seu investimento maior será a sua necessidade de informação, contrariando assim de modo evidente, a decisão do pleito.</font></i><br>
</p><p><i><font>25- E é indiscutível que a qualidade da informação deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, conforme ressalta do guião diretivo imposto pelo artigo 7º do CVM.</font></i><br>
</p><p><i><font>26- De acordo com a disciplina consagrada no artigo 304º do Código dos Valores Mobiliários os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado e nesse relacionamento devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.</font></i><br>
</p><p><i><font>27- A responsabilidade do intermediário financeiro, no caso do Banco Réu decorre, desde logo, do disposto no artigo 314.º do CVM.</font></i><br>
</p><p><i><font>28- Com efeito, a responsabilidade do intermediário financeiro a que alude o art.º 314º do CVM, apresenta-se desde logo como uma responsabilidade contratual, cujos pressupostos estão definidos pelo art.º 798º do CC, sendo a causa de tal responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos, e presume-se nos termos do artigo 799º do CC.</font></i><br>
</p><p><i><font>29- O Banco Réu tem um dever de diligência ativa, no sentido de se inteirar, atenta a experiência e conhecimentos do cliente, da razoabilidade e adequação da aplicação financeira.</font></i><br>
</p><p><i><font>30- Ora, do acervo dos factos dados como provado, resulta que, o A. marido não possuía qualificação, ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, e ainda que tinha um perfil conservador, ou seja, estava habituado a aplicar as suas poupanças em depósitos a prazo, pelo que não tinha experiência no funcionamento do mercado de valores mobiliários.</font></i><br>
</p><p><i><font>31- Assim sendo, no caso de o cliente não ser um investidor institucional ou experiente, como é o caso dos autos, carece objetivamente de particular proteção, nomeadamente, em termos de informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>32- Sendo certo que, essa informação deve cobrir os aspetos técnicos necessários, de forma clara e apreensível pelo cliente em causa, para produzir o efeito útil a que se destina.</font></i><br>
</p><p><i><font>33- Não obstante, o gerente do Banco Réu desconsiderando o perfil do A. marido, ainda assim, aconselhou-o, a investir e aplicar as suas poupanças em Obrigações SLN 2006, informando-o [erroneamente] e assegurando que a aplicação em causa era equivalente a um depósito a prazo, com capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.</font></i><br>
</p><p><i><font>34- Daí que, e em face das referidas informações [inexatas], tenha o A. marido, prima facie confiante, dado autorização para aplicação de fundos seus no valor de 50.000,00€ numa obrigação SLN 2006, convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente Banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>35- É que, e em rigor, não sabendo sequer os Autores em concreto o que era a SLN, acabaram por seguir a sugestão do gerente do Banco, subscrevendo as obrigações SLN 2006, e aceitando como boa a informação do referido gerente no sentido de que o risco era mínimo, tratando-se de produto idêntico a um depósito a prazo.</font></i><br>
</p><p><i><font>36- Portanto, a informação prestada no sentido de que era uma aplicação equivalente a um depósito a prazo quando em verdade não o era, assume tanto maior gravidade quanto se sabe que o funcionário em causa sabia que os Autores não fariam aplicações que não tivessem capital garantido e que não pudessem ser resgatadas em qualquer altura – ou seja, no sentido de que a informação prestada foi afinal determinante da vontade contratual dos Autores.</font></i><br>
</p><p><i><font>37- Sendo certo que, esta referenciação ao DP não é, evidentemente, inocente, uma vez que se trata de um produto muito divulgado, de todos conhecido, e sobretudo, reconhecido pela sua segurança, sobre ele recaindo invariavelmente conforme o réu sabia, a preferência dos Autores.</font></i><br>
</p><p><i><font>38- Repare-se que, os depósitos a prazo, desde há muitos anos e pelo menos até ao início da crise de 2006, constituíram reduto de investimento de clientes não propensos ao risco ou iletrados, pelo que o depósito a prazo, o seu regime, a sua solidez são a pedra de toque da segurança e da ausência de risco: por isso, a apelativa comparação feita pelo Réu.</font></i><br>
</p><p><i><font>39- Acresce que, o facto de ter sido dito ao A. marido que o capital estava garantido pelo BPN (informação inverdadeira), veio dar ainda mais confiança e segurança para aplicar o seu dinheiro, pois o BPN é uma entidade bancária de todos conhecida no mercado financeiro e com credibilidade, na qual o A. marido confiavam plenamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>40- Portanto, os Autores estavam convictos de estar a contratar com o Banco e a subscrever produto desse mesmo Banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>41- Pelo que, a saliência exagerada da comparação a um depósito a prazo (quanto ao risco de investimento), e a garantia do capital pelo próprio BPN, ofuscou tudo o resto, não tendo os Autores a verdadeira perceção das consequências adversas que potencialmente estavam contidas na operação em causa, o que permite imputar ao Banco Réu a violação dos deveres que sobre si impendiam, mormente deveres de informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>42- Resulta claramente da matéria de facto provada, que a comunicação contratual efetuada não foi completa nem é integralmente verídica, estando igualmente patenteado que foram subtraídos elementos informativos que não permitiram que o cliente compreendesse os riscos essenciais envolvidos na operação financeira realizada.</font></i><br>
</p><p><i><font>43- Sendo certo que, tal só ocorreu por força das instruções recebidas das chefias e da estrutura comercial, no desenvolvimento das operações de financiamento promovidas pela SLN, de tal forma que os funcionários bancários receberam instruções no sentido de que deveriam passar «por cima» das questões relativas ao negócio obrigacionista e foram instruídos para enfatizar e evidenciar as características atrativas.</font></i><br>
</p><p><i><font>44- Em suma, e sem margem para quaisquer dúvidas, porque a factualidade assente fala por si, é inquestionável que in casu o intermediário financeiro/Banco violou o dever de informação, não elucidando convenientemente [antes prestando informação incorreta, para não dizer enganadora e ardilosa] o A. marido sobre as características do produto financeiro que lhes era proposto/sugerido.</font></i><br>
</p><p><i><font>45- Mesmo que assim não se entenda, o que não se concebe nem concede, sempre se dirá que a declaração de que o Banco Réu é o garante da aplicação financeira, sobretudo quando os Autores nem sequer sabiam o que era a SLN, só pode ser compreendido, pelo declaratário normal, como uma efetiva garantia de pagamento e que este lhes seria restituído a 100% pelo BPN (art.236º, nº1 do CC).</font></i><br>
</p><p><i><font>46- Temos, pois, que no caso dos autos, o banco Réu assumiu perante os Autores aquando da aquisição do produto financeiro (2006), o compromisso da garantia do capital que havia sido investido.</font></i><br>
</p><p><i><font>47- Trata-se, neste caso, de um compromisso contratual em que o banco réu assume perante os Autores o pagamento do capital investido na aludida aquisição dos ativos financeiros e nessa medida verifica-se uma situação de responsabilidade contratual que o banco réu não pode deixar de assumir e com as consequências decorrentes do art. 798 do C. Civil.</font></i><br>
</p><p><i><font>48- Donde e relativamente à responsabilidade pelo reembolso do capital investido na aplicação financeira em causa do banco réu, na qualidade de intermediário financeiro, a mesma só existe, no caso em apreço, porque o banco réu assumiu, segundo o que vem provado, proceder ao pagamento do valor nominal dos títulos em causa, o que consubstancia um compromisso contratual, ao qual não pode fugir, como acima já se referiu.</font></i><br>
</p><p><i><font>49- No caso dos autos, o banco réu, na qualidade de intermediário financeiro em que aqui operou, não podia deixar de pautar o seu comportamento contratual em nome do relacionamento de confiança existente entre si e os Autores pelo princípio da boa-fé (cfr. art. 762º nº2 do C. Civil).</font></i><br>
</p><p><i><font>50- A apelante incumpriu em toda a linha o dever de informação que sobre si recaia, omitindo informação relevante e prestando informação incorreta, determinando o A. marido à subscrição de um produto que não conhecia, não tendo sido esclarecido quanto às suas características, antes lhes tendo sido descrito enganadoramente como um produto com capital garantido, como equivalente a um depósito a prazo, mas com uma remuneração mais vantajosa, pelo que o A. marido atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura, com risco exclusivamente do Banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>51- Também não podemos olvidar, que no caso dos autos o funcionário do Banco Réu não explicou aos Autores que se tratavam de «obrigações subordinadas», e consequentemente, que a este produto financeiro está associado um risco não comum mas sim anormal (ou especial), na medida em que o investimento subjacente, em caso de insolvência ou liquidação da entidade emitente, apenas seria reembolsado após a satisfação dos créditos dos demais credores por dívida não subordinada (com exceção dos acionistas), como resulta do disposto na al. c) do art.48º do CIRE (DL nº53/2004), de 18 de Março).</font></i><br>
</p><p><i><font>52- Esta informação não é inócua, antes pelo contrário, é relevante e determinante, uma vez que coloca os investidores (neste caso os Autores), numa posição bem mais desvantajosa do que os simples depósitos a prazo, mas que lhes foi claramente ocultada.</font></i><br>
</p><p><i><font>53- Por outro lado, o facto de não ser previsível, à época, o colapso do sistema financeiro, não justifica o facto de o Banco Réu ter omitido aos Autores o risco de insolvência da SLN, e a possibilidade de nunca mais virem a reaver o dinheiro investido, pois as obrigações do intermediário financeiro acima referidas e designadamente a obrigação de informação, já estão consagradas na lei desde data muito anterior ao início da mencionada crise.</font></i><br>
</p><p><i><font>54- Outrossim, ainda que, à data, pudesse não ser previsível que viesse a ocorrer insolvência da sociedade emitente (risco especial), a Ré tinha a obrigação de alertar os Autores para o risco (geral) da insolvência da emitente, sobretudo face à posição extremamente desfavorável atribuída aos credores obrigacionistas em tal situação.</font></i><br>
</p><p><i><font>55- Também, não se pode esquecer o prazo de 10 anos, prazo extremamente longo, pelo que, em tão dilatado período de tempo, nunca ninguém poderia afirmar que no final o capital estava garantido, e por isso mesmo, a insolvência sempre seria de se admitir e considerar (mais uma vez o banco réu prestou informação falsa).</font></i><br>
</p><p><i><font>56- E, não se pode dizer que não havia exemplo de insolvências de bancos (o que não é correto, pois já havia ocorrido com a C..., no ano de 1986), quando a SLN nem sequer era o banco, mas sim uma empresa ou uma holding de empresas de vários ramos de negócio, com todos os riscos que isso envolve, designadamente de contágio entre elas.</font></i><br>
</p><p><i><font>57- A própria Nota Informativa do produto (junta com a contestação), prevê expressamente no ponto 1 “Advertência aos investidores”, decorrendo de forma irrefutável que haviam duas características cruciais a serem advertidas aos clientes: a primeira prende-se com a possibilidade de insolvência da sociedade emitente, ou seja, que a SLN só lhes restituiria o capital no final do prazo de 10 anos se chegado esse tempo futuro ela tivesse disponibilidade financeira para proceder à restituição, e a segunda, diz respeito à subordinação dessas obrigações, pois nestas condições, o reembolso do capital, só seria pago depois de satisfeitos os credores que não tivessem créditos subordinados.</font></i><br>
</p><p><i><font>58- Em face do referido, não se pode aceitar que se diga que a advertência aos investidores relativa ao risco de insolvência não era informação exigível ao banco Réu, uma vez que à data nada fazia prever o que se veio a concretizar, isto é, a insolvência da SLN.</font></i><br>
</p><p><i><font>59- Não foi isso que entendeu a própria SLN e o Banco de Portugal, aliás, ambos entenderam diferente, daí constar da Nota Informativa como advertência a ser dada e explicada aos investidores.</font></i><br>
</p><p><i><font>60- No caso dos autos, o Banco Réu não provou ter fornecido cópia da Nota Informativa aos Autores, e muito menos provou ter-lhes dado as explicações que dela constam (ónus que lhe incumbia).</font></i><br>
</p><p><i><font>61- O facto de não ter provado que entregou aos Autores qualquer Nota Informativa sobre o emitente das Obrigações, integra a violação dos deveres consignados nos artigos 312º-C e 312º-F, ambos do Código dos Valores Mobiliários, especialmente no que tange a falta de documentação da informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>62- Estamos, aqui no domínio da responsabilidade contratual feita em nome do relacionamento anterior de clientela existente entre os Autores e o Banco Réu e nessa perspetiva o banco réu tem de assumir contratualmente o reembolso do capital investido (cfr. art. 798 e segs. do C. Civil).</font></i><br>
</p><p><i><font>63- Efetivamente, tendo o Banco Réu avançado para a aquisição do produto financeiro aqui em causa sem observar os deveres de informação junto dos Autores, a que estava obrigado na qualidade de intermediário financeiro em que interveio, torna-se responsável pelos prejuízos causados aos Autores, nos termos do art. 314 nº1 do CVM, sendo certo também que não se mostra ilidida a presunção a que alude o nº2 do citado art. 314 que impendia sobre o banco Réu.</font></i><br>
</p><p><i><font>64- Dizer-se que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, quando, na verdade, não tem, não pode ser visto como artifício ou sugestão admissível, tanto mais que a obrigação de informação é essencial e resulta da lei (arts. 253.º, n.º 2, e 485.º, n.º 2, do CC).</font></i><br>
</p><p><i><font>65- O A. marido só aceitou negociar com o Banco Réu, porque lhe foi comunicado que tinham uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo próprio BPN.</font></i><br>
</p><p><i><font>66- Ou seja, o A. marido atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, por isso, num produto com risco exclusivamente banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>67- O réu sabia que prestava informação errada ao A. marido – dizendo-lhe que garantia o capital e os juros – e sabia que essa errada informação era determinante, como foi, da declaração de vontade emitida.</font></i><br>
</p><p><i><font>68- Ora, por força do art. 800º do C.C. (ou, para quem considere que em causa não está responsabilidade contratual, mas sim extracontratual, por força do art. 500º do C.C.), o BPN responde pelos atos dos seus funcionários.</font></i><br>
</p><p><i><font>69- A situação dos autos pode ser igualmente enquadrada na modalidade de responsabilidade pré-contratual ou culpa in contrahendo (art. 227.º do CC), porque nos preliminares do contrato o Banco informou o A. marido que estava garantido o retorno do capital.</font></i><br>
</p><p><i><font>70- A apresentação do produto como produto seguro, como do próprio do banco constitui violação do dever de informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>71- Afirmar que o produto é produto seguro, como do próprio banco é o mesmo que afirmar que é o próprio banco que reembolsará o cliente do capital investido.</font></i><br>
</p><p><i><font>72- Que não é um produto de risco.</font></i><br>
</p><p><i><font>73- Relevante é que, ao dizer que o produto era produto seguro, do próprio do banco, os Autores não foram colocados perante a hipótese de investir as suas poupanças em produto que não era próprio do BPN.</font></i><br>
</p><p><i><font>74- Por força do art. 314º nº 2 do C.V.M. - redação original, presume-se a culpa do intermediário financeiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>75- Porque o dano sofrido pelos Autores, decorreu da prestação de informação falsa e a falsidade da informação é uma forma de violação do dever de prestar informações por ação, presume-se a culpa do Banco Réu, nos termos previstos no nº 2, do artigo 304º-A do Código dos Valores Mobiliários.</font></i><br>
</p><p><i><font>76- Assim, a omissão de tal informação foi causal da segurança dos Autores em subscrever as Obrigações SLN 2006, fazendo que as subscrevessem, e agora sofram os Autores um dano por não lhes ser reembolsado o dinheiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>77- O comportamento do banco réu foi decisivo e causal na produção dos danos, pois o que motivou a autorização, por parte do A. marido, foi o facto de lhe ter sido dito pelo gerente que | [0 0 0 ... 0 1 0] |
ITJyu4YBgYBz1XKvbgpy | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><div><font>1</font></div><br>
<b><font>Processo </font></b><font>nº 231/19.0T8OVR.P1-A.S2 do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo Local Cível de Ovar.</font><div><font>*</font></div><font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<b><font>1</font></b><font>-Do acórdão da Relação que julgou improcedente o recurso de apelação foi interposto recurso de revista pela interessada AA, no qual conclui:</font><br>
<i><font>A)O acórdão recorrido viola a lei substantiva, fazendo ainda uma errada aplicação do direito, padecendo ainda de nulidades, nomeadamente, as descritas no art. 615 do CPC. </font></i><br>
<i><font>B)A sentença proferida em 1ª instância limita-se a um controlo meramente formal da legalidade dos atos praticados no processo, sem exercer um real e efetivo controlo da atividade do Notário ao longo do processo, pelo que, efetivamente, não há lugar ao conhecimento das questões substantivas e, até mesmo processuais, desencadeadas pelas partes. </font></i><br>
<i><font>C)Neste sentido, jamais se poderá permitir considerar que o douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto possa ter confirmado uma decisão, em que não se conheceu da matéria colocada em causa, ex-novo, junto desse mesmo Venerando Tribunal. Pelo que, é admissível o recurso de revista ora interposto, uma vez que não há uma" dupla conforme". </font></i><br>
<i><font>Posto isto, </font></i><br>
<i><font>D)Entende-se ser questão de particular relevância jurídica, a apreciação da invocada violação do princípio da intangibilidade da legítima, embora o acórdão recorrido conclua existir caso julgado. É certo que, a aqui recorrente nunca se conformou com o despacho determinativo da partilha e respetivo mapa de partilha. </font></i><br>
<i><font>E)Ora, o artigo 48 do RJPI tem sido objeto de apreciação, doutrinal e jurisprudencial, atenta a controversa que suscita, conforme resultam mormente do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no âmbito do processo 245/17.4YRCBR, datado de 21-11-2017 e disponível para consulta </font></i><a><i><u><font>www.dgsi.pt/jtrc</font></u></i></a><i><font>, aliás a que faz referencia o acórdão recorrido. </font></i><br>
<i><font>F) No caso concreto, houve violação de tal principio, atento o facto de dois dos três irmãos interessados, terem eles próprios, determinado, sem o consentimento expresso pela terceira irmã, (aqui recorrente), quais os bens que compunham os quinhões hereditários deles próprios. </font></i><br>
<i><font>G)Impõe-se que tal questão mereça douta decisão a proferir por este Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de modo a permitir uniformização de jurisprudência pondo fim a tal controvérsia, que, aliás, à luz das novas regras processuais, constantes da Lei n.º 117/2019 de 13/09, (entrará em vigor no próximo dia 01 de Janeiro de 2020), deixará de existir, atenta a expressa imposição da unanimidade de interessados. </font></i><br>
<i><font>H)Pela mera consulta dos autos, constata-se haver manifesta concordância e conjugação de esforços e de posições entre dois, dos três irmãos, e em sentido dissonante destes, a posição da aqui recorrente. </font></i><br>
<i><font>I)Tratando-se de uma sucessão legitimária, constitui a forma de imposição da maioria dos dois terços, uma violação do princípio da intangibilidade qualitativa da legítima, plasmado no art. 2163, ex vi art. 2157, ambos do Código Civil. </font></i><br>
<i><font>J)Está, pois, em causa, conhecer se, efetivamente, os co-herdeiros. por maioria de dois terços podem impor, aos outros, uma vontade que a lei definida pelo Código Civil proíbe ao testador. </font></i><br>
<i><font>K)A doutrina e Jurisprudência têm vindo a decidir, no sentido de obstar a que, os co-herdeiros que representem dois terços da herança possam designar os bens que integram a legítima do herdeiro legitimário, contra a sua vontade, sob pena de, tal, desvirtuar os interesses inerentes a uma justa e correta partilha de bens entre os diversos os interessados. </font></i><br>
<i><font>L)No caso dos autos, há a violação desse princípio da intangibilidade, na medida em que, contra a vontade da recorrente, os seus dois irmãos, e co-herdeiros, elegeram os bens que compunham os respetivos quinhões, e por consequência, aqueles que compunham o quinhão que caberia á recorrente, e que constituiria a sua legítima, o que não é consentido pelo disposto no art. 2163 do C.C., que proíbe que, contra a vontade do herdeiro, este se veja na contingência de herdar apenas o que a maioria determina. </font></i><br>
<i><font>M)Ora, o douto Acórdão recorrido, entende que esta questão não se levanta nestes autos de inventário, considerando existir caso julgado. </font></i><br>
<i><font>N)O destino a dar á quase totalidade dos bens a partilhar foi determinado pela maioria de dois terços, em deliberação conjunta dos seus dois irmãos, como que, impuseram à recorrente, a sua vontade. </font></i><br>
<i><font>O)Da referida ata não resulta qualquer manifestação de vontade por parte da recorrente, nem nada se diz na dita ata sobre qual seja a posição desta. </font></i><br>
<i><font>P)É manifesto que a "maioria de dois terços" gera desigualdades entre os interessados, suscitando situações de manifesta imposição de vontades por parte de herdeiros a outros, por contraposição com o Código Civil, que proíbe tal manifestação de vontade ao testador, autor da herança. </font></i><br>
<i><font>Q)E este é o entendimento do legislador, quando em 13 de Setembro último, procede à publicação da Lei n.º 117/2019, que procede à revogação do RJPI e aprova o regime do inventário notarial, com a expressa alteração do artigo 48º, onde revoga o requisito da maioria de dois terços, passando a substitui-lo pela unanimidade. </font></i><br>
<i><font>R)Ou seja, veio o legislador mediante a alteração do teor do citado art. 48 do RJPI, fazer coincidir a lei do processo com a lei substantiva no que se refere ao dito princípio da intangibilidade da legítima, repondo a obrigatoriedade da unanimidade das deliberações na composição dos quinhões, reafirmando a posição de igualdade entre todos os herdeiros. </font></i><br>
<i><font>S)Assim, e apesar da Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro, apenas entrar em vigor em 01 de Janeiro de 2020, o espírito do legislador não pode ser entendido como pretendendo que uma lei adjetiva se sobreponha à lei substantiva do Código Civil, pelo que, a douta sentença proferida que homologou a partilha, efetivamente, viola a lei substantiva, uma vez que homologa uma partilha que se encontra em violação do principio da intangibilidade da legitima, porquanto, efetuada, no essencial, com base na vontade imposta pelos dois irmãos da recorrente, e contra a vontade desta. </font></i><br>
<i><font>T)Impõe-se questionar, se a lei se satisfaz com a mera conformação tácita da herdeira prejudicada com a partilha, ou se determina expressa manifestação de vontade de todos os interessados nesta. </font></i><br>
<i><font>U)Ao não ter sido obtida a expressa posição do interessado quanto à proposta de partilha apresentada pelos demais dois terços dos interessados a sentença que homologa a partilha viola a lei substantiva. </font></i><br>
<i><font>V)O acórdão recorrido encontra-se ferido de erro, quanto aos factos que invoca para a final defender tal transito em julgado, porquanto, o despacho determinativo da partilha apenas ocorreu em 17 de Dezembro de 2018, ou seja, cerca de um ano após a realização da conferência preparatória, sendo certo que o mesmo não foi notificado aos interessados sob registo. Ou seja, nem sequer é possível aos autos conhecer em que data tal notificação foi conhecida da aqui recorrente. </font></i><br>
<i><font>W)Por outro lado, a aqui recorrente, endereçou ao processo um requerimento, datado de 31 de Dezembro de 2018, mediante o qual, a mesma, refere proceder a "reclamação", invocando questões de Direito que pretendia ver apreciadas, colocando, consequentemente, em causa, o despacho determinativo da partilha. </font></i><br>
<i><font>X)Face a tal manifestação de oposição por parte da recorrente àquele despacho determinativo da partilha não se concebe defensável o juízo efetuado no douto acórdão recorrido, que conclui ter transitado em julgado o despacho determinativo de partilha, </font></i><br>
<i><font>Y)Consequentemente, não se admite haver caso julgado. Pelo que, deveria o tribunal recorrido, pronunciar-se sobre a questão da violação do princípio da intangibilidade da legítima, o que não ocorreu, em manifesta violação da lei substantiva, mais concretamente, violando o disposto no art. 2163 do CC, postergando a mesma. </font></i><br>
<i><font>POR OUTRO LADO, </font></i><br>
<i><font>Z)O acórdão recorrido quanto à questão colocada da imposição da compropriedade, em violação do disposto no art. 58 do RJPI, seguindo a mesma linha de raciocínio, concluiu que a interessada, aqui recorrente, ter-se-á conformado com a adjudicação em compropriedade, no caso da verba sete, porquanto não recorreu do despacho determinativo da partilha. Ora, impõe-se apreciar tal decisão, sob dois pontos de análise; </font></i><br>
<i><font>AA) O primeiro ponto de análise, é aquele, aliás, já invocado supra, em particular, o facto invocado da apresentação de uma " reclamação" por parte da recorrente, no qual, para além do mais, expressamente, põe em causa a adjudicação da verba numero sete. Não se conformando, pois, com tal despacho. E, consequentemente, deveria sobre tal reclamação ter sido tomada uma de duas decisões; </font></i><br>
<i><font>BB) Ou se considerava que tal reclamação era, em concreto, a interposição de recurso, e consequentemente, impunha-se a notificação para a nomeação de Advogado, ou, caberia á Sr.ª Notaria. esclarecer que de tal despacho determinativo de partilha, não cabia a reclamação apresentada, convidando a parte a corrigir o formalismo. Ora nada disso aconteceu! </font></i><br>
<i><font>CC) Independentemente das circunstâncias concretas em que tal procedimento deveria ter seguido, jamais, se poderá concluir, nos termos em que o douto acórdão o faz, ou seja, efetuando uma apreciação meramente formalista da questão, e bastando-se com uma mera conclusão no sentido de não ter havido recurso do despacho determinativo da partilha. </font></i><br>
<i><font>DD) Um segundo ponto de análise entende-se dever ocorrer, quanto á análise que é feita pelo acórdão recorrido no que concerne á sucessão de atas e decisões praticados pelas partes, quanto ao destino da verba numero sete. </font></i><br>
<i><font>EE) O destino dado à verba sete não foi nenhum daquele previamente acordado, pelo que a recorrente foi surpreendida com a adjudicação de um imóvel que não manifestou interesse em ficar e por um valor que a mesma não concorda. </font></i><br>
<i><font>FF) Além do que, pretende-se impor à recorrente a adjudicação em compropriedade, na proporção de 71/100 de tal verba sete, pelo valor da avaliação, quando inexistiu propostas de terceiros seu pelo valor correspondente a 85% do valor da avaliação </font></i><br>
<i><font>GG) Determina o art. 58 do RJPI, quais as regras que devem ser observadas no preenchimento dos quinhões, quer através da licitação, quer através de sorteio, prescrevendo a sua alínea c) que os bens restantes, ( ... ) são repartidos á sorte entre os interessados, por lotes iguais. </font></i><br>
<i><font>HH) A adjudicação da verba sete nos termos em que ocorre contradiz o plasmado no art. 58, n.º 1, alínea c), pois, a mesma, ocorre sem o consentimento da interessada, e contra a respetiva vontade, até porque não aceita manter-se na indivisão do bem em causa. </font></i><br>
<i><font>II) Não pode o mapa da partilha adjudicar um direito, nem impor uma comunhão, que a recorrente não aceita, direito que lhe assiste, e previsto no art. 1412 do CC. </font></i><br>
<i><font>JJ) Este é o entendimento, plasmado no Acórdão do STJ, proferido no âmbito do processo n.º 2862/08.4TBMTS.P1.S1, datado de 17/05/2016, e disponível para consulta </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font> .. esclarecendo que: ( ... )Só será legítimo partilhar bens por via da adjudicação em comum de verbas aos interessados, no processo de composição de quinhões, desde que ocorra acordo dos interessados, com expressa manifestação de vontade nesse sentido, sob pena de se aceitar, por iniciativa do juiz, uma imposição de compropriedade que contraria a finalidade do processo de inventário e o regime do art. 1412 do c. c. A compropriedade é uma propriedade em comum na qual os comproprietários detêm, relativamente à coisa de que são contitulares, direitos de propriedade qualitativamente iguais, a qual se adquire por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei. Não prevendo a lei que a propriedade possa ser constituída por declaração do juiz, não pode este - na falta de acordo dos interessados - compor quinhões hereditários adjudicando em comum bens indivisíveis”. </font></i><br>
<i><font>KK) Aliás, se aquela verba sete fosse sorteada entre os co-herdeiros, não haveria lugar a aplicação de qualquer outra modalidade de composição de quinhões. </font></i><br>
<i><font>LL) É manifesta a violação da lei processual, procedendo-se a uma errada aplicação desta, em específico o prescrito no art. 58 n.º 1 alínea c) do RJPI, quando à necessidade de aceitação expressa por parte da recorrente de uma compropriedade. Violando-se ainda a lei substantiva no seu art. 1412 do cc. </font></i><br>
<i><font>ACRESCE QUE, </font></i><br>
<i><font>MM) O acórdão recorrido enferma de um erro de interpretação e aplicação da lei, quando entende que não há nulidade de falta de notificação aos interessados da obrigatoriedade de constituição de Advogado, por parte da Sra. Notaria; </font></i><br>
<i><font>NN)Refere aquele acórdão recorrido que: ... "Com efeito, a Exma. Sra. Notaria não tinha qualquer dever legal genérico de informar os interessados da obrigatoriedade de constituir advogado, dado que, nos termos da lei, as partes têm a liberdade de constituir ou não advogado." </font></i><br>
<i><font>OO)É entendimento da recorrente que o Acórdão proferido pela Relação do Porto, incorre em manifesta violação da lei substantiva, por erro de interpretação, ao não considerar que os requerimentos apresentados pela aqui recorrente não discutiam questões de Direito, e por incorreta aplicação do art. 40 do CPC, de onde decorre a obrigatoriedade da constituição de Advogado, em conjugação com o determinado no art. 13 do RJPI, particularmente o respetivo nº 1 que, é obrigatória a constituição de Advogado no inventário, se forem suscitadas, ou discutidas, questões de Direito. </font></i><br>
<i><font>E AINDA, </font></i><br>
<i><font>PP) Refere ainda o acórdão recorrido que improcedem as nulidades arguidas pela recorrente ao longo de todo o decurso do processo de inventário, porque nenhuma consubstancia uma nulidade prevista nos art.s 186, 187 e arts. 193 n.º 1 e 194 do CPC, pelo que só após reclamação do interessado poderia a Sra. Notaria conhecer de tal vicio, e proferir despacho, sendo que só após o Tribunal poderia apreciar da legalidade e validade de tal despacho. </font></i><br>
<i><font>QQ)Atento o facto de a aqui recorrente ter por diversas vezes apresentado requerimentos por si manuscritos, em que coloca em causa as decisões tomadas no processo de inventário, só após a constituição de advogado, se veio a mesma a perceber das respetivas nulidades! </font></i><br>
<i><font>RR) Sendo certo que, tais nulidades apenas poderiam ser arguidas aquando da interposição de recurso, de acordo com o estabelecido no art. 76 do RJPI, pois nessa data apenas permite a lei processual o recurso de Apelação, face à existência de uma sentença judicial que homologou a partilha! </font></i><br>
<i><font>SS)Assim, o acórdão recorrido vai contra o estabelecido naquele preceito legal, (art. 76 do RJPI), em manifesta violação da lei processual, não conhecendo ainda das nulidades processuais arguidas na Apelação, em manifesta violação dos arts. 615 do CPC, </font></i><br>
<i><font>TT) Por outro lado, o Acórdão recorrido omite pronúncia sobre o inequívoco incumprimento das regras de processo, estabelecidas na Portaria n.º 278/2013, de 5 de Março, na sua versão atualizada pela Portaria n.º 46/2015 de 23 de Fevereiro. </font></i><br>
<i><font>UU) Resulta da análise criteriosa do processo de inventário, através do sistema informático, o não cumprimento dessas regras processuais, mais concretamente o cumprimento do estabelecido no art. 12. Não se podendo aferir com certeza e fiabilidade o cumprimento integral de tais normas processuais. Não existindo garantias de cumprimento, não poderemos concluir pela ausência de nulidades, nomeadamente, as previstas no art. 615 do CPC, E cujo conhecimento se impetra. </font></i><br>
<i><font>VV) Entende a aqui recorrente que o Acórdão recorrido deveria ter analisado a Apelação interposta pela aqui recorrente, ponderando as questões de Direito por esta invocadas, apreciando-as e concluindo pela procedência de tais questões, pois só desse modo de poderia proceder a uma melhor aplicação do Direito, conforme com as normas substantivas estabelecidas no nosso ordenamento jurídico. </font></i><br>
<i><font>WW) Considerando que tais questões invocadas pela aqui recorrente são questões de particular relevância jurídica, e a sua ponderação teria de ser forçosamente diferente, concluindo-se que a defesa dos seus interesses foi manifestamente preterida ao longo de todo o processo de inventário, postergando-se a lei substantiva, ou fazendo-se uma errada aplicação desta, quer ao nível da lei substantiva, quer ao nível da lei processual. </font></i><br>
<i><font>Nestes termos e nos melhores de Direito aplicáveis deve o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que conheça de mérito das questões aqui invocadas, assim se dando provimento ao presente recurso</font></i><font>.</font><br>
<b><font>2</font></b><font>- Contra-alegaram os interessados BB e CC, concluindo: “</font><i><font>Deve ser verificada a existência de dupla conforme, assim como a ausência de motivo para a revista excecional, sendo proferido despacho de não admissão do recurso nos termos do disposto nos artigos 641 nº 2 al. a) e 677 do CPC e, tal não sucedendo, deve improceder o recurso, mantendo-se o decidido no douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto</font></i><font>”.</font><br>
<b><font>3</font></b><font>-Sobre o requerimento e alegações de recurso de revista foi proferido, pelo relator, despacho reclamado, o qual foi revogado pela conferência e, admitido o recurso.</font><br>
<b><font>4</font></b><font>- Em causa a adjudicação à recorrente, e sem o seu acordo, da verba nº 7, em compropriedade e pelo valor da avaliação, quando não se conseguiu qualquer terceiro interessado pelo valor reduzido a 85%.</font><br>
<b><font>5</font></b><font>- Historiando a cronologia processual e factos relevantes:</font><br>
<font>- No dia 24 de abril de 2017, o requerente BB apresentou presencialmente no Cartório Notarial da Dr.ª DD, em …, requerimento de Inventário por partilha dos bens da herança aberta por óbito de EE e de FF.</font><br>
<font>- Em 7.02.2019, foi proferido pela Mª Juíza do Juízo Local Cível de Ovar do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, sentença homologatória da partilha.</font><br>
<font>- Não se conformou a interessada AA, e interpôs recurso de apelação, sendo deliberado pelo Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso, ao qual negam provimento e, em consequência, é mantida a sentença recorrida.</font><br>
<font>Porém, no caso vertente verifica-se que:</font><br>
<font>-Em 3-12-2018 a Srª Notária despachou no sentido de que, tendo ficado frustrada a venda por negociação particular (da verba nº 7), se deveria proceder à adjudicação em compropriedade aos interessados cujos quinhões não se encontram ainda preenchidos, na proporção mais próxima da metade;</font><br>
<font>-Em 17-12-2018 a Srª Notária proferiu o despacho determinativo da partilha, e foi elaborado o respetivo mapa;</font><br>
<font>- A interessada ora recorrente reclamou por não ter sido dado cumprimento ao despacho de 3-12-2018 (proporção da divisão do bem na proporção mais próxima da metade;</font><br>
<font>-A fls 68 há um despacho/notificação de 3-01-2019, proferido pela Srª Notária referindo que se alterou a proporção para ser dado cumprimento ao art. 58 nº 1 do RGPI;</font><br>
<font>-A fls. 72, com data de 28-01-2019, a ora recorrente em requerimento dirigido à Srª Notária vem impugnar o mapa da partilha, sendo proferido pela Srª Notária o despacho de fls. 72v. e 73, com data de 31-01-2019, em que mantém o teor do mapa da partilha;</font><br>
<font>-Não foi repetida a conferência de interessados face à não adjudicação daquela verba nº 7 por meio de proposta em carta fechada e frustração da venda por negociação particular;</font><br>
<font>- Nem foi remetido ao Tribunal de 1ª Instância a impugnação da ora recorrente ao mapa da partilha;</font><br>
<font>-A fls. 76 e com data de 1-02-2019 encontra-se um mapa da partilha reformulado;</font><br>
<font>-Em 4-02-2019 a Srª Notária considera findo o processo de inventário nos termos do art. 66 nº 1 do RGPI remete o processo ao Sr. Juiz da 1ª Instância (para decisão homologatória da partilha);</font><br>
<font>-A partilha foi homologada por decisão de 7-02-2019;</font><br>
<font>-A notificação da sentença homologatória foi repetida (por correio sob registo), em 14-03-2019.</font><br>
<font>- Com data de 31-01-2019 a Srª Notária manda notificar os interessados de que mantinha o teor do mapa da partilha e a decisão homologatória da partilha foi proferida em 07-02-2019.</font><br>
<font>- De onde tem de entender-se que o despacho determinativo da partilha (e respetivo mapa) só foi fixado pela Srª Notária em 31-01-2019.</font><div><font>*</font></div><font>O recurso foi admitido em conferência.</font><br>
<font>Foram dispensados os vistos.</font><div><font>*</font></div><b><font>Cumpre conhecer</font></b><font>:</font><br>
<font>Deveria a ora recorrente ter impugnado o despacho determinativo da forma à partilha, o que não fez, limitando-se a reclamar, perante a srª Notária, “contra o mapa, ao abrigo do disposto no art. 63 -1 do RJPI”, fls. 67, apresentar “reclamação contra o mapa por não observância do despacho que determinou a partilha”, fls. 69, e impugnar o mapa da partilha, fls. 72 (que foi reformulado com data de 1-02-2019 e consta de fls. 76).</font><br>
<font>Estando em causa o despacho determinativo da forma à partilha dos bens que constituíam a herança, era necessário impugnar esse despacho da srª Notária, perante o juiz do Juízo Local Competente, para que essa questão pudesse ser apreciada em recurso de apelação que, eventualmente, viesse a ser interposto da sentença de homologação dessa partilha.</font><br>
<font>Apenas se pode apelar dos despachos do sr. Juiz, ou seja, a Relação só conhecerá das decisões interlocutórias do Notário (indiretamente), se houverem sido impugnadas para o tribunal da 1ª instância, territorialmente competente, e aqui decididas.</font><br>
<font>Refere o Ac. da Rel. de Lx. de 6-12-2018, proferido no proc. nº 71/16.8T8PTS.L1 que, </font><br>
<font>“I- Uma sentença que homologa a partilha não tem de ser objeto direto de recurso – até porque raramente haverá matéria para o efeito -, podendo sê-lo só indireta ou reflexamente, pondo em causa outras decisões que, se anuladas, implicarão, por arrastamento, a anulação daquela.</font><br>
<font>III-Uma decisão do notário torna-se definitiva quando foi objeto de reclamação ou recurso (se bem ou mal admitido não interessa) e foi confirmada ou quando não foi objeto de reclamação nem de recurso no momento oportuno”. </font><br>
<font>E refere o Ac. do STJ de 28-06-2018, proferido no proc. nº 4175/12.8TBVFR.P1.S1 que, “a não impugnação direta e oportuna de qualquer decisão intercalar antecedente da sentença homologatória da partilha obstava a que a apelação que a visasse impugnar pudesse ter por objeto também aquelas decisões”.</font><div><i><font>*</font></i></div><font>Estamos perante um processo de inventário regulamentado pela Lei n.º 23/2013, de 05 de Março - REGIME JURÍDICO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO- (RJPI).</font><br>
<font>Dispunha o art. 3 n.º 7 do RJPI, então em vigor, que “Compete ao tribunal da comarca do cartório notarial onde o processo foi apresentado praticar os atos que, nos termos da presente lei, sejam da competência do juiz”.</font><br>
<font>Nos termos do art. 66, com a epígrafe “Decisão homologatória da partilha”, consta do seu nº 3: “Da decisão homologatória da partilha cabe recurso de apelação, nos termos do Código de Processo Civil, para o Tribunal da Relação territorialmente competente, com efeito meramente devolutivo”.</font><br>
<font>Por outro lado, consta do nº 4 do art. 57, com a epígrafe “Despacho sobre a forma da partilha”, “Do despacho determinativo da forma da partilha é admissível impugnação para o tribunal da 1.ª instância competente, no prazo de 30 dias, a qual sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo”.</font><br>
<font>E acrescenta o art. 76 referente ao “Regime dos recursos” que:</font><br>
<font>“1- Da decisão homologatória da partilha cabe recurso, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o regime de recursos previsto no Código de Processo Civil.</font><br>
<font>2 - Salvo nos casos em que cabe recurso de apelação nos termos do Código de Processo Civil, as decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da decisão de partilha”.</font><br>
<font>Assim, deve entender-se que, do despacho determinativo da forma da partilha apenas é admissível impugnação para o tribunal da 1.ª instância competente, não sendo admissível recurso de apelação, porque se trata de decisão interlocutória que subirá com o recurso a ser interposto da decisão de partilha.</font><br>
<font>E também assim era no domínio da lei anterior, pois que, de acordo com o nº 3 do art. 1373 do CPC, o despacho determinativo da partilha só podia ser impugnado na apelação interposta da sentença da partilha.</font><br>
<font>Também assim o entendeu o Ac. da Rel. Co. de 12-01-2016, no Proc. nº 482/05.4TBAGN.P1, “O despacho determinativo da forma à partilha só pode ser impugnado na apelação interposta da sentença homologatória da partilha, recurso este que abrangerá todos os despachos posteriores ao determinativo da forma à partilha, desde que com eles conexionados”.</font><br>
<font>Também se deve entender que a impugnação do despacho determinativo da forma da partilha para o tribunal da 1.ª instância competente é pressuposto para a análise da questão (preenchimento dos quinhões dos interessados), pela Relação em recurso de apelação.</font><br>
<font>Mas, refere o art. 57 do RJPI que “4 - Do despacho determinativo da forma da partilha é admissível impugnação para o tribunal da 1.ª instância competente, </font><u><font>no prazo de 30 dias</font></u><font>, a qual sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo” (sublinhado nosso).</font><br>
<font>Assim, deveria ter esperado, o Cartório Notarial, o decurso do prazo de 30 dias antes de remeter o processo ao Sr. Juiz, com indicação de processo findo e, para decisão homologatória, prazo durante o qual poderia ser impugnado pelos interessados o despacho determinativo da partilha.</font><br>
<font>Não tendo sido dada oportunidade aos interessados de impugnarem perante o Tribunal da 1ª Instância o despacho determinativo da partilha, sendo entretanto proferida sentença homologatória, temos como adequada a impugnação pela via do recurso de apelação interposto da sentença homologatória.</font><br>
<font>E não se verificava caso julgado.</font><br>
<font>É o que resulta do nº 2 do art. 76 do RGPI, se o despacho determinativo da partilha não pôde ser impugnado antes, poderá sê-lo no recurso interposto da decisão homologatória da partilha “- Salvo nos casos em que cabe recurso de apelação nos termos do Código de Processo Civil, as decisões interlocutórias proferidas no âmbito dos mesmos processos devem ser impugnadas no recurso que vier a ser interposto da decisão de partilha”. </font><br>
<font>Assim, só por confusão de datas se pode entender que o Tribunal recorrido tenha entendido que se verificava caso julgado, ao referir: </font><br>
<font>“</font><i><font>Em suma, há caso julgado.</font></i><br>
<i><font>Tendo-se a interessada (ora recorrente) conformado com o despacho que determinou a composição do seu quinhão (e a dos restantes interessados), não recorrendo para o Mº Juiz da Comarca, a que propósito poderia agora este Tribunal pronunciar-se sobre tal questão?</font></i><br>
<i><font>O mesmo se verifica quanto ao facto de a verba sete ter ficado em compropriedade, solução que a ora recorrente aceito e que agora vem impugnar.</font></i><br>
<i><font>Com o devido respeito, temos alguma dificuldade em compreender a posição assumida pela ora recorrente nesta matéria</font></i><font>”.</font><br>
<font>E, para assim concluir, refere o Ac. recorrido: </font><i><font>“Releva particularmente o facto de a interessada (ora recorrente) não ter interposto recurso do despacho determinativo da partilha.</font></i><br>
<i><font>Isto porque, tal despacho destina-se, para além do mais, a repartir os bens do acervo hereditário pelos herdeiros, determinando quais os bens que preenchem os respetivos quinhões.</font></i><br>
<i><font>A interessada (ora recorrente), se não concordava com os bens que integraram o seu quinhão, poderia e deveria ter recorrido para o Mº Juiz da Comarca, do despacho que definitivamente determinou quais os bens que integravam o seu quinhão.</font></i><font> </font><br>
<i><font>Não o tendo feito, a consequência é a definitividade da decisão, como expressamente decorre do disposto no n.º 1 do artigo 17 do RJPI que, sob a epígrafe “Questões definitivamente resolvidas no inventário</font></i><font>”.</font><br>
<font>Mas do Ac. recorrido também consta: “Em 31.01.2019, a Exmª Senhora Notária proferiu o seguinte despacho: «Face à reclamação apresentada pela interessada AA, cumpre responder e decidir: (…) Face ao exposto, mantenha-se o teor do mapa de partilha.</font><br>
<font>Notifique-se»”.</font><br>
<font>Não concordando com os bens que integraram o seu quinhão, a interessada deveria ter impugnado, perante o Mº Juiz da Comarca, o despacho da Srª Notária que, definitivamente determinou quais os bens que integravam o seu quinhão. Mas não pôde porque não lhe foi dada oportunidade dado que os autos foram, de imediato, remetidos ao juiz do Juízo Local competente para homologação da partilha e não aguardaram o prazo de 30 dias como determinava o nº 4 do art. 57 do RJPI -“Do despacho determinativo da forma da partilha é admissível impugnação para o tribunal da 1.ª instância competente, no prazo de 30 dias, a qual sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo”.</font><br>
<font>-É que, com data de 31-01-2019 a Srª Notária manda notificar os interessados de que mantinha o teor do mapa da partilha e, a decisão homologatória da partilha foi proferida em 07-02-2019.</font><br>
<font>Assim, a decisão que determinou a forma à partilha ainda não se tinha tornado definitiva por não ter decorrido ainda o prazo, de eventual, impugnação, no momento em que o juiz é chamado a proferir decisão homologatória da partilha.</font><br>
<font>Não havendo decisão definitiva de determinação da forma à partilha, a decisão existente (que poderia ser impugnada) não formou caso julgado.</font><br>
<font>Assim, concluímos que não se verifica caso julgado, na vertente de autoridade do caso julgado.</font><br>
<font>Pelo que, deveria o Tribunal da Relação ter-se pronunciado sobre a questão suscitada no recurso, o que não fez.</font><br>
<font>Lê-se no sumário do Ac. recorrido: “II. Tem-se suscitado a questão de saber se esta mudança de paradigma [de unanimidade para dois terços] é ou não suscetível de pôr em causa o princípio da intangibilidade da legítima.</font><br>
<font>III. No entanto, a questão não se coloca nestes autos, considerando que todos os interessados, incluindo a recorrente, foram notificados do despacho determinativo da partilha.</font><br>
<font>IV. Isto porque, tal despacho destina-se, para além do mais, a repartir os bens do acervo hereditário pelos herdeiros, determinando quais os bens que preenchem os respetivos quinhões.</font><br>
<font>V. Se a interessada (ora recorrente), não concordava com os bens que integraram o seu quinhão, poderia e deveria ter recorrido para o Mº Juiz da Comarca, do despacho que definitivamente determinou | [0 0 0 ... 0 0 0] |
IzJyu4YBgYBz1XKvcQpH | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font><br>
<br>
<font>Proc. nº. 154/17.7T8VRL.G1.S2</font><br>
<font>Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real - Juízo Central Cível de Vila Real – Juiz 1</font><br>
<br>
<font>***</font><br>
<br>
<font>Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.</font><br>
<font>- </font><b><font>AA</font></b><font> e mulher BB, residentes em ..., freguesia de ..., concelho de ..., instauram ação declarativa comum contra: </font><br>
<font>- CC e mulher DD, casados no regime da comunhão de adquiridos, moradores em …, freguesia e concelho do ...; </font><br>
<font>- EE, solteira, moradora na Rua …., ..., e </font><br>
<font>- FF, solteira, moradora nos …, ..., concelho de ...; </font><br>
<b><font>Pedindo</font></b><font> que se declare: </font><br>
<font>A) Que eles, Autores, são proprietários dos prédios rústicos descritos no 1º item, alíneas A) e B) da petição inicial; </font><br>
<font>B) Que tais prédios, constituindo duas unidades agrícolas, embora não se mostrem todos encravados, pois tanto o …, como o conjunto dos seis que integram a unidade descrita em …. dispõem de acesso próprio - o primeiro, ao caminho público que liga … ao …, e o segundo, ao caminho de consortes que, vindo da estrada camarária de …, confronta diretamente com ele, na estrema sul do inscrito na matriz sob o artigo …, e nas estremas sul e poente dos inscritos sob os artigos … e … – não têm qualquer forma de comunicação entre si, estando separados pela faixa de terreno localizada na estrema poente do prédio dos Réus, inscrito na matriz sob o artigo …; </font><br>
<font>C) Que os referidos prédios dos Autores não dispõem de outro meio, através de terceiros, que seja mais curto, mais cómodo e o que menos dano causará aos Réus, de acederem uns aos outros, designadamente do … ao …, e vice-versa, senão através da faixa de terreno descrita no 3º item, localizada na estrema poente do prédio dos Réus, inscrito na matriz sob o artigo …; </font><br>
<font>D) Que os referidos prédios dos Autores se encontram em situação que lhes permite requerer que seja decretada por ali a constituição de uma servidão de passagem a pé e de carro, com a largura de 3 m e comprimento de 30 m a favor dos prédios referidos no 1º item, condenando-se os Réus a reconhecê-lo, e a manterem a referida faixa sempre livre e desembaraçada de pessoas e bens, de modo a permitir, por ali, livremente, o trânsito a pé e de carro, num e noutro sentido, dos prédios descritos em 1.B, através da estrema norte do …., como forma de acederem ao … e deste até àqueles. </font><br>
<b><font>Alegam para o efeito</font></b><font> que são proprietários das duas unidades agrícolas que identificam, tendo ambas acesso direto a vias públicas, mas que não existe acesso direto entre essas suas duas unidades agrícolas que permita aceder de uma à outra; que tal acesso de uma unidade agrícola à outra pode ser feito de forma mais cómoda e mais curta através de uma faixa de terreno de um prédio dos réus que identificam; pelo que requerem a constituição de uma servidão de passagem a onerar esse prédio dos Réus. </font><br>
<font>Regularmente citados, </font><b><font>apenas o primeiro Réu contestou</font></b><font>, arguindo a exceção de caso julgado, e alegando que não se verificam os requisitos para a constituição de uma servidão de passagem a onerar o seu prédio, não dando consentimento para o efeito, pelo que conclui pela improcedência da ação, a julgar já no despacho saneador. </font><br>
<font>A exceção de caso julgado foi oportunamente decidida, tendo sido julgada improcedente.</font><br>
<font>Os autos prosseguiram os seus termos, vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a </font><b><font>prolação de sentença que, julgando a ação parcialmente procedente</font></b><font>: </font><br>
<font>a) Declarou que os Autores são proprietários dos prédios rústicos descritos no 1º item, alíneas A) e B) da petição inicial. </font><br>
<font>b) Declarou que tais prédios, constituindo duas unidades agrícolas, embora não se mostrem todos encravados, pois tanto o …, como o conjunto dos seis que integram a unidade descrita em … dispõem de acesso próprio - o primeiro, ao caminho público que liga ... ao ..., e o segundo, ao caminho de consortes que, vindo da estrada camarária de ..., confronta diretamente com ele, na estrema sul do inscrito na matriz sob o art. …, e nas estremas sul e poente dos inscritos sob os artigos … e … – não têm qualquer forma de comunicação entre si, estando separados pela faixa de terreno localizada na estrema poente do prédio dos Réus, inscrito na matriz sob o artigo …. </font><br>
<font>c) Declarou que os referidos prédios dos Autores não dispõem de outro meio, através de terceiros, que seja mais curto e mais cómodo, de acederem uns aos outros, designadamente do ... ao ..., e vice-versa, senão através da faixa de terreno descrita no 3º item, localizada na estrema poente do prédio dos Réus, inscrito na matriz sob o artigo ….. </font><br>
<font>d) Julgou improcedente o pedido formulado sob a alínea D) do petitório dos Autores, no sentido de que assiste aos Autores o direito de verem constituída uma servidão de passagem, a onerar o prédio dos Réus, com as legais consequências, dele absolvendo os Réus. </font><br>
<b><font>Inconformados, interpuseram os Autores</font></b><font> recurso de apelação, sendo decidido, pelo Tribunal da Relação, julgar improcedente o recurso, confirmando e mantendo a decisão impugnada.</font><br>
<font>*</font><br>
<font>De novo inconformados, </font><b><font>vêm os autores apresentar recurso de revista</font></b><font>, concluindo as alegações de recurso, nos seguintes termos:</font><br>
<font> </font><i><font>IV </font></i><b><i><font>– DAS ALEGAÇÕES REVIDENDAS</font></i></b><br>
<i><font>1ª O acesso pedonal e carral desde o ... ao ... e vice versa, ambos propriedade dos AA, pela extremidade poente do dos RR, inscrito na matriz sob o art…., propriedade dos RR - que é enorme, mas acaba ali, cf. docs juntos aos autos - em nada os afeta ou prejudica, não apenas pela exiguidade da respetiva área, 3mx30m, mas também por ter sido sempre inculta e em terra batida, sendo utilizado pelos AA e ante possuidores para os mesmos fins, pelo menos desde 1999 até outubro de 2015, ainda que o fizessem com licença dos pais dos Rdos, como decidido em ação anterior a esta, cf. sentença junta aos autos</font></i><br>
<i><font>2ª Os Rects nunca quiseram submeter ao contraditório os factos assentes nas als A), B), E), F), tendo o valor que têm e não outro, como parece ter-lhes sido inculcado na douta sentença, tanto mais que foram ab initio alegados nos itens 4º, 5º, 6º, 7º; 9º; 11º e 12º, todos da p.i. - não como integradores essenciais da causa de pedir e do pedido, mas como histórico dos antecedentes desta ação, o que, aliás, explica que os AA não hajam instado nenhuma das testemunhas por si arroladas sobre nenhum desses factos.</font></i><br>
<i><font>4ª A al. G), onde se exarou, com a relevância jurídica que se lhe inculca na economia da sentença, que “o trânsito apeado e carral se processa “com normalidade” pelo caminho de ..., inclusive com veículos ligeiros” haverá de ter-se por não escrita, ou, então, redigida com menção de factos concretos que objetivem a sua menção conclusiva, tendo em conta o teor do relatório de VNJQ, fotos e docs não impugnados pelo Rdo que neutralizam, claramente, a força de tal expressão, motivo porque não pode manter-se ali incólume a transcrição acrítica e sem qualquer fundamento, claro e objetivo, das vagas afirmações levadas pelo Rdo ao art. 8º da contestação, sobretudo quando as mesmas se mostram desmentidas pelas respostas dadas naquele relatório aos factos alegados pelo Rdo nos itens de 16º a 22º daquele articulado.</font></i><br>
<i><font>5ª Tal redação foi tida pela Mma Juiz como confirmada por “uma” testemunha que não identificou - uma de duas, todavia, das que depuseram em Juízo sobre tal questão -GG e HH - a quem a Mma Juiz concedeu, a esses, sim, incompreensível credibilidade, como se referiu na apelação e se vê da transcrição escrita dos seus depoimentos gravados - ainda por cima, omitindo-se na sentença factos reais e concretos que justificassem o uso da expressão “com normalidade” alegada pelo Rdo no art. 8º da contestação, transcrita acriticamente e sem qualquer fundamento, para aquela al. G dos factos provados, que deverá ser anulada ou retificada nos termos atrás sugeridos.</font></i><br>
<i><font>6ª Juízo aquele que, além de não passar de um mero conceito de direito, sendo, por isso, conclusivo, podendo tal caminho servir, quando muito, para o trânsito normal de carros de bois, que já não existem, ou para tratores potentes, mas não já para um veículo ligeiro ou mesmo pesado que não disponham de tração 4x4, e, menos, ainda, para o transporte seguro do pessoal, máquinas, alfaias, adubos, uvas, azeitona, e quejandos, atentos os “constrangimentos” a que se reporta o relatório “pericial” e fotos ali juntas.</font></i><br>
<i><font>7ª Não podia ter-se o caminho de ... como perfeitamente transitável, com normalidade, e, até para veículos ligeiros, quando a Mma Juiz nunca foi nem quis ir ao local, para compreender ou imaginar o penoso sacrifício por que tem passado o A. desde que se viu obrigado a ir por ali com a carrinha cheia de uvas, umas vezes, e com azeitona, outras, a derrapar perigosamente, tanto no verão como no inverno, sobretudo em determinados troços onde o declive das suas encostas é mais acentuado, só conseguindo rebocá-la até ao ponto mais alto com o auxílio de um trator mais potente que o seu, sem o que teria de descarregar no solo e levar tudo às costas até à estrada, como já lhe sucedeu.</font></i><br>
<i><font>8ª Na referida expressão, omitiu-se, ainda, a natureza e extensão das unidades agrícolas cujos donos, alegadamente, transitem pelo caminho de ... “com normalidade e, até com veículos ligeiros” bem como os concretos meios de acesso utilizados, formas de cultivo e colheita dos eventuais produtos, bem como onde vivem tais proprietários, para fazermos uma mínima ideia - do confronto com a situação concreta dos Rects - das distâncias que percorrem desde ... até aos supostos prédios, quanto tempo perdem no trajeto de ida e volta, para que o Tribunal pudesse decidir com algum critério, pois não podem comparar-se factos, grandezas e situações incomparáveis.</font></i><br>
<i><font>9ª Se o Rdo não era obrigado a referir tais elementos, não é menos correto afirmar que a Mma Juiz não podia transcrever para a matéria de facto assente uma expressão tão genérica nos termos em que aquele a referiu no art. 8º da contestação, minime quando a mesma se mostra de todo descaraterizada por falta de factos que justifiquem o uso de tal expressão, e, sobretudo, pela força que assumem, nesse contexto, tanto o relatório de VNJQ como as fotos e demais documentos que o ilustram.</font></i><br>
<i><font>10ª O Rdo não reclamou do relatório nem impugnou nenhum dos documentos que o integram, do que nem 1ª nem a 2ª instâncias colheram as implícitas consequências, sobretudo o Tribunal da Relação que não se terá apercebido também de que a Mma Juiz determinara a realização de uma VNJQ para averiguação dos factos alegados pelo Rdo nos itens de 16º-22º da Cont. - o que foi cumprido com todo o rigor pela Exma Perita -para, inexpectavelmente, ao final do contraditório, por despacho na Ata de 24.10.18, ref.ª ..., ter dispensado a inspeção judicial requerida pelas partes “...tendo em conta o Relatório da Verificação não Judicial Qualificada... considerando-a desnecessária”.</font></i><br>
<i><font>11ª Decisão que levou os Rects a intuir que o Tribunal não precisaria de mais provas para considerar o caminho de ... excessivamente incómodo e dispendioso, enquanto pretensa alternativa de acesso à estrada pública, convicção legitimada pela força de que se revestem os factos já assentes no saneador, os descritos no relatório e demais documentos de VNJQ, porquanto, sujeitos ao contraditório e podendo, por isso, ter sido objeto de impugnação, reclamação e até de recurso, não o foram.</font></i><br>
<i><font>12ª Estava vedado ao Tribunal emitir juízos em sentido contrário ao daqueles factos, por não estarem abrangidos pelas restrições das als c) e d) do art. 568º e do 574º-2, sob pena de incorrer, em violação desses normativos e na dos arts 607º-5, 608º-2 e 615º-1, do que tudo sai reforçada a ilação de que, apesar de o ... confinar em parte com o caminho de ..., a comunicação através dele com a estrada que liga essa povoação ao ..., revela-se insuficiente, - na aceção jurídica e com a amplitude que o atual intérprete do 1550º-2 do CC terá de inculcar-lhe - face aos constrangimentos do trajeto, à perda de mais de 2 horas de trabalho em viagens num e noutro sentido, ao desnivelamento e natureza do solo arenoso, à intensidade e dureza dos trabalhos agrícolas e ao uso diário de máquinas, veículos e alfaias, como provado nas als “C”e “D” da matéria assente.</font></i><br>
<i><font>13º Aliás, esse caminho por ... implica sacrifícios de que a douta sentença não se faz eco, ao ter como não excessivo incómodo e dispendioso o percurso alternativo por ali, tal revelando não terem sido levados em conta o teor integral do relatório e demais documentação junta aos autos, nem tão pouco o depoimento do Autor e das testemunhas, que mais não poderiam ter dito para o demonstrarem. (Cf. p.f, a título de exemplo, o do A., min.22:42 ao 23:54, o da testemunha II, min. 04:36 ao 04:53 e o de JJ- min.12:19 ao 12:27. “A gente para se mudar de baixo para cima com o trator, a carrinha tem de descarregar o trator em cima, em ..., porque a carrinha não vai a baixo carregada com o trator e subir para cima também não sobe.”</font></i><br>
<i><font>14ª Mas se a Mma Juiz, porventura, sentisse quaisquer dúvidas acerca desses factos e/ou da interpretação e rigor das respostas que ali abrangeram as questões suscitadas pelos RR nos arts de 16º a 22º, ou sobre a força dos documentos que as ilustravam, mais natural, mais justo e mais assertivo seria, proceder à requerida inspeção judicial, prova por excelência, em que seria posta em contacto direto e imediato com a realidade.</font></i><br>
<i><font>15ª O que se preteriu sem suporte legal, pois trata-se de um poder/dever vinculado à lei, e não meramente discricionário, que só poderá deixar de exercer-se se a diligência fosse tida por desnecessária ou inútil para a descoberta da verdade, caso em que Mma Juiz deveria ter fundamentado tal decisão em termos claros e muito precisos, para que dela pudessem as partes recorrer, se fosse caso disso. O que, efetivamente, sucederia se os fundamentos a invocar não se pautassem por razões lógicas e científicas que levassem o Tribunal a discordar das respostas documentadas no relatório (Cf., i.o, Ac.STJ de 19.4.1995,CJ, ano III,T 11,págs. 43 e 44; A. dos Reis, in CPC An. IV, Coimbra Ed.,1981, pág.05 e A. Varela, in Manual de Proc. Civ. 1984, Coimbra Ed., pág 585)</font></i><br>
<i><font>16ª Resta, nessa parte, sublinhar que se a Mma Juiz tivesse efetuado a requerida inspeção judicial, não só poderia manter como também reforçar a convicção que, pelos vistos, já formara antes, vendo-se os AA, por isso, confrontados com uma decisão-surpresa, que, de todo, não era espectável, pois caso a tivesse feito, não só teria evitado incorrer, como incorreu, em violação dos arts 3º-1, 5º-2 e 607º-4, do CPC como poderia ainda voltar atrás, infletindo-a no sentido que, então, sim, julgasse mais justo e mais correto.</font></i><br>
<i><font>17ª Mesmo admitindo que o intérprete não possa contornar a letra do art.1550º do CC, nada obsta a que se afiram os conceitos de “encrave relativo” e de “insuficiência de ligação à via pública”, pelas necessidades normais de acesso, ou seja, das relacionadas com a natureza das culturas a que os prédios em causa estão afetos, da forma como se procede à sua exploração e das despesas que acarretam, sendo certo que, no caso dos autos, os prédios dos Rects têm uma área global de cerca de 4 hectares de vinha da região demarcada do Douro, oliveiras e árvores de fruto.</font></i><br>
<i><font>18ª É, pois, possível calcular, aritmeticamente, ainda que com recurso à força da presunção judicial decorrente da quantidade, constância e frequência de serviços que uma exploração desta natureza lhes acarreta, bem como às despesas mínimas que terão de suportar na contingência de terem de recorrer ao acesso alternativo, atenta a natureza e constância dos trabalhos que tal tipo de exploração lhes exige – sobretudo, mostrando-se os parâmetros essenciais dessa função provados nas als “C”e“D”, relativamente às despesas de exploração, e nos itens 3º, 5º e 6º da mesma série, quanto às do percurso por ...</font></i><br>
<i><font>19ª Efetivamente, comparando os referidos factos com os das als B) e C) facilmente se constata pelas regras de vida e através de uma “regra de 3 simples”, ou mesmo “de cabeça”, que, por ..., sempre gastariam - no mínimo, com desgaste de pneumáticos, combustível e 2 horas de trabalho perdido, mas que têm de pagar ao pessoal, nas viagens de ida e volta por cada dia de trabalho - mais do décuplo das despesas que poderiam fazer se lhes fosse permitido transitarem do ... para o ..., e vice versa, pela extrema poente do …, tendo em linha de conta que, pela extrema poente do … só gastariam 10 seg.de carro e 30, a pé, assim se vendo, mesmo a olho nu, caso a ação viesse a proceder, a enorme discrepância entre os eventuais prejuízos para o Rdo, e os notoriamente comprovados, para os Rects (Cf Acs. TRC de 27/5/2014, e de 13/5/2014, proc. nº 4054/11.6TJCBR.C1)</font></i><br>
<i><font>20ª Cumprido se mostra, pois, indo mesmo além do disposto no art.412º do CPC, o onus probandi relativo à factualidade relevante do ponto de vista da demonstração do excessivo incómodo e/ou dispêndio em que assenta o reconhecimento do direito potestativo em causa, ainda que não cabal, atendendo à constante variação dos preços e dos valores relativos às despesas de exploração e à quantidade e venda dos frutos colhidos, cujo cômputo será sempre possível obter com base nos referidos elementos, objetivos e inalteráveis, que carrearam para os autos e lograram demonstrar.</font></i><br>
<i><font>21ª É, assim, enorme, a desproporcionalidade entre a desvantagem ou prejuízo de relevo que daí resultaria para o Rdo, enquanto comproprietário de uma nesga de terreno com 30 m de comprido - praticamente isolada do resto da Quinta, pois para além da linha que a define na sua extrema poente, nada mais ali possui – tendo ainda em conta que os AA apenas a usarão para vencerem a curtíssima distância que medeia entre o ... e o ..., mal se compreendendo, pois, que o Rdo obrigue os Rects a percorrer cerca de 20 Km por dia na viagem de ida e volta, quando poderiam fazê-lo por ali em 10 seg, de carro, e em 30, a pé</font></i><br>
<i><font>22ª De resto, nenhuns prejuízos se provaram - o Rdo, aliás, não os referiu, ao contrário dos Rects que, no art. 15º da p.i., alegaram expressamente a ausência de quaisquer danos, para aquele ou para o seu prédio - sendo certo que se algum dano dali lhe adviesse, sempre seria um minus em relação aos sofridos pelos AA - cf Acs.TRC de 27/5/2014, e de 13/5/2014, proc. nº 4054/11.6TJCBR.C, e de 10.12.2013, in Proc. 361/11.6T2AND.C1- mas que estes logo o indemnizariam, ainda que esse eventual dano não merecesse a tutela do direito.</font></i><br>
<i><font>23ª Não pode, assim. manter-se o fundamento de que se socorreu a Mma Juiz para julgar improcedente parte do pedido C) no sentido de que “se desconhece se o referido trajeto pretendido pelos AA seria ou não o que menos prejuízo causaria aos RR”, para, logo, se obtemperar que estes, “certamente, sofrerão menos danos caso não exista qualquer servidão a onerar o seu prédio”, por lhe estar vedado suprir a inércia do Rdo, pois recaindo sobre este, o ónus de contrariar os factos alegados pelos AA no 15º item da p.i., não o fez, pelo menos, na forma legalmente prevista, devendo ter-se tais factos por confessados, ou seja, que “...a faixa oneranda não é nem nunca foi cultivada, sendo desprovida de árvores, videiras ou quaisquer outros arbustos, sendo por isso de reduzido ou, mesmo, de nulo valor material...”</font></i><br>
<i><font>24ª Daí que, dando-se por não escrito tal fundamento, deverá ter-se aquele pedido C) como integralmente provado, sob pena de violação dos arts 342º-2 do CC, e 572.b), 573º e 574º do CPC - cf, ainda, o Ac RC, de 10.12.2013, in Proc.361/11.6T2AND.C1 - pormenor que à Mma Juiz e à Relação terá passado despercebido, o que arrasta consigo a total procedência do 3º suporte do pedido principal.</font></i><br>
<i><font>25ª Acresce que, recaindo sobre o Rdo o onus probandi de tal argumento, não vemos que o haja alegado e, muito menos, provado nos autos quaisquer factos ou danos materiais nesse sentido, pelo que, ao concluir-se desse modo, mostram-se ambas as instâncias incursas na nulidade prevista nos arts 608º-2 e 615º-d) do CPC, conhecendo de questão que a parte a quem tal aproveitaria não alegou nem provou.</font></i><br>
<i><font>26ª O R. seguramente atido à força aparente do jus utendi et abutendi a que sempre se ateve, olvidando que tal direito não é absoluto, não só reconheceu a inexistência de quaisquer danos para o seu prédio - tacitamente, por via da cominada “confissão” dos factos alegados no art. 15º da p.i. - como aceitou, expressamente, cf art. 2º da cont. e ao final das contra-alegações, que “a travessia carral e pedonal pelo seu prédio, porque mais curta e mais cómoda, seria até benéfica e conveniente ao prédio dos AA”.</font></i><br>
<i><font>27ª Ao nível do respetivo conteúdo e dos limites objetivos do direito de que aquele se arroga enquanto comproprietário do …, reconhece-lhe a lei, sem dúvida, tal qualidade, na justa medida em que tal direito se revele necessário à preservação das utilidades que o mesmo lhe proporciona, mas não já quando o único argumento a que se arrima é essa mesma qualidade de que se prevalece para justificar a sua oposição ao pedido dos Rects, pois aí, como se decidiu no Ac RC de 10.12.2013, in Proc.361/11.6T2AND.C1, encontra-se limitado pelo instituto do Abuso de Direito.</font></i><br>
<i><font>28ª Sobre essa mesma temática tem vingado desde há anos na jurisprudência desta nossa Suprema Instância, v.g. o douto Ac. STJ, de 14-02-2013, onde se considera que «na concretização do que devam poder considerar-se os limites do direito de propriedade, a doutrina vem defendendo que a questão tem de ser colocada e abordada no âmbito da função social da propriedade privada”. Nesse mesmo sentido, pode ler-se, também, P. Lima eA. Varela, in CCAn.1987, vol. I. Pág. 300</font></i><br>
<i><font>29ª Esta postura do Rdo vê-se ainda asperamente censurada pelo douto Ac STJ de 07/02/2008, in proc. nº 07B3934, onde se considera que “a figura do Abuso do Direito surge como um modo de adaptar o direito à evolução da vida, servindo como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam, por forma considerada justa pela consciência social, em determinado momento histórico, ou obstando a que, observada a estrutura formal do poder conferido por lei, se excedam manifestamente os limites que devem ser observados, tendo em conta a boa fé e o sentimento de justiça em si mesmos.</font></i><br>
<i><font>Nestes termos e nos melhores, de direito, que, estamos certos, não deixarão de suprir-se, deverá a presente Revista ser aceite, e, depois, procedendo-tanto no que tange à reapreciação da matéria de facto, até onde for possível, como no que respeita às questões de direito que serviram de leitmotif à sua interposição, revogando-se as decisões recorridas, e julgando-se esta ação procedente, fará este Tribunal Supremo inteira JUSTIÇA</font></i><font>.</font><br>
<font>Não foram apresentadas contra-alegações.</font><br>
<font>*</font><br>
<font>Este Coletivo conheceu do recurso de revista em termos gerais, abordando as questões respeitantes a:</font><br>
<font>- Violação do caso julgado formal;</font><br>
<font>-Improcedência do recurso de apelação, no segmento respeitante à impugnação da matéria de facto;</font><br>
<font>Sendo decidido:</font><br>
<font>a)- Não conhecer do recurso de revista com fundamento na alegada violação de caso julgado;</font><br>
<font>b)-Julgar o recurso de revista improcedente no segmento respeitante à impugnação da matéria de facto;</font><br>
<font>Quanto ao mais, verificando-se que o acórdão da Relação confirmava, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão da 1ª Instância, foram os autos remetidos à Formação a que alude o art. 672, nº 3 do, do CPC, para verificação dos invocados pressupostos da revista excecional, sendo deliberado por esse Coletivo, admitir a revista excecional.</font><br>
<font>Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir.</font><br>
<font>*</font><br>
<font>Nas Instâncias foram julgados como provados e não provados os seguintes factos:</font><br>
<i><font>i) </font></i><b><i><font>considerou provado que</font></i></b><i><font>:</font></i><br>
<i><font>1. Os Autores são donos de sete prédios rústicos de vinha da região demarcada do Douro, sitos no lugar das ..., freguesia e concelho do ..., todos com inscrição matricial e registral a seu favor, sendo que: </font></i><br>
<i><font>A - O primeiro, inscrito na respetiva matriz sob o art. ..., encontra-se descrito na CRP sob o nº …. e ali registado sob AP. 5 de 2005.7/8. </font></i><br>
<i><font>B - Os restantes seis – por serem imediata e sucessivamente contíguos entre si e pertencerem ao mesmo dono – formam uma só unidade agrícola registada na CRP sob Ap. 2013 de 2011/03/24, com as menções matriciais e registrais ao diante indicadas, por ordem da respetiva contiguidade topográfica e atento o sentido norte-sul: </font></i><br>
<i><font>a - Matricial, sob o art. …, e registral, nº …</font></i><br>
<i><font>b - Matricial, sob o art. …, e registral, nº … </font></i><br>
<i><font>c - Matricial, sob o art. …, e registral, nº … </font></i><br>
<i><font>d - Matricial, sob o art. …, e registral, nº … </font></i><br>
<i><font>e - Matricial, sob o art. …, e registral, nº … </font></i><br>
<i><font>f - Matricial, sob o art. …, e registral, nº …. </font></i><br>
<i><font>2. A nascente destes, possuem os Réus um outro - em regime de compropriedade e na proporção de 4/6 para os 1°s, 1/6 para a 2ª e 1/6 para a 3ª - sito no mesmo lugar de ..., também rústico de vinha da região demarcada do Douro e de cultura arvense de sequeiro, inscrito na matriz sob art….. e descrito na CRP sob N° .... </font></i><br>
<i><font>3. Entre a estrema sul do ... e a estrema norte do ... apenas medeia uma faixa de terreno que integra a estrema poente do prédio dos Réus, com 30 metros de comprimento por 3 metros de largura, em terra batida e no mesmo plano das estremas sul e norte daqueles dois. </font></i><br>
<i><font>4. Residindo os Autores em ..., seja qual for o prédio ou prédios a que pretendam dirigir-se, têm que se deslocar sempre até ao ..., incontornavelmente, sendo que, a partir daquele lugar, para alcançarem, a pé e/ou de carro, os descritos em 1.B, bastar-lhes-á tomarem a estrada camarária que liga aquele lugar à povoação de ..., que abandonam ali, para fletirem a poente, seguindo depois por um caminho de consortes cerca de 80 metros, ao cabo dos quais entram no 113-A descrito em 1.B-c), passam pelo … e deste para o .... </font></i><br>
<i><font>5. Uma servidão de passagem a pé e de carro pelo … dos Réus, mais precisamente pela faixa de terreno descrita no 3º item, permitiria aos autores acederem ao ... quando se encontram na extremidade norte do ..., e vice-versa, pela forma mais cómoda e mais curta, bastando-lhes percorrer os 30 metros que separam aqueles seus dois prédios, o que conseguem, à vontade, em 10 segundos, de carro, e em 30, se apeados. </font></i><br>
<i><font>6. Se para acederem ao ... forem obrigados a ir por ..., porque terão de partir sempre, do ..., tomar a EN 2 que liga esse lugar a ... e ao chegarem a ..., fletirem para sul, seguindo depois pelo caminho que leva ao ..., para alcançarem, finalmente, a extremidade poente do ..., ao cabo de 1.100 m, percorrem, ao todo, ou seja, desde o ... até este prédio, 6,6 Km. </font></i><br>
<i><font>A. Foi outorgada uma escritura pública, em 9.06.99, entre KK e mulher, então donos do ..., e LL e mulher, então donos dos ..., … e …, que ali fora designada como de “constituição de servidão”. </font></i><br>
<i><font>B. Em finais de 2007, os Autores viram-se impedidos de passar pelo prédio dos réus, pois, ao chegarem ao cabo do ..., pretendendo atravessar a faixa de terreno descrita com vista a poderem aceder ao ..., constataram que a mesma se encontrava ladeada por dois esteios em ferro, a suportarem um cadeado a obstruir a passagem de carros e de pessoas, pelo que logo removeram aquele artefacto, continuando a transitar por ali, por ser esse o trajeto mais cómodo e mais curto. </font></i><br>
<i><font>C. Para prosseguirem no ... com as tarefas em que andavam ocupados na unidade agrícola descrita em 1.B – quase sempre com máquinas, pessoal, adubos ou produtos químicos fitossanitários já preparados, i.é, já misturados nos tambores e barris, no estado líquido – ao chegarem ao cabo, ou seja, à estrema norte do ..., se não puderem transitar deste para aquele pela faixa dos Réus descrita em 3, ver-se-ão os Autores obrigados a voltar para trás com carros, máquinas, produtos, trabalhadores, bebidas e prezigo, e terem de repercorrer 1,4 Km de ... ao Peso, mais 6,6 Km, desde aqui a ..., e seguir pelo caminho público do ..., num total de 8 km, quando lhes bastava atravessarem em 10 segundos o …, de sul para norte, para chegarem ao .... </font></i><br>
<i><font>D. Porque estamos no coração do Douro, a produção de fruta, azeite e a cultura vitivinícola são predominantes, e onde os tratamentos fitossanitários, por isso, são frequentes, bem como a rega do bacelo, da enxertia nova, as podas, cavas, escavas, redras, colheita e transporte de uvas, azeitonas, frutas e dos mais diversos produtos agrícolas exige um aturado e contínuo esforço. </font></i><br>
<i><font>E. No âmbito da ação com processo sumário n.º 220/08.0TBPRG – J2, que correu termos pela Instância Local de ..., os Autores peticionaram contra os aqui Réus o reconhecimento e declaração de existência de uma servidão de passagem a pé e de carro, constituída por usucapião, materializada na faixa de terreno referida no art.º 3º da petição inicial, a onerar o prédio rústico dos Réus identificado no art.º 2º da petição inicial (art.º 73-A) e em benefício do seu prédio rústico identificado no art.º 1º-B (art.º ...). </font></i><br>
<i><font>F. Tal ação judicial foi julgada improcedente, com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos aí formulados, cuja sentença final aí proferida transitou devidamente em julgado. </font></i><br>
<i><font>G. O caminho público de ... é utilizado por vários proprietários, nomeadamente confinantes com o prédio rústico dos Autores, que por aí processam com normalidade o trânsito apeado e carral. </font></i><br>
<i><font>ii) </font></i><b><i><font>considerou não provado que</font></i></b><i><font> (vão numerar-se para melhor identificação, utilizando-se a numeração romana para evitar a confusão com os “factos assentes” ): </font></i><br>
<i><font>I) Os anteriores donos do prédio com o artigo matricial ..., sempre passaram, a pé e de carro, durante mais de 30 anos, num e noutro sentido, ou seja, os donos do ... pelo ..., e os donos deste, pelos descritos em 1-B-a),b),c), o mesmo continuando os Autores a fazer desde que compraram o ... em 2005, convencidos de que lhes assistia tal direito, a pé e de carro, como lhes fora afiançado pelos vendedores. </font></i><br>
<i><font>II) À data da celebração da escritura referida em A., a constituição de servidão já continha os requisitos probatórios mais do que suficientes ao seu reconhecimento judicial por usucapião, pois há mais de 30 anos que já dava recíproca serventia - a uns e a outros e de uns para os outros, i.é, ao ..., …, ..., … e …. </font></i><br>
<i><font>III) Só não tendo intervindo os anteriores donos, ao tempo ainda vivos e com quem mantinham as melhores relações de vizinhança, porque a estrema poente daquele prédio, presumida e logicamente, já estava onerada por uma servidão da mesma natureza, embora com apenas 3 m de largo, bastante, aliás, pois naquela faixa o seu trajeto é muito curto e em linha reta, ao passo que nos demais é curvilíneo e os veículos que por ali passavam com cargas, precisavam de maior largura para o descrever. </font></i><br>
<i><font>IV) E a prova de que toda a gente reconhecia os anteriores donos do ... e os dos descritos em | [0 0 0 ... 0 0 0] |
HDFXu4YBgYBz1XKvHPdB | 1.ª Secção (Cível) | <b><font> </font></b><font>
<p><font>Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo Central Cível ... – J...</font><br>
</p><div><br>
<font>***</font></div><br>
<br>
<b><font>1</font></b><font>. AA, casada, Contribuinte Fiscal n.º ..., residente em Rua ... – ... ... propôs acção declarativa sob a forma de processo comum contra o Banco BIC Português SA, Contribuinte Fiscal n.º ... e ... na Av. ..., ..., ... ... (anteriormente Banco Português de Negócios, BPN), pretendendo “...ver declarado que as obrigações SLN RENDIMENTO MAIS 2004, que lhe foram vendidas ao Balcão do BANCO PORTUGUÊS DE NEGÓCIOS BPN- (ACTUAL BANCO BIC S.A., RÉU NA PRESENTE ACÇÃO), o foram com garantia de reembolso de capital a 100% (cem por cento), com a consequente condenação do Réu a pagar à Autora o montante da obrigação garantida, acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos, e ainda ser o Réu condenado ao pagamento de montante indemnizatório decorrente dos danos não patrimoniais (danos morais) bem como ás despesas e encargos com a presente demanda, nestes se compreendendo honorários a profissional forense (advogado).” </font><br>
<p><font>Com fundamentos nos factos que descreve na sua petição inicial, concluiu tal articulado formulando o seguinte pedido: </font><br>
</p><p><font>“TERMOS EM QUE: </font><br>
</p><p><font>Nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de Vossa Excelência Meritíssimo Senhor Juiz, deve a presente ser recebida por legal e tempestiva e por via dela ser proferida douta decisão que: </font><br>
</p><p><font>a) – Declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra de obrigações SLN RENDIMENTO MAIS 2004, por parte da Autora ao Réu, BPN- (ACTUAL BANCO BIC S.A., RÉU NA PRESENTE ACÇÃO), – Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ..., foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia de reembolso do capital a 100% (cem por cento). </font><br>
</p><p><font>b) – Declare que é da Responsabilidade do BANCO BIC S.A, Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ..., o reembolso do capital reportado à aquisição por parte da Autora das obrigações SLN RENDIMENTO MAIS 2004, no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), porquanto com a transmissão do Nacionalizado Banco BPN, para a esfera jurídica do Réu BANCO BIC S.A, Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ..., transmitiram-se de igual modo na sua totalidade todas as obrigações emergentes dos contratos que obrigavam o BPN, independentemente de todo e qualquer acordo que o Réu BANCO BIC S.A, Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ..., tenha estabelecido com o Estado Português no acto de compra ou em momento anterior, o que só lhe concede o direito de regresso a discutir entre as partes em causa (Estado Português e BANCO BIC S.A, Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ...), sendo tal acordo marginal à aqui Autora. </font><br>
</p><p><font>E; </font><br>
</p><p><font>1 – Condene o ao Réu, BANCO BIC S.A., Contribuinte Fiscal n.º ..., e ...: Av. ..., ..., ... ..., a proceder ao imediato reembolso do capital de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescidos dos juros vencidos desde 25 de Outubro de 2014, até integral reembolso do capital, condenando ainda o Réu BANCO BIC S.A., a pagar á Autora quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, mas nunca inferior a € 10.000,00 (dez mil euros), por danos morais sofridos pela Autora com o comportamento imputável ao Réu BANCO BIC S.A.” </font><br>
</p><p><b><font>2</font></b><font>.Contestou o réu Banco BIC Português SA, também em resumo e no essencial, excepcionando a incompetência deste tribunal em razão do território e a ineptidão da petição inicial, negando que em momento algum tivesse assegurado à autora que o capital investido fosse garantido, podendo gerar ganhos ou perdas dependendo das movimentações de mercado, não tendo a ré por qualquer modo garantido as perdas que a autora, eventualmente, viesse a sofrer, excepcionando ainda a prescrição do direito invocado pela autora, pelo decurso do prazo de dois anos a que se refere o artigo 324.º do Código dos Valores Mobiliários (tudo também como melhor consta da sua contestação de fls. 104 e ss., que se dá por reproduzida). </font><br>
</p><p><b><font>3</font></b><font>.A autora pronunciou-se quanto às excepções alegadas na contestação (fls. 167 e ss.), mantendo, no essencial, a posição já anteriormente assumida na petição inicial, tendo no mesmo articulado ampliado o pedido inicialmente formulado, a que o réu Banco se opôs, ampliação que foi rejeitada por despacho de fls. 194. </font><br>
</p><p><b><font>4</font></b><font>.Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedentes as excepções de incompetência territorial, de ineptidão da petição inicial e que relegou para final o conhecimento da excepção peremptória de prescrição, fixando-se o objecto do processo e enunciando-se os temas de prova (cfr. acta de audiência prévia de fls. 211 e ss.). </font><br>
</p><p><b><font>5</font></b><font>.Realizado o julgamento, foi proferida sentença que:</font><br>
</p><p><font>- Julgou improcedente a excepção de prescrição invocada pelo banco réu, Banco BIC Português SA; </font><br>
</p><p><font>- Julgou procedente a acção, condenando o Banco réu a pagar à autora AA, a quantia de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento e contados desde a data da citação da ré, até integral pagamento; </font><br>
</p><p><font>- Absolver o Banco réu dos demais pedidos contra si formulados pela autora. </font><br>
</p><p><b><font>6</font></b><font>. Não se conformando com o assim decidido </font><b><font>veio o Banco Réu interpor</font></b><font> recurso de apelação, que mereceu a seguinte deliberação do Tribunal da Relação:</font><br>
</p><p><i><font>Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente o recurso interposto pelo apelante Banco BIC Português, S.A., e, revogando a sentença recorrida, absolvem este do pedido contra ele formulado pela Autora AA.</font></i><br>
</p><div><br>
<font>*</font></div><br>
<br>
<font>Agora, inconformada com o decidido pela Relação, interpõe </font><b><font>recurso de Revista</font></b><font> para este STJ a autora e, formula as seguintes conclusões:</font><br>
<p><i><font>PRIMEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>A douta decisão ora sob recurso, mostra-se em contradição com a mui douta decisão proferida no Douto Acórdão desse Egrégio Supremo Tribunal de Justiça, Entre o presente caso, e os que em sede recursiva, foi por Vossas Excelências Egrégios Senhores Juízes Conselheiros julgado e decidido no âmbito dos processos n.ºs 1821/16.8T8STRE1, acórdão de 11 de Janeiro de 2018, em que foi Relator o Egrégio Senhor Juiz Conselheiro Tomé de Carvalho e que obteve unanimidade na sua votação, e os processos n.º 2695/16.4T8STRE1, acórdão de 21 de Dezembro de 2017, em que foi Relatora a Egrégia Senhora Juíza Conselheira, Conceição Ferreira, e que obteve unanimidade na sua votação, 20329/16.5T8LSB.L1.S1 em que foi Relator o Egrégio Senhor Juiz Conselheiro Salreta Pereira, 20403/16.8T8SLB.L1.S1 , 6ª Secção, em que foi Relatora a Egrégia Senhora Juíza Conselheira, Maria Olinda Garcia, 753/16.4TBLSB.L1.S1, 6.ª Secção, em que foi Relator o Egrégio Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, de entre muitos outros, não se vislumbra de todo a mínima diferença, indo assim contra Jurisprudência dominante de um Tribunal Superior.</font></i><br>
</p><p><i><font>SEGUNDA</font></i><br>
</p><p><i><font>No caso concreto, os pressupostos da responsabilidade contratual decorrente do acordo de garantia do capital e de juros feito com o cliente, verificam-se: e verifica-se a ilicitude, por violação do dever de informação e do compromisso de garantia do capital e de juros; a culpa, a qual se presume nos termos do art. 799.º, n.º 1 do Código Civil, e a causalidade, ou seja, o nexo entre o facto e o dano, que a doutrina também considera estar abrangida pela presunção do artigo 799.º, n.º 1 do Código Civil (cf. Menezes Cordeiro, Direito Bancário, ob. cit., p. 432).</font></i><br>
</p><p><i><font>TERCEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>Não se pode afirmar, como consta do douto acórdão, que não se verifica a violação do dever de informação e que a informação dada era verdadeira pois apenas quereria significar que a garantia de capital se reportava ao facto de se pretender com esta garantia afirmar que o Autor no final do prazo receberia a totalidade do dinheiro investido e não menos do que esse montante, já que, o que esteve sempre na base dessa informação de garantia de capital era o compromisso de reembolso do mesmo.</font></i><br>
</p><p><i><font>QUARTA</font></i><br>
</p><p><i><font>O Douto Tribunal Recorrido no seu Douto acórdão, ao dar como provado os factos constantes dos pontos, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, e 11, donde se resulta mostrar-se provado que; </font></i><br>
</p><p><i><font>1- A autora, AA, detinha à data de Outubro de 2004, um depósito a prazo no BPN (actualmente, o réu Banco BIC SA), agência ou balcão de ...; </font></i><br>
</p><p><i><font>2- Tal depósito a prazo, estava a essa data a atingir a sua data de vencimento;</font></i><br>
</p><p><i><font>3- Sabendo disso, o gerente do Banco réu naquele balcão, contactou a autora, solicitando que se dirigisse ao Balcão do Banco, pois queria falar com ela porque tinha uma proposta interessante para lhe fazer;</font></i><br>
</p><p><i><font>4- Dessa forma, em dia do mês de Setembro de 2004, a autora, acompanhada do seu marido, dirigiu-se ao referido balcão, com vista a informar-se de qual a proposta que o referido gerente do Banco tinha para lhe fazer;</font></i><br>
</p><p><i><font>5- Uma vez aí, foi recebida pelo gerente do referido balcão, que lhe reafirmou que o Banco tinha de facto uma proposta aliciante para lhe fazer;</font></i><br>
</p><p><i><font>6- Sendo que o referido gerente, referiu desde logo á Autora que, como esta sabia o depósito a prazo que detinha naquele Banco, estava na data limite de vencimento, pelo que, poderia proceder ao resgate do mesmo e aplicar o montante que ele titulava num programa de aplicação financeira que lhe traria uma maior rentabilidade e detinha a mesma segurança que o depósito a prazo, com garantia de capital a 100% (cem por cento), tal como o depósito a prazo;</font></i><br>
</p><p><i><font>7- Para o efeito, o identificado gerente disse à autora que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos; </font></i><br>
</p><p><i><font>8- Que a aplicação em causa e que lhe estava a propor era segura, que não corria qualquer risco, posto que tinha o reembolso do capital investido garantido a 100% (cem por cento) e lhe daria uma maior rentabilidade ao dinheiro que ela detinha em depósito a prazo;</font></i><br>
</p><p><i><font>9- Foram exibidos à autora documentos como os que constam de fls. 56 e 57 (docs. nº 1 e 2 junto com a petição inicial), em que constava, além do mais, que era garantido a 100% o capital investido, bem como uma elevada taxa de remuneração;</font></i><br>
</p><p><i><font>10- Perante tais argumentos do gerente do balcão, pessoa em quem a autora depositava confiança, enquanto responsável pelo acompanhamento da sua conta bancária, a autora acedeu em resgatar o depósito a prazo e proceder á sua aplicação naquela aplicação financeira;</font></i><br>
</p><p><i><font>11- Assim, em 11 de Outubro de 2004, a autora, subscreveu tais aplicações, no montante de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), correspondentes ao montante que detinha em depósito a prazo (documento de fls. 62, doc. nº 3 junto com a petição inicial);</font></i><br>
</p><p><i><font>Perante a prova de tais factos, estes só por si, impunham decisão diversa que condenasse o Réu como peticionado foi e como decidido o foi em primeira instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>QUINTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Ao decidir como decidiu, absolvendo como absolveu o Réu no entendimento de que o mesmo não violou de forma grosseira os deveres que lhe estavam impostos pelo Código de Mercado dos Valores Mobiliários, o Tribunal a quo perante a prova produzida e mesmo aquela que se não mostra revogada pelo douto acórdão recorrido e até por este firmada e confirmada, violou as normas dos artigos 7.º n.º 1 e 312.º n.º 1 do Código de Valores Mobiliários.</font></i><br>
</p><p><i><font>SEXTA</font></i><br>
</p><p><i><font>A douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 73.º; 74.º; 75.º, do R.G.I.C.S.F.; dos artigos 408.º, 582.º, 798.º e 799.º, do Código Civil; e nos artigos 7.º; 304.º; 304.º-A; 305.º; 309.º, 310.º; 312.º; 314.º; n.º 2 e 334.º do Código de Mercado dos Valores Mobiliários.</font></i><br>
</p><p><i><font>SÉTIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>O nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano causado ao autor (art. 563.º do CC) deve ser analisado através da demonstração, que decorre claramente da matéria de facto, de que se tais deveres de informação tivessem sido cumpridos, a Autora não teria investido naquela aplicação, mas noutra que lhe garantisse um retorno seguro, condição que ele colocou para fazer o investimento.</font></i><br>
</p><p><i><font>OITAVA</font></i><br>
</p><p><i><font>A protecção dos interesses legítimos dos clientes de produtos financeiros implica, em relação a eles, que o intermediário financeiro indague sobre a sua situação financeira e experiência – o princípio know your costumer, ou, know your client no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objectivos de investimento do cliente – n.º 3 do art. 304º do CVM – devendo observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.</font></i><br>
</p><p><i><font>NONA</font></i><br>
</p><p><i><font>O dever de conhecimento do perfil do cliente, sobretudo nos casos de investidores não qualificados, a avaliação não só da sua capacidade de investimento como a de suportar o risco inerente ao produto que pretende adquirir, para se ajuizar se certa transacção é adequada ao cliente – suitablity test –, impõe ao intermediário financeiro um rigoroso dever pré-contratual de informação, que não se queda pelo padrão do bom pai de família, mas antes, dada a professionalidade do banco/intermediário financeiro, lhe impõe um grau de diligência mais acentuado, devendo actuar como “diligentissimus pater familias”, não sendo toleráveis procedimentos que possam sequer ser incursos em culpa leve.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>O dever contratual de agir de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, impostos ao intermediário financeiro, no interesse legítimo dos seus clientes, não é mais, afinal, que o dever de agir de boa fé, constituindo um dever principal – a prestação propriamente dita no complexo obrigacional a cargo do intermediário financeiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA PRIMEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>A relação contratual obrigacional que se estabelece entre o cliente e o intermediário financeiro, exige deste um elevado padrão de conduta, com lealdade e rigor informativo pré-contratual e contratual: informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, tendo em conta que, entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a da contraparte.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA SEGUNDA</font></i><br>
</p><p><i><font>O não cumprimento dos deveres de informação é sancionado, no quadro da responsabilidade civil contratual – art. 483º, nº1, do Código Civil –, impendendo sobre o intermediário financeiro ou banco, que age nessa veste, presunção de culpa nos termos do art. 799º, nº1, do Código Civil, sendo claro o n.º 2 do art. 304-A do CVM quando estatui – “A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado por violação de deveres de informação.”</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA TERCEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>Os factos provados demonstram que o Réu, na fase pré-contratual, não prestou a exigível e qualificada informação pautada pelo standard da actuação de boa fé, com o elevado padrão de conduta, não actuando com diligência e transparência de modo a informar, cabalmente, do risco do negócio, não respeitando, nem protegendo o interesse do investidor, seu cliente há anos, e que, naturalmente confiava, como seria esperável dessa relação de confiança, uma informação que, obviamente, não era a de que a entidade emitente que a Autora desconhecia e que nunca lhe foi referida, pudesse cair na insolvência, mas que não deveria ser a que foi prestada: o retorno do investimento naquele produto financeiro era garantido como se fosse um produto do banco, o que foi razoavelmente entendido, como tão seguro e garantido como um depósito a prazo, já que como resulta da própria sentença e mantido no douto acórdão, foi referido á Autora que a garantia de capital era dada pelo próprio Banco..</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA QUARTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Se nos deveres de informação não cabe, por exemplo, o dever de alertar para o risco de insolvência da entidade que coloca o produto financeiro no mercado, sobretudo se as circunstâncias não assinalarem no horizonte esse risco, já nos casos, como é o que nos ocupa, em que o cliente é induzido a investir pelo Banco, que toma a iniciativa de o contactar, o que revela confiança, não mesmo certo é que qualquer reticência de informação já é violadora do padrão de exigência informativa cometida ao intermediário financeiro.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA QUINTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Tendo o funcionário do Banco informado a cliente Autora., de acordo com as exactas instruções superiores por si recebidas, que a emissão do papel comercial em questão podia ser subscrita com toda a segurança, que o próprio Banco se responsabilizava pelo retorno no prazo do vencimento, garantindo o reembolso do mesmo e o pagamento dos respetivos juros, não comportando, por isso, qualquer risco, que o produto tinha, afinal, o mesmo valor que um depósito a prazo, e que a A. podia pedir o pagamento do capital e do juro que estivesse vencido antecipadamente, pode concluir-se que o Banco se vinculou, perante a A., a co-assumir a obrigação de reembolso do capital subscrito e respetivos juros que sobre a entidade emitente do dito papel comercial recaía, assegurado o pagamento como direto responsável por ela;</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA SEXTA</font></i><br>
</p><p><i><font>É patente que o Réu Banco BIC, S.A., não observou o elevado grau de diligência que legalmente lhe é imposto, pelo que é forçosa a conclusão de que a sua culpa é grave.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA SÉTIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>Ocorrendo como ocorreu uma violação das sobreditas obrigações e deveres, o intermediário financeiro incorre em responsabilidade civil e está obrigado a indemnizar os danos causados, ao abrigo da disciplina vertida no artigo 314º, nº 1, do Código dos Valores Mobiliários. Adianta o n.º 2 do referenciado normativo que a culpa do intermediário financeiro se presume quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA OITAVA</font></i><br>
</p><p><i><font>A Douta decisão não faz a melhor aplicação do direito, pelo que pode e deve ser revogada e substituída por outra que aplicando o direito, declare que no caso sub judice, tendo ficado provado que, a gestora de conta do referido balcão afirmou aquando da venda das obrigações que as mesmas tinham o capital garantido, já que tal tanto se mostra suficiente para a ilação da prova da prestação de informação não verdadeira, que constituiu causa suficiente e única para que o Recorrente anuísse na aquisição do produto, sendo que se tivesse sido informada das características verdadeiras do mesmo, jamais teria subscrito/adquirido tal produto, sendo que tal depoimento se mostra corroborado pela testemunha, que declarou conhecer que a Autora tinha perfil conservador, isto é, era um cliente de poupanças; a a que acresce o facto de ter sido dado como provado, que a Autora confiou nas informações prestadas pelo seu gestor de conta do BPN.</font></i><br>
</p><p><i><font>DÉCIMA NONA</font></i><br>
</p><p><i><font>Ao decidir como decidiu, o Douto Tribunal, interpretou de forma manifestamente errada tal informação/afirmação/compromisso do Banco, porquanto tal afirmação enquanto motivadora e influenciadora da aquisição do produto, pressupunha uma garantia efectiva de reembolso do capital, assumida pelo próprio Banco, sem qualquer referência á emitente, num produto que aliás reconhecidamente era do interesse também do próprio Banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>Os factos dados como provados quer em primeira Instância quer no Tribunal Recorrido, só por si impõe que seja proferida douta decisão que revogando o douto acórdão, condene o Réu Banco BIC, S.A., conforme peticionado e decidido foi em primeira instância.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA PRIMEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>Mostra-se que a Autora recorrente era aforradora conservadora, avessa a investimentos financeiros de risco, sendo certo que as anteriores aplicações tinham sido feitas em Obrigações do Banco BPN, e acreditou a Autora que estas eram rigorosamente a mesma coisa, desconhecendo de todo em todo que se tratava de um produto alheio ao Banco, pelo que só adquiriu a “Obrigação 2004” por ter sido convencida pelo gerente da agência da do BIC, que o retorno da quantia investida na sua aquisição, era garantido pelo próprio Banco, e que se tratava de um sucedâneo de depósitos a prazo, com características semelhantes a estes, mas melhor remunerado, o que era do conhecimento dos funcionários da agência da do BIC que com ele lidavam e nos quais o autor confiava plenamente.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA SEGUNDA</font></i><br>
</p><p><i><font>A Autora nunca teve intenção de adquirir aquele produto financeiro, nem o teria adquirido se os funcionários do BPN a tivessem previamente informado acerca das suas características, ou se lhe tivessem mostrado e explicado conteúdo da “nota informativa” respeitante a tal produto, nomeadamente o teor dos capítulos “Reembolso antecipado” e “Garantias e subordinação.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA TERCEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>É fonte de tal responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos, definido no artigo 77º nº 1 do RGICSF, aprovado pelo DL nº 298/92, de 31-12 (artigo 77º, n.º 1 e 5, em face das redacções introduzidas pelos DL nº 1/2008 e 211-A/2008).</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA QUARTA</font></i><br>
</p><p><i><font>No âmbito da comercialização de produtos financeiros, se o mediador prestar a informação de que o capital está garantido, a responsabilidade da entidade emitente do produto estende-se ao intermediário financeiro - face ao consagrado nomeadamente nos artigos 304º do CVM (boa fé, elevado padrão de diligência, lealdade e transparência) e bem assim atendendo aos deveres de informação a que aludem os artigos 7º nº 1 e 312º, nº1, ambos do CVM, estabelecendo-se, até, nestes casos, uma presunção legal de culpa (artº 314º do CVM).</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA QUINTA</font></i><br>
</p><p><i><font>O Banco que promove a subscrição de obrigações emitidas por outra sociedade junto de clientes que não possuem qualificação ou formação técnica que lhes permita conhecer integralmente os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos expliquem devidamente, tem o dever de prestar aos interessados na aquisição de tais valores mobiliários todas as informações e explicações necessárias para que eles tomem uma posição informada e esclarecida sobre a compra das obrigações, designadamente tem o dever de lhes explicar o que são obrigações, de os informar sobre a entidade que as emite e sobre a relação dela com o Banco e o dever de os informar sobre o risco das obrigações, esclarecendo-os que, em caso de insolvência da sociedade emitente das obrigações, eles, interessados, correm o risco de não serem reembolsados do capital que aplicaram nas obrigações.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA SEXTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Como instituição de crédito, está sujeita às regras de conduta que o RGICSF – em vigor na altura da subscrição das obrigações - impunha às instituições de crédito, designadamente ao critério de diligência previsto no artigo 76.º, segundo o qual devia actuar nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição dos riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos investidores.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA SÉTIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>Como intermediário financeiro O Banco Réu, está sujeito aos deveres de informação prescritos pelo Código de Valores Mobiliários [versão que estava em vigor em 2006, data da aquisição das obrigações, ou seja o Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.ºs 61/2002, de 20 de Março, 38/2003, de 8 de Março, 107/2003, de 4 de Junho e 66/2004, de 24 de Março, pelo Decreto-lei n.º 52/2006, de 15 de Março e pelo Decreto-Lei n.º 219/2006, de 2 de Novembro].</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA OITAVA</font></i><br>
</p><p><i><font>O artigo 312º do CVM, na redação anterior ao DL 357-A/2007, consagrava já deveres específicos de informação, que conjugados com a concretização que deles era feita no art. 39º do Regulamento da CMVM nº12/2000, abrangia informação detalhada sobre os riscos da aplicação financeira apresentada pelo intermediário financeiro, abrangendo o risco de liquidez, o risco de crédito ou risco de mercado.</font></i><br>
</p><p><i><font>VIGÉSIMA NONA</font></i><br>
</p><p><i><font>Apresentando as obrigações como sendo “equivalentes a um depósito a prazo”, em que “o reembolso do capital era garantido, por não se tratar de um produto de risco” e que “o cliente poderia dispor do respetivo capital quando assim o entendesse”, omitindo informação indispensável à avaliação dos riscos relacionados com o reembolso do capital e respetivos juros, o Banco Réu violou de forma grave o dever de informação constante do artigo 312.º do Código de Mercado dos Valores Mobiliários..</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA</font></i><br>
</p><p><i><font>O n.º 2 do artigo 314º do Código de Mercado dos Valores Mobiliários consagra uma presunção de culpa e também de nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação pelo intermediário financeiro e os danos sofridos pelo cliente.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA PRIMEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>A violação culposa de deveres indeclináveis de informação a cargo de intermediário financeiro (um banco, parte apetrechada na negociação), no âmbito da atividade bancária, perante cliente investidor não qualificado e em deficit de informação, é fonte de obrigação indemnizatória pelo decorrente dano causado a esse cliente.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA SEGUNDA</font></i><br>
</p><p><i><font>Se a comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido responsabiliza a entidade emitente do produto, tal não impede que também se constitua em responsabilidade o respetivo intermediário financeiro que, no relacionamento contratual com aquele seu cliente, atue por forma a assumir também o reembolso do capital investido.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA TERCEIRA</font></i><br>
</p><p><i><font>Mostrando-se provado, como aliás se mostra, que o banco intermediário financeiro propôs ao cliente, no âmbito da contratação, a aquisição de um produto com margem de risco – que aquele não subscreveria se tivesse conhecimento de todas as características do mesmo –, com a prestação de informação falsa de equiparação a um depósito a prazo e garantia de reembolso do capital investido, em violação de elementares padrões de boa-fé na relação com o cliente, ocorre culpa grave do banco.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA QUARTA</font></i><br>
</p><p><i><font>A questão do dever de informação nas suas diversas facetas no âmbito da intermediação financeira efetuada por Bancos que “vendem” aos seus balcões papel comercial de outras entidades, com eles relacionadas, vem sendo, ultimamente, de forma reiterada abordada nos nossos tribunais como evidenciam, nomeadamente de entre muitos mais, os seguintes acórdãos:</font></i><br>
</p><p><i><font>a) Do Supremo Tribunal de Justiça de 10/01/2013 no processo 89/10.4TVPRT.P1.S1; de 06/06/2013 no processo 364/11.0TVLSB.L1.S1; de 06/02/2014 no processo 1970/09.9 TVPRT.P1.S1; de 17/03/2016 no processo 70/13.1RBSEI.C1.S1; de 05/05/2016 no processo 8013/10.8TBBRG.G2.S1 e de 12/01/2017 no processo 428/12.3TCFUN.L1.S1, todos disponíveis em </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font>.</font></i><br>
</p><p><i><font>b) Do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/04/2017 no processo 2928/16.7T8GMR.G1 e de 11/01/2018 no processo 401/16.2T8BGG.G1, ambos disponíveis em </font></i><a><i><u><font>www.dgsi.pt</font></u></i></a><i><font>. </font></i><br>
</p><p><i><font>c) Do Tribunal da Relação do Porto de 02/03/2015 no processo 1099/12.2TVRRT.P1; de 30/05/2017 no processo 588/11.0TVPRT.P1 e de 11/04/2018 no processo 984/17.0T8PNF.P1, disponíveis em </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font>.</font></i><br>
</p><p><i><font>d) Do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/09/2017 no processo 821/16.2T8GRD.C1; de 16/01/2018 no processo 3906/16.1T8VIS.C1; de 23/01/2018 no processo 3246/16.6T8VIS.C2 e de 23/01/2018 no processo 4327/16.1T8VIS.C1, todos disponíveis em </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font>.</font></i><br>
</p><p><i><font>e) Do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/03/2015 no processo 153/13.8TVLSB.L1-7; de 10/10/2017 no processo 4042/16.6T8LSB.L1-7 e de 22/02/2018 no processo 20742/16.8T8SNT.L1-6 todos disponíveis em </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font>.</font></i><br>
</p><p><i><font>f) Do Tribunal da Relação de Évora de 21/12/2017 no processo 2695/16.4T8STR.E1; de 11/01/2018 no processo 1821/16.8T8STR.E1; de 08/03/2018 no processo 1820/16.0T8STR.E1 e de 22/03/2018 no processo 1609/16.6T8STR.E1, todos disponíveis em </font></i><i><font>www.dgsi.pt</font></i><i><font>.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA QUINTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Sendo que a decisão proferida se mostra ferida não só pela violação das normas já citadas do Código de Mercado dos Valores Mobiliários, mas de igual modo choca frontalmente com toda a doutrina dominante.</font></i><br>
</p><p><i><font>TRIGÉSIMA SEXTA</font></i><br>
</p><p><i><font>Mostra-se provado que as informações dadas pelos gerentes do BPN á data de 2004, nomeadamente a informação que á Autora foi dada pelo gerente do BPN, eram a estes transmitidas pela Hierarquia do Banco, sendo certo que á data de 2004, já tal Hierarquia bem sabia qual era a verdadeira situação quer do Banco quer da SLN, já que como ,melhor resultou provado em sede de Inquérito Parlamentar, as operações e respectivos prejuízos do Banco e do Grupo foram sucessivamente ocultados das contas do BPN, quer individuais quer consolidadas, referentes aos anos de 1999 a 2006 e 3° trimestre de 2007, divulgadas ao mercado, não reflectindo aquelas a imagem verdadeira e apropriada da posição financeira e da respectiva performance do BPN em cada uma das datas referidas, em quantias materialmente significativas, designadamente, o valor declarado de capitais próprios chegou a estar sobreavaliado em 21% em 2002 e 2003 e em 17% em 2004 </font></i><br>
</p><p><i><font>TERMOS EM QUE;</font></i><br>
</p><p><i><font>Na procedência do presente, Vossas Excelências Egrégios Senhores Juizes Conselheiros, ao proferirem Douta decisão revogando o Douto Acórdão Recorrido, pela verificação da existência de culpa grave por parte do Réu ao prestar informação não verdadeira e omitir informação obrigatória, condenando o Réu nos termos peticionados na acção.</font></i><br>
</p><p><b><font>Foram apresentadas contra-alegaçõ | [0 0 0 ... 0 0 0] |
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